Psicologia Jurídica e Psicanálise: Reflexões teóricas e práticas
ZENO GERMANO
Psicologia Jurídica e Psicanálise: Reflexões teóricas e práticas
São Paulo 2017
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Renato Gomez
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ ________________________________________________________________ G323p Germano, Zeno Psicologia jurídica e psicanálise: reflexões teóricas e práticas / Zeno Germano. - 1. ed. - São Paulo : Baraúna, 2016. ISBN: 978-85-437-0731-0 1. Direito - Aspectos psicológicos. 2. Psicologia forense - Brasil. I. Título. 16-38308
CDU: 340.6
________________________________________________________________ 01/12/2016 05/12/2016 Impresso no Brasil Printed in Brazil
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PREFÁCIO O Livro do Prof. Zeno Germano vem preencher uma lacuna teórica para a interface entre a Psicologia e a área jurídica, contribuindo ainda com apontamentos acerca da relação entre muitos constructos da Psicanálise com a Psicologia Jurídica. Portanto, a obra nos auxilia em duas áreas de suma importância, a Psicologia e a Psicanálise, para compreendermos as vicissitudes do cotidiano daqueles que militam cotidianamente para o fortalecimento das relações entre o universo da psicologia e o da esfera jurídica. Importante salientar o quanto a Psicologia Jurídica ainda é uma prática muita recente em nosso país com pouca produção teórica e de pesquisas nessa temática. Inclusive nos cursos de formação em Psicologia pouco ou quase nada se encontra no conjunto de disciplinas e dos conteúdos teóricos voltados para a consolidação do conhecimento nesse campo, nas diversas grades de integralização dos cursos de graduação em Psicologia. Normalmente estão existindo mais ações práticas do que reflexões teóricas e contribuições conceituais nesta área e, em decorrência, pouquíssima “práxis” envolvendo a teoria e a prática do Psicólogo. 5
Nesse sentido, a obra em tela do Prof. Zeno Germano, de forma corajosa, vem acrescentar aquilo que ainda falta e muito nesse encontro da Psicologia com o jurídico: ele nos brinda com reflexões teóricas amalgamadas com sua vivência prática neste campo tão singular para o trabalho do Psicólogo, articulando com habilidade e inteligência a indissociabilidade necessária entre aquilo que é fruto de sua prática docente e de seu legado teórico à pesquisa de autores clássicos e atuais, iluminando o “já conhecido” e também a prática cotidiana no campo da Psicologia Jurídica. Contudo, ratifico e insisto que além da já citada importância dessa obra por sua contribuição conceitual para a prática do Psicólogo Jurídico, outra marca fundamental da mesma é a explicitação das contribuições da Psicanálise para a compreensão das diversas ações e práticas do Psicólogo e da Psicologia Jurídica. Reitero que a singularidade desta obra do Prof. Zeno Germano está justamente nesta grande contribuição que os conceitos da teoria psicanalítica podem trazer para a compreensão do complexo universo da subjetividade humana. Uma das primeiras temáticas que ele trata é acerca da “verdade”, em que nos convoca a entender que devemos lidar de forma diferente com as verdades de cada sujeito, distinguindo ainda com precisão, que, na psicoterapia, a verdade é a realidade interna e que, de outra forma na Instituição, a verdade dependerá dos fatos oriundos da realidade externa conotando para o leitor que, na própria verdade, existe certa relatividade, como já nos ensinava Protágoras na Grécia antiga. 6
Dessa forma, nos alerta que, em especial na clínica psicanalítica de neuróticos, só existe a verdade que o sujeito diz não existindo qualquer necessidade de verificação da mesma, mas sim de uma escuta atenta do funcionamento psíquico de cada sujeito. Destaca também com habilidade, por outro lado, que na dinâmica de funcionamento predominantemente não neurótica é exigido do analista que o mesmo não se contente com a “verdade” do paciente como única questão a ser trabalhada, mas deve-se levar em consideração a realidade externa, ou seja, que deveremos considerar a necessidade de falar com familiares sobre alguns aspectos que envolvam o paciente como, por exemplo: medicações, internações, questões sociais ou de higiene. Em outro momento, ao fazer a discussão acerca da “neutralidade” do analista, nos esclarece que esta confundiu-se muito com uma subtração da espontaneidade do profissional, como se este não tivesse vida própria e nem o direito de viver plenamente a sua subjetividade de forma natural fora do setting psicanalítico para não comprometer o tratamento. A obra nos convoca a ter nessa temática uma postura intermediária que nos permita viver plenamente nossa vida pessoal nos diversos espaços fora do consultório, seja em atividades de lazer, artísticas ou familiares, em consonância com os ensinamentos de Aristóteles, que nos adverte que a verdade está no meio e não nos extremos. Fundamental também o esclarecimento do autor presente na temática dos documentos Psicológicos e 7
