REVISTA PODER | EDIÇÃO 153

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J U L HO | AGOSTO 2 02 2

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50 70 SUMÁRIO 4 6 10

À frente da Ambipar Environment, Cristina Andriotti quer tornar companhia a maior consolidadora ESG do país

FOTOS PAULO FREITAS; PEDRO DIMITROW; PICO GARCEZ; DIVULGAÇÃO; GETTY IMAGES;

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O CÉU NÃO É O LIMITE

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O ator e humorista Paulo Vieira usa o riso como arma para conquistar TV e publicidade

O GIACOMETTI DESIGNER

CANTO DO PODER

O espaço de trabalho do advogado Celso Vilardi 70

PODER VIAJA

Algarve, no sul de Portugal, é um dos destinos mais famosos para curtir o verão europeu

RESET NA CABEÇA

RESPIRO ENSAIO

É HORA DE DESAPEGAR

A história do suíço Diego Giacometti, irmão de Alberto

OPINIÃO

A metodologia que ajuda a fazer as pazes com a memória

PORNÔ É POP

Oportunidade do Bem segue a onda das roupas second hand e já doou mais de R$ 5 milhões à caridade

VIDA PÓS-BURNOUT

Betania Tanure e um convite à reflexão sobre vida e trabalho

REPRESENTATIVIDADE E AFETO

OnlyFans, espécie de TikTok para adultos, faz indústria crescer e movimenta milhões de dólares

OPINIÃO

Como seguir em frente com mais consciência e evitar recaídas

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Cinco médicas negras fundam clínica focada na inclusão e viram case de sucesso

CALMARIA NA TORMENTA

Carolina Ignarra e as atitudes de quem é aliado da diversidade 36

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Com perfil discreto, ministra Rosa Weber assume presidência do STF e pode ajudar a baixar temperatura de possível conflito institucional Setor de aviação executiva passa por cima da crise e cresce 32

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EDITORIAL COLUNA DA JOYCE CAIU NA REDE É ESG

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SOB MEDIDA CULTURA OPINIÃO

Andrea Bisker mostra a importância das pausas 80

ÚLTIMA PÁGINA

CRISTINA ANDRIOTTI POR PAULO FREITAS

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PODER EDITORIAL

A

pesar de não ser a principal executiva no organograma da Ambipar, Cristina Andriotti é a figura mais notável de um grupo que não para de crescer ao adquirir empresa atrás de empresa. Já foram 36 desde o IPO de 2020. A emergência dos assuntos ESG fez com que a companhia tenha optado por oferecer um conjunto completo de soluções, do tratamento de resíduos à venda de créditos de carbono. E é Cristina que faz a integração dos recém-chegados, uma missão que só é possível com muita capacidade de liderança, objetividade e com as tais habilidades socioemocionais de que tanto se fala. Já Rosa Weber é bem menos eloquente, mas a discretíssima e técnica ministra que em setembro assume a presidência do STF em meio a um momento certamente caótico da política nacional, ganhou respeito entre os poderes. Para advogados ouvidos pela PODER, seu comportamento sereno ajudará muito a acalmar os ânimos, que precisam mesmo ser apaziguados. E o que acontece com quem já viveu o esgotamento profissional hoje mais conhecido por burnout? Em reportagem especial, falamos o que é preciso fazer para não recair. A pornografia também é algo a que se volta uma, duas, três, muitas vezes, mas aqui o que importa é mostrar as cifras bilionárias que a envolvem – com tentativas até de aberturas de capital. E se o Brasil pudesse ser avaliado pela movimentação de sua aviação executiva, talvez estivéssemos no “G1” – mostramos nesta edição o que (e quem) vai brilhar na Labace 2022, a principal feira do setor, em agosto. Por aqui também passam o humorista Paulo Vieira, sucesso de público e crítica, que vai se tornando a cara de um país nas mais diversas plataformas, o design elegante de Diego Giacometti, irmão do Alberto famoso, a beleza nua e crua da natureza do Algarve, em Portugal, e Rosiska Darcy de Oliveira, a escritora que desde 2013 ocupa a cadeira 10 da Academia Brasileira de Letras. Tem muito mais, isto foi só um teaser. Agora é sua hora de fruir – importei esse verbo tão caro aos críticos de arte, gostou? – a PODER.

R E V I S TA P O D ER . C O M . B R


apresenta


FONTE DA JUVENTUDE

ABILIO DINIZ está sempre envolvido em muitos projetos, mas a menina dos olhos dele e da mulher GEYZE é, no momento,

sem dúvida, o Plenae, plataforma digital que eles criaram alguns anos atrás para oferecer conteúdo gratuito sobre saúde, bem-estar e qualidade de vida. Aos 85 anos, Abilio, que tem energia no DNA, está cada vez mais dedicado aos projetos do Plenae. Quem o acompanha de perto conta que a plataforma é o verdadeiro segredo da sua vitalidade.

MARÉ ALTA

Em tempos de ressaca do mercado financeiro, o mar de venture capital está agitado com uma novidade. Trata-se do tricampeão mundial de surfe GABRIEL MEDINA, que se junta ao empreendedor serial Ricardo Siqueira (ex-maxiPago!) e ao multifamily office Carpa, do CEO Ian Dubugras, ex-presidente do Bank of America no Brasil, para lançar o primeiro “celebrity fund” do Brasil, a Kauai Ventures. O fundo vai aportar em startups com teses disruptivas, que envolvam blockchain, NFT, blue carbon, metaverso etc.

ALADIM

Candidato a vice do ex-presidente LULA nas eleições ao Palácio do Planalto, o ex-governador GERALDO ALCKMIN fez três pedidos especiais durante a elaboração do plano de governo da chapa. Um sobre o aperfeiçoamento da tributação no comércio exterior, outro sobre priorizar a competitividade brasileira com medidas efetivas de desburocratização e um terceiro que visa criar um programa educacional para alunos que ficaram defasados durante a pandemia. Todos foram acatados pelo PT e constam no programa com 121 compromissos assumidos em um eventual governo.

TIC-TAC

A ala ideológica da campanha à reeleição do presidente JAIR BOLSONARO está aliviada com a aprovação da PEC dos Auxílios – ou PEC Kamikaze, como a havia chamado o próprio ministro PAULO GUEDES. Com a expectativa de recuperação do presidente nas pesquisas de intenção de voto, atualmente o segundo colocado, o grupo avalia ser fundamental chegar ao segundo turno para manter de pé a tese de fraude eleitoral tão propagada – sem apresentar evidências – por Bolsonaro. Isso porque, se perder a eleição no primeiro turno, ele terá de ir contra centenas de outros candidatos eleitos – governadores, senadores, deputados federais e estaduais.

6 PODER JOYCE PASCOWITCH


ATRÁS DA TOCA

CANAL ABERTO

FOTOS REPRODUÇÃO INSTAGRAM PESSOAL; GETTY IMAGES; ANTONIO CRUZ/AGÊNCIA BRASIL; DIVULGAÇÃO CNN; CICERO RODRIGUES/MEMÓRIA GLOBO; FERNANDO FRAZÃO/AGÊNCIA BRASIL; DIVULGAÇÃO

Principal responsável pela chegada da CNN ao Brasil, o ex-CEO DOUGLAS TAVOLARO deixou o canal de notícias em março e desde então tem tido uma série de encontros reservados com grupos de mídia, anunciantes e empresários para implantar um projeto similar no país. Entre as tratativas, que ocorrem em sigilo, a com a emissora norte-americana CNBC, com foco em economia e negócios, é a mais avançada. Outro nome que vem sendo ventilado nesse mesmo projeto é o de CARLOS HENRIQUE SCHRODER, ex todo poderoso na TV Globo.

LÁ E CÁ

Ex-presidente da Câmara dos Deputados, RODRIGO MAIA (PSDB-RJ) tem defendido entre seus pares no ninho tucano que o partido, se quiser sobreviver à crise institucional e reconquistar protagonismo nacional, precisa urgentemente definir o seu campo político. Segundo ele, siglas como PSDB e MDB não gostam de se assumirem de centro e de direita, mas é assim que a sociedade as vê. Para Maia, com o PT consolidado na esquerda, resta ao seu partido ocupar o espaço que hoje pertence a Bolsonaro.

Presidente nacional do PSD e um dos homens mais influentes da política no Brasil, o ex-ministro GILBERTO KASSAB anunciou recentemente que vai defender a neutralidade do seu partido na eleição ao palácio do Planalto. Nas redes sociais, Kassab disse que “no momento apropriado, de modo a não interferir na boa governança partidária, compartilhará sua ‘preferência pessoal’ na disputa”. Decisão que surpreende um total de zero pessoas nos corredores de Brasília. Para interlocutores e aliados, Kassab tem deixado claro que pretende declarar seu voto ao ex-presidente Lula.

MULTIPLICAÇÃO

A filósofa e best seller DJAMILA RIBEIRO acaba de lançar o curso online e gratuito Jornalismo contrahegemônico: Reflexões para um novo presente. A formação, que apresenta um panorama de como o jornalismo pode ser mais diverso e inclusivo, está disponível no canal do YouTube Feminismos Plurais. Dividido em dez episódios, a iniciativa aborda temas como desinformação, teoria feminista negra, lugar de fala, imprensa negra e feminista, LGBTQIA+ e indígena. “O curso é para qualquer um que queira aprender e refletir sobre a importância e o poder da informação, afinal, um jornalismo sério e comprometido com a verdade e com os direitos humanos é fundamental para o fortalecimento da nossa democracia”, ressalta Djamila.

FUNILARIA

Se em alguns setores a crise está braba, não se pode dizer o mesmo do setor de cirurgias plásticas. Entre os grandes e mais famosos cirurgiões dessa especialidade, a procura está sendo cada vez maior e, principalmente, vinda de homens. A maioria deles do interior do Brasil, do mercado de agronegócio. PODER JOYCE PASCOWITCH 7


Se você não espera nada de alguém, jamais se decepciona SYLVIA PLATH, ESCRITORA NORTE-AMERICANA

SAS

3 PERGUNTAS PARA... COMO O 5G VAI IMPACTAR, OU COMO JÁ ESTÁ IMPACTANDO, O SETOR DE MEDICINA NO BRASIL?

COMO A IMPLANTAÇÃO DESSA TECNOLOGIA VEM SE DANDO NA PRÁTICA NO HC?

A conectividade é fundamental para a telemedicina, a medicina digital. Muitas coisas ficavam limitadas pela falta de conectividade. É uma quantidade gigante de dados e imagens trafegando, e o 5G resolve o problema, tanto de latência, a demora de uma imagem chegar [no outro ponto], como pelo fato de não ter tantas quedas. A tecnologia tem tudo a ver com o momento que a saúde passa e irá começar a desbloquear serviços que a gente ainda não conseguia disponibilizar porque não tinha a possibilidade de transmissão massiva de dados. Estamos num momento de estruturação tecnológica. A área de saúde é apaixonante, especialmente para um engenheiro como eu. Aqui consigo medir, um dia depois da implantação de um projeto, seu impacto social e econômico.

Com a baixa latência do 5G, é possível que um movimento feito em regiões mais remotas seja visto aqui. Por exemplo, em lugares em que há equipamento de ultrassom, mas não um médico disponível, o 5G dá a oportunidade de que uma parteira, uma doula, um operador de um aparelho portátil, faça um exame de ultrassom pré-natal e um médico especialista acompanhe [a consulta] num grande centro. Não é uma aplicação sofisticada, mas há centenas de gestantes que não fazem exame pré-natal e acabam tendo problemas na gestação. Isso tem impacto gigantesco. No futuro, talvez possamos usar a tecnologia para pequenas cirurgias, mas a gente começa do mais simples para depois ir elevando o grau de dificuldade.

CAPITANIAS

E O METAVERSO, ONDE SE ENCAIXA NESSE AMBIENTE?

Eu acredito que todas as tecnologias precisam ser testadas

A campanha de Lula tem dedicado atenção a algumas regiões e identificou lugares em que é necessário tentar reverter o favoritismo de Jair Bolsonaro ou, ao menos, diminuir a vantagem do presidente. São os estados do Acre, Rondônia, Roraima, Santa Catarina e no Distrito Federal. Em Goiás, onde Bolsonaro é tradicionalmente forte, a disputa entre os dois está acirrada.

8 PODER JOYCE PASCOWITCH

e avaliadas, e o metaverso é uma delas. Toda a parte que envolve interações sociais, como o tratamento de doenças mentais ou comportamentais, esse tipo de abordagem ajuda. A ideia é que o próprio paciente possa passar por uma experiência digital para depois se sentir mais confortável na experiência real. Isso vale para treinamentos médicos também. Nós gostariamos de trazer o laboratório da Meta para dentro do HC. A gente acredita muito na interação digital, mas o percurso precisa ser humanizado. Qualquer pessoa tem uma experiência digital desconfortável, na interação com bancos, por exemplo. Na saúde queremos que o paciente seja – e esteja – acolhido em todos os momentos.

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FOTOS FREEPIK; GETTY IMAGES; RENATO TK/DIVULGAÇÃO; DIVULGAÇÃO; MUSEU BISPO DO ROSÁRIO/ITAÚ CULTURAL; FÁBIO RODRIGUES POZZEBOM/AGÊNCIA BRASIL; REPRODUÇÃO INSTAGRAM PESSOAL; DIVULGAÇÃO HBO+

MARCO BEGO, engenheiro especializado em automação de processos e CIO (chief innovation officer) do projeto InovaHC, do Hospital das Clínicas de São Paulo


ESTE MÊS A MULHER E O HOMEM DE PODER VÃO... CONFERIR a mostra Bispo do

Rosário – Eu Vim: Aparição, Impregnação e Impacto, com mais de 400 obras, no Itaú Cultural. São mantos, estandartes, esculturas e outras peças que o sergipano produziu em casas psiquiátricas, onde passou a maior parte da vida

FUGIR para o mato e se hospedar na cabana contemporânea Altar Mini, instalada em uma clareira com vista para o rio Juquiá, no Legado das Águas, a maior reserva privada da Mata Atlântica do país, localizada no Vale do Ribeira (SP). Toda de madeira e inspirada no movimento tiny-house, é a mais nova opção de hospedagem do grupo do empresário Facundo Guerra, expert em descobrir e ressignificar espaços LER Receitas

CONFERIR as novidades do mercado de aviação de negócios na Labace, a maior feira do setor na América Latina. Entre os dias 9 a 11 de agosto em São Paulo (veja mais na pág. 26) DESCOBRIR ideias inovadoras e

inspiradoras por trás das moradias mais criativas no mundo na série documental Home, na Apple TV+

ACOMPANHAR in loco o US Open, em

Flushing Meadows, no Queens, Nova York. No torneio feminino a torcida é pela brasileira Bia Haddad, que atravessa excelente fase e se tornou a primeira tenista do país a alcançar a 28ª colocação do ranking do WTA

OUVIR o novo álbum do cantor, compositor e multi-instrumentista Andrew Bird, veterano do indie folk. Inside Problems usa da atmosfera que consagra a vasta discografia de Bird para examinar questões da mente e do coração

de Inverno da Comunidade (Cia. das Letras), o mais recente livro de Louise Glück, a poetisa americana vencedora do Nobel de Literatura em 2020 DAR UMAS VOLTAS pelo Emporio

Fasano. Recém-aberto na rua Bela Cintra, em São Paulo, é um templo de guloseimas de alta qualidade do mundo todo. Mais uma empreitada comandada por Gero Fasano

ESCUTAR a segunda temporada do podcast TransformaGov, produzido pelo Instituto de Relações Governamentais (Irelgov), sobre os desafios do cenário eleitoral no Brasil. O primeiro episódio, “Dados e eleições: antecipando tendências?”, conta com a participação da advogada Mariana Chaimovich e do cientista político Guilherme Camargo CELEBRAR a volta da temporada de

dança do Teatro Alfa, depois de dois anos de pausa. Em agosto, grupo Corpo e São Paulo Cia. de Dança

BAIXAR o BibliON, novo app que

dá acesso ao acervo da Biblioteca Digital de São Paulo. A plataforma disponibiliza diversas opções de livros digitais e oferece acesso a audiolivros e a programações culturais como clubes de leitura, podcasts e seminários

MARATONAR Santa Evita, série

inspirada no best-seller do argentino Tomás Eloy Martínez sobre a intrigante história do corpo embalsamado de Eva Perón, que permaneceu por três anos sem ser enterrado aguardando a construção de um monumento que nunca foi concluído. No Disney+

DESCOBRIR o Exit Bar, point

escondido em São Paulo com gastronomia assinada pela chef Daniela França Pinto e carta de drinques criada por Márcio Silva, o bartender mais premiado do Brasil. @exitbarsp

GARANTIR a inscrição para o Women Invest Summit, congresso para mulheres que desejam aprimorar seus conhecimentos sobre investimentos. O evento será realizado em setembro, no Hotel Unique, com palestras, painéis e workshops ASSISTIR Hacks,

série da HBO Max sobre uma comediante veterana que enfrenta a decadência da carreira e a falta de humor. Forte candidata ao Emmy.

com reportagem de carla julien stagni, caroline marino e dado abreu PODER JOYCE PASCOWITCH 9



