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Por Rodrigo Penna
P O R LU I T P S
A VOZ DA EXPERIÊNCIA
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Duas gerações e duas visões diferentes de mundo: o fim de uma reunião de mais um aprendiz do mercado financeiro
Sentou ao fundo da mesa e abriu um botão do terno novo, deixando os “Hs” da gravata aparentes – tinha comprado o acessório em Paris há três anos e gostava de usar em ocasiões especiais. Aquela seria a primeira reunião desse jovem banqueiro para o fechamento de um grande negócio e ele já se sentia o Warren Buffett em dia de reunião de conselho. Distribuiu pela mesa seus cartões – cada um deles levava seu nome abaixo do logo do banco de investimentos no qual trabalhava como analista há três anos –, ligou o iPad e a tela já mostrava suas anotações. Havia estudado suas falas durante toda a noite anterior. Além de deixá-lo bem na fita com o diretor, participar daquela venda significava um bônus gordo, que provavelmente usaria para dar um upgrade em seu BMW para um modelo igual ao do pai.
O dono da empresa estava ao fundo da sala e nem parecia o fundador de uma das maiores cadeias de varejo da América Latina, com seu sapato de couro surrado e camisa social sem terno. No momento que o empresário se calou com ar de questionamento, o analista acreditou que havia chegado o momento de seu triunfo. Respirou fundo e começou: – Seu endividamento dobrou nos últimos três anos e a margem operacional está quatro pontos percentuais abaixo da média do mercado. Com os recursos oferecidos pelas suas ações, a empresa poderá reduzir o nível de alavancagem e refinanciar... – Quantos anos você tem, garoto? – o empresário o interrompeu. – Vinte e seis. – E por quanto tempo estudou minha empresa? – Estou analisando os números a fundo há mais de três meses – disse o aprendiz, tentando manter a pose enquanto ajeitava os óculos – Sou especialista em bens de consumo. – Bom, rapaz – o empresário prosseguiu – Quando tinha sua idade, pegava dois ônibus lotados para visitar fábricas por toda a cidade atrás de tecido barato. Até tinha carro, mas vendi para que minha mulher pudesse levar as crianças na escola. Quando me endividei para comprar minha primeira fábrica, tive de avisar um dos meus filhos que ele teria que ir para escola pública para que o mais novo se formasse. Sobrevivi a quebra do varejo nacional com a abertura da importação nos anos 1990, hiperinflação por duas décadas e a alta carga tributária deste país. Sei o nome dos meus 3 mil funcionários e construí uma rede de mais de 300 lojas diante desse cenário. E você, o que tem para falar sobre minha empresa mesmo?
Desconsertado, o jovem analista não parecia ter a mesma confiança. Não falou mais nada por toda a reunião. Sabia apenas que nunca mais usaria aquela gravata.
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CARIOCA, LUI TPS É FINANCISTA E AUTOR DO ROMANCE VIEIRA SOUTO 458, FICÇÃO SOBRE A EXTRAVAGÂNCIA E A DECADÊNCIA DA JUVENTUDE DOURADA DO RIO DE JANEIRO
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