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Contos Sinistros de Enrique Scheider



Emerson Francelino de Oliveira

Contos Sinistros de Enrique Scheider

SĂŁo Paulo 2016


Copyright © 2016 by Editora Baraúna SE Ltda

Projeto Gráfico Editora Baraúna Revisão

Vanise Macedo

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ ________________________________________________________________ O46c Oliveira, Emerson Francelino de Contos sinistros de Enrique Scheider / Emerson Francelino de Oliveira. - 1. ed. - São Paulo : Baraúna, 2016. ISBN 978-85-437-0669-6 1. Conto brasileiro. I. Título. 16-34540

CDD: 869.3 CDU: 821.134.3(81)-3

________________________________________________________________ 08/07/2016 12/07/2016 Impresso no Brasil Printed in Brazil

DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO À EDITORA BARAÚNA www.EditoraBarauna.com.br

Rua da Quitanda, 139 – 3º andar CEP 01012-010 – Centro – São Paulo - SP Tel.: 11 3167.4261 www.EditoraBarauna.com.br


Dedicado a todos os meus alunos.



Sumรกrio

Invasรฃo de Privacidade. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 Pressรกgio. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 Visita Sombria. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 Uma Velha Visita. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 A Caminho do Inferno?. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 Figura Diabรณlica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 Arrependimento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47



Contos Sinistros de Enrique Scheider

Invasão de Privacidade

Madrugada no mês de janeiro. O bairro de Tremembé, na zona norte da capital de São Paulo, era atacado por constantes relâmpagos e trovões no céu noturno. Fizera muito calor durante o dia. A sensação térmica, naquele momento, era de 20 graus; o clima estava agradável. De todas as residências, ao longe se via apenas um sobrado com uma janela acesa na parte superior, na Rua Albertina, bem próximo ao Horto Florestal. O que alguém estaria fazendo acordado, altas horas? Como cena de um filme que aumenta aos olhos do telespectador, do alto a imagem da casa escura vai se aproximando lentamente. A janela torna-se maior diante da imaginação do leitor. A vidraça estava descortinada. Havia uma suave música tocando, dentro do cômodo aceso. Alguém parecia ouvir new age. Na varanda, você, leitor curioso e ousado, vê pela janela o que se passa no interior da casa. Surgiu a visão de Enrique, trajando um fino pijama. Mantinha-se sentado na cadeira do escritório, diante da escrivaninha. Você sabe que é Enrique, pois havia um diploma com o nome no quadro de mogno amadeirado preso à parede, à direita, abaixo do relógio - “Enrique Scheider”. “Formado em Psicologia pela Universidade de Mogi das Cruzes”. 9


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Ele parecia viver só. Por certo, para economizar energia, apenas usava a luz da mesa. Todas as lâmpadas permaneciam apagadas; apenas a claridade da escrivaninha era suficiente para escrever. Naquele momento, o rapaz não sentia sono. Permanecia escrevendo. Era evidente que Enrique não percebia a sua presença, leitor. E você, curioso, permanece do lado de fora da janela, observando o que o morador fazia. Ventos passavam, assoviando pelas frestas das janelas e portas. Enrique parecia habituado com o ruído e sabia que, lá fora, cairia um temporal. Do lado de fora, você não se incomoda com o tempo chuvoso, pois está protegido pela varanda. Mas, é claro, não é possível sentir o tempo fisicamente, nem o medo dos ofuscantes e barulhentos relâmpagos, pois tudo acontece apenas na sua imaginação. Por isso, você se tranquiliza. Da janela, você volta a atenção ao morador. Enrique continuava escrevendo sobre a escrivaninha de madeira escura, em estilo colonial. Havia um copo com meio suco de laranja, ao lado de alguns papéis amassados e outros, rabiscados como rascunho. Os materiais de cima da escrivaninha recebiam maior claridade da luz do abajur. Os demais móveis e objetos afastados, e mais os pendurados nas paredes, estavam na penumbra, sem receber tanta luminosidade. Do lado direito, via-se também uma estante antiga, da mesma cor da escrivaninha, em modelo colonial. Os pés amadeirados tinham formato de patas. Assim eram a escrivaninha e a cadeira de Enrique. Na estante, muitos livros e alguns quadros com fotos antigas; talvez de pa10


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rentes, por certo de pessoa já falecida. Ainda se via um pequeno aparelho de som, no qual Enrique ouvia uma música suave. De momento, tem-se a impressão de que as figuras dos quadros olham para você, leitor... Enrique, de semblante calmo, parecia ter 35 anos. Aparentemente, era a única pessoa em casa. A chuva forte começou a cair, acompanhada de rajadas de ventos, que passavam novamente, assoviando pelas frestas. Enrique olhou para a janela; você assusta-se e, imediatamente, esconde-se, achando que o identificou. Mas o rapaz observou apenas o clarão do relâmpago e não se abalou; afinal era sempre assim naquela época do ano. Enrique não percebeu mais nada além do tempo chuvoso. Você, um tanto assustado, diz: - Ufa! Ainda bem que ele não pode me ver! - e sorri aliviado. Então se tranquiliza, porque tudo não passou de fruto da sua imaginação. Recomendação do Autor Se você é um leitor medroso, ou sofre de Síndrome do Pânico, não é recomendável ler as histórias que Enrique escreveu! A única maneira de sair da janela é fechando este livro agora! Mas, se deseja prosseguir, boa sorte! Espero que o leitor não se perturbe. Boa leitura! Emerson F. de Oliveira