NEGÓCIOS

CAIU NA REDE É ESG À frente de uma empresa de soluções ambientais que adquiriu cerca de 40 outras em dois anos, a paulistana Cristina Andriotti, CEO da Ambipar Environment, sua para harmonizar culturas, propósitos e receitas e fazer da companhia a maior e mais completa consolidadora ESG do país por paulo vieira fotos paulo freitas


atos relevantes e comunicações ao mercado não são exatamente textos que convidam à leitura, exceto para quem fareja negócios, investe no mercado financeiro, analisa o sobe e desce das ações. Para esses, o nome Ambipar tem se tornado cada vez mais familiar. Rara é a semana, ou a quinzena, em que a empresa de soluções ambientais não emite um desses comunicados, em geral para dar ciência de que acaba de adquirir o controle acionário de mais uma empresa no Brasil ou no exterior – a Ambipar está em dezena e meia de países. Desde que a companhia fundada, em 1995 por Tércio Borlenghi Júnior, abriu seu capital na bolsa, há dois anos, primeira de seu setor a fazê-lo, foram 36 aquisições, mas, pelo andar do trem-bala, o número tende a ficar defasado quando esta PODER chegar a seu leitor. Nas últimas semanas, a Ambipar incorporou ao seu ecossistema – eis finalmente o uso preciso da palavra – a canadense Graham Utility, a capixaba CTA, ambas de respostas a acidentes na natureza, a Bioenv Análises Ambientais, a Flyone, de resgate aéreo, e a Dracares, de proteção marinha e costeira. Com as duas últimas vieram também as vistosas frotas das companhias. No fim de julho, o grupo de empresas da Ambipar contava com 12 mil colaboradores. Para dar munição a esses negócios, o bilhão de reais obtido no IPO, contudo, foi insuficiente, até mesmo porque algumas compras são feitas no exterior. Com as ações na bolsa hoje travadas no mesmo valor da precificação da abertura de capital em 2020 – e valendo 1/3 da máxima histórica, a cotação do papel de há um ano – , um alívio surgiu no começo de julho, quando, numa operação engenhosa, a Ambipar levantou US$ 168 mi ao fundir-se com um fundo do tipo Spac, de propósito específico, listado na Nyse, a bolsa de Nova York. A grana dará fôlego à empresa, cuja dívida rondava 2,8 vezes o Ebitda (o lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação), proporção não recomendada para cardíacos. A isso se somam algumas rodadas de emissão de debêntures, a última de R$ 750 milhões na virada do ano. Para auxiliar na governança e na consolidação de tantos novos negócios, a Ambipar dividiu-se em duas: a Environment, que dá destino e gerencia os resíduos de grandes clientes, serviço que está na origem da empresa, entre outras atividades; e a Response, de socorro a acidentes

Se fôssemos criar aqui dentro da empresa o know-how para as novas vertentes em que entramos, perderíamos o timing para a concorrência

12 PODER JOYCE PASCOWITCH

ambientais, principal eixo de atuação da companhia no exterior. É de se imaginar a felicidade com que o CFO da empresa recebe a notícia de cada nova aquisição, mas a face pública – e boa parte do suor privado – da Ambipar é a da economista paulistana Cristina Andriotti, 58 anos, há 14 anos na companhia e hoje CEO da divisão Environment. Apesar de ter um par na Response, Guilherme


Borlenghi, filho de Tércio, é ela quem fala por toda a Ambipar. Além disso, Cristina, que é egressa da área de RH, tem a trabalhosa missão de acolher os recém-chegados, entender as sinergias, estabelecer uma cultura minimamente comum, alinhar os chacras, ou melhor, os propósitos, e fazer com que as incorporações efetivamente deslanchem e façam sentido. Parece complicado, e é, mas agir rápido é imperioso. “A gente começou fazendo gestão e valorização de resíduos das empresas, passamos para soluções de economia circular e, enquanto isso, o mercado começou a falar das tais três letrinhas, o ESG”, disse a CEO a PODER na sede da empresa, em Nova Odessa, na região de Campinas (SP). “Se fôssemos criar aqui dentro da empresa o know-how para as novas vertentes em que entramos, perderíamos o timing para a concorrência.” Subitamente incorporado ao léxico corporativo, o ESG vem exigindo ações concretas de players que jamais se importaram muito com

cuidados socioambientais. A governança já estava mais ou menos assentada, especialmente em empresas listadas em bolsa, que são obrigadas a publicar balanços trimestrais, mas a expressão “net zero” só recentemente virou mantra, muito por conta das pressões do mercado financeiro. De fato, o apocalipse climático era há muito caçapa cantada, mas foi outro dia que a tigrada viu que era preciso dar respostas efetivas a perguntas como “o que fazer com as embalagens?”, além, é claro, de ter de enPODER JOYCE PASCOWITCH 13


ME DÁ UM CARBONO AÍ

Embora um projeto que regulamenta o mercado de carbono no Brasil tramite há mais de um ano na Câmara dos Deputados, o governo federal editou em maio deste ano decreto com a mesma finalidade. Ele estabelece setores elegíveis para negociar créditos de carbono, que é a saída que empresas e instituições que não conseguem reduzir sua própria emissão têm para auxiliar os países em seus compromissos pela interrupção do aquecimento global. Dentre os setores, estão as indústrias de papel e celulose, de construção e parte da química. O decreto também cria uma entidade que deve inventariar as emissões dos entes. O texto foi torpedeado por ser extremaextremamente vago e não impor obrigações setoriais de redução, o que pode vir a interfirir no funcionamento do chamado mercado voluntário, em que as empresas definem suas metas isoladamente, seja por razões de mercado (conseguir financiamentos atrelados a metas ESG), seja por reconhecer que a vida na Terra efetivamente corre riscos. ApeApesar de há tempos atuar no mercado voluntário de carbono a partir de preservação florestal, Plínio Ribeiro, CEO da Biofílica, vê a iniciativa governamental com bons olhos, malgrado os problemas do texto. Ribeiro celebra que em 2022 a pauta tenha finalfinalmente avançado, citando ainda os R$ 300 mi que o BNDES anunciou que irá destinar para fomento do mercado voluntário de carbono.

14 PODER JOYCE PASCOWITCH

contrar caminhos para reduzir ou neutralizar a pegada de carbono. Assim, para a Ambipar, criar uma plataforma completa de serviços ambientais passou a fazer muito sentido. Daí a aparente sangria desatada por comprar controle acionário de empresas (algumas no limite dos 50%), que aderem ao ecossistema sem perder sua visão de negócio, corpo técnico e nome. Duas das empresas mais “sexy”, para usar uma expressão cara ao pessoal das startups, são a Boomera e a Biofílica, ambas incorporadas à Ambipar em meados


Quanto mais velho a gente fica, mais a gente percebe que ninguém é insubstituível. Entendo que agrego valor para a companhia, mas tenho um time muito bom ao meu lado

de 2021. A Boomera, que investe bastante em P&D (pesquisa e desenvolvimento) vem dando vida (bem) mais longa ao material das embalagens plásticas, especialmente aquelas de difícil reciclagem, transformando-as em resina e película para produção de novas embalagens. Além disso, a empresa se conecta diretamente com uma rede de 300 cooperativas de catadores em todo o Brasil – o número deve chegar a 500. Cofundador da Boomera e empreendedor social do ano de 2020 para a Fundação Schwab no Fórum Econômico Mundial, Guilherme Brammer viu na Ambipar uma maneira de saciar a necessidade constante de matéria prima – um grande acordo de exclusividade da Boomera com a Dow Química exige entrega regular da resina produzida a partir do plástico coletado. Em entrevista a PODER por videoconferência, Guilherme disse que cogitou capitalizar a Boomera com fundos de investimento, mas que a decisão de aderir à rede de empresas da Ambipar, que na entrevista chamou de “grande startup pujante”, fez muito mais sentido. “Isso permite que a gente tenha um plano agressi-

vo de crescimento, para três vezes nosso tamanho já em 2023. E sem as burocracias de uma multinacional.” Guilherme ainda elogia a CEO Cristina, uma líder de operações que “entende rapidamente o negócio” e é capaz de “colocar-se do nosso lado”. A Biofílica não coloca exatamente a mão da massa como a Boomera, já que negocia os tão falados créditos de carbono, mercado em franca expansão no Brasil (veja boxe na pág. 14). Com 15 anos de atuação e cerca de 100 clientes no país, ela tem como meta quinPODER JOYCE PASCOWITCH 15


PLÁSTICO, O PROBLEMA

O Brasil é modelar na reciclagem de alumínio, chegando a 95% de reaproveitamenreaproveitamento, assim como performa bem no papelão, mas marca passo no plástico, material que está em virtualmente todos os produtos e que deixa o consumidor com um grande “problema na mão”, na opinião da jornalista Mara Gama, do Ecoa, do portal UOL. Para Mara, as leis permissivas brasileiras não ajudam a incrementar a taxa de reciclagem baixíssima desse componente. O plástico é o grande poluidor dos oceanos e é idenidentificado por 92% da população, como mostrou pesquisa Ipec de 2021, como “muito problemático” para o meio ambiente. Para desespero de Mara e de todos os que se abespinham com o tema, artefatos plásticos são muitas vezes utilizados uma única vez. Em 2019, o Parlamento europeu baniu esses produtos de uso único, como pratos e talheres, algo que seria muito desejável por aqui. O diabo é que as leis brasileiras, vagas, não responsabilizam produtores e comerciantes pela coleta do descarte – a chamada logística reversa. Para não ser portadora apenas das más notícias, Mara lemlembrou a PODER que em julho o Congresso Nacional rejeitou os vetos de Jair Bolsonaro em relação a projeto de lei de 2017 que dá incentivos fiscais a atividades de reciclagem tanto para pessoas físicas como jurídicas. “Mas se isso vai mudar alguma coisa, demodemocratizando um pouco o setor, é outra conversa.”

16 PODER JOYCE PASCOWITCH

GISELE

Se a Biofílica e a Boomera são sexy, fica difícil encontrar o adjetivo adequado para definir a modelo gaúcha Gisele Bündchen, que em julho passado foi anunciada como acionista e embaixadora de marca da Ambipar, em movimento que lembra bastante o da ubíqua cantora Anitta com o Nubank. Gisele, que tem forte atuação como ativista ambiental, reuniu-se por três dias em 2021 com executivos da empre-

FOTOS DIVULGAÇÃO

Gisele Bündchen, que é embaixadora de marca em troca de participação acionária, helicóptero de resgate em acidentes na natureza e o “outfit” de um colaborador nas operações de campo

tuplicar de tamanho até 2030. Não está longe disso: em um ano, já dobrou. Plínio Ribeiro, cofundador da companhia, agora Biofílica Ambipar, disse que já havia recebido propostas de aquisição do exterior, mas se deixou seduzir pela Ambipar. Pesou, entre outros motivos, a objetividade do fundador e principal controlador acionário, Tércio Borlenghi. “Ele viu muito claramente o valor do negócio.” Sobre Cristina, elogia a condução no processo de integração. “Ela limpou o caminho para que não gastássemos muito tempo nas reuniões. Passa muita confiança.” Com a incorporação, Cristina passou para o conselho da Biofílica, envolvendo-se com ainda mais zelo na busca dos resultados operacionais. Para Plínio, ter entrado na plataforma de serviços ambientais “muito completa” da Ambipar foi um movimento estratégico, já que a venda de créditos de carbono é só uma das estratégias net zero das empresas – e se destina justamente àquelas que não conseguem reduzir suas emissões. E apenas pensando no “cross-selling”, a venda de serviços para os clientes da Ambipar no Brasil, a Biofílica aumenta seu escopo potencial de B2B em 20 vezes.


O social dentro do cliente é bastante difícil de acessar, e muitos já têm atuação no tema, as multinacionais, por exemplo, costumam fundar institutos para isso

sa que dividem com ela o comitê de sustentabilidade e se disse “segura” de sua escolha. “Procuro fazer investimentos conscientes em negócios que tenham impacto positivo para a sociedade e para o planeta. Os serviços de cuidado com o meio ambiente e de sustentabilidade que a empresa presta precisam se multiplicar muitas vezes para que consigamos promover mudanças significativas”, disse, conforme divulgou, em nota, a Ambipar. Já o “stake”, a participação acionária de Gisele, esse não foi revelado. Se o core da Ambipar é o “E” (de “environment”), resta saber o que fazer com o “S”, uma vez que as empresas no Brasil ainda têm lacunas na área. Para Cristina, a Ambipar já faz o “walk the talk” organicamente, com diversas posições de liderança ocupadas por mulheres – elas são 35% em cargos dea diretoria, 41% nos de gerência e 30% de supervisão. Mas quanto a colocar no pipeline o oferecimento desse tipo de produto aos clientes, não há nada concreto. Por enquanto. “O social dentro do cliente é bastante difícil de acessar, e muitos já têm atuação no tema, as multinacionais, por exemplo, costumam fundar institutos para isso. Quando não é o caso, a gente se sente na obrigação de dizer: ‘Acho que com esse S aí você não cumpre o que deveria ofertar’. Mas falamos isso

muito mais como uma orientação.” Mesmo diante da avalanche de novos negócios, Cristina fala com desenvoltura de seu trabalho de “conectar” empresas, para ela seu principal “desafio” à frente da Ambipar. E embora não tenha nenhuma vontade de se aposentar – “vejo-me trabalhando ativamente por mais 20 anos”, diz –,a nova vovó do mercado não se vê indispensável no processo. “Quanto mais velho a gente fica, mais a gente percebe que ninguém é insubstituível. Entendo que agrego valor para a companhia, mas tenho um time muito bom ao meu lado. Minha missão é dividir conhecimento e ter sempre mais gente comigo.” n PODER JOYCE PASCOWITCH 17


ESPELHO

ou um garoto-propaganda de 82 anos. Um coroa propaganda.” É cheio de leveza e bom humor que o maestro João Carlos Martins comenta o convite para estrelar a campanha de Dia dos Pais da Reserva, marca de roupas do Grupo AR&CO. Com o objetivo de amplificar a linha de camisas e o mote “Camisaria Reserva, feita com maestria no Brasil’’, a marca celebra a trajetória do maior maestro brasileiro em um shooting feito com a Orquestra Bachiana no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. O lugar é também o endereço escolhido para um concerto do regente e sua orquestra no dia 13 de agosto. “Continuo na ativa e me sinto honrado em participar dessa campanha para a Reserva. Ser pai é entender os filhos, porque no futuro eles também serão pais”, comenta João Carlos Martins. Mundialmente conhecido por seu trabalho, começou sua

carreira aos 8 anos, na década de 1940. Aos 18, desenvolveu distonia focal, distúrbio neurológico que atinge os movimentos das mãos. Foi sua luta contra essa condição que fez o maestro virar símbolo de superação. Mas, João Carlos tem outros dois títulos que o enchem de orgulho: de pai e avô. “Quando meus filhos eram crianças, íamos assistir a jogos de futebol”, conta. A programação era dividida com as partidas que aconteciam em sua casa. “Tínhamos um campinho em que jogávamos com os amigos”, lembra o ‘Joca’, como é chamado pela família. João Carlos tem quatro filhos, oito netos e muitos seguidores dele e da sua Fundação Bachiana, entidade sem fins lucrativos que criou para incentivar e promover a formação musical. E sabe qual é o legado que ele deixa para todos? “Minha luta pela inclusão social por meio das artes e da música. É esse o legado desse velho maestro”, afirma. n

FOTO DIVULGAÇÃO

“S

PAI COM MAESTRIA



TOGA

CALMARIA NA TORMENTA Ministra Rosa Weber assume presidência do STF em momento particularmente conturbado, mas perfil discretíssimo pode ajudar a baixar temperatura de possível conflito institucional POR PAULO VIEIRA

20 PODER JOYCE PASCOWITCH

ma à invasão do Capitólio diligentemente preparado por Bolsonaro dia após dia de seu mandato. Estar à frente do STF nas próximas semanas só deve ser menos penoso do que sentar-se na cadeira de Moraes, que em agosto passa a chefiar o Tribunal Superior Eleitoral. Rosa já passou por essa prova de fogo: esteve à frente do TSE em 2018, justamente o ano das eleições de Bolsonaro – que ele, mesmo vencedor, insiste em dizer fraudadas. Ao menos ela pode se consolar com a perspectiva iminente de sua aposentadoria: em 2023 completa 75 anos e tem de se afastar compulsoriamente do serviço público, abreviando em um ano o mandato no Poder Judiciário. Rosa Weber, que foi indicada ao STF por Dilma

“A ministra é muito rigorosa, técnica, não poderia ser mais adequada para este momento do país” Oscar Vilhena, Vilhena, FGV

