Plano Escolar: caminho para a autonomia

Page 1

Akiko Oyafuso e Eny Maia

1



Plano Escolar: caminho para a autonomia



Akiko Oyafuso Eny Maia

Plano Escolar caminho para a autonomia

S達o Paulo, setembro de 2004


Copyright © Akiko Oyafuso e Eny Maia

Capa Rex Design Revisão Waltair Martão Editoração Eletrônica Oficina Editorial Coordenação Editorial Editora Biruta

4a Edição - 2004 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Oyafuso, Akiko Plano Escolar / Akiko Oyafuso, Eny Maia.– 4. ed. – São Paulo : Biruta, 2004.

ISBN 85–88159–26–0 1. Escolas - Administração e organização 2. Planejamento Escolar 1. Maia, Eny. II. Título.

04-1215

CDD-371.207 Índices para catálogo sistemático: 1. Plano Escolar : Administração escolar : Educação 371.207

Todos os direitos desta edição reservados à Editora Biruta Ltda Rua Coronel José Eusébio, 95 - Travessa Dona Paula, casa 120 Consolação CEP 01239-030 São Paulo - SP Brasil Tel (11) 3214-2428 Fax (11) 3258-0778 E-mail biruta@editorabiruta.com.br www.editorabiruta.com.br A reprodução de qualquer parte desta obra é ilegal, e configura apropriação indevida dos direitos intelectuais e patrimoniais do autor.


SUMÁRIO

Apresentação

7

Educação Brasileira: entre o passado e o futuro

15

A construção da identidade

19

Planejamento e Gestão: como transformar a rotina em desafio

23

A Elaboração do Plano Escolar – Tarefa coletiva

27

De volta para o futuro

31

O Trabalho Coletivo

35

Conhecer e interpretar – Caminho para a autonomia

39

O Desenvolvimento dos Alunos – A construção da identidade escolar

57


PLANO ESCOLAR: CAMINHO PARA A AUTONOMIA

A Construção de uma Nova Escola

75

Plano de Desenvolvimento da Escola

83

Projeto Pedagógico

93

Roteiros Possíveis

101

Avaliação do Plano Escolar e do Projeto Pedagógico – Avaliação da Política da Escola

113

Bibliografia

121


Akiko Oyafuso e Eny Maia

9

APRESENTAÇÃO

AOS NOSSOS COLEGAS DIRETORES, PROFESSORES E TÉCNICOS DE EDUCAÇÃO.

O livro “Plano Escolar: caminho para a autonomia”

está em sua 4ª edição. Entendemos que a receptividade desse material entre professores, dirigentes e técnicos se deva a algumas características que, na nova edição, permanecerão como eixos organizadores das idéias apresentadas para a reflexão e para a discussão. Decidimos atualizá-lo considerando a expansão na oferta de ensino do país e as profundas mudanças que decorrem das revoluções nas tecnologias de informação, comunicação e do modo de produção. Um dos eixos de organização do livro é a valorização de nossa experiência profissional que tomamos como ponto de partida. Reportamo-nos às experiências que vivenciamos em funções de direção e de coordenação, na administração de redes públicas de ensino e na atuação como professores e técnicos.


PLANO ESCOLAR: CAMINHO PARA A AUTONOMIA

O objetivo central do livro é orientar e ampliar o debate sobre o planejamento escolar e sobre a implementação de reformas educacionais, que se tornam efetivas quando, de fato, passam a integrar a política da escola. Ao propor estratégias de planejamento não podemos ignorar os obstáculos que estão presentes no contexto escolar e na sociedade. Se há consenso sobre o espaço privilegiado que a escola ocupa na democratização do acesso à cultura e ao conhecimento, então podemos questionar sobre as políticas educacionais que, de fato, privilegiam o desenvolvimento do trabalho das escolas. Isso porque, as teorias mais consistentes e as tecnologias mais modernas não oferecerão às escolas o poder de garantir a homogeneização das desigualdades sociais e econômicas presentes na sociedade. A “Sociedade do Conhecimento” não garante a priori a democratização do conhecimento. É necessário que haja mobilização política e social para que isso ocorra. A retórica sobre a centralidade da escola como “locus” da democratização não resiste ao “cenário de desintegração” que se caracteriza pela perda de sentido do papel, por currículos cada vez mais flexíveis e menos densos, pelo fim das avaliações, pelo conjunto de professores cada dia pior remunerados. “Tão mal remunerados que seus salários não são suficientes para cobrir as necessidades de moradia, transporte ou alimentação. Vão cada vez menos dias por semana às escolas. ... a preocupação dos professores pela própria sobrevivência limita suas possibilidades de se ocuparem da aprendizagem dos outros”*1 O “cenário de desintegração” presente também nas escolas públicas brasileiras tem sido apontado com freqüência


