Aplicações matemáticas com tecnologias de informação e comunicação

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Lisani Geni Wachholz Coan Méricles Thadeu Moretti (Orgs.)

Aplicações matemáticas com Tecnologias de Informação e Comunicação Cooperação entre UFSC, IFSC e UMINHO

Florianópolis/SC

2016


Editora Insular

Aplicações matemáticas com Tecnologias de Informação e Comunicação Cooperação entre UFSC, IFSC e UMINHO

Lisani Geni Wachholz Coan Méricles Thadeu Moretti (Orgs.)

Editor Nelson Rolim de Moura Projeto gráfico e capa Carlos Serrao Revisão Carlos Neto

Aplicações matemáticas com tecnologias de informação e comunicação – cooperação entre UFSC, IFSC e UMINHO. Lisani Geni Wachholz Coan, Méricles Thadeu Moretti (Orgs.) / Florianópolis : Insular, 2016. 232 p. : il. ISBN 978-85-7474-898-6 1. Educação matemática 2. Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) I. Título CDD 370

Editora Insular Rodovia João Paulo, 226 Florianópolis/SC – CEP 88030-300 Fone/Fax: (48) 3232-9591 editora@insular.com.br –www.insular.com.br – twitter.com/EditoraInsular

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Especiais agradecimentos ao CNPQ que financiou a publicação do presente livro. Aos autores dos artigos da coletânea que contribuíram com os resultados de estudos, pesquisas ou apresentação de diferentes estratégias de ensino realizadas ao longo dos últimos três anos. Reforçamos que a divulgação destes resultados é de fundamental importância para que professores agreguem novos elementos para o enfrentamento das dificuldades que emergem no processo de ensino e aprendizagem relacionadas à Educação Matemática.



Sumário Apresentação.........................................................................11 O uso das TIC no ensino: apontamentos de professores de Matemática do IFSC/Florianópolis.......................................17 Lisani Geni Wachholz Coan, Floriano Viseu, Méricles Thadeu Moretti

A resolução de tarefas matemáticas com recurso ao Sketchpad.........................................................................43 Floriano Viseu

O uso de calculadora científica no ensino de Números Complexos: uma proposta metodológica.............63 Antônio João

Atividade experimental: uma opção metodológica para o ensino de Matemática e Física .....................................81 Elenita Eliete de Lima Ramos, Carlos Antônio Queiroz

Estudo da Cicloide: uma proposta de ensino para o Ensino Médio..............................................................95 Gustavo Camargo Bérti

Funções Exponencial e Logarítmica na perspectiva da Educação Financeira: uma proposta de sequência didática.....111 Graciele Amorim Zimmermann

O conhecimento de Probabilidades de futuros educadores e professores dos primeiros anos..........................................123 José António Fernandes, Floriano Viseu, María M. Gea

Integrar novas tecnologias na prática docente do IFSC: os desafios relativos ao uso do Moodle.................................143 Lisani Geni Wachholz Coan, José Carlos Kahl, Viviam Giacomelli Pedroso, Méricles Thadeu Moretti, Floriano Viseu


Aplicação dos conceitos de Integrais Definidas no cálculo do volume do tronco do Cone por meio dos Registros de Representações Semióticas....................................................167 Marleide Coan Cardoso, Vanessa da Silva Pires

Recursos para o Ensino de Matemática ao aluno deficiente visual...................................................................................195 Ranúzy Borges Neves

Gráfico Tabuleiro: a construção e o relato de experiência de um jogo no Ensino de Estatística......................................213 Viviam Giacomelli Pedroso


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Apresentação

N

as últimas décadas muitas reflexões, estudos e pesquisas têm sido desenvolvidas no campo da Educação Matemática, tanto aqui no Brasil como em outros países, levando-se em consideração os desafios que a sociedade moderna coloca, especialmente em relação à formação inicial e continuada dos professores bem como à formação matemática dos alunos para os diferentes níveis e modalidades de ensino. Os esforços concentram-se nas questões que levam em conta a apropriação e otimização de novas ferramentas tecnológicas no processo de ensino e aprendizagem de conhecimentos matemáticos, uma vez que nos cursos de formação inicial dos professores de Matemática, pouca ou nenhuma atenção é atribuída para o uso das TIC. Cada vez mais se concentram as atenções para promover e divulgar distintas práticas pedagógicas que possam auxiliar outros colegas no fomento de sua formação e capacitação. Os pesquisadores que discutem práticas pedagógicas dos professores que ensinam matemática se apoiam em distintos fundamentos epistemológicos, sociológicos ou filosóficos, permeando quadros teóricos que amparam a perspectiva da inovação e da reflexão, os quais estão voltados para o campo da formação de professores, tanto inicial quanto continuada, sendo a última um grande desafio, e por que não, o mais motivador. Nossa opção, na presente obra foi olhar para o aspecto da práxis docente, ou seja, qual a contribuição maior para a formação continuada de professores de Matemática, senão olhar para aquilo que o professor já faz em sala de aula, resultado de experiências vivenciadas e de objetos de pesquisas que estão apontando novas possibilidades. Lembra-se que neste contexto, o desafio que salta aos olhos é relativo à integração e otimização das novas tecnologias no processo de ensino e, nesse sentido, destaca-se que os professores, não só de Matemática, desejam muito e, precisam ter oportunidade deste aprimoramento. Levando-se em consideração que as universidades e institutos federais estabelecem cooperação com universidades estrangeiras, como é o caso da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) e a Universidade do Minho (UMINHO) de Portugal, abordam-se, nesta obra, trabalhos que envolvem pesquisadores destas insti11


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tuições. Assim, o primeiro artigo “O uso das TIC no ensino: Apontamentos de Professores de Matemática do IFSC/Florianópolis”, de autoria de Lisani Geni Wachholz Coan (IFSC), Floriano Viseu (UMINHO) e Méricles Thadeu Moretti (UFSC), vem nos apresentar os resultados de uma pesquisa realizada com os professores de Matemática do Campus de Florianópolis do (IFSC), relativa a suas perspectivas sobre o uso e a integração das tecnologias no processo de ensino e aprendizagem. Evidencia-se que os professores de Matemática sinalizam a lacuna em sua formação inicial no aspecto da discussão, da apropriação e do desenvolvimento de situações diferenciadas que privilegiem o uso das TIC. Nesse sentido, vislumbra-se que a formação continuada dos professores, com bastante ênfase, vem acontecendo e deva ter espaço, dentro do próprio ambiente de trabalho, com a realização de eventos promovidos entre os colegas, nos quais se oportuniza a divulgação das diferentes estratégias de ensino que professores desenvolvem e adotam. A seguir, apresenta-se o artigo que orienta o uso de recursos tecnológicos, como é o caso do Geomert´s Sketchpad (GSP), que potencializa, a partir da construção de um dado objeto matemático, a exploração de propriedades e de regularidades, desenvolvido por Floriano Viseu da UMINHO, denominado “A Resolução de Tarefas Matemáticas com Recurso ao Sketchpad”. Neste estudo o autor aborda o uso deste software para explorar problemas de Geometria e de Álgebra, focando o triângulo equilátero, o triângulo duplicado e o teorema de Pitágoras, assim como de área máxima de retângulos com o mesmo perímetro e volume máximo de uma caixa. No IFSC, os professores de Matemática atuam em diferentes níveis e modalidades de ensino o que justifica que se evidencie a necessidade da realização de capacitação contínua. Tal justificativa corrobora a intenção da proposta do artigo que aborda os conteúdos matemáticos, relativos a Números Complexos, de forma que o tratamento, a justificativa e a contextualização evidencie a aplicação prática dos conteúdos em cursos técnicos de Eletrotécnica e Eletrônica do IFSC, uma vez que nestes cursos este conhecimento é um dos pré-requisitos de outros conteúdos específicos destas áreas de profissionalização, nas quais há o uso de calculadoras científicas, o que nem sempre é familiar aos professores de Matemática, conforme destacaram os autores do primeiro artigo desta obra. Assim, o professor e pesquisador Antônio João contribui com a abordagem sobre a praxi da dinâmica da integração desta tecnologia em: “O Uso de Calculadora Científica no Ensino de Números Complexos: uma Proposta Metodológica”. 12


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Na sequência, o texto “Atividade Experimental: uma Opção Metodológica para o Ensino de Matemática e Física”, de autoria de Elenita Eliete de Lima Ramos e Carlos Antonio Queiroz, traz o resultado de um trabalho interdisciplinar entre as Unidades Curriculares de Matemática e Física numa turma de Ensino Médio integrado à Educação Profissional na modalidade de Educação de Jovens e Adultos. Os autores apresentam uma opção metodológica que tem como foco as atividades experimentais. Apoiam-se na teoria das Representações Semióticas de Raymond Duval e convidam o leitor a refletir como as diferentes representações de um objeto matemático adquirem sentido e significados por meio de atividades experimentais. Dando prosseguimento, seguem dois artigos que tratam da aplicação de uma sequência didática. O primeiro deles, desenvolvido por Gustavo Camargo Berti, o “Estudo da Cicloide: uma Proposta de Ensino para o Ensino Médio”, objetiva apresentar aos professores de Matemática uma possibilidade de exploração dos conteúdos conceituais referentes à geometria considerando-se a ação de movimento, obtida por meio da aplicação de uma sequência didática. Seu estudo utiliza a cicloide, uma curva descrita mecanicamente, para a qual propõe a utilização do software de geometria dinâmica GeoGebra, o qual permite a sua construção por meio da aplicação de propriedades geométricas e a visualização da curva gerada ao se aplicar o movimento nessa construção. Além disso, o autor observa a importância de estabelecer o paralelo entre as geometrias plana e analítica, uma vez que a curva cicloide também é gerada por meio de equações paramétricas. O outro, denominado “Funções Exponencial e Logarítmica na Perspectiva da Educação Financeira: uma Proposta de Sequência Didática”, de Graciele Amorim Zimmermann, também resulta de estudos relacionados a praxi pedagógica que utiliza a sequência didática para explorar os conhecimentos relativos aos conteúdos de Função Exponencial e Função Logarítmica no Ensino Médio na perspectiva da Educação Financeira. Esta situação envolve o pagamento mínimo de uma fatura de cartão de crédito e atende a proposta que vislumbra tornar esses conteúdos matemáticos mais significativos para o estudante e atender as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) que consideram que é de extrema importância os alunos terem contato com a Educação Financeira no ambiente escolar. O artigo de José António Fernandes, Floriano Viseu e María M. Gea, denominado “O Conhecimento de Probabilidades de Futuros Educadores e Professores dos Primeiros Anos”, apresenta resultados de um estudo so13


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bre a adequação do conhecimento de probabilidades de futuros educadores e professores dos primeiros anos de escolaridade observando-se a sua importância e as exigências de ensino desse tema para os alunos destes anos de escolaridade. Isto é, os futuros educadores e professores, que já tiveram contato com este tema no curso universitário, responderam a três tarefas, que versam sobre os conteúdos: definição de acontecimentos certos, probabilidade simples e probabilidade conjunta e condicional. Os resultados apontam que os futuros educadores e professores manifestam dificuldades na resolução das tarefas e recomenda-se que a sua formação em probabilidades seja aprofundada ao longo da sua formação acadêmica, sendo que na tarefa de probabilidade simples, eles apresentaram um melhor desempenho. Dado que a presente obra leva em consideração a contribuição para a formação inicial e continuada de professores, em especial da área que trata dos conteúdos matemáticos, relativos a novas propostas de ensino, deve-se buscar elementos que apontem em qual dimensão o sistema de ensino coloca fragilidades de modo que as instituições revejam algumas políticas de atuação. A exmplo disso, a proposta trazida pelos pesquisadores, Lisani Geni Wachholz Coan, José Carlos Kahl, Viviam Giacomelli Pedroso, Méricles Thadeu Moretti e Floriano Viseu, denominada “Integrar Novas Tecnologias na Prática Docente do IFSC: os Desafios Relativos ao Uso do Moodle” referencia a importância de se realizar um mapeamento sobre a possibilidade de integrar novos recursos tecnológicos na prática docente. No Campus de Florianópolis, do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), o Moodle já é aderido na prática docente fazem alguns anos, como aliado ao ensino presencial, mais efetivamente para os professores que atuam no ensino da modalidade de Educação a Distância (EaD). Porém, o questionário respondido por 76 professores mostra que, os docentes gostariam de usar este recurso, dado as suas potencialidades para fazer um acompanhamento aos alunos, devido às dificuldades de aprendizagem ou mesmo para melhor suprir e atendê-los para além da sala de aula presencial, mas poucos sabem usá-lo. Os resultados da pesquisa orientam que a instituição precisa dar o devido espaço para capacitar seus docentes para melhor otimizarem e integrarem novas tecnologias e ambientes virtuais de aprendizagem no contexto educativo. Outro artigo denominado “Aplicação dos Conceitos de Integrais Definidas no Cálculo do Volume do Tronco do Cone por Meio dos Registros de Representações Semióticas”, das autoras Marleide Coan Cardoso e Vanessa 14


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da Silva Pires, aborda a importância do uso da teoria de Registros de Representação Semiótica, aplicada ao estudo do cálculo do volume de um sólido de revolução. Esta teoria possibilitou ilustrar a complexidade de abordagem do volume do tronco de cone nos diferentes níveis de ensino da Matemática utilizando os conceitos do cálculo diferencial e integral, sendo que o objeto matemático escolhido foi o tronco de cone ou cone truncado. Esta proposta pode ser uma metodologia alternativa ao processo ensino-aprendizagem do Cálculo Diferencial e Integral. Nos últimos anos muitos pesquisadores têm tido a preocupação de perceber como a Educação Matemática pode estar mais próxima dos alunos que têm necessidades especiais, claro que novamente o foco é no papel do professor enquanto agente de atuação no contexto das políticas adotadas pelas esferas governamentais colocadas em prática. Nesse sentido a autora Ranúzy Borges Neves, no artigo denominado “Recursos para o Ensino de Matemática ao Aluno Deficiente Visual”, apresenta alguns recursos criados por instituições e professores brasileiros, no intuito de auxiliar o ensino de Matemática para alunos cegos. Sabe-se que nem sempre a implementação e execução de projetos que atendam as necessidades dos alunos com deficiência, contemplam e propiciam a efetiva capacitação de professores. Assim, a autora contribui com elementos para a formação de professores de Matemática, sinalizando diferentes materiais que podem ser utilizados junto a alunos que tenham deficiência visual, uma vez que o docente deverá estar capacitado a lidar com este aluno, buscando através de práticas pedagógicas, a inclusão e inserção do mesmo em sala de aula. O último artigo da coletânea traz o resultado da aplicação de uma experiência metodológica que envolve o conteúdo de Estatística em cursos de nível médio. A autora do projeto, professora e pesquisadora Viviam Giacomelli Pedroso, compartilha esta prática com os leitores com intuito de oferecer novas estratégias de ensino para aplicação destes conhecimentos matemáticos. O texto “Gráfico Tabuleiro: a Construção e o Relato de Experiência de um Jogo no Ensino de Estatística” expõe um modo alternativo de trabalhar exercícios do conteúdo de Estatística no Ensino Médio e nos cursos técnicos integrados através de um jogo, tornando a aprendizagem mais atrativa para os alunos. Esse jogo de tabuleiro teve sua primeira experimentação e ajustes no IFSC Campus Florianópolis e tem sua elaboração, regras e uso totalmente embasados em elementos estatísticos de gráficos, tabelas e medidas de tendência central, visando trabalhar fatores teóricos e 15


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práticos do conteúdo. Além disso, a proposta privilegia o uso da calculadora na execução das tarefas elaboradas neste jogo. Enfatiza-se que as contribuições apresentam elementos e possibilidades para a prática dos professores que ensinam Matemática, sinalizando que é importante promover a divulgação das experiências que torna a aprendizagem de conteúdos matemáticos mais significativa para os alunos. Igualmente, fornecem dados que sinalizem diferentes cursos e percursos para os professores que atuam nos diferentes níveis e modalidades de ensino, frente aos inúmeros desafios que a sociedade contemporânea nos apresenta, em especial sob foco do efetivo partido que se pode tirar das novas ferramentas tecnológicas que invadem e são fatos concretos no espaço e na vida dos nativos digitais. Lisani Geni Wachholz Coan Méricles Thadeu Moretti

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O uso das TIC no ensino: apontamentos de professores de Matemática do IFSC/Florianópolis Lisani Geni Wachholz Coan1 Floriano Viseu2 Méricles Thadeu Moretti3

Resumo

O

presente estudo objetivou perceber como os professores de Matemática do Campus de Florianópolis do Instituto Federal de Educação de Santa Catarina (IFSC) perspectivam o uso e a integração das tecnologias no processo de ensino e aprendizagem. O objetivo foi averiguar de que forma a utilização de recursos tecnológicos possibilita uma inovação metodológica na prática docente do IF-SC. São analisadas as perspectivas sobre o uso das TIC por dez professores de Matemática que atuam em diferentes níveis e modalidades de ensino. A atuação destes professores se dá nos cursos Técnicos de Nível Médio, nos cursos Subsequentes, nos cursos de Graduação e Pós-Graduação, bem como na modalidade de Educação de Jovens e Adultos. Percebe-se que os professores de Matemática almejam fazer capacitação continuada para buscarem o aprimoramento sobre o uso e otimização de novas tecnologias que ofereçam distintas oportunidades de aprendizagem aos alunos, uma vez que os cursos de formação inicial ainda não contemplam este aspecto. Palavras-chave: Uso de tecnologias. Professores de Matemática. Formação continuada.

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PhD em Educação Matemática (PPGECT/UFSC, 2015). Doutora em Educação Matemática (IE/UMINHO-PT, 2012. Professora de Matemática do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC). Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Aplicações Matemáticas (GPAM). Contato: lisanigwc@gmail.com Doutor em Educação, Especialização em Didática da Matemática, pela Universidade de Lisboa. Professor Auxiliar do Instituto de Educação da Universidade do Minho. Investigador do Centro de Investigação em Educaçãp (CIEd). Contato: fviseu@ie.uminho.pt. Doutor em Educação Matemática pela ULP/Estrasburgo. Professor titular voluntário da UFSC e permanente do PPGECT/UFSC. Contato: mthmoretti@gmail.com 17


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Diariamente nos confrontamos com situações distintas que remetem para questionamentos sobre a possibilidade de conseguirmos viver sem as tecnologias, uma vez que estamos no advento das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC). O presente texto4 aborda as questões relativas ao uso das TIC no âmbito do processo de formação dos docentes e das implicações desse uso na prática pedagógica. Nesse sentido, faz-se uma revisão de literaturas sobre a expressiva manifestação e presença das tecnologias no contexto da sociedade contemporânea em detrimento do papel da Escola e dos professores frente a esta demanda. Busca-se perceber como a formação, inicial e continuada, dos professores de Matemática sinaliza a devida relação que se estabelece entre o uso e integração das TIC e o processo de ensino e aprendizagem. Aplicou-se uma entrevista a dez professores de Matemática do IFSC – Campus de Florianópolis, para averiguar a des(sintonia) que há entre a demanda e a formação de professores bem como os entraves que se fazem presente no ambiente de trabalho, os quais contribuem para o impedimento de uma melhor apropriação de artefatos tecnológicos. Nas últimas décadas ouviu-se muito dizer que a Escola precisa dar abertura à integração e uso das TIC uma vez que os alunos estão fortemente inseridos no mundo tecnológico. Nesse sentido, tenta-se visualizar como se deu o tratamento da integração e do uso das TIC no sistema educativo, em especial no que diz respeito ao ensinar e aprender. A integração das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) no processo de ensino e aprendizagem faz com que haja uma verdadeira transformação que vai para além da simples incorporação de um novo recurso na sala de aula. Dentre as diversas possibilidades que as TIC proporcionam nesse processo, destaca-se o uso do computador ligado à Internet (MIRANDA, 2007). Para esta autora, os professores devem saber tirar partido do ‘arsenal’ tecnológico que têm à sua disposição com os alunos, na exploração, tratamento e representação da informação de modo que corroborem na construção de conhecimentos significativos e que auxiliem o desenvolvimento de projetos, entre outros fatores. Nesse sentido faz-se uma apresentação de como se deu este processo no Brasil para situar o quanto é lento para as inovações se concretizarem se não há o devido apoio de todas as esferas governamentais. Analisa-se ainda como esta discussão se arrolou em Portugal, que é um dos países da Europa 4 18

Para maior aprofundamento da temática, consultar Coan (2012).


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que em meados da década de setenta o governo sinalizou que o caminho da integração e utilização das TIC necessariamente passava pelo sistema educacional. Observa-se que não se tem a pretensão de fazer comparativos sobre a otimização e uso das tecnologias nas Escolas, mas sim visualizar o que o sistema brasileiro pode melhorar a partir das experiências já firmadas há pelo menos duas décadas neste país. Não restam dúvidas que nos últimos tempos, em diferentes Continentes, muitos pesquisadores se debruçaram sobre como tirar pleno partido das ferramentas tecnológicas no contexto educacional para as diferentes modalidades e níveis de ensino. Lembra-se que em países como Portugal, por exemplo, os olhares dos educadores e de governos se voltaram veementemente para perceber como o uso das TIC iria revolucionar o ensino e a aprendizagem bem antes de se falar nisso no Brasil. Em nosso país, a discussão deste processo de otimização e integração das tecnologias no sistema de ensino avança mais lentamente e tarda um pouco em relação a outros países por se tratar de inovações fragmentadas e não como uma política de Estado. Nesse aspecto tenta-se inicialmente compreender como se deu a integração das TIC no sistema educacional brasileiro.

A integração das TIC no Sistema Educativo: uma retrospectiva Num país, como é o caso do Brasil, com tantas singularidades, conforme observa o Ministério da Ciência e da Tecnologia, precisa-se ampliar as condições de acesso e uso das TIC nos diferentes segmentos da sociedade, garantindo a educação como atividade permanente na vida dos cidadãos bem como a capacidade de desenvolvimento de novas habilidades no novo cenário de mudança acelerada. Destaca-se que paralelamente à questão da oferta de um ensino de primeiro mundo para todos os alunos brasileiros, estampam problemas cruciais que passam à margem das prioridades das distintas esferas de governos. Uma delas é a urgência no combate ao expressivo número de cidadãos adultos que são analfabetos, o que certamente terá reflexos ao se tratar o uso das TIC. Segundo a UNESCO (2011), o Brasil aparece em terceiro lugar dentre os dez países selecionados com maior índice de adultos analfabetos, entre 2005 e 2008, com 14 milhões. Atualmente, encontra-se entre os 53 países que estão mais distantes quanto ao alcance e cumprimento dos “Objetivos da Educação para Todos” até 2015, mesmo diante dos sinais positivos que se têm observado nas últimas décadas. Contudo, para a UNESCO (2011), o 19


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Brasil, dentre os 164 países representantes em Dakar, assumiu-se que nos diversos compromissos assumidos se situa a oportunidade dos brasileiros terem acesso às Tecnologias de Informação e Comunicação. Para a Missão para a Sociedade da Informação (1997), a Escola será um dos principais interventores a garantir segurança e solidez no futuro e deverá desempenhar um papel fundamental na formação dos cidadãos, preparando-os para a Sociedade da Informação. Para tanto, busca-se identificar os principais esforços que marcaram as últimas décadas quanto à incorporação das tecnologias no sistema educativo brasileiro. No século passado, mais precisamente na década de 70, foram realizadas as primeiras iniciativas para definir uma política de informática para o país que atendesse ao desenvolvimento de produtos e demandas de serviços da microeletrônica. De acordo com Almeida (2008), as políticas educativas de países como a França, os Estados Unidos e Portugal têm influenciado significativamente o âmbito da realidade da educação brasileira quanto à integração das tecnologias digitais neste setor. No início dos anos 80, realizou-se o I Seminário de Informática Educativa no Brasil, do qual resultaram projetos como Educom, Formar e PROINFO (Borba & Penteado, 2007; Moraes, 2000; Prado & Silva, 2009). O Projeto Educação por Computadores (Educom) foi lançado em 1983 pela Secretaria Especial de Informática – SEI do Ministério da Educação e Cultura (MEC), o qual propõe que as universidades brasileiras apresentem propostas para a criação de centros pilotos em Informática na Educação. Os centros pilotos faziam um trabalho integrado com escolas de Ensino Básico. Optou-se por realizar experiências piloto, para depois haver uma disseminação significativa a nível nacional (Borba & Penteado, 2007). Na sequência, em 1986, o MEC lança o Projeto Nacional de Formação de Recursos Humanos em Informática na Educação (FORMAR), com o intuito de preparar os professores formadores (multiplicadores) para a disseminação a nível nacional do uso pedagógico do computador nas escolas (Borba & Penteado, 2007; Prado & Silva, 2009). No início da década de 90, o MEC elabora o Programa Nacional de Informática na Educação (PROINFO), que foi o primeiro programa de abrangência nacional de Informática Educativa (Almeida, 2008). O PROINFO funcionava em parceria com os CIEds atuando como centros de pesquisa, bem como no desenvolvimento de softwares educacionais e na capacitação contínua e permanente de professores da rede pública de ensino. Este Pro20


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grama pautava-se pelas ideias de Papert sob a perspectiva de uma educação construcionista e também na educação transformadora fundada na prática pedagógica crítica e reflexiva de Paulo Freire, pois “havia a expectativa de superar a abordagem educacional baseada na transmissão de informações” (Almeida, 2008, p. 117). Borba e Penteado (2007) consideram que esta iniciativa do PROINFO contribuiu significativamente para a criação de Laboratórios de Informática nas Escolas brasileiras. Além disso, o PROINFO beneficiou a formação de professores dando-lhes o devido suporte para poderem trabalhar melhor com o novo arsenal tecnológico. Na década de 90, discutem-se questões relativas à informática educativa de formação contínua e permanente, principalmente sobre a produção e avaliação de softwares educacionais e a criação de universidades virtuais. No final desta década, foram lançadas as primeiras Universidades Virtuais, sendo que em 2000 ficou instituída a Universidade Virtual Pública do Brasil/UNIREDE. Lembra-se que os primeiros sinais da Educação Virtual surgem em março de 1994. Na ocasião, a Universidade de Brasília (UnB) lança o I Curso de Especialização em Educação Continuada e a Distância. O MEC instituiu, em 1996, a Secretaria de Educação a Distância (SEED), apesar da experiência que a UnB vinha acumulando com a Educação a Distância desde os anos setenta ao estabelecer um convênio junto a Open University (Moraes, 2000). Em 1997, o MEC lança a proposta de instalar laboratórios de computadores nas Escolas públicas (urbanas e rurais) do Ensino Básico em todo o país por meio do PROINFO. As justificativas apresentadas no documento que regulamenta o PROINFO (Ministério da Educação, 1996) são de que haveria a possibilidade de trazer mudanças na forma de conduzir as pesquisas e produzir o conhecimento no país, novos métodos de produção industrial, novas formas de viver, trabalhar, pensar e conviver no mundo atual, o que traria resultados significativos para as instituições educativas. O referido documento regulador deste Programa (Ministério da Educação, 1996) apresenta como principais metas: (i) melhorar a qualidade do processo de ensino-aprendizagem; (ii) criar uma nova ecologia cognitiva nos ambientes escolares com a integração das novas TIC; (iii) propiciar uma educação voltada para o desenvolvimento científico e tecnológico; e (iv) propor uma educação voltada para a cidadania global numa sociedade tecnologicamente desenvolvida. O MEC atua como agente de inovação tecnológica no contexto educativo, fomentando a inserção das TIC e também das técnicas de Educação a 21


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Distância (EaD), bem como a promoção de pesquisas e desenvolvimento de novas práticas no ensino brasileiro. Pode-se dizer que, apesar de todas as dificuldades quanto à materialização que a implementação de um programa como o PROINFO representa nas Escolas, segundo ressalta Silva (2007), este programa democratizou o livre acesso de alunos e professores aos Laboratórios de Informática das redes públicas, o que não ocorria até então. De acordo com Almeida (2008), o Governo Federal expande a oportunidade para a população ter um maior acesso à informática ao lançar o Programa para a Inclusão Digital. Desde 2003, o Governo Federal oferece o Projeto Cidadão Conectado — Computador para Todos, que foi uma forma de adquirir computadores de baixo custo com linhas especiais de financiamento. À semelhança do PROINFO, surge o Programa Um Computador por Aluno (Pro-UCA), o qual demora a dar os primeiros sinais. O projeto “One Laptop Per Child” (OLPC) foi apresentado ao governo brasileiro no Fórum Econômico Mundial em Davos – Suíça, em janeiro de 2005. Meio ano depois, o governo instituiu um grupo interministerial para avaliar e apresentar um relatório sobre a possibilidade do país vir adotá-lo. Um olhar atento permite perceber que as Escolas são um grande potencial consumidor da tecnologia (Bonilla, 2005). Os diversos programas que foram adotados pelos governos brasileiros nas últimas décadas denotam no discurso a influência da lógica do mercado ao frisarem com muita ênfase a melhoria da qualidade de ensino das Escolas públicas a partir da implementação das TIC no sistema educacional. Reconhece-se a importância de diversos programas. Porém, segundo Bonilla (2005) e Borba e Penteado (2007), os mesmos ainda não envolvem a maioria das escolas do Brasil e, por sua vez, nem os seus professores e nem os seus alunos. Sem dúvida, é notória a diferença dos resultados dessas ações em algumas escolas públicas de alguns estados brasileiros, contudo, são frutos de experiências isoladas, o que não poderia estar se evidenciando ao se conceber Programas de alcance nacional. Bonilla (2005) lembra que os programas governamentais voltados à integração das TIC no sistema educativo brasileiro, não têm conseguido tocar as questões-chave. Tal situação deve-se por conta dos mesmos ainda se limitarem ao aspecto atrativo e modernizador sem que se modifiquem os fatores do processo pedagógico, como o currículo, a avaliação, as formas de aprender e construir conhecimento, a relação entre professor e alunos, entre outros. Desse modo, os referidos Programas servem como uma máscara de modernidade por trazerem a tecnologia para dentro das escolas, embora con22


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tribuam para a permanência do modelo de educação tradicional. O debate precisa acontecer para além desta perspectiva. Observa-se que as iniciativas adotadas pelos gestores do governo e demais setores do sistema de ensino ainda são insuficientes para que de fato se possa pensar numa Sociedade da Informação e do Conhecimento: O maior desafio ainda é universalizar o acesso às TIC para atingir todo o contingente de alunos brasileiros, docentes e estabelecimentos escolares; ampliar a compreensão de que o alicerce conceptual para o uso de tecnologias na educação é a integração das TIC ao currículo, ao ensino e à aprendizagem ativa, numa óptica de transformação da escola e da sala de aula em um espaço de experiência, de formação de cidadãos e de vivência democrática, ampliado pela presença das TIC (ALMEIDA, 2008, p. 124, grafia original). Percebe-se melhor como transcorreu a intenção da universalização do acesso às TIC tomando como viés de análise a concepção do Programa Sociedade da Informação no Brasil, cuja motivação tem sido explicitamente econômica. Para Bonilla (2005), o Brasil preocupou-se, sobretudo, em desenvolver a infraestrutura de informações, depois com a informatização da economia para só então chegar ao patamar da Sociedade da Informação. Isso fica evidenciado pelo tipo de ajustes internacionais que o país tem adotado, especialmente nas décadas de 70 a 90 do século passado. Mediante o objetivo de inserir o país no cenário de cooperação internacional, os governos têm feito diversos acordos junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e com o Banco Mundial (BIRD), que passaram a definir as diretrizes políticas que o Brasil deveria seguir. Dentre as diferentes diretrizes que tais órgãos definiram, várias delas referem-se ao ensino. Segundo Bonilla (2005), o Banco Mundial estabelece que sejam cobradas taxas para os “níveis mais altos do ensino, a flexibilização do ensino formal, oferecendo mais treinamentos aos professores e menos formação stricto sensu, privilegiando a formação ligeira e barata, como a capacitação em serviço, a distância e em cursos mais rápidos” (p. 46). Houve investimento maciço em infraestrutura tecnológica, porém não ocorreu uma política que democratizasse o acesso e o devido uso das tecnologias. A análise de Bonilla (2005) evidencia que, no contexto das sociedades contemporâneas, os brasileiros passaram a ser denominados de consumidores e como tal “necessitam apenas de formação básica que lhes dê condições 23


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de usar a tecnologia, navegar e efetuar compras online, sem qualquer compreensão do processo e dos conhecimentos que estão perpassando o contexto em que estão imersos” (p. 46). Ainda de acordo com Bonilla (2005), a partir do governo de Lula há um direcionamento para ações de ordem social em que as camadas menos favorecidas são trazidas para o contexto contemporâneo. Nos últimos anos, segundo a diretriz do Governo Federal, o MEC está incentivando a adoção de Software Livre e tem produzido conteúdos específicos que orientam a sua utilização associada à distribuição Linux-Educacional que acompanha os computadores que são instalados pelo PROINFO. Destaca-se a inclusão digital e social por meio do uso de softwares livres como forma de popularizar a certificação digital e a inclusão digital como estratégia de enfrentamento dos sérios problemas sociais que o país enfrenta. Para Bonilla (2005), já em Portugal as escolas dispõem de diversas formas para se candidatarem a projetos e desse modo obterem recursos financeiros, diferente do Brasil cujas verbas para os Programas apenas provêm do PROINFO e do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST), os quais atingem somente uma determinada parcela das escolas públicas. De acordo com esta autora, “um número significativo de escolas, principalmente aquelas localizadas no interior do país, ficam à margem desse processo, uma vez que as informações sobre essas dinâmicas não chegam até essas localidades” (p. 183). Além disso, em Portugal, todas as escolas foram conectadas à Internet, pelo acesso da Rede Digital de Integração de Serviços. No Brasil, parte das escolas de alcance do PROINFO não possui conexão à Internet, pois, de acordo com Bonilla (2005), “muitas das que possuem estão conectadas a provedores gratuitos, o que significa que a escola paga pelos pulsos telefônicos. Ou a escola consegue verbas para manter essa despesa ou então desiste do uso em virtude do alto valor da tarifa” (p. 185). Por isso, a maior conectividade ainda se destaca no setor privado que dispõe de verbas para este fim. Para Bonilla (2005), desde o início da década de 90 passada, governos e empresas de diversos países, centraram a sua atenção no avanço das Tecnologias de Informação e Comunicação como fator de desenvolvimento econômico. A título de curiosidade, observa-se como se deu a rápida expansão da rede de Internet nos mais distintos continentes de meados da referida década em diante. Este rápido aumento do uso da Internet é uma das respostas dos avanços da Sociedade da Informação. Porém, isso não é uma realidade 24


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para todos, pois ainda há muitos “infoexcluídos” nos diferentes cantos do mundo. Na figura a seguir, está representado o aumento do número relativo de pessoas com acesso a Internet no período de 1998 e 2008, sendo que as cores mais escuras indicam que nesta região mais de 31% da população tem este acesso. Figura 1: Comparativo de usuários online em 1998 e 2008

Fonte: BBC News, 2012.