FOTO FABIO RODRIGUES POZZEBOM/AGÊNCIA BRASIL

N

uma Suprema Corte marcada pela divergência e pela eloquência – eufemismo para desdém ao preceito de apenas falar nos autos –, a porto-alegrense Rosa Weber é um oásis. Uma esfinge. Ou nem isso, já que nem mesmo enigmas ela oferece ao interlocutor interessado em decifrá-la. Rosa não fala com a imprensa, evita pronunciamentos públicos, não antecipa seus votos, deve desconhecer as ferramentas mais básicas do Instagram e normalmente só se manifesta nos processos que julga, como, aliás, convém – ou deveria convir – ao decoro de qualquer juiz. A ministra assume a presidência rotativa da casa em setembro, no meio do furacão. Não que tenha sido fácil para seu antecessor, Luiz Fux. A tensão institucional levada a cabo pelo bolsonarismo e seu criador, que teve no STF e em alguns de seus ministros inimigos preferenciais, gerou cenas como a de 7 de setembro de 2021, de procissão de caminhoneiros e outras categorias teleguiadas querendo invadir a sede do STF. Além disso, o próprio Bolsonaro falou explicitamente em descumprir ordem do ministro Alexandre de Moraes, a quem chamou de “canalha” – outros colegas mereceram do presidente epítetos como “mentiroso”, “psicopata”, “sem caráter”, “petista”, “comunista” e, no caso de Luís Roberto Barroso, ainda houve associações à pedofilia. Rosa, que talvez por seu perfil discretíssimo escapou da linha de tiro do chefe do Executivo e de seus acólitos, assume seu termo como presidente poucos dias depois de outro 7 de setembro, este o do bicentenário da Independência do Brasil, o que coloca mais simbolismo na fogueira, mas promete ser amendoim perto do que vem por aí: as eleições de outubro e o cli-


PODER JOYCE PASCOWITCH 21


Com Cármen Lúcia, colega que já presidiu o STF, e a exPGR Raquel Dodge

A ministra e Luiz Fux, a quem substitui em setembro

Em manifestação contra o STF no Rio, em 2021, Rosa “deu as caras”

22 PODER JOYCE PASCOWITCH


Rousseff em 2011, não deve se sentir muito à vontade em assumir a presidência da corte em momento tão apoteótico, mais digno de Joãosinho Trinta do que de, vá lá, Geraldo Alckmin, mas talvez ela não se sinta à vontade com estreias de modo geral. E é justamente por ter esse perfil baixo que alguns analistas privilegiados do trabalho do Supremo veem com expectativa a assunção da gaúcha. “A ministra Rosa é absolutamente discreta, muito rigorosa, seus votos são técnicos, e ela tem aderência incondicional ao pacto constitucional. Não poderia ser mais adequada para este momento do Brasil, de muita estridência. Ao não reverberar, ela já contribui, e sua presença [na presidência] pode ser muito despolitizadora, o que será positivo para o futuro governo”, disse a PODER Oscar Vilhena Vieira, professor de direito constitucional da FGV-SP. Vieira, contudo, faz questão de dizer que ser “muito silente” não significa “não tomar posições”. “Quando presidiu o TSE em 2018, Rosa nunca se omitiu.” “Ela vai contribuir para diminuir a tensão institucional”,

formação de quadrilha associado ao núcleo político dos acusados no mensalão; também negou pedido de habeas corpus a alguém preso por roubar xampu de R$ 10. No campo do direito do trabalho, área em que fez carreira – ela foi presidente do Tribunal Superior do Trabalho antes de chegar ao STF –, 75% de suas decisões em 2021 favorecem os trabalhadores, segundo análise do Anuário da Justiça do ConJur. Na argumentação tortuosa dos detratores de redes sociais, toda essa atuação pode ser ainda menos digna de ataques do que dois fatos que não dizem respeito à magistratura. A filha de Rosa, a produtora cultural Mariana Weber, assinou ficha de filiação ao Psol em 2019. Por ter dado abrigo um dia a Adélio Bispo, responsável pela facada que mudou a história do país em 2018, o partido é, junto com o PT de Lula, o inimigo preferencial do reacionarismo alinhado a Bolsonaro. O outro filho de Rosa, o jornalista Demétrio Pires Weber, ironicamente, já foi vítima de ataques de petistas nas redes sociais por ter colaborado com jornais que eram tratados pelos

FOTOS FABIO RODRIGUES POZZEBOM/AGÊNCIA BRASIL; JOSÉ CRUZ/AGÊNCIA BRASIL; GETTY IMAGES

“Ela vai contribuir para diminuir a tensão institucional. Tem pulso firme, vejo-a também habilidosa Lima, criminalista nos bastidores” Juca Oliveira Lima, crê o advogado criminalista Juca Oliveira Lima, “justamente por seu perfil sereno, discreto.” “Sou de família de juiz, gosto desse perfil de discrição. E ela tem pulso firme, vejo-a também habilidosa nos bastidores, não me lembro dela entrando numa briga com seus pares.” Se o bolsonarismo não anda se ocupando propriamente da ministra Rosa, a fortuna crítica, digamos, de sua década na Corte não deve agradar em nada à malta. Em 2021, anulou medida provisória de Bolsonaro que retirava o poder de moderação das redes sociais no caso de conteúdo falso e antidemocrático. Também suspendeu num primeiro momento o orçamento secreto, como é chamado o conjunto de emendas de parca ou nenhuma transparência que garante a aprovação de temas caros ao governo no Congresso. E mais para trás, viu constitucionalidade nas cotas raciais das universidades públicas e votou contra a condenação em segunda instância, cavalo de batalha da turminha da Lava Jato de Curitiba, mudando entendimento de quatro anos antes. Na época do impeachment de Dilma, rejeitou oito ações que contestavam a manutenção dos direitos políticos da ex-presidente; e, retroagindo ainda mais, votou contra o crime de

simpatizantes do lulopetismo como integrantes da “mídia golpista”. Os bolsonaristas acham hoje que a tal “mídia golpista” trabalha contra seu líder. A comparação é um tanto indevida, já que a sabatina para o STF no Senado depende de humores políticos, e, em sua vez, Rosa teve 14 votos contrários. Mas, no passado, ela “gabaritava”, tendo sido aprovada em 1967 em primeiro lugar no vestibular para a faculdade de direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Rosa talvez já estivesse vacinada para o contraditório, tendo dito aos senadores na Comissão de Constituição e Justiça antes da sabatina que “há de manter o juiz a sua humildade e a consciência de que, embora limitado como ser humano em sua dimensão pessoal, ele deve ser grande na resposta, para acompanhar as mudanças trazidas pelo progresso científico, tecnológico e humano”. Para o advogado Walfrido Warde, autor do livro O Espetáculo da Corrupção, a ministra adquiriu respeito nos meios “jurídico, político e militar” – o que certamente engrandece sua figura. “Ela será capaz de manter a etiqueta democrática”, completa. n PODER JOYCE PASCOWITCH 23


LISTA DE DESEJOS

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ESPECIAL

Raro setor imune à crise, aviação executiva apresenta seus novos trunfos na Labace, maior feira do setor, em São Paulo POR EVANILDO DA SILVEIRA

o contrário de grande parte da economia brasileira, a aviação executiva nacional passou por cima da crise e acelerou durante a pandemia. Segundo dados da Associação Brasileira de Aviação Geral (Abag), em 2021 o volume de operações foi de 350 mil pousos e decolagens, o que representa um crescimento de 3,5% em relação a 2019, antes da irrupção da Covid. O crescimento foi ainda maior nos seis primeiros meses de 2022 em relação a igual período de 2019, 12,7%. Além do aumento da movimentação, houve cresci-

28 PODER JOYCE PASCOWITCH

mento da frota da aviação geral. Os números ajudam a gerar expectativa pela próxima Labace, maior feira da aviação de negócios da América Latina, cuja 17ª edição acontece agora, entre os dias 9 e 11 de agosto, em São Paulo. Flavio Pires, diretor da Abag, entidade que organiza o evento, também destaca o crescimento “ainda mais expressivo” de jatos executivos. “Em abril de 2021 eram 689, e até abril deste ano 60 novos jatos foram integrados à frota brasileira.” Para Luiz Sandler, managing partner da IJT, uma das expositoras da Labace, empresa fundada na Flórida há 35 anos e há mais de duas décadas com escritório


em São Paulo, o momento é de fato “muito aquecido e dinâmico”. “No mundo, a aviação executiva acelerou muito desde o terceiro trimestre de 2020, com elevação de preços nos últimos nove meses devido à escassez provocada pela intensa procura”, diz. “Mas nos últimos 45 anos há uma aparente tendência de estabilização ou mesmo de ajuste.” O crescimento do mercado de aviação executiva também fica evidente por outro dado: o tempo de espera para receber uma aeronave nova adquirida dos fabricantes. “Hoje a fila está entre um e dois anos”, conta Marcos Amaro, fundador e CEO da Amaro Aviation, que trabalha no regime de propriedade compartilhada dos aparelhos. “Nós, por exemplo, compramos um Phenom 300, da Embraer, que só vamos receber no quarto trimestre de 2024.” Essa longa espera pela entrega de aeronaves novas inflacionou o mercado. “Os aviões com um ou dois anos de idade podem chegar a ter preço até maior do que um novo, já que muitos clientes não podem aguardar a entrega por muito tempo”, explica Anderson Markiewicz, diretor de vendas e aquisições de aeronaves da Líder Aviação. Diante desse quadro, as empresas do segmento não têm do que se queixar. No caso da Líder, por exemplo, a demanda por fretamento de voos privados voltou aos patamares pré-pandemia, caso se compare janeiro a junho de 2019 com o mesmo período de 2022. “Embasados nesses dados, percebe-

mos que houve novos entrantes na aviação executiva”, diz Bruna Assumpção, superintendente das unidades de manutenção executiva, fretamento e gerenciamento de aeronave da empresa. “Ou seja, pessoas que nunca haviam vivido essa experiência estão cada vez mais dispostas a investir nos benefícios que a aviação executiva oferece, seja na compra de aparelhos ou no táxi aéreo.” A Líder agora espera crescimento dos negócios da sua unidade de manutenção executiva. A previsão para este ano é de aumento na demanda de serviços em relação a 2019. “Para os de manutenção programada, a expectativa de crescimento é de 23,5 % e de 12% nos não programados”, estima Bruna.

VOAR PARA O TRABALHO

Há vários fatores que explicam esse crescimento do setor. De acordo com Junia Hermont, Chief Operating Officer (COO) da Líder, a maioria dos clientes que utilizam os serviços da empresa tem a aviação executiva como importante ferramenta de trabalho, já que a maior parte dos voos é nos dias úteis. “Claro que existe a demanda por lazer também, mas a própria Abag aponta que 83% das 100 maiores empresas do país utilizam aviação executiva para deslocamentos profissionais”, explica. Isso fica ainda mais claro quando se pensa que, segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), das mais de 3.200 pistas de pouso no Brasil, pouco mais

FOTO GETTY IMAGES

Nas fotos desta e da pág. oposta, aviões HondaJet Elite S com capacidade de 6 a 7 passageiros da Líder Aviação

PODER JOYCE PASCOWITCH 29


‘‘Percebemos uma mudança, de se aproveitar o agora. As preocupações sanitárias e com a qualidade do transporte aéreo regular também contribuiram para o mercado” Luiz Sandler, managing partner da IJT

Aeronaves da Pilatus da Amaro, empresa que atua no modelo de compartilhamento

de 100 atendem voos regulares. “Assim, a aviação executiva chega aos demais pontos do país, atuando como elo entre os centros de produção e os de negócios, exercendo papel fundamental no crescimento do Brasil e cumprindo a função que a comercial não tem condições de atender”, acrescentar Junia. “Essa demanda aumentou ainda mais com a pandemia e com as restrições impostas à aviação comercial.” Sandler, da IJT, mesmo especulando que a “euforia pode estar arrefecendo”, conta que seu grupo tem novidades. Desde 2021, com a chegada de Luiz Gustavo Ribeiro, sócio especializado no mercado de táxi aéreo e administração de aeronaves, foi adicionada à companhia a IJM – International Jet Management. “Queremos atuar como butique, prestar um serviço altamente personalizado, provendo máxima disponibilidade das aeronaves.” Sandler diz que o comportamento de seu cliente mudou com a pandemia e com o “confronto com a vulnerabilidade e a finitude” trazida especialmente em 2020. “Percebemos uma mudança de se aproveitar o agora. Fora isso, as preocupações sanitárias e com a qualidade do transporte aéreo regular contribuíram com o mercado de aviação executiva.” Com tudo isso, a expectativa é que esta Labace seja maior que a anterior, de 2019, tanto pelo aquecimento do mercado quanto pelas novidades que chegam no setor. “Estamos com 100% dos espaços comercializados”, conta Pires, da Abag. “São mais de 70 expositores confirmados, incluindo empresas como Embraer, Dassault, Boeing, Tam Aviação Executiva, entre outras. Uma das novidades deste ano é o


FOTOS GETTY IMAGES; DIVULGAÇÃO

Gulfstream G550 da IJT, outra empresa que mostra seus aviões na Labace

segundo hall de exibição, que tem atraído muitos expositores. São mais de 50 empresas interessadas em participar. As fabricantes também apresentam seus lançamentos durante a feira”, diz Flavio Pires, diretor da Abag. A apresentação dos eVTOLs, aeronaves elétricas de decolagem e pouso verticais, que devem chegar às grandes cidades ainda nesta década, será outra atração da feira, junto com as empresas de compartilhamento de aeronaves, modelo no qual o cliente divide os custos operacionais com outros sócios. O compartilhamento é uma opção viável para clientes que voam acima da média, mas que não querem possuir um avião de uso exclusivo, um mercado certamente promissor. É nesse segmento que atua a Amaro Aviation. A empresa fraciona a propriedade das aeronaves em até 16 cotas, que podem ser adquiridas separadamente pelos interessados, que aí compartilham o tempo de uso dos aviões. “Hoje temos seis aviões contratados, dos quais dois em operação, e cerca de 30 clientes.” “No ano que vem vamos receber mais três aparelhos e esperamos vender pelo menos R$ 100 milhões em cotas. Em 2024, teremos mais um avião em nossa frota.” Para Pires, o setor de aviação de negócios se destacou durante a pandemia por seu crescimento e por substituir parcialmente a malha aérea comercial, submetida às restrições de demanda. “Foi ele que garantiu o transporte de doentes, levou oxigênio na crise de Manaus e vacinas aos lugares mais distantes para garantir a imunização de todos”, diz. “Além disso, as pessoas começaram a optar pelo transporte privado, para viagens a trabalho, lazer ou atender uma emergência.” n

A Labace, maior feira de aviação civil do Brasil, que volta agora a São Paulo após interrupção por conta da pandemia, e um eVTOL


OPINIÃO

6 ATITUDES DE UMA PESSOA ALIADA DA INCLUSÃO POR CAROLINA IGNARRA

visibilidade do tema Diversidade, Equidade e Inclusão, motivada pelo ESG e pelos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, com 17 metas até 2030 para proteção do planeta e dignidade das pessoas), tem estimulado o surgimento de novas ações. Percebemos o aumento da participação positiva de executivos e executivas a favor de culturas mais inclusivas nas organizações. Natural que as intenções, no primeiro momento, possam ser por conveniência, por obrigação de lei. Sabemos que para virar convicção ainda tem uma jornada a alcançar. Porém, esse é um bom sinal de que a inclusão tem sido mais recorrente nas empresas e também fora delas. O corporativo ainda está entendendo como iniciar essa pauta e qual o papel de executivas e de executivos como pessoas aliadas da inclusão. O importante é ter atitude para começar. A primeira delas é humildade para assumir que está em aprendizagem. Estamos todos em desconstrução, mas isso não justifica nossas falhas. Os erros servem para provocar mudanças de comportamento. A segunda atitude é entender a interseccionalidade, porque não é possível se posicionar como pessoa justa e inclusiva se levantamos apenas uma das bandeiras de grupos minorizados. Precisamos considerar as necessidades de todas e todos como caminho na jornada de inclusão. 32 PODER JOYCE PASCOWITCH

A terceira atitude é reconhecer a nossa condição de privilegiadas e privilegiados, o que não anula nossos esforços, mas nos ajuda a entender que com os mesmos esforços ainda há pessoas que tiveram menos oportunidades. A quarta atitude é saber a diferença entre ser uma pessoa aliada e ser uma pessoa simpatizante da inclusão. Essa última fica de fora, não se envolve e assim não mobiliza pessoas. O aliado precisa entender e valorizar o que tem sido feito para contribuir sobre inclusão. Seguir pessoas dos grupos minorizados nas redes sociais é um começo para conhecer as novas formas de entender a vida. Também é importante compartilhar os conteúdos nas nossas redes, no ambiente de trabalho, na família e onde mais estivermos presentes. A quinta atitude de pessoas aliadas da inclusão é o incômodo contra as injustiças. É sentir-se verdadeiramente atingido com as piadas que ofendem e excluem pessoas por sua raça, credo, caraterísticas etc. A sexta atitude é a reação para nos posicionarmos contra o fortaleci-

mento do capacitismo, machismo, racismo, homofobia etc. Todas as formas de discriminação que nunca estão sozinhas. Sempre tem alguém para rir, concordar ou dar continuidade à exclusão. Mesmo sob o risco de ter o rótulo de “a pessoa chata da inclusão”, que pode inibir nossas reações, precisamos apontar e desconstruir esses comportamentos. Uma forma amistosa é assumir estar junto nessa desconstrução, com exemplos próprios. Uma pessoa aliada entende sua importância como agente da humanização das atitudes para a transformação contra as injustiças e fazer do mundo um lugar realmente bom para todas e todos. n