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I

Então, como leitor curioso, que também parece não se incomodar com a forte chuva, quer saber o que Enrique escrevia. A imagem aproximou-se mais do papel escrito em tinta preta. Foi possível ver os pelos dos braços do rapaz e ouvir o ponteiro do relógio, preso à parede, marcando os segundos. Eram cinco para as três da manhã. A ponta da caneta deslizava sobre o papel. Lia-se a seguinte história:

Presságio Esta história que escrevo aconteceu comigo, no final da década de 80, no século XX, nesta residência, quando tinha 15 anos. Em um dos quartos, eu dormia em cima de um beliche; e meu terceiro irmão, o Sidney, dormia embaixo. Meu irmão mais velho, Wilson, estava adormecido no mesmo quarto, sobre outro beliche. O caçula, Fernando, dormia embaixo deste. Por volta das 3h, de um dia do mês de novembro, acordei com uma pessoa chamando-me. A voz vinha lá do portão. Era um conhecido da família, senhor Orestes. 13


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Com voz rouca, ele chamava, incessantemente, pelo meu nome: “Enrique, Enrique...”. O que estranhei foi perceber que minhas duas cadelinhas não latiram. Todas as vezes que alguém se apresentava no portão, elas agiam com ferocidade. Estaria eu sonhando, então? Meus irmãos e meus pais pareciam também não ouvir. A voz do velho continuava a me chamar. Fiquei pensativo... Por que estaria me chamando, naquela hora da madrugada? Eu não conseguia me aquietar; por mais que quisesse ignorar, não era possível. Assim, propus-me atendê-lo. Levantei com cuidado para não acordar os meninos. Abri devagarzinho a porta, sem fazer ruído. No corredor externo da casa, as cadelas continuaram dormindo. Achei novamente estranho, mas prossegui. Passei ao lado da janela fechada do quarto dos meus pais; pelo jeito, permaneciam adormecidos. Segui em direção ao quintal. Conforme me aproximava do portão, percebi que a voz cessara. Ao abrir, não havia ninguém. Senti-me confuso e envergonhado. Achei mesmo que estivesse sonhando. Então, tranquei o portão e decidi voltar para o quarto. Depois de três passos, já no retorno, a voz começou a me chamar novamente. Dessa vez, bem longe. Inquieto e com raiva, quis flagrar o conhecido que fazia, por certo, uma brincadeira de mau gosto. Ou estaria o senhor Orestes precisando de socorro? Não resisti. De novo, abri o portão, deixei-o um pouco encostado e segui pela rua de frente, indo em direção à voz já distante. Não havia ninguém passando na rua... Não era possível ver o senhor da voz rouca, mas 14


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apenas ouvir a voz. Acreditei que não sonhava, pois meu nome podia ser ouvido muito claramente. Conforme eu me aproximava, a voz diminuía. Ao chegar à esquina, percebi que a voz emudecera mais uma vez. Fiquei com raiva, irritado. Quando fiz menção de retornar para casa, voltou a chamar meu nome, da outra esquina, no outro quarteirão. Aquela voz distante e rouca parecia um magnetismo tentador! E não conseguia resistir. Continuei a seguindo, em passos largos. Não sentia medo; apenas queria descobrir o que o tal senhor desejava. Era de socorro que estava precisando? Eu estava preocupado. Contudo, ao chegar mais uma vez, a voz cessou! Esperei alguns segundos para saber se continuaria a me chamar. Não. A voz havia cessado. Voltei. Após eu ter dado três ou quatro passos em direção a casa, a maldita voz voltou a dizer meu nome, do quarteirão seguinte. Com raiva, saí correndo em direção a ela. Decidi descobrir, de uma vez por todas, o que o senhor desejava, ou por que ele brincava assim. Enquanto eu corria, a voz chamou por três vezes. Ao chegar à esquina, houve silêncio. De repente, a distância, no final da rua, avistei um terreno baldio e escuro. Nele, vi um grupo de cinco rapazes mal encarados. Todos fumavam. Um deles, eu reconheci, pois morava próximo de casa. De longe, eles avistaram-me, e um disse: - Olha lá! Ele viu a gente! Vamos apagá-lo, senão será capaz de nos delatar! Dois pegaram um punhal e vieram em minha direção. Eu estava com muito medo! Saí correndo, assustado e com raiva de mim mesmo, pelo fato de ter caído 15


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