Tomando-se como referência o período de 1998 e 2008, percebe-se que houve um aumento significativo do número de pessoas conectadas à Internet (BBC News, 2012). Contudo, tais números revelam que apesar de todo este aumento, no ano de 2008, o Brasil, por exemplo, ainda estava longe de atingir a sua totalidade. Ou seja, num período de apenas dez anos houve um aumento extraordinário de pessoas que passaram a usar Internet no Brasil, cuja taxa de aumento foi de 2781%, comparado ao crescimento ocorrido em Portugal que foi de 350%, considerando-se o mesmo período. Apesar deste significativo aumento, os números mostram que em 2008 ainda há quase 63% de brasileiros que não têm acesso à Internet. Surpreende igualmente que Portugal expresse um valor considerado alto de excluídos digitais (58,1%), uma vez que neste país os investimentos foram mais focados e mais enfáticos há várias décadas, diferentemente do Brasil que está em vias de levar a Internet ao maior número de pessoas por meio de programas, conforme foi visto anteriormente. Os dados do sítio da BBC News (2012) indicam que a taxa populacional considerada offline ainda é significativa, mesmo que países como Brasil e Portugal tenham registrado um aumento significativo de número de pessoas conectadas à Internet. 25


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Taxa de infoexclusão

População online

Tabela 1: Taxa da população online x off-line em Brasil e Portugal (1998 e 2008) 1998

2008

Taxa de aumento

Brasil

2.500.000

72.027.700

2781%

Portugal

1.000.000

4.475.740

347,5%

População total

População off-line

Brasil

193.700.000

121.167.300

62,5%

Portugal

10.700.000

6.224.260

58,1%

Taxa da população off-line

Fonte: os autores.

Tais dados refletem o que ainda precisa melhorar nestes países uma vez que os mesmos têm um impacto no sistema educacional. Na elaboração dos respectivos Livros Verdes que atendem a um programa maior, fica explícita que cada programa de governo enfatiza, sob diferentes olhares, determinadas áreas, como é o exemplo da inserção das TIC no sistema de ensino. No caso de Portugal, em várias situações, o Livro Verde enfatiza o termo “Sociedade da Informação e do Conhecimento”, reafirmando que é preciso ir além do contexto da circulação de informação. Enquanto no Brasil, o programa Sociedade da Informação incluído no Livro Verde, apresenta um caráter essencialmente econômico, no qual o cidadão é considerado um consumidor de tecnologias. O debate central que foi apresentado no relatório da UNESCO (2007), sobre as formas de alcançar verdadeiramente uma Sociedade do Conhecimento, permite-nos compreender o que virá ao encontro das políticas que serão tomadas em cada país, em especial no que tange à educação. Este será um movimento comum nas diferentes nações, divergindo os contextos locais e culturais, mas o compromisso será sempre de atender resultados positivos. É notório o quanto cada país tem se envolvido com o comprometimento da popularização das TIC, de modo especial, na questão da sua integração no sistema educativo. Por outro lado, os indicativos apresentados em determinados relatórios mostram que ainda há muito a ser feito para que as escolas, como um todo, estejam planamente capazes de atender os propósitos da sonhada Sociedade do Conhecimento. Cumpre ressaltar os dados apontados e 26


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apresentados no Relatório de impacto do uso das TIC em escolas da Europa (Balanskat, Blamire & Kefala, 2006). Neste relatório, os autores referem que a utilização das TIC na educação e na formação realmente tem sido uma prioridade na maioria dos países europeus durante a última década. Tais autores lembram que todos os países da União Europeia investiram em equipamento, conectividade, desenvolvimento profissional, entre outros, de modo que as TIC cheguem e sejam plenamente usadas nas escolas. Quanto ao uso de Learning Management Systems (LMS) ou Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA), os mesmos ainda não refletem uma imagem positiva em termos de sua integração no processo pedagógico. Estes autores destacam que as escolas têm investido no uso de LMS para melhorar o compartilhamento de conhecimento e que os mesmos ainda são utilizados pelos professores para se comunicarem com outros professores e não com os alunos e seus pais. Quanto ao uso de AVAs, os mesmos são progressivamente integrados na educação. Porém, o seu uso ainda é limitado, porque há necessidade de treinamento para apoiar esta pedagogia inovadora. São mencionados três fatores principais que impedem que os professores e alunos tirem pleno partido das TIC, os quais estão diretamente ligados ao professor, à Escola e ao Sistema. Faltam aos professores habilidades, confiança, formação pedagógica e programas de treinamento diferenciados, para que eles possam utilizar as TIC com eficiência. Nas escolas há falta de infraestrutura, os hardwares estão velhos e mal conservados, não há software educacional adequado e o acesso às TIC ainda é limitado. Os fatores relacionados com o Sistema ainda são marcados pela rígida estrutura dos sistemas de ensino tradicionais. Por consequência, as avaliações são tradicionais, os currículos restritos e a estrutura organizacional também restrita (Balanskat, Blamire & Kefala, 2006). Mediante tais considerações, há necessidade de rever conhecimentos, os currículos e também a estrutura escolar (Laffin, 2006). A sociedade contemporânea, caracterizada como Sociedade da Informação e do Conhecimento, foca a relevância da busca do saber permanente e de qualidade para todos. O amplo acesso e uso das TIC, conforme destaca Kenski (2009), induzem inovações no processo educativo, reorganizando os currículos, os modos de gestão e também as metodologias utilizadas na prática escolar. Para Coan e Viseu (2010), essa nova cultura educacional exige que se adotem estilos de pedagogia que favoreçam aprendizados personalizados, significativos e cooperativos. Por sua vez, requer uma redefinição dos pro27


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fessores, pois estes devem familiarizar-se cada vez mais com as TIC e trilhar caminhos que possibilitem a inovação pedagógica. Sem dúvida que a revolução tecnológica tem impulsionado distintas formas de interação entre os indivíduos, o que proporciona novos debates na educação, especialmente no ensino, na aprendizagem e na formação. Amante (2007) discute as razões pelas quais a presença das TIC se justifica cada vez mais desde os primeiros anos de escolaridade de uma criança. É, portanto, pelo potencial das novas tecnologias no que diz respeito “à natureza dos programas utilizados, quer às possibilidades de acesso à informação e comunicação disponíveis através da Internet, aliado à sua presença, cada vez mais marcante no nosso dia a dia” (p. 52). Porém, estes resultados estão relacionados com a forma como os professores (alguns) fazem uso do computador em razão de atender o lado mais construtivo e criativo que tais ferramentas dispõem. Independente de qual seja a idade do aluno ou qual seja a área de atuação de um professor, parte-se do pressuposto que o uso das TIC não pode ser uma mera reprodução de antigas práticas pedagógicas. Dentro desta perspectiva, abre-se espaço para modalidades de ensino que buscam nas Tecnologias de Informação e Comunicação uma forma de atender as demandas e exigências do mercado, como é o caso da Educação a Distância (EaD). O ensino mediado por tecnologias que atende as soluções de e-learning, também conhecido como ensino online, está ganhando força também no Brasil, nas diferentes instituições que praticam o ensino a distância. O e-learning é uma forma de ensino à distância que usa a vantagem do poder que a Internet proporciona. Segundo Belloni (2009), a EaD sem dúvida contribuirá significativamente para a organização do trabalho nos sistemas tradicionais, a transformação dos métodos de ensino, assim como uma melhor utilização das novas tecnologias na educação.

A contribuição das TIC no processo de ensino e aprendizagem A variedade de recursos tecnológicos que o professor tem à sua disposição para o desenvolvimento das atividades da sala de aula não significa que a integração desses recursos seja uma realidade. Por exemplo, o uso do computador e da Internet ainda não são artefatos comuns a todos os ambientes escolares. Em vários países, muito ainda precisa ser feito para que a educação esteja aliada às TIC em todo o território nacional. Assim, Ponte e Canavarro (1997) destacam a importância do papel do professor nas escolas da sociedade contemporânea, uma vez que a experi28


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ência de trazer as TIC para este espaço tem demonstrado que cada vez mais o professor é chamado para assumir novas funções e responsabilidades. Segundo estes autores, o papel do professor é de extrema importância “na criação de ambientes de aprendizagem, no diagnóstico da dificuldade dos alunos, na condução de atividades complexas e multifacetadas” (PONTE & CANAVARRO, 1997, p. 33), o que faz com que tanto o professor como os alunos façam parte da dinâmica de aprendizagem. Procura-se, portanto, analisar e perceber as contribuições das Tecnologias de Informação e Comunicação no processo de ensino e aprendizagem, especialmente no que diz respeito ao seu uso no ensino e aprendizagem da Matemática. Houve um crescimento significativo do número de trabalhos publicados, como artigos, teses de mestrado e doutoramento cujo tema envolve o devido uso das novas tecnologias no sistema educativo (Costa, 2007). Esta análise permite sinalizar que nas últimas décadas muito foi feito para que a disciplina da Matemática não fique aquém da integração das TIC no processo de ensino e aprendizagem possibilitando que os alunos e professores estejam cada vez mais atentos às potencialidades que tais ferramentas proporcionam neste processo. É pertinente observar que a Matemática é uma disciplina obrigatória no currículo escolar de vários níveis de ensino em todo o mundo (D’Ambrósio, 1993), sendo que ela ocupa uma posição privilegiada nas escolas. Por isso, entende-se que este lugar de destaque merece uma maior atenção para a discussão de questões relativas ao ensino e à aprendizagem desta disciplina na era da Sociedade do Conhecimento. A utilização das TIC no contexto educativo deve atender uma perspectiva que vai além da mera transmissão de conhecimentos (Coan, Viseu & Moretti, 2013; Costa, 2009; Fernandes, Alves, Viseu & Lacaz, 2006; Semedo, 2011; Simões, 2008; Viseu, 2009) e sim promover uma pedagogia centrada na atividade do aluno (Viseu, 2015). Em Portugal, a integração das TIC no currículo de Matemática do ensino secundário surge, sobretudo, após a reforma curricular de 1986. Assim como se observa este fenômeno na disciplina de Matemática, esta integração na educação realizada em Portugal e noutros países europeus mostra que é possível estabelecer objetivos que beneficiem todo o sistema educativo. Tais tecnologias, na perspectiva de Ponte e Canavarro (1997), se forem utilizadas como instrumentos para a criação de ambientes de aprendizagem motivadores, favorecem: 29


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· a vivência de uma atividade matemática mais significativa,

na qual há lugar à resolução de problemas, à investigação e experimentação, à formulação e testagem de conjecturas, à produção de conhecimento matemático por parte dos alunos;

· uma abordagem conceptual compreensiva, possibilitando o

aprofundamento de conceitos e ideias matemáticas de outra forma inacessíveis aos alunos;

· uma maior ênfase no desenvolvimento de capacidades de nível cognitivo elevado, como a resolução de problemas;

· a melhoria geral das atitudes face à Matemática (p. 129). Para Viseu (2009), o uso de recursos tecnológicos por professores de Matemática favorece uma aprendizagem mais significativa, principalmente no que se refere ao desenvolvimento da capacidade de resolução de problemas, autonomia e pensamento crítico, especialmente na atitude positiva relativa à Matemática. Este autor analisou o papel das TIC na supervisão de professores estagiários de Matemática no que se refere ao desenvolvimento do conhecimento didático e da competência reflexiva dos futuros professores. A investigação de cariz interpretativo permitiu perceber o quanto as TIC favorecem a supervisão da prática pedagógica, a aproximação das escolas e da universidade, o desenvolvimento do conhecimento didático dos futuros professores, proporcionando-lhes a possibilidade da partilha de experiências, discussão de situações da sala de aula, promoção de uma pedagogia centrada no aluno, mais tempo para refletir sobre as suas práticas, entre outros. Ainda segundo este autor, o uso do computador justifica-se por permitir: [...] o desenvolvimento de actividades de exploração e pesquisa através de uma diversidade de programas que possibilitam abordagens enriquecedoras dos conceitos matemáticos. A sua utilização na aula relativiza a importância da aquisição da capacidade de cálculo e de manipulação simbólica, reforça o papel da linguagem gráfica e as diferentes representações dos conceitos matemáticos, potencia o desenvolvimento de capacidades de ordem mais elevada do que o cálculo e a memorização e favorece a realização de actividades mais desafiantes do que a resolução de exercícios para aplicação dos conhecimentos apreendidos (VISEU, 2009, p. 59, grafia original). 30


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Além do benefício da utilização do computador com recurso a software educativo e à Internet, na aprendizagem da Matemática, Fernandes et al (2006) reconhecem que nesta disciplina há um destaque para o uso de calculadoras, científicas e gráficas. Para estes autores, há razões que justificam o uso de tais tecnologias nas aulas de Matemática, uma vez que as mesmas promovem uma aprendizagem mais profunda e significativa, bem como a abordagem mais indutiva e experimental da Matemática. A utilização destes recursos propicia a criação de ambientes de aprendizagem mais dinâmicos e a realização de atividades torna-se mais envolvente para professores e alunos. Ou seja, as TIC oferecem uma larga contribuição no processo de ensino e da aprendizagem da Matemática e auxiliam na criação de ambientes de aprendizagens mais envolventes (Ponte & Canavarro, 1997). Como diz Semedo (2011), os professores de Matemática em Portugal, representam “um grupo profissional com boa relação com as TIC” (p. 250). Mediante as considerações até aqui elencadas, de que os estudos reforçam a aproximação entre professores e as TIC no campo da Matemática, ainda é incipiente e limitado o hábito do uso das TIC no ensino da Matemática pelos professores brasileiros desta disciplina (Souza, 2010). Além disso, quando estas ferramentas tecnológicas fazem parte do processo, ainda de acordo com esta autora, geralmente o seu uso está associado a práticas que consistem na reprodução de atividades habitualmente desenvolvidas em salas de aulas que estabelecem a substituição de recursos tradicionais por tecnológicos. Constata-se que ainda se apresentam algumas adversidades com as quais se depara o sistema educativo, independente de qual seja o país em foco, que de certa forma afeta direta ou indiretamente todos os envolvidos neste processo em pleno século XXI. Nesse sentido que se leva em consideração o que precisa ser melhorado para que os professores tenham ao seu dispor a devida assistência quanto a integração de novas tecnologias, especialmente no quesito da capacitação para o efetivo uso.

Perspectivas dos professores de Matemática do IFSC/FlorianópolisSC relativo ao uso das TIC no processo de ensino e aprendizagem No campo da Educação Matemática, vários pesquisadores têm se reportado para as teorias do filósofo e psicólogo Raymund Duval, que se debruça sobre a aprendizagem matemática e o papel dos registros de representação 31


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semiótica para a apreensão do conhecimento matemático. Num de seus últimos estudos, este autor observa que as significativas reformas e mudanças no sistema de ensino, em todos os países, colocam um grande desafio a todos os envolvidos neste contexto. Para Duval (2014), caminha-se na perspectiva do desaparecimento da sala de aula, o que é previsível e tende a acontecer. A questão central desta tendência exige que se perceba “porque as mudanças tecnológicas do ambiente, por um lado, e o fracasso dos sistemas educativos, por outro lado, impõem uma individualização do ensino” (DUVAL, 2014, p. 3). Estes aspectos têm relação direta com a mudança tecnológica digital que trouxe novas situações para o ensino, em particular as implicações positivas ou negativas relativas ao ensinar e aprender os conhecimentos matemáticos. Segundo Dias (2004), a mudança decorre das possibilidades de expressão e criação que as novas tecnologias propõem aos alunos. Nesta nova trama de comunicar e aceder à informação, sem dúvida que o foco se situa no redirecionamento do papel do professor. Duval (2014. p. 5) alerta para o fato de que a matemática é “a experiência de uma autonomia completa”, é preciso fazer por si mesmo para atingir a compreensão. Para este autor, a matemática possui características cognitivas e epistemológicas que a torna diferente de qualquer outro tipo de conhecimento, [...] ela se desenvolve de forma independente de qualquer fonte externa de informação, unicamente por meio de transformações de representações produzidas em sistemas semióticos comuns (linguagem natural e diagramas) e em sistemas semióticos especializados (sistemas numéricos, gráficos, figuras geométricas). E é, graças a essas transformações de representações semióticas, que a atividade matemática dá um poder ilimitado de exploração e é gerador de novos conhecimentos (DUVAL, 2014, p. 5-6).

Portanto, o papel da Web no contexto educativo representa um meio de construir e transformar informações em conhecimentos, pois constitui uma interface educacional cujas interações privilegiam o aprender colaborativamente e em rede. Assim, alunos, professores e tutores formam uma comunidade virtual de aprendizagem cuja finalidade deve ser a produção do conhecimento. Para Dias (2000, p. 160), tal comunidade advém da partilha de interesses e de práticas, sendo que “as práticas da aprendizagem baseada na Web implicam a ultrapassagem dos constrangimentos tradicionais como o tempo e o lugar físico”. 32


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Parte-se do pressuposto que o professor promove o ambiente de aprendizagem de modo que para o aluno faz sentido estar ali ao oferecer-lhe situações que o instiguem a apropriar-se do saber e do construir competências cognitivas (Charlot, 2005). Tais aspectos possibilitam a construção de conhecimentos significativos que beneficiam o seu desenvolvimento em tarefas de alto nível cognitivo em todas as áreas ou níveis de modalidades de ensino. Porém, nem sempre os professores encontram situações favoráveis no contexto de ensino que estabeleça ricos ambientes de aprendizagem. Por exemplo, pensar a integração de tecnologias na prática pedagógica dos professores não é, por várias razões, uma tarefa simples. Em algumas áreas de ensino, esta situação é ainda mais complexa, como é o caso do ensino de Matemática, a qual ainda representa uma das disciplinas que registra o menor uso de tecnologias pelos professores que atuam nesta área (Barcelos, Behar & Passerino, 2010; Calil, 2011; Gatti & Nunes, 2009). Esta constatação provavelmente está relacionada com a formação do professor de Matemática, uma vez que nem sempre o currículo das Licenciaturas em Matemática contempla todas as competências que a prática docente requer (Coan, Viseu & Moretti, 2013). Em relação à formação de professores de Matemática para o uso pedagógico das TIC percebe-se que ainda há um distanciamento entre a sua formação inicial e as exigências colocadas pela sociedade da informação (Gatti & Nunes, 2009). Estas autoras analisaram os currículos de 31 cursos de Licenciaturas em Matemática no Brasil e constataram que somente um deles não apresentava “uma disciplina isolada para trabalhar com conceitos ligados à computação. Porém, quando se trata de uso da informática para a educação, esta é referida claramente em apenas 29% dos cursos” (p. 108). Destacam ainda que a discussão sobre a utilização das TIC aparece nos artefatos curriculares dos cursos, mas não propriamente sobre a aplicação das mesmas na prática pedagógica dos futuros professores. Segundo Coan (2012), tal situação se configura em outras instituições pois segundo depoimento de um professor entrevistado, a sua formação em Licenciatura Matemática não lhe proporcionou subsídios para o uso de tecnologias na prática pedagógica, até mesmo sobre o uso de calculadoras, ou seja: Calculadora gráfica não sei usar! Nossa formação aqui na licenciatura, HP 48 científica, era a mais famosa na época e 33


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os professores proibiam a entrada em sala e não ensinavam a gente usar. Vejo até como faz, porque aqui nos cursos de tecnologia aqui usa e não sabe nem ensinar os alunos a usar uma calculadora gráfica (COAN, 2012, p. 248). Por outro lado, os cursos que têm em consideração que deve haver mudanças na prática pedagógica dos futuros professores de Matemática sobre o uso das tecnologias com seus alunos apostam na inovação curricular de modo a atender tais requisitos. Com o intuito de perceber como os professores de Matemática do IFSC/ Florianópolis-SC estudaram e discutiram o acesso e uso das TIC na sua prática pedagógica, aplicou-se uma entrevista para dez professores de Matemática do referido Campus. O foco da entrevista era relativo à formação docente, à sua capacitação continuada de um modo geral e também sobre a formação do uso de tecnologias a serem aplicadas no sistema educativo. Buscou-se saber ainda qual é sua relação com a apropriação e uso das TIC no processo de ensino e aprendizagem enquanto prática pedagógica. No Quadro 1, a seguir, apresenta-se o perfil dos professores participantes na entrevista sobre aspectos da sua formação inicial e continuada, relativos ao uso das TIC bem como se deu a aproximação e apropriação das mesmas no processo de ensino. Os dez professores participantes serão identificados como Pn, sendo n ϵ N = {1, 2, 3, ..., 10}. Os dez professores possuem o curso de Licenciatura em Matemática, contudo a maior ou menor afinidade com o uso das TIC provavelmente tem relação com a época em que fizeram os cursos de formação inicial e também com o tipo de formação continuada que eles têm realizado. Dos dez professores pesquisados, seis fizeram o mestrado e dois concluíram o doutorado. Ao serem indagados sobre a preferência pelo nível de ensino, seis deles gostam de lecionar nos Cursos Técnicos de Ensino Médio, três em Cursos Superiores e para um deles o nível de ensino é indiferente. O dado que chama muita atenção se situa na formação inicial e a sua relação com o incentivo ao uso das tecnologias. Ou seja, tanto os professores que há mais tempo se formaram quanto aos que concluíram o curso de licenciatura em Matemática nos últimos anos, não tiveram o privilégio de ter em seu currículo uma formação para o uso das tecnologias com seus alunos. Os dados informados no quadro a seguir refletem claramente que o professor precisa buscar capacitações para saber lidar com o novo, uma vez que 34


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Quadro 1. Aspectos relativos ao uso das TIC pelos professores de Matemática Pn P1

Tempo de formação inicial x docência no IFSC

TIC utilizadas Formação no ensino Inicial em TIC

28 anos 20 anos Não

P2

TIC que gostaria de aprender a usar GeoGebra

Utilização do Moodle

computador

Software MatLab

Fez uso na Graduação e no Mestrado

Sofwares (MatLab, GeoGebra, Maple, Statgraphics) GeoGebra, Excel, Wolfram Alpha Softwares e Internet

Não sabe informar

Não usa por falta de domínio e de tempo

A Plataforma Moodle

Falta de capacitação

Simuladores

Já usou para postar material

Softwares Dinâmicos (MatLab, GeoGebra, Wolfram Alpha), Moodle e redes sociais Calculadora, Internet Laboratório de Matemática Calculadora e computador

Lousa Digital

Já usou nos cursos superiores

Não sugere nenhuma Não sugere nenhuma Uso do Moodle para assessorar os alunos Aprimorar o uso do Moodle e outros softwares

Nunca usou

Calculadora, computador

03 anos 02 anos Não P3 11 anos 03 anos Um pouco

P4 P5

10 anos 04 anos Não 23 anos 18 anos Não

P6 09 anos 07 anos Não

P7

04 anos 02 anos Não

P8

03 anos 02 anos Sim

P9

28 anos 21 anos Não

P10 10 anos 09 anos Não

Calculadora, GeoGebra, Moodle

Não usa por que não conhece

Nunca usou Uso para vídeo aulas e repositório de materiais Aulas na EaD e para seus alunos

Fonte: os autores.

a formação inicial não lhes deu este suporte. Para P2, sua formação acadêmica não lhe ofereceu o devido conhecimento sobre as TIC e observa que em todo o curso de graduação teve uma disciplina que fez uso de métodos matemáticos com uso de computação científica com conteúdo específico de ensino superior. Esta lacuna é descrita por nove professores, P4, ressalta que 35


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a sua formação inicial não lhe propiciou para tal e reforça: “o que utilizo foi resultado de uma busca pessoal”. Apenas um professor (P8) menciona ter adquirido embasamento para usar as TIC na formação inicial e ressalta que “durante a graduação aplicávamos oficinas com os alunos, visando buscar maneiras lúdicas de ensinar matemática”. Percebe-se que os cursos de licenciatura, que preparam o futuro professor de Matemática de algumas universidades, apesar de sinalizarem inovação curricular, não conseguem contemplar esta demanda. O curioso é que mesmo o professor recém-formado, conforme a fala de (P7) que é formado a menos de quatro anos, confirma que “apesar de diversas disciplinas de Didática e de Métodos de Ensino, foram raros os momentos que apresentavam algo diferente do tradicional”. Entende-se por tradicional na fala deste professor, as aulas que são ministradas exclusivamente pelo professor que é responsável por repassar o conteúdo ao quadro. Observa-se que independentemente do tempo em que os professores obtiveram a graduação, eles tiveram que buscar seus próprios meios para adquirirem o devido conhecimento sobre a integração das tecnologias no ensino de Matemática. Todos os professores participantes do presente estudo, de alguma forma, utilizam algum recurso tecnológico em suas aulas. Destaca-se que os professores estão fazendo uso de artefatos tecnológicos em suas aulas, uns com maior ênfase que outros, porém este fator tem relação direta com a formação continuada, que é uma das necessidades apontadas por todos. A questão-chave se situa na possibilidade dos professores terem o devido suporte técnico para a implementação de novos recursos, como é o caso de diferentes softwares. A falta deste suporte tem implicações diretas na organização e prática do professor. Por exemplo, se o professor quiser trabalhar com algum software que é eficaz e ele conhece, poderá utilizá-lo se for open source, que é a política do Instituto. Outro ponto a ser destacado é a falta de autonomia que o professor tem para baixar ou instalar qualquer programa nos computadores dos laboratórios por que não é de sua atribuição e competência. Isso tem impedido a realização de vários eventos, inclusive para o uso nas aulas do professor, uma vez que há muita demora no atendimento destas solicitações. Em relação ao uso de diferentes softwares, a maioria dos professores conhece vários deles, como é o LabMat, o Wolfram Alpha, entre outros, com os quais têm familiaridade e gostam de usá-los, porém só poderão utilizá36


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-los se os mesmos estiverem instalados, o que nem sempre acontece porque depende de um responsável técnico atender esta demanda. Outro ponto forte é relativo à continuidade da qualificação profissional do docente, especialmente para aprimorar e aperfeiçoar a integração e otimização de novas tecnologias, como é o caso de lousa digital (P6), o uso de simuladores (P5) bem como se aprofundar no efetivo uso da Plataforma Moodle para além de repositório de matérias (P4, P9, P10). Além de que o uso de diferentes softwares como o GeoGebra e LabMat ainda não são conhecidos por todos. Os professores reforçam que ao usarem as TIC no processo de ensino e aprendizagem faz com que “a aula se torna mais concreta e a percepção sobre os temas abordados melhora” (P8). Observa-se que, o interesse pelo conteúdo aumenta “devido a facilidade proporcionada pelo uso da tecnologia” (P5). É positivo usar tecnologias por que “melhorou a atenção dos alunos durante as aulas” (P6), “interesse e dedicação” (P7) e também porque propicia maior “interação com os alunos” (P1). Este aspecto se evidencia na aprendizagem de distintos conteúdos, porém a facilidade para construir gráficos no ensino de Funções e Funções de várias Variáveis; para analisar os dados estatísticos, no estudo de Limites, Derivadas e Integrais e, no Cálculo Vetorial, pois possibilita a visualização entre outros benefícios. Sinaliza-se com evidência que um dos maiores desafios que se coloca ao professor de Matemática nos tempos modernos, para além da falta de interesse dos alunos em estudar, um dos pontos sinalizado pelos dez professores, diz respeito ao uso das TIC. Ou seja, “utilizar as TIC em sala pois não tenho preparação para isso” (P1). Este ponto deve ser levado em consideração uma vez que seis de dez professores se consideram adeptos ao uso das TIC e quatro não. Portanto, o professor que já utiliza sabe do proveito que se tira ao integrá-las na sua prática docente e deseja aprimorar a sintonia com o novo que se coloca diariamente. Os professores que ainda não têm efetivamente esta aproximação com as mesmas devem ter oportunidade de melhor as conhecerem para tirarem maior partido no processo de ensino. Destaca-se que o grupo de professores de matemática tem otimizado a troca de conhecimentos no que diz respeito ao uso de novos recursos tecnológicos para socializar os saberes e auxiliar os colegas neste processo. Curiosamente, metade dos professores questionados ainda não fez uso da Plataforma Moodle, por não conhecerem a dinâmica do funcionamento e solicitam espaço e tempo para se capacitarem. 37


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Considerações finais Apontar a capacitação continuada como uma das prioridades na docência, sem dúvida é uma das melhores contribuições para a proficiência do docente, pois ao serem questionados sobre os aspectos mais desafiadores que se colocam na sua prática pedagógica, relacionam a necessidade de ampliar os conhecimentos sobre o uso de novas TIC. Este aspecto certamente tem emergido em detrimento das cobranças que o professor se faz para acompanhar os nativos digitais que são seus alunos. No contexto do sistema educativo um dos maiores desafios que se apresenta diz respeito à efetiva operacionalização e implementação eficaz das ferramentas tecnológicas para auxiliar a aprendizagem de conhecimentos matemáticos. De um modo geral, o fator da falta de um devido treinamento e capacitação para melhorar o uso das ferramentas tecnológicas, conforme a maioria dos professores entrevistados relata, ainda é uma questão que merece maior atenção no âmbito escolar. Além de equipar as escolas com infraestruturas adequadas para o devido uso das tecnologias, devem-se capacitar os professores de modo que o seu fazer pedagógico venha ter outra conotação na sociedade que exige constantes adaptações e mudanças. Esta é uma constatação que Miranda (2007) faz, ao considerar que “acrescentar a tecnologia às atividades já existentes na escola e nas salas de aula, sem nada alterar nas práticas habituais de ensinar, não produz bons resultados na aprendizagem dos estudantes” (p. 44). Ainda de acordo com esta autora, isso é uma consequência da falta de proficiência que muitos professores manifestam no uso das tecnologias, principalmente as computacionais, o que resulta da falta de recursos e de formação. Além disso, a autora acrescenta que o fato de inovar com a integração das tecnologias, acima de tudo, requer que haja uma pré-disposição por parte dos professores para que estes venham a modificar as suas concepções e práticas de ensino. Em virtude da permanente mudança que acarretam também as tecnologias, principalmente na questão da velocidade das alterações no universo informacional, exige dos professores a formação constante. Caso não haja uma formação continuada dos professores, a integração e devida utilização das TIC fica comprometida. É preciso que sejam dadas oportunidades e as devidas condições ao docente, tanto em relação ao apropriar-se do novo bem como ser-lhe dada a devida assistência técnica para poder implementar as novas ferramentas disponíveis. 38


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Um ponto forte na prática educativa do grupo de professores de Matemática do IFSC de Florianópolis está relacionado ao uso de diferentes estratégias e dinâmicas que oportunizam a realização da formação docente, dando-se abertura para a capacitação entre colegas. Dito de outro modo, o professor que sabe utilizar ferramentas novas, que faz abordagens diferenciadas de determinados conteúdos ou que obteve resultados significativos e inovadores na sua vida profissional, os apresenta aos colegas em forma de capacitação por meio de oficinas ou seminários. Esta predisposição de cultivar uma prática de ajuda mútua deve ser uma tônica cada vez mais cultivada entre os professores uma vez que estamos diante de significativas rupturas e mudanças no sistema educativo. Deseja-se que, as escolas, os professores, os alunos e a comunidade como um todo, indiscutivelmente, não somente tenham o devido acesso às novas tecnologias e à Internet, como também saibam aprender a tirar o melhor proveito das mesmas.

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A resolução de tarefas matemáticas com recurso ao Sketchpad Floriano Viseu1

Resumo

A

utilização de recursos tecnológicos no estudo de conteúdos matemáticos proporciona a realização de atividades que somente com papel e lápis não se tornariam tão eficientes, tais como, por exemplo, a exploração dos dados de uma tarefa e a determinação e prova de conjecturas. Entre tais recursos, os de geometria dinâmica, como é o caso do Geomert´s Sketchpad (GSP), potencializam, a partir da construção de um dado objeto matemático, a exploração de propriedades e de regularidades que contemplam esse objeto através da sua ‘manipulação’. Para evidenciar as potencialidades da utilização deste software, exploram-se, com recurso ao GSP, problemas de Geometria (triângulo equilátero, triângulo duplicado e o teorema de Pitágoras) e de Álgebra (área máxima de retângulos com o mesmo perímetro e volume máximo de uma caixa). Palavras-chave: Matemática. Resolução de tarefas. Softwares dinâmicos. Prova de resultados matemáticos.