Carolina Ignarra é CEO da Talento Incluir, consultoria que já inseriu mais de 8 mil profissionais com deficiência no mercado de trabalho. É autora de dois livros: Inclusão e Maria de Rodas – Delícias e Desafios na Maternidade de Mulheres Cadeirantes

FOTOS GETTY IMAGES; MÁRCIO NEVES/DIVULGAÇÃO

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ESPELHO

DE DENTRO PARA FORA

Nini Andrade Silva, prestigiada designer de interiores, tem as pessoas e suas histórias como inspiração de trabalho e sua arte é marcada pela multiculturalidade POR CAROLINE MARINO

FOTO PAULO FREITAS

A

portuguesa Nini Andrade Silva, designer de interiores, costuma dizer que seus projetos nascem de dentro para fora, algo que se inicia no espírito, percorre o desenho e conflui na matéria. “Não é o que se vê, mas o que se sente”, afirma. Assim, no centro de cada trabalho que desenvolve estão as pessoas e suas histórias, com um toque da cultura de cada local. Com assinatura marcada pela identidade das formas – sempre orgânicas e fluidas – e por contrastes sutis para enfatizar a beleza de espaços e objetivos, Nini, que nasceu em Funchal, capital do arquipélago da Madeira, formou-se em design no Instituto de Artes Visuais, Design e Marketing, em Lisboa, e seguiu seu percurso de conhecimento pelo mundo – passou por locais como Nova York, África do Sul e Dinamarca. “Quando comecei a trabalhar, tive um sócio inglês e atuei na Inglaterra. De lá para cá passei por muitos lugares para aprender e me inspirar em diferentes culturas”, conta. Seu primeiro reconhecimento veio com o prêmio de Andrew Martin, em Londres, que analisa trabalhos no mundo todo. Depois disso não parou mais. Acumula mais de 50 premiações, como o de melhor design de interiores das Américas para o Hotel B.O.G no International Hotel & Property Awards. Nini

também é autora de linhas de mobiliário que incluem cadeiras, sofás e mesas, e de peças utilitárias e decorativas. “Conto histórias e é isso que torna meu design diferente. É comum ouvir relatos de pessoas que, ao entrarem em um hotel, por exemplo, sabem que lá tem minha assinatura”, afirma Nini. E como uma boa contadora de histórias, ela é cidadã do mundo e adora conhecer pessoas e lugares diferentes. De sorriso aberto, e olhos vivos e cheios de vontade de criar e se envolver genuinamente, Nini tem amigos nos quatro cantos do planeta. Recentemente esteve no Brasil para reuniões sobre o projeto de design que está desenvolvendo para a nova unidade da rede W Hotels e W Residences, em São Paulo, prevista para 2023. “Esse projeto é muito significativo. Estar no Brasil é uma alegria e volto a Portugal com um pouquinho dos brasilei-

ros em mim”, revela. Segundo Nini, a concepção é toda inspirada no Brasil, numa fusão de culturas, raças, cores e paixões, reinterpretada por meio de um traço de vanguarda e irreverência das formas. Ela antecipa que terá suas peças interpretadas por artistas brasileiros e, no último andar, haverá uma homenagem ao arquiteto Oscar Niemeyer. O ateliê de Nini projetou espaços exclusivos, recorrendo a materiais, cores, formas e texturas inspiradas na alma brasileira. Além da parte tradicional de um hotel, haverá restaurantes, bares, teatros, spa, uma área dedicada a convenções e uma piscina no topo do prédio para a realização de festas à noite. O W Residences, com apartamentos de 53 m2 a 102 m2 ainda possui unidades à venda. “Será um local de muita vida e um ponto de encontro multicultural entre os turistas e os brasileiros.” n PODER JOYCE PASCOWITCH 33


CULTIVANDO

O AMANHÃ

Para atender à crescente demanda alimentar, indústria e pesquisa apostam na proteína cultivada

A

Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) estima que em 2050 haverá 10 bilhões de pessoas no planeta e uma das principais preocupações é como alimentar a crescente população. É nesse contexto que novas opções de produção de alimentos têm ganhado espaço.

Além da proteína à base de plantas, tendência cada vez mais popular que reproduz textura e sabor da proteína tradicional, há também a busca pela produção em escala da proteína cultivada, desenvolvida por meio de pesquisa celular. Como um dos maiores produtores de alimentos do mundo, o Bra-

PROCESSO DE PRODUÇÃO DA PROTEÍNA CULTIVADA As células-tronco são retiradas de animais vivos

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JOYCE PASCOWITCH

As células são cultivadas com nutrientes específicos para sua proliferação

sil desempenha um papel central de ser vanguarda e protagonista no mercado, tanto aprimorando-se em setores já consolidados quanto no investimento pesado em pesquisa e tecnologia para despontar em novos mercados, como o de proteínas alternativas. “Temos papel estratégico na oferta global de alimentos”, explica Raquel Casselli, diretora de engajamento corporativo do GFI Brasil (The Good Food Institute), entidade que atua para o fortalecimento do ecossistema de proteínas alternativas junto às empresas, à academia e também agentes públicos. “Embora tenhamos começado depois de alguns países, as iniciativas em desenvolvimento são consistentes e têm o potencial de garantir vantagens expressivas ao Brasil. Temos convicção que esse será mais um setor que o nosso agronegócio poderá liderar globalmente.” Líder global na produção de alimentos à base de proteína, a JBS tem olhado com atenção para a proteína cultivada como opção alimentar. Recentemente, a companhia realizou dois movimentos importantes.


ILUSTRAÇÕES FREEPIK; FOTOS GETTY IMAGES; PAULO VITALE/DIVULGAÇÃO

Com um aporte de US$ 41 milhões, a empresa assumiu, em 2021, o controle da espanhola BioTech Foods, uma das líderes no desenvolvimento de biotecnologia para a produção de proteína cultivada. Posteriormente, em maio de 2022, anunciou a criação de um centro de pesquisas em alimentos, o JBS Biotech Innovation Center, em Santa Catarina, com investimento previsto de US$ 60 milhões nos próximos quatro anos. Nesse primeiro momento, a empresa concentrará esforços na construção de instalações especializadas para o desenvolvimento de tecnologia 100% nacional para a produção de proteína cultivada e da planta piloto, bem como na aquisição dos insumos necessários para a realização das pesquisas. “O movimento que está sendo consolidado por meio do JBS Biotech Innovation Center é inédito no Brasil. Não há nada nesse porte em desenvolvimento no segmento, seja pela iniciativa privada ou por investimentos públicos”, diz o cientista Luismar Porto, presidente do JBS Biotech Innovation Center, ressaltando que “o investimento da JBS no mercado de proteína cultivada é, de longe, o mais relevante entre as empresas brasileiras”. Além de Porto, que foi cientista visitante da Harvard University e do Massachusetts Institute of Technology (MIT), o projeto contará com cerca de 25 pesquisadores e será liderado também por Fernanda Vieira Berti,

vice-presidente com passagem pelo Research Institute I3Bs e criadora de uma startup incubada no Vale do Silício (EUA) que desenvolveu produtos baseados em medicina regenerativa e células-tronco para o tratamento de animais. “Temos certeza de que se trata de um mercado promisO cientista Luismar Porto e a vice-presidente do JBS sor e que proporcioBiotech Innovation Center, Fernanda Vieira Berti nará seus primeiros resultados em médio prazo”, garante Fernanda. “Enten- le da produção e da segurança do demos que quando estiver em fase alimento”, afirma a especialista de comercial, a proteína cultivada che- ciência e tecnologia do GFI Brasil, gará inicialmente aos consumidores Amanda Leitolis. na forma de alimentos preparados, Apesar da proteína alternativa como hambúrgueres, embutidos, al- ainda ser um mercado em fase inimôndegas, entre outros.” cial, o setor está em franco cresciDe forma resumida, a produção de mento. Segundo o GFI, as empresas proteína cultivada acontece a partir de proteína e frutos do mar cultivada multiplicação de células dentro dos faturaram US$ 1,4 bilhão em de biorreatores em ambiente fabril. 2021 frente aos US$ 400 milhões O produto final contém os mesmos no ano anterior. Países como Cintipos de células que formam o teci- gapura, que já aprovou a comerciado muscular dos animais, portanto, lização de proteína cultivada para tem potencial para replicar o perfil consumo, e Holanda, em vias de sensorial e nutricional da proteína aprovar a legalização, são os piobovina tradicional. neiros. Nos Estados Unidos, star“Esse processo pode gerar prote- tups têm discutido com os órgãos ína cultivada com a mesma espes- reguladores locais a aprovação do sura, textura e características sen- produto no país. E o Brasil, com soriais e nutricionais dos cortes de terreno fértil no ecossistema, poscarnes tradicionais, com inúme- sui as condições necessárias para se ras vantagens, como mais contro- tornar líder em mais um setor.

Células são selecionadas e estruturadas Biorreatores ampliam a capacidade produtiva das células

A proteína cultivada é preparada para ser embalada e comercializada

A proteína é utilizada na produção de alimentos como hambúrgueres, embutidos, almôndegas, entre outros

PODER JOYCE PASCOWITCH 35


CAOS

A VIDA PÓS BURNOUT

Quem já sofreu com a síndrome sabe que ela deixa cicatrizes, mas dá para seguir em frente com mais consciência – e evitar a recaída POR CAROLINA MELO

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ores de cabeça e de estômago, insônia, cansaço físico e mental, sensação de impotência, dificuldade de concentração. Mesmo quem não viveu um burnout já está familiarizado com os principais sintomas da síndrome. As histórias se acumulam e é raro não conhecer alguém que tenha sofrido com a condição que ganhou, em janeiro deste ano, nova definição pela Organização Mundial da Saúde (OMS): “estresse crônico associado ao local de trabalho que não foi adequadamente administrado’’. Embora seja fácil listar os males causados, falar sobre as estratégias de cura são outros quinhentos porque as alternativas variam de acordo com cada pessoa e com as diferentes experiências vividas. Mas há algo em comum compartilhado por todos aqueles que já superaram um burnout e seguiram adiante: mudar a relação com o trabalho e, consequentemente, o estilo de vida é imprescindível para não ter uma recaída. “Uma vez diagnosticado, é essencial identificar os fatores de risco que desencadearam o primeiro burnout para evitar que o episódio se repita no futuro’’, diz o psiquiatra Rodrigo Bressan, professor da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp) e presidente do Instituto Ame Sua Mente. A psicóloga Ilana Pinsky, consultora da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e coautora do livro Saúde Emocional: Como Não Pirar em Tempos Instáveis, explica que a melhor estratégia para não reviver um burnout consiste em separar a vida pessoal da profissional. Para ela, a relação com o trabalho deve ser pensada como um casamento, em que se deve questionar o vínculo e entender o que há de positivo e de negativo nele, fazendo os ajustes neces-

sários. ‘’Não há receita pronta, o que cura o burnout de uma pessoa não necessariamente vai resolver o problema de outra. Deve-se pensar em estratégias individuais. Há quem se sinta isolado com o home office, e entra em conflito com o trabalho porque o contato com pessoas é indispensável para seu desempenho. Em outros casos, é graças ao trabalho a distância que o indivíduo consegue investir na qualidade de vida, blindando-se contra o esgotamento profissional’’, diz.

LONGE DA TOXICIDADE

De acordo com o psiquiatra Roberto Aylmer, médico e consultor de liderança especializado em burnout, as pessoas que vivem um episódio de esgotamento costumam seguir em frente mais atentas à saúde mental e ao autocuidado. Aylmer crê que elas aprendem a não tolerar um ambiente de trabalho tóxico, onde haja qualquer tipo de opressão, aceitando com mais facilidade o risco de ficar desempregado. ‘’Não há como viver um burnout, afastar-se por um período e voltar para a mesma condição de antes. Alguma mudança precisa acontecer, seja com a chefia, equipe, cargo, empresa, área de atuação e até a cidade ou o país. O melhor antídoto para curar uma relação abusiva com o chefe, por exemplo, é ter um novo responsável e receber feedback positivo dele, compreendendo que o problema não estava em sua performance como profissional’’, explica Aylmer. A administradora pernambucana Renata, de 33 anos (o nome foi trocado a pedido), viveu uma experiência desse tipo há dois meses, com a chegada de um novo chefe que foi-lhe afastando gradativamente de suas funções dentro da empresa. As críticas sobre

seu desempenho – muitas vezes em tom ofensivo – passaram a ser recorrentes. Prostrada e sem ânimo para levantar da cama, precisou de crises de choro para entender que sofria assédio moral – o simples fato de ver o nome do chefe na tela do celular já causava pânico. Renata buscou ajuda psiquiátrica e, com o diagnóstico de burnout estabelecido, tratou a fase aguda da síndrome com afastamento imediato do trabalho e administração de antidepressivos. Mas a cura definitiva veio de outras formas. Ela dialogou com ex-chefes para recuperar a autoestima perdida e ver reconhecido seu valor como profissional, reviveu um antigo desejo de realizar uma pós-graduação e mergulhou no desenvolvimento de uma mar-

‘‘É essencial identificar os fatores de risco para evitar que o episódio se repita no futuro” Rodrigo Bressan professor da EPM/Unifesp e presidente do Instituto Ame Sua Mente PODER JOYCE PASCOWITCH 37


‘‘Não há receita pronta. O que cura o burnout de uma pessoa não necessariamente vai resolver o problema de outra”

LA VIE EN ROSE

Para o engenheiro argentino Santiago Campos, 36 anos, a cura do burnout não estava dentro da empresa. Após quatro anos trabalhando como gerente de projeto em São Paulo, Santiago se viu atropelado por uma carga de trabalho excessiva, que lhe afastava cada vez mais dos momentos que deveriam ser dedicados ao descanso e lazer. O diálogo com a chefia sobre o problema não trouxe soluções para o esgotamento e ele buscou ajuda psicológica com uma equipe da própria empresa que, paradoxalmente, possuía uma espécie de programa de combate ao estresse no trabalho. ‘’Eles incentivaram o uso de ansiolíticos, mas eu não queria tomar remédio para continuar no mesmo cenário de exaustão. Foi ali que entendi que precisava mudar radicalmente’’, conta. O engenheiro se candi-

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Ilana Pinsky consultora da Organização Pan-Americana da Saúde

ca de óleos essenciais destinados a mães e bebês – um sonho que já estava em andamento e ganhou força durante o burnout. Já convencida de que deveria procurar um novo emprego, Renata foi informada pelo RH da empresa que ela seria realocada para uma nova equipe. ‘’Me restabeleci como profissional, aprendi a ler os sinais e entendi que era importante nutrir minhas habilidades sem depositar todas as expectativas em uma empresa. Se a mudança de equipe não tivesse ocorrido, eu já estava com todas as ferramentas necessárias para me recolocar no mercado. E sigo na terapia porque a saúde mental vale ouro’’, conclui.