Akiko Oyafuso e Eny Maia

11

nos discursos dos formuladores de políticas públicas, de secretários, diretores, técnicos; mas a percepção, via de regra, é a de que os atores principais “estão em falta”. Por que faltam os professores à escola? Por que faltam os diretores? Por que as escolas não constroem a sua identidade, uma vez que têm autonomia para tanto? Por que não se consegue elaborar um projeto coletivo de escola? Por que os alunos não aprendem? Há décadas os estudos sobre o “estado da arte” da educação na América Latina apontam para a urgência em investir na formação, na remuneração e nas condições de carreira dos docentes e técnicos. No Brasil, cerca de 90% da população estuda em escolas públicas. A qualidade dessa escola deveria se colocar como a grande questão, prioridade das agendas sociais e políticas. Resistem, entretanto, ao cenário de desintegração, por absoluto empenho dos quadros dirigentes, docentes, técnicos e da comunidade, determinadas unidades escolares muitas vezes localizadas na periferia das cidades em contexto de violência, baixos salários e desemprego. Como conseguem superar tantos obstáculos e por que se empenham? É equivocado apontar um único fator para explicar o fenômeno, mas é possível afirmar que o compromisso profissional, a consciência da responsabilidade social, o prazer de realizar um trabalho bem sucedido e a convergência de valores e atitudes frente ao conhecimento e à sociedade contribuem para construir a identidade de escolas diferenciadas.*2 Por outro lado, a autonomia escolar não pode se confundir com o isolamento. Contextos marcados pela acelerada mudança tecnológica e social, nem sempre facilitam a socialização dos conhecimentos. É possível pensar, por exemplo,


PLANO ESCOLAR: CAMINHO PARA A AUTONOMIA

que se formem “guetos” de conhecimento aos quais a maioria, incluídos os profissionais da educação, não tenha acesso. Se a descentralização é desejada, os órgãos centrais e intermediários da administração passam a ter um papel mais complexo e exigente. Cabe assessorar e prover as escolas dos recursos necessários para garantir a aprendizagem dos alunos e, por conseguinte, a melhoria da qualidade da educação. O que vimos observando são duas situações opostas: a da descentralização-centralizada quando projetos são elaborados em nível central sem que haja discussão e participação dos atores escolares. Nesse caso, os professores são colocados na posição de coadjuvantes, embora deles se espere o desempenho de prin­ cipal protagonista. Estamos nos reportando a projetos que, quando muito, são apresentadas aos professores sem que se ofereçam as condições para que o estudem, repensem-no ou elaborem alternativas, adequadas a seu contexto. O projeto que deveria cumprir um papel de emulação, de estímulo à criação particular de cada unidade e de geração de conhecimento, em geral, não é sequer considerado pela escola. Por outro lado, é muito “atual” e conveniente que, em nome da autonomia dos professores e da escola, não se apresente qualquer projeto ou programa educacional, pois esses, deverão emergir da prática profissional orientadora das “decisões que dão certo”, como se a prática desenvolvida com bons resultados não estivesse apoiada em teorias que deveriam ser explicitadas. Neste contexto, colocar em discussão questões curriculares quase se torna uma “ofensa” aos méritos dos professores. Trabalha-se com o discurso fortemente carregado de cores políticas e ideológicas, dis-


Akiko Oyafuso e Eny Maia

13

tanciado dos problemas colocados pelo cotidiano escolar e que, portanto, gera mais ansiedade do que estímulo à ação. Convivem como em um processo esquizofrênico, a crise enfrentada pelos docentes em relação ao seu trabalho numa sociedade que se transforma e passa a exigir novas alternativas de ação, o compromisso profissional que revelam e a autonomia que se lhes quer atribuir como se um certo isolamento fosse o reconhecimento a tanto esforço. Enquanto nas escolas particulares sofisticam-se os trabalhos de assessoria aos docentes, estimula-se o aper­feiçoamento e a busca, em conjunto, de respostas mais adequadas aos desafios do momento; nas escolas públicas fala-se muito em trabalho cole­tivo e cada vez mais o professor não tem com quem dialogar. Em situação de implementação de políticas públicas procuramos manter o olhar sobre as escolas, uma vez presente em nossa memória a repercussão e o impacto de reformas educacionais sobre aqueles que atuam cotidianamente nas salas de aula do país. O percurso profissional nos permitiu ocupar diferentes espaços decisão: dos micros e dos macropoderes. Ambos complexos, considerando as relações de poder e a disputa em função de valores e expectativas nem sempre fáceis de identificar e, menos ainda, de administrar. No âmbito da escola, o modo de organização, as relações de poder, a dinâmica das relações profissionais, a relação com a comunidade e a força que daí deriva garantem a aceitação ou a rejeição de quaisquer propostas ou discursos, por mais inovadores que possam parecer aos formuladores. Quanto mais distante, se mostre do universo cultural do