Com a crescente evolução tecnológica, existe uma diversidade de recursos que podem ser integrados nas atividades de ensino e de aprendizagem. Dos vários recursos tecnológicos disponíveis, o computador, pelas suas características, oferece uma diversidade de programas que possibilitam abordagens enriquecedoras dos conceitos matemáticos. A sua utilização na aula de matemática reforça o papel da linguagem gráfica e das múltiplas representações dos conceitos matemáticos, potenciando quer a realização de atividades mais desafiantes do que a resolução de exercícios para a aplicação dos conhecimentos apreendidos, quer o desenvolvimento de capacidades de 1

Doutor em Educação, Especialização em Didática da Matemática, pela Universidade de Lisboa. Professor Auxiliar do Instituto de Educação da Universidade do Minho. Investigador do Centro de Investigação em Educação (CIEd). Contato: fviseu@ie.uminho.pt. 43


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ordem mais elevada do que o cálculo e a memorização (Fernandes, Alves, Viseu & Lacaz, 2006). O computador é um recurso que pode ser utilizado individualmente ou juntamente com outros equipamentos tecnológicos, independentemente do tipo de software que armazena. Existem softwares específicos para serem utilizados no ensino de conceitos matemáticos, permitindo a professores e alunos autorregular o processo de ensino e de aprendizagem. Uma utilização adequada do computador favorece o desenvolvimento de competências, tais como a responsabilidade, a autoconfiança e a autonomia. No aspecto relacional, promove a solidariedade entre os vários intervenientes na sala de aula e a relação aluno-aluno e professor-aluno. Ponte e Canavarro (1997) defendem que a utilização do computador na aula de matemática favorece o desenvolvimento de capacidades de raciocínio e de comunicação. Ao constituir-se uma ferramenta essencial para as atividades de ensino e de aprendizagem (NCTM, 2008), o computador, e outros recursos tecnológicos, permite explorar e testar conjecturas, visualizar diferentes formas de representação de conceitos matemáticos, e estabelecer conexões entre as múltiplas representações dos conceitos matemáticos, o que tem implicações no desenvolvimento cognitivo dos alunos. A utilização de recursos tecnológicos no ensino-aprendizagem de Matemática é cada vez mais exigida no contexto da sociedade em que vivemos. A sua utilização nas aulas de Matemática possibilita a realização de cálculos de um modo eficiente, facilita a organização e análise de dados, fornece imagens visuais de conceitos matemáticos e apoia a atividade exploratória e investigativa dos alunos. Através do uso da tecnologia, os alunos podem raciocinar sobre a mudança de parâmetros e modelar e resolver problemas mais complexos que de outra forma não se poderiam resolver (NCTM, 2008). O uso da tecnologia contribui para o desenvolvimento da capacidade de resolução de problemas, da autonomia, do pensamento crítico e de uma atitude positiva em relação à Matemática. Porém, o progressivo aumento do uso da tecnologia não deve substituir o cálculo de papel e lápis, mas antes conciliar os diferentes processos de cálculo, sem esquecer o cálculo mental, e proporcionar aos alunos um ambiente de aprendizagem de cunho laboratorial (Ministério da Educação, 2002). A variedade de tarefas matemáticas a propor ao aluno é alargada pelo uso de recursos tecnológicos. Estes instrumentos transformam-se em ferramentas importantes na realização de atividades que exijam o uso de diferentes capacidades relacionadas com o pensamento matemático. Vários documen44


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tos com orientações curriculares para a educação matemática, nomeadamente da APM (1998) e NCTM (2008), salientam a relevância da utilização educativa de recursos tecnológicos, como a calculadora e o computador, nos diversos níveis de ensino. O recurso a softwares educativos tem mostrado que o computador pode ser um mediador no desenvolvimento de conceitos matemáticos. Permitem abordar os conteúdos diversificando as formas de os apresentar, alargando assim as condições de aprendizagem dos alunos. Softwares como o Geomert´s Sckechpad (GSP) surgiram combinando as suas potencialidades para o trabalho de conceitos algébricos e geométricos. O GSP permite relacionar as informações dadas algebricamente com as múltiplas representações (gráficos, tabelas e expressões analíticas), servindo, como referem Ponte, Branco e Matos (2009), de base à resolução de problemas e modelação de situações reais, o que constitui importantes suportes para a aprendizagem. Tal recurso favorece a interação entre os alunos na apresentação e discussão dos seus resultados, ao poderem construir, rever, modificar as suas construções e testar as suas conjecturas, envolvendo-se na sua própria aprendizagem (King & Schattschneider, 2003). A Geometria é, por excelência, uma área da Matemática que permite explorar as potencialidades dinâmicas e gráficas de ambientes computacionais de aprendizagem. Os ambientes computacionais para o ensino da Geometria permitem realizar construções geométricas, no ecrã do computador, utilizando explicitamente as propriedades das figuras, e possibilitam a manipulação direta dessas construções, conservando as propriedades utilizadas. Para De Corte (1992), estes ambientes devem ter como referência o desenvolvimento de três componentes: (1) a competência, caracterizada pelo desenvolvimento de capacidades num determinado domínio; (2) a aquisição, que consiste na obtenção de processos de aprendizagem que conduzam ao desenvolvimento de competências; (3) a intervenção, que se resume à aplicação de métodos de ensino e de estratégias adequadas para colocar em prática os processos de aprendizagem. Segundo de Villiers (1997), os programas de geometria dinâmica são ‘poderosos’ por funcionarem como um meio de verificação de conjecturas. Nesta atividade, Jones (1998) considera que os ambientes de geometria dinâmica introduzem critérios específicos de validação para a resolução de problemas de construção, visto que uma solução só é válida se e só se não for possível estragá-la por arrastamento. Schwartz (1992) sustenta que tais ambientes são exploratórios, pois as ferramentas que disponibiliza propiciam a formu45


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lação de hipóteses que funcionam como “espelhos intelectuais” (p. 223), no sentido em que os alunos podem experimentar as suas ideias, através da manipulação das construções. O movimento e a modificação de construções realizadas em ambientes de geometria dinâmica facilitam, como defende Laborde (1993), a visualização de propriedades e de relações geométricas, conservando-as invariantes. Os ambientes de aprendizagem proporcionados pelos softwares dinâmicos, contrariamente aos processos tradicionais (papel e lápis), permitem a manipulação de uma maior variedade de ações e de objetos, o que possibilita a realização de outras tarefas mais complexas. Os alunos libertam-se assim de tarefas de natureza mecânica para darem espaço à formulação e validação de conjecturas (Junqueira, 1995). Tais ambientes fazem com que os alunos possam compreender, de uma forma mais aprofundada, as relações entre os conceitos geométricos, estimulando o raciocínio abstrato. Vários estudos têm sido desenvolvidos nesta área, como, por exemplo, o que foi realizado por Viseu, Nogueira e Santos (2009) com o objetivo de averiguar como alunos do 9.º ano de escolaridade aprendem, com recurso ao GSP, o tema ângulos numa circunferência. Neste estudo, foram os alunos que determinaram as propriedades da circunferência recorrendo ao GSP. Os autores concluem que: (1) a maioria dos alunos valorizou o uso do GSP nas construções e a possibilidade de pensar por si próprio; (2) o recurso ao GSP, como ferramenta de suporte nas construções, permitiu que os alunos estabelecessem as relações pretendidas e as validassem através da sua aplicação; (3) o uso do GSP incentivou os alunos a aplicar os seus conhecimentos a situações do quotidiano, o que lhes permitiu olhar com mais atenção para o mundo que os rodeia na procura de situações em que possam aplicar o que aprendem; (4) na transição da exploração para a generalização, tornou-se crucial a natureza exploratória das tarefas, bem como a possibilidade de manipular as construções efetuadas e de comparar os dados, fruto da dinâmica que o GSP proporciona. Os ambientes de geometria dinâmica são propícios à descoberta de propriedades e de relações geométricas, favorecendo a aprendizagem, beneficiando a aquisição de conhecimentos e incluindo a produção de provas. A possibilidade de arrastamento de uma figura é uma característica destes ambientes, o que possibilita a exploração de vários exemplos, a observação de propriedades, casos específicos, contraexemplos, atividades que se ligam à formulação e justificação de conjecturas. As construções com recurso a 46


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ambientes de geometria dinâmica tornam-se muito mais poderosas do que a construção tradicional (papel e lápis) (Junqueira, 1995). Num estudo realizado por Piteira (2000), com uma turma do 8.º ano e outra do 9.º ano de escolaridade, de duas escolas diferentes, com o objetivo de analisar a atividade matemática desenvolvida pelos alunos com o Sketchpad, a investigadora observou que os menus deste software fizeram com que os alunos, em determinadas situações, tivessem de pensar como construir novas figuras, avaliassem o que tinham construído e pensassem sobre as conclusões a obter. A autora considera que estas atividades ajudaram os alunos a manusearem os objetos geométricos até chegarem a conclusões sobre as suas propriedades e relações geométricas. O estudo fez emergir potencialidades do GSP, tais como facilitador na construção de significados geométricos, potenciar a compreensão das relações estabelecidas através das interações entre alunos e professores e da consciencialização dos alunos das atividades que realizam. Para a autora, os ambientes de geometria dinâmica incentivam os alunos a expor e clarificar, numa perspetiva de partilha e negociação, as suas ideias, dificuldades e respectivas reavaliações. Apesar das vantagens enunciadas sobre a utilização de softwares de geometria dinâmica, é importante refletir sobre a verdadeira contribuição das tecnologias informáticas para a atividade matemática. Segundo Loureiro e Bastos (2002), nem sempre o recurso aos ambientes de geometria dinâmica são úteis para a demonstração. Já para Coelho e Saraiva (2002), não são só as especificidades dos ambientes de geometria dinâmica que contribuem para estimular a atividade matemática, mas “todo um contexto de ensino/ aprendizagem, com realce para as interações estabelecidas entre professores, alunos e o próprio AGD (elemento mediador na construção do conhecimento matemático), aos modelos didáticos ensaiados e às características exploratórias das tarefas propostas” (p. 56). Compete ao professor, segundo Rodrigues (2001), atender à escolha dos materiais tecnológicos quando da preparação da sua atividade, adotando uma análise crítica, tendo em conta os seguintes fatores: (1) adequação aos seus alunos, ao currículo, ao rigor pretendido de exploração, extensão e densidade; (2) facilidade de utilização do recurso; (3) o potencial pedagógico; (4) tipo de eficácia, utilidade e necessidade. Perante a integração de recursos tecnológicos no processo de ensino-aprendizagem coloca-se ao professor o desafio de utilizar esses recursos de forma a promover o pensamento matemático e o desenvolvimento de conceitos (Fitzallen, 2005). 47


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De modo a ilustrar as potencialidades do GSP no desenvolvimento de atividades de ensino e de aprendizagem, apresenta-se a resolução com este recurso, com base nas atividades de exploração e de prova, das seguintes tarefas: triângulo equilátero, triângulo duplicado, teorema de Pitágoras, área máxima de retângulos com o mesmo perímetro e volume máximo de uma caixa.

Triângulo equilátero Determinar a relação entre a soma das distâncias de um ponto qualquer do interior de um triângulo equilátero aos seus três lados e a altura do triângulo. Exploração Considerar um triângulo equilátero ABC, de altura h, e um ponto no seu interior (D). As distâncias de D a cada um dos lados do triângulo são determinadas pelas medidas dos segmentos de reta h1, h2 e h3 (segmentos perpendiculares a esses lados). Figura 1 - Representação dos segmentos que determinam as distâncias de um ponto interior de um triângulo equilátero aos seus lados

Fonte: O autor.

Com recurso ao Sketchpad, determinam-se as distâncias de D a cada um dos lados do triângulo e somam-se esses valores. Movendo este ponto, verifica-se que a soma das distâncias de D aos lados do triângulo é constante, tal como comprovam os valores recolhidos numa tabela: 48


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Figura 2 - Recolha de dados que traduzem a regularidade entre a soma das distâncias de um ponto interior de um triângulo equilátero aos seus lados

Fonte: O autor.

Em contexto de sala de aula, antes de efetuar a soma de tais distâncias, o professor pode questionar os alunos sobre os possíveis valores que essa soma pode assumir. Prova Para provar a conjectura formulada, decompõe-se o triângulo equilátero ABC em três triângulos (ADC, ADB e BDC). Cada um destes triângulos tem, em relação aos respectivos lados do triângulo ABC, de altura os segmentos h1, h2 e h3: Figura 3 - Transformação dos dados do problema na procura de provar a conjectura estabelecida

Fonte: O autor. 49


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Determinando as áreas dos quatro triângulos verifica-se que:

Como o triângulo ABC é equilátero,

, então, que é constante,

independentemente da localização do ponto D no interior do triângulo ABC.

Triângulo duplicado Figura 4 – Tradução dos dados do enunciado do Triângulo Duplicado Considerar um triângulo qualquer ABC. Construir um novo triângulo FDE prolongando os lados de ABC, como mostra a figura, sabendo que:

Que relação há entre as áreas dos triângulos FDE e ABC? Provar essa relação. Fonte: O autor.

Exploração Recorrendo ao Sketchpad, determinam-se as áreas dos triângulos ABC e DEF. Verifica-se que, quaisquer que sejam as medidas do triângulo de partida, a área do triângulo DEF é sete vezes a área do triângulo ABC, como informam os dados recolhidos apresentados na seguinte figura: 50


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Figura 5 - Representação e recolha dos dados do problema Triângulo Duplicado

Fonte: O autor.

Para se perceber a obtenção deste resultado, decompõe-se o triângulo DEF a partir dos vértices do triângulo ABC da seguinte forma: Figura 6 - Transformação dos dados do problema na procura de estabelecer conjecturas

Área ∆DBF = 7,79 cm2 Área ∆DAB = 7,79 cm2 Área ∆DAE = 7,79 cm2 Área ∆ACE = 7,79 cm2 Área ∆ECF = 7,79 cm2 Área ∆CFB = 7,79 cm2 Área ∆ABC = 7,79 cm2

H

(Área ∆DBF)+(Área ∆DAB)+(Área ∆DAE)+(Área ∆ACE)+(Área ∆ECF)+(Área ∆CFB)+(Área ∆ABC) (Área ∆ABC)

= 7,00

Fonte: O autor.

O triângulo DEF é assim decomposto em sete triângulos equivalentes. Os valores recolhidos na folha de cálculo que verificam a conjectura entre as áreas dos triângulos DEF e ABC são comprovados pela razão entre a soma das áreas dos triângulos que decompõem o triângulo DEF e a área do triângulo ABC. 51


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Prova Para provar a relação obtida, determinam-se as áreas de cada um dos triângulos, considerando h1, h2 e h3 as alturas do triângulo ABC relativamente a cada uma das suas bases. Figura 7 - Transformação dos dados do problema na procura de provar a conjectura estabelecida

H

Fonte: O autor.

· Área do triângulo ABC:

.

· Área do triângulo ABD:

.

· Área do triângulo BDF: , na determinação da área deste triângulo considerou-se a base BF que é congruente com AB. A altura do triângulo em relação a esta base é DK. A construção desta altura originou o triângulo ADK que é igual ao triângulo ACG, visto que, de um para o outro, têm um lado geometricamente igual (AD=AC) e os ângulos adjacentes as estes lados em cada um dos triângulos são geometricamente iguais (visto serem verticalmente opostos; e porque os ângulos DKA e CGA são retos). Então DK=h3.

· Área do triângulo BCF:

.

· Área do triângulo CEF:

, na determinação da área

deste triângulo considerou-se a base CE que é congruente com BC. A altura 52


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do triângulo em relação a esta base é FM. A construção desta altura originou o triângulo BMF que é igual ao triângulo AIB, visto que, de um para o outro, têm um lado geometricamente igual (AB=BF) e os ângulos adjacentes as estes lados em cada um dos triângulos são geometricamente iguais (visto serem verticalmente opostos; e porque os ângulos AIB e BMF são retos). Então FM = h2 .

· Área do triângulo ACE: · Área do triângulo ADE:

, na determinação da área

deste triângulo considerou-se a base AD que é congruente com AC. A altura do triângulo em relação a esta base é EN. A construção desta altura originou o triângulo ECN que é igual ao triângulo BCH, visto que, de um para o outro, têm um lado geometricamente igual (DA=AC) e os ângulos adjacentes as estes lados em cada um dos triângulos são geometricamente iguais (visto serem verticalmente opostos; e porque os ângulos BHC e CNE são retos). Então EN=h1.

.

Prova-se assim que a área do triângulo DEF, formado a partir do triân­ gulo ABC com as condições sugeridas, é sete vezes a área do triângulo ABC. 53


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Teorema de Pitágoras Num triângulo retângulo o quadrado da medida da hipotenusa é igual à soma dos quadrados das medidas dos catetos Com o recurso ao Sketchpad, construíram-se o triângulo retângulo ABC e os quadrados (ACDE, BCHG e ABFE) sobre os seus lados. O software permite calcular o valor das áreas desses quadrados, assim como somar as áreas dos quadrados construídos sobre os catetos do triângulo: Figura 8 - Relação entre as áreas dos quadrados construídos sobre os lados de um triângulo retângulo

Área BCKL = 3,93 cm2

H

Área BIJA = 19,99 cm2 Área ACDE = 23,92 cm2 (Área BCKL) + (Área BIJA) = 23,92 cm2

Fonte: O autor.

Constata-se que a soma das áreas dos quadrados construídos sobre os catetos do triângulo retângulo é igual à área do quadrado construído sobre a hipotenusa do triângulo. Arrastando um dos vértices do triângulo, a conjectura estabelecida é reforçada através dos valores recolhidos numa tabela.

54


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Figura 9 - Verificação em vários triângulos retângulos da relação entre as áreas dos quadrados construídos sobre os seus lados.

H

Fonte: O autor.

Como a recolha de um número finito de dados não permite validar a relação do teorema de Pitágoras, existem várias provas geométricas que se podem realizar com recurso ao GSP, como ilustra a prova que se apresenta.

Prova Determinar o centro do quadrado ACGF, que é o ponto de interseção das diagonais do quadrado (V). De seguida, traçar por este ponto retas paralelas aos lados do quadrado construído sobre a hipotenusa do triângulo retângulo. Com os pontos de interseção destas retas com os lados do quadrado ACGF, construir os quadriláteros AMVL, LVKC, KVJG e JVMF.

55


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Figura 10 - Prova geométrica do Teorema de Pitágoras

Fonte: O autor.

Recorrendo ao menu do SGP das transformações geométricas, efetua-se uma translação dos quadriláteros que decompõem os quadrados construídos sobre os catetos do triângulo retângulo para o quadrado construído sobre a hipotenusa deste triângulo. Observa-se que este quadrado é composto pelos quadriláteros transladados, o que permite provar que BC2=AB2+AC2 qualquer que seja o triângulo retângulo que se considere. Área máxima de retângulos com o mesmo perímetro De entre os retângulos com o mesmo perímetro de 12cm, qual o que tem maior área? Qualquer retângulo com perímetro de 12 cm faz com que a soma da largura pelo seu comprimento seja de 6 cm: . Fazendo variar uma das dimensões do retângulo para valores próximos de zero, por exemplo l, a outra dimensão (c) assume valores próximos de 6. A variação conjunta das dimensões dos retângulos com perímetro de 12 cm traduz-se na construção, com recurso ao GSP, de retângulos que à medida que uma das dimensões se aproxima de zero a outra dimensão aproximar-se-á de 6. Esses retângulos são obtidos a partir da construção de um segmento de reta com 6 cm de comprimento (AB) e de um ponto arbitrário (C) sobre esse segmento. Para formar os retângulos, considera-se uma circunferência com centro em 56


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C e abertura até ao ponto B. Traça-se uma perpendicular a AB no ponto C e através do ponto de intersecção entre essa perpendicular e a circunferência (D) obtêm-se os pontos de referência para formar os retângulos que se geram a partir do deslocamento do ponto C. Figura 11 - Representação dos dados do problema ‘Área máxima de retângulos com o mesmo perímetro’

Fonte: O autor. Fonte: O autor.

Com o GSP representa-se o ponto que tem de coordenadas (medida de AC, perímetro do retângulo). Selecionando o ponto C e o ponto representado no sistema de eixos cartesiano, através do Locus (comando do GSP que constrói um lugar geométrico definido por objetos relacionados por alguma propriedade) obtém-se o segmento de reta que representa os perímetros constantes dos retângulos que se podem formar. Do mesmo modo, representa-se o ponto com coordenadas (medida de AC, área do retângulo). Selecionando o ponto C e este ponto representado no sistema de eixos cartesiano, através da função Locus obtém-se parte da parábola que representa a variação das áreas dos retângulos que se podem formar. Ao deslocar-se o ponto que percorre a parábola, a área máxima é de 9 cm2, o que indica tratar-se da área de um quadrado de 3 cm de lado. 57


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Prova Se Então , o que gra­ fi­camente é representado por uma parábola com concavidade voltada para baixo e cujo vértice tem de coordenadas (3, 9) . O valor máximo da área é 9 cm2 para c=3cm, o que significa que se trata de um quadrado com lado de 3 cm. Outra forma de provar a conjectura estabelecida é através da aplicação de conhecimentos adquiridos no estudo da derivada de uma função. Como A =-c 2+6c, A’ = -2c+6 . Esta função anula-se quando c=3.

A análise da variação de sinal da função derivada e da monotonia da função correspondente permite verificar que a área máxima é de 9 cm2 para c = 3 cm.

Volume máximo de uma caixa Pretende-se construir uma caixa sem tampa retirando aos quatro cantos de uma folha de cartolina quatro quadrados iguais e dobrando, de seguida, a parte restante da folha. Qual deve ser o lado dos quadrados a retirar à folha de cartolina para que o volume da caixa construída seja máximo? Na resolução deste problema, o GSP permite simular a planificação e a construção de caixas em função da dimensão dos quadrados que são cortados nos cantos de uma folha retangular.

58


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Figura 12 - Representação dos dados do problema ‘Volume máximo de uma caixa’

Fonte: O autor.

O ponto X é o elemento que determina a construção de tais quadrados, tornando-os geometricamente iguais. A variação deste ponto tem implicações nas dimensões das caixas a obter e na posição do ponto P no gráfico que representa no sistema de eixos cartesiano a variação do volume das caixas. Para este gráfico, representa-se o ponto P que tem de coordenadas e de seguida selecionam-se o ponto X e o ponto P, por esta ordem, para que, através do comando Locus, o GSP gere o gráfico pretendido. Deslocando o ponto P no gráfico obtido determina-se o valor do lado dos quadrados a retirar à folha de cartolina que faz com que o volu­me da caixa construída seja máximo (por observação do gráfico, o volume máximo é aproximadamente de 18 cm2 quando o corte dos quadrados é aproximadamente de 1 cm). Prova Considerando que as dimensões2 da folha que gera as caixas são de 8 cm e 5 cm (dimensões presentes na construção no GSP), como os quadrados a cortar nos cantos da folha têm uma medida desconhecida (x), as 2

Para tornar mais realística a tarefa, pode-se admitir como dimensões das folhas as dimensões de uma folha A4 (21x29,7). 59


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dimensões das caixas que se podem obter são representadas por (8-2x) cm, (5-2x) cm e x cm. O volume das caixas é obtido pela expressão: . Como se trata de um problema de otimização, estuda-se o sinal da derivada da função obtida:

Constata-se que o volume máximo (18 cm3) das caixas que se formam em função dos cortes dos cantos da folha se obtém quando esse corte é de 1 cm.

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O uso de calculadora científica no ensino de Números Complexos: uma proposta metodológica Antônio João1 Resumo

A

forma como os cidadãos têm tido oportunidade de integrarem as mais variadas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) em suas vivências diárias, contribuíram para que se abrisse o debate sobre qual partido a Escola deve tirar desta dinâmica. Sendo assim pretende-se reforçar a importância junto aos professores sobre o uso de calculadoras científicas em situações de ensino de modo que o conteúdo seja devidamente contextualizado para os alunos. Tal justificativa emerge da condição de ser professor de Matemática numa instituição de ensino onde o estudo de Números Complexos se faz fortemente presente devido a sua aplicação em cursos de formação profissionalizante, como é o caso dos cursos de Eletrônica e Eletrotécnica, no IFSC Campus Florianópolis. Palavras-chave: Calculadora científica. Números Complexos. Professor de Matemática.

O momento atual coloca desafios significativos ao sistema educacional em detrimento do grande aumento das mais variadas tecnologias e a forte presença das mesmas na vida das pessoas. Desse modo não poderia ser diferente para os professores de todas as áreas de ensino, uma vez que os seus alunos estão canalizando cada vez mais o seu tempo para o uso de diferentes ferramentas tecnológicas, principalmente as que possibilitam a conexão em rede. Este desafio precisa ser encarado como algo positivo no espaço educacional dado que as mesmas agregam um potencial significativo na otimização e organização de dados e de informações, enfim, especialmente pela possibilidade do rápido acesso a inúmeras formas de obter os conhecimentos. Por outro lado, os professores e demais envolvidos no processo de ensino 1 Professor de Matemática do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC). Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Aplicações Matemáticas (GPAM). Contato: antonio.joao@ifsc.edu.br 63


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devem estar atentos ao fato de que a integração das mídias no sistema educacional por si só não garantem que a aprendizagem dos alunos ocorra. Tanto o professor como todos os demais envolvidos no sistema educacional, deverão saber tirar o devido proveito e usufruir dos benefícios que tais tecnologias oferecem (BONILLA, 2005; BIANCHETTI, 2001; KENSKI, 2008). Os avanços que a era tecnológica tem oferecido e proporcionado, e a forma como os cidadãos têm tido oportunidade de integrarem as mais variadas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) em suas vivências diárias, contribuíram para que se abrisse o debate sobre qual partido a Escola deve tirar desta dinâmica. A aposta é que as TIC somem positivamente no sistema educacional e para que isso aconteça, as mesmas devem ser agregadas e otimizadas no processo de ensino e aprendizagem na perspectiva de tornar o processo de aprendizagem de novos conhecimentos como mais-valia para os atores envolvidos (COAN, 2012; VISEU, 2009; VISEU & PONTE, 2009). Provavelmente o desafio seja maior em determinadas áreas de conhecimento levando-se em consideração que o processo de formação de professores exige a realização de debates que instiguem o seu aprimoramento e uma maior aproximação à realidade dos alunos. Observa-se, por exemplo, que ainda há várias licenciaturas que nem sequer apresentam esta temática ao longo do curso e ainda não oferecem o devido espaço para que os futuros professores percebam que não se pode mais ficar à margem da integração e uso do potencial tecnológico no espaço do desenvolvimento de novos saberes. Para Coan, Viseu e Moretti (2013, p. 23), “a integração de tecnologias na prática pedagógica dos professores não é, por várias razões, uma situação simples”. Estes autores destacam que diferentes investigadores sinalizam que: Em algumas áreas de ensino esta situação é ainda mais complexa, como é o caso do ensino de Matemática, a qual ainda representa uma das disciplinas que registra o menor uso de tecnologias pelos professores que atuam nesta área [...]. Este fator pode ter relação com a formação do professor de Matemática uma vez que nem sempre o currículo das Licenciaturas em Matemática abrange todos os aspectos das necessidades que a prática docente exige (COAN, VISEU & MORETTI, 2013, p. 23-24). Mediante tais considerações, o presente texto tem o propósito de contribuir com a formação de professores de Matemática apresentando alguns 64


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elementos que possibilitem ampliar a prática pedagógica do docente, relativo ao conteúdo de Números Complexos. O presente artigo é um relato de experiência de ensino decorrente da adoção de diferentes estratégias metodológicas implementadas em sala de aula, as quais privilegiam o uso das TIC, como é o caso da calculadora científica. Tal perspectiva leva em conta a importância do estudo de Números Complexos uma vez que este assunto se faz fortemente presente devido a sua aplicação em cursos de formação profissionalizante, a exemplo dos cursos de Eletrônica e Eletrotécnica, do Campus de Florianópolis do IFSC. Para Borba e Penteado (2007 apud BARROSO 2009, p. 01), o acesso às ferramentas tecnológicas é um direito do aluno e esse direito deve ser proporcionado pela escola, de forma que esta constituição não seja feita como comumente são feitos nos cursos de informática, mas com a tecnologia inserida “em atividades essenciais, tais como aprender a ler, escrever, compreender textos, entender gráficos, contar, desenvolver noções espaciais”. Desta forma, deve-se possibilitar que as calculadoras adquiram espaço na sala de aula, como destacado por Scheffer e Dallazen (2005), elas possibilitam uma maior reflexão sobre as ações, elaboração, representação, construção e interpretação de problemas, aguçando o raciocínio matemático, oportunizando aos alunos a manipulação de variáveis, aproximando-o da realidade. O campo de estudo relativo aos Números Complexos justifica-se, pois estes conteúdos têm presença obrigatória no currículo destes cursos por serem as ferramentas exclusivas para que o aluno consiga aprofundar e conhecer sobre análise de circuitos elétricos de corrente alternada, por exemplo. O estudo de Números Complexos facilita e possibilita a aprendizagem desses circuitos uma vez que se utiliza o chamado Cálculo Fasorial, cujas grandezas elétricas são representadas por fasores, os quais, por sua vez, são representados através dos saberes relativos ao campo de conhecimento dos Números Complexos. Assim, o objetivo é mostrar aos professores como operar com Números Complexos em calculadoras científicas. Presume-se que o estudante conheça os princípios básicos de sua calculadora e também que tenha conhecimento dos fundamentos dos Números Complexos e das operações fundamentais sobre os mesmos. Ao contrário do que se possa imaginar, a manipulação de Números Complexos através da calculadora, dá pouco trabalho e quase não exige muito treinamento. Atualmente, quase todas as calculadoras científicas trazem em65


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butidas funções destinadas a esta manipulação; algumas suportam apenas transformações mais simples, enquanto outras permitem operações bem mais avançadas. Atualmente, mesmo as calculadoras científicas mais baratas são capazes de realizar as transformações da forma retangular para polar e vice-versa, ou seja: retangular ↔ polar. Infelizmente, não há uma padronização para simbolizar essas transformações: em algumas calculadoras aparecem teclas nomeadas como REC e POL ou (R e P), para identificar as formas, retangular e polar. Há outras máquinas que utilizam os símbolos x e y (ou a e b) representando a parte real e imaginária do Número Complexo, bem como r e ϴ, representando o módulo e o ângulo destes números. Tais representações podem ser observadas na Figura 1 a seguir: Figura 1 - Símbolos usados em teclas de calculadoras científicas para operações com os Números Complexos.

Fonte: o autor

Dado que os Números Complexos possuem mais de um tipo de representação, conforme já fora mencionado anteriormente, os mesmos chamam atenção pela forma que as várias representações se relacionam, pois o custo cognitivo para transitar entre uma representação e outra pode ser maior ou menor. Para Duval (2009), uma mudança de registro é frequentemente efetuada com fins de simplicidade e de economia de tratamento. Desse modo, a possibilidade de apresentar as diferentes formas de representação de saberes a ensinar por meio de ferramentas tecnológicas, no caso a calculadora científica, amplia o leque de conhecimento para os professores de Matemática que não conhecem ainda esta aplicação e finalidade do estudo de Números Complexos. Com isso busca-se neste artigo apontar como é possível propor a diminuição do custo cognitivo entre a passagem de um registro para outro mediante o uso das TIC. Isso por que certas mudanças de registros de diferentes 66


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situações de operações com os Números Complexos não se dá de forma tão direta para o aluno.

Fundamentos sobre os Números Complexos: alguns elementos Conforme foi mencionado anteriormente, nos Livros Didáticos do Ensino Médio, o Número Complexo geralmente é apresentado como Z = a + bi, composto pela parte real a e a parte imaginária b. Quando este assunto é tratado em cursos específicos, como os que foram mencionados, faz-se uma adequação da unidade imaginária i utilizada em Números Complexos a qual é convenientemente trocada pela letra j evitando-se que o aluno faça confusão com o símbolo i utilizado pra representar corrente elétrica. Denominamos então operador imaginário ao termo j na equação, como sendo . Um número complexo Z, que está apresentado na Figura 2 na sua forma gráfica, pode ser expresso de duas outras formas, conforme sinalizam os dados na sequência: a forma Retangular e a forma Polar. Figura 2 - Representação gráfica de um número complexo

Fonte: o autor.