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datou a uma vaga na companhia Airbus, na França, e pouco tempo depois já estava de malas prontas para embarcar para Toulouse, berço da empresa francesa. As lições do burnout, contudo, não foram esquecidas: “Aprendi a reconhecer meus limites e a dizer ‘não’ quando percebo que não posso dar conta de uma tarefa. O e-mail da empresa não está mais conectado ao meu celular. Faço pausas durante o dia para conversar com meus colegas sobre outros assuntos que não sejam relacionados ao mundo profissional. E quando o expediente acaba, todo mundo fecha o computador e vai embora, mesmo que o mundo esteja caindo. O trabalho não vai pra casa, é outra relação’’. As estratégias adotadas por Santiago estão alinhadas com

APAGANDO O INCÊNDIO

O que fazer para evitar um novo burnout - O basicão: praticar exercícios físicos, ter alimentação saudável e boa rotina de sono, reduzir consumo de bebidas alcoólicas - Certifique-se de que trabalha em ambiente em que haja abertura para o diálogo, caso preciso - Entenda o que funciona melhor para sua rotina de trabalho, incluindo uma pausa maior durante a jornada, ou, ao contrário, tentando sair mais cedo - Aprenda a delegar - Faça pequenas pausas durante o expediente e evite falar – e pensar – sobre trabalho durante esse período - Evite ler e-mails do trabalho durante os momentos de descanso - Valorize o ócio: não realizar tarefas o tempo todo também é importante - Tenha sempre em mente o que lhe conecta com aquele trabalho ou com aquela empresa

‘‘O melhor antídoto para curar relação abusiva com chefe é ter outro responsável e receber feedback positivo” Roberto Aylmer médico e consultor em liderança

a ciência. Um estudo publicado em 1995 no periódico científico Journal of Occupational Health Psychology já falava sobre a importância de utilizar o tempo ocioso para se desligar do trabalho e se recuperar do estresse causado – praticar exercícios físicos, encontrar amigos, assistir televisão e ficar deitado no sofá, sem fazer nada, foram exemplos de atividades propostas. Naquela época, o telefone celular já era considerado como possível vilão contra a reabilitação do esgotamento cau-

sado pelo trabalho. Mais recentemente, em 2016, uma pesquisa realizada pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, apontou a importância de realizar pequenas pausas, com duração de até dez minutos, durante o expediente, desconectando-se das funções profissionais. O estudo mostrou uma melhora nos níveis de concentração, motivação e humor dos funcionários, comprovando que longas horas de trabalho não tornam ninguém mais produtivo. n PODER JOYCE PASCOWITCH 39


OPINIÃO

BETANIA TANURE

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avegar é preciso, viver não é preciso.” Convido você, leitor, a embarcar comigo nesta reflexão sobre você, sobre sua empresa, sobre sua vida. Ventos inesperados como os da pandemia contribuem para uma situação instável para as pessoas e para a empresa: 61% do tempo de trabalho dos executivos brasileiros não agregam valor ao negócio. Terrível, não? Esse é o dado de pesquisa que fizemos na BTA em junho deste ano. Um efeito disso vai além do resultado empresarial: a sensação de que se trabalha, trabalha, trabalha e não se sente produtivo, o que aumenta o grau de insatisfação e infelicidade pessoal. Como sair dessa armadilha pantanosa? A primeira atitude é distinguir as suas competências reais daquelas que, às vezes inebriado pelo poder, você imagina ter. Há três dimensões de competência: a obje-

pode-se estar em uma superequipe. Nela é possível revezar as competências, que se complementam. Afinal, ninguém é perfeito, mas uma equipe pode ser! Em que águas culturais o seu barco navega? Águas autoritárias, como 65% das empresas brasileiras, que se dizem abertas mas não são? Águas relacionais, como a grande maioria, onde o benefício de tocar a alma e o coração das pessoas se contrapõe à falta do feedback assertivo, da meritocracia, da distinção entre profissional e pessoal? Águas flexíveis, atributo cultural fundamental em mares instáveis, que por vezes extrapola para a indisciplina, face sombria da flexibilidade. Não há porto seguro, vivemos uma era de incertezas. Cuidado para não se encantar magicamente com o metaverso e fugir da realidade. O fio terra são os princípios e o propósito claros e compartilhados, estrela guia nos momentos em que a incerteza turva a clareza sobre o futuro. Estamos todos no mesmo barco. A desunião, a raiva e a explosão, tão comuns em nosso querido Brasil de hoje, não nos ajudam a chegar a um bom porto. Saber navegar também contra o fluxo natural é característica chave do líder. Esses são os principais temas do nosso novo livro, Você e Seu Barco, lançado neste mês de agosto. É preciso navegar! Bem-vindo a bordo! Embarque conosco e tenha uma boa viagem! n Betania Tanure é professora e consultora da Betania Tanure Associados (BTA). Atua na área de gestão, cultura empresarial e formação de equipes de alta performance

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VOCÊ E SEU BARCO

tiva, a subjetiva e a política. Elas se manifestam individualmente, mas “transbordam” para a equipe e para a cultura da organização. A objetiva é a mais presente: nela estão 68% dos executivos, enquanto apenas 15% estão na subjetiva. Aquele que integra as duas primeiras dimensões e agrega a elas a de caráter político (atenção, não falo de politicagem!) pertence aos 7% de dirigentes, não importa a posição hierárquica. Ele pode ir além, trabalhar a sua competência política de modo a transformar positivamente o seu entorno, a sociedade, a realidade do seu país e tornar-se um dirigente estadista, dimensão que o Brasil tanto precisa atingir. Nas empresas, apenas 5% dos dirigentes a alcançaram. Quanto aos 10% que completariam o quadro das três dimensões, pasme!: nesse grupo não se reconhece nem competência objetiva, nem subjetiva, nem política. Se você precisa mudar, ou quer ser ainda melhor, olhe-se no espelho, sem véu, e mãos à obra! Em um mundo que vive crises radicais e complexas, não é possível ser um superdirigente o tempo todo, mas


JUSTIÇA E SENSIBILIDADE

À frente de casos complexos e midiáticos, a advogada criminalista Izabella Borges inaugura escritório butique no Jardim América e propõe um novo olhar para o Direito

FOTO PAULO FREITAS

“S

empre fui apaixonada pela natureza humana.” É dessa forma que a advogada criminalista IZABELLA BORGES abre a conversa com PODER para falar sobre o caminho que percorreu na advocacia – e fora dela – para se tornar especialista em casos de violência doméstica e familiar. A carreira teve início em um escritório butique em que atuava prioritariamente em crimes financeiros. Ao abrir seu escritório, em 2016, a expertise em direito penal econômico a levou para casos de fraudes patrimoniais que ocorriam no âmbito familiar. “Atuar como advogada criminal é lidar com pessoas nos piores momentos de suas vidas. É preciso humanizar o atendimento”, conta ela que passou a estudar psicologia e psicanálise para atender melhor os clientes – em sua maioria mulheres – vítimas de violência física, psicológica e financeira. “Assim formamos o primeiro escritório butique de São Paulo especializado em violência doméstica e familiar, com metodologia interdisciplinar de trabalho e ênfase no acolhimento de cada cliente”, explica a advogada que trabalha com equipe multidisciplinar e está obtendo decisões favoráveis ao trazer teses inovadoras para os tribunais. Com isso, esteve à frente de casos complexos e midiáticos, como da apresentadora Luisa Mell e da atriz Duda Reis. Inclusive com Duda, a parceria extrapolou as cortes e a dupla hoje é responsável pelo Instituto Survivor, que apoia mulheres em situação de violência doméstica. “Sempre quis desenvolver um trabalho social para mulheres em situação de vulnerabilidade. No escritório fazemos atendimento pro bono, mas não conseguíamos atender toda a demanda”, explica Izabella, que está em fase de expansão, com a inauguração do novo escritório no Jardim América em agosto.


Quantas vezes você teve dificuldade de lembrar um dado importante? Ou esqueceu onde salvou um artigo essencial para um projeto? Conheça uma metodologia que ajuda a melhorar a capacidade de armazenar informações POR CAROLINE MARINO


ILUSTRAÇÕES GETTY IMAGES

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o mundo hiperconectado em que vivemos, as informações vêm de todos os lugares – WhatsApp, apps, televisão, e-mail, o diabo. Uma estimativa, feita pela Universidade da Califórnia-San Diego de 2019, apontava que as pessoas são bombardeadas diariamente com o equivalente a 35 GB de informações, uma quantidade suficiente para sobrecarregar um computador em uma semana. No entanto, segundo dados de outra universidade, a de Berna, na Suíça, as pessoas conseguem ler, no máximo, em torno de 350 páginas por dia – o equivalente a 590 KB. “Vivemos uma fase desafiadora, com acesso a dados o tempo todo. Em um mesmo dia, você assiste a um vídeo, ouve um podcast e lê reportagens, material que poderia servir de inspiração para o desenvolvimento de um projeto, por exemplo, mas não é possível memorizar as partes de que precisa por conta do volume”, diz Valéria Oliveira, consultora da escola de negócios HSM, e especialista em temas comportamentais. Ou seja, o que acontece é que você se esforça para lembrar a ideia por trás de um artigo que leu recentemente e perde tempo procurando onde salvou o vídeo que seria importante para uma apresentação. Como, então, absorver tanto conhecimento e conseguir usá-lo para produzir melhor, ter insights e não ficar à deriva? Tiago Forte, brasileiro radicado nos Estados Unidos especializado em produtividade, autor de Building a Second Brain: A Proven Method to Organize Your Digital Life and Unlock Your Creative Potential (Construindo um

CONTROL Z

Segundo Cérebro: Um Método Comprovado para Organizar Sua Vida Digital e Desbloquear Seu Potencial Criativo, em tradução livre), crê ter uma solução. Ele sugere usar o aplicativo de notas do seu celular e, a partir daí, aperfeiçoar o sistema com o uso de outros recursos. É isso mesmo que você leu: Tiago fala em “segundo cérebro”. A ideia é simples, de acordo com ele. Basta pensar em um caderno, daqueles simples, que você usava na escola, para anotar ideias, ansiedades e reflexões sobre a vida. Pegue esse caderno e expanda seu uso para desenhar projetos e metas. “Nossa memória é limitada, e o segundo cérebro vem justamente para nos ajudar por meio dessas anotações”, explica. A etapa seguinte é digital. “Seu celular, tablet ou computador podem guardar links, citações, PDFs, livros. Com isso, você consegue criar o melhor segundo cérebro possível”, conta. Para ele, construir esse aparato é registrar 10% de uma ideia que parece aprovei-

tável para usar no futuro. “Fazendo isso por mais de dez anos, guardando uma ou duas notas por dia, você vai ter criado mais de 600 pedaços de conhecimento útil”, afirma. Ele sugere alguns apps, como Evernote, Craft Google Keep e Simplenote. E, para auxiliar nesse processo, desenvolveu o que chamou de metodologia Code, processo criativo de fazer anotações e usá-las para produzir novos trabalhos ou para subsidiar a tomada de decisões (veja mais no quadro da pág. 45).

MAIS PRODUTIVIDADE E IDEIAS

Na visão de Cinthia Alves, psicóloga especializada em desenvolvimento humano e mudança de comportamento, a experiênPODER JOYCE PASCOWITCH 43


MENTE ORGANIZADA

As quatro etapas do método desenvolvido pelo especialista Tiago Forte

ORGANIZAR Agora é necessário estruestruturar um sistema para guarguardar as informações. Tiago Forte recomenda organizar suas notas em torno de proprojetos e metas. “Muitas pespessoas gostam de criar categocategorias, como negócios, ideias, marketing, mas isso pode até servir para uma bibliobiblioteca, mas não para sua vida pessoal”, diz. Segundo ele, o ideal é criar uma pasta para cada projeto ou meta, e inseinserir as informações ali.

DESTILAR (OU REFINAR) Hora de usar a tesoura. Ao captar informações de um lilivro, talvez só cinco ou dez frafrases sejam realmente importanimportantes. Tiago sugere uma pergunta para ajudar nesse processo: “Quais ações e conclusões vovocê quer tirar desse conteúdo para colocar na sua vida?”. EXPRESSAR O objetivo de fazer anotaanotações não é apenas registrar ininformações de um certo modo é, na verdade, ter uma ferraferramentea de expressão – a expresexpressão de sua voz, de sua história, de sua mensagem, de sua exex periência. “O segundo cérebro existe para você se expressar melhor. Significa ter mais matématéria-prima e fontes”, explica o esespecialista. Para Tiago Forte, essa etapa se assemelha a juntar pepeças de Lego para ter algo maior, novas ideias para se comunicar bem. “Tudo isso serve para memelhorar nossa comunicação e nos tornar mais eficazes e criativos.”

‘‘Num mundo em que somos desafiados a inovar, saber que temos a informação registrada traz segurança e diminui a ansiedade” Valéria Oliveira, consultora da HSM

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CAPTURAR A primeira etapa é simsimples: escrever tudo aquiaquilo que achar interessante. Quando a informação está apenas em sua cabeça ou lá fora, vagando pelo mundo, o conteúdo ainda não é seu. Você tem de capturá-la e ininseri-la em seu “laboratório” particular. Ou seja, não sosomente memorize aquilo que o interessou, registre.


única forma de resolver nossas demandas. Se não estivermos atentos para questionar o porquê fazemos as coisas – e, mais ainda, como fazemos –, corremos o risco de ficar apenas no piloto automático, restringindo nosso campo de experiência e aprendizagem ao que já funcionou algum dia”, revela. Além disso, Cinthia explica que a memória é afetiva, engenhosa estratégia de sobrevivência para que não fiquemos paralisados por conta de traumas do passado, e, com isso, para armazenar alguma nova informação ou registrar sensações, é fundamental estar com atenção plena no que se está vivendo. “Quanto mais recursos utilizarmos para educar nossa mente para o direcionamento do foco, mais memória disponível teremos”, informa. Os benefícios do método são muitos. A partir do momento que você consegue organizar as informações, aumenta seu repertório e consegue trabalhar com mais criatividade e foco. “Num mundo em que somos desafiados a inovar, saber que temos a informação registrada quando precisarmos dela traz segurança e diminui a ansiedade”, diz Valéria, da HSM. Isso sem falar que, com mais cia de registrar e, assim, prestar mais atenção às notas feitas, aumenta o nível de consciência e, consequentemente, a intencionalidade para as ações e para o melhor uso do tempo. Isso porque a neurociência já identificou que a mente tem um gasto calórico significativo toda vez que tem algo novo para lidar. Assim, identifica de forma automática quais comportamentos atendem às nossas necessidades e fazem deles hábitos. E isso pode ser um problema. “Nossos hábitos, por mais funcionais que sejam, nem sempre são saudáveis e podem não ser a

O especialista Tiago Forte

conhecimento, você tem uma visão ampla e consegue com facilidade pensar em soluções e contribuir com seus circunstantes. n

‘‘Nossos hábitos nem sempre são saudáveis. Se não estivermos atentos para questionar o porquê fazemos as coisas, corremos o risco de ficar apenas no piloto automático” Cinthia Alves, psicóloga PODER JOYCE PASCOWITCH 45


RESPIRO

Não que faltassem conflitos pelo mundo desde que Mash, filme do grande Robert Altman, chegou às telas, na virada para os anos 1970. Mas os cirurgiões de um acampamento militar em plena guerra da Coreia tornaramse personagens clássicos da comédia cinematográfica. Os incorretíssimos Capitão Hawkeye Pierce e Trapper John McIntyre, interpretados por Donald Sutherland e Elliott Gould, cumprem bastante bem o interminável serviço, e isso é o que parece importar. Na vida real, os Estados Unidos perderam cerca de 35 mil homens numa guerra sanguinária que deixou como legado cerca de 2 milhões de mortos e a divisão aparentemente perpétua do país asiático. E parecem não ter aprendido a lição, pois, cerca de uma década depois, as forças ianques iniciavam um pesadelo ainda maior no Vietnã.

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RISO NA GUERRA



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O NOVO ÍCONE DOS JARDINS

de projetistas, como Grazzieli Gomes Rocha, sócia-diretora Aflalo/Gasperini Arquitetos. Grazzieli destaca a localização como uma das muitas vantagens do empreendimento. “Jardins é um bairro extremamente tradicional, tem qualidade urbana, com árvores e vegetação. É um lugar agradável para passear do ponto de vista urbanístico.” Fernanda Marques, arquiteta de in-

teriores, considera o bairro um sonho de consumo de grande parte dos paulistanos. “Os futuros moradores terão a sensação de morar no meio de um jardim, dentro da cidade”, comenta.

CONFORTO O edifício terá duas torres, uma delas com dois apartamentos por andar. Na outra, um único imóvel

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Imagine morar numa das esquinas mais icônicas dos Jardins, bairro nobre de São Paulo. Agora, pense em um edifício com apartamentos amplos e em sintonia com a metrópole. Essa é a proposta do HELBOR JARDINS POR ARTEFACTO, um residencial exclusivo com unidades de altíssimo padrão em um dos endereços mais cobiçados da capital: alameda Lorena com a rua Haddock Lobo. Com conceito moderno e sofisticado, o projeto tem realização da Helbor e Toledo Ferrari em parceria com a Artefacto, empresa especialista em mobiliário de alto padrão e que assina todos os móveis das áreas comuns do Helbor Jardins. “A parceria vem de longa data, mas é a primeira vez que começa já na concepção do empreendimento”, diz Fabiana Lex, diretora de marketing da Helbor. Para transformar a ideia em realidade, foi chamado um time renomado


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em todo o pavimento. “Vamos explorar muito essa questão das áreas sociais voltadas para a rua”, conta Roberto Aflalo Filho, sócio-diretor Aflalo/Gasperini Arquitetos. Com 322 m2 ou 372 m2 privativos, o projeto traz quatro suítes, sendo uma master com terraço e closet. Quem escolher uma dessas duas opções ainda irá desfrutar de quatro vagas de garagem, hall social, sala de estar/jantar com terraço coberto, sala íntima. Os apartamentos também possuem lavabo, cozinha com copa, área de serviço, depósitos e área verde interna. As unidades garden são uma atração à parte. Com opções de 397 m2 ou 591 m2 privativos, têm terraço

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descoberto e cinco vagas de garagem. Vale lembrar que a área para os carros conta com carregadores de veículo elétrico ou híbrido, além de vagas preferenciais. Nas áreas comuns, os moradores poderão aproveitar lobby, salão de festa, piscina coberta e climatizada, sauna, sala de massagem, brinquedoteca, fitness, playground, espelho d’água e jardins. Vale a pena conferir. VISITE O STAND DE VENDAS: ALAMEDA LORENA, 1.717 – JARDINS TEL: 11 3085-4880 https://www.helbor.com.br/ imoveis/jardinsartefacto

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Acima, a elegância da área comum, onde os moradores podem desfrutar da piscina coberta e climatizada, além da ampla área verde, um convite ao relaxamento. Abaixo, o conforto do hall e a academia superequipada.