Psicossociais de que escrever um documento em conjunto com outro profissional por si só não é sinônimo de interdisciplinaridade, pois percebe em muitos deles, ainda que pese sua excelente qualidade, a escassez de conteúdos propriamente psicológicos e a supervalorização de aspectos sociais, bem como, da ausência das diretrizes do Conselho Federal de Psicologia. São muito importantes as considerações sobre o fracasso em mediação de conflitos, nas quais o autor diferencia entre o que é uma disputa e um conflito como condição básica para melhor se pensar a problemática do fracasso em mediação através de considerações psicanalíticas que envolvem este processo. Fundamentais ainda as contribuições referentes a se as pessoas envolvidas em uma mediação querem ou desejam esta empreitada, destacando para tanto, à luz da psicanálise, a diferença entre o querer e o desejo. Prossegue relatando que, no debate entre o acordo e a transformação, a proposta da mediação transformadora defende que o acordo não é o objetivo principal a ser alcançado e que mais importante é que haja a possibilidade de mudança na relação entre os envolvidos. Ademais, o autor nos alerta que o êxito ou fracasso de uma mediação estão intimamente conectados a capacidade que as pessoas têm de se manter em um nível racional de seu ego e que tenham a maturidade de reconhecer e separar os aspectos intersubjetivos envolvidos na disputa. No tocante à polêmica da necessidade ou não do Psicólogo jurídico realizar visitas externas para a pro8
dução de provas, o autor enfatiza que prefere pensar o psicólogo como aquele profissional que levantará questões novas, fruto de seu olhar e escuta diferenciadas, tendo como finalidade fazer o Juiz pensar as possibilidades envolvidas nos casos e não apenas atender a uma determinação, acrescentando que as práticas dessas visitas seriam muito mais adequadas a natureza do fazer dos Assistentes Sociais do que do profissional de Psicologia. Desta forma, por tudo isso e muitas outras contribuições não citadas face ao limite desse prefácio, esta obra do Prof. Zeno Germano constitui um diferencial singular na produção conceitual e teórica da Psicologia Jurídica e no encontro da mesma com o campo Psicanalítico, suprindo assim uma lacuna existente nas reflexões desse campo e tornando-se por isso uma leitura instigante, inteligente, formadora e essencial para os que militam nessa importante e emergente área da Psicologia. Parabéns ao Prof. Zeno Germano por esta contribuição para construção e consolidação da Psicologia no Brasil e, em especial, do campo da Psicologia Jurídica. PROF. DR. FRANCISCO ESTÁCIO NETO • Psicólogo • Coordenador do Curso de Psicologia da Universidade Federal Fluminense/ESR; • Membro do Conselho Universitário Superior da Universidade Federal Fluminense. 9
APRESENTAÇÃO. Este livro é fruto de minha vivência de mais de 15 anos enquanto psicólogo e docente de Psicologia. O que escrevo aqui mostra meu estilo de trabalhar e de pensar meu saber/fazer com Psicologia Jurídica e com a clínica psicanalítica. É também um retrato do quanto algumas questões me preocuparam e ainda me preocupam no campo psi. Muito do que está contido nas páginas deste livro foi e ainda é dito em minhas aulas. Meus alunos e quem convive profissionalmente comigo não irá estranhar alguns posicionamentos, pois já me ouviram dizer em sala ou no espaço profissional. Neste sentido, tenho clara consciência de que não se trata de um pensamento melhor ou pior, apenas mais um pensamento. E isto tem peso para mim, pois acredito que o psicólogo precisa pensar seu fazer e não apenas atuar. A ausência de reflexão em nossa prática é danosa e fomenta a ideia de um tecnicismo inócuo para nossa profissão. Nas próximas páginas, estarei passeando por questões da psicanálise e da psicologia jurídica, mas também das mediações de conflito familiares. As reflexões tentam mostrar como eu faço psicologia jurídica, clinica psicoterápica e mediação de conflito tendo o marco 11