Formas de representação de um Número Complexo e suas transformações Os Números Complexos poderão ser representados na forma Retangular e na forma Polar, sendo que as respectivas formas sofrem transformações realizadas por meio de calculadoras científicas. Forma retangular (REC ou R): expressa matematicamente por

Z = a + jb

onde é a parte real do complexo (a = Re[Z]) e b é a parte imaginária do mesmo (b = 1m[Z]); 67


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Forma polar (POL ou P): sendo A o módulo do complexo (A = |Z|) e ϴ seu ângulo (ϴ = âng Z), contado a partir do semi-eixo Re positivo. De acordo com a convenção usada em Trigonometria, ângulos positivos são aqueles “contados” no sentido anti-horário do círculo trigonométrico. A transformação de uma forma em outra é imediatamente obtida pela aplicação das noções elementares de trigonometria, quais sejam: a) Transformação REC→POL: dados a e b, encontra-se

Contudo, os alunos sempre deverão estar atentos em qual quadrante do Plano Cartesiano o referido Número Complexo está representado. Se eles usarem as teclas Rec e Pol da calculadora, ela automaticamente fornecerá o ângulo no devido quadrante. b) Transformação POL → REC: dados A e θ, encontra-se

Além das transformações que são feitas com estes números, eles ofere­ cem diferentes possibilidades de realizar operações matemáticas entre eles. Isto é, assim como acontece nos demais Conjuntos Numéricos, também no Conjunto dos Números Complexos são realizadas diversas operações. Por exemplo: sejam dois Números Complexos.

Neste caso é possível demonstrar que as quatro operações básicas resultam em: 68


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O presente artigo busca apresentar uma nova abordagem dos Números Complexos, bem como mostrar diferentes formas de operar com os mesmos mediante uso de calculadoras científicas. Presume-se que o estudante conheça os princípios básicos de sua calculadora e que ele tenha o devido conhecimento sobre os fundamentos dos Números Complexos e das operações fundamentais que são realizadas com os mesmos. Operações com Números Complexos mediante uso de Calculadora Científica O presente estudo levou em consideração o uso de calculadoras designadas como padrão, ou seja, aquelas que são capazes de realizar as transformações de forma polar ↔ retangular de forma simples e direta sem a necessidade de programação da calculadora. Destaca-se que a obtenção de dados deu-se mediante observação em sala de aula com alunos de Cursos Técnicos Integrados e dos Cursos de Engenharia em Mecatrônica, Engenharia Elétrica e Engenharia Eletrônica do Campus de Florianópolis, no semestre letivo de 2013 e 2014. Constatou-se que os modelos de calculadoras científicas mais utilizadas pelos alunos dos referidos cursos são apresentadas na Figura 3: 69


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Figura 3 - Modelos de calculadoras mais utilizadas pelos alunos do IFSC

Fonte: o autor.

Cabe salientar que, dentre os modelos exibidos, a maioria dos alunos dos referidos cursos do IFSC utiliza o modelo fx 82 MS da CASIO anteriormente mencionado. Isto se deve ao fato de serem instrumentos de bom desempenho e cujo preço é bastante acessível. As operações com Números Complexos e suas transformações mediante uso de calculadoras científicas atende algumas particularidades dado o modelo de máquina que venha a ser utilizado.

Exemplos de operações com Números Complexos com uso de diferentes calculadoras: I) Modelo: CASIO fx-82 MS A série FX da CASIO introduziu os displays de duas linhas. Na linha superior as operações aparecem “por extenso”, enquanto que na linha inferior são registrados os dados de entrada e valores de saída, conforme indica a Figura 4.

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Figura 4 - Calculadora Casio, modelo fx 82MS

Fonte://www.hpdtc.com/admin_ddttcc77/media/uploads/produtos /calculadora_cientifica_casio_fx82ms.jpg. Acesso em 09 jan 2015.

1. Indicar a transformação REC→ POL pressionando a tecla 2. Digite as partes Re e Im, separadas pelo símbolo de vírgula, e fechar parênteses à direita

3. Obtenção do módulo (A) – pressionar a tecla 4. Obtenção do ângulo (ϴ) – pressionar 5. Caso necessite encontrar o módulo novamente basta pressionar

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1. Indicar a transformação POL →REC pressionando as teclas

2. Entrar com o módulo A e θ , separadas pelo símbolo de vírgula, e fechar parênteses à direita

3. Obtenção da parte real (Re) – pressionar a tecla

4. Obtenção da parte imaginária e (Im) – pressionar

5. Caso necessite encontrar a parte real novamente basta pressionar

Exemplo 1 - Converter o número complexo z = 20 - j10 para a forma Polar. Digite as partes Re e Im, separadas pelo símbolo de vírgula, e fechar parênteses à direita

a) Obtenção do módulo (A) – pressionar a tecla A = 22,3 b) Obtenção do ângulo (ϴ) – pressionar Caso necessite encontrar o módulo novamente, basta pressionar A = 22,3 72


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Sendo assim, a representação na forma Polar fica

Exemplo 2 - Converter o número complexo

para a forma

Retangular. Indicar a transformação POL → REC pressionando as teclas

Entrar com as partes Re e Im, separadas pelo símbolo de vírgula, e fechar parênteses à direita

Obtenção da parte real (Re) – pressionar a tecla Re = 3 Obtenção da parte imaginária (Im) – pressionar Im = 4 a) Caso necessite encontrar a parte real, basta pressionar Re = 3 Sendo assim, a representação na forma retangular fica z = 3 + j4 Na sequência será feita a explanação mediante uso de outro modelo de calculadora, a HP 300S.

73


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II) Modelo: HP 300S Figura 5 - Calculadora HP, modelo 300S

Fonte: http://www.qualitech.info/gerencia/uploads/produtos/xlarge/ 062ce3c5bd20130227023205.jpg. Acesso em 09 jan 2015.

Exemplo 1 - Expressar o número complexo Polar.

Ou ainda,

74

na

forma


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Exemplo 2 - Expressar o número complexo gular.

na forma Retan-

III) Modelo: HP 10S Figura 6 - Calculadora HP, modelo 10S

Fonte: http://www.gimba.com.br/objetosmidia/ ExibirObjetoMidia?Id=16379 Acesso em 09 jan 2015. 75


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na forma Retan-

Exemplo 1 - Expressar o número complexo gular.

Desse modo, o Número Complexo tação na forma Retangular como :

, fica com a sua represen-

Exemplo 2 - Expressar o número complexo

na forma Polar.

Caso necessite novamente encontrar os valores, basta proceder como a seguir

Sendo assim, a representação na forma retangular fica

Mediante as considerações até aqui apresentadas, tem-se a seguir, uma situação prática de aplicação de Números Complexos que envolvem os diferentes Registros de Representação com uso de calculadoras científicas em modelo de circuito de transmissão de tensão e corrente alternadas. Portanto, apresenta-se um exemplo que busca aplicar o que fora até aqui referenciado. 76


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O uso de Números Complexos: uma aplicação prática Considera-se um circuito de transmissão de tensão e corrente alternadas no qual os valores instantâneos dessas duas grandezas são dados pelas senoides , assim, solicita-se a devida resolução desta situação. a) Represente, para o instante inicial, essas duas senoides na forma trigonométrica. b) Represente, para o instante inicial, essas duas senoides na forma algébrica. c) Potência (P) é definida como a taxa com que a energia é transferida da bateria para algum componente e é dada pelo produto da tensão pela corrente (P = i.v). Com as equações de tensão e corrente obtidas nos itens a e b, obtenha a equação complexa nas formas Polar e Retangular para a potência elétrica em watt.

Resolução da situação anunciada a) Para representar a tensão e a corrente precisa-se dos seus respectivos valores em módulo, v = 220V e i = 10A e e de seus ângulos de fase para a tensão ϴ1 = 300 e para a corrente ϴ2 = 600 sendo assim, encontramos as seguintes representações trigonométricas para a tensão e a corrente:

b) Nesta etapa fica bem tranquilo o uso da calculadora para realizar a conversão dos Números Complexos acima referenciados para os seguintes números:

c) Observa-se que para encontrar o valor da potência deve-se usar P = v . i , o que é mais conveniente usar a tensão e a corrente na forma polar e e portanto de 77


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Ou seja

Em geral percebe-se que os alunos têm muita facilidade em manipular as operações com números complexos na calculadora, uma vez que essa já vem sendo utilizada ao longo do curso, bastando apenas que o professor apresente a funcionalidade das teclas(funções) que serão utilizadas em sala para que os mesmos efetuem tais conversões. Ressaltando que em aulas anteriores tenha-se introduzido o conteúdo de Números Complexos bem como suas operações básicas, duas aulas de 55 minutos cada é o suficiente para que os alunos aprendam as transformações aqui apresentadas e ponham em prática através de suas calculadoras.

Considerações finais Mediante as considerações aqui elencadas, nota-se que esta forma de tratar os Números Complexos tem possibilitado que os alunos se envolvam nas atividades propostas e os mesmos conseguem perceber por qual razão estes conhecimentos são estudados. Observa-se que nem sempre o uso de tecnologias, como é o caso das calculadoras científicas para ensinar vários modos de representação de Números Complexos, é uma tarefa simples para todos os professores, até por que muito pouco se tem de exemplos de aplicações nos materiais didáticos. Além disso, este conteúdo é ensinado aos alunos do Ensino Médio por que lhes será cobrado em vestibulares e sendo assim, fica à mercê da proposta de justificar o “para quê” e do “por quê” tais conhecimentos se fazem presentes no currículo das escolas. Destaca-se igualmente que é de extrema importância que os alunos sejam colocados diante de situações que explorem o tratamento de elementos matemáticos por meio de diferentes Registros de Representação o que lhes proporciona maior domínio sobre a apreensão destes elementos e o devido 78


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aprofundamento e agilidade para a compreensão dos conteúdos estudados. Da mesma forma este ganho é estendido aos professores que promovem situações de aprendizagem que coloca os conhecimentos matemáticos de modo que o seu ensino e a sua aprendizagem se justificam. Para os professores nem sempre há o devido esclarecimento sobre as reais necessidades de tratar determinados saberes a ensinar ao longo do Ensino Médio, por exemplo. A ausência de sentido e de justificativas que denotem o seu uso e suas aplicações no contexto dos alunos muitas vezes impede que seja promovida uma boa Transposição Didática em suas classes. O estudo aqui apresentado permite que os professores foquem nos aspectos mais relevantes do estudo de Números Complexos e assim os auxilia na seleção do quê, para quê e como propor estes novos saberes. De modo análogo, os alunos têm questionado os seus professores para quê se precisa estudar o conteúdo de Números Complexos e mediante esta proposta de capacitação os professores conseguem apresentar diferentes caminhos e diferentes Registros de Representação destes elementos matemáticos, o que os auxilia significativamente no processo de aprendizagem. Buscou-se com este trabalho, salientar a importância do uso da calculadora científica uma vez que através de seu uso o aluno consegue minimizar o custo cognitivo ao fazer as conversões entre os vários tipos de representações dos Números Complexos. Deve-se salientar que este estudo não visa substituir o ensino dos Números Complexos e sim colocar mais uma ferramenta que possa facilitar certos tipos de operações uma vez que elas se tornam muito trabalhosas quando feitas de maneira convencional.

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80


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Atividade experimental: uma opção metodológica para o ensino de Matemática e Física Elenita Eliete de Lima Ramos1 Carlos Antônio Queiroz2

Resumo

E

ssa pesquisa é o resultado de um trabalho interdisciplinar entre as Unidades Curriculares de Matemática e Física e teve como objetivo efetuar reflexões sobre uma metodologia de ensino baseada em atividades experimentais. Discute-se a teoria das Representações Semióticas de Raymond Duval (2003) como meio articulador do processo de ensino e de aprendizagem de Matemática a partir das atividades interdisciplinares realizadas. A pesquisa foi realizada no Instituto Federal de Santa Catarina – IFSC, Campus Florianópolis, em uma turma do primeiro ano do Ensino Médio Integrado do Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na modalidade de Educação de Jovens e Adultos – PROEJA. O foco do artigo está em refletir como as diferentes representações de um objeto matemático adquirem sentido e significados, por meio de atividades experimentais, especialmente num ambiente composto por estudantes jovens e adultos com trajetórias e experiências de vida tão diversificadas. São explicitadas nesse trabalho algumas particularidades sobre o sujeito que frequenta a Educação de Jovens e Adultos – EJA, o papel das representações semióticas no ensino e na aprendizagem de Matemática, a metodologia utilizada bem como as considerações e reflexões sobre o trabalho desenvolvido. Palavras-chave: Ensino de Matemática. Ensino de Física. Atividade Experimental. Registro de Representação Semiótica. Educação de Jovens e Adultos.

1

Licenciada em Matemática e doutora em Educação Científica e Tecnológica pela UFSC. É professora do IFSC e atualmente coordena o PROEJA na instituição, Desenvolve pesquisas na área de Educação Matemática Crítica e Educação de Jovens e Adultos. Contato: elenita@ifsc.edu.br 2 É licenciado em Física e doutor em Engenharia e Ciência s dos Materiais pela UFSC. Contato: carlosantonioqueiroz@gmail.com 81


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Iniciando a Conversa Uma particularidade nas turmas de EJA é o fato dos alunos dessa modalidade de ensino estarem muitos anos afastados dos bancos escolares. A experiência adquirida ao longo da vida, propiciou a esses educandos a construção de modelos que explicam intuitivamente os fenômenos da natureza, como a queda de um corpo ou o princípio da conservação da energia, com a presença bastante forte do empirismo, do não científico, do não escolar. Embora, inicialmente, isto possa parecer um problema, essas diferentes concepções tendem a se tornar um elemento motivador, um ponto de partida, nas discussões em sala de aula. Assim, sugere-se que essas discussões devam ser conduzidas numa perspectiva de construção de conceitos e modelos capazes de explicar alguns fenômenos da natureza. Esse caráter de informalidade e de intuitivo na explicação dos fenômenos naturais pelos estudantes da EJA também é verificado nas aulas de Matemática. As facilidades encontradas no cotidiano pelos alunos na execução de alguns processos matemáticos como cálculo mental, por exemplo, não se refletem no ambiente escolar quando estes são solicitados a fazer o registro ou a sistematização desse raciocínio. O formalismo matemático e as diferentes formas de representação dos objetos matemáticos, assim como a associação entre eles, parecem distantes ou desconhecidos para a maioria dos alunos. Diante deste contexto, parece-nos essencial a criação de um cenário onde se possa oportunizar a esses estudantes a explicitação das crenças, dos mitos, das visões de mundo, enfim, das formas como vão se organizando e representando os conceitos e saberes. Do mesmo modo, é igualmente essencial, já que este é o papel da escola, fornecer subsídios para que os estudantes percebam que, ainda que sejam úteis sob um ponto de vista pessoal, tais crenças podem ser comparadas e até mesmo substituídas por outras capazes de resolver problemas mais abrangentes.

O papel das representações semióticas na aprendizagem matemática A importância do uso das diferentes representações semióticas na compreensão da matemática é assunto tratado por alguns autores, entre eles destaca-se o precursor desta teoria, Raymond Duval3. 3 82

É filósofo e psicólogo de formação, autor de muitos trabalhos envolvendo a psicologia


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Duval concentra seus estudos na aprendizagem da Matemática, segundo os aspectos cognitivos; discute a especificidade da aprendizagem e do ensino dessa disciplina, ligadas aos aspectos semióticos das representações matemáticas. Ensinar Matemática, sob o ponto de vista de Duval, é antes de tudo possibilitar o desenvolvimento geral das capacidades de raciocínio, de análise e de visualização. A atividade matemática, neste caso, é caracterizada pela dependência das representações semióticas, bem como pela grande variedade destas representações (FLORES e MORETTI, 2005). Para esse autor, aprender Matemática requer uma atividade cognitiva diferente daquela requerida em outros domínios de conhecimento. Isso se deve a duas características principais: a importância das representações semióticas e a grande variedade delas utilizadas nesse campo do saber. Para (DUVAL, 2003, p.21), “a compreensão em matemática implica na capacidade de mudar de registro. Isso porque não se deve jamais confundir um objeto e sua representação”, uma vez que por serem os objetos matemáticos inacessíveis, perceptivamente ou instrumentalmente (microscópio, telescópio), o acesso aos mesmos se dá necessariamente por representações semióticas. Ressalta ainda que, duas representações de um mesmo objeto produzidas em dois registros diferentes, não têm de forma alguma o mesmo conteúdo. Percebe-se, então, porque a compreensão na Matemática está intimamente ligada ao fato de se dispor, no mínimo, de duas formas de representação semiótica diferentes. Nas palavras de Duval “a originalidade da atividade matemática está na mobilização simultânea de ao menos dois registros de representação ao mesmo tempo, ou na possibilidade de trocar a todo o momento de registro de representação” (DUVAL, 2003, p. 14). Representar, tratar e converter registros de representação semiótica são argumentos fundamentais na proposta teórica de Duval (2003), que acredita ser necessário mobilizar sistemas cognitivos específicos para cada atividade matemática, essencialmente ligada às operações semióticas. Em outras palavras, para Duval só é possível conhecer, compreender, aprender Matemática pela utilização das representações semióticas do objeto matemático. E vai além, o sujeito precisa mobilizar tais representações para verdadeiramente conhecer, isto é, operar com elas, “converter” inscognitiva e o papel dos registros de representação semiótica para a apreensão do conhecimento matemático. 83


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tantaneamente uma representação do objeto matemático dado num sistema semiótico, em outra representação de um outro sistema semiótico, que seja mais econômico cognitivamente, na resolução de um dado problema. Fainguelernt (1999, p.59), por sua vez, defende a exploração das representações e ressalta que “[...] é fundamental, na construção de um conceito, partir da percepção e da intuição de dados concretos e explorar as representações e as aplicações e desenvolver o raciocínio lógico para, só então, chegar aos processos de abstração e de generalização”.

A atividade experimental como motivadora da aprendizagem A atividade de ensino está intimamente relacionada à atividade de pesquisa, esta inerente à razão e ao homem por ser o único capaz de se perguntar e questionar o meio em que vive. Eu insistiria em que a origem do conhecimento está na pergunta, ou nas perguntas, ou no ato mesmo de perguntar; eu me atreveria a dizer que a primeira linguagem foi uma pergunta, a primeira palavra foi a um só tempo pergunta e resposta, num ato simultâneo (FAUNDEZ e FREIRE, 1985, p. 48).

Seguindo o raciocínio de Faundez e Freire é razoável aceitar que qualquer atividade de pesquisa, assim como a atividade experimental, possa ser iniciada por meio de uma pergunta ou questionamento e foi nessa direção que essa pesquisa foi conduzida. Entre as várias possibilidades metodológicas que permitam a construção ou reconstrução do conhecimento, optou-se pela atividade experimental. Interessante destacar uma contribuição de Descarte (2000) sobre a experimentação no processo de pesquisa: Percebi [...], no que concerne às experiências, que estas são tanto mais necessárias quanto mais adiantado se está em conhecimentos.[...] Primeiramente, tentei descobrir, em geral, os princípios ou causas primitivas de tudo o que é ou que pode ser no mundo. [...] Depois, examinei quais eram os primeiros e mais comuns efeitos que podiam ser deduzidos de tais causas. [...] Após isso, quis descer às mais particulares (DESCARTE, 2000, p. 117).

O ambiente em uma turma de EJA, como já mencionado anteriormente, é composto por sujeitos que trazem conhecimentos empíricos e al84


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gumas vezes conflitantes com aqueles abordados pela escola. A opção pela atividade experimental como estratégia motivadora das discussões dos conceitos de Matemática e Física se mostrou adequada para esta modalidade de ensino: seja por proporcionar a vivência dos alunos em um laboratório, seja para impulsionar a discussão e a significação do fenômeno investigado e das formas de registros tão utilizadas em Matemática.

A atividade experimental como metodologia de ensino As atividades aconteceram durante as aulas interdisciplinares de Física e Matemática. Ainda que as intenções inicias fossem outras, a atividade experimental se apresentou como elemento impulsionador das discussões, um articulador entre o teórico e o prático, um facilitador no sentido de atribuir significados às representações semióticas tão utilizadas em Matemática. Nessa direção, ainda que sugestões de experimentos pudessem advir de questionamentos realizados em sala de aula pelos alunos, foi disponibilizado, previamente pelos professores, um conjunto de atividades práticas que pudessem enriquecer a abordagem de um assunto específico. A dinâmica que se estabeleceu foi a seguinte: diante de um questionamento, de uma provocação feita pelos professores ou de uma curiosidade dos alunos, planejava-se uma atividade experimental. As questões que se transformaram em experimentos foram aquelas que relacionavam duas grandezas físicas, já que um dos propósitos de se utilizar a prática experimental foi analisar como as diferentes representações semióticas de um objeto matemático, nesse caso função do primeiro grau, adquirem sentido e significado. Ao escolher a atividade experimental como uma opção metodológica, buscou-se promover uma motivação para a discussão de conceitos. Do momento em que se estabelece a problemática inicial, passando pelo procedimento para efetuar as medidas até o momento em que se socializam os resultados do experimento, tem-se um longo e rico caminho a ser explorado e percorrido. Os experimentos realizados possuíam aspectos essencialmente simples de elaboração e execução, mas rico nas possibilidades de discussões. Há de se ressaltar que a atividade experimental, nessas aulas, se apresentou como um processo dinâmico, diferentemente de algumas vivências acadêmicas onde, não raramente, os experimentos são realizados pelos professores, tendo caráter apenas demonstrativo, mistificado, longe do aprendiz. Na 85


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experiência aqui relatada, os estudantes participaram ativamente de todo o processo, ou seja, as atividades experimentais foram efetivamente desenvolvidas pelos alunos, ficando os docentes responsáveis pela supervisão dos trabalhos. Os experimentos foram realizados nos laboratórios de Física e Química ou nos corredores do IFSC, procurando-se seguir um caminho flexível e tendo-se como etapas: • planejamento das atividades experimentais; • leitura de textos – Fundamentação teórica; • realização do experimento pelos alunos: coleta e organização dos dados; • representação dos dados e das relações entre as grandezas nos diferentes registros matemáticos; • elaboração, pelos alunos, do material a ser socializado com os colegas e professores contendo título, objetivos, hipóteses, descrição do aparato experimental, o gráfico da função gerada por meio do experimento juntamente com as considerações finais e conclusões. É importante registrar que os professores de Matemática e Física atuavam juntos em sala de aula, o que possibilitou o procedimento pedagógico adotado, resultando um trabalho interdisciplinar. De posse dos dados obtidos experimentalmente, grandezas físicas medidas pelos alunos, inicia-se a descoberta de uma nova lógica de organização, de classificação e de registro. Surgem, no decorrer da atividade, dados que precisam ser representados e analisados. Dados que, inicialmente, são pares ordenados de números, que com uma nova roupagem (representação) se transformam em tabelas, que organizados de uma forma diferente tomam forma de uma reta, que pode ser descrita por uma função matemática capaz de descrever a problemática que originou toda a discussão. Dentre as atividades experimentais desenvolvidas durante esta prática pedagógica, apresenta-se a que foi motivada pelo seguinte questionamento: Qual a vazão de água de um bebedouro da escola?

O cálculo da vazão de água em bebedouros da escola No ensino fundamental é comum os professores apresentarem aos alunos os conceitos de unidades de medidas, entre elas, as de volume. No entanto, observam-se em turmas de ensino médio, especialmente nas de EJA, as 86


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dificuldades de compreensão na escrita e na leitura dessas representações. Outro ponto interessante é a percepção da relação direta entre duas grandezas, utilizada em operações matemáticas básicas, de forma intuitiva, no cotidiano. Sem se dar conta que a proporção direta não é válida para todas as situações, não é raro encontrar pessoas que a utilizam de forma indiscriminada e equivocada. O experimento, que será descrito a seguir, intitulado “Cálculo da vazão em bebedouros da escola” se mostrou adequado para discutir conceitos como o de: proporção direta, área, volume, unidade de medidas, par ordenado e funções. O conceito de vazão, embora seja corrente na fala diária, é contrastado com o pouco entendimento pela maioria das pessoas. As pessoas pagam suas contas de água ou abastecem seus carros nos postos de gasolina, no entanto, parece não existir, com facilidade, a aceitação de que a vazão é dependente de duas grandezas, volume e intervalo de tempo. Cabe destacar que na etapa inicial de apresentação do problema surgiram muitas inquietações sobre o conceito de vazão, quer no seu significado, quer na sua forma de escrita. Assim, perguntas sobre o significado de vazão, invasão, evasão e vazão surgiram de forma espontânea no debate inicial.

As contribuições da atividade experimental no processo de ensino e aprendizagem O experimento, de execução relativamente simples, mas capaz de suscitar ricas discussões, consistiu em captar e medir o volume de água escoado por um bebedouro em diferentes intervalos de tempo. Para a realização dessa experiência foi necessário um cronômetro, geralmente contido em um celular ou relógio simples, um béquer e uma proveta (instrumentos encontrados no laboratório de química), folhas de espaço milimetrado e um laboratório de informática. A orientação foi formar grupos de três estudantes para que, de posse de um béquer, de uma proveta e de um cronômetro pudessem efetuar medidas de intervalo de tempo e volume de água escoada. Como os estudantes realizaram as atividades em trio, enquanto um aluno acionava o botão do bebedouro, o outro cronometrava o tempo decorrido e um terceiro fazia as anotações. Devido às limitações de escala escrita no béquer, o volume de água captada foi transferido para uma proveta, que possui uma escala mais sensível, permitindo uma leitura de medida de 87


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volume mais confiável. Para cada intervalo de tempo foram efetuadas três medidas de volume, com as quais se calculou o valor médio de volume de água escoado. Em seguida as medidas foram organizadas em uma tabela e posteriormente os alunos foram instruídos a construir o gráfico de Vol x t, (volume em função do tempo) em folha de papel de espaço milimetrado (Figura 1). A tabela 1 apresenta as medidas de tempo (t) e volume médio (Vol) de água escoada, obtidas por um dos grupos. Quadro 1- Medidas de volume de líquido escoado em função do tempo t Instante t (min)

Instante t (s)

Volume médio (mL)

0,0

0,0

0,0

0,5

30,0

290,0

1,0

60,0

585,0

1,5

90,0

910,0

2,0

120,0

1210,0

2,5

150,0

1540,0

3,0

180,0

1860,0

Fonte: Os autores.

Verificou-se, nesta etapa do trabalho, a facilidade de organização dos grupos, bem como a destreza na construção do gráfico no papel. Porém, neste momento, os alunos perceberam e chamaram a atenção de que os pontos obtidos experimentalmente se aproximavam de uma reta (Figura 1), no entanto, não estavam exatamente alinhados. O que os levou a pensar que haviam cometido algum equívoco na construção. Tal reação pode ser explicada pelo fato de que a maioria dos professores e livros didáticos de Matemática apresentam os gráficos de uma função afim como oriundos de uma lei de formação (expressão matemática), de uma fórmula pronta. Assim, raramente ou nunca é mencionando que a lei de formação de uma determinada função pode ser obtida por uma aproximação, ou seja, é um modelo matemático capaz de descrever o comportamento entre variáveis. O passo seguinte foi encaminhar os alunos ao laboratório de informática para, com o auxílio de um software, determinar a reta que melhor se aproximasse dos pontos obtidos, assim como a expressão matemática que 88


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representasse aqueles dados. A equação gerada pelo software, por meio de uma regressão polinomial, foi uma função do primeiro grau, indicando o comportamento linear entre as duas grandezas. A orientação dos professores foi para que os educandos, ao observarem o gráfico e a lei de formação gerada pelo software, identificassem a dependência entre as variáveis: intevalo de tempo e volume escoado. Figura 1: Gráfico do volume em função do tempo V = f(t)

Fonte: Os autores.

Nesta etapa foi possível explorar o conceito de erro experimental, modelos matemáticos, generalizações, abstrações, dependência entre grandezas, o conceito de função afim bem como a importância de se utilizar diferentes registros para um mesmo objeto matemático. A expressão obtida com as medidas relacionadas à Tabela 1 foi: V = 10,5 t – 29,5 Nesse momento foi fundamental a mediação do professor para enfatizar que a expressão algébrica determinada pelo software era uma representação de uma função polinomial do primeiro grau, que expressava uma tendência de comportamento entre as duas grandezas envolvidas. 89


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Cabe ressaltar que nesta etapa os alunos não apresentaram a mesma tranquilidade do momento anterior. Isso pode ser justificado pela pouca familiaridade dos educandos com expressões matemáticas desta natureza em suas atividades cotidianas e pela pouca habilidade com computadores (turma de EJA). O algebrismo presente neste tipo de operação requer um esforço cognitivo muito diferente do utilizado para construir tabelas e gráficos, representações essas mais frequentemente encontradas no dia a dia das pessoas. Assim, aconselha-se ao professor que deseje adotar prática pedagógica semelhante, reservar um tempo maior nesta etapa do momento pedagógico a fim de que seus alunos tenham condições de apreender todo o algebrismo que esta atividade requer, já que o software fornece a solução diretamente sem esse passo intermediário. Figura 2: Gráfico do volume em função do tempo gerado por um software

Fonte: Os autores.

Entre as possibilidades de discussão geradas por esta atividade experimental destacam-se: a) O volume de água escoada varia linearmente com o tempo: oportunidade de explorar o conceito de grandezas diretamente proporcionais e o conceito de função crescente e decrescente; b) A expressão matemática que descreve o comportamento do volume em função do tempo é dada pela função do primeiro grau: V = 10,5 t – 29,5 c) Para o instante inicial, t = 0s, o volume deveria ser igual a zero. No entanto, ao substituirmos esse valor na representação algébrica da função V = 10,5 t - 29,5 , obtém-se V = – 29,5 ml, 90


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que implicaria em ter um volume negativo. Esse resultado pode ser creditado aos erros experimentais (instrumentos de medida, habilidade do observador) e ao processo de linearização. Assim, em primeira aproximação, esse termo pode ser desprezado e a função a ser considerada para melhor descrever a relação entre as grandezas passa a ser a função linear: V = 10,5 t ; d) O coeficiente angular da função gerada, a = 10,5 adquire um significado prático nesse contexto: indica o volume de água escoado a cada segundo (vazão), ou seja, o volume de água liberado por aquele bebedouro foi de 10,5 mL por segundo; e) A obtenção da lei de formação da função, V = 10,5 t, permite-nos fazer uma previsão de volume de água escoado para aquele bebedouro durante um determinado intervalo de tempo. Por exemplo: Qual o desperdício de água mensal se cada pessoa acionar, desnecessariamente, o botão do bebedouro por um segundo. Considerando que 500 pessoas passam por ali diariamente: Volume = vazão x tempo x número de pessoas x número de dias úteis Volume = 10,5 mL x 1s x 500 pessoas x 22 dias = 115.500 mL, ou seja, 115,5 litros de água.

Considerações finais A opção metodológica pela atividade experimental, além de instigar os alunos a irem a busca de soluções para um problema inicialmente posto, possibilita a manipulação de dados experimentais e a representação de objetos matemáticos em diferentes registros. Representar as grandezas que associam valor escoado e intervalo de tempo, sob a forma de uma expressão matemática, por meio de uma reta ou mesmo utilizando-se de uma representação gráfica é tarefa simples para os professores, no entanto, essa simplicidade não se faz presente para a maioria dos alunos. Tais representações, tão comuns aos docentes, trazem significados muitas vezes desconhecidos para os estudantes, seja porque eles não entendem o conteúdo que está sendo representado, seja porque aquelas formas de representar não lhes são familiares. A tarefa de mostrar as diferentes formas nas quais as variáveis se relacionam tornou-se um desafio. Desafio que se apresenta na significação dos conceitos utilizados na Física e nos diversos tipos de registros matemáticos, 91


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que podem ser um conjunto de pares ordenados, uma tabela, um gráfico ou relações matemáticas, nem sempre tão concretas. Se, como afirma Duval (2003, p.21), “a compreensão em matemática implica na capacidade de mudar de registro”, a opção metodológica pelas atividades experimentais se mostrou bastante adequada no que diz respeito a transitar por diferentes registros. Se toda representação é cognitivamente parcial em relação ao objeto a ser representado, como defende Duval (2003), então a complementariedade entre os registros se torna fundamental, uma vez que duas representações de um mesmo objeto, produzidas em dois registros diferentes, não têm, de forma alguma, o mesmo conteúdo; cabendo ao docente, juntamente com seus alunos, explorarem as especificidades de cada uma. A prática experimental possibilitou que os objetos matemáticos ficassem menos abstratos; dessa forma, a tarefa de manipular letras e números presentes numa equação matemática se tornou menos árida, já que não eram letras e números quaisquer, mas, elementos que surgiram de uma situação vivenciada por cada um daqueles alunos. Além disso, a possibilidade de obtenção e manipulação dos dados, que neste caso eram grandezas físicas, se apresentou como um elemento facilitador para o entendimento de alguns conceitos matemáticos como o de par ordenado, o de variável dependente e independente e o próprio conceito de função. Dessa forma, os conceitos acima mencionados podem se tornar mais claros e significativos para os alunos na medida em que vamos explorando, na função gerada a partir dos dados experimentais, a relação entre as variáveis envolvidas: tempo e volume de água. Cabe ressaltar que, com a realização desse experimento foi possível trabalhar:

· transformação de unidades de medidas de volume; · cálculo de valor médio; · organização de dados em uma tabela; · representação gráfica de um conjunto de pares ordenados numa folha de espaço milimetrado e num software;

· geração da lei de formação; · interpretação da lei de formação gerada; 92


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· apresentação do conceito de inclinação da reta e sua interpretação prática no contexto desse experimento;

· estimativa de consumo mensal da água do bebedouro. A prática pedagógica aqui descrita se mostrou eficiente em atribuir significados às representações semióticas tão presentes e importantes no ensino da Matemática. A capacidade de trabalhar com diferentes representações de uma mesma ideia significa mudar de perspectiva, ver sob outro ângulo, realizando conexões e associações entre diferentes tipos de representação. Isso porque, como afirma Duval (2003) certas representações podem levar o aluno a perceber melhor os conceitos matemáticos do que outras, por isso a importância de utilizar formas diversificadas de representações. Por exemplo: por meio do gráfico e da tabela é mais fácil verificar se a função é crescente ou não; já a lei de formação da função é a forma de registro que nos permite realizar simulações para valores não utilizados no momento do experimento, assim como identificar o coeficiente angular da função, que neste contexto representa a vazão do bebedouro. Ou seja, como defende Duval (2003) toda representação é cognitivamente parcial em relação ao objeto a ser representado, já que duas representações de um mesmo objeto, produzidas em dois registros diferentes, não têm, de forma alguma, o mesmo conteúdo. A tarefa de obtenção de medidas, organização dos dados em tabelas, construção de gráficos, geração da lei de formação possibilitam uma nova lógica de organização, de classificação e de registro. O trânsito entre as diversas formas de registros se constituiu um desafio, tanto para alunos quanto para professores, presente na linguagem matemática e na significação dos conceitos, como pares ordenados, gráficos ou/e relações matemáticas. Esse desafio deve ser trabalhado pelo professor com o intuito de fornecer significado concreto às abstratas relações matemáticas. Ao finalizar esse trabalho, espera-se despertar em nossos colegas professores a vontade de adotar a prática experimental como mais uma opção metodológica. Espera-se, também, chamar a atenção para o fato de que as diferentes formas de representação semiótica dos objetos matemáticos, na maioria das vezes, configuram-se como uma linguagem incomum aos alunos, especialmente os da EJA; por serem pouco utilizadas no cotidiano daqueles que não têm seus saberes formalizados pela escola. 93


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Apresentar aos alunos estruturas matemáticas e formas de repesentação, existentes somente no intelecto, e delas se apropriar na busca de explicação do mundo que nos cerca não é uma atividade das mais simples, sendo que esse quadro ainda é mais desafiador na EJA. Nesse contexto cabe citar Fonseca (2005, p. 30): Das experiências que acompanhamos como educadores, […] não será difícil recordar de episódios em que se estabelece o conflito na relação do ensino-aprendizagem: seja porque o aluno se recuse à consideração de uma nova lógica de organizar, classificar, argumentar, registrar que fuja aos padrões que lhe são familiares […]; seja, ao contrário, porque o próprio aluno se impõe uma obrigação de despir-se do conhecimento adquirido em outras atividades de sua vida social por julgá-lo menos “correto” ou inconciliável com o saber de sua formação escolar.

