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CLÁUDIO EMANUEL Abdala

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CONTOS

CONTOS

O Diamante De Huparu

O verde florescia abundantemente. Árvores de to das as espécies produzindo frutos a mancheias. Rios caudalosos que despencavam em cascatas e cachoei‑ ras de tirar o fôlego. Animais que pululavam de todas as partes. Era a fauna e a flora que se confraterniza vam numa harmonia jamais pensada pelo mais oti‑ mista dos biólogos.

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Em verdade, aquela floresta era um verdadeiro Éden não descoberto pelos ditos civilizados. Entre‑ tanto, o homem estava presente na figura simples do índio que se harmonizava perfeitamente com a mãe Natureza. Banho nos rios, pesca apenas para o neces‑ sário de cada dia, sem ambição material, sem cobiça, sem egoísmo; tudo era dividido com todos.

Respeito à natureza, respeito aos idosos, respeito à vida.

Naquela tarde Huparu, índio ainda adolescente, ha‑ via saído para caçar e numa gruta muito úmida encon trou a grande pedra. Era um diamante lindo, extrema‑ mente puro e valioso, do tamanho da mão fechada de Huparu. O índio ficou muito feliz, não pelo valor da pe‑ dra, pois não sabia o que era diamante, mas pela beleza cintilante quando refletia a luz do sol. Imediatamente, fez um lindo colar, sendo admirado por toda a tribo.

O tempo passou, Huparu se tornou o grande chefe e sábio da tribo. Seus conselhos evitaram várias guer ras entre as tribos da região, e todos viam nele, agora já maduro, um grande líder.

Um dia, uma frota de grandes navios é vista no horizonte. Era o homem branco com a ilusória ne cessidade de conquistas sobre os outros homens, tornando‑se lobos uns dos outros. Aportou distribuin‑ do presentes para conquistar a confiança dos nativos, o que conseguiu.

No dia seguinte, Huparu estava sentado à beira do rio, quando Jonas, o capitão, se aproximou e disse:

— Lindo colar que você usa, grande chefe!

— Encontrei há muito tempo quando ainda era bem jovem. Ele reflete a luz do Pai Sol – respondeu o índio convicto.

— Da terra de onde vim, esta pedra tem grande va‑ lor, os homens matam e morrem por ela – falou Jonas com os olhos a brilhar.

— E o que vocês fazem com ela? – inquiriu Hupa ru interessado.

— Nós a burilamos e transformamos em belíssi‑ mas joias. Vendemos, ganhamos muito dinheiro e compramos muitas coisas!

— E para que ganhar muito dinheiro?

— Eu já disse chefe; para comprar muitas coisas.

— E para que comprar muitas coisas? – voltou a perguntar o índio.

— Ora – respondeu Jonas sem jeito – para ter status!

— E o que é status?

— Bem! Status é... Quer dizer... Como posso te explicar... É uma forma das pessoas respeitarem as outras. É isso, o status faz com que as pessoas se‑ jam respeitadas.

O chefe da tribo pensou... pensou... e argumentou:

— Aqui na tribo, as pessoas são respeitadas pelo que são, pelo que fazem, pela coragem, pela sabedo‑ ria, pela idade e pelos bons conselhos – depois de al guns segundos continuou – diante da Mãe Natureza não é preciso guardar e acumular coisas. Andamos sem roupas como essas de vocês, isso porque nasce‑ mos sem roupas e não vamos precisar delas depois de mortos. Quando pescamos e caçamos é para o alimen‑ to do dia, a gente sabe que amanhã a floresta dá mais.

Meio desconcertado e ao mesmo tempo tentando afastar do pensamento as reflexões profundas que os conceitos de Huparu estimulavam, propôs: perguntou Jonas um pouco agastado.

— Chefe, você trocaria comigo esse diamante por esta lanterna?

— Para que serve lanterna?

— Para iluminar a noite.

— Mas nós já temos a lua.

— E na noite sem lua?

— Temos as estrelas.

— E quando o céu estiver encoberto de nuvens?

— Está bem homem branco – disse Huparu com ar de compreensão – tome a pedra do seu status e seja feliz com ela, como eu irei continuar feliz sem ela.

