Diferença sexual e desconstrução da subjetividade em perspectiva

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Magda Guadalupe dos Santos

A paixão na cena de Eurípides Maria de Fátima Silva

Políticas de ação afirmativa, autoconceito e discriminação: uma discussão teórica

Este livro apresenta um conjunto de artigos de autoras distintas, integrantes de diversos centros de pesquisa do Brasil, Portugal e Argentina. O tema proposto, correlacionando “diferença sexual e desconstrução da subjetividade”, por ser bastante amplo, assenta-se na análise crítica e de várias angulações sobre o lugar que o gênero feminino ocupa nas questões filosófico-jurídicas e literárias da atualidade.

Maria José Viana Marinho de Mattos Karina Naia Claudiano

Del sexo binario a la diversidad de géneros: algunas contribuciones teóricas María Luisa Femenías

O assédio moral e o Segundo Sexo Mônica Sette Lopes Taísa Maria Macena Lima

A orientação sexual e a família: breves notas sobre interpretação evolutiva do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem

DIFERENÇA SEXUAL e desconstrução da subjetividade em perspectiva

Zamira de Assis ISBN 978-85-8425-190-2

9 788584 251902

ZAMIRA DE ASSIS MAGDA GUADALUPE DOS SANTOS

A família e sua regulamentação pelo legislativo brasileiro: o discurso parlamentar e as questões de gênero

A mulher sujeita ao impossível Carla Rodrigues

Beatrice Cenci: a bela parricida Daniela de Freitas Marques

A necessária superação da “propriedade na pessoa” como essencial para a efetivação da democracia na diversidade de gêneros Lia Maria Manso Siqueira Kelly Cristine Baião Sampaio

Revisitação do gênero, através da literatura: uma análise do lugar marginal da mulher a partir do conto Fugitiva, da escritora canadense Alice Munro Luciana Pereira Queiroz Pimenta Ferreira Bárbara Andreza Lopes Santos Carina de Freitas Queiroz Joice de Melo Silva

[ORGS.]

Susana Almeida

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DIFERENÇA SEXUAL e desconstrução da subjetividade em perspectiva

Teorias feministas e o Estatuto da Diversidade Sexual

Entrevista com

JUDITH BUTLER

A questão do gênero como categoria histórica de análise na busca da efetivação do Estado Democrático de Direito Lusia Ribeiro Pereira

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DIFERENÇA SEXUAL e desconstrução da subjetividade em perspectiva

[ORGS.]

ZAMIRA DE ASSIS MAGDA GUADALUPE DOS SANTOS Carla Rodrigues Daniela de Freitas Marques Kelly Cristine Baião Sampaio Lia Maria Manso Siqueira Luciana Pereira Queiroz Pimenta Ferreira Lusia Ribeiro Pereira Maria de Fátima Silva Maria José Viana Marinho de Mattos María Luisa Femenías Mônica Sette Lopes Susana Almeida Taísa Maria Macena Lima

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Copyright © 2016, D’ Plácido Editora. Copyright © 2016, Os Autores Editor Chefe

Plácido Arraes Produtor Editorial

Tales Leon de Marco

Editora D’Plácido Av. Brasil, 1843 , Savassi Belo Horizonte - MG Tel.: 3261 2801 CEP 30140-002

Capa

Letícia Robini (Sob ícones de Daniel Behrends para The Noun Project) Diagramação

Bárbara Rodrigues da Silva Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida, por quaisquer meios, sem a autorização prévia da D’Plácido Editora.

Catalogação na Publicação (CIP) Ficha catalográfica ASSIS, Zamira; SANTOS, Magda Guadalupe dos. [Orgs.] Diferença sexual e desconstrução da subjetividade em perspectiva-Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2016. Bibliografia ISBN: 978-85-8425-190-2 1. Ciências Sociais 2. Feminismo 3. Estudo de Gênero I. Título CDU304