Assim, entendemos que se faz necessária uma certa vigilância, por parte dos professores, no sentido de tomar consciência de que algumas representações e procedimentos que nos parecem tão óbvios e familiares, aos olhos dos alunos se apresentam como desafios a serem enfrentados e trabalhados. O que se defende é que para algumas situações didáticas, um caminho pode ser a opção pela atividade experimental.

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Estudo da Cicloide: uma proposta de ensino para o Ensino Médio Gustavo Camargo Bérti1

Resumo

O

objetivo deste estudo é apresentar aos professores de Matemática uma possibilidade de exploração dos conteúdos conceituais referentes à geometria considerando-se a ação de movimento. Para tal utiliza-se a cicloide, uma curva descrita mecanicamente. Propõe-se uma sequência didática visando à obtenção dessa curva, aqui fundamentada na utilização do software de geometria dinâmica GeoGebra, o qual permite a construção mediante a aplicação de propriedades geométricas e a visualização da curva gerada quando se aplica movimento nessa construção. A curva cicloide também é gerada por meio de equações paramétricas, obtidas por meio de observações na configuração geométrica que permite a obtenção da curva, trazendo à tona um importante paralelo entre as geometrias plana e analítica. Palavras-chave: Cicloide. GeoGebra. Curvas descritas mecanicamente. São comuns entre os estudantes as dificuldades na compreensão de conceitos decorrentes da visualização de objetos geométricos estáticos. Em Brasil (1997) refere-se a pesquisas realizadas pelo SAEB (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica) no ano de 1995, cujos resultados de desempenho em Matemática mostram um rendimento geral insatisfatório, pois os percentuais, em sua maioria, situam-se abaixo de 50%. É relevante o fato de que o pior índice está relacionado ao campo da geometria. É possível que esta situação seja ocasionada pelo tratamento que normalmente é dado à geometria na Educação Básica, desconexa dos outros campos da Matemática e das demais ciências. Dentre as habilidades descritas nos PCN+ (Orientações Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais) do Ensino Médio para a área de Matemática (BRASIL, 2002) destacam-se algumas referentes à importância da conexão entre os diferentes campos dessa ciência com outras ciências na resolução de situações problema:

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Licenciado em Matemática. Mestre em Matemática em Rede Nacional. Professor no Instituto Federal de Santa Catarina – IFSC, Campus Criciúma/SC. Contato: gustavo.berti@ ifsc.edu.br. 95


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1) Identificar as relações envolvidas e elaborar possíveis estratégias para enfrentar uma dada situação-problema; 2) Frente a uma situação ou problema, reconhecer a sua natureza e situar o objeto de estudo dentro dos diferentes campos da Matemática; 3) Construir uma visão sistematizada das diferentes linguagens e campos de estudo da Matemática, estabelecendo conexões entre seus diferentes temas e conteúdos, para fazer uso do conhecimento de forma integrada e articulada. 4) Reconhecer relações entre a Matemática e outras áreas do conhecimento, percebendo sua presença nos mais variados campos de estudo e da vida humana. Retomando-se a dificuldade na compreensão dos conceitos decorrentes da visualização de objetos geométricos estáticos, esta pode ser minimizada com o auxílio de régua, compasso, papel e outros tipos de materiais manipulativos que possibilitem as construções tanto em duas dimensões (geometria plana), quanto em três dimensões (geometria especial). Todavia, ao mudar o foco do estudo para as curvas construídas por meio de movimento em configurações geométricas, as dificuldades, que já se faziam presentes no caso dos elementos geométricos estáticos, se potencializam, e o professor precisa buscar estratégias para que o aluno visualize o movimento que origina cada curva e possa compreender os conceitos decorrentes de tal procedimento de construção. A partir destas considerações, o objetivo desse artigo é oportunizar estas experiências para a formação de professores de Matemática, uma vez que este conhecimento amplia o conjunto de conteúdos conceituais relativo à geração de curvas mecanicamente. Desse modo, os professores podem facilitar o processo de aquisição desses saberes de seus alunos, pois eles passam a ter noções sobre qual curva será gerada mediante a reprodução do movimento que a define. Espera-se que o aluno compreenda o processo de construção de cada curva através de sua definição e também relacione essa construção dinâmica com a descrição de tal curva por equações paramétricas. Tendo em vista algumas das habilidades propostas pelos PCN+ (numeradas e citadas anteriormente) e os argumentos motivadores, pretende-se, nesse trabalho, desenvolver as seguintes ações para contemplar tais tópicos, como sugere o Quadro 1: 96


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Quadro 1- Ações a serem desenvolvidas no estudo da cicloide Habilidade

Ação para desenvolvimento da habilidade nesse trabalho

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Elencar os elementos geométricos presentes na cicloide assim como a relação que há entre estes, a partir da definição de uma curva.

2

Reconhecer que o campo da Matemática a ser explorado é a geometria, dada a natureza da descrição da curva.

3

Observar as relações entre os elementos na construção geométrica a fim de buscar as equações paramétricas da curva, observando que o mesmo problema pode ser resolvido com a construção geométrica dinâmica ou via geometria analítica.

4

Perceber que o movimento produzido pela construção geométrica ou a curva dada por suas equações paramétricas aparece em diversas áreas do conhecimento e que as relações estudadas na Matemática podem ser aplicadas para solucionar problemas das respectivas áreas.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014

Tendo ainda os PCN+ como referência, considerando o campo da geometria como foco, afirma-se que este deve ser pensado de duas maneiras distintas, sendo a primeira delas marcada pela identificação de propriedades que consideram a posição relativa dos objetos geométricos, e a segunda pela quantificação de comprimentos, áreas e volumes. Na Educação Básica, via de regra, prioriza-se a segunda abordagem da geometria. Para que o raciocínio geométrico seja desenvolvido em sua plenitude é preciso levar em consideração também a primeira abordagem da geometria, cujo processo de ensino e aprendizagem pode ser fundamentado na análise dos elementos geométricos, utilizando-se desenhos, planificações e construções com objetos. A última etapa desse trabalho se desenvolve na perspectiva de que os temas abordados no Ensino Médio devem permitir uma articulação lógica entre as ideias e conceitos, visando à construção de um aprendizado mais significativo por parte do aluno. Trata-se da obtenção das equações paramétricas das curvas estudadas, as quais tiveram a construção geométrica partindo-se do movimento descrito pela respectiva definição, levando em consideração as relações obtidas em tal processo. É feita assim a articulação entre a Geometria Plana e a Geometria Analítica, o que para o aluno representa um enorme ganho dado que normalmente isso não é feito desse modo e o aluno acaba fazendo o estudo de forma isolada. Se o professor tratar tais elementos de forma articulada o aluno compreenderá que a Geometria Analítica é outra abordagem para a Geometria Plana, com enfoque na parte algébrica. 97


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Segundo Brasil (2002), perceber essa relação entre as geometrias é um dos principais objetivos da Geometria Analítica. Para dar início a explanação, inicia-se com a apresentação das curvas planas descritas mecanicamente.

Curvas planas descritas mecanicamente Existem várias definições para o conceito de curva nos mais diversos campos da Matemática. Para Picado (2004), uma curva pode ser pensada como o caminho traçado por um ponto a mover-se no espaço tridimensional. Weisstein (2014) define intuitivamente curva plana como uma curva que se encontra em um único plano. Esta pode ser aberta ou fechada. Retas e parábolas são exemplos de curvas planas abertas, enquanto circunferências e elipses exemplificam curvas fechadas. Algumas curvas planas podem ser descritas mecanicamente, ou seja, pelos movimentos que as geram, como por exemplo, a cicloide, que é a curva gerada por um ponto fixo P de uma circunferência quando este rola, sem deslizar, por uma reta. A Figura 1 ilustra tal movimento. Figura 1 - Movimento que origina uma cicloide

Fonte: http://www.criced.tsukuba.ac.jp/grapes/pt/image/cycloid01.html

Geometria dinâmica O termo dinâmico está associado às ideias de mudança e de movimento. O termo geometria dinâmica é proveniente de softwares de geometria em que é possível fazer construções utilizando as relações entre os elementos geométricos. Cabri Geometrie, Régua e Compasso e GeoGebra são exemplos desse tipo de software. 98


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Destaca-se aqui o GeoGebra, em função deste ser um software gratuito e possuir ferramentas cuja aplicação é relativamente simples e eficaz considerando-se as propostas descritas na sequência didática apresentada neste artigo. O uso do software GeoGebra é uma ferramenta fundamental para o desenvolvimento de tal sequência. As possibilidades da utilização das relações entre os objetos geométricos são exemplificadas aqui por meio da construção de um quadrado utilizando-se o GeoGebra, conforme a sequência sugerida no Quadro 2: Quadro 2 - Os 8 passos usados na construção do quadrado ABCD por meio do GeoGebra Passo 1

Criar os pontos A e B, e o segmento AB (de medida a)

Passo 2

Criar uma reta perpendicular a AB passando por B (reta b)

Passo 3

Criar uma circunferência de raio a com centro em B

Passo 4

Criar o ponto C (interseção da reta b com a circunferência criada no Passo 3)

Passo 5

Criar uma reta paralela a AB passando por C (reta d)

Passo 6

Criar uma circunferência de raio a com centro em A

Passo 7

Criar o ponto D (interseção da reta d com a circunferência criada no Passo 6)

Passo 8

Criar os segmentos BC, CD e AD.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014.

A Figura 2 ilustra o produto final desta construção, o quadrado ACBD construído no software de geometria dinâmica GeoGebra, utilizando-se as propriedades de construção sugeridas no Quadro 2. Observa-se que a implementação desta atividade requer algumas considerações como: o acesso a computadores conectados à rede de Internet ou com o software GeoGebra instalado, de preferência que cada aluno tenha uma máquina para fazer a atividade; o professor precisa focar no objetivo que pretende alcançar por meio da atividade; os alunos precisam de um tempo para compreender a dinâmica do uso do software. 99


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Figura 2 - O quadrado ABCD construído mediante uso do GeoGebra

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014.

Como a construção do quadrilátero ABCD foi feita com base nas propriedades do quadrado (lados opostos paralelos, lados adjacentes perpendiculares, e todos os lados congruentes), os pontos C e D ficam condicionados às posições de A e B. Ou seja, mesmo com o movimento de qualquer um dos vértices do polígono, a figura ABCD, se mantém como quadrado, o que não ocorre caso a construção não leve em consideração as propriedades sugeridas no Quadro 2. Na Figura 3 é possível observar que o quadrilátero sempre se mantém um quadrado se tais propriedades forem consideradas, o que não ocorre se ele for construído de modo aleatório por meio do uso do GeoGebra. Ainda na Figura 3, há a comparação dos efeitos do movimento do vértice A confrontando-se as duas situações. Figura 3 - Construção do quadrado com e sem uso das propriedades

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014. 100


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Para Gravina (2001), a estabilidade sob a ação de movimento proporcionada pelos softwares de Geometria Dinâmica faz com que se tenha na tela uma infinidade de desenhos que mantém as propriedades do objeto vislumbrado na construção inicial. Isso ocorre se todas as propriedades de certo objeto geométrico forem respeitadas na respectiva construção, A trajetória de um ponto pode ser observada pela ferramenta denominada rastro. Dessa forma, é fácil obter curvas descritas mecanicamente. Como exemplo, destaca-se a circunferência de centro A e raio a que pode ser construída observando-se a trajetória do ponto B (outro extremo do segmento de medida a), mediante habilitação da ferramenta rastro como mostra a Figura 4. Figura 4 - Construção da circunferência no GeoGebra com a ferramenta rastro.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014.

Mediante as considerações sugeridas, pode-se igualmente trabalhar com o recurso do GeoGebra, diferentes elementos geométricos, como é o caso das equações paramétricas que será abordado na próxima seção.

Equações paramétricas De acordo com Weissten (2014), as equações paramétricas representam um leque de equações que expressam um conjunto de quantidades de funções explícitas de uma série de variáveis ​​independentes, conhecidas como “parâmetros”. Como exemplo de curva descrita por equações na forma paramétrica, sugere-se a construção da circunferência de raio 1 centrada na origem do plano cartesiano, cuja equação na forma cartesiana é x² + y² = 1, apresentada na Figura 5. 101


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Figura 5 - Representação da circunferência de raio 1.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014.

Pensando-se nas coordenadas de um ponto genérico P dessa circunferência, de coordenadas x e y, temos que x = cos t e y = sen t, portanto as equações paramétricas da circunferência de raio 1 em função do parâmetro t são:

Destaca-se que basta variar o parâmetro t de 0 a 2π radianos para se obter a circunferência completa.

A obtenção da cicloide: uma sequência didática Para que os objetivos dessa dinâmica sejam alcançados é proposta uma sequência didática visando à obtenção da cicloide. Tal sequência se dá mediante a realização de três tipos de atividades, quais sejam: 1) Obtenção da curva mediante o uso de material manipulativo, reproduzindo o movimento evidenciado na definição da curva; 2) Obtenção da construção geométrica que permite a obtenção da curva no software GeoGebra; 3) Obtenção das equações paramétricas da curva com base na observação das relações utilizadas na construção geométrica que permite a obtenção da curva. Um dos principais objetivos do desenvolvimento da tarefa proposta é que o professor instigue os alunos a perceberem como se dá a articulação entre a Geometria Plana e a Analítica. Assim, destaca-se que os docentes devem conhecer e tratar os elementos geométricos de modo que os alunos tenham 102


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real domínio sobre as definições que lhes forem apresentadas. Desse modo, a presente proposta perpassa três fases para que os alunos consigam fazer este elo entre as diferentes abordagens envolvidas. Para tanto, serão apresentadas algumas atividades para se fazer a construção da cicloide com uso de material manipulativo, com uso do GeoGebra e também com as equações paramétricas. No entanto, leva-se em consideração que o aluno conheça a definição de uma cicloide, qual seja: Cicloide é uma curva traçada por um determinado ponto fixo da circunferência de um círculo (geratriz), quando este rola, sem deslizar, por uma reta (diretriz).

Atividade 1 – Construção da cicloide com material manipulativo Para que os alunos desenvolvam a construção da cicloide por meio de materiais manipulativos, precisa-se de alguns materiais específicos. •

Material necessário: - régua; - copinho de acrílico com grafite fixado na borda; - folha de ofício.

• Instruções: Utilizando a folha de ofício como base, role (sem deslizar) o copinho ao longo da régua, procurando reproduzir o movimento evidenciado na definição da curva cicloide. A Figura 6 ilustra o procedimento descrito. Figura 6 - Procedimento para construção da cicloide com material manipulativo

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014. 103


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• Questões: Considere os pontos A (origem da curva), T (ponto de tangência entre o copinho e a reta definida pela régua) e P (ponto que descreve a curva (grafite)). Mediante tais considerações pode-se propor um conjunto de questões de modo que os alunos estejam atentos no passo a passo da construção da cicloide com uso de material concreto, entre elas tem-se: 1) Qual a comprimento da circunferência do copinho? 2) Qual a distância entre o ponto A e o primeiro ponto (após a origem) em que a curva tangencia a reta definida pela direção da régua? 3) Visualmente, qual a relação entre o comprimento do arco TP e do segmento AT? Atividade 2 – Construção geométrica que permite a obtenção da cicloide no GeoGebra Lembra-se que os professores que levarem esta proposta de trabalho aos seus alunos, precisarão prever um tempo hábil para a realização da mesma, pois ela envolve o uso de computadores e, além disso, o uso do GeoGebra que é um software de aplicação bem prática e de fácil manuseio. Portanto, nesta etapa o professor deve apontar para alguns tópicos como se sugere a seguir. Considera-se: – o eixo x (y=0) como reta diretriz; – a origem do sistema cartesiano, ou seja, o ponto (0,0) como origem da cicloide; – uma circunferência de raio r como geratriz que rola, sem deslizar, sobre a diretriz, deslocando-se para a direita. É importante que todos os alunos estejam atentos às instruções a serem dadas para que consigam finalizar a tarefa com sucesso. • Instruções: Siga o seguinte roteiro de construção no software GeoGebra: I) No campo de entrada digite A = (0,0); II) r = 10; III) No campo de entrada digite y = r; IV) Clique na ferramenta PONTO e clique na reta y = r para criar o ponto C (renomei-o caso seja necessário); V) Clique na ferramenta CÍRCULO DADOS CENTRO E RAIO, clique no ponto C e em seguida digite o valor do raio: r; 104


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VI) Oculte a reta y = r; VII) Clique na ferramenta INTERSECÇÃO DE DOIS OBJETOS e posteriormente na circunferência de raio r e no eixo x (o ponto obtido deve ser nomeado como T); VIII) Clique na ferramenta SEGMENTO e clique nos pontos A e T (o segmento obtido deve ser nomeado como b); IX) Clique na ferramenta ÂNGULO COM AMPLITUDE FIXA e posteriormente nos pontos T e C, nessa ordem. Quando solicitado sobre o ângulo digite b/r e marque a opção sentido horário (o ponto obtido deve ser nomeado como P); X) Habilite o rastro no ponto P e movimente o ponto C em qualquer intervalo de à direita do eixo y. A curva obtida pelo rastro do ponto P é uma cicloide. A Figura 7 mostra a obtenção da cicloide a partir da construção no GeoGebra. É importante ressaltar que o valor do raio r pode ser modificado variando-se o ponto que o representa no controle deslizante. No caso desta figura tem-se uma cicloide originada por uma circunferência de raio 2,1. Figura 7 - Obtenção da cicloide no GeoGebra

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014. 105


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De modo análogo ao que se desenvolveu na construção da cicloide com uso de material manipulativo, para o uso do software GeoGebra tem-se a orientação por meio de um conjunto de questões a serem respondidas. • Questões: 1 ) Utilize a ferramenta ARCO CIRCULAR e clique nos pontos C, P e T, nesse segmento. O comprimento desse arco, logo após o início do movimento, é equivalente ao de qual segmento utilizado na construção? 2) Por que, na etapa IX, é utilizado um ângulo de medida b/r para que se obtenha o ponto P? 3) Qual a medida do segmento b quando o ponto P volta a tocar o eixo x pela primeira vez após o início do movimento? Compare essa medida com o comprimento da circunferência de raio r. 4) Calcule o valor adequado de raio para que no intervalo de 0 a 40 sejam feitos... a) 2 movimentos completos; b) 5 movimentos completos; c) 10 movimentos completos; A Figura 8 mostra as cicloides solicitadas nos itens a, b e c. Figura 8 - Cicloides solicitadas na questão 4

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014.

É interessante solicitar que os alunos verifiquem a coerência de suas respostas da questão 4 no GeoGebra, modificando o valor de r. A seguir, será apresentada a construção geométrica da cicloide que será obtida no GeoGebra utilizando-se equações paramétricas. 106


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Atividade 3 – Pensando em equações paramétricas para descrever a cicloide A Figura 9 ilustra alguns elementos a serem considerados no uso do GeoGebra que possibilitarão a construção da cicloide, agora envolvendo conceitos da Geometria Analítica: as equações paramétricas. Figura 9 - Construção geométrica que possibilita a obtenção da cicloide no GeoGebra

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014.

A construção desta cicloide também está atrelada a uma sequência de orientações, que devem ser utilizadas durante a elaboração da atividade no software GeoGebra. • Instruções: Nesta atividade serão determinadas as equações para x e para y em função do parâmetro t. Para iniciar atividade é necessário responder as seguintes questões, observando-se a Figura 9: 1) Qual a relação entre a coordenada y de P e os segmentos CF e CT? 2) Qual o comprimento do segmento CT em função de r? 3) Qual o comprimento do segmento CF em função de r e t? 4) Escreva uma equação que relacione y, r e t, com base nas respostas anteriores. 107


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5) Qual a relação entre a coordenada x de P e os segmentos AT e PF? 6) Qual o comprimento do segmento AT em função de r e t (lembre-se das atividades anteriores)? 7) Sabendo que o triângulo CPF é retângulo, qual o comprimento do segmento PF em função de T? Levando-se em consideração o que se deseja alcançar e dado que as questões anteriores tiveram a otimização de seus resultados, solicita-se que os alunos escrevam uma equação que relacione x, r e t, com base nas respostas anteriores, e que se repita o processo na relação entre y, r e t. Além disso, destaca-se que ao longo do movimento que descreve a cicloide, a relação entre as coordenadas x e y de P, com os segmentos AT e PF e CF e CT, respectivamente, mudam, mas que sempre se chega às mesmas equações que relacionam r e t com cada coordenada. Desse modo, espera-se que o estudante consiga obter as equações paramétricas para uma cicloide de raio r em função do parâmetro t:

Questões de aplicação das equações paramétricas: 1) Em uma nova janela do programa GeoGebra: a) No campo de entrada digite r = 1; b) No campo de entrada digite t = 20 (na janela de álgebra o círculo que sinaliza a visualização de tal parâmetro deve estar azul, para que seja possível obter um controle deslizante na janela de visualização); c) No campo de entrada digite P = (r*(t-sin(t)), r*(1-cos(t))) para criar o ponto P; d) Com o botão direito, clique no ponto P e depois em HABILITAR RASTRO; e) Arraste o parâmetro t e verifique o movimento descrito pelo ponto P.

Na Figura 10 há quatro cicloides. Tais curvas resultam da construção do passo a passo sinalizado na proposta da atividade 3, por meio do uso do GeoGebra e aplicação das equações paramétricas. 108


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Figura 10 - Construção geométrica que a ser obtida no GeoGebra utilizandose equações paramétricas

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014.

Agora os professores podem solicitar que seus alunos escrevam as quatro equações paramétricas que foram utilizadas na composição ilustrada na Figura 10. Tal questão pode finalizar a sequência didática. Além disso, durante a realização da sequência didática é importante relacionar as três atividades propostas bem como sua relevância para o processo de aprendizagem. A realização de tarefas que envolvem representações diferentes dos objetos matemáticos deve-se dar de distintas formas para que ampliem os seus conhecimentos e assim transitem livremente em distintos registros de representação. Concluída a etapa de apresentação da sequência didática envolvendo o estudo da cicloide, na próxima seção são apresentadas as considerações finais.

Considerações finais Ao longo do desenvolvimento desse trabalho evidencia-se a busca por várias estratégias, a análise dos procedimentos, da interpretação e da visualização do conceito de cicloide e suas representações. Espera-se viabilizar a 109


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possibilidade de fazer com que os alunos enxerguem uma situação problema por diferentes pontos de vista cujos resultados colaboram com um processo de ensino-aprendizagem significativo aplicado em qualquer área do conhecimento, mais especificamente aqui, na geometria. Busca-se com a sequência didática proposta incentivar os educadores a uma prática que leve em consideração as habilidades descritas nos parâmetros curriculares sem que se fique restrito a uma simples lista de conteúdos, contemplando-as de forma criativa, utilizando diferentes instrumentos e relacionando os conteúdos com os diferentes campos da ciência, em especial da própria Matemática.

Referências bibliográficas BRASIL. Ministério da Educação. Secretária da Educação Média e Tenológica. PCN+, Ensino Médio: orientações educacionais complementares aos parâmetros curriculares nacionais. Ciências da Natureza, Matemática e suas tecnologias. Brasília: MEC, 2002. 144 p. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: Introdução aos parâmetros curriculares nacionais/Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997. 126p. GRAVINA, M. A. Os ambientes de geometria dinâmica e o pensamento hipotético-dedutivo. set. 2001. 262 f. Tese (Doutorado em Informática na Educação) – Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2001. PICADO, J. O que é uma curva? Coimbra: UC, 2004. Disponível em: http://www. mat.uc.pt/~picado/geomdif/0405/Apontamentos/sI2.pdf. Acesso em: 17 dez. 2014. WEISSTEN, E. W. Plane curve. Disponível em: http://mathworld.wolfram.com/ PlaneCurve.html. Acesso em: 29 nov. 2014.

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Funções Exponencial e Logarítmica na perspectiva da Educação Financeira: uma proposta de sequência didática

Graciele Amorim Zimmermann1

Resumo

E

ste texto traz uma sequência didática para aplicação dos conhecimentos das funções exponencial e logarítmica no Ensino Médio numa situação que envolve o pagamento mínimo de uma fatura de cartão de crédito. Dessa forma vislumbra-se tornar esses conteúdos matemáticos mais significativos para o estudante e atender as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) que consideram que é de extrema importância os alunos terem contato com a educação financeira no ambiente escolar. Palavras-chave: Função exponencial. Função logarítmica. Educação financeira. Sabe-se que o processo de ensino e aprendizagem de conhecimentos matemáticos torna-se mais instigante e com maior significado para os alunos se os novos conhecimentos recebem um tratamento mais dinâmico ao serem ensinados. O presente artigo apresenta uma sequência didática, que foi implementada a partir da sugestão de Campos et al. (2014), com objetivo de oferecer aos alunos do Ensino Médio uma forma de aplicação prática dos conhecimentos da Função Exponencial e Logarítmica. Esta proposta visa atender as orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) que levam em consideração que é de extrema importância que os alunos tenham contato com a Educação Financeira no ambiente escolar. “Em princípio, inserir a educação financeira no currículo escolar parece uma medida capaz de adicionar aos saberes escolares relevância, utilidade e pertinência no cotidiano dos estudantes, potencializando, por exemplo, a interface entre ma1

Mestre em Matemática e Computação Científica. Professora de Matemática do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC). Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Aplicações Matemáticas (GPAM). Contato: graciele.amorim@ifsc.edu.br 111


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temática e economia e, em especial, entre educação matemática e educação financeira” (HOFMANN, 2013, p. 295). A sequência didática engloba os temas de função exponencial e logarítmica numa situação que envolve o pagamento mínimo de uma fatura de cartão de crédito. É importante ressaltar que a intenção deste trabalho não é esgotar elementos sobre o tema, mas sim servir de contributo para que professores possam abordar esses tipos de funções em suas aulas sob uma ótica mais significativa para o aluno.

Educação financeira e funções? Visitando o portal do Ministério da Educação e Cultura é possível encontrar um material sobre educação financeira para o ensino médio disponibilizado em versões para o professor e para o aluno. Esse material é parte do programa denominado Programa Educação Financeira nas Escolas que consiste de “uma iniciativa da Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF) com o objetivo de oferecer ao jovem estudante a formação necessária para que possa tomar decisões financeiras conscientes e sustentáveis tanto para a vida pessoal quanto para o país” (CONEF, 2013, p. iii). Em CONEF (2013, p. 13), dentre os diversos objetivos específicos relacionados ao tema vida social, situam-se várias expressões que referenciam o uso do cartão de crédito, tais como: “identificar os elementos de uma fatura de cartão de crédito” e “identificar os comportamentos financeiros que provocam endividamento no cartão”. Ressalta-se que, segundo a Confederação Nacional do Comércio (CNC, p. 3) em dezembro de 2014 “o cartão de crédito foi apontado como um dos principais tipos de dívida por 74,6% das famílias endividadas”. No propósito de ir ao encontro dessa importante problemática, o presente artigo procura correlacionar essa discussão com foco de aplicabilidade nas funções exponenciais e logarítmicas. Tais funções são apresentadas ao aluno no primeiro ano do Ensino Médio e, em geral, o discente apresenta dificuldades para lidar com esses conteúdos. Pereira (2010, p.14) expõe que “são constantes as dificuldades apresentadas pelos alunos quanto à abordagem metodológica do estudo das Funções Exponenciais e Logarítmicas”, também “quanto ao tratamento conceitual através de situações-problemas”, e no estudo do “comportamento gráfico”. Nessa perspectiva, em consonância com os PCN’s do Ensino Médio (Brasil, 2000, p. 44), lembramos que cabe “ao ensino de Matemática ga112


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rantir que o aluno adquira certa flexibilidade para lidar com o conceito de função em situações diversas”.

Iniciando a discussão com a turma Sugere-se ao professor que esta sequência didática seja aplicada após os alunos terem compreendido a definição e propriedades de logaritmo. Para execução da mesma serão necessários apenas cálculos simples de porcentagens e conhecimentos básicos em planilhas eletrônicas. Considera-se interessante que a sequência de atividades propostas seja realizada em dupla ou em equipes de três alunos, a critério do professor. Os recursos necessários são: uma fatura de cartão de crédito2 para cada equipe, calculadora científica e computador com software para tabulação de dados em planilhas. O passo a passo para condução das atividades pode ser descrito através dos subitens especificados a seguir.

Conhecendo a fatura de um cartão e suas tarifas Como forma de motivar a atividade, o professor apresentará para a turma os elementos3 que constam em uma fatura de cartão de crédito. Neste passo o professor poderá ressaltar que, de acordo com a Resolução no 3.919 (Brasil, 2010), a partir de junho de 2011, apenas cinco tarifas podem ser cobradas pelas emissoras dos cartões: anuidade, emissão de segunda via do cartão, retirada em espécie na função saque, uso para pagamento de contas e avaliação emergencial do limite de crédito. Após essa discussão inicial os grupos deverão, a partir da fatura que têm em mãos, responder a seguinte pergunta: I) A que percentual corresponde o valor mínimo de pagamento da fatura?

Efetuando o pagamento mínimo da fatura O uso do cartão de crédito traz inúmeras vantagens ao usuário: O chamado “dinheiro de plástico” possibilita fazer compras com status de à vista permitindo pagamento posterior. A programação das parcelas pode ainda se estender sem juros. [...]. É possível também fazer saques e compras internacionais sem a necessidade de portar a moeda local. Além disso, 2

Caso o professor não disponha de diferentes faturas, é possível encontrar várias imagens em sites de busca. 3 A Cartilha da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (ABECS), disponível em http://www.abecs.org.br, pode auxiliar o professor nessa introdução. 113


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os cartões possuem grande aceitação comercial que permite inclusive transações via internet. (CAMPOS et al., 2014, p. 1) No entanto, apesar dos atrativos, é necessário que o usuário tenha uma boa organização financeira. Campos et al. (2014, p. 2) coloca que “se o cliente não faz o pagamento integral da fatura, esta diferença não paga passa a ser automaticamente financiada e o usuário acaba por usar o crédito rotativo”. Os encargos correspondentes às taxas de juros rotativos, multa e juros de mora variam de acordo com cada administradora de crédito. É válido lembrar que “as taxas de juros são livremente pactuadas entre o cliente e a emissora do cartão” (BRASIL, 2011, p. 4). Para exemplificar, suponha uma situação hipotética na qual o valor integral de uma fatura é igual a R$ 100,00 com juros rotativos de 10% ao mês. Supondo-se que apenas o pagamento mínimo de R$ 15,00 foi efetuado até a data do vencimento, pergunta-se: qual será o valor da nova fatura do mês seguinte? Admita que novas dívidas do cartão não tenham sido adquiridas no período. O Quadro 1 traz de forma simplificada a resposta a esta pergunta: Quadro 1 - Total da nova fatura Restante da fatura Juros rotativos (10% a.m.) Total da nova fatura

R$ 85,00 R$ 8,50 R$ 93,50

Fonte: elaborado pela autora

Após essa explanação, cada grupo analisará sua fatura e responderá as seguintes perguntas: I) Se apenas o pagamento mínimo for efetuado, qual será o valor de juros rotativos incidentes na próxima fatura? II) O que ocorrerá com o valor da fatura se o usuário continuar a fazer o pagamento mínimo durante um período de cinco meses sem que tenham sido novas dívidas no período? III) O que ocorrerá com o valor da fatura se o usuário continuar a fazer o pagamento mínimo durante um período de cinco meses acrescentando nos meses subsequentes um novo débito de R$ 50,00 na fatura?