E Jonas, o homem branco, voltou para a chamada civilização, vendeu o diamante, comprou os seus bens e continuou em busca do ilusório status.

E na floresta, à beira do rio, numa linda noite, Hu‑ paru olhava o céu atapetado de estrelas e, lembrando do homem branco, pensou consigo:

— O homem busca o diamante da terra que muitas vezes traz tanta dor e se esquece de olhar para o céu que durante a noite está repleto de verdadeiros dia mantes colados no teto celeste. O homem se torna tão pobre, sem perceber que é tão rico.

A Escolha

O Dr. Ângelo Diniz era um juiz de direito muito conceituado na cidade onde residia. Homem enérgi‑ co, disciplinado e dono de um coração justo e bondo‑ so. Julgava de forma imparcial, sempre buscando o bem que pode atenuar o mal. Dedicado pai de família, dignificava a missão de esposo e pai. Por todos era querido e respeitado.

Em determinada noite, o dr. Ângelo retornava ao seu lar depois de um dia exaustivo de trabalho. Ao se aproximar da garagem, observa um vulto na escuridão da noite, e antes de qualquer reação, um jovem de mais ou menos dezessete anos já estava no banco do carona com um punhal encostado no seu pescoço. O jovem estava muito agitado, de tal forma que o punhal já estava a ferir o homem da justiça. O rapaz pede para ele dirigir o automóvel para longe da residência.

Durante o percurso, o juiz faz uma proposta que desconcerta o jovem:

— Eu vou te dar algumas opções para você esco lher uma.

— Coroa – disse o jovem agressivo – não estou dis‑ posto à conversa, eu acho melhor o senhor ficar calado.

— Escute‑me e sua vida poderá tomar outro rumo!

— Vá, fale, mas se for algum truque, eu te cor‑ to todinho!

— Eu vou te dar as opções: primeira, me deixar e fugir; segunda, me roubar e fugir; terceira, me roubar, me matar, tornando‑se um assassino e fugir; e a quar‑ ta, baixar o punhal, jogá‑lo fora e se dar uma nova chance me ouvindo.

O juiz falava com tamanha ternura, em um tom paternal que o jovem empalideceu e tremeu em suas bases.

— O senhor quer me enganar, como todos. Quem se importa?

— Eu me importo.

— A pobreza me levou a esta situação.

— Isto não é totalmente verdade – afirmou dr. Ân‑ gelo convicto – por favor, deixe‑me encostar o carro, vamos conversar um pouco.

O juiz estacionou o veículo e, magnetizado pela força moral, como um animal acuado e amedrontado, o jovem ficou na expectativa.

— Vou contar uma história para você – disse o se‑ nhor, afável. – Em determinada favela, vivia um me‑ nino de oito anos de idade. Ele não conheceu o pai, não sabia quem era, nem a sua mãe sabia. Vivendo num barraco em condições muito precárias, muitos dias passando fome, era forçado a dormir embaixo da cama, e, nem sempre conseguia dormir, pois sua mãe recebia os “clientes”; ela vendia o próprio corpo para sobreviver e criá‑lo. Um dia, um traficante, vendo o menino chorando, lhe ofereceu um revólver e disse:

— Vá ganhar a vida!

— E o que o menino fez? – perguntou o rapaz, já em outro clima mental.

— Recusou. Depois de alguns dias, o mesmo traficante ofereceu ao garoto a possibilidade de ser “aviãozinho”, ou seja, trabalhar entregando as drogas aos compradores. E o menino recusou mais uma vez.

Durante a noite, o garoto subia no telhado do bar raco e, ficava olhando as estrelas e sonhando em cres cer, estudar, se formar e trabalhar. Ficava olhando as casas e os edifícios lá debaixo, com o desejo de um dia descer do morro. Pensava em ajudar a mãe a deixar “aquela vida”, e dizia: – um dia vou ser doutor!

— Ele conseguiu? – perguntou o jovem infrator. –Ele virou doutor? Ajudou a mãe? Desceu do morro?