teórico da Psicanálise como norte. Vocês perceberão que o livro, com exceção dos dois primeiros capítulos sobre mediação, não segue rigidamente as exigências acadêmicas de estrutura textual. É proposital. Apesar deste livro obviamente estar baseado nas normas da ABNT, me permiti rupturas nos textos, como a predominância da primeira pessoa do singular e a ausência de citações diretas em todos os textos. Inclusive, em alguns capítulos não faço nenhuma citação, privilegiando apenas minhas próprias considerações. Outro aspecto que penso importante salientar é que dentro desta proposta de ruptura com um texto excessivamente acadêmico, a maior parte dos capítulos está posta como uma associação livre de ideias, sem uma preocupação com referências cronológicas. Os capítulos poderiam estar separados, por exemplo, com os textos sobre psicanálise em uma primeira parte e os de psicologia jurídica em uma segunda parte, todavia não organizei a sequência assim de forma intencional. A sequência propositalmente misturada mantém uma ideia tanto da associação livre quanto de um caráter mais artístico no tratamento final dos textos. Quero que vocês leiam este livro sabendo que poderão abrir em qualquer página e ainda assim poderão usufruir da leitura. Penso que esta proposta aumenta o caráter artístico já citado e ajuda ainda mais na ruptura de uma lógica acadêmica. Ao mesmo tempo, esta minha postura no texto faz com que a leitura seja de fácil degustação. Quero ser o mais facilmente compreendido possível. Não in12
teressam aqui os termos técnicos em excesso. Desde o início quis que a leitura fosse fácil sem deixar de trazer a tona questões complexas do trabalho que faço. Acredito que estas complexidades estão nos textos. Em essência, este livro foi pensado basicamente para meus alunos de graduação e pós-graduação em psicologia, e principalmente para os que me seguem nos caminhos da psicanálise e da psicologia jurídica. É uma forma de tornar ainda mais concreto o sistema de pensamento que costumo transmitir em minhas aulas. Alguns agradecimentos são necessários. À meus alunos de graduação em psicologia do ILES ULBRA pelo desafio que me proporcionam em ter que seguir estudando para poder estar com eles, ao ILES ULBRA, na figura do diretor prof. Milcíades Alves de Almeida, à equipe psicossocial de apoio às Varas de Família do Tribunal de Justiça de Rondônia, na figura da colega psicóloga Sara Manente, às pessoas que eu atendi e atendo nas Varas de família e meus pacientes, suas angústias também me levaram a estudar mais e melhorar como profissional. Minha mãe Dona Júlia, meu pai Francisco Simões e meus filhos Tadzon, Nicolas, Larissa e Rebeca, por tudo que representam na minha vida mesmo não convivendo diariamente comigo. Também minha esposa Andreza, meu enteado Bruno e meu herdeiro mais novo, Athos Germano, que convivem comigo todo dia e que me fazem querer e tentar ser um homem melhor. Sobre minha esposa Andreza, alguns comentários especiais. Além de companheira de vida e mãe do 13
meu filho Athos, sua habilidade e competência como psicóloga me inspiram a ser melhor como profissional. Atuando como psicóloga jurídica junto a crianças em situação de acolhimento institucional, percebo nela um grau de envolvimento técnico e ético tão grande que escrevi quase todo este livro pensando no que ela acharia de cada página. Tanto que após ela ter lido, foi sua uma crítica que entendi perfeitamente. Para ela, os textos parecem incompletos ou deixam a impressão de que precisavam de maior desenvolvimento. Concordo. Esta incompletude é, por um lado, fruto de ausência de outras inspirações para escrever mais e, por outro lado, é também um sintoma do espírito de ruptura que já anunciei. Penso mesmo que minha prática é incompleta e quero que os textos demonstrem isso. Não me vejo com obrigação de parecer completo, apesar de saber que a completude que minha esposa reclama, ela não quer de mim, mas sim do texto. Também foram, tem sido e serão, assim espero, com Andreza, os maiores e melhores diálogos sobre psicologia que venho tendo ao longo destes anos. Ela me instiga, me incentiva e me possibilita refletir sobre minha prática, até mesmo quando fala apenas das experiências dela. Sobre estas vivências, acrescento que me ajudaram a elaborar melhor os questionamentos sobre o trabalho psicossocial, os relatórios e o pensamento de que psicologia jurídica não é apenas um campo restrito ao trabalho no Judiciário. Deixo claro que minha paixão por minha esposa se dá tanto para ela enquanto mulher quanto como psicóloga. Em bre14
ve, um livro com escritos nossos sobre psicologia jurídica deverá ganhar vida. Termino esta apresentação com um agradecimento sincero pelo prefácio do professor Francisco Estácio Neto da Universidade Federal Fluminense (UFF). Minhas lembranças de suas aulas ainda estão vivas em minha memória. Sinto-me privilegiado por sua disponibilidade ao diálogo e a postura de grande respeito profissional, que é mútuo. Porto Velho, agosto de 2016.
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