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CULTURA INC
POR LUÍS COSTA
DISCUSSÃO DE
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RELAÇÃO
Um dos escritores italianos mais celebrados da atualidade, Domenico Starnone investiga em romance a delicada relação entre um casal e seus segredos
Em tempos de refúgio e hiperconvivência durante a pandemia, casais se reaproximaram, outros se afastaram. Nesse estado de intimidade crescente, de distância impossível, a relação se esgarça e segredos escapam. Mas, uma vez ditos, suas repercussões são incontroláveis.
Ano passado, Domenico Starnone, um dos mais celebrados escritores italianos contemporâneos, lançou Segredos (Todavia, R$ 59,90), livro que investiga a relação conturbada de um jovem casal: Pietro, professor de literatura na periferia de Roma, e Teresa, sua ex-aluna, agora adulta. Depois de uma briga, eles embarcam em uma aposta arriscada e sem volta: cada um deve contar ao outro
seu segredo mais terrível. A narrativa tem o arco de quase cinco décadas: dos anos 1970, quando eles mostram um ao outro seus demônios pouco de antes de romperem, aos dias atuais, quando Teresa é uma cientista de prestígio, e Pietro, já octogenário, um intelectual reconhecido e pai de uma jornalista. O segredo contado na juventude, contudo, agora assombra o velho professor.
Dito e silêncio, ego e aparência, identidade e imagem. Segredos in-
vestiga a delicada relação entre um casal e um passado que teima em não ser apagado, a ponto de ameaçar ruir uma reputação longamente construída. O livro é o terceiro de Starnone lançado pela Todavia, depois de Laços (2017) e Assombrações (2018).
A título de curiosidade: Domenico Starnone é apontado como o suposto marido de Elena Ferrante, a autora misteriosa da tetralogia napolitana iniciada por A Amiga Genial, cuja identidade é mantida em segredo. Não é certo. Sabe-se que ele é casado com a tradutora italiana Anita Raja. O que não se sabe é se Anita está por trás do pseudônimo de Elena. n
LUTA PELA TERRA
Único filme brasileiro na mostra Panorama do Festival de Berlim, A Última Floresta (Luiz Bolognesi) adentra a Floresta Amazônica para contar a história de um xamã Yanomami que tenta manter vivos os espíritos da mata e as tradições de seu povo em meio à chegada de garimpeiros na região. O elenco tem o próprio xamã Davi Kopenawa Yanomami, líder indígena premiado pela ONU por sua luta pela preservação do meio ambiente.
VERSOS DO TEMPO
Algo Antigo (Companhia das Letras, R$ 49,90), novo livro de Arnaldo Antunes, chega às livrarias com uma seleção de poemas, poemas visuais e fotografias para falar sobre o tempo – o presente e também o passado. Nos versos, o tempo do isolamento da pandemia, o de um noticiário de assombros diários e o de uma política violenta e excludente.
MÚSICA PARA CURAR
Gal Costa, 75 anos, revisita antigas canções de sua carreira, agora em parceria com jovens e velhos parceiros de estúdio. Nenhuma Dor (Biscoito Fino), disponível nas plataformas digitais, foi concebido e finalizado em 2020, quando Gal, sem gravar e fazer shows, resolveu pela primeira vez tentar a experiência de uma gravação remota com vozes e instrumentos de músicos que admirava, como Rodrigo Amarante, Seu Jorge, Rubel, Silva, Criolo e Jorge Drexler.
O IMPÉRIO POR DENTRO
House of Cardin é uma imersão na mente de um dos nomes mais celebrados da história da moda. A vida do estilista francês Pierre Cardin, que morreu em dezembro do ano passado aos 98 anos, é revisitada em um documentário que teve acesso exclusivo aos arquivos do seu império, com entrevistas inéditas. O filme está disponível nas plataformas Looke, NOW, Vivo, Microsoft, Google Play e iTunes.