— Sim, meu filho – falou emocionado – é ele quem está falando com você. Eu sou o menino pobre, que venceu na vida, não porque virou doutor e sim, por que não se deixou corromper. A pobreza pode favore cer o desenvolvimento da criminalidade tornando‑se um campo fértil, àqueles que já trazem a predisposi‑ ção no próprio caráter. Existem ricos instruídos nas melhores escolas, não sabem o que é fome, nunca subiram em um morro e, são criminosos, marginais astutos e perversos. Quantos estão travestidos em ho‑ mens de bem, políticos, com nível universitário, que não passam de lobos em pele de cordeiros?

Você, meu filho, não se tornou assim porque é po‑ bre. Na verdade, mesmo sem saber a sua história, sin‑ to em você, alguém pedindo socorro. E aí! Você já fez a sua escolha?

O jovem, em prantos, jogou o punhal pela ja‑ nela e abraçou o juiz, que retribuiu o forte abraço, olhando a alvorada que surgia convidando para um novo começo.

Uma semana depois, o jovem estava assumindo o trabalho de mensageiro interno, no gabinete do juiz, no fórum da cidade.

Suic Dio

Era uma noite fria de outono, as nuvens borras cosas encobriam a lua e as estrelas, uma chuva fina molhava as calçadas da cidade. O vento soprava, em seu cantar solitário, levando consigo algumas folhas arrancadas bruscamente dos galhos das árvores que se curvavam vencidos pelo seu ímpeto.

Sobre a ponte das Torres, que une ambas as margens do Tâmisa, em Londres, uma mulher de olhar triste e angustiado pensava nos dissabores da própria existência. Nascera, e, em dois anos, havia perdido os pais em um naufrágio. Fora levada para um orfanato onde vivera sem a experiência de um verdadeiro lar. Quando se tornou maior de idade, trabalhou duro em uma taberna, onde teve a opor tunidade de encontrar o grande amor de sua vida. Casou ‑se, e, durante dez anos, viveu um paraíso com o esposo e os dois filhos. Entretanto, mais uma vez, as águas que se transformaram em abundantes lágrimas, levaram em suas correntes caudalosas, a felicidade. Em outro naufrágio, ela perdeu o esposo e os filhos.

Naquela noite, ela estava como que hipnotizada, olhando as águas do Tâmisa, e em sua tela mental, como imagens cinematográficas se descortinava a sua vida, a sua desdita, a sua profunda dor, e pensava so‑ litária: – Como continuar vivendo? Como ser feliz, se tudo me foi roubado pela própria vida? Que destino cruel, ter meus amados pais, esposo e filhos tragados pelas águas caudalosas? Não, não desejo mais viver. Terminarei a minha triste história como aqueles que foram a razão do meu viver. Se eles não mais existem, também eu mergulharei nas profundezas do nada.

— Quem disse que eles não mais existem? – a voz do inesperado homem assustou Carmem – a morte não é o final da história.

— Quem é o senhor?

— Alguém que já viveu bastante para entender os meandros da vida. Meu nome é Charles Bermann. Minha querida, a existência é uma longa jornada de aprendizado. Entretanto, quando comparada com a eternidade não chega a um minuto. Eu imagino a dor que te dilacera o coração, mas buscar a solução no sui‑ cídio é uma ilusão.

— Mas como eu vou conseguir continuar vivendo com uma dor tão profunda? – interrompeu a mulher. Como superar, se o jardim do meu coração se trans‑ formou em um deserto sombrio?

— Filha, posso chamá‑la assim, pois tenho idade para ser seu pai. O sofrimento, quando inevitável e aceito com resignação, pode, verdadeiramente, abrir úlceras profundas na alma. Entretanto, depois que o tempo as cicatrizam, transformam‑se em fonte de luz para o Espírito.

— Eu não consigo – disse Carmem, em prantos –não vejo luz, não tenho perspectivas, minha única saí da é a morte.

— Saída não – afirmou Charles – entrada, sim! En‑ trada em uma dor que nem a imaginação mais fértil é capaz de vislumbrar.

— Mas, como? O senhor está me deixando confusa.

— Filha, observe o céu agora. – falou inspirado – O que você consegue ver?

— Nuvens escuras anunciando tempestade.

— É verdade, porém as nuvens são passageiras, o que é permanente está atrás, ou melhor, acima das nu‑ vens. E nessa noite que anuncia chuva, o que há acima das nuvens? – perguntou sorrindo.