Utilizando o recurso das planilhas eletrônicas Sobre o uso de planilhas eletrônicas ressalta-se que: “a possibilidade de uma fácil manipulação dos dados torna possível ao estudante visualizar fa114


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cilmente a variação, mas sem nunca perder de vista a essência da movimentação, que é sua definição recursiva, já que a programação da planilha é feita a partir dela” (COSER FILHO, 2008, p. 74). Dessa maneira, entende-se que o objetivo principal não é o resultado final da atividade proposta e sim, o decorrer dela. Nesse sentido observa-se que é importante que os alunos respondam a pergunta II sem a utilização de planilhas eletrônicas para que compreendam os procedimentos que irão realizar. Ou seja, de nada adianta a mera repetição de comandos se o discente não está ciente do processo que está ocorrendo. Feijó (2007) discute que a utilização das planilhas demonstra uma mudança que proporciona ao aprendiz verificar que não existe somente a transferência do conhecimento, mas sim um processo de construção do mesmo. Como exemplo a ser exposto pelo professor retoma-se a situação exposta anteriormente: tendo como base a mesma taxa de juros rotativos, numa situação hipotética, o que ocorrerá se o usuário do cartão efetuasse durante doze meses consecutivos apenas o pagamento mínimo da fatura do cartão? O Quadro 2 ilustra o que ocorrerá com as faturas posteriores e o total de juros acumulados ao longo do tempo, sem que novas dívidas sejam adquiridas nesse período. Quadro 2 - Planilha de cálculo de encargos durante 12 meses

Fonte: elaborado pela autora. 115


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Para a construção da segunda e da terceira linha do Quadro 2, foram utilizadas as formulações expressas através do Quadro 3. Observa-se que a partir da construção dessas linhas iniciais, as demais poderão ser obtidas selecionando-se a linha 2 e arrastando-a para baixo pelo canto inferior direito da célula G3. Quadro 3 - Construção da primeira e da segunda linha da planilha

Fonte: elaborado pela autora.

Para efeitos de visualização, preservaram-se duas casas decimais. Como atividade os alunos deverão, a partir da fatura que têm em mãos, construir uma planilha análoga supondo que o usuário continue a fazer o pagamento mínimo da fatura nos próximos doze meses sem aquisição de novas dívidas. Após a construção da planilha os alunos deverão analisá-la para responderem as seguintes perguntas: IV) Há outra maneira (fórmula) para expressar os valores da coluna que corresponde ao valor restante da fatura? V) Ao final de doze meses a dívida ainda não estaria quitada. Quanto já teria sido pago no total? 116


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VI) Quantos meses são necessários para a quantidade de juros acumulados ultrapassar o valor original da fatura?(Se necessário inclua mais linhas na planilha). VII) Quantos meses são necessários para a quantidade de juros acumulados ultrapassar o valor da original da fatura se o cliente decidisse pagar consecutivamente um percentual 30% da fatura ao invés de efetuar o pagamento mínimo? VIII) Se continuarmos acrescentando mais linhas para meses subsequentes observaremos que a dívida parecer nunca terminar (isso é facilmente visualizado se aumentarmos a quantidade de casas decimais da coluna B). Que tipo de função já estudada tem esse comportamento?

Registros gráficos Dentre as diferentes competências e habilidades a serem desenvolvidas pelos alunos de Ensino Médio, os PCN’s (BRASIL, 2000) situam: a interpretação e utilização de diferentes formas de representação (tabelas, gráficos, expressões, ícones...); identificação, análise e aplicação de conhecimentos sobre valores de variáveis representados (realizando previsão de tendências, extrapolações e interpolações e interpretações). Além destas há também a análise qualitativa de dados quantitativos representados gráfica ou algebricamente relacionados a contextos socioeconômicos, científicos ou cotidianos. Para que tais competências e habilidades sejam desenvolvidas faz-se necessário lembrar que: Para que ocorra a aprendizagem de um conceito matemático, a noésis (conceitualização do objeto matemático) deve ocorrer por meio de significativas semiósis (representações). Isto implica em dizer que a compreensão em matemática acontece na medida em que o sujeito que aprende, consegue coordenar os vários registros de representação associados a um mesmo objeto matemático. Estabelecer coordenações entre os vários registros significa potencializar a compreensão deste objeto matemático (VERTUAN, 2007, p. 20-21). Sugere-se ao docente explorar o Quadro 2 através de uma análise gráfica. A Figura 1 mostra um gráfico de dispersão construído a partir da coluna E: 117


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Figura 1 - Juros mensais para pagamento mínimo da fatura até o dia do vencimento

Fonte: elaborada pela autora.

Adicionando-se uma linha de tendência ao conjunto de pontos da Figura 1 observa-se um ajuste exponencial, cujo modelo é dado por f (t) = 9,1e–0,1t, no qual t representa o tempo em meses e f (t) é valor de juros correspondente ao mês t. Analisando-se graficamente os juros acumulados da coluna G do Quadro 2 temos que a linha de tendência tem comportamento logarítmico (Figura 2) e pode ser aproximada pela expressão f (t) = 26,91n(t) – 0,8 na qual t representa o tempo em meses e f (t) é valor de juros acumulados até o mês t: Figura 2 - Juros acumulados para pagamento mínimo da fatura até o dia do vencimento

Fonte: elaborada pela autora. 118


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Outra análise interessante consiste em fazer um estudo comparativo entre modelos de juros acumulados para percentuais distintos superiores ao pagamento mínimo (Figura 3). Nas mesmas condições anteriores supuseram-se três situações: o pagamento mínimo de 15% da fatura, o pagamento parcial de 30% e outro correspondente a 60% do valor total. É possível verificar que as curvas de ajustes têm crescimentos distintos, ou seja, quanto maior o valor percentual pago, menor a taxa de crescimento dos juros acumulados. Figura 3 - Comparativo de juros acumulados para diferentes percentuais de pagamento da fatura até o dia do vencimento

Fonte: elaborada pela autora.

Para finalização da discussão propõem-se aos grupos a resolução das seguintes questões: IX) Qual curva seria obtida na Figura 3 ao longo dos doze meses se a fatura fosse quitada integralmente? X) Na Figura 3 os modelos foram obtidos utilizando-se o logaritmo natural. Com auxílio da calculadora científica escreva cada uma das igualdades na base 10. XI) Nas Figuras 1 e 2 expresse o tempo t em função do juro. Ao isolar a variável t que tipo de função aparece? Qual relação pode-se estabelecer, portanto, entre as funções exponencial e logarítmica? XII) Qual é o significado de cada um dos coeficientes que multiplicam 119


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ln(t) nos modelos que aparecem nas Figuras 1, 2 e 3? Qual o significado dos números que são somados ou subtraídos? XIII) Construa um gráfico comparativo análogo ao da Figura 3 a partir da fatura que o grupo detém. Verifique quais as equações que representam as linhas de tendência dos conjuntos de dados.

Conclusão A sequência didática aqui proposta tratou de uma aplicação prática de situações do cotidiano dos alunos trazida para o contexto escolar e que promove diferentes formas de perceber o uso de conteúdos específicos da matemática do Ensino Médio. Esta proposição de atividade servirá de suporte teórico aos professores de Matemática que os auxiliará na aplicação dos conteúdos de função logarítmica e exponencial. Neste artigo não foi dado tanta ênfase em situações onde mais dívidas fossem adquiridas ao longo do período no qual a fatura não foi integralmente quitada. Fica como sugestão também explorar essas situações supondo dias de atraso no pagamento, o que vai implicar em multa e juros de mora. Ademais, como possibilidade de continuidade dessa investigação sugere-se a adequação de um conjunto de perguntas que tenham foco no ensino de Cálculo para cursos superiores para aplicação no estudo de limites e assíntotas, uma vez que tais conteúdos podem ser tratados a partir desse ponto de vista, por exemplo. Em suma, reforça-se que é de extrema importância que os professores de Matemática levem, sempre que possível, os seus alunos a perceberem que os assuntos tratados em sala de aula têm aplicação prática, ou seja, que façam as devidas conexões dos conteúdos que apresentam com as situações vivenciadas pelos seus alunos para que a aprendizagem se torne mais significativa e tenha mais sentido. Que essa sequência didática possa elucidar para o aluno a importância do estudo de funções e evidenciar sua estreita proximidade com situações que vivenciamos.

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PEREIRA, J. G. A. A abordagem das funções exponencial e logarítmica numa perspectiva conceitual e gráfica no ensino médio. 2010. 121f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010. VERTUAN, R. E. Um olhar sobre a modelagem matemática à luz da teoria dos registros de representação semiótica. 2007. 141f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências e Educação Matemática) – Centro de Ciências Exatas. Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2007.

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O conhecimento de Probabilidades de futuros educadores e professores dos primeiros anos José António Fernandes1 Floriano Viseu2 María M. Gea3

Resumo

N

este texto apresenta-se um estudo sobre a adequação do conhecimento de probabilidades de futuros educadores e professores dos primeiros anos de escolaridade às exigências de ensino desse tema aos alunos que irão ter no futuro. Para tal, os futuros educadores e professores, que já tinham estudado o tema de Probabilidades no curso de graduação universitária, responderam a três tarefas, com vários itens, versando os conteúdos: definição de acontecimentos certos, probabilidade simples e probabilidade conjunta e condicional. Em termos de resultados, excetuando a tarefa de probabilidade simples, em que se observou um melhor desempenho, as dificuldades sentidas pelos futuros educadores e professores na resolução das outras tarefas recomendam que a sua formação em probabilidades seja aprofundada ao longo da sua formação acadêmica. Palavras-chave: Conhecimento para ensinar. Probabilidades. Futuros professores dos primeiros anos. 1

2 3

Doutor em Educação, área de conhecimento de Metodologia do Ensino da Matemática, pela Universidade do Minho. Professor Associado do Instituto de Educação da Universidade do Minho. Investigador do Centro de Investigação em Educação (CIEd). Contacto: jfernandes@ie.uminho.pt Doutor em Educação, Especialização em Didática da Matemática, pela Universidade de Lisboa. Professor Auxiliar do Instituto de Educação da Universidade do Minho. Investigador do Centro de Investigação em Educaçãp (CIEd). Contato: fviseu@ie.uminho.pt. Doutora em Ciencias de la Educación, especialidade em Didáctica de la Matmática, pela Universidade de Granada. Professora Ayudante Doctora do Departamento de Didáctica de la Matemática da Universidade de Granada. Membro do Grupo de Investigación sobre Educación Estadística. Contacto: mmgea@ugr.es 123


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Cada vez mais o mundo em que vivemos envolve aspectos de incerteza, que se manifestam nos mais variados setores e domínios pessoais e sociais, tais como na medicina, na produção, no marketing, na política, na ciência e na tomada de decisões. Ora, a teoria das probabilidades constitui, por excelência, o instrumento para lidar com essas situações de incerteza. Segundo Fischbein (1975), a visão determinista do mundo, que tem sido prevalecente na escola desde o Renascimento até o século passado, tem relegado o ensino das probabilidades para um plano secundário ou mesmo inexistente. Em consequência, para este autor, a pouca visibilidade da incerteza na escola explicaria, por sua vez, muitas das dificuldades experimentadas pelos alunos na sua aprendizagem. A importância que é atribuída às Probabilidade e Estatística nas sociedades atuais tem levado muitos países a introduzirem estas temáticas nos currículos escolares de Matemática desde os primeiros anos de escolaridade, o que também acontece em Portugal (PORTUGAL, 2007). Adicionalmente, para além do reconhecimento da sua importância, alguns autores (e.g., Batanero, 2013; Borovcnik; Peard, 1996) veem no ensino das Probabilidades desde os primeiros anos uma forma de evitar que os alunos consolidem ideias erradas. Ora, o ensino de noções elementares de Probabilidades aos alunos dos primeiros anos de escolaridade exige que os seus professores adquiram conhecimentos nesta temática. Assim, no presente texto avaliam-se os conhecimentos de futuros educadores e professores dos primeiros anos de escolaridade4 no tema de Probabilidades, tendo em vista perceber se estes futuros educadores e professores são detentores de um conhecimento adequado às necessidades do ensino. Seguidamente, na próxima secção, abordaremos a questão do conhecimento do professor para ensinar, nas três secções seguintes apresentaremos o desempenho de futuros educadores e professores dos primeiros anos em tarefas de Probabilidades e, finalmente, sintetizaremos as principais conclusões e implicações para a formação de professores.

Conhecimento do professor para ensinar Embora a preparação dos professores se verifique ao longo de toda a sua carreira, é no período da formação inicial que é dado um impulso decisivo 4 124

Os futuros educadores trabalharão com crianças antes do ensino formal e os futuros professores lecionarão alunos até ao 6.º ano de escolaridade (inclusive).


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para a construção do seu conhecimento profissional. Os cursos de formação inicial de professores seguem modelos diversificados, desde aqueles que integram a prática e a teoria ao longo do curso até os modelos sequenciais, em que primeiro se tratam as matérias teóricas (da Matemática e da Didática) e só depois se realiza o estágio pedagógico. Atualmente, em resultado da adaptação do ensino superior português às determinações do processo de Bolonha, a formação inicial de professores de Matemática de todos os níveis de ensino é obtida através da realização de dois cursos sequenciais, o primeiro de licenciatura (com seis semestres) e o segundo de mestrado (com três ou quatro semestres). O curso de licenciatura fornece ao futuro professor o conhecimento na área de docência, neste caso, da Matemática. O curso de mestrado é orientado para a preparação dos licenciados em áreas de formação educacional geral, de didáticas específicas e de prática de ensino supervisionado, ou seja, proporciona sobretudo o conhecimento relativo ao currículo, aos alunos e aprendizagem e à prática letiva. A investigação em educação matemática tem dado um destaque especial ao conhecimento que o professor precisa para ensinar. Shulman (1986) reconhece a existência de um conhecimento específico para ensinar, organizando-o em conhecimento do conteúdo, conhecimento pedagógico geral, conhecimento do currículo e conhecimento pedagógico do conteúdo. Destes conhecimentos, Shulman dá particular destaque ao conhecimento pedagógico do conteúdo, que consiste nas formas de representar e formular o assunto de modo a torná-lo compreensível ao aluno. O interesse por este tipo de conhecimento deriva da ligação que se estabelece entre o conhecimento do conteúdo e a prática de ensino, o que significa que as discussões sobre o conteúdo devem ser relevantes para o ensino e que as discussões sobre o ensino devem garantir que se dê atenção ao conteúdo (Ball; Thames; Phelps, 2008). Ponte (2012) defende que o conhecimento do professor de Matemática é orientado para a atividade de ensinar, apoiando-se em conhecimentos de natureza teórica e também de natureza social e experiencial, integrando quatro vertentes fundamentais: (i) conhecimento da matemática; (ii) conhecimento dos alunos e da aprendizagem; (iii) conhecimento do currículo; e (iv) conhecimento da prática letiva. Para Shulman (1986), o conhecimento do conteúdo abrange não só o conhecimento dos assuntos a ensinar, mas também o conhecimento das suas estruturas organizacionais, tanto de natureza substantiva – a variedade de formas pelas quais os conceitos e princípios básicos de uma disciplina espe125


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cífica são organizados – como sintática – o conjunto de regras que determinam o que é verdadeiro ou falso, o que é válido ou não num domínio disciplinar. Nesta perspetiva, ensinar um dado assunto é mais do que conhecer os fatos e os conceitos que são apresentados na prática. Como refere este autor, para um professor não basta saber que ‘uma dada coisa é assim’, tem que saber ‘porque é que é assim’, sustentando as suas afirmações e distinguindo claramente o que é central e o que é periférico. Determinadas tarefas de ensino dependem, sobretudo, do conhecimento do conteúdo matemático. Tomar decisões sobre como e quando abordar um dado tópico matemático, orientar os alunos no que têm que fazer, ouvir e comentar as suas ideias, determinar a validade de um argumento matemático ou a adequação das representações matemáticas e estabelecer conexões entre os tópicos abordados quer noutras disciplinas quer na própria Matemática são exemplos de tarefas em relação às quais o conhecimento do conteúdo é determinante (BALL ET AL., 2008; Kahan; Cooper; Bethea, 2003; Kilpatrick; Swafford; Findell, 2001; Osana; Lacroix; Tucker; Desrosiers, 2006; Santos; Ponte, 2002; Shulman, 1986). Ball et al. (2008) distinguem dois tipos de conhecimento do conteúdo, o comum e o especializado. O conhecimento comum do conteúdo traduz o conhecimento que qualquer pessoa com formação matemática manifesta quando responde corretamente a uma dada questão ou resolve corretamente um dado problema matemático. O conhecimento especializado do conteúdo é o que distingue o professor de Matemática de qualquer outra pessoa com formação matemática. Este conhecimento está na base da capacidade do professor para explicar a razão de ser dos procedimentos matemáticos e a especificidade da linguagem matemática. É este conhecimento especializado que permite ao professor usar representações adequadas dos conceitos matemáticos, analisar diferentes estratégias de resolução de tarefas e envolver os alunos nas suas atividades e na discussão dos seus resultados. Relativamente ao conhecimento do currículo, Shulman (1986) considera que se trata do conhecimento que o professor tem dos programas da sua área disciplinar, da variedade de materiais que podem utilizar no seu ensino e das vantagens e desvantagens do uso desses programas e materiais na sala de aula. Este autor salienta duas dimensões do conhecimento curricular que considera importantes para o ensino, o conhecimento horizontal – que relaciona os conteúdos de uma dada disciplina com os assuntos que os alunos aprendem noutras disciplinas – e o conhecimento vertical – que inclui 126


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a familiaridade com os assuntos da mesma área disciplinar, ensinados em diferentes níveis escolares, e com os materiais que podem ser usados no seu ensino. Segundo Canavarro (2003), o conhecimento destas duas componentes do conhecimento curricular ajuda o professor a equacionar as melhores opções de abordar os conteúdos, “pondo em prática as orientações metodológicas, para dar consecução às finalidades principais da aprendizagem da Matemática” (p. 49). Para esta autora, o conhecimento do currículo abrange outros conhecimentos para além dos conteúdos e dos materiais. Integra também o conhecimento que articula os conteúdos matemáticos, as recomendações metodológicas, as finalidades e objetivos e as indicações sobre a avaliação das aprendizagens dos alunos. Para esta articulação se tornar eficiente, a autora considera que o professor precisa conhecer o teor dos programas, de os interpretar e de os adaptar à sua pessoa e ao contexto onde exerce a sua profissão docente. Considera também que o professor precisa dar atenção à importância que a Matemática tem na formação do aluno, que se pretende matematicamente alfabetizado para que seja capaz de lidar com as situações da sociedade atual. Outro domínio do conhecimento que o professor precisa desenvolver para ensinar é o conhecimento dos alunos e dos seus processos de aprendizagem. Abrange o conhecimento dos alunos como pessoas, dos seus interesses, dos seus gostos, das suas formas habituais de reagir, dos seus valores, das suas referências culturais (Santos; Ponte, 2002) e das formas como aprendem e desenvolvem as suas ideias matemáticas (Kilpatrick et al., 2001). O professor deve ser sensível aos modos próprios de aprender, de pensar e de fazer Matemática que os alunos desenvolvem ao longo da sua escolarização. Cada aluno constrói as suas próprias abordagens sobre as tarefas matemáticas, o que pode contribuir para um maior envolvimento nas atividades da aula. Desde a planificação até a concretização dos planos de aula, o professor precisa de atender ao que os alunos conhecem, saber como responder às suas questões ou afirmações e como tomar decisões sobre o que fazer com as diferentes ideias que os alunos colocam (Kilpatrick et al., 2001). O professor desempenha, assim, um papel de facilitador da aprendizagem dos alunos e não de transmissor de conceitos, fatos ou técnicas. Ball et al. (2008), ao analisarem a relação entre o conteúdo e os alunos, identificaram um conhecimento do conteúdo e os alunos e um conhecimento do conteúdo e o ensino. O conhecimento do conteúdo e os alunos resulta da combinação do conhecimento sobre os alunos e sobre a Matemática. 127


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Trata-se de um conhecimento que o professor precisa, por um lado, para antecipar possíveis reações dos alunos e, por outro, para ouvir e interpretar o que emerge do pensamento dos alunos. Cada uma destas tarefas exige do professor uma compreensão matemática específica e uma familiaridade com os alunos e o seu pensamento matemático. Como componente central destas tarefas sobressai o conhecimento que o professor deve possuir sobre as conceções mais comuns e as conceções erróneas dos alunos em relação a um dado conteúdo matemático. Já o conhecimento do conteúdo e o ensino é o que combina conhecimento sobre o ensino e sobre a Matemática. Muitas das tarefas matemáticas do ensino requerem conhecimento matemático na fase da sua planificação. Tal conhecimento emerge quando o professor precisa sequenciar os conteúdos a ensinar, escolher os exemplos que levem os alunos a compreender melhor o conteúdo, avaliar as vantagens e as desvantagens de diversas representações para ensinar uma ideia específica e selecionar métodos e procedimentos. O conhecimento do conteúdo e do ensino também emerge quando o professor precisa tomar decisões sobre as contribuições que deve solicitar aos seus alunos. Ao discutir com os alunos as suas atividades, o professor tem que decidir quando lhes deve pedir que clarifiquem melhor as suas ideias, usar os seus comentários para fazer um ponto da situação e colocar novas propostas de trabalho para facilitar a sua aprendizagem. Cada uma destas tarefas requer uma interação entre a compreensão específica da matemática e a compreensão dos assuntos pedagógicos que podem afetar a aprendizagem dos alunos. Entre os diferentes tipos de conhecimento para ensinar, referidos por Ball et al. (2008), no presente trabalho tratamos o conhecimento do conteúdo de Probabilidades. Para tal, analisaremos nas três secções seguintes as respostas de futuros educadores e professores dos primeiros anos de escolaridade as tarefas sobre acontecimentos certos, probabilidade simples e probabilidade condicionada e conjunta. À altura da aplicação das tarefas, estes futuros educadores e professores já tinham estudado o tema de Probabilidades na universidade, no âmbito de uma unidade curricular.

Definição de acontecimentos certos Foi proposta a 63 futuros educadores e professores dos primeiros anos de escolaridade uma tarefa sobre a definição de acontecimentos certos num processo de extração de berlindes (bola de gude) de um saco (Figura 1), con128


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tendo berlindes de três cores, de modo a ter-se a certeza de obter pelo menos um, dois ou três berlindes de cores especificadas. Figura 1 – Enunciado da tarefa proposta aos alunos sobre acontecimentos certos Num saco há 4 berlindes vermelhos, 3 verdes e 2 brancos. a) Quantos berlindes se devem retirar do saco (sem reposição) para termos a certeza de obter pelo menos um berlinde de cor verde? Porquê? b) Quantos berlindes se devem retirar do saco (sem reposição) para termos a certeza de obter pelo menos um berlinde de cor vermelha e outro de cor verde? Porquê? c) Quantos berlindes se devem retirar do saco (sem reposição) para termos a certeza de obter pelo menos um berlinde de cada cor? Porquê?

Fonte: Os autores.

Uma estratégia de resolução da tarefa consiste em considerar os berlindes da cor que estão em maior número, começando por aqueles que não são favoráveis e continuando com os que são favoráveis ao acontecimento (se for o caso). Por exemplo, no caso do item a) temos de extrair sete berlindes para obter de certeza uma bola verde, número que corresponde à soma do número de berlindes de cor vermelha, branca e mais um berlinde. Em alternativa, podemos analisar o número de berlindes que ficam no saco depois da extração. Ainda no caso do item a), ao extrairmos sete berlindes, ficam no saco dois berlindes, os quais podem ser ambos vermelhos, verdes ou brancos, ou de cores diferentes. Em qualquer caso terá saído pelo menos um berlinde verde. Já no caso de termos extraído seis berlindes (ou menos), restarão no saco três berlindes (ou mais), os quais poderão ser todos verdes, não garantindo, assim, a obtenção do berlinde verde. Na Tabela 1 apresenta-se, em cada item, o número de berlindes que os alunos indicaram ser necessário extrair para garantir a realização certa do respetivo acontecimento. Pela tabela podemos verificar que o número correto de berlindes a extrair do saco para a realização certa do acontecimento (7 berlindes nos itens a e b, e 8 berlindes no item c) é indicado por mais alunos no item a) (84%), diminui no item b) (59%) e mais ainda no item c) (38%). Assim, o desempenho dos alunos diminuiu sistematicamente com a garantia de extrair pelo menos um berlinde de uma cor, dois berlindes de duas cores e um berlinde de cada uma das três cores consideradas. 129


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Tabela 1 - Percentagem de alunos segundo o n.º de berlindes extraídos em cada um dos três itens (n=63) Nº de berlindes

Itens a)

b)

c)

2

5

3

6

9

16

4

2

5

3

2

2

6

2

17

27

7

84*

59*

6

8

3

38*

9

8

NR

3

5

3

extraídos

*Resposta correta; NR – Não Resposta. Fonte: Os autores.

Em termos de raciocínio, para garantir a obtenção de pelo menos um berlinde de uma cor, os alunos centraram-se no total de berlindes das outras cores, o que conduzia à seleção da resposta correta. Para garantir a obtenção de pelo menos um berlinde de cada uma de duas cores distintas, os alunos centraram-se no total de berlindes da cor não pretendida e de uma das cores pretendidas, o que conduzia à resposta correta ou errada consoante se escolhia uma ou outra das cores pretendidas. Finalmente, para garantir a obtenção de pelo menos um berlinde de cada uma das três cores, os alunos consideraram o total de berlindes de duas das cores, o que conduzia à resposta correta ou errada consoante as cores consideradas. Quer no caso dos dois berlindes de cores distintas, quer no caso dos três berlindes de cores distintas, a obtenção da resposta correta requer que se considere o número total de berlindes da cor ou cores pretendidas por ordem decrescente, 130


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começando pela cor mais numerosa e continuando com a que se segue ou seguem na ordenação. Ora, é a não consideração sistemática deste requisito que explica o aumento das dificuldades dos alunos quando se passa da garantia de extrair pelo menos uma bola de uma cor para duas bolas de cores distintas e, finalmente, para três bolas de cores distintas. Adicionalmente, alguns alunos justificaram o número de berlindes a extrair com base na obtenção de certos valores de probabilidade das cores envolvidas, incluindo a equiprobabilidade de todas as cores, que eles avaliaram subjetivamente como sendo suficientemente elevados para garantir a obtenção da cor ou cores pretendidas. No caso do item c), desta tarefa, ele foi proposto por Fischbein e Gazit (1984) a alunos do 5.º, 6.º e 7.º ano (com 10-13 anos), com ensino prévio em probabilidades, tendo-se obtido percentagens de respostas corretas muito díspares (14% no 5.º ano, 32% no 6.º ano e 54% no 7.º ano), e aumentando claramente com o ano escolar. Também Ortiz e Mohamend (2014) propuseram este item a futuros professores do ensino primário, tendo obtido uma percentagem de respostas corretas um pouco superior (46%), enquanto Fernandes e Barros (2005), num item muito semelhante, aplicado a futuros educadores e professores dos primeiros anos, obtiveram uma percentagem de respostas corretas muito baixa (24%), talvez por estar em jogo um maior número de berlindes. Dos resultados obtidos, conclui-se que os futuros educadores e professores revelaram muitas dificuldades, sobretudo no caso da certeza da extração de um berlinde de cada cor. Neste último caso, obteve-se uma percentagem de respostas corretas mesmo inferior à obtida pelos alunos do 7.º ano do estudo de Fischbein e Gazit (1984).

Probabilidade simples Na tarefa seguinte (Figura 2), constituída por duas questões, a questão 1 e a questão 2 foram propostas a 72 e 61 alunos, futuros educadores e professores dos primeiros anos de escolaridade, respetivamente. Entre as duas questões, a questão 1 é semelhante a uma outra proposta por Batanero, Gómez-Torres, Contreras e Díaz (2015) a professores dos primeiros anos em formação. 131


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Figura 2 - Enunciado da tarefa proposta aos alunos probabilidade simples Questão 1. Um saco tem 3 bolas brancas (B) e 4 bolas pretas(P). Que bolas devem ser acrescentadas às existentes no saco para que a probabilidade de obter: a) Uma bola preta seja 2/3 ? b) Uma bola branca seja 2/3?

Questão 2. Paulo tem 5 bolas brancas e 7 pretas numa caixa. Miguel tem outra caixa com 3 bolas brancas e 5 pretas. Quantas bolas, pretas ou brancas, devem ser deslocadas de uma caixa para a outra para que ambos os meninos tenham a mesma probabilidade de extrair uma bola preta da sua caixa? Justifique.

Fonte: Os autores.

Tanto a questão 1 como a questão 2 são questões que admitem mais do que uma resposta correta. No caso da questão 1, em ambas os itens, uma estratégia sistemática a considerar consiste em estabelecer as sucessivas frações equivalentes a 2/3 (2/3=4/6=6/9=8/12=10/15=12/18=14/21=16=24...) e determinar o número de bolas de ambas as cores a acrescentar ao saco, até se obter um valor da probabilidade dado por uma destas frações equivalentes. De entre outras possibilidades, no caso do item a), poderíamos acrescentar 2P e 0B (obtendo-se P(P)=6/9) ou acrescentar 4P e 1B (obtendo-se P(P)=8/12), enquanto, no caso do item b), poderíamos acrescentar 5B e 0P (obtendo-se P(B)=8/12) ou acrescentar 7B e 1P (obtendo-se P(B)=10/15). No caso da questão 2 identificam-se três possibilidades distintas: 1) deslocar 1B e 1P da caixa do Paula para a do Miguel, ficando as duas caixas com a composição e, portanto, com a igual probabilidade extrair uma bola preta [P(P)=6/10 (Paulo e Miguel)]; deslocar 3B e 4P da caixa do Paulo para a do Miguel [P(P)=3/5 (Paulo)=9/15 (Miguel)]; e, finalmente, deslocar 1B e 2P da caixa do Miguel para a do Paulo [P(P)=9/15] (Paulo)=3/5 (Miguel)]. Na Tabela 2 apresentam-se os resultados obtidos em cada uma das questões/itens da tarefa, codificando as respostas dadas pelos alunos em corretas, incorretas e não respostas.

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Tabela 2 – Percentagem de respostas corretas, erradas e não respostas nos itens de probabilidade simples Questão 1 (n=72)

Questão 2 (n=61)

Tipo de resposta

a)

b)

Correta

69

68

80

Incorreta

21

25

18

Não resposta

10

7

2

Fonte: Os autores.

Pela Tabela 2, observa-se que as percentagens dos diferentes tipos de resposta são muito próximas em ambos os itens da questão 1. No caso das respostas corretas, cerca de dois em cada três alunos apresentaram essa resposta. As respostas corretas aos itens a) e b) apresentam alguma variabilidade em termos do número de bolas (de ambas as cores) a acrescentar às já existentes no saco. No caso do item a), a maioria dos alunos (69%) apresentou a resposta “acrescentar 0B e 2P”, que resulta em P(P)=6/9, seguindo-se os alunos (29%) que apresentaram a resposta “acrescentar 1B e 4P, que resulta em P(P)= 8/12, e apenas um aluno (2%) apresentou a resposta “acrescentar 4B e 10P”, que resulta em P(P)=14/21. No caso do item b), a maioria dos alunos (84%) apresentou a resposta “acrescentar 5B e 0P”, que resulta na P(B)=8/12, seguindo-se os alunos (8%) que apresentaram a resposta “acrescentar 13B e 4P”, que resulta em P(B)=16/24, os alunos (5%) que apresentaram a resposta “acrescentar 7B e 1P, que resulta em P(B)=10/15), e apenas um aluno (3%) apresentou a resposta “acrescentar 11B e 3P”, que resulta em P(B)=14/21. Em ambas os itens, de entre as inúmeras respostas corretas possíveis, uma larga maioria dos alunos (69% no item a) e 84% no item b) apresentaram como resposta correta a possibilidade que corresponde ao menor número de bolas (de ambas as cores) a acrescentar às já existentes no saco, ou seja, duas bolas (0B e 2P) no item a) e cinco bolas (5B e 0P) no item b). A maior adesão 133


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dos alunos a estas respostas pode dever-se ao fato de, em ambos os casos, se acrescentar bolas de apenas uma das cores pois, nessa situação, será mais fácil obter a composição pretendida do saco do que quando se acrescentam bolas das duas cores. Em relação às respostas incorretas, fundamentalmente, elas não respeitam as proporções entre as razões relativas à probabilidade requerida e indicada, sendo que alguns alunos concentraram-se apenas nos casos favoráveis. Comparativamente com a questão 1, na questão 2 obteve-se uma maior percentagem de respostas corretas, próxima da que foi obtida por Batanero et al. (2015) no seu estudo (76%), tendo quatro em cada cinco alunos apresentado essa resposta. Diferentemente do que se verificou na questão anterior, nesta questão todos os alunos, que responderam corretamente, deslocaram bolas de uma caixa do Paulo para a caixa do Miguel de modo a obterem a mesma composição de bolas em ambas as caixas. Adicionalmente, um aluno (2%) referiu também a possibilidade “deslocar 1B e 2P da caixa do Miguel para a do Paulo” (portanto duas possibilidades ao todo) e outro aluno (2%) referiu a mesma possibilidade e a possibilidade “deslocar 3B e 4P da caixa do Paulo para a do Miguel” (portando três possibilidades ao todo). Mesmo não tendo sido inquiridos os alunos sobre todas as possibilidades de deslocar bolas de uma caixa para a outra, de modo a obter-se igual probabilidade de extrair uma bola preta em ambas as caixas, não deixa de ser surpreendente que quase todos os alunos (96%) tenham indicado apenas uma possibilidade, precisamente aquela que se refere à igual composição das caixas. Ora, este fato, conjuntamente com a prevalência de acrescentar bolas de apenas uma das cores, que se verificou nos dois itens da questão 1 (cerca de dois em cada três no item a) e cerca de quatro em cada cinco no item b), denotam pouca flexibilidade dos alunos para formularem outras respostas igualmente corretas.