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AGRADECIMENTOS

Esta obra coletiva, DIFERENÇA SEXUAL E DESCONSTRUÇÃO DA SUBJETIVIDADE EM PERSPECTIVA, congrega autoras de diferentes regiões do Brasil, assim também da Argentina, Estados Unidos da América e Portugal. Foi necessário o empenho de todas as pesquisadoras e professoras de centros acadêmicos de destaque, para que um trabalho a várias mãos pudesse se efetivar. Resguarda-se aqui a competência técnica e cognitiva de cada autora, assim como uma crença comum de que o universo acadêmico sempre será o lugar do diálogo e que, de várias perspectivas, questões de gênero e feminismos podem proceder a novas e constantes interlocuções. Nesta obra coletiva há de se registrar o agradecimento aos vários centros universitários, na figura de seus diretores e pro-reitores, que acreditaram em nosso projeto, e nos permitiram, com seu apoio, o uso da logomarca, do brasão específico de cada uma das universidades que aqui se fazem representar por suas autoras, professoras. Registramos nosso agradecimento especial à Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) que por meio da sua Pro-Reitoria de Pesquisa e Pós-graduação (PROPPG) e da Faculdade Mineira de Direito fomenta e acredita na pesquisa como promotora do conhecimento. Do mesmo modo Universidades e Centros Universitários de renome interno e internacional apoiaram essa publicação emprestando a sua logomarca. Nossos agradecimentos são tanto pela permissão do uso do brasão, quanto pela solidariedade e simpatia no cumprimento dessa árdua empreitada.

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Finalmente, nossos agradecimentos especiais à Professora Judith Butler (da Universidade de Berkeley, Califórnia, EUA), que gentilmente nos concedeu uma entrevista para compor a obra e permitiu que esta pudesse ser traduzida e publicada ao público em geral. Esperamos que a obra, que coliga intelectuais de distintas áreas do saber, possa ser recebida com entusiasmo por leitoras e leitores. Magda Guadalupe dos Santos e Zamira de Assis

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO

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Diálogos feministas e interdisciplinares Magda Guadalupe dos Santos Zamira de Assis

ENTREVISTA COM JUDITH BUTLER

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“Devemos estar felizes pelo sujeito do feminismo não estar definido” Carla Rodrigues Magda Guadalupe dos Santos

CAPÍTULO 1

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A mulher sujeita ao impossível Carla Rodrigues

CAPÍTULO 2

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Beatrice Cenci: a bela parricida Daniela de Freitas Marques

CAPÍTULO 3

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A necessária superação da “propriedade na pessoa” como essencial para a para a efetivação da democracia na diversidade de gêneros Lia Maria Manso Siqueira Kelly Cristine Baião Sampaio

CAPÍTULO 4

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Revisitação do gênero, através da literatura: uma análise do lugar marginal da mulher a partir do conto Fugitiva, da escritora canadense Alice Munro Luciana Pereira Queiroz Pimenta Ferreira Bárbara Andreza Lopes Santos Carina de Freitas Queiroz Joice de Melo Silva

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CAPÍTULO 5

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A questão do gênero como categoria histórica de análise na busca da efetivação do Estado Democrático de Direito Lusia Ribeiro Pereira

CAPÍTULO 6

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Teorias feministas e o Estatuto da Diversidade Sexual Magda Guadalupe dos Santos

CAPÍTULO 7

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A paixão na cena de Eurípides Maria de Fátima Silva

CAPÍTULO 8

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Políticas de ação afirmativa, autoconceito e discriminação: uma discussão teórica Maria José Viana Marinho de Mattos Karina Naia Claudiano

CAPÍTULO 9

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Del sexo binario a la diversidad de géneros: algunas contribuciones teóricas María Luisa Femenías

CAPÍTULO 10

187

O assédio moral e o Segundo Sexo Mônica Sette Lopes Taísa Maria Macena Lima

CAPÍTULO 11

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A orientação sexual e a família: breves notas sobre interpretação evolutiva do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem Susana Almeida

CAPÍTULO 12

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A família e sua regulamentação pelo legislativo brasileiro: o discurso parlamentar e as questões de gênero Zamira de Assis

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INTRODUÇÃO:

Diálogos feministas e interdisciplinares Magda Guadalupe dos Santos 1 Zamira de Assis2

Este livro apresenta um conjunto de artigos de autoras distintas, integrantes de diversos centros de pesquisa do Brasil, Portugal e Argentina. O tema proposto, correlacionando “diferença sexual e desconstrução da subjetividade”, por ser bastante amplo, assenta-se na análise crítica e de várias angulações sobre o lugar que o gênero feminino ocupa nas questões filosófico-jurídicas e literárias da atualidade. Não se trata de um conjunto de artigos assentados na defesa ou na crítica da diferença sexual ou na apologia ou crítica radical das teorias sobre a constituição ou fabricação do gênero. Os vários textos apontam, em bases epistemológicas distintas, o lugar crítico que o gênero feminino ocupa ao longo da história, seja ele construído, constituído, desconstruído ou refabricado em modelos histórico-culturais. Pela liberdade de entendimentos das diversas autoras que se juntaram no propósito comum de trazer diferentes elucidações às questões de gênero, não se pretende definir conceitos e princípios sob pautas normativas fixas e determinantes. Pelo contrário, o contraste entre as várias linhas de análises e pesquisas é o que realça a amplitude temática e que há muito se discute em larga escala. Como se sabe, tanto a teoria da diferença sexual quanto a teoria do gênero assumem dimensões epistemológicas em torno aos princípios da 1