— As estrelas – respondeu a mulher, não perce‑ bendo que já estava mais tranquila.

— As estrelas e a lua – completou Charles – e, ama‑ nhã pela manhã o sol. Entretanto, as estrelas continua‑ rão, mesmo sem serem vistas pelos nossos olhos huma nos. Entendeu?

— O senhor está falando de vida depois da morte?

— Sim, minha querida! Vida sempre! Vida abun‑ dante, exuberante! De que adiantariam os amores se a morte fosse realmente aniquiladora? Tudo perderia o sentido. O homem sempre perguntou: – Quem sou? De onde vim? Para onde vou? Entretanto, nunca abriu verdadeiramente o coração para ouvir as respostas.

— Não sei por que, mas ouvindo o senhor, sinto o meu coração mais leve, menos dolorido. Então o que devo fazer?

— Você experimentou a orfandade, e sabe as dores que a falta dos pais proporcionam, mas também foi mãe e já experimentou esse amor que tudo renuncia, tudo sacrifica pela felicidade dos filhos. Então, minha querida, deixe esse amor represado em seu coração banhar tantos órfãos dessa cidade. Agora, vai para sua casa e pensa, pensa em nossa conversa. Vida, mi‑ nha filha, sempre vida. Adeus.

Ao ouvir a despedida, Carmem como uma criança, atirou‑se nos braços de Charles e osculou‑lhe as mãos.

Alguns dias se passaram, Carmem havia expulsa‑ do o pensamento do suicídio da sua mente, e, depois de pensar muito resolveu procurar Charles. Utilizou de sua influência na cidade, do seu dinheiro, sem êxi‑ to. O homem havia desaparecido sem deixar rastros.

Numa tarde, Carmem relembrava o encontro com Charles, e em determinado momento, uma lembrança fez estremecer todo o seu corpo: – Ele falou da minha orfandade – pensou emocionada – mas eu não contei sobre a minha infância para ele. Como ele soube?

Na mesma tarde, Carmem se dirige para o Gabine te de Leitura da cidade, e começa a folhear os jornais mais antigos, há mais de quarenta anos. Trêmula e em prantos lê: – Foi encontrado às margens do Tâmisa, o corpo de Charles Bermann, desaparecido há três dias.

Um ano mais tarde, Carmem inaugura uma casa‑ ‑lar para acolher crianças órfãs, às quais iria dedicar‑ ‑se pelo resto da sua vida.

Guerra Vazia

Aqueles eram dias obscuros. O homem, mais uma vez, quedara‑se diante da louca ambição, transfor‑ mara‑se em lobo do próprio homem, desrespeitan‑ do as leis mais primárias de respeito à vida em todas as suas manifestações. A Segunda Guerra Mundial chegava ao seu ponto mais crítico e os campos de concentração eram o símbolo da vergonha humana. Neles, magotes de seres esquálidos esperavam a mor te, alguns a desejavam, tamanha a dor e a vergonha que experimentavam.

Num vilarejo distante e abandonado, o cenário não era diferente da maior parte do mundo, prédios com‑ pletamente destruídos, casas e casebres perfurados por balas de metralhadoras, destroços, lixo e poeira.

Havia um silêncio mortal, até os pássaros em êxodo forçado desapareceram.

Entretanto, o vilarejo não estava totalmente deser‑ to. Um soldado alemão, único sobrevivente do seu batalhão, escondia‑se em uma casa que permanecera

EMANUEL Abdala

conservada apesar dos bombardeios. Hans Forher era um jovem com vinte anos incompletos, que havia bus‑ cado o Exército alemão iludido pelas promessas de Hitler e pelos sonhos de aventuras e vitórias. Estava, agora, apavorado após ver a morte de todos os seus companheiros; os sonhos de vitória haviam ruído como os castelos de areia na beira do mar. Desejava agora voltar para casa, rever seus pais e irmãos. Assim pensava e chorava convulsivamente.

Não longe dali, na entrada do vilarejo, com a res‑ piração irregular e o coração descompassado, a farda em frangalhos e uma metralhadora em mãos, estava John, um jovem americano que havia desertado do seu exército. Ele não havia desejado ir para a guerra. Era músico, queria montar sua banda, quando foi sur preendido com a convocação do Exército americano.