ENSAIO

Paulo Vieira aprendeu cedo a transformar o riso em arma, conquistou TV e publicidade e quer levar para o horário nobre um país que não costuma se ver ali

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por amauri arrais

esde que se tornou onipresente na programação da TV Globo, Paulo Vieira tem recebido todo tipo de convite. Em um deles, foi incluído num grupo de WhatsApp de antigos colegas da época da escola que trocavam fotos em que o agora amigo famoso aparecia: “Olha eu, fulano e o Paulo”. O ator e humorista de 29 anos diz ter rido ao ver as imagens: todas mostravam uma criança rechonchuda em segundo plano, comendo um lanche sem encarar a câmera por não ter sido chamada para posar. “Na escola eu era do time perdedor, mas como todo bom hipster fiz do fato de ser perdedor um estilo de vida”, diverte-se. Nascido no interior de Goiás, Paulo se mudou criança com a família para Palmas, capital do Tocantins, onde começou a fazer teatro aos 5 anos. Dessa época, lembra de já querer trabalhar na televisão para melhorar de vida e também das brincadeiras com a mãe, Conceição, que incentivava a imaginação dos dois filhos com personagens como “as crianças educadas” quando havia visita em casa. Paulo aprendeu cedo a usar o humor como arma, reação ao “absurdo da vida”. Com um desses absurdos se deparou já na adolescência, ao perceber que não se enquadrava no grupo dos meninos que podiam paquerar quem quisessem. “No colégio, eu sabia que não era

fotos pedro dimitrow uma opção de namoro porque era preto e gordo. O preto mais padrão da minha turma já não namorava.” Com a família, que sempre foi fonte de inspiração, aprendeu a rir dos próprios dramas cotidianos. “A gente é um povo muito bem-humorado, que garimpa a risada como se fosse um diamante”, descreve. O pai, Luisão, virou personagem de um dos fios famosos do aplicativo, acompanhado pelos seus mais de 600 mil seguidores no Twitter: as histórias de empreendedorismo fracassado com o amigo Pablo devem virar série no Globoplay. Paulo conquistou seu espaço na TV como assistente de Fábio Porchat na Record, depois de se destacar em competições de humor. Desde os primeiros quadros, como o “Emergente Como a Gente”, consegue fazer graça com a classe C, raro caso de comediante que não foi cancelado pelo tribunal da internet. Ele acredita que, embora o tema principal de seu trabalho sejam as diferenças sociais, seu assunto são as pessoas. “O rico acha que o pobre é um eterno não ganhador da Mega-Sena, quando ele é muito mais complexo que isso. A falta de dinheiro atravessa o pobre, mas ele também tem vontades, sonhos, ele dá um jeito de rir.” O ator também vê uma evolução de como a televisão passou a mostrar essa fatia do público. Quando apresentou o projeto do seu programa mais recente, o Avisa Lá que Eu Vou, à Globo, sentiu que havia em algumas pessoas uma expectativa por histórias e personagens pitorescos. Na atração do GNT, que ganhou quadro no Fantástico, viajou por dez cidades do interior do Brasil conversando com pessoas comuns. Os espectadores contaram nas redes terem se comovido com alguns relatos.


Costume L’aura Alfaiataria, blusa acervo, óculos Moon Eyewear, tênis Converse, relógio Hugo Boss para Vivara, acessórios Skull


Calça, colete e camisa L’aura Alfaiataria, gravata acervo, tênis Nike, relógio Hugo Boss para Vivara, acessórios Skull



“Acho que a diferença de tom é porque [o programa] se apresenta de maneira afetiva. Não tem como eu ridicularizar minha mãe. É um programa bem-humorado, mas o objetivo final dele não é fazer rir”, define o apresentador, que não esconde a empolgação com a atração de que mais se orgulha. Paulo também já atraiu muitos fãs – e haters – por deixar claras suas opções políticas. Num vídeo célebre, apareceu com a namorada exibindo uma bandeja de doces na volta do casamento do ex-presidente Lula com a socióloga Janja, em maio. Logo após a eleição de 2018, diz ter sofrido muitas ameaças na internet de apoiadores de Jair Bolsonaro durante o espetáculo em que atuava no Rio. Hoje rosto de uma dezena de marcas, há 12 anos lembra ter ouvido de uma empresa que adoraria que estrelasse uma de suas campanhas, mas que antes precisava apagar posts de teor político. Ao questionar quais seriam as publicações, recebeu algumas com a frase Black Lives Matter. “Nunca estive disposto a fazer certos silêncios em público, seja por publicidade ou qualquer outra coisa. Sempre soube que o que era para ser meu viria com a complexidade que eu carrego”, diz. Nem mesmo os questionamentos recorrentes sobre sua sexualidade o tiram do sério. Paulo namora há cinco anos a influenciadora digital Ilana Sales, que já apresentou aos seguidores como seu “namorado secreto”. Ele tem uma teoria sobre as piadas. “O homem brasileiro precisa atender a certos pré-requisitos e eu não estou disposto a preencher. Boa parte das minhas referências na comédia são gays, como Dzi Croquettes.” O ator também não se enquadra muito em rótulos, como mostra a quantidade de projetos dos últimos

anos: além dos quadros e programas, acaba de publicar um livro infantil, tem um EP gravado com Tulipa Ruiz, atuou e dirigiu no teatro. Na lista do que virá, além da nova série inspirada no pai, estão um programa infantil, um reality e um longa baseado no quadro “Isso É Muito a Minha Vida”. A legião de fãs também cresceu, mas Paulo afirma ainda manter a mesma rotina. Durante as viagens, já atendeu convites de desconhecidos no Twitter para tomar uma cerveja ou ir a uma festa de aniversário. “Não quero deixar de fazer as coisas boas da minha vida. Todo dia eu saio de casa para fazer amigos.” n

Calça e boina acervo, camiseta Oficina Reserva, jaqueta brechó Minha Avó Tinha, tênis Nike, acessórios Skull Styling: Isabela Marques Make: Tibby Ramos Visagista: Jonathan de Oliveira Direção de arte: David Nefussi Produção executiva: Ana Elisa Meyer Assistente de fotografia: Humberto Felga Tratamento de imagem: RG Imagem


ANCESTRALIDADE

Cinco médicas negras de diferentes especialidades apostaram em uma clínica com propósito bem definido: ser referência de inclusão na área da saúde POR CARLA JULIEN STAGNI

ano era 2021. Pandemia ainda rolando solta. Mas não dava para recuar. Cinco mulheres negras, médicas de diferentes especialidades, tinham um projeto bem definido, pronto para ser executado, e um sonho: abrir uma clínica com o propósito de inclusão, representatividade e afeto. Na verdade, um projeto de vida, de quem quer promover mudanças: “Focamos no lado humano para promover saúde e bem-estar de maneira qualificada e acolhedora”, explica Cecília Pereira, especialista em ginecologia e obstetrícia, e também mastologista. Nascia o Grupo Ifé. O nome escolhido partiu do fato de as sócias serem negras, além da forma como veem e pensam a medicina. Uma busca no Google trouxe a palavra Ifé, que significa amor em iorubá e resumia toda a proposta dessa turma. “Queríamos algo curtinho e que remetesse à nossa ancestralidade”, conta Cecília, que se uniu à

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cirurgiã plástica Abdulay Eziquiel, à cardiologista Aline Tito, à dermatologista Júlia Rocha e à oftalmologista Liana Tito para oferecer consultas mais longas e completas – coisa rara em tempos de planos de saúde –, a preços acessíveis, mirando especialmente nas mulheres negras, mas deixando bem claro que a Ifé é democrática e está aberta a todos, independente de raça, gênero e classe social. “A vontade de criar a Ifé veio de nossas próprias experiências como médicas, em outras clínicas e hospitais. Concordamos que é importantíssimo oferecer um atendimento afetivo, que enxergue o paciente como um todo”, explica Cecília. “É oferecer o que nunca tivemos na vida como pacientes. Antes eu trabalhava em clínicas padrão AAA e sempre sentia um frio na barriga na hora de atender as pessoas. Na faculdade, por exemplo, tive apenas um professor negro. Já sofri discriminação como paciente e como médica”, reafirmando que a representatividade é um dos principais pilares do empreendimento. Outro grande diferencial da clínica localizada na rua Marquês de Abrantes, no Flamengo, tradicional bairro carioca, é justamente ter um staff formado por negros, desde as sócias até a recepcionista. Não por acaso, essa parcela da população acaba sendo a maioria na carteira de pacientes. “Nossa equipe fala sobre nós. Os pacientes

“Queremos oferecer o que nunca tivemos na vida como pacientes. Também já sofri discriminação como médica” Cecília Pereira, especialista em ginecologia e obstetrícia

são em sua maioria negros. Eles se identificam conosco e é natural que esse público se sinta acolhido. Mas a clínica está aberta a todos”, faz questão de frisar a ginecologista. Claro que a representatividade está embutida nesse pacote. “Sabemos da responsabilidade que te-

FOTO MATRI FOTOGRAFIA JÚLIA ALDENUCCI/DIVULGAÇÃO

AFETO


No sentido horário, Júlia Rocha, dermatologista; Abdulay Eziquiel, cirurgiã plástica; Liana Tito, oftalmologista; Cecília Pereira, ginecologista; e Aline Tito, cardiologista

mos de enaltecer a força para que todos se sintam mais confiantes, inclusive nós mesmas. Queremos ser referência e inspirar meninas e jovens negras que sonham em fazer universidade como a gente.” Durante as pesquisas para a definição do projeto, as médicas perceberam

haver poucos empreendimentos com perfis semelhantes no Brasil. Talvez, por esse motivo, elas têm se surpreendido com o sucesso alcançado pelo negócio: “É um saldo surpreendente. As agendas estão lotadas”, comemora Cecília, ressaltando que a Ifé – e cada uma das sócias – tem as redes sociais como

grandes aliadas para fazer com que a clínica e seu propósito sejam mais e mais conhecidos Brasil afora. “No momento, o plano é sedimentar essa conquista e, aos poucos, quem sabe, ter novos parceiros que compartilhem das mesmas ideias e assim poder oferecer outras especialidades médicas.” n PODER JOYCE PASCOWITCH 57


Sucesso do OnlyFans, vitaminado pela Covid-19 e pelo trabalho remoto, recicla feito de uma indústria que tem história centenária POR ANDERSON ANTUNES

ILUSTRAÇÃO GETTY IMAGES

LUXÚRIA


O

uso da nudez como forma de expressão e de protesto vem desde tempos imemoriais, ou quase isso. Mas é possível marcar o século 16, na transição das trevas da Idade Média para a Idade Moderna, como o período do surgimento do que mais tarde seria conhecido por pornografia. Em 1524, o italiano Marcantonio Raimondi foi preso por expor em público uma série de desenhos com conotação explicitamente sexual. Durou pouca a pena. Ele foi tirado da cadeia depois que Pietro Aretino, artista e intelectual conservador influente da época, negociou com sucesso sua liberdade. Em seus escritos e caricaturas, Aretino, hoje em dia considerado um “nicodemita”, como são conhecidos os protestantes que fingiam ser católicos para escapar da fogueira da Inquisição, analisava o comportamento humano e, de quebra, ganhava uns trocados extras chantageando poderosos com a ameaça de “denunciá-los” por meio de sua arte caso não recebesse o que exigia. O crime? Se envolver em aventuras sexuais que fariam corar até mesmo Eros, o mais fogoso dos filhos alados de Afrodite, deusa do amor e do sexo na mitologia grega (para os romanos, Vênus). A pornografia e a hipocrisia sempre fizeram sombra uma à outra, como se vê.


O que certamente deixaria Aretino e Raimondi tão corados quanto Eros – mas de surpresa, e não de pudor – é a realidade atual daquilo que ambos enxergavam como uma arte, e que se destacava por ser proibida: liberada e consumida em massa, ainain da que malvista por muitos pudicos de araques, a pornografia hoje é uma grande indústria – e das que mais crescem. Uma pespes quisa feita pela consultoria Absolute Markets Insights apontou que, apenas em 2019 e somente na internet, o negócio global do pornô movimentou US$ 35,2 bilhões. Para o ano seguinte, o crescimento anteriormente previsto era de pouco mais de 15%, mas essa estimativa foi superada com folga em consequência de um “imprevisto” que forçou quase toda a população mundial a ficar em casa, a pandemia de Covid-19, que teve entre suas várias consequências um impacto jamais visto no meio em que sexo é commodity. Em resumo, o novo coronavírus mudou drasticamente a forma como conteúdos pornoporno gráficos são consumidos e, acima de tudo, produzidos. Mais pessoas em casa gerou um aumento do concon sumo desses produtos. Pessoas estressadas, isoladas e entediadas em razão de uma doença que as obrigou a mudar de rotina, por sua vez, tendem a gastar mais. E como a demanda atrai dinheiro, o resultado disso foi o prasurgimento de um Vale do Silício virtual que tem nos pra Apezeres carnais, aliados à tecnologia, sua fonte de receita. Ape nas em 2020, o primeiro ano da Covid, o tráfego de sites proiproi bidos para menores aumentou mais de 20%. E entre esses, um dos maiores destaques foi o britânico OnlyFans, espécie de Tik Tok para adultos em que profissionais e amadores produzem vídeos e imagens em troca da cobrança de valores que podem variar entre US$ 5 e US$ 50 mensais pela assinatura do serviço. Há casos de produtores de conteúdo do OnlyFans que embolembol sam dezenas de milhões de dólares por ano, e virou moda enen tre as celebridades criar suas páginas oficiais na plataforma – como a da cantora Anitta – na qual oferecem uma versão mais quente de si mesmas, porém não exatamente pornográficas. Fundado em 2016 por Tim Stokely, executivo britânico com vasta experiência no ramo do voyeurismo, o OnlyFans conta atualmente com 2 milhões desses usuários que pospos tam material caliente para mais de 130 milhões que pessoas que os consomem. Em 2021, as receitas da plataforma ulul trapassaram US$ 1,2 bi, e seu valor de mercado estimado é de US$ 1 bi. Stokely pretende lançá-lo na Bolsa de ValoValo res de Londres em um futuro próximo, com seus papéis negociados junto com os de companhias centenárias e tradicionais como os bancos HSBC e Lloyds. InvestidoInvestido res dispostos a comprar suas ações não faltarão. E isso, sem sombra de dúvida, lhe dará um verniz de negócio sério, poucas vezes antes atrelado aos investimentos passados em tudo que fosse ligado ao universo da lulu xúria, por mais que, como os inúmeros filmes sobre Wall Street já indicaram, experiências sexuais façam parte das rotinas dos players de mercados de capitais.


PORN ACEITÁVEL

Nesse sentido, a pandemia serviu – e muito – para tornar o “porn” mais aceitável, por mais que ainda seja visto com olhares tortos e hipócritas. Entre os que controlam o dinheiro, no entanto, o que se vê são as oportunidades que novidades como o OnlyFans carregam consigo, e seu inegável potencial de crescimento em uma nova fase global de pessoas cada vez mais enclausuradas em casa, seja para se proteger de doenças ou para trabalhar remotamente, outra tendência que a Covid-19 ajudou a potencializar. Ganham todos: os que usam e pagam sem remorso os serviços tais como aqueles oferecidos pela mina de ouro de Stokely, as empresas e os produtores desses serviços

e, para citar dados mais recentes, até mesmo as populações em si, uma vez que o “fenômeno” OnlyFans contribuiu, também, para uma redução no aumento de doenças sexualmente transmissíveis em vários países. Falta analisar ainda o efeito psicológico que tudo isso possa vir a ter nos envolvidos nessa revolução “triple X”, e sua aceitação continuará escassa pelos demais humanos que negam o próprio desejo. Talvez esse balanço seja, no fim das contas, a receita do sucesso, a hipocrisia que sustenta toda uma estrutura que tem em seu charme a proibição. Ou seja: para todo Raimondi haverá sempre um Aretino, numa roda secular que gira sempre se adaptando às lombadas de seu caminho. Mas que a pornografia nunca foi tão pop, não há como negar. n


SEMINOVO

Na onda das roupas second hand, o projeto Oportunidade do Bem, capitaneado por Ana Eliza Setubal, é um case de sucesso que já doou mais de R$ 5 milhões à caridade POR CARLA JULIEN STAGNI FOTO PAULO FREITAS

É

impactante entrar no showroom do Oportunidade do Bem, em São Paulo. Duas enormes salas localizadas em dois andares de um prédio no Itaim estão lotadas de roupas, dos mais diferentes estilos e marcas, nacionais e importadas. Algo em torno de 6 mil peças. Todas chegaram ali por meio de doações de pessoas abastadas – em sua maioria –, que aderiram à ideia de praticar o desapego do que não faz mais sentido em seus closets e vida, em prol de quem realmente precisa. À frente dessa operação, Ana Eliza Setubal, advogada e empresária, habituée da alta roda paulistana, que, bem relacionada que é, se tornou uma espécie de fomentadora desse movimento. A ideia surgiu em uma das sessões de desapego do próprio guarda-roupa, em 2019. Naquele momento ela enxergou o potencial das peças second hand de luxo, cada vez mais em alta em tempos de economia circular e empreendedorismo sustentável. Foi aí que decidiu criar o Oportunidade do Bem, iniciativa que promove a venda de roupas e acessórios de segunda mão com 100% da arrecadação destinada à caridade. “Diferente de brechós e outros comércios de usados, trabalhamos com doação. Todas as peças são doadas, até por marcas que têm sobras de coleção e mandam pra gente produtos novos. Dessa forma conseguimos ter um preço menor que todo mundo e reverter 100% do que é arrecadado. Atualmente atendemos nove instituições que foram escolhidas com todo o cuidado e carinho”, orgulha-se Ana Eliza. Graças a uma invejável rede de contatos, Ana tem conseguido doações de peso e coloca à venda, por