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Professora doutora do Departamento de Filosofia e da Faculdade de Direito da PUC Minas. Integrante do Grupo de Pesquisas Interdisciplinares de GêneroGPFEM-PUC Minas Professora doutora da Faculdade Mineira de Direito da PUC Minas. Integrante do Grupo de Pesquisas Interdisciplinares de Gênero - GPFEM-PUC Minas e do Instituto de Investigação Científica Constituição & Processo. Advogada.

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igualdade e da diferença, cujas distintas angulações incidem em certa questão feminista fundamental: a da transformação social em busca de um mundo menos competitivo e menos violento entre mulheres e homens. Ambas as teorias visam um modo de pensar e de organizar a vida fora do impacto da sujeição em função da aplicação de categorias como sexo, gênero e sexualidade. Ao optarmos pelo título que toma a diferença sexual como centro das análises, não se visa opor saberes ou teorias, mas ampliar os quadros interpretativos sobre a questão do gênero.A teoria da diferença sexual, com origem nos anos de 1970, nas formulações de pesquisadoras como Luce Irigaray, Luisa Muraro e Rosi Braidotti, entre outras, todas de formação e origem europeia, concebem o gênero a partir de algumas posições explicitadas em O Segundo sexo, de Simone de Beauvoir, livro polêmico aparecido em 1949. Para as teóricas da diferença sexual, a mulher não é apenas o Outro, como escreve Beauvoir, mas, vista de uma perspectiva da sexualidade,“a mulher” tem sido registrada como o outro do Outro. Essa dimensão de alteridade ganha conotação restritiva numa ordenação masculina, colocando-se fora da ordem simbólica instituída pelo patriarcado. Levando em consideração a dimensão conceitual das teorias da diferença sexual, a especificidade desta obra, escrita a várias mãos, se assenta na consciência de não neutralidade diante da fabricação ou desconstrução do gênero. Os vários artigos que compõem este livro tomam o gênero como significado corpóreo, trabalhando em termos de linguagem corpórea, de posição sexualizada no mundo, sob o enfoque da noção de sujeito construído ou desconstruído ao longo de novas tematizações conceituais e registros históricos, jurídicos e políticos. Se, para a maioria das teóricas europeias da diferença sexual, ao tratar-se de um sujeito feminino não se pode desconsiderar o efeito da diferença sexual, sob o impacto da produção cultural tanto da feminilidade quanto da masculinidade, também a leitura desconstrutivista do gênero e da subjetividade, que ganha impacto na América do Norte- especialmente, com Judith Butler, e também na América do Sul, principalmente com María Luisa Femenías-, traz sua contribuição para as questões feministas, impedindo juízos muito generalizadores sob rotulações específicas. As diferentes autoras dos vários artigos aqui presentes não se fixam, contudo, em modelos específicos contemplados pelos paradigmas das teorias da diferença sexual ou da desconstrução do gênero, pois justamente investigam as complexas bases de assimetria entre o 10

