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SOB PRESSÃO

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OPINIÃO

OPINIÃO

A hipertensão arterial atinge bilhões de pessoas ao redor do mundo e requer atenção porque chega sem avisar, é silenciosa

POR CARLA JULIEN STAGNI

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Doença crônica e silenciosa, daque las que só provocam sintomas quando já está em estágio avançado, a hipertensão atinge uma boa fatia da população mundial.

Má alimentação, sedentarismo e altos níveis de estresse, entre outros fatores, turbinaram os números da doença nas últimas três décadas: a incidência em adultos entre 30 e 79 anos passou de 650 milhões para 1,28 bilhão. Os dados são de um estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS) feito em parceria com o Imperial College London. O levantamento mostrou também que metade das pessoas que fez parte da pesquisa não tinha ideia de que era hipertensa.

Quando não se faz o tratamento adequado, o grande risco da hipertensão é o aumento significativo de problemas cardíacos,

cerebrais e renais, o que a torna uma das principais causas de morte em todo o mundo. Nos últimos anos, algumas modalidades terapêuticas não convencionais têm sido sugeridas para controlar a doença, caso da musicoterapia ou mesmo da aproximação de questões ligadas à espiritualidade. Quem revela isso é Juliana Gil de Moraes, cardiologista especializada em hipertensão arterial do hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Aqui, a entrevista completa com a médica.

PODER: O QUE CAUSA HIPERTENSÃO?

JULIANA GIL DE MORAES: Estamos falando de uma condição multifatorial que depende de fatores genéticos, ambientais e sociais. A hipertensão pode ter causas essenciais, que são as hereditárias, ou secundárias, como obesidade, uso de certas medicações e doenças congênitas, da tireoide e renais, além de apneia do sono.

PODER: QUANDO A PRESSÃO É CONSIDERADA ALTA?

JGM: Ao fazer a aferição da pressão arterial, temos sempre dois números: o maior indica a pressão sistólica (relacionada à contração do coração) e o mais baixo à pressão diastólica, que é quando o músculo cardíaco entra na fase de relaxamento. A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é caracterizada pela elevação persistente da pressão arterial (PA) e é diagnosticada quando a PA sistólica (PAS) é maior ou igual a 140 mmHg e/ou a PA diastólica (PAD) é maior ou igual a 90 mmHg. Lembrando que essa aferição deve ser feita com a técnica correta em pelo menos duas ocasiões diferentes.

Juliana Gil de Moraes, cardiologista do SírioLibanês, em São Paulo

PODER: EXISTE PRESSÃO IDEAL?

JGM: A meta é definida individualmente, de acordo com a idade e/ ou a presença de doenças associadas. O ideal é ter valores menores que 140/90 mmHg. Nos mais jovens, pode-se pensar em valores inferiores a 130/80 mmHg.

PODER: A HIPERTENSÃO TEM SINTOMAS?

JGM: Ela é silenciosa, mas sintomas como cefaleia, inchaço dos membros inferiores, cansaço, tontura, rubor facial e alterações do sono podem ser sinais de pressão elevada.

PODER: QUAIS OS RISCOS PARA OS HIPERTENSOS?

JGM: A hipertensão é responsável por cerca de 80% dos acidentes vasculares cerebrais (AVCs), por 65% dos infartos agudos, e por 40% a 50% dos problemas renais.

PODER: O ESTRESSE E AS QUESTÕES EMOCIONAIS CONTRIBUEM PARA O APARECIMENTO DA DOENÇA?

JGM: Sim, sabe-se que o estresse pode elevar a pressão arterial, seja de maneira aguda ou crônica. Isso acontece por aumentar a liberação de hormônios como adrenalina e cortisol.

Segundo a OMS, nas últimas três décadas, o número de hipertensos entre os 30 e 79 anos passou de 650 milhões para 1,28 bilhão de pessoas

PODER: MULHER OU HOMEM: QUEM TEM MAIS PREDISPOSIÇÃO PARA DESENVOLVER HIPERTENSÃO?

JGM: Nos mais jovens, a incidência é mais elevada entre homens, mas o aumento da pressão por década de vida é maior nas mulheres. A partir dos 60 anos, a pressão arterial entre elas costuma ser mais alta e a prevalência de hipertensão, maior. Em ambos os sexos, porém, a incidência aumenta com a idade.

Na faixa de 65 anos ou mais, é de 61,5% entre os homens e de 68,0% entre as mulheres.