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valores bem abaixo da tabela, desde valiosas bolsas Hermès até peças mais simples como t-shirts brancas, passando por casaquetos Chanel, vestidos Pucci e camisas Gucci, tudo disponibilizado depois de passar por um cuidadoso controle de qualidade. “Em dois anos doamos quase R$ 5 milhões, sendo que teve a pandemia no meio disso tudo. E o céu é o limite. O propósito é atender cada vez mais entidades. É um aprendizado contínuo. Não quero ensinar ninguém a fazer nada, mas é fato que acabamos formando uma corrente em que um inspira o outro a fazer o bem”, explica a empresária, que recebe compradores de todas as partes do Brasil na sede do Oportunidade do Bem, na capital paulista. Isso sem falar no site www.oportunidadedobem.com.br, responsável por uma fatia menor do total das vendas. “Estamos sendo conhecidos por um número maior de pessoas e vendendo cada vez mais. Sempre pensando em ações que possam atrair novos compradores e parceiros. As mulheres que são consumidoras das marcas de luxo estão começando a se interessar pelo second hand. Com o dólar nas alturas, até elas estão comprando peças seminovas”, comemora Ana, lembrando que no último evento que fizeram, em parceria com o JK Iguatemi, faturaram R$ 560 mil em quatro dias. “Todo mundo sabe fazer o bem, só que não basta saber, tem que concretizar. Existe um caminho para ser aprendido e percorrido. O desapego tem diferentes perfis: você pode desapegar de uma roupa, você pode doar dinheiro, seu tempo... Nosso objetivo é atrair cada vez mais doadoras, vender muito e ajudar mais instituições.” n


“Todo mundo sabe fazer o bem, só que não basta saber, tem que concretizar”


INDULGÊNCIA

O GIACOMETTI O suíço Diego Giacometti ecoou a elegância frágil e leve do trabalho de seu irmão famoso, o artista plástico Alberto, e mostrou que a arte escultórica e a funcionalidade podem caminhar lado a lado uando o nome Giacometti é mencionado, imediatamente vem à cabeça a lembrança de Alberto, o criador de marcantes esculturas de bronze nas quais as formas humanas ganham perfis muito alongados e, quase sempre, esboçam um movimento. Mas, a família Giacometti era talentosa. Além de Alberto, seu oriirmão Diego teve uma trajetória marcante e muito ori ginal. Tornou-se conhecido, e até mesmo célebre, pela sua produção de mobiliário doméstico, quase sempre diexecutado em material nobre, o bronze. Um ano de di ferença separava Alberto, nascido em 1901, e Diego, em 1902. Ambos tiveram intenso contato com o universo impresartístico dentro de casa: eram filhos do pintor impres prisionista suíço Giovanni Giacometti (1868-1933), pri mo de outro pintor conhecido, Augusto, e reconhecido desde a década de 1880. A obra de Giovanni começou via ganhar maior presença com as vanguardas que na vi completarada do século 19 para o 20 revolucionaram completa posmente o vocabulário artístico. Apesar de também pos suir certo ímpeto inovador, Giovanni acabou por não se destacar naquele tumultuado início do movimento momo experimenderno. Estranhamente, sua sensibilidade e experimen tação foram consideradas radicais para a época. Apesar artísde sua própria dificuldade em buscar a carreira artís tica, Giovanni foi um pai bastante positivo e influente junto aos seus filhos artistas, sempre a encorajá-los a buscar realizações no campo estético.

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FOTOS DIVULGAÇÃO

POR ANA ELISA MEYER


ESCOLHAS E FORMAÇÃO

Diego Giacometti em seu estúdio, em foto de Cecil Beaton de 1962, e cães, de 1976; na pág ao lado, peça L’autruche, de 1977

Nascido em Borgonovo, pequena aldeia localizada na fronteira da Suíça com a Itália, Diego cresceu convivendo com a beleza e a simplicidade do campo, cercado por animais e florestas. Apesar da força e do estímulo familiar para que abraçasse a atividade artística, acabou cedendo a algo menos desafiador e, de certa forma, mais convencional, partindo para Basileia e mais tarde para St. Gallen, onde se preparou para atividades de perfil bem mais comercial. Acabada a formação, com poucas tentativas profissionais, Diego se mostrou insatisfeito com o mundo dos negócios. Foi quando ouviu um generoso conselho que partiu de dentro de sua própria casa, agora de sua mãe, Annetta. Ela o incentivou, quando tinha apenas 25 anos, a se juntar ao irmão Alberto, que já vivia em Paris. Annetta acreditou que ele deveria mergulhar na atividade artística, e nada melhor do que viajar a Paris, que nos anos 1920 era reconhecidamente o centro da profunda renovação artística. Enquanto Alberto acompanhava o curso do mestre escultor Antoine Bourdelle na Académie de la Grande Chaumière, já experimentando novas e excitantes formas de expressão, Diego foi arrebatado pelas novas possibilidades que vinham de outros desdobramentos da revolução artística modernista. Chamou sua atenção (e, mais tarde, a do mundo) a iconoclastia de Marcel Duchamp, que com seus originais ready-made, dessacralizava os cânones da arte ao colocar objetos industrializados de função e condição cotidiana e utilitária em museus e exposições. Tal procedimento, cujo objetivo era o desejo de possibilitar um novo olhar sobre cada um desses objetos triviais, como um porta-garrafas ou o famoso urinol de louça branca, produzia um efeito de enorme estranheza, e, com certeza, de humor sarcástico. Eram características centrais do movimento vanguardista que eclodia no interior do próprio modernismo. Durante 40 anos, Alberto e Diego trabalharam lado a lado em um estúdio no bairro de Montparnasse, vivendo uma relação intensamente criativa. Todas as obras de Alberto passavam, num primeiro estágio, pelas mãos de Diego, que esculpia a pedra, fazia os moldes, polia e aplicava a coloração no bronze. Diego foi também um modelo recorrente para as obras do irmão, que ao longo de sua carreira pintou e esculpiu a sua cabeça e acabou por se tornar uma marca da sua produção escultórica. Embora não posPODER JOYCE PASCOWITCH 65


suísse a energia frenética e a imaginação febril, tampouco o rigor filosófico do irmão mais velho, Diego se encaminhava para exibir grande talento artístico.

DESCOBERTA DAS ARTES DECORATIVAS

Em 1929, Diego teve o seu primeiro contato com as artes decorativas quando o artista americano Man Ray apresentou aos irmãos um decorador de interiores que convivia com os surrealistas, Jean-Michel Frank. Impressionado com a inventidade e habilidade dos irmãos Giacometti, Frank os contratou para criar objetos específicos visando atender demandas de seus clientes. Por sinal, clientes poderosos, tais como a estilista italiana Elsa Schiaparelli, o colecionador francês Aimé Maeght e a família de nobres franceses Noailles. A colaboração intensa com Frank refinou o senso artístico de Diego, que, resgatando a vivência bucólica de sua infância, partiu para uma experimentação original em que associou as formas naturais com as quais conviveu intensamente com propostas artísticas semiabstratas produzidas em diversos materiais, mas sobretudo em bronze e técnicas de cera perdida.

Luminária projetada especialmente para o Museu Picasso, em Paris; e, ao lado, cadeiras de Giacometti; abaixo. mesa de centro Aux Cerfs et Aux Chiens,, de 1963

tário, peculiar e inovador. Um de seus mais entusiastas patronos era o então consagrado estilista francês Hubert de Givenchy, para quem criou um grande número de peças ao longo de toda vida. Recebeu encomendas de móveis para o casal Aimé e Marguerite Maeght, e foi chamado a criar peças públicas para importantes museus, tais como o Museu Picasso, em Paris, e Museu Marc Chagall, em Nice.

Nos anos 1950, as explorações de Diego no campo do design de móveis ganharam maior intensidade e consistência. Longe da influência de Alberto, que nessa época já era um artista bastante conhecido, Diego estabeleceu sua própria clientela para a qual produzia um mobiliário utili-

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FOTOS DIVULGAÇÃO

O RECONHECIMENTO


O bronze Le Chat Maître d’Hôtel, de 1967, o artista com o irmão Alberto em 1960 e a banqueta Coiffeuse à La Souris, do mesmo ano

Em 1966, ano que perdeu o irmão Alberto, Diego, era bastante reconhecido no universo das artes decorativas, dedicando-se exclusivamente ao desenho e produção de mobiliário, alcançando, então, o mais alto patamar de inventividade. O interesse pelas formas vindas da natureza permaneceu e acabou por se tornar a grande característica de suas obras. Com um vocabulário poético singular, retratava animais - como sapos, gatos e pássaros - frequentemente em bronze, utilizando uma linguagem que associava as artes decorativas aos temas do surrealismo. Dessa articulação resultou um conjunto de obras únicas, atemporais, de forte dimensão estética. Após sua morte, em 1985, suas peças permaneceram muito ambicionadas no circuito das maiores galerias europeias. A partir da década de 1990, obras e coleções importantes foram leiloadas levando Diego Giacometti a ser um nome também muito valorizado no mercado de artes. n PODER JOYCE PASCOWITCH 67


CANTO DE PODER POR ALINE VESSONI FOTOS PAULO FREITAS

O SILÊNCIO DOS INOCENTES

São Paulo, avenida Brigadeiro Faria Lima, principal centro financeiro do país. Carros, motos, bicicletas, o futuro da mobilidade urbana e muita gente por todos os lados. No 5º andar de um de seus prédios, onde está localizado o escritório Vilardi Advogados, o silêncio, no entanto, não condiz com os

Acima, a vasta biblioteca do hall do escritório Vilardi Advogados, com um mobiliário sóbrio para consultas e estudos de legislação. Ao lado, mais um canto convidativo para a leitura

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ruídos e a barulheira do lado de fora. Talvez esteja aí uma das razões da dificuldade do advogado Celso Vilardi em se manter afastado do escritório durante a pandemia. “Foi muito difícil, eu tentei trabalhar em casa, mas me concentro melhor no escritório. Como ele estava vazio, resolvi continuar com

a minha rotina. Fiquei apenas três semanas afastado e depois comecei a vir sozinho, a princípio de duas a três vezes por semana”, conta. O nome por trás da empresa é um dos mais importantes em direito penal no Brasil e foi advogado de defesa de alguns réus da Operação Lava Jato. Em

seu escritório, uma dezena de livros de direito penal sobre a mesa, todos com as páginas marcadas – prática de quem exerce pesquisas exaustivas. Aliás, para Vilardi, essa é uma das fórmulas para o sucesso profissional na advocacia. “A primeira coisa é não parar de estudar. Quem não se atualiza, não tem chance. Até porque, em um país como o Brasil, com as constantes modificações legislativas, se você não prestar atenção, nem sabe o que é crime.” Em


segundo lugar é se modernizar, ter gente jovem por perto, ouvi-los”, conta. Foi exatamente o que aconteceu durante a Operação Lava Jato, quando o escritório, além de prestar serviços de advocacia criminal, passou a atuar na gestão de crise empresarial, já que “quando os crimes acontecem de forma reiterada no âmbito da empresa, isso gera um desgaste perante os diretores, acionistas, investidores etc.”. Com uma rotina bastante regrada, Vilardi é do tipo que acorda cedo – por volta das 6 da manhã –, lê os jornais, pratica exercício físico e às 9 já está no escritório para longas jornadas de 12 ou 13 horas de trabalho. Indagado sobre a dificuldade de encarar as duras notícias da atualidade logo como primeira atividade diária, o advogado vê como parte do ofício, mas alerta em tom de preocupação: “O Brasil está polarizado, violento. Parte da discussão da polarização [política] está atrelada a um ataque às instituições, o que nunca tivemos no país a não ser em momentos de ruptura [...] acredito que teremos muitos atos antidemocráticos até as eleições”. n

Computador e mais livros. Vilardi tem um espaço aconchegante para receber seus clientes, rodeado de plantas e pelo santuário com Nossa Senhora de Fátima – de quem é devoto

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PODER VIAJA POR ADRIANA NAZARIAN

DOLCE VITA NO CAMPO

Uma das formas mais especiais de desbravar a PUGLIA é se hospedando em uma autêntica masseria, como são chamadas as fazendas dessa região do sul italiano. Então, vale ficar de olho nessa novidade para a próxima visita: a Masseria Muzza é o novo projeto da família Baglioni, que coleciona hotéis únicos pela Europa. Fica em propriedade do século 17 pertinho de Otranto e tem um daqueles jardins mágicos, perfumado por oliveiras. Com bons restaurantes, piscina e um spa delicioso, é daqueles lugares para se perder a noção do tempo e curtir a dolce vita no seu melhor. +@BAGLIONIHOTELSANDRESORTS

Atenção viajantes com desembarque marcado para Saint-Tropez. A Louis Vuitton acaba de inaugurar um restaurante no destino que certamente merece a visita. Isso porque quem comanda a cozinha é o chef Mory Sacko (aka MoSuke, Paris), conhecido por misturar influências africanas e asiáticas com o savoir-faire francês de maneira nada óbvia. Fica no hotel White 1921 e tem um clima deliciosamente cool. +@MORYSACKOATLOUISVUITTON

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FOTOS TOM CLAEREN/DIVULGAÇÃO; DIVULGAÇÃO

TEMPERO


TODOS A BORDO

Mais um motivo para flanar por Paris nestes tempos solares. O La Réserve, um dos hotéis mais especiais da cidade, criou um passeio gourmet pelo Sena imperdível. Atenção aos detalhes: a experiência acontece a bordo de um motoscafo vintage cheio de bossa e é comandada por Jérôme Banctel, chef duas estrelas Michelin responsável pela gastronomia do hotel. Enquanto os viajantes apreciam pontos icônicos como as Tulherias sob outro ponto de vista, monsieur Banctel e sua trupe servem delícias sob medida para um jantar especialíssimo. Allons-y?

PARAÍSO PARTICULAR

Mais uma boa notícia para os hotelmaníacos: o Four Seasons desembarca em Belize no próximo ano. O cenário? Uma ilha privativa e paradisíaca, cercada por barreira de corais que é patrimônio da humanidade. Além dos habituais bangalôs e dos esportes aquáticos que fazem sucesso na região, o projeto terá campo de golfe e um centro de wellness. E pelo menos duas experiências matadoras: observação de estrelas e mergulhos com Fabien Cousteau, neto da lenda francesa Jacques Cousteau +FOURSEASONS.COM

OÁSIS EM L.A. Passar uma temporada em L.A é sempre uma boa ideia

e, em 2026, a experiência promete ficar ainda melhor. O grupo hoteleiro Aman anunciou que irá desembarcar no destino americano pertinho da Rodeo Drive. Além de todos os serviços Aman que somos fãs, a unidade de Beverly Hills terá como destaque o projeto de paisagismo com plantas nativas invadindo todos os ambientes – a ideia é funcionar como um oásis em plena cidade. +AMAN.COM

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Em sentido horário, a partir da foto à esquerda: praia da Marinha, um dos pontos mais frequentados por turistas e portugueses, tem boa estrutura e conta com barzinhos e restaurantes; Praia do Meco, protegida por uma falésia, é mais familiar; Praia da Quinta do Lago, que fica entre Ancão e a cidade de Faro, só pode ser acessada a pé – é ótima para quem gosta de trilhas; praia na região de Lagos, maior cidade do Algarve , e finalmente Carvalhal, com dunas e mar convidativo, que fica ao lado de Comporta, balneário cheio de charme que já vale a visita


VIAGEM

AO SABOR

DOS ELEMENTOS Um dos mais famosos destinos do verão europeu, Algarve, no sul de Portugal, atrai turistas do mundo inteiro por conta das lindas praias ornadas por falésias e o mar em tons de azul. E a vida noturna da região não deixa a desejar, com baladas e restaurantes charmosos FOTOS PICO GARCEZ


SOB MEDIDA POR DADO ABREU

Imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL), a escritora, jornalista e ensaísta carioca é referência do movimento feminista – seus primeiros livros, Le Féminin Ambigu e La Culture des Femmes, publicados durante o exílio, exprimem sua participação no emergente movimento internacional de mulheres. Seu mais recente trabalho, Liberdade (ed. Rocco), versa contra o ódio, a fúria obscurantista e o autoritarismo do Brasil contemporâneo UMA MEMÓRIA DE INFÂNCIA: As mangueiras seculares da

casa de minha avó. Fiz uma casinha no tronco de uma delas. UM MEDO: Uma doença incapacitante. UMA FRASE QUE CARREGA PARA A VIDA: “O acaso tem sempre a última palavra”. O MELHOR LIVRO QUE EU LI RECENTEMENTE: Tudo É Rio, de Carla Madeira. SUA PEÇA DE ROUPA PREFERIDA: Uma echarpe longa de cashmere que comprei há muitos anos em Genebra. MELHOR DO BRASIL: Os amigos da vida inteira. LIBERDADE É... Poder escolher a própria vida. COM O QUE SE PREOCUPA: Ameaças à democracia e a miséria em que vive a maioria da população brasileira. SER BEM-SUCEDIDA É... Ser feliz e fazer feliz. MOMENTO DE MAU HUMOR: No engarrafamento dentro de um túnel. UMA MÚSICA: Bachianas Brasileiras nº 5, de Heitor Villa-Lobos. QUALIDADE: Não abandono os feridos. DEFEITO: Dificuldade para perdoar. PRIMEIRA COISA QUE FAZ QUANDO CHEGA AO TRABALHO:

Trabalho em casa. Abro a janela do meu escritório e fico olhando o jardim como se fosse a primeira vez. MELHOR HORA DO DIA: Quando entro na cama quente antes de dormir.