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feminino e masculino, em domínios simbólicos nem sempre unitários. Suas análises se assentam em perspectivas históricas e ético-jurídicas, em diálogos com a Educação, a Literatura, a Psicanálise e a própria teoria da Desconstrução, ultrapassando, assim, a dimensão simbólica específica da diferença sexual, mas assimilando algumas de suas teses críticas, especialmente aquelas sobre o repúdio ao feminino, relegado historicamente a certa dimensão de radical alteridade. Nesse sentido, chega-se à desconstrução de uma simbologia unitária de um sujeito uno dos feminismos, estabelecido sob os paradigmas da heterossexualidade obrigatória e sob uma cultura do welfare state. Repensar assim as estruturas binárias de gênero, sexo, corporeidade e função social constitui também intento explícito em alguns dos artigos aqui presentes, em que se problematiza a distinção entre o simbólico e o normativo-social, como um conjunto de significados adquiridos e variáveis enquanto performativos na relação dinâmica com os esquemas da normatividade sexual, tal como alude Butler em Gender Trouble (1999), o que transparece na complexidade de tramitação nos tribunais, tanto em nível internacional, quanto em nível nacional no Brasil e em parte da América do Sul. Enfim, o que aqui se explora, de perspectivas distintas, é uma revisão dos limites formulados à representação e a transformações nas práticas sociais, sob o olhar de várias das teorias feministas e de diversas disciplinas que se voltam para o problema da submissão, do domínio, da falta de simetria, da heteronormatividade sobre o sexo, o gênero e a corporeidade, em suas projeções metodológicas. Logo como texto de abertura, temos a presença de Judith Butler (Universidade de Berkeley, Califórnia, EUA), numa entrevista a nós concedida. Butler aqui problematiza as bases da filosofia contemporânea, transitando entre Derrida e Foucault, entre a simbologia do luto e a representação da morte, assim como entre a imposição de normas e sua subversão, e, finalmente, entre performatividade e representação de gênero. A complexidade de seu pensamento bem nos permite repensar as possibilidades de novas subjetividades no contexto da atualidade, reaprendendo sempre “novas formulações” sobre o tema da normatividade, da sexualidade, e mesmo da realidade. Na retomada dos rastros principais dos vários textos, transitando pelo estudo da literatura, Daniela Freitas Marques (UFMG) aborda a tragédia eternizada pelos efeitos estéticos e os crimes brutais imputados a belas mulheres, de que se ocupa também Maria de Fátima Silva 11

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(Universidade de Coimbra), que relê as peças trágicas de Eurípedes da perspectiva da psicologia feminina, e ainda Luciana P. Queiroz Pimenta Ferreira (PUC Minas) e equipe, que investigam, as múltiplas faces da violência contra a mulher sob a ótica da relação entre literatura e direito. Do ponto de vista das teorias da Educação, Lusia Ribeiro Pereira (PUC Minas) examina a questão do gênero enquanto categoria histórica de análise na busca de efetivação do Estado Democrático de Direito e o relevo de tais questões após a promulgação da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha). De forma análoga, Kelly C. Baião (UFJF) e Lia M. Siqueira (UFJF) estudam, pela ótica lukacsiana, os padrões de opressão androcêntrica no sistema capitalista, contestando os dogmas consensuais democráticos. De forma correlata, Maria José Viana Marinho de Mattos (PUC Minas) e Karina N. Claudiano (PUC Minas) desenvolvem uma análise das ações afirmativas e de autoconceito, desde a sua implementação na legislação brasileira. Mônica Sette Lopes (UFMG) e Taísa M. Macena Lima (PUC Minas) investigam o percurso da pesquisa jurídica acerca do assédio moral e a condição feminina, sob a ótica crítica aos essencialismos culturais que desqualificam a mulher como um segundo sexo. Susana Almeida (IP Leiria, Portugal) realiza uma incursão acerca da tutela da homossexualidade e suas representações no âmbito familiar, no contexto jurisprudencial do Tribunal Europeu de Direitos Humanos. Zamira de Assis (PUC Minas) expõe o modo como o parlamento brasileiro trata as questões de gênero, por meio da análise do discurso manifesto em algumas das proposições legislativas, assim como nos debates e pareceres de projetos de leis sobre questões relacionadas à “família”. María Luisa Femenías (UNLP-UBA, Argentina) investiga os estereótipos duais acerca da inferioridade e superioridade que, historicamente, têm segregado mulheres e homens, examinando a complexidade histórica de representação do paradigma masculino como norma e do feminino como desvio, e tenta fazer dialogar novas propostas de abertura do espaço de interseção ético-política. Carla Rodrigues (PPGF-IFCS/UFRJ) discute a crise de representação articulada com a questão do sujeito, o qual ocupa o centro do pensamento filosófico tanto pela sustentação de sua necessidade como categoria, quanto pelo questionamento de sua pretensão de expressão unitária, servindo-se das teorias da Desconstrução, da Psicanálise e das teorias feministas. Magda Guadalupe dos Santos (PUC Minas) busca estabelecer uma analogia entre teorias feministas e a proposta do Estatuto da Diversidade Sexual, 12

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ainda na situação de pré-projeto político-jurídico no Brasil, analisando certos traços metodológicos das teorias feministas e a (in)validade da constituição de um sujeito supostamente universal e abstrato, que ainda prevalece na história da filosofia e do direito. Da perspectiva do gênero e das teorias da diferença sexual, este livro pretende oferecer ao leitor propostas de retomadas e releituras do nosso tempo, para além dos modelos da heteronormatividade determinante de condutas e modos de ser e de dever-ser. Belo Horizonte, novembro de 2015.