PLANO ESCOLAR: CAMINHO PARA A AUTONOMIA

conjunto dos professores, os discursos político-pedagógicos e o conjunto de programas que se quer implementar, maior a possibilidade de que sejam ignorados. Por vezes se fazem, ao nível das escolas, simulacros de mudança para evitar as pressões e surgem alianças imprevisíveis entre os atores do processo, incluída a comunidade, sem que essa perceba o quanto está sendo prejudicada em tais negociações. É o que ocorre com freqüência em relação à proposta de promoção continuada, organização em ciclos ou seja lá a denominação que se dê à possibilidade dos alunos progredirem segundo seu próprio ritmo. Os pais são convencidos de que a promoção acarretaria prejuízo em relação ao desenvolvimento e à aprendizagem, como se a recíproca fosse verdadeira-a reprovação- garantisse o sucesso escolar posterior. Da mesma forma, a abordagem dos professores por meio de sucessivas reuniões em que predomina o discurso político em detrimento do foco nas políticas de escola não garante a adesão às idéias e tampouco transforma e/ ou qualifica a prática docente. A reação de afastamento por parte dos professores não deve ser compreendida como uma forma de resistência às mudanças, mas como comportamentos de defesa de uma competência acumulada e sistematicamente negada. Quando se criam as condições para que os professores discutam os trabalhos que desenvolvem e as dificuldades que enfrentam, lado a lado, com os especialistas evidencia-se o empenho e o interesse no aperfeiçoamento profissional. Os formuladores de políticas públicas precisam mais do que cuidar do “brilhantismo” das idéias, conquistar a adesão


Akiko Oyafuso e Eny Maia

15

e o convencimento dos professores, que só a negociação com os organizadores do projeto de escola é capaz de garantir. Por outro lado, precisam se aproximar, de fato, das escolas para saber de suas demandas e procurar, em conjunto, as respostas que não estão necessariamente dadas. Por esse motivo, colegas, destacamos a citação do professor Perrenoud, visto que a nossa experiência profissional permite dizer que não há fórmulas mágicas para garantir o sucesso dos alunos. Certamente dependerá do trabalho coletivo e do comprometimento da sociedade que ultrapassa os muros da escola e as ruas do bairro. “A luta contra o fracasso escolar não pode ser senão sistêmica, coletiva, organizada para o longo prazo e perseguida por décadas. Cada ministro, pesquisador, movimento pedagógico que acredita ter a solução atrasa o movimento. Eles reforçam o pensamento mágico, a ilusão de que se encontrou finalmente a pedra filosofal. Quantas reformas não foram jogadas fora antes de produzir seus resultados? Quantas pistas interessantes não foram abandonadas por não conduzirem imediatamente ao milagre? Nosso conceito de mudança permanece mágico, ou tudo ou nada, como se os saberes, as práticas, as instituições, pudessem mudar por decreto ou alguém tivesse a fórmula mágica”. (Perrenoud)*3


PLANO ESCOLAR: CAMINHO PARA A AUTONOMIA

NOTAS

*1. Ver o texto de Braslavsky. As políticas educativas ante a revolução tecnológica em um mundo de interdependências crescentes e parciais. Em Educação e Novas Tecnologias: esperança ou incerteza? Juan Carlos Tedesco (org.) *2. Ver Juan Carlos Tedesco. O novo pacto educativo. *3. Ver Perrenoud, Philippe Perrenoud. Construir as competências desde a escola. Artmed Editora. Porto Alegre, 1999.


Akiko Oyafuso e Eny Maia

17

EDUCAÇÃO BRASILEIRA: Entre o passado e o futuro “Porque eu sou do tamanho do que vejo E não do tamanho da minha altura”. (Fernando Pessoa)

Conhecer os dados gerais que caracterizam a educação

básica do país é importante quando se tem como objetivo contribuir para a melhoria da qualidade de aprendizagem e de vida da população. Mas, é insuficiente. Os números retratam um momento e indicam tendências, porém, devem ser interpretados e revisitados à luz das referências que temos principalmente sobre o contexto em que atuamos. Esses dados poderão ou não, iluminar a prática pedagógica, na medida em que formos mais ou menos capazes de perceber quais os projetos, programas e ações têm potencial para reverter o quadro de precariedades em que atuamos. Não se trata de dispor de um repertório infindável de teorias, mas de resgatar a prática docente e compreendê-la, colocar à prova a nossa capacidade de criação e a, de correr riscos apostando em novas experiências. Se a realidade global emergente modifica o cenário social,


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.