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UM HOBBY: Planejar viagens, lendo sobre os lugares. Foram muitas. Não consegui fazer todas. OBJETO QUE NUNCA VOU ME DESFAZER: Um Calder que Mário Pedrosa me deu e que está dedicado a ele. UMA DESCOBERTA RECENTE: Posso não sair de casa durante dois anos. UMA IDEIA GENIAL QUE EU GOSTARIA DE TER TIDO:

A criação do mar.

QUANDO PRECISO ME INSPIRAR EU... Crio absoluto

silêncio em torno de mim. E fico ouvindo. NA MINHA GELADEIRA SEMPRE HÁ: Um bom vinho branco. PRATO PREFERIDO: Risoto de frutos do mar. O MELHOR CONSELHO QUE JÁ RECEBI: Ouça o seu desejo. A ÚLTIMA COISA QUE COMPREI FOI: Uma broa de milho. SE NÃO FOSSE JORNALISTA E ESCRITORA SERIA: Uma infeliz em uma profissão qualquer. QUEM TE INSPIRA: Edgar Morin, antropólogo, sociólogo e filósofo francês. ESTADO MENTAL NESTE MOMENTO: Apreensiva, muito. O QUE FALTA REALIZAR: Um romance? Uma autobiografia? A ver. SER FEMINISTA É... Assumir a autoria da minha vida. DESEJO PARA O FUTURO: Morrer dormindo, sem dor.

FOTOS LEO AVERSA/PARCEIRO/EDITORA GLOBO; GETTY IMAGES; ARQUIVO CLARICE LISPECTOR/IMS; DIVULGAÇÃO; DIVULGAÇÃO PRIME VIDEO; ESTEVAM AVELLAR/COMUNICAÇÃO GLOBO

ROSISKA DARCY DE OLIVEIRA


MANIA: Entrar no avião

com pé direito.

SUA BIBLIOTECA PREFERIDA NO MUNDO: Biblioteca Bodmeriana,

em Genebra, na Suíça. UM DISCO QUE VOCÊ LEVARIA PARA UMA ILHA DESERTA:

Tropicália ou Panis et Circencis, de Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil, Nara Leão, Os Mutantes e Tom Zé.

UMA SÉRIE QUE VOCÊ MARATONARIA DE NOVO:

O QUE NÃO PODE FALTAR NO SEU CAFÉ DA MANHÃ:

Pão fresco

UM(A) ESCRITOR(A) QUE TODO MUNDO DEVERIA LER:

Clarice Lispector.

ALGUM LUGAR INESQUECÍVEL QUE CONHECI NOS ÚLTIMOS ANOS:

Downton Abbey.

LUGAR PREFERIDO NO MUNDO:

Veneza, Itália.

PECADO GASTRONÔMICO:

Foie gras quente.

UMA MULHER QUE TE REPRESENTA:

A Medina de Fez, no Marrocos, citada no meu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras (ABL). O QUE ME DEFINE: Uma boneca russa, sai sempre mais uma de dentro.

UM SOUVENIR DE VIAGEM:

A máscara de um arlequim comprada nos meus 30 anos, em Veneza.

UM FILME: O Leopardo, de Luchino Visconti.

ONDE E QUANDO É MAIS FELIZ: Entrando no mar,

no primeiro mergulho.

Fernanda Montenegro.

LIVRO DE CABECEIRA:

Memórias de Adriano, de Marguerite Yourcenar.

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CULTURA INC.

CINEASTA DE RISCO POR LUÍS COSTA

Com três longas em cartaz só neste ano, José Eduardo Belmonte se divide entre projetos diversos e aposta em novos formatos no audiovisual

A

agenda de José Eduardo Bel Belmonte não para. Em 2022, os trabalhos do cineasta e diretor artístico da TV Globo im impressionam: são três longas-me longas-metragens, séries para a tevê, além de projetos de documentário e uma coprodução internacional. “Trabalho, para mim, é algo ororgânico, como a vida. O que é bem diferente de ser workahoworkaho lic”, diz o diretor. Ao lado dos formatos clásclás sicos, Belmonte prepara nono vas investidas em podcasts, games e realidade virtual. “A questão é ser fiel a quem se é”, conta. “Minha perceppercep ção é de que nos ensinos de artes no país, em vez de ajudarem a descobrir um estilo próprio, tenten ta-se impor um jeito de fazer”, opina o diretor, que começou a carcar reira fazendo videovideo arte e viu seu ofício se metamorfosear. “Vi o fim da película, o surgimento do digidigi tal, a mudança de cinema para auau diovisudiovisu al, a cheche gada do streaming, a apropriaapropria

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ção da linguagem cinematográfica pelos games. Por isso é importante pesquisar as possibilidades que vão surgindo”, afirma. O menino inquieto e curioso, que desmontava relógios para entender o permecanismo, diz agora que tenta e per severa, assumindo os riscos dos projetos. “Preciso não ter medo do fracasso, que é um bom professor e faz parte da jornada. Penso que é importante reter o que é bom e avançar.” Em março, Belmonte lançou Alemão 2, thriller que sucedeu seu maior sucesso comercial e levou 1 milhão de espectadores ao cinema em 2014. Em junho, foi a vez de As Verdades, drama com Lázaro Ramos, ambientado no interior da Bahia, que conta a história de um


FOTOS BOB WOLFENSON/DIVULGAÇÃO; DIVULGAÇÃO

assassinato sob a perspectiva de três personagens. Com Johnny Massaro, O Pastor e o Guerrilheiro estreou em julho, com um drama histórico que aborda a vida do país na segunda metade do séditaculo passado, no período entre a dita dura e a redemocratização. Nos três, Belmonte usou uma espéespé cie de fórum permanente com o elenelen co. “Sempre consultar, estudar e ouvir sobre questões do roteiro, das menmen sagens do filme, a forma de fazer, de mostrar”, explica. “É um processo que varia de acordo com a maleabilidade da produção, mas funciona, porque a eses sência do audiovisual é colaborativa.” Entre as muitas referências do cinema, três diretores permanepermane cem como “faróis”, segundo ele: Scorsese (“não apenas pelos filmes, mas pela polípolítica”), Godard e Alain ResRes nais. “Já se passaram décadéca das e Meu Tio da América [de Resnais], ], segue sendo meu filme preferido”, conta Belmonte, que também cita a músimúsi ca, a poesia, a pintura e a fotografia como inspirações para o seu trabalho. Aos 51 anos, o paulista que cresceu em Brasília lembra da cinefilia da adolescência, quando ia atrás de filmes que traziam uma experiênexperiên cia de sonho. Na faculdafaculda de de cinema da UnB, onde foi aluno de Nelson Pereira dos Santos – um dos principais nomes do cinema novo –, ele se aprofundou no modelo documental. “Creio que sou uma mistura dialética entre eses sas duas coisas”, brinca. Belmonte também assinará na TV Globo, onde ocupa a diredire ção artística desde 2016, uma série cômica basebase

ada em contos de Ariano Suassuna e planeja, entre outros projetos, um documentário sobre a artista visual Rita Wainer e uma coprodução que deverá ser rodada em Detroit, nos Estados Unidos. n

PODER É SELO LITERÁRIO A associação Quatro Cinco Um, que desde 2017 edita a revista literária de mesmo nome, Paulo Werneck tem agora seu próprio selo editorial: a Tintada-China Brasil, fundada por portugueses em 2012 e doada ao grupo no começo deste ano. “Vamos continuar a produzir os livros que fizeram o nome da Tinta-da-China em Portugal e no Brasil”, explica Paulo Werneck, editor da Quatro Cinco Um. “O melhor da literatura portuguesa clássica e contemporânea, livros de história de Portugal, do Brasil e da África lusófona e outras linhas editoriais que vamos desenvolver a partir de agora.” A editora já está no quarto livro lançado desde que a associação assumiu as publicações: Diante do Fascismo – Crônicas de um País à Beira do Abismo, de Paulo Roberto Pires; Estar Vivo Machuca – As Melhores Crônicas, do humorista Ricardo Araújo Pereira; O Pequeno Livro do Grande Terremoto, de Rui Tavares; e Flores de Verão, de Tamiki Hara. “O livro é a nossa obsessão e queremos levá-lo para todos os espaços possíveis neste país: não só onde ele deveria estar, como escolas, bibliotecas etc., mas também empresas, cidades, todas as esferas da nossa experiência”, diz um animado Werneck. PODER JOYCE PASCOWITCH 77


LIVRO

mória e no cotidiano, Juliana afirma o exercício da alteridade na literatura. “Sempre estamos escrevendo o outro de algum modo. A premissa de contar histórias é estar próximo do outro, o outro que está contido em você a partir da fabulação, da empatia, da refleJuliana Leite cria xão, do sonho.” personagem centenária que, Com o caderno em que anota à mão mais do que um “indivíduo”, cenas, personagens e gestos, a autora vai mapeando suas histórias. “As ceé a “humanidade em si” nas vão se somando e os cadernos vão atalia, uma mulher muito idosa, indicando conclusões e enlaces”, conpassa os dias em seu apartamen- ta. Com o isolamento da pandemia, as to entre idas à cozinha e telefonemas anotações, antes feitas nas ruas, voltacom a filha, fazendo da meram-se para as miudezas do comória uma maneira de contidiano, o café, os retratos, os tinuar viva. O personagem almoços de domingo. foi tramado nos cadernos “Tenho a impressão de de Juliana Leite, que lanque as coisas que mais perfuça Humanos Exemplares ram a gente, no sentido sensí(Companhia das Letras, R$ vel, de criar espelhamento com Juliana Leite 69,90). Aos 39 anos, a escritoa sensibilidade, são a partir desra, que venceu o Prêmio Sesc sas miudezas. Às vezes acho que em 2018, foi aos escaninhos as pessoas não sabem nem muida própria vida para compreto bem como acontece, e isso vai ender sua heroína. para a dimensão do mágico que é “Essa foi a chave inicial: contar e ouvir histórias e se sentir se você completa 100 anos, tocado e pertencido a esse muné como se não fosse mais do pequeno”, revela. um indivíduo, mas um pouco a huDepois da “ressaca” de um romanmanidade em si”, diz. ce, Juliana agora prefere o tiro curto Na trama, histórias de família e do conto. “Tenho um tempinho para amizade, de apagamentos e memórias me desligar”, diz a escritora, que afirtriviais. “Quando me encontro com os ma sempre tentar projetos diferentes. meus mais velhos, o papo é muito ba- “Gosto da possibilidade de não me reseado nessa realidade”, conta Juliana, petir. Mas o caderno está rolando. Tem que cresceu ouvindo histórias da fa- coisas anotadas. Em algum momento, mília. Além da imersão na própria me- a costura vai acontecer.”

DETALHE N

RETRATOS BRASILEIROS Com 30 trabalhos inéditos, a exposição Dalton Paula: Retratos Brasileiros traz ao Masp trabalhos de diferentes fases da trajetória do artista brasiliense, de 2018 até os dias atuais. A mostra reúne 45 pinturas que retratam lideranças e personalidades negras historicamente invisibilizadas no Brasil e integra a programação bienal do Masp dedicada às chamadas “Histórias Brasileiras 2021-22”, por ocasião do bicentenário da Independência do Brasil. A VOZ DO TEMPO Aos 86 anos e dona de um timbre que encantou da bossa nova ao Clube da Esquina, Alaíde Costa começa a rodar a turnê do disco O Que Meus Calos Dizem Sobre Mim, lançado em maio. Com Emicida entre os produtores, o disco traz canções inéditas e regravações, e conta com parcerias como João Bosco, Ivan Lins, Guilherme Arantes e Fátima Guedes.

NA MATA Depois de passar por São Paulo, a exposição Amazônia, de Sebastião Salgado, desembarca no Museu do Amanhã, no Rio. Com 194 fotografias, a mostra, que já passou por museus na França, Itália e Inglaterra, é resultado de sete anos de experiências e expedições do fotógrafo na Amazônia brasileira e revelam a floresta, rios e montanhas, assim como a vida em várias comunidades indígenas.

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FOTOS DIVULGAÇÃO; SEBASTIÃO SALGADO; PAULO REZENDE/IMS

A VIDA NO

PODER É


OPINIÃO

HORA DE APERTAR O PAUSE POR ANDREA BISKER

D

FOTOS GETTY IMAGES; DIVULGAÇÃO

esde que decidi ser consultora de tendências e inovação, 25 anos atrás, durmo e acordo com o mesmo questionamento: será que estou deixando algo importante passar? Tirando um pico de ansiedade aqui, outro ali, posso dizer que amo o que escolhi fazer: ajudar empresas na tomada de decisões estratégicas. São escolhas definidoras, do ponto de vista da criação de novos produtos e serviços, de posicionamento, enfim, de futuro. O futuro não acontece de uma hora pra outra. O futuro já circula entre nós, como uma poeira dispersa em que um grão isolado parece não ter nada a ver com o outro. Mas basta conectar os pontos. E o único jeito de conseguir isso é fazendo uma pausa. Neste mundo

tão barulhento e veloz, silenciar os ruídos internos e externos tem sido uma tarefa tão difícil quanto essencial. Como escreveu Nietzsche, em Crepúsculo dos Ídolos, “habituar o olho ao descanso, à paciência, ao deixa-aproximar-sede-si”. Muitas vezes é no vazio, no tédio, que estão os insights. Aquele momento raro em que se tem a chance de reavaliar crenças e paradigmas, olhando para tudo com menos certeza. Livre dos vieses, nascem novas formas de ver o mundo – e a gente dá um passo na direção da inovação. Dia desses Becky Korich, dramaturga e cronista, publicou na Folha de S.Paulo um texto belíssimo sobre a fobia coletiva que temos vivido: a necessidade de preencher todos os espaços com estímulos e telas, ignorando a importância do vácuo. Uma preocupante falta de intimidade com a gente mesmo – mas que pode ser revertida. Lembrei da declaração do pensador contemporâneo e escritor israelense Yuval Harari, em sua obra Sapiens – Uma Breve História da Humanidade, quando ele escreve que o ser humano passou a ter um poder gigantesco nas mãos graças à tecnologia, e não necessariamente sabemos lidar com isso. Quem levou a pausa a sério – virou até livro – foi Rachael O’Meara, autora do best-seller Pausa: o Poder Transformador de Reservar um Tempo Para Si Mesmo (Benvirá, 2019). Desgastada física e emocionalmente por conta da vida de

executiva em uma gigante da tecnologia, ela se beneficiou da política de período sabático da empresa e parou tudo. Nas páginas, ela divide a experiência, traz evidências científicas, estudos sobre o efeito positivo do descanso e elenca dicas práticas para quem quer planejar um tempo off. Se você tem interesse por isso – no comando da sua empresa, no conselho do qual faz parte ou como líder de uma área –, eu o convido a fazer uma pausa. E também a praticar o exercício do questionamento de paradigmas. Até hoje, todas as inovações significativas a que assisti passaram de alguma forma por isso. Não é exatamente um processo confortável. Demanda esforço e pode trazer alguma inquietação. Uma vez que a certeza é quebrada, dificilmente se volta atrás. Como escreveu o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han na obra Sociedade do Cansaço, o fato de um paradigma ser posto sob questionamento já é uma evidência de que ele pode estar em declínio. Confie na sua conexão dos pontos: é sobre analisar dados, cruzar informações, identificar exemplos, escutar o que se fala ao redor, sair da bolha. Quando a gente se propõe a fazer isso, de um jeito sincero e sem medo, o resultado é fascinante. Daí te pergunto: que paradigma você ou seu negócio precisam rever urgentemente? Aperte o pause. n Andrea Bisker é CEO da Spark:off, consultoria de inovação e análise de tendências. Também é professora da Escola Superior de Propaganda e Marketing

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O sobrenome famoso do pai, o jornalista e empresário Assis Chateaubriand, mais o gosto pelas artes, eram apenas duas entre as poucas características que GILBERTO CHATEAUBRIAND herdou do fundador dos Diários Associados, provavelmente o maior tycoon da imprensa brasileira que, como tal, adorava aparecer. Bem mais discreto, Gilberto Francisco Renato Allard Chateaubriand Bandeira de Melo, que morreu de causas naturais em julho, aos 97 anos, era do tipo cuja fortuna ficava à sombra da timidez. Entusiasta do modernismo das artes visuais brasileiras, era dono daquela que é considerada a maior coleção de arte particular do país, com cerca de 8 mil peças. Gilberto, francês de nascimento e brasileiro de coração, era capaz de passar horas apreciando alguns de seus quadros como os de Lasar Segall e Candido Portinari. Ele cedeu, inclusive, 6,6 mil de suas raras peças, como Urutu, de Tarsila do Amaral, e O Farol, de Anita Malfatti, para o MAM do Rio. Também presentou outras instituições brasileiras e gigantes artsy estrangeiros, como o MoMA de Nova York. Diplomata nos anos 1950, Gilberto passou seus últimos momentos em sua fazenda de Porto Ferreira, no interior de São Paulo, com seus cachorros.

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FOTO PAULO FREITAS

MEMÓRIA


Leve, Inteligente, Engajador.

tá ON.

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