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“DEVEMOS ESTAR FELIZES PELO SUJEITO DO FEMINISMO NÃO ESTAR DEFINIDO” Entrevista com Judith Butler1

Carla Rodrigues2 Magda Guadalupe dos Santos3

É crescente no Brasil o interesse pela obra da filósofa Judith Butler, cuja trajetória feminista se confunde com o percurso de uma pensadora política que amplia os problemas de gênero para as questões de desigualdade que atravessam as relações de poder. Entre homens e mulheres, mas também entre países, entre Estado e cidadãos, entre saberes e mesmo dentro dos movimentos feministas, questão que ela enfrenta a partir da ideia de manter a heterogeneidade a fim de não reproduzir novas formas imperialistas. Nesta entrevista, Butler fala da importância de autores como Michel Foucault e Jacques Derrida na sua 1

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Judith Butler é professora no Departamento de Retórica e de Literatura Comparada e Coeditora do Programa de Teoria Crítica na Universidade de Berkeley, Califórnia, EUA. É autora de várias obras, como Gender Trouble (1990), Bodies that Matter (1993), Precarius Life (2004), Frames of War (2009), Senses of the Subject (2015), tendo sido condecorada, pelo conjunto de sua obra, em 2012, com o Theodor-W.-Adorno-Preis, especialmente por suas contribuições às questões de gênero, sexualidade, teoria crítica, moral e filosofia. Carla Rodrigues é professora do Departamento de Filosofia da UFRJ (PPGF/ IFCS/UFRJ), doutora e mestre em Filosofia (PUC-Rio), realizou pesquisa de pós-doutorado (IEL/Unicamp) como bolsista PDJ/CNPq. É coordenadora do laboratório Escritas - filosofia, gênero e psicanálise (UFRJ/CNPq). É autora, entre outros, de “Coreografias do feminino” (Ed. Mulheres, 2009) e “Duas palavras para o feminino – hospitalidade e responsabilidade, sobre ética e política em Derrida” (NAU Editora/Faperj, 2013). Magda Guadalupe dos Santos é Professora do Departamento de Filosofia e da Faculdade Mineira de Direito na PUC Minas. É mestre em Filosofia e doutora em Direito, ambos os títulos pela UFMG. É pesquisadora de questões de gênero e teorias feministas, com publicações na área. Integrante do Grupo de Pesquisas Interdisciplinares Feministas (GPFEM-PUC Minas).

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obra – principalmente no que diz respeito ao tema da performatividade de gênero – e nos oferece a chance de pensar em feminismos que se constituam a partir de bases dialógicas, assim como Butler reconhece estar fazendo em seu trabalho. Esta entrevista nos foi concedida em dois momentos distintos.As quatro últimas questões são de 2013 e as duas primeiras de outubro de 2015, justamente para a edição deste livro. Gentilmente e sempre com grande presteza, Butler nos permitiu juntar as duas entrevistas em uma tradução em português a ser publicada no presente livro. Nossos agradecimentos à Professora e filósofa Judith Butler, pela sua constante cordialidade. Pergunta: O que você pensa atualmente sobre as várias correntes feministas que dialogam entre si em bases pouco homogêneas? Judith Butler: É importante que a solidariedade feminista aceite a heterogeneidade de circunstâncias e contextos culturais, de diferenças linguísticas e geopolíticas. Caso contrário, a solidariedade se tornaria um esforço para impor uma única norma cultural a todos, e isto é imperialismo cultural. Para o feminismo não reproduzir a dinâmica do imperialismo no interior de seu próprio movimento, deve se engajar no processo de tradução cultural, o que significa estar aberto à constatação de que uma estrutura é desafiada e rearticulada por outra. Isso também ajuda a saber a que nos opomos e a reconhecer que a forma como identificamos e combatemos a violência, a desigualdade e a injustiça, deve estar aberta a discussão, a fim de forjar formas de solidariedade com base em um esforço genuíno para alcançar e oferecer reconhecimento. Pergunta: Tal como ocorre nas ciências duras, é a tensão a força motriz fundamental que nos leva a mudar e seguir em frente? A tensão é também importante condição para a persuasão retórica? Judith Butler: Não sei se podemos falar sobre tensão em abstrato. Mas se aceitarmos que somos parcialmente formados por relações de poder, e que também nos opomos a certas constelações de poder, então estamos num beco sem saída.Temos que descobrir a diferença entre o poder pelo qual agimos e os poderes a que nos opomos. Essa é uma tensão, se não uma forma de ambivalência. Talvez a retórica entre assim em cena: nós 16