LIVRO
A DOR DE LEMBRAR
Luiz Schwarcz, fundador da Companhia das Letras, lança livro de memórias em que resgata passado de dor da família e narra luta contra a bipolaridade
“Não sou sócio de nenhum clube de orgulho bipolar”, afirma Luiz Schwarcz, fundador da Companhia das Letras. Aos 65 anos, ele agora revolve o passado da família, marcada por traumas da Segunda Guerra Mundial, para contar uma trajetória de perdas, silêncios e angústias. Em O Ar que Me Falta – História de uma Curta Infância e de uma Longa Depressão (Companhia das Letras), a história de dois refugiados da perseguição nazista que se encontram no Brasil é o mote para um relato pessoal de uma vida com bipolaridade, transtorno mental marcado pela alternância entre períodos de depressão e de euforia.
“Um objetivo que tive foi escrever afetivamente, sem julgar e sem simplificar a vida das pessoas. Elas são complexas, contraditórias e no caso dos meus pais, lindas, a seu modo”, diz Schwarcz. Andras, húngaro que escapou de um trem a caminho do campo de extermínio de Bergen-Belsen e não pôde salvar o pai. Mirta, croata que, aos 3 anos, teve de decorar um nome falso, fugiu com a família para a Itália e depois para o Brasil. Filho desse casal, Schwarcz sentiria o peso da culpa que Andras carregava por não ter conseguido evitar a morte do pai. “Eu sempre pensei em escrever sobre o meu pai. Sobre o silêncio dele. Talvez esse silêncio me abalou tanto, por tantos anos, que eu sempre esperava me curar pela ficção”, diz Schwarcz. Ele decidiu escrever a história após um episódio em que a depressão tirou-lhe o ar, no topo de uma montanha, quando esquiava com as netas.
“Este livro é sobre a doença, mas também sobre minha infância, minha família, o Holocausto. Porém a depressão é o fio da vida que consegui narrar. Ela certamente não é engrandecedora, e, paradoxalmente, isso me agrada literariamente mais do que os aspectos normais, bem-sucedidos, vitoriosos”, afirma. Com um relato íntimo, o livro recusa a autocelebração e prefere caminhos mais tortuosos, contando episódios de fúria provocados pela bipolaridade e narrando experiências sexuais. “Não quis tratar de nada engrandecedor nas minhas memórias.”
TERRÁQUEOS
SAYAKA MURATA TRAD: RITA KOHL
(ESTAÇÃO LIBERDADE)
Depois de se tornar um fenômeno internacional com Querida Konbini, a romancista japonesa narra uma história distópica sobre abuso sexual, a sensação de eterno deslocamento na sociedade e a busca por rotas de fuga.
FOTOBIOGRAFIA JOÃO CABRAL DE MELO NETO
EUCANAÃ FERRAZ E VALÉRIA LAMEGO
(VERSO BRASIL)
O pernambucano era avesso a celebrações biográficas e pedia que não incluíssem a sua foto nas edições de seus livros. Mas ganhou esta esplêndida fotobiografia, organizada por Valéria Lamego e Eucanaã Ferraz, com mais de 500 imagens e até poema inédito. As escolhas literárias do mês pelo editor Paulo Werneck
VISTA CHINESA
TATIANA SALEM LEVY
(TODAVIA)
Uma carioca de classe alta vai até a Floresta da Tijuca para correr. No ponto turístico que dá nome ao livro, é surpreendida por um estuprador. A história aconteceu com uma amiga da autora, que transformou o relato em um livro curto, que se lê com o coração na boca.
NOITE VIRA DIA
RICHARD MCGUIRE TRAD: ALICE SANT’ANNA
(COMPANHIA DAS LETRINHAS)
O autor da aclamada graphic novel Aqui narra neste álbum infantil com desenhos de encher os olhos as diversas transformações de uma coisa em outra: noite em dia, árvore em papel, papel em notícia, notícia em lixo, lixo em novidade...