Nas asas da liberdade

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Copyright © Rogério Andrade Barbosa Capa e Projeto Gráfico Casa Rex Ilustração Rubens Matuck Editoração Eletrônica Casa Rex Coordenação Editorial Editora Biruta 3ª edição - 2011 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Barbosa, Rogério Andrade Nas asas da liberdade / Rogério Andrade Barbosa; [ilustração Rubens Matuck] – São Paulo: Biruta, 2006. ISBN 978-85-88159-53-2 1. Lendas - Literatura infantojuvenil 2. Literatura infantojuvenil I. Matuck, Rubens. II. Título

CDD028.5

06-1233 Índices para catálogo sistemático: 1. Lendas: Literatura infantil 2. Lendas: Literatura infantojuvenil

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Edição em conformidade com o novo acordo ortográfico da língua portuguesa. Todos os direitos desta edição reservados à Editora Biruta Ltda. Rua Coronel José Euzébio, 95 – Vila Casa 100-5 Higienópolis – CEP 01239-030 São Paulo – SP – Brasil Tel (011) 3081-5739 Fax (011) 3081-5741 E-mail: biruta@editorabiruta.com.br Site: www.editorabiruta.com.br A reprodução de qualquer parte desta obra é ilegal e configura uma apropriação indevida dos direitos intelectuais e patrimoniais do autor.




“Eu tenho um sonho...que um dia os filhos dos antigos escravizados e dos antigos escravocratas serão capazes de sentarem-se, juntos, fraternalmente.” (Trecho do discurso de Martin Luther King Jr., na manifestação efetuada no dia 28 de agosto de 1963, no Lincoln Memorial, em Washington.)



Esta lenda recontada de pais para filhos durante sucessivas gerações é uma das mais populares do folclore afro-americano. Em variadas versões, negros escravizados, inconformados com os maus-tratos, desapareciam sem deixar vestígios, sussurrando, uns para os outros, uma frase encantada que funcionava como um código secreto: “Vamos voar!” Durante o longo e turbulento período que passaram impedidos de acesso a qualquer tipo de direitos, inclusive o de aprender a ler e escrever, as histórias que circulavam entres os negros eram a única oportunidade que eles tinham para inventar um mundo para si mesmos. Deste modo, fortaleceram sua tradicional cultura oral, na qual podiam expressar seus sentimentos, dramas e esperanças. Séculos mais tarde, o laureado poeta negro Langston Hughes, em um poema intitulado “Liberdade”, revelou a dolorosa opressão e exclusão sofrida pelo seu povo: ...Algumas pessoas pensam que linchando um negro elas lincham a Liberdade. Mas a Liberdade levanta-se, ri em suas faces e, diz: Vocês nunca me matarão!


O conto de Rogério Andrade Barbosa nos oferece uma janela para a vida dos negros nos EUA e podemos constatar o quanto ela compartilha com a dos africanos em todas as Américas. A busca constante da liberdade é a tônica dessa experiência. Por isso uma estória da escravidão não se isola no tempo. Tem tudo a ver com as lutas de hoje; tudo a ver com a condição humana. Sou de Búfalo, estado de Nova York, fronteira com Canadá pelo rio Niágara. Nasci branca e só adulta soube de uma característica histórica de minha terra: era ponto principal da ferrovia clandestina que conduzia africanos escravizados à liberdade. Mais tarde foi berço do Movimento Niágara, precursor do pan-africanismo e do movimento dos direitos civis. O líder era W. E. B. Du Bois, intelectual e ativista negro que foi o mentor secular de Martin Luther King. Também custei a conhecer – e muitos ainda não conhecem – a existência das comunidades negras das ilhas do litoral do estado de Carolina do Sul que criaram e preservaram intactas sua própria língua e cultura. Aliás, a maioria branca do povo norte-americano desconhece grande parte da história de seu país por ser ligada à experiência de vida dos africanos. A ferrovia clandestina está no conto de Rogério, e essas comunidades negras também – no nome do velho que ainda sabe manipular a magia de sua tradição ancestral e, assim, conquistar a liberdade para seu povo. As comunidades Gullah lembram os quilombos da América do Sul e do Caribe, ampliando o campo da liberdade para além do espaço físico concreto. Ela está na herança cultural, afirmando e cultivando uma identidade própria que abre voo contra qualquer barreira. A palavra e o canto são as asas da liberdade. “Kumba ya” cantávamos nós enquanto marchávamos pelos direitos civis. Aposto que a frase seja descendente direta do “Kum buba yali tambe” que alça o voo dos Gullah no conto de Rogério. Elisa Larkin Nascimento Rio de Janeiro, 22 de dezembro de 2005 Elisa é Diretora do IPEAFRO (Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros). Mestre em Ciências Sociais e em Direito pela Universidade do Estado de Nova York. Professora-Doutora em Psicologia pela USP.


“À Rosa Parks, costureira negra, falecida aos 92 anos em 2005, que se recusou a ceder seu lugar a um branco num ônibus, no estado de Alabama, e que desencadeou o movimento liderado por Martin Luther King Jr., que mudou a história do racismo nos Estados Unidos.”



Na África, quando a memória era a dona do tempo, havia determinados povos que sabiam voar. Dotados de conhecimentos sobrenaturais, tinham asas da cor do ébano que, abertas, se distinguiam no azul do céu. Por isso, muitos deles conseguiram escapar da perseguição dos caçadores de escravos, esvoaçando como um bando de pássaros, acima dos boquiabertos tripulantes dos navios-negreiros. Mas, nem todos tiveram a mesma sorte. Alguns, antes que pudessem voar, foram capturados. Acorrentados em porões imundos, durantes dias e noites infindáveis, à medida que as embarcações se afastavam da costa africana, homens, mulheres e crianças aprisionados deixaram seus sortilégios para trás. Ao desembarcarem na América do Norte, os sobreviventes da brutal travessia foram, aos poucos, esquecendo a magia que os transformava em seres alados. Misturados a outros negros, trazidos à força de diferentes regiões do imenso continente africano, passavam despercebidos. Deste modo, ninguém podia descobrir quem sabia voar ou não.


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