PODER: EXCESSO DE PESO FAVORECE HIPERTENSÃO?

JGM: Sim. Obesidade e hipertensão têm uma relação linear por causa do aumento da retenção hídrica, da atividade do sistema nervoso simpático e elevação dos níveis de cortisol no sangue, fatores que contribuem para elevar a pressão.

PODER: EXISTE CRIANÇA HIPERTENSA?

JGM: Casos em crianças e adolescentes vêm aumentando nos últimos anos. Atualmente, a prevalência na idade pediátrica é de 3% a 5%; na faixa de 7 a 12 anos, de 1,9%, com porcentagens maiores entre crianças e adolescentes obesos. Esse crescimento se dá pelo aumento do consumo de produtos industrializados, sedentarismo, obesidade e até por hábitos como passar muitas horas jogando videogame, que é um gerador de estresse.

A hipertensão é responsável por 80%

dos AVCs, 65% dos infartos agudos e de 40% a 50% dos problemas renais

PODER: HIPERTENSÃO E GRAVIDEZ ESTÃO RELACIONADAS?

JGM: A hipertensão relacionada à gestação se caracteriza pelo aumento da pressão arterial normalmente no terceiro trimestre, porém sem perda de proteínas pela urina ou qualquer outro sintoma sugestivo de pré-eclâmpsia, que é quando a pressão se eleva acima de 140/90 mmHg, trazendo riscos para a mãe e o feto. Geralmente, o problema desaparece espontaneamente uma ou duas semanas após o parto. O diagnóstico precoce e o tratamento são importantes para evitar consequências para a gestante e o bebê. Sabe-se que o tratamento rigoroso da doença não traz consequências ao bebê, devendo ser sempre conduzido por um especialista. Esse cuidado é fundamental porque os distúrbios hipertensivos da gestação estão entre as principais causas de mortalidade materna e perinatal em todo o mundo. A hipertensão crônica está presente em 0,9 a 1,5% das grávidas, e estima-se que a pré-eclâmpsia complica de 2% a 8% das gestações. No Brasil, é a principal causa de parto prematuro terapêutico.

PODER: MANTER UM ESTILO DE VIDA SAUDÁVEL EVITA A HIPERTENSÃO?

JGM: Sim. Tabagismo, obesidade, dieta não balanceada e atividade física insuficiente são fatores de risco estabelecidos e alvos de intervenções para o controle da hipertensão arterial. Nos últimos anos, algumas modalidades terapêuticas não convencionais têm sido sugeridas, como a adoção de respiração lenta, em que a pessoa inspira e expira profundamente, sessões de musicoterapia. O interesse por questões ligadas à espiritualidade também pode ajudar.

PRATO BEM-FEITO

Foi no fim da década de 1990 que o National Heart, Lung and Blood Institute (NHLBI, na sigla em inglês), que tem sede nos Estados Unidos, definiu as bases da chamada dieta DASH (Dietary Approaches to Stop Hypertension). Trata-se da adoção de hábitos alimentares simples que, comprovadamente, ajudam a prevenir e a controlar a hipertensão, além de trazer outros benefícios como a redução do colesterol ruim e a prevenção de câncer colorretal, entre outros. Basicamente, para seguir a dieta DASH é preciso aumentar o consumo de frutas, hortaliças, laticínios com baixo teor de gordura e cereais integrais; e reduzir a ingestão de carnes vermelhas, gorduras, doces e bebidas com açúcar.

PODER: QUE TIPO DE EXERCÍCIOS SÃO OS MAIS INDICADOS?

JGM: Os hipertensos que seguem as recomendações de prática de atividade física apresentam uma redução de 27% a 50% no risco de morte. Sabe-se que exercícios de resistência, dinâmicos e isométricos são capazes de reduzir a pressão arterial.

PODER: UMA VEZ DETECTADA A HIPERTENSÃO, É NECESSÁRIO TOMAR MEDICAMENTO PARA SEMPRE OU É POSSÍVEL ESTABILIZÁ-LA?

JGM: A partir do momento em que é feito o diagnóstico e se estabelece o tratamento medicamentoso, deve-se fazer o controle e sempre estar em acompanhamento com um médico. Ao mudar seu estilo de vida, alguns pacientes conseguem reduzir e até suspender as medicações por um período. Outros, por sua vez, sofrem alterações em determinada estação do ano. Cada caso é um caso. n

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