Dona Magnólia Roxa texto e concepção Lia Zatz ilustrações Inácio Zatz
Copyright © Lia Zatz Ilustrações
Inácio Zatz Capa e Projeto Gráfico
Rex Design Revisão
Waltair Martão Coordenação Editorial
Editora Biruta 2º edição – 2011
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Zatz, Lia Dona Magnólia Roxa / texto e concepção Lia Zatz : ilustração Inácio Zatz. – São Paulo: Biruta, 2004. ISBN: 978-85-88159-29-7 1. Literatura infantojuvenil I. Zatz, Inácio. II. Título. 04-1218
CDD-028.5
Índices para catálogo sistemático: 1. Literatura infantil 028.5 2. Literatura infantojuvenil 028.5
Edição em conformidade com o acordo ortográfico da língua portuguesa. Todos os direitos desta edição reservados à Editora Biruta Ltda. Rua Coronel José Euzébio, 95 – Vila Casa 100-5 Higienópolis – CEP 01239-030 São Paulo – SP – Brasil Tel: (11) 3081-5739 fax: (11) 3081-5741 E-mail: biruta@editorabiruta.com.br Site: www.editorabiruta.com.br A reprodução de qualquer parte desta obra é ilegal e configura uma apropriação indevida dos direitos intelectuais e patrimoniais do autor.
Apresentação A série Ver-a-cidade tem como objetivo sensibilizar o leitor para as diversas leituras possíveis do texto, da ilustração e do mundo. É constituída por três livros que apresentam duas histórias cada um, colocadas em lados opostos. No livro Dona Magnólia Roxa / Ser ou não ser: eis a questão, o primeiro da série, as duas histórias apresentam exatamente as mesmas ilustrações, colocadas na mesma ordem, mas possuem narrativas muito diferentes. Dona Magnólia Roxa fala sobre uma senhora muito calma e distraída que vive em uma cidade bastante agitada. Por estar alheia a vários acontecimentos à sua volta e não se encaixar no ritmo que a vida urbana impõe, Dona Magnólia Roxa causa uma série de confusões, e deixa de provocar acidentes contando apenas com a sua sorte. Ser ou não ser: eis a questão é a história de um menino que se muda de uma paisagem seca no interior para a cidade, esperando encontrar água em abundância. Suas expectativas são frustradas a partir do momento em que passa a morar em um cortiço, onde a água é extremamente controlada. Sua situação o leva a se perguntar o que ele quer (e não quer) ser quando crescer, e se ele já tem uma identidade naquela cidade. As mesmas imagens usadas para ilustrar duas narrativas diferentes mostram que o mesmo cenário urbano pode ser palco para diversas histórias, além de instigarem o leitor a imaginar ainda outras possibilidades. Outros livros da série Em Tô com fome, o segundo livro da série, a autora conta as histórias de um menino pobre e de um menino rico. Os textos são idênticos, as ilustrações é que mostram as particularidades do contexto e das vivências de cada um deles. O que pode haver de tão semelhante na história de vida de um menino pobre e de um menino rico que permita à autora utilizar a mesma narrativa? Já em O cachecol, o terceiro livro da série, um mesmo acontecimento – a mudança de avó e neta de um sítio onde moravam para a cidade – é narrado de formas diferentes pelas duas personagens. O que sente e pensa a neta é muito diferente daquilo que a avó pensa e sente, revelando que cada pessoa vê, entende e vive as situações segundo sua própria história de vida.
Dona Magnólia Roxa é uma senhora muito
distraída. Isso, às vezes, lhe causa alguns problemas, o que, aliás, não tem a menor importância, pois ela nem percebe.
Certo dia, por exemplo, dona Magnólia Roxa
foi passear em seu carrinho conversível que já foi de sua avó, de sua mãe e agora é dela, mas está muito bem conservado. No caminho, encontrou seu amigo, o Dr. Robalo, e parou para bater papo. Dr. Robalo, todo contente, perguntou o que ela achava de seu novo visual.
— Um pouco escorregadio — disse dona
Magnólia Roxa. — Mas deve ser porque o tempo está um pouco molhado.