Dois jovens prestes a se encontrar, ambos desi‑ ludidos em seus sonhos, amedrontados, cansados e em um grande nível de stress. John aproxima‑se da casa, que chama a atenção por ser a menos destruída. Sorrateiramente, abre a porta e entra. Móveis quebra dos, cortinas rasgadas, tudo coberto de poeira. Con‑ trastando com quadro desolador, estava, no canto da sala, um piano de calda coberto com um lençol, que a princípio, deveria ser branco tingido de marrom pela poeira.

Enquanto o jovem americano descobria o piano, deu‑se a primeira rajada da metralhadora de Hans, que percebeu a presença do intruso inimigo. John res‑ pondeu imediatamente, e uma guerra particular teve início. Os jovens rolando no chão, escondendo‑se atrás dos móveis, lutando desesperadamente pela vida. Em determinado momento, encontram‑se frente a frente. O inesperado acontece. Ambos puxam o gati‑ lho das metralhadoras e as duas máquinas da mor‑ te travam e não cospem as balas de fogo. Atônitos, encontram‑se os olhos pela primeira vez. Em ato con tínuo, se livram das armas e atracam‑se como feras em sua irracionalidade. Trinta minutos se passam entre socos, pontapés, móveis atiçados contra o corpo, até que ambos caem completamente exaustos. O resulta‑ do: cortes, hematomas, equimoses e muito sangue.

Após alguns minutos inconscientes, ambos acor dam e sem forças para levantar, iniciam o diálogo:

— Qual é o seu nome – perguntou John com esforço.

— Meu nome é Hans. E o seu?

— O meu é John. Você é de que cidade?

— Eu sou de Berlim, Alemanha.

— Eu sei que Berlim fica na Alemanha, tive aula de geografia – respondeu John com ar de riso. – Eu sou da Califórnia.

Grande silêncio se fez. Em determinado momento, os olhos se cruzaram, e, assim, permaneceram por uns dez minutos, um olhando profundamente nos olhos do outro. O silêncio é cortado por um gemido.

— O que foi? – perguntou Hans.

— Minhas costelas, eu acho que você me fraturou algumas. Você bate bem!

— Não era para ser assim, quer dizer, eu não que ria que fosse assim. Mas não se sinta inferior, acho que você também fraturou algumas das minhas. Ambos sorriram.

Agora foi a vez de John perguntar:

— Por que você entrou na guerra?

— A princípio – falou Hans – pensei que era pela aventura e sede das vitórias, mas agora sinceramente não sei. E você?

— Eu fui forçado, era aceitar ou ser preso. Eu que‑ ria montar minha banda, fazer música, ser feliz. Por isso desertei.

— Você fugiu?

— Sim – confirmou John em tom mais sério – a guerra é um flagelo para a Humanidade, uma prova patente da nossa proximidade com os animais, pois é assim que nos comportamos, como verdadeiros ou até piores que os animais. Não existe uma lógica. Como invadir as cidades, destruir tudo e matar as pessoas que não conhecemos, que jamais sequer vimos?

— Você tem razão, somos todos membros da gran de família universal. Isso sem falar que os homens que promovem as guerras ficam em seus gabinetes cercados de seguranças, enquanto os jovens, muitas vezes, ainda adolescentes, perdem a vida nas batalhas ou sofrem nos campos de concentração. John será que isso um dia vai acabar?

— Valendo‑me da sensibilidade dos músicos, eu creio que só quando o ser humano vencer o egoísmo, o orgulho e a vaidade e se deixar embalar pelo amor, cantando um hino de louvor à fraternidade, aí sim, o mundo viverá em paz.

— John, a conversa está boa, mas temos um pro blema prático – questionou Hans preocupado – pelas leis da guerra, me sinto ridículo falando assim, como se ela fosse digna de ter leis. Bem, seja como for, para eles nós somos inimigos, e agora o que faremos?

— Bem – disse John sorrindo – aqui nessa cidade, tem uma casa, um piano e dois moradores. Vamos fa‑ zer música e esperar essa louca guerra acabar.

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