Probabilidade conjunta e condicionada No estudo realizado por Fernandes, Batanero, Correia e Gea (2014) foi proposta a seguinte tarefa (Figura 3), envolvendo os conceitos de probabilidade condicionada e probabilidade conjunta, a 46 futuros educadores e professores dos primeiros anos de escolaridade. 134


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Figura 3 - Enunciado da tarefa proposta aos alunos sobre probabilidade condicionada e conjunta Questão 1. Num saco há 3 bolas brancas e 2 bolas pretas, conforme se mostra na figura seguinte. As bolas são todas iguais exceto na cor. Sem ver, tiram-se sucessivamente duas bolas do saco.

Considera que a 1ª bola extraída é colocada de novo no saco antes de se extrair a 2ª bola. a) Sabe-se que a 1ª bola extraída é branca. Qual a probabilidade de a 2ª bola ser branca? b) Qual a probabilidade de obter duas bolas brancas?

Considera que a 1ª bola extraída não é colocada de novo no saco antes de se extrair a 2ª bola. c) Sabe-se que a 1ª bola extraída é branca. Qual a probabilidade de a 2ª bola ser preta? d) Qual a probabilidade de obter uma bola branca e uma bola preta (por qualquer ordem)?

Questão 2. Num grupo de 25 pessoas, 10 são homens e 15 são mulheres. Escolhem-se, ao acaso, duas pessoas do grupo das 25 pessoas. a) Sabendo-se que a primeira pessoa escolhida é mulher, qual a probabilidade de a segunda pessoa ser homem? b) Sabendo-se que a segunda pessoa escolhida é mulher, qual a probabilidade de a primeira pessoa ser homem? c) Qual a probabilidade de obter duas mulheres? d) Qual a probabilidade de obter um homem e uma mulher (por qualquer ordem)?

Fonte: Os autores.

Na Tabela 3 apresentam-se as percentagens de respostas corretas, erradas e não respostas nos itens de probabilidade condicionada e de probabilidade conjunta nos contextos de extração de bolas de um saco (questão 1) e de seleção de pessoas de um grupo (questão 2). 135


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Tabela 3 – Percentagem de respostas corretas, erradas e não respostas nos itens de probabilidade condicionada e conjunta segundo o contexto (n = 46) Probabilidade condicionada

Probabilidade conjunta

Saco

Grupo de

Saco

Grupo de

de bolas

pessoas

de bolas

pessoas

1a)

1c)

2a)

2b)

1b)

1d)

2c)

2d)

Correta

81

76

63

4

37

17

30

20

Incorreta

17

20

30

83

52

72

59

63

2

4

7

13

11

11

11

17

Tipo de resposta

Não resposta

Fonte: Os autores.

Pela Tabela 3, constata-se que, no conjunto de todos os itens, os participantes revelaram um claro melhor desempenho nos itens de probabilidade condicionada (1a), 1c), 2a), 2b)) do que nos itens de probabilidade conjunta (1b), 1d), 2c) e 2d)), com média de respostas corretas de 56% no primeiro caso e de 26% no segundo. Estes resultados vão de encontro aos de Contreras (2011), que obteve 44% de respostas corretas na probabilidade condicionada e 41% na conjunta, e de Estrada e Díaz (2006), que obtiveram 56% e 52%, respetivamente, num grupo de futuros professores que tinham realizado previamente um curso de Estatística. Já Contreras, Estrada, Díaz e Batanero (2010) obtiveram 23% e 22% de respostas corretas, respetivamente, noutro grupo que não tinha realizado o curso. Em todos estes estudos os dados eram fornecidos numa tabela de contingência, o que pode explicar os resultados ligeiramente melhores que foram obtidos nos dois primeiros estudos. No nosso estudo, a maior dificuldade dos alunos na probabilidade conjunta, relativamente à probabilidade condicionada, pode explicar-se por se tratar de um conceito mais elaborado, pois a probabilidade condicionada, tal como foi aqui abordada, a partir da restrição do espaço amostral, pode ser determinada sem requerer a combinação das probabilidades dos acontecimentos e/ou questões de ordem (caso dos itens 1d) e 2d)), ao contrário do que aconteceu na determinação da probabilidade conjunta. Analogamente, 136


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os problemas colocados nos estudos anteriores não requerem também estas operações, podendo resolver-se simplesmente através da leitura dos dados da tabela em questão. Em geral, entre os contextos de formulação dos itens, extração de bolas de um saco e seleção de pessoas de um grupo, excetuando o caso do item 2b), não se verificaram grandes discrepâncias no desempenho dos alunos quer no caso da probabilidade condicionada, quer no caso da probabilidade conjunta. Por outro lado, verifica-se que os alunos revelaram um melhor desempenho nos itens 1a) e 2a) relativamente aos itens 1c) e 2b), respetivamente, o que corrobora a conclusão de Fischbein e Gazit (1984), quando referem que os alunos sentem mais dificuldades na determinação da probabilidade condicionada em situações de não reposição do que em situações com reposição. No caso do item 2b), com apenas duas respostas corretas, pensamos que as grandes dificuldades dos alunos resultam da sua estrutura. Nesta situa­ção, o fato de se ter invertido o eixo temporal na sequencialização dos acontecimentos tornou muito mais difícil a questão para os alunos, pois eles tendem a assumir que um acontecimento que ocorre depois não pode afetar um acontecimento que ocorre antes. Este enviesamento na avaliação de probabilidades, conhecido por “falácia do eixo temporal” (Falk, 1986), tem origem na atribuição de relações de causa-efeito, em que as causas precedem os efeitos, o que deixa de ser válido em probabilidades. Este resultado aponta na direção dos que foram obtidos por Contreras (2011) e Contreras, Batanero, Díaz e Arteaga (2013), em que apenas aproximadamente 25% dos futuros professores apresentou a resposta correta num item de estrutura similar ao proposto no nosso trabalho. No caso da probabilidade conjunta, verifica-se um desempenho dos alunos ligeiramente melhor nos itens 1b) e 2c) do que nos itens 1d) e 2d). Também neste caso, muito provavelmente, as maiores dificuldades dos alunos estão relacionadas com o fato de que no cálculo da probabilidade destes acontecimentos compostos é necessário reconhecer que a ordem das configurações conduz a possibilidades distintas, o que não é relevante nos outros dois itens. Finalmente, ainda na probabilidade conjunta, verifica-se um melhor desempenho dos alunos nos itens 1b) e 2c), relativamente aos itens 1d) e 2d), o que reafirma o melhor desempenho dos alunos em situações de reposição, que foi também verificado no caso da probabilidade condicionada. 137


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Conclusões e implicações Em geral, nas três tarefas propostas aos futuros educadores e professores dos primeiros anos de escolaridade, conclui-se que, excetuando o caso da probabilidade simples, eles revelaram um desempenho bastante limitado: 60% nos itens de definição de acontecimentos certos; 72% nos itens de probabilidade simples; 56% nos itens de probabilidade condicionada; e 26% nos itens de probabilidade conjunta. As menores dificuldades experimentadas pelos futuros educadores e professores nos itens de probabilidade simples e de definição de acontecimentos certos foi também observada por Fernandes (1999) em alunos do 8.º e 11.º ano. Quando comparada com a probabilidade condicionada e conjunta, o melhor desempenho dos alunos na probabilidade simples pode explicar-se por se tratar de uma determinação menos complexa do que a daquelas, uma vez que nas primeiras estão envolvidos mais conceitos. Ainda segundo o mesmo autor, as maiores dificuldades nos acontecimentos certos decorre do fato de que estes acontecimentos têm de se verificar em todos os casos do universo amostral, diferentemente dos acontecimentos possíveis (mas não certos) nos quais não é necessário uma análise exaustiva de todos os casos. Entre a probabilidade condicionada e a probabilidade conjunta, a maior dificuldade nesta última foi também observada em alunos do 9.º ano por Fernandes, Correia e Contreras (2013). Para estes autores, isso poderá dever-se ao fato de a probabilidade conjunta poder ser considerado um conceito mais elaborado do que o conceito de probabilidade condicionada, quando se trabalha no contexto de amostragem com ou sem reposição, tal como foram aqui explorados, enquanto pode ser mais similar quando, como nos estudos citados anteriormente, se calcula diretamente da leitura de uma tabela de dupla entrada. Já entre os dois contextos em que a probabilidade condicionada e a probabilidade conjunta foram exploradas no nosso trabalho, o contexto de extração de bolas de um saco e de seleção de pessoas de um grupo, não se observaram grandes discrepâncias do sucesso dos alunos. Segundo Polaki (2005), as dificuldades dos alunos em estabelecer o espaço amostral de experiências compostas têm origem na exigência de integração de mais do que um aspecto da situação numa estrutura significativa. Por exemplo, no caso da experiência de lançamento de duas moedas, o aluno terá de coordenar simultaneamente a contagem e a ordem dos elementos de dois conjuntos, integrando-os para obter o espaço amostral da experiência composta. 138


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Para além dos aspectos antes referidos, o desempenho dos alunos na probabilidade condicionada deve ser visto com precaução, pois os itens estavam formulados de forma explícita, isto é, estavam formulados em contexto escolar, em que é explícita a aplicação da probabilidade condicionada. Todavia, Fernandes, Martinho e Viseu (2015) verificaram que futuros educadores e professores dos primeiros anos sentiram muitas dificuldades em itens de probabilidade condicionada formulados em contexto social (e.g., “Que uma mulher seja professora”, no universo dos portugueses), em que é implícita a aplicação da probabilidade condicionada. Apesar das dificuldades reveladas pelos alunos nos itens de formulação implícita, este tipo de itens devem ser explorados pelos alunos, e, portanto, também na formação dos professores, uma vez que eles se constituem como uma componente formativa importante ao promoverem a literacia probabilística (WATSON; MORITZ, 2003). No caso da probabilidade condicionada e conjunta, concretamente no âmbito didático, algumas dificuldades reveladas pelos alunos no presente estudo podem ser enfrentadas a partir de estratégias adequadas. Por exemplo, na perspetiva de Watson e Moritz (2002), os alunos devem ser encorajados a interpretar corretamente o significado das operações lógicas envolvidas nos acontecimentos compostos, o que certamente ajudará os alunos no reconhecimento do acontecimento conjunção, distinguindo-o dos acontecimentos disjunção e condicional. O desempenho dos futuros educadores e professores dos primeiros anos, tal como foi observado no presente estudo, recomenda que a sua formação ao nível do conhecimento do conteúdo de Probabilidades seja aprofundado ao longo da sua formação acadêmica, para poderem dar respostas às exigências do ensino desta temática, sem descurar a importância do seu estudo em contextos sociais e não meramente escolares.

Agradecimento Este trabalho contou com o apoio de Fundos Nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia no âmbito do projecto PEst-OE/ CED/UI1661/2014 do CIEd-UM e do Proyecto EDU2013-41141-P (MEC).

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Integrar novas tecnologias na prática docente do IFSC: os desafios relativos ao uso do Moodle Lisani Geni Wachholz Coan1 José Carlos Kahl2 Viviam Giacomelli Pedroso3 Méricles Thadeu Moretti4 Floriano Viseu5

Resumo

O

presente artigo apresenta os resultados de uma pesquisa realizada pelo Grupo de Trabalho (GT Moodle)6, instituído na Assessoria de Matemática do IFSC, a convite da Direção Geral do Campus de Florianópolis. O estudo teve como objetivo realizar um mapeamento sobre a possibilidade de integrar o Moodle como aliado ao ensino presencial, em especial em áreas que apresentam maiores necessidades de acompanhamento aos alunos, devido às suas dificuldades de aprendizagem, como é o caso da disciplina de Matemática. Para o efetivo uso deste ambiente virtual pelos professores na sua prática de ensino, mais especificamente os que atuam nas Ciências Exatas,

1

2

3

4 5 6

PhD em Educação Matemática (PPGECT/UFSC, 2015). Doutora em Educação Matemática (IE/UMINHO-PT, 2012, Professora de Matemática do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC). Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Aplicações Matemáticas (GPAM). Contato: lisanigwc@gmail.com Mestre em Engenharia de Produção (UFSC, 1993), Licenciado em Matemática (UFSC, 1988), Professor de Matemática do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC). Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Aplicações Matemáticas (GPAM). Contato: jkahl@ifsc.edu.br

Professora de Matemática e Estatística do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) - Campus Florianópolis. Licenciada em Matemática. Mestre em Matemática e Computação Científica na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Aplicações Matemáticas (GPAM). Contato: viviam.giacomelli@ifsc.edu.br

Doutor em Educação Matemática pela ULP/Estrasburgo. Professor titular voluntário da UFSC e permanente do PPGECT/UFSC. Contato: mthmoretti@gmail.com Doutor em Educação, Especialização em Didática da Matemática, pela Universidade de Lisboa. Professor Auxiliar do Instituto de Educação da Universidade do Minho. Investigador do Centro de Investigação em Educaçãp (CIEd). Contato: fviseu@ie.uminho.pt. GT “Reestruturação do Moodle para o Ensino”: Portaria Nº 043/2013 – DGCF/IFSC – 09/04/2013 e Portaria Nº 032/2014 – DGCF/IFSC – 28/02/2014 143


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faz-se necessário saber em que aspectos o mesmo precisa adequar-se melhor de modo a otimizar a sua integração e efetiva utilização pelo corpo docente em sua prática docente. A investigação busca respostas para a intenção de melhor suprir e atender os alunos dado que a grande maioria trabalha nos seus empregos e não consegue procurar seu professor em horários extraclasse. Palavras-chave: Uso do Moodle. Formação continuada. Professores do IFSC.

E

m virtude da expansão e da oferta da Educação a Distância (EaD) no cenário educativo, tanto no Brasil como em outros países, passou-se a ter novas perspectivas e desafios para professores e alunos. Este advento implicou um impulso maior para que os professores que não estavam habituados a trabalhar efetivamente com tecnologias passassem a integrá-las e otimizá-las com mais frequência nas suas práticas de ensino. Tal integração possibilitou que os docentes que atuavam no ensino presencial aos poucos trouxessem para as suas situações de ensino o uso do computador ligado à Web, bem como o uso de ambientes virtuais de aprendizagem (Salvador & Gonçalves, 2006). Atualmente, inúmeros trabalhos estão disponíveis na Internet que mostram os significativos resultados que tais mudanças proporcionam para a escola, alunos e professores. Um destes destaques é relativo ao uso das TIC na EaD possibilitando a educação online ou e-learning. Tanto no Brasil como noutros países, esta tendência expandiu-se para o uso da modalidade de b-learning (blended learning) que une o ensino presencial com a educação online. A educação conseguiu abrir espaço para o uso de ambientes de aprendizagem mediados pelas TIC, entre eles a Plataforma Moodle, que é o mais utilizado pelas instituições públicas por ser de fácil e livre acesso. Para coletar os dados, aplicou-se um questionário online, no qual participaram setenta e seis (76) professores, sendo que de Matemática participaram sete (7) dos doze (12) professores efetivos. O questionário “Uso do Ambiente Virtual de Aprendizagem – Moodle no IFSC – Campus Florianópolis” teve como finalidade a obtenção de dados sobre os conhecimentos que os professores do Campus Florianópolis têm do Ambiente Virtual de Aprendizagem – Moodle e o uso que fazem dessa ferramenta instalada no site do próprio Campus.

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Em virtude de vários professores do IFSC terem atuado na modalidade de Educação a Distância, na qual esta Plataforma era a ferramenta eletrônica de comunicação utilizada para gerir o processo de ensino e aprendizagem, averigua-se como esta experiência pode agregar mais-valia ao ensino presencial. Isso porque se tem a possibilidade de ofertar o ensino na modalidade de b-learning, garantido em legislação brasileira. Esta normatização foi emitida por portaria do Ministério da Educação de nº 4.059, de 10 de dezembro de 2004, a qual garante que até 20% da carga horária total de um curso poderá ser ofertada na modalidade semipresencial. Mediante tais considerações faz sentido questionar o que deve ser feito para que o Instituto, como um todo, em especial os professores, consigam tirar maior proveito das tecnologias atuais em benefício da melhoria no processo de ensino. Por outro lado, cabem os devidos questionamentos relativos aos fatores que impedem a efetiva apropriação e integração das TIC no sistema educativo, de modo que se percebam quais são os entraves que ainda se colocam. Nesse sentido, pretende-se analisar como os docentes do IFSC/Florianópolis, que ainda não usam ou não conhecem o potencial de um ambiente virtual de aprendizagem, podem sintonizar-se melhor com tais ferramentas. Fazer uso de ambientes virtuais de aprendizagem, como é o caso da Plataforma Moodle, a qual é efetivamente utilizada na Educação a Distância (EaD) do IFSC, ainda não é suficientemente inserida na prática de todos os professores. A iniciativa de lançar-se este GT demonstra que há interesse da gestão em promover a otimização do Moodle no ensino presencial, uma vez que isso é viável, porém requer maior conhecimento por parte dos professores para poderem explorara as suas potencialidades. O presente artigo apresenta estudos que analisam como se dá a integração do Moodle no ensino na dimensão do ensino colaborativo, o que sugere que ele seja otimizado para além de repositórios de materiais. Trata também da perspectiva de seu uso pelos professores e alunos nas mais diferentes áreas e níveis de ensino. Busca-se perceber o que muda no papel do aluno e do professor ao otimizarem a utilização de ferramentas eletrônicas para comunicação síncrona e assíncrona. Os dados coletados por meio do questionário servirão de base para subsidiar e suprir a demanda da formação continuada dos professores que atuam nas mais diferentes áreas e níveis de ensino, em especial os docentes de Matemática. Para tanto, procura-se saber que relação estabelecem os professores que atuam nos cursos de nível médio e superior com esta tecnologia, sobretudo os que envolvem as áreas mais 145


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próximas das Ciências Exatas dado que são as que necessitam de um maior acompanhamento das atividades dos alunos. Por outro lado, destaca-se que, acima de tudo, há de prevalecer o senso crítico sobre a integração das tecnologias no sistema educativo, uma vez que jamais podemos esquecer qual o verdadeiro papel da escola, do professor e dos alunos.

A utilização de ambientes virtuais de aprendizagem (Moodle): qual é o papel do professor e dos alunos? Sabe-se que está centrada no professor boa parte da responsabilidade pelos resultados a serem alcançados junto aos seus alunos do trabalho efetivado e organizado na sala de aula. Da mesma forma, num ambiente virtual de aprendizagem, tais questões não são muito diferentes, pois, como referem Lopes e Gomes (2007), esse ambiente de aprendizagem caracteriza-se pelo acesso protegido e gestão de perfis de utilizador, pela gestão de acesso a conteúdos, pelas ferramentas de comunicação síncrona e assíncrona e pelos sistemas de controle de atividades. Se o professor de determinada disciplina integrar um ambiente virtual de aprendizagem no processo de ensino e aprendizagem, deverá saber encaminhar objetivamente a finalidade deste uso. Supõe-se que toda a ferramenta tecnológica atende a este pré-requisito, ou seja, o professor tem a clareza da finalidade do seu uso e dos possíveis resultados que pretende alcançar. Nesse sentido é preciso entender qual o papel do professor e de alunos nos diferentes ambientes de aprendizagem, visando-se uma promoção de pedagogia centrada na atividade do aluno (Viseu, 2015). Os ambientes de aprendizagem dinamizados na sala de aula e na Plataforma Moodle podem complementar-se de uma forma dinâmica e envolvente. Isso resulta do tipo de estratégias de ensino que o professor adote. Uma proposta de ensino que considere estes dois ambientes de aprendizagem vislumbra uma prática de ensino bem diferente do caráter diretivo ou transmissivo (Ponte, 2005). Neste caso, perspectiva-se que aconteçam momentos ricos de diálogo, de construção e de reflexão em torno do que se faz e diz na construção do conhecimento matemático. Tal proposta sugere que os professores desenvolvam uma prática que evidencie o ensino-aprendizagem exploratório, que, segundo Ponte (2005), garanta a participação dos alunos na construção do conhecimento. 146


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No caso da Matemática, essa perspectiva atende a comunicação matemática na sala de aula, como se observa, por exemplo, no conjunto de orientações curriculares apontadas pela APM (1998) e pelo NCTM (1991, 1994). As áreas que constituem a centralidade do trabalho de um professor de modo a dar forma ao que se passa nas aulas de Matemática são as atividades, o discurso e o ambiente (NCTM, 1994). As atividades propiciam os contextos intelectuais de modo a promover o desenvolvimento matemático dos alunos quando se envolvem numa diversidade de tarefas. No entanto, é o professor que deve coordenar e dirigir o discurso, incutido nos alunos o respeito pela diversidade de opinião dos outros. Ainda segundo as Normas Profissionais (NCTM, 1994), o papel do professor na dinamização do discurso consiste em colocar questões e tarefas que facilitem, promovam e desafiem o pensamento de todos os alunos, ouvindo-os atentamente, como também consiste em solicitar que escrevam ou argumentem as suas respostas e processos. O professor também deve indicar as ideias que durante a discussão merecem um maior aprofundamento, decidir como e quando deverá introduzir notações e linguagens matemáticas que corroborem as ideias dos alunos, decidir quando deverá fornecer informação, esclarecer questões, fornecer modelos, ser diretivo, ou deixar um aluno persistir na dificuldade e gerir a sua participação na discussão. Outro fator que determina a comunicação e a dinâmica dos ambientes de aprendizagem e a interação entre o professor e os alunos é a natureza das tarefas. Conforme enuncia Ponte (2005), o grau de desafio das tarefas situa-se entre os polos de desafio “reduzido” e “elevado” e o grau de estrutura é definido entre “aberta” e “fechada”. De acordo com as respectivas características das tarefas, as mesmas abrangem determinadas classificações. Os exercícios constituem tarefas fechadas e de desafio reduzido. Os problemas matemáticos enquadram-se como tarefas fechadas, contudo de elevado grau de desafio. As investigações matemáticas representam tarefas abertas e também com elevado grau de desafio. E as tarefas de exploração, segundo o mesmo autor, são tarefas mais simples e abertas. Para além dos fatores que determinam o processo de comunicação entre os diferentes atores no espaço da sala de aula, o momento atual sugere a realização de reflexões que ultrapassam tais espaços físicos pois vive-se uma era ascendente dos processos de aprendizagem colaborativas de comunidades online. Mediante a integração das TIC no processo de ensino, especialmente o uso de ambientes virtuais de aprendizagem, remete para discussão os desa147


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fios da sociedade e da comunicação em rede sob o aspecto da aquisição e desenvolvimento de capacidades sobre a autonomia do aluno referentes ao seu aprender e pensar (Dias, 2004). Este autor declara que o comunicar e o aprender representam outro enfoque ao se tomar como referência as novas abordagens para a realização das aprendizagens online que envolvem os processos colaborativos na construção das aprendizagens e do conhecimento. Portanto, utilizar um ambiente virtual de aprendizagem representa um grande potencial se o mesmo atender os objetivos educacionais mediante estratégias devidamente definidas e bem planejadas. Para Bottentuit Junior (2007), no caso da adoção de ambientes de ensino online, o aluno tem a seu favor a possibilidade de exploração de atividades de aprendizagem de forma individualizada mediante o uso do computador no momento e lugar mais apropriados. O uso de ambientes de aprendizagem virtuais que atendam o princípio construtivista, leva em consideração a observância das seguintes características: [...] envolvimento pessoal no processo de ensino e aprendizagem; aprendizagem pela descoberta; construção do conhecimento com base nas experiências e valores dos alunos; o professor é um orientador no processo de ensino; o aluno controla o ritmo da sua aprendizagem; a criatividade é estimulada; ocorre o ensino significativo (BOTTENTUIT JUNIOR, 2007, p. 36).

Valente e Moreira (2007) referem que não há dúvidas de que as plataformas mais recentes ensaiam uma aproximação significativa com as teorias construtivistas, em especial a Plataforma Moodle, pois ela “apresenta-se como um projeto de apoio ao construtivismo social na educação” (p. 783). Porém, como esta plataforma pode ser organizada de acordo com as perspectivas de seu administrador e dos professores não se garante de que ela sempre atenderá a filosofia construtivista. Valente e Moreira (2007) chamam a atenção que qualquer plataforma poderá ser baseada em “determinados princípios e ser utilizada na valorização de princípios opostos” (p. 784). Os ambientes de aprendizagem que preconizam os princípios do construtivismo enfatizam a efetiva participação dos alunos em “resolução de problemas, que utilize o pensamento crítico sobre as atividades de aprendizagem que mais significam para si e que construa o seu próprio conhecimento, cabendo ao professor o papel de [...] orientador, facilitador, conselheiro, tutor e aprendiz” (idem, 2007, p. 784). 148


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Assim, busca-se nas experiências e em resultados de investigações realizadas ao longo das últimas décadas, a relevância do uso de AVA, especialmente a Plataforma Moodle, no processo de ensino e aprendizagem em diferentes níveis e áreas de ensino.

As vantagens do uso da Plataforma Moodle: apontamentos de alguns estudos Relativo à Plataforma Moodle, Valente e Moreira (2007) consideram que esta plataforma possibilita o acesso a saberes científicos de um modo mais dinâmico e colaborativo do que em salas de aula onde predominam métodos expositivos. Porém, segundo estes autores, esta plataforma poderá ser utilizada com critérios que seguem um “modelo mais tradicional de sebenta eletrônica ou ‘dispensário de informação’ sem qualquer semelhança aos ambientes de aprendizagem construtivistas” (p. 784). Estes autores destacam a importância de realizar estudos que investiguem sobre a melhor forma de utilizar este recurso tecnológico no processo de ensino e aprendizagem. Lopes e Gomes (2007) referem que há um considerável aumento na utilização da Plataforma Moodle nas escolas portuguesas de ensino básico e secundário, principalmente pelas práticas de formação online e pelo uso das TIC como extensão e complementação do ensino presencial. Outro exemplo se verifica nas atas do Encontro Caldas Moodle, ocorrido no ano de 2008, que traz o relato de inúmeras experiências em diferentes áreas e níveis de ensino cuja aposta se situa na integração desta plataforma como ferramenta eficaz para complementar o ensino presencial (Costa, Páscoa, Cruz, Spilker & Vasques, 2008). Tal mudança também está sendo registrada no contexto educativo no Brasil mediante a implementação de programas pelo Governo Federal – tais como a Universidade Aberta do Brasil (UAB) –, que procuram garantir a inclusão social e também transformar a realidade da educação brasileira. Constata-se que a propagação do uso da Plataforma Moodle no contexto educacional brasileiro atribui-se à oferta de cursos de formação inicial e contínua por meio da Educação a Distância (Moraes, Gularte, Rodrigues, Catapan & Mallmann, 2007). De uma maneira geral, destaca-se que há um considerável aumento de adesão ao uso desta plataforma nas diferentes áreas de ensino, bem como para a modalidade de blended learning (Albuquerque & Leite, 2008; Bona, Fagundes & Basso, 2011; Bottentuit Junior, 2007; Franco, 2009; Semedo, 2011). 149


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A ênfase do uso da Plataforma Moodle situa-se na promoção de uma aprendizagem colaborativa (Semedo, 2011), pois desse modo estimula uma maior autonomia dos alunos e também respeita o ritmo individual de aprendizagem. Nesta perspectiva, Bottentuit Junior (2007) utilizou as funcionalidades do Moodle para dinamizar um protótipo de laboratório virtual de Química de modo que as alterações realizadas neste protótipo estimulassem uma aprendizagem mais significativa e colaborativa para os alunos envolvidos do 7.º ano de escolaridade. De acordo com este autor, os professores gostaram de utilizar as TIC no ensino sendo que os mesmos demonstraram possuir “conhecimentos suficientes para criar atividades de aprendizagem que integrem o computador na sala de aula e que se mostram interessados em saber mais sobre o potencial das TIC na educação” (p. 156). O estudo revela também que a “combinação entre aulas presenciais e aulas práticas utilizando como complemento um laboratório virtual na Plataforma Moodle é o modelo ideal para o ensino com recurso às tecnologias” (BOTTENTUIT JUNIOR, 2007, p. 158). Os autores Bona, Fagundes e Basso (2011) relatam os resultados de um estudo numa escola pública estadual de Porto Alegre, que teve por objetivo refletir como se dá a articulação entre o ensino presencial e o ensino não presencial, no caso da modalidade da EaD, na disciplina da Matemática. Segundo estes autores, a pesquisa-ação, sustentada por Portfólios de Matemática, demonstrou que no final de cada trimestre o estudante apresentava tudo que aprendeu na disciplina de Matemática naquele período de tempo por meio da produção individual do seu portfólio para o qual foram utilizadas as tecnologias digitais. Esta experiência revelou que os estudantes cada vez mais fazem uso das tecnologias para produzir os seus conhecimentos na edição de novos portfólios fortalecendo a comunicação entre os envolvidos. Diferentes áreas de ensino em distintos países têm apostado na integração de ambientes virtuais de aprendizagem na educação, evidenciando que o seu uso está para além de um repositório de materiais a partir da adoção de modelos b-learning (Semedo, 2011). Destaca-se o desenvolvimento de experiências também na área da Matemática, com alunos de diferentes níveis e modalidades de ensino. Alguns autores referem que há vantagens do uso de ambientes virtuais de aprendizagem, no caso da Plataforma Moodle, porque instigam os alunos a trabalharem de forma mais integrada e pela possibilidade de complementar o ensino presencial. Este AVA tem sido ampla150


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mente utilizado por professores, pesquisadores e alunos como complemento ao ensino presencial em diversos países. Mediante tais considerações, faz-se uma análise de estudos que utilizaram um AVA, entre os quais o Moodle, como uma ferramenta para promover uma nova dinâmica no processo de ensino e aprendizagem, dando-se preferência aos estudos que incidem na área da Matemática. Dentre os quais, destacam-se os estudos de pesquisadores como Assemany, Villar, Akio, Rangel, Spiller e Dias (2008); Coan (2012); Morais, Pereira e Miranda (2010); Raposo (2009); Semedo (2011); Torres, Giraffa e Claudio (2008). Morais, Pereira e Miranda (2010) investigaram o uso de ambientes online, no caso a Plataforma Moodle, cuja interação desenvolvida entre os alunos do 5.º ano envolvia a resolução de problemas matemáticos por fóruns de discussão. Os problemas matemáticos atendem as orientações do programa oficial de Matemática para esta série de ensino e a investigação, de cunho qualitativo, teve como objetivo analisar o nível de satisfação e o tipo de interação desenvolvida entre os alunos ao fazerem uso da Plataforma Moodle na aprendizagem da Matemática. Participaram no estudo 47 alunos de duas turmas do 5º ano de uma Escola do Ensino Básico do Norte de Portugal. Para perceber o nível de satisfação dos alunos ao participarem das atividades dos fóruns, os investigadores os questionavam sobre o que pensam das aulas de Matemática em ambiente online e se superaram melhor as suas dificuldades nesta disciplina ao usarem o computador. Mediante a proposta da resolução de problemas matemáticos, os alunos promoviam interações na Plataforma Moodle, cuja análise das mesmas segue as categorias interação convergente, monólogo e interação divergente. A interação convergente clarifica o assunto em discussão ou quando aprofunda numa discussão de concordância, contrário da interação de divergência, pois a discussão assume um caráter de discordância ou reforça aspectos que não estão relacionados com o assunto em pauta. A interação na forma de monólogo apresenta as respostas diretas à questão colocada ou então apresenta um entendimento individual sem considerar as opiniões dos demais participantes. Segundo os autores, das 201 interações feitas, 71,5% atendem a categoria de monólogo e consideram que apesar deste tipo de interação indiciar a utilização de um pensamento reflexivo por parte dos alunos revela que os mesmos aceitam o ensino centrado no professor. Para Morais, Pereira e Miranda (2010), a interação na forma de monólogo é importante, porém: 151


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[...] numa época em que as redes sociais invadem o dia a dia dos alunos, nas quais se discutem os mais variados assuntos com posições quer divergentes, quer convergentes, será importante fomentar e enfatizar a interacção convergente e a interação divergente como estratégias de ensino e aprendizagem conducentes à construção conjunta do conhecimento (p. 9).