Dr. Robalo deu um sorriso amarelo e se
despediu muito ofendido. Afinal, escorregadio ele sempre fora. O que sua amiga não percebera é que ele havia raspado a barba que usara por mais de trinta anos.
Dona Magnólia Roxa continuou seu
passeio e decidiu dar uma paradinha na loja de sua prima, dona Xicrinha. Sua prima, no entanto, não estava e nem poderia estar já que dona Magnólia Roxa tinha entrado na loja errada.
O dono da loja, um senhor muito distinto,
depois de desistir de tentar explicar a dona Magnólia Roxa seu engano, resolveu contarlhe seus problemas. Sensibilizada, dona Magnólia Roxa ouvia com a atenção que conseguia ter até que o homem falou:
— E, além de tudo, fiquei sabendo hoje
que o aluguel da loja vai aumentar. Foi um balde de água fria na cabeça.
Dona Magnólia Roxa ficou indignada:
— Mas que absurdo! E ainda por cima
colocaram o balde torto. Deste jeito, quando o senhor andar, pode até derramar!
Dona Magnólia Roxa tentou ajeitar o
balde, consolou o dono da loja, disse que, infelizmente, não podia mais esperar dona Xicrinha, pediu que lhe transmitisse um recado e continuou seu passeio.
E por falar em Dr. Robalo, estava dona Magnólia Roxa entrando em casa depois deste dia de passeio calmo e prazeroso quando viu o próprio caminhando pela calçada. Dona Magnólia Roxa lembrou-se que há alguns dias seu amigo havia se queixado de que ela andava muito distraída. Apesar de não concordar nem um pouco com essa opinião, decidiu agradá-lo mostrando como estava atenta: — Puxa Dr. Robalo, que lindo terno! Hoje de manhã o senhor não estava assim tão bem vestido! O tal Dr. Robalo que era, na verdade, o irmão, Dr. Cação, agradeceu o elogio e aproveitou para entregar-lhe um pacote de folhetos de sua campanha para prefeito. Dona Magnólia Roxa entrou em casa toda contente, pois estava mesmo precisando de papel usado para fazer os bloquinhos de papel reciclado com os quais gostava de presentear suas amigas.
Vocês devem estar se perguntando se ela não devia voltar à casa do sobrinho para cantar parabéns. Pois é... ela simplesmente esqueceu.
Mar que eu ainda nunca vi, mas tenho pra mim que vou ver um dia...
E eu continuo sonhando com รกgua. Eu jรก crescido, indo trabalhar feliz, no azul do fundo do mar.
E então viemos embora pra cidade. Pra Mansão, um lugar onde tem água, tem sim, mas é uma água bem diferente do meu sonhar.
O açude é um tanque que nunca seca. E é
desse tanque-açude que a gente pega água: água de beber e de tomar banho, água de fazer café e comida, água de lavar roupa e chão.
Dos quatro banheiros que tem a Mansão,
nenhum tem uma gotinha de água sequer. Os canos tão tudo enferrujado, apodrecido, seco.
Eu continuo sonhando com água. Com um
jeito de não precisar mais carregar água escada acima, lata d’água na cabeça.
São três escadas até chegar no nosso canto
onde tem um beliche, uma cama, um fogão, uma mesa, duas cadeiras... Sim, e uma cortina, mó de separar dos cantos de outras famílias.
E nenhuma janela. Assim que no meu
sonhar de agora sempre aparece também um pedacinho de céu bem azul que eu posso olhar lá do nosso canto.
Antes a gente morava na roça. Faz muito tempo não. Eu era pequeno, lembro pouquinha coisa: de colher feijão e mandioca, de caçar preá com meu irmão, de festa de são Cosme e Damião. De pegar água no açude. Mas aí o açude secou. Secou de secar sequinho. E eu dei pra sonhar com água. Sonhar em ir m’embora daqui. Prum lugar onde tivesse água, muita água. Água que caísse do céu e subisse do mar. Água que caísse do mar e subisse do céu. Tanta água, que nunca faltasse peixe, nunca um barco encalhasse na lama. Tanta água, que até os animais teriam que andar de guarda-chuva. Chuááá... Eu acordava e minha cama tava toda molhada.
Ser ou não ser, eis a questão texto e concepção Lia Zatz ilustrações Inácio Zatz