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destaque na gestão João Doria

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HIGH TECH

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POR UM CAPITALISMO CIVILIZADO

Encontro convocado O Fórum Econômico mente essa nova Davos – a mensapelo papa Francisco Mundial de Davos, na Suíça, um dos princigem é que o planeta, em iminência de um colapso por conta do aquebusca soluções para pais encontros do pocimento de sua temperatura méuma economia global der político-econômico do planeta, viveu, dia, é, no fim das contas, o maior de todos os stakeholders. mais justa e menos na celebração de seus 50 anos, mês Ironicamente, essa nova agenda predatória. Tudo o que passado, seu momento de inflexão. Ou assim o encontro quis se aproximou o fórum de Davos do temário de um encontro de três o Fórum Econômico vender. Afinal, pela primeira vez dias que o papa Francisco conMundial de Davos desde 1973, o fundador e organizador, Klaus Schwab, atualizou o vocou para março, em Assis, na Itália, chamado de Economia de anda pensando – “manifesto” que norteia as prátiFrancisco. Trata-se de um Fórum ou, ao menos, diz cas do capitalismo que Davos endossa, chancela e incita. No novo Econômico Mundial do B, pode-se dizer, que tem como patrono não estar pensando – manifesto, quem passa a ter a preexatamente o papa, mas São Franultimamente cedência antes dada ao sharehol der (o acionista) é o stakeholder. cisco, o santo mendicante de há bitos mais do que austeros, críti Definir stakeholder é espeto. Um co de primeira hora da opulência POR PAULO VIEIRA jornal brasileiro adotou a curiosa eclesiástica e que nasceu, pregou expressão “partes interessadas”. e morreu em Assis. São partes interessadas funcioO encontro contará com econários, clientes e a sociedade imnomistas jovens de todo o munpactada pelos bens produzidos ou do para discutir maneiras de, nas comercializados pelas empresas. palavras de Vossa Reverendíssima, Acionistas também estão no barco. “aliviar o peso” que verga sobre os Ter como conferencistas a atimais pobres. A ideia é buscar cavista sueca Greta Thunberg e o minhos para o desenvolvimento de ex-vice-presidente americano Al uma “economia circular” de beneGore, vozes estridentes da quesfício coletivo – planeta por óbvio tão ambiental, marcou simbolicaincluído. A falar a essa grei, estre

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“Apesar do discurso em favor do stakeholder, o shareholder, o acionista, sempre quer arrancar mais um pouquinho. É natural”

Ladislau Dowbor, professor do departamento de pós-graduação da PUC-SP

las como os prêmios Nobel Amartya Sen, um dos idealizadores do conceito de IDH, o índice de desenvolvimento humano, e Muhammad Yunus, talvez o único banqueiro do mundo incapaz de aprender como espoliar os pobres, além do economista americano Jeffrey Sachs, conselheiro da ONU e especialista em temas como desigualdade e pobreza, entre outros.

O Brasil levará uma das maiores delegações a Assis, junto com países como Itália e Estados Unidos. Professor do departamento de pós- -graduação da PUC-SP, Ladislau Dowbor vai ao encontro munido de “otimismo prudente”, como disse a PODER. Ao mesmo tempo em que enxerga um consenso entre os atores econômicos de que “há uma necessidade de mudança” do sistema que “exclui milhões de pessoas, dilapida recursos naturais e protege boa parte do PIB mundial em paraísos fiscais”, ele tem bastante claro os limites entre teoria e prática. “Apesar do discurso em favor do stakeholder, o shareholder sempre quer arrancar mais um pouquinho, é natural”, diz. “A Samarco sabia que o dique de Brumadinho estava vazando, mas quem vai comunicar isso para o cara que compra os papéis do Bradesco, um dos controladores da Vale e, assim, da própria Samarco?” Dowbor vê um “sistema de desresponsabilização” das empresas, abertas ou não, que ainda obedece à lógica do melhor resultado financeiro a qualquer custo. É o caso, ele reforça, do “dieselgate”, o escândalo promovido pelos executivos alemães da Volkswagen que investiram, na década passada, no desenvolvimento de um software para modificar os resultados dos testes de controle de emissão de poluentes dos carros da marca. Nesse caso, jogar óxido de nitrogênio em índices superiores ao tolerável no ar pareceu menos lesivo do que deixar de entregar o resultado do ano.

Outro brasileiro que vai a Assis é o economista paulistano Diego Wawrzeniak, que vive com outras 30 pessoas na comunidade Inkiri/ Piracanga na paradisíaca península de Maraú, na Bahia. A sociedade alternativa à beira-mar leva em conta valores como sustentabilidade ambiental, justiça, empode

ramento humano e espiritualismo. Wawrzeniak ajudou a implantar ali soluções econômicas baseadas no microcrédito. Até uma moeda própria passou a circular por lá.

MENSAGEM

Artífice e protagonista em Assis, o papa também esteve em Davos, embora não de corpo presente. Francisco endereçou aos líderes mundiais que acorreram ao encontro suíço – como Donald Trump, João Doria e Paulo Guedes – uma carta em que alertou da “obrigação moral” de colocar “o ser humano, e não a mera procura de poder ou lucro, no centro das políticas públicas”. A frase é coerente com o que Francisco chamou de “ecologia inte

O papa Francisco, que lidera em março um Fórum Econômico do B em Assis, na Itália, e algumas das estrelas de Davos a ladeá-lo, o brasileiro Paulo Guedes e a sueca Greta Thunberg

gral” na encíclica Laudato si’, de 2015, o principal documento produzido até aqui pelo Vaticano sob sua chefia. “A proteção do meio ambiente deverá constituir parte integrante do processo de desenvolvimento”, diz a encíclica, aduzindo que “a análise dos problemas ambientais é hoje inseparável da análise dos contextos humanos, familiares, laborais, urbanos e da relação de cada pessoa consigo mesma”.

É pertinente supor que ninguém vá a Assis só para marcar posição nas redes sociais e fazer greenwashing na própria imagem. A condução do papa e a simbologia da cidade levam a crer que a desigualdade e a sustentabilidade, temas de eleição da Economia de Francisco, perturbam de fato os congressistas. Mas se até mesmo os barões do capital de Davos, que não fizeram nos últimos anos outra coisa senão esticar a corda de um modelo já muito tensionado, desenveram certa paúra do lucro pelo lucro, tudo é possível.

Jamie Dimon, CEO do banco JP Morgan, disse recentemente que líderes políticos e empresariais “perderam a visão de como o capitalismo pode criar oportunidades para todos” e vê o sistema em seu “tipping point” – o ponto de mudança. Mas é ao mesmo Dimon que é creditada a seguinte frase: “Davos é o lugar onde bilionários dizem a milionários como a classe média deveria trabalhar mais para ajudar os pobres”. n

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