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procuramos persuadir os outros de nossos pontos de vista, mas não temos nenhuma maneira de saber com antecedência se eles vão concordar, ou se vão tomar as nossas condições de ser algo diferente do que pretendíamos. Portanto, há um risco, uma aposta, em toda persuasão.Você pode dizer que esta é uma tensão que é pressuposta na própria cena de interpelação. Pergunta: Logo após a morte de Jacques Derrida, em 2004, você publicou na London Review of Books um ensaio dedicado a ele. É um belo texto, que reconhece as qualidades de um grande filósofo, e que torna evidente para nós algo que você e Derrida sabiam como demonstrar muito bem nas obras que ambos publicaram: a possibilidade de estabelecer uma linha de pensamento em dimensões dialógicas. Você e Derrida sustentaram um diálogo textual a partir de perspectivas distintas, seja em termos conceituais e em linguagens performativas, seja em termos histórico-discursivos, apontando traços filosóficos importantes nos diversos nomes que permeiam a história da nossa cultura filosófica e estabelecendo, através deles, distâncias e aproximações. Um bom exemplo dessa sua preocupação dialógica se encontra no prefácio e introdução de alguns de seus livros, tais como Subjects of Desire4 e Gender Trouble5. Especialmente nesse ensaio de 2004, publicado na London Review of Books, você escreve que Derrida nos ajuda a ler a partir de novas perspectivas. Nessa noção de “leitura”, se inscreve a nossa habilidade de compreender, a qual “depende de nossa capacidade de interpretar sinais”. Você conclui, no entanto, por meio de uma interpretação de Derrida, que não podemos acreditar que a linguagem sempre confunde as nossas intenções, mas apenas que as nossas intenções “não governam totalmente tudo o BUTLER, J. Subjects of Desire. Hegelian Reflections in Twentieth-Century France. New York: Columbia University Press, (1987) 1999. 5 BUTLER, J. Gender Trouble: Feminism and the Subversion of Identity. New York: Routledge, (1990) 1999; Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. 8. Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015. 4

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Magda Guadalupe dos Santos

A paixão na cena de Eurípides Maria de Fátima Silva

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Este livro apresenta um conjunto de artigos de autoras distintas, integrantes de diversos centros de pesquisa do Brasil, Portugal e Argentina. O tema proposto, correlacionando “diferença sexual e desconstrução da subjetividade”, por ser bastante amplo, assenta-se na análise crítica e de várias angulações sobre o lugar que o gênero feminino ocupa nas questões filosófico-jurídicas e literárias da atualidade.

Maria José Viana Marinho de Mattos Karina Naia Claudiano

Del sexo binario a la diversidad de géneros: algunas contribuciones teóricas María Luisa Femenías

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A orientação sexual e a família: breves notas sobre interpretação evolutiva do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem

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9 788584 251902

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A família e sua regulamentação pelo legislativo brasileiro: o discurso parlamentar e as questões de gênero

A mulher sujeita ao impossível Carla Rodrigues

Beatrice Cenci: a bela parricida Daniela de Freitas Marques

A necessária superação da “propriedade na pessoa” como essencial para a efetivação da democracia na diversidade de gêneros Lia Maria Manso Siqueira Kelly Cristine Baião Sampaio

Revisitação do gênero, através da literatura: uma análise do lugar marginal da mulher a partir do conto Fugitiva, da escritora canadense Alice Munro Luciana Pereira Queiroz Pimenta Ferreira Bárbara Andreza Lopes Santos Carina de Freitas Queiroz Joice de Melo Silva

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Susana Almeida

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DIFERENÇA SEXUAL e desconstrução da subjetividade em perspectiva

Teorias feministas e o Estatuto da Diversidade Sexual

Entrevista com

JUDITH BUTLER

A questão do gênero como categoria histórica de análise na busca da efetivação do Estado Democrático de Direito Lusia Ribeiro Pereira

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