O estudo revela que o nível de satisfação dos alunos na utilização de ambientes online na aprendizagem da Matemática é bastante elevado porque segundo depoimentos dos alunos, tais ambientes são divertidos e interessantes para a aprendizagem; motivadores e adequados para promover a discussão e tirar dúvidas com os seus colegas e professores. No trabalho de Assemany, Villar, Akio, Rangel, Spiller e Dias (2008), apresentam-se os relatos de uma investigação sobre distintas formas de uso do Moodle como ferramenta de apoio no setor curricular de Matemática da Educação Básica e na Formação de professores do Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Esta pesquisa envolveu mais de 500 alunos do Ensino Básico. Participaram da experiência alunos do oitavo ano do Ensino Fundamental e alunos do segundo ano do Ensino Médio. Tais alunos foram cadastrados na Plataforma Moodle que vem sendo utilizada por este Colégio desde 2005. Para os alunos do oitavo ano foi criado um curso online, denominado Monitoria, que era supervisionado pelo professor da turma e por alunos voluntários de séries mais avançadas. Neste curso os alunos recebiam tarefas diversas que estavam relacionadas com a aprendizagem da Matemática. Através do Fórum de Dúvidas os alunos cadastrados podiam postar os seus questionamentos e obter informações de professores responsáveis da turma, de monitores ou de seus colegas. Tais questionamentos, argumentações e demais construções que resultavam deste espaço serviram de acervo para serem utilizados pelos professores, monitores e futuros professores de Matemática para o desenvolvimento de estratégias e novas atividades pedagógicas. Para os alunos do segundo ano do Ensino Médio as atividades propostas destacam-se pela resolução de listas de exercícios em páginas de edição colaborativas (wiki) e testes on–line (TOL), durante o ano letivo de 2007. Uma das atividades realizadas pelo wiki foi a partir da prova feita em sala de aula que possibilitou aos alunos apresentarem as soluções desta avaliação no AVA até dois dias depois da realização da mesma em sala de aula a fim de conquistarem uma pontuação extra. A cada aluno foi permitido apresentar a solução de apenas uma das questões e cada colega tinha 152


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a possibilidade de melhorar e complementar as soluções apresentadas por seus colegas sem alterar o que eles haviam postado. A outra atividade que utilizou os testes, chamada de TOL–2007, envolveu 90 alunos de três turmas do 2º ano do Ensino Médio. Esta atividade envolveu uma prova objetiva de cinco questões com cinco opções cada e de caráter obrigatório. A adoção desta plataforma objetivou fazer maior aproximação entre os recursos computacionais e as práticas de ensino da Matemática, além de experimentar novas formas de promover a aprendizagem ao recorrer a tais recursos. Coan (2012) investigou o uso do Moodle para o ensino de Matemática com alunos da Educação de Jovens e Adultos (PROEJA) do IFSC. O estudo evidenciou que a utilização desta ferramenta possibilitou um ganho motivacional e cognitivo significativo dos alunos porque tiveram um acompanhamento para além da sala de aula presencial. Lembra-se que inicialmente os alunos manifestaram resistência em relação à proposta de trabalho, uma vez que a maioria nem sequer sabia usar um computador. Além disso, a maioria dos alunos desta modalidade evidenciam um distanciamento da disciplina de Matemática pois a consideram difícil. A pesquisa teve como objetivo fazer do Moodle não um mero repositório de materiais, contudo estabelecer um elo dinâmico entre a sala presencial e a virtual. O trabalho de Torres, Giraffa e Claudio (2008) indica que a utilização da Plataforma Moodle auxilia na aprendizagem dos alunos numa disciplina de Cálculo “A” em cursos de Ciência da Computação e Sistemas de Informação, por meio de uma Monitoria Virtual. Este dispositivo comprovou-se eficiente porque além de proporcionar melhores resultados dos alunos nesta disciplina contribuiu para mudar o modo de estudar, produzindo “uma mudança cognitiva e também comportamental, uma vez que os alunos deixaram de ser espectadores no processo de ensino e passaram a ser agente no seu processo individual de aprendizagem” (p. 8). A Monitoria Virtual contemplou o uso de sala de bate-papo (Chat) para que pudessem ocorrer trocas de informações e esclarecimentos de dúvidas entre os alunos e também com o seu professor. Dentro da Monitoria Online também foi usado o recurso do Fórum, uma biblioteca virtual que dispunha de links a complementar os assuntos estudados em sala de aula, além de atividades e tarefas que atendessem o objetivo desta Monitoria. O conjunto de atividades propostas no Moodle baseava-se em exercícios de modo a complementar tudo que estava relacionado ao Cálculo “A” que o professor trabalhava em sala de aula. Tais exercícios eram relativos aos conteúdos que os alunos mais apresentavam 153


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dificuldades e eram considerados pelo professor como pré-requisitos ao estudo desta disciplina, sendo que um dos tópicos mais críticos aos alunos representava o conteúdo das Funções. Os resultados foram surpreendentes e o índice de reprovação diminuiu significativamente nas turmas que participaram da pesquisa. Além disso, os alunos mostraram-se satisfeitos com o uso da Monitoria Virtual que os auxiliou nas suas dúvidas e o índice de aprovação foi considerado muito positivo, uma vez que alcançou 86%, resultado que até então se concentrava em 60%. Portanto, conforme destacam os autores, {...} O trabalho desenvolvido tendo como suporte o MOODLE comprovou-se eficiente não só por ter propiciado a melhoria no desempenho dos alunos na disciplina de Cálculo “A”, mas também porque, conforme depoimentos deles contribuiu para alterar seu modo de estudar. Produziu-se uma mudança cognitiva e também comportamental, uma vez que os alunos deixaram de ser espectadores no processo de ensino e passaram a ser agente no seu processo individual de aprendizagem (TORRES, GIRAFFA & CLAUDIO, 2008, p. 8).

Tais afirmações corroboram a ideia de que vale a pena o professor propiciar novas formas para os alunos serem inseridos no processo de ensino, pois desse modo melhoram a condição de sua autoaprendizagem. O estudo de Raposo (2009) aborda o uso da Plataforma Moodle conjugado com o uso do GeoGebra, ambos desenvolvidos em regime open source. Segundo este autor, a “combinação destas duas ferramentas poderá ajudar na partilha e comunicação entre aluno-aluno, professor-aluno e aluno-professor” (p. 5). Os participantes do estudo foram alunos entre 12 e 14 anos do oitavo ano do Ensino Básico. Raposo (2009) investigou as vantagens que o uso de um ambiente de geometria dinâmica em conjunto com o uso de um ambiente virtual, a Plataforma Moodle, pode proporcionar aos alunos. Também analisou de que forma esta dinâmica pode beneficiar e consolidar os conhecimentos que os alunos adquirem em sala de aula sobre a aprendizagem de Geometria numa dimensão de trabalho colaborativo. O estudo de caso teve caráter qualitativo, ao descrever e analisar os dados relativos à interação dos alunos no ambiente presencial e virtual e, quantitativo sob a análise dos dados registrados na Plataforma Moodle. O estudo levou em consideração a exploração de tarefas e o respectivo feedback entre o traba154


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lho presencial e a distância por alunos do oitavo ano. Efetivamente, participaram 25 alunos no estudo, no ano letivo de 2008/2009 numa escola situada em Palmela, distrito de Setúbal, Portugal. Tais alunos vivenciaram pela primeira vez o uso de ambientes de aprendizagem online na disciplina da Matemática. O investigador também foi o professor a conduzir os trabalhos junto a estes alunos que resultaram nos dados deste estudo. Em razão de que nem todos os alunos da turma ainda tinham computador com Internet em suas casas, adotou-se o uso de fóruns para fazer as devidas interações sobre as tarefas que envolviam o GeoGebra. O estudo analisou três tarefas postadas no ambiente virtual, por meio das quais o professor/investigador instigava a participação dos alunos na discussão e resolução das mesmas. Segundo Raposo (2009), “ao longo do estudo verificou-se um empenho crescente dos alunos na resolução das tarefas, chegando ao ponto de questionar, fora do período do estudo, o porquê da diminuição do recurso à plataforma” (p. 89). Esta dinâmica do uso do ambiente virtual proporcionou que os alunos apresentassem as suas conclusões no AVA e vice-versa. A partir das postagens que os alunos fizeram no Moodle, puderam reviver a matéria dada em sala de aula, possibilitando que fizessem as devidas reflexões sobre o que os seus colegas apresentavam. A cobrança de novas posturas para com os professores certamente remete para a questão da necessidade de como os cursos de formação inicial e continuada deverão lidar com esta situação. Vários estudos se voltam para as questões que dizem respeito a novas formas do professor saber integrar as tecnologias de modo a não reproduzir metodologias tradicionais, especialmente no âmbito da aprendizagem da Matemática (Barcelos, Batista & Rapkiewicz, 2004; Barcelos, Oliveira Filho, Rapkiewicz & Batista, 2004; Semedo, 2011). Outros trabalhos indicam as vantagens que são propiciadas para a aprendizagem por meio da criação de comunidades educativas virtuais no campo do ensino da Matemática, com destaque na formação inicial de professores (Ponte, Oliveira & Varandas, 2002, 2003). Para estes autores, os programas de formação têm responsabilidade para com os seus futuros professores em lhes ensinar a usar as tecnologias não apenas de forma instrumental. Porém, estes cursos devem desenvolver nos futuros professores a confiança no uso destas ferramentas e também atitudes críticas frente a estas tecnologias para que saibam qual é a melhor maneira de as integrar nas finalidades e objetivos do ensino da disciplina de Matemática. 155


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Entende-se que não se trata de uma tarefa trivial querer que os docentes explorem ao máximo as potencialidades das novas tecnologias de uma hora para outra ao se considerar que há muitos obstáculos e limitações que merecem consideração. Por outro lado, os dados preliminares de um estudo exploratório sobre o uso das TIC pelos professores, feito em cinco países do sul da Europa — Espanha, Grécia, Holanda, Itália e Portugal —, por Peralta e Costa (2007), indiciam que as mesmas ainda não estão sendo utilizadas efetivamente como recurso integrado nas atividades de ensino. O estudo de Calil (2011) sinaliza que ainda é pouco o uso das TIC pelos professores de Matemática com seus alunos como ainda é pouco o uso restrito dos computadores na preparação de material a integrar nas estratégias de ensino. Os professores alegam que precisam de bem mais tempo para realizar o mesmo. Para Calil (2011), os professores de Matemática advindos de curso de Licenciatura em Matemática a distância não promoveram a integração de ambientes virtuais de aprendizagem, no caso do Moodle, utilizado por eles em sua formação inicial. Destaca-se que o uso da mesma não foi integrado nas atividades pedagógicas dos professores mesmo que eles a tenham utilizado em diferentes atividades desenvolvidas durante a sua formação. A partir das considerações apresentadas, menciona-se que, uma das principais questões que devem ser observadas em relação à formação de professores perpassa o saber utilizar as tecnologias de maneira refletida e adaptada à sua disciplina bem como ao nível escolar que está atuando (Ponte, Varandas & Oliveira, 2001). Ponte e Serrazina (1998) referem que são requisitos dos docentes “o conhecimento de implicações sociais e éticas das TIC; a capacidade de uso de software utilitário; a capacidade de uso e avaliação de software educativo e; a capacidade de uso de TIC em situações de ensino-aprendizagem” (p. 12). Nem sempre é possível aos professores encontrarem os devidos meios de conciliar sua vida profissional com o grau de exigências advindas da integração de tais recursos. Especialmente porque um dos fatores que impacta é relativo ao maior tempo que o uso da integração das TIC requer para a preparação das aulas, que faz alguns professores afirmarem que “sendo assim, na maioria das vezes o uso da TIC não compensa” (Barcelos, Behar & Passerino, 2010, p. 1032). Porém, segundo estas autoras, a sua utilização aumenta a motivação dos alunos o que justifica que seja garantido o seu efetivo uso no processo de ensino. 156


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Para que este processo se efetive, faz-se necessário que os docentes conheçam efetivamente qual é o potencial das mais diferentes tecnologias desenvolvidas com e para este propósito. Dentre os destaques de recursos source que a WEB disponibiliza, referencia-se a Plataforma Moodle, devido ao diversificado leque de recursos que este ambiente virtual dispõe. No entanto, assim como toda nova tecnologia que surge, a capacitação e formação continuada é quase que um pré requisito em função da constante atualização realizada nestes ambientes.

Perspectiva dos professores do IFSC/Florianópolis relativos ao uso do Moodle As informações provenientes do questionário online aplicado junto aos professores do Campus de Florianópolis fornecerão os dados para implementação de dois projetos que visam melhorias da interface do Ambiente Virtual de Aprendizagem – Moodle, e do seu uso como ferramenta do processo de ensino e aprendizagem. As questões do questionário levaram em consideração a demanda da formação e atuação do professor sobre o uso desta ferramenta e também em relação aos aspectos que o Moodle ainda não disponibiliza ou que não atende as necessidades dos professores. Tal preocupação evidencia-se por conta de várias áreas de ensino fazerem uso dos recursos gráficos, das simbologias e/ou equações matemáticas e que ainda não estão disponíveis na versão do Moodle utilizada no IFSC. A identificação dos professores que responderam ao questionário serão identificados como Pn, sendo n ϵ N = {1, 2, 3, ..., 76}. Teve-se a participação de professores dos Departamentos Acadêmicos7 do Campus de Florianópolis. Observa-se que o DALTEC é o departamento que congrega professores das disciplinas da Formação Propedêutica ou conhecida como a Formação Geral dos alunos, como é o caso da Matemática, da Física, da Biologia, da Língua Portuguesa, de Ciências Humanas, entre outras. Dentre os vinte e quatro participantes deste departamento, conforme indica o gráfico a seguir, sete são professores de Matemática. Os professores do DASS, em sua maioria, são professores com formação na área de Tecnologias de Informação, que por sua vez têm relação próxima com as TIC. 7

Departamento Acadêmico de Metal-Mecânica (DAMM); Departamento Acadêmico de Construção Civil (DACC); Departamento Acadêmico de Eletrotécnica (DAE); Departamento Acadêmico de Eletrônica (DAELN); Departamento Acadêmico de Linguagem, Tecnologia, Educação e Ciência (DALTEC) e Departamento Acadêmico de Saúde e Serviços (DASS). 157


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Figura 1 - Participação dos professores IFSC/Florianópolis por departamento

Fonte: Os autores.

Busca-se saber como os professores das distintas áreas de conhecimento otimizam esta ferramenta no processo de ensino, caso ele já seja adepto ao recurso. A Figura 2 é relativa ao hábito de uso, ou seja: “você costuma usar o Moodle?”. Figura 2 - Número de professores que usam o Moodle por departamento

Fonte: Os autores. Destaca-se que de 24 professores do DALTEC, apenas 11 aderem ao Moodle, enquanto que dos 17 professores do DASS, 14 fazem uso sistemático. Do total de 76 participantes, 40 (52%) utilizam esta tecnologia na sua disciplina, sendo que entre os professores de Matemática apenas dois não usam por que não a conhecem, conforme sugere a figura a seguir: 158


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Figura 3 - Adesão ao Moodle pelos professores em geral x professores de Matemática

Fonte: Os autores.

Mediante os números colocados anteriormente, fica expresso que uma parcela significativa de professores não integrou esta ferramenta na sua prática pedagógica por não conhecê-la. Tal aspecto reforça a intenção em fazer um curso de capacitação para compreenderem como podem tirar partido da mesma, ou seja, de 76 docentes, 65 estão motivados e querem fazer um curso para conhecerem como otimizar esta tecnologia, conforme indica a Figura 4. Figura 4 - Professores com intenção de capacitação sobre o uso do Moodle

Fonte: Os autores.

Lembra-se que todos os professores participantes do departamento do DALTEC, dos quais inclui-se os da Matemática, manifestaram interesse de se capacitar e aprimorar seus conhecimentos para melhor otimizar o poten159


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cial deste ambiente de aprendizagem. A necessidade da formação continuada dos professores justifica-se uma vez que uma significativa parcela dos questionados nem o conhecem e os que já fazem uso do Moodle, restringe-se a repositório de materiais. Tanto é que o envio de arquivos, considerada a atividade mais útil, seguido do uso do fórum, são as atividades de uso mais citadas pelos professores. Há outros que o indicam para fazer avaliação com os alunos, realização de questionários e chat ou mesmo entrega de atividades. Está nítido que o Moodle utilizado no Campus de Florianópolis não atende as expectativas dos professores. Manifestações como de (P16) reforçam que este recurso precisa ser “um ambiente mais amigável; falta de ferramentas para trabalhar com o ensino, principalmente com equações matemáticas e um suporte técnico mais atuante”. Relativo à questão da falta de ferramentas adequadas que atendam as diferentes demandas em várias disciplinas oferecidas no IFSC, é eminente que é um dos quesitos de menor eficácia dentro do ambiente virtual, na versão instalada no IFSC. Isso porque tem-se a necessidade de fazer uso constante de recursos gráficos, de simbologias ou mesmo equações matemáticas, que por sua vez não estão habilitados ao uso. Provavelmente esta é uma das razões de muitos professores aderirem ao envio de arquivos em detrimento de outras formas de comunicação com seus alunos, dado a dificuldade de otimizar esta linguagem, conforme sugere a figura que segue. Figura 5 - Dificuldade relativa à digitação da linguagem matemática no Moodle

Fonte: Os autores.

Os professores que se deparam com tais obstáculos, recorrem ao “material escaneado e por meio de envio de arquivos editados em outras ferramen160


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tas” citado por P56 e tantos outros. Alguns professores usam o editor de texto Mathchat, mas a maioria não recorre ao Moodle pela falta de agilidade no uso de linguagens matemáticas que ele disponibiliza. Uma das intenções deste estudo recai sobre o atendimento ao aluno para além da sala de aula presencial. Em especial nas disciplinas que detêm o maior número de alunos que não conseguem aprovação no final do semestre letivo, como acontece na maioria dos cursos técnicos com a disciplina de Matemática e, nos superiores com as disciplinas relativas aos Cálculos e Geometria. Um estudo sobre reprovações realizado no IFSC em 2014 constatou que nos cursos superiores, 80% delas são relativas à área da Matemática.8. Porém, 67% dos alunos que cursam a graduação declaram que o fator tempo é um dos fatores responsável pelas reprovações. Já metade dos alunos reprovados em Matemática do Ensino Médio, afirma que a falta de interesse lhes leva à reprovação e 11% manifestam que é pela dificuldade de aprendizagem que eles reprovam neste nível de ensino. Levando-se em consideração que todo semestre abrem-se várias turmas especiais para atender o significativo número de alunos reprovados em Matemática, julga-se que a integração de recursos tecnológicos poderá atender e auxiliar estes alunos. Observa-se que no Ensino Médio 30% dos reprovados recorrem a Internet para suprir suas dificuldades enquanto que, apenas 14% participam de aulas de reforço presenciais oferecidas em horários no contra turno no IFSC. Ou seja, há de se pensar alternativas que estejam em sintonia com os alunos de modo que outras estratégias de ensino estejam ao alcance dele. Uma delas poderá ser o uso de um ambiente virtual que estabeleça este elo com o aluno para que o professor consiga oferecer outros meios de suprir suas dificuldades. Nesse sentido averiguou-se a possibilidade dos professores questionados usarem o Moodle como ferramenta para auxiliar os alunos de forma não presencial, como é o caso de aulas de reforço. Dos 40 professores que já usam o Moodle, 17 usariam na atual edição, porém 22 só se dispõem se houver melhorias nas ferramentas de interface que é um dos complicadores já sinalizado anteriormente. Oito professores não usariam em hipótese alguma. Os professores que manifestam interesse em acompanhar o aluno para além da sala de aula presencial reforçam as vantagens neste processo por possibilitar “a flexibilidade de negociação de horário para o encontro [...] 8

Dados obtidos no Grupo de Trabalho GT para “Estudos sobre Pendências em Matemática no Campus Florianópolis” Portaria 031/2014 - DGCF/IFSC. 161


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os fins de semana são preciosos para estudo” (P28). Este professor reconhece que há obstáculos que se colocam uma vez que alguns estudantes ainda não têm acesso a Internet em suas casas. Contudo, “o fato dos alunos poderem acompanhar as atividades de suas casas e postarem as atividades nos prazos estipulados” (P44) é uma das vantagens que professor e aluno dispõem, também corroborado pelos demais colegas. “No fórum, por exemplo, todos respondem as dúvidas [...] desta forma incentivamos a colaboração e potencializamos o processo de ensinoaprendizagem. Sem contar com a disponibilização de materiais, links, exercícios, vídeos, etc” (P70). Destaca-se que os professores consideram que o uso do Moodle é de extrema importância e reconhecem que suas vantagens se sobrepõem ao não uso. Apenas um professor questionado menciona que adotar esta tecnologia na prática docente exige bem mais tempo do professor.

Considerações finais Os apontamentos advindos de estudos relativos à integração de tecnologias no sistema educativo, em especial o uso do Moodle, destacam que a otimização deste ambiente virtual de aprendizagem promove maior ampliação da comunicação entre alunos-alunos e alunos-professores, além de garantir diferentes estratégias de ensino. As experiências realizadas com a utilização desta ferramenta corroboram que houve maior envolvimento dos professores no processo de formação dos alunos em função dos diferentes recursos que a sua interface disponibiliza. Dentre eles destaca-se a possibilidade de agregar novas formas de avaliação dos alunos e também no aspecto da continuidade ao processo de ensino e aprendizagem para além da sala de aula presencial. Além disso, observa-se que todos ganham ao explorar as potencialidades desta tecnologia. Sem dúvida que toda inovação que se pretende colocar em prática requer a devida predisposição dos propositores de modo que os novos desafios sejam encarados. Aqui em particular, o articulador principal é o professor, o qual precisa compreender a dinâmica que se apresenta ao transitar em distintos ambientes de aprendizagem, quer seja o presencial ou o virtual. Isso por que o professor precisa pensar como e quais são as boas tarefas que ele seleciona, propõe e as conduz na sua realização. No caso dos professores de Matemática, as diferentes atividades a serem desenvolvidas pelos alunos devem privilegiar as que unem o pensamento matemático aos conceitos ma162


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temáticos ou mesmo aquelas que lhes despertam curiosidades, convidando-os a especularem e prosseguirem as suas intuições. Percebe-se que as formas de comunicação resultam das atividades encaminhadas, sugeridas e realizadas pelo professor e também pela diversidade de tarefas que os alunos desenvolvem e como nelas se envolvem. Os ambientes de aprendizagem são modelados tanto pelo tipo de atividades, bem como pelo discurso em que os alunos se envolvem. Reforça-se que o professor inova se ele busca o devido conhecimento relativo às diferentes estratégias de ensino aliadas aos mais variados recursos tecnológicos disponíveis. A respeito da otimização da plataforma Moodle na prática pedagógica docente, torna-se fundamental que o professor tenha oportunidade de buscar a formação continuada, uma vez que este software está em constante reformulação e inovação, pois a cada nova edição que é feita, novas habilidades são requisitadas aos que a utilizam. Por isso em vários momentos os professores participantes no estudo revelam que necessitam de suporte técnico adequado que garanta a devida operacionalização, bem como a devida oportunidade na realização de cursos de formação e capacitação. Tanto é que, em relação ao Moodle, no Brasil há um movimento de capacitação anual, sendo realizadas anualmente conferências nacionais, denominadas por MoodleMoot, porém com vagas limitadas. Além do Brasil, que este ano organiza a 15ª versão deste evento, países como a Austrália, a Colômbia, o México, o Peru, EUA e a Irlanda, fazem acontecer as discussões relativas ao seu efetivo uso nos mais diferentes contextos, em especial no sistema educativo. Em 2014, o evento foi realizado em Florianópolis, do qual participaram vários profesores do IFSC Campus de Florianópolis, dentro os quais alguns professores de Matemática.

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Aplicação dos conceitos de integrais definidas no cálculo do volume do tronco do Cone por meio dos Registros de Representações Semióticas Marleide Coan Cardoso 1 Vanessa da Silva Pires2

Resumo

O

presente artigo é resultado de um estudo relacionado aos registros de representação semiótica aplicados ao estudo do cálculo do volume de um sólido de revolução. O objeto matemático escolhido para a realização do estudo foi o tronco de cone ou cone truncado. Inicialmente foi realizado um breve estudo sobre os aspectos históricos do desenvolvimento do cálculo diferencial e integral, sobre os registros de representação semiótica e o tronco de cone. Por meio dos diferentes registros de representação semiótica foi possível ilustrar a complexidade de abordagem do volume do tronco de cone nos diferentes níveis de ensino da Matemática utilizando dos conceitos do cálculo diferencial e integral. Conclui-se que a utilização dos registros de representações semiótica pode ser uma metodologia alternativa ao processo ensino-aprendizagem do Cálculo Diferencial e Integral tornando-o significativo. Palavras-chave: Representação semiótica. Cálculo. Volume de um sólido de revolução. Entre os inúmeros aspectos que diferem os objetos matemáticos que são abordados no Ensino Superior dos abordados na Educação Básica, está a sua complexidade. Embora, em muitos casos, estes objetos coincidam com os conceitos que lhes são conferidos na Educação Básica. Observa-se que a forma de representar e de tratar é diferente quando abordados no Ensino Superior, especialmente no campo de conhecimento do Cálculo Diferencial. Desse modo não se pode negar a importância dos fundamentos do Cálculo Diferencial na Educação Básica. 1 2

Doutora em Ciências da Linguagem. Professora de Matemática do IFSC - Campus Criciúma. Contato: marleide.cardoso@ifsc.edu.br Licenciada em Matemática do Instituto Federal Catarinense – Campus Avançado Sombrio. 167


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A constituição curricular dos conceitos abordados no Cálculo Diferencial e Integral necessita do domínio de conceitos importantes que fundamentam o processo de aprendizagem. No entanto, grande parte dos estudantes que apresenta dificuldades no processo de compreensão dos conceitos tratados na Matemática superior, também apresenta dificuldades nos conceitos da matemática da Educação Básica. Por vezes, se estes estudantes não têm construídos os conceitos denominados fundamentais também apresentam dificuldade de relacioná-los com os conceitos abordados em Cálculo Diferencial e Integral. Nesse sentido que a abordagem dos objetos matemáticos por meio dos registros de representação semiótica pode ser uma possibilidade para se ilustrar estas diferenças de complexidade (DUVAL, 2009). Reconhecendo as características pertinentes aos objetos matemáticos apresenta-se neste artigo, a ferramenta de análise sobre os diferentes registros de representações semióticas. Esta teoria, desenvolvida por Raymond Duval, será utilizada como uma possibilidade de abordagem do volume de um sólido de revolução em seus diferentes registros de representação. A Matemática, enquanto área do conhecimento, pode ser organizada em objetos que constituem o currículo da Educação Básica e objetos que constituem o currículo do Ensino Superior. Embora essa área de conhecimento apresente esta característica de organização, a Matemática do Ensino Superior tem sua estrutura curricular fundamentada na Educação Básica. O objeto matemático a ser analisado neste estudo será um tronco de cone representado por um copo de 180 ml. O cálculo do volume deste será apresentado por meio de integrais simples, duplas e triplas nos registros de representações gráfica e algébrica deste sólido. A partir do desenvolvimento dessa pesquisa se pretende ilustrar possibilidades das várias abordagens metodológicas de um mesmo objeto matemático quando da sua abordagem no processo de ensino, realizando as conversões e tratamentos necessários. A abordagem deste estudo considera também o processo de formação de professores nos cursos de licenciatura em Matemática, onde se tem a oportunidade de vivenciar abordagens diferenciadas dos conceitos em seus diferentes aspectos. No entanto, a forma de abordagem desses conceitos no Ensino Superior é diferente, sendo que a complexidade dos conteúdos acompanha o avanço da estrutura curricular prevista em sua organização. Em relação às disciplinas de Cálculo Diferencial e Integral, por exemplo, os estudantes geralmente apresentam dificuldades em relacionar os objetos de estudo em seus diferentes sistemas de representações, tais como os gráficos, a representação algébrica, entre outras. 168


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Este artigo é resultado de uma pesquisa investigativa e qualitativa, que propõe apresentar os registros de representações semióticas como possibilidade de abordagem de um objeto da geometria euclidiana: o volume de um corpo de revolução. Por meio dos diferentes sistemas de representação é possível ilustrar sua complexidade nos diferentes níveis de ensino da Matemática. O objeto matemático escolhido foi o tronco de cone, por se tratar de um sólido constituinte do currículo da Educação Básica e do Ensino Superior. Este objeto será apresentado em seus diferentes registros de representação semiótica considerando-se a seguinte problemática: como utilizar os registros de representação semiótica na abordagem do cálculo do volume de um sólido de revolução no Cálculo Diferencial e Integral (CDI)? A fim de responder a problemática proposta, de maneira geral necessita-se conhecer algumas possibilidades de utilização dos registros de representação semióticas como recurso metodológico na abordagem dos objetos do Cálculo Diferencial Integral relacionado ao cálculo do volume do tronco de cone. A concretização desta proposta necessitou inicialmente da definição de seus objetivos específicos, tais como um estudo bibliográfico sobre os registros de representação semiótica e de aspectos históricos do CDI. Desse modo busca-se entender a evolução do CDI e, se identifica os diferentes registros de representações semióticas apresentadas no cálculo da integral do volume do tronco de cone. Também se utilizam os diferentes registros de representação no tratamento de variáveis e se aplicam os mesmos no cálculo do volume do tronco de cone. Mediante tais considerações, o presente estudo está organizado em seções, como a introdução na qual se situa a justificativa, a problemática e os objetivos. Na fundamentação teórica se apresentam autores que discutem os registros de representação semiótica o Cálculo Diferencial e Integral. No transcorrer do texto se evidencia a opção metodológica para responder ao problema proposto. No contexto da proposta de atividade se apresenta o volume do tronco de cone abordado por meio das representações semióticas das integrais definidas, e finalmente nas considerações finais apresentam-se as discussões resultantes da pesquisa realizada analisadas à luz de seus objetivos e da fundamentação teórica. A seguir apresenta-se um breve resgate histórico do CDI relacionado com o desenvolvimento do conceito de integral e dos registros de representação semiótica como possibilidade de abordagem do volume do tronco de um cone. 169


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Breve histórico do Cálculo Diferencial e Integral O desenvolvimento do Cálculo ocorreu principalmente no século XVII, segundo a história, porém, os seus primeiros registros, de acordo com Boyer (1992) e Eves (2004), são de origem grega nos trabalhos de Eudoxo e Arquimedes, em Papirus Egípcios e Tábuas cuneiformes babilônicas. A partir de alguns estudos feitos por egípcios, babilônios e gregos, o surgimento do Cálculo se deu para resolver problemas relacionados a áreas e volumes de algumas figuras planas como retângulos e trapézios por meio do Método de Exaustão, sendo este atribuído a Eudoxo (370 a. C), onde afirma que uma grandeza pode ser subdividida indefinidamente. Tal consideração leva em conta a proposição de que “Se de uma grandeza qualquer subtrai-se também uma parte não menor que sua metade, do restante subtrai-se também uma parte não menor que sua metade, e assim por diante, se chegará por fim a uma grandeza menor que qualquer outra predeterminada da mesma espécie” (EVES, 2004, p. 419). Uma das maiores contribuições gregas para o cálculo foi dada por Arquimedes, por volta de 225 a. c., na qual utilizou o método da exaustão para encontrar a área do círculo, obtendo assim uma das primeiras aproximações para o número π (pi). A ideia de Arquimedes é resultado de uma propriedade de equilíbrio ao considerar o seguinte procedimento para se determinar uma área ou volume, ou seja: [...] corte a região correspondente num número muito grande de tiras planas ou de fatias paralelas finas e [...] pendure esses pedaços numa das extremidades de uma alavanca dada, de tal maneira a estabelecer o equilíbrio com uma figura de área ou volume e centroide conhecidos. (EVES, 2004, p. 422).

Com essas descobertas do Cálculo Infinitesimal tornou-se possível o estudo de movimentos e do espaço. Esta nova ferramenta do Cálculo proporcionou novos estudos até então desconhecidos, conforme enuncia Devlin (2010, p. 24-25): [...] o movimento dos planetas e a queda dos corpos na Terra, o funcionamento das máquinas, o fluxo dos líquidos, a expansão dos gases, forças físicas tais como o magnetismo e a eletricidade, o voo, o crescimento das plantas e animais, a propagação das epidemias e a flutuação dos lucros. A Matemática tornou-se o estudo dos números, da forma, do movimento, da mudança e do espaço. 170


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A descoberta dos conceitos do Cálculo Diferencial foram posteriores ao Cálculo Integral, no entanto, em termos curriculares, é o Cálculo Diferencial que é abordado primeiro. Segundo Eves (2004, p.417), [...] A ideia da integração teve origem em processos somatórios, ligados ao cálculo de certas áreas e certos volumes e comprimentos. A diferenciação, criada bem mais tarde, resultou de problemas sobre tangentes a curvas e de questões sobre máximos e mínimos. Mais tarde ainda, verificou-se que a integração e a diferenciação estão relacionadas entre si, sendo cada uma delas operação inversa da outra.

Muitos outros matemáticos se destacaram no cálculo de infinitésimos em trabalhos com a integração. Dentre eles destaca-se o matemático alemão Johann Kepler (1571-1630) o qual adquiriu conhecimentos relacionados ao volume de diferentes sólidos de revolução. Boyer (1992) considera que Kepler visualizava o volume dos sólidos como a soma de suas numerosas camadas finas, cada uma com a forma de um disco cilíndrico. Já o italiano Boaventura Cavalieri (1598–1647) que publicou, em 1635, um dos livros mais influentes do início do período moderno, a Geometria indivisibilibus continuorum, apresentou o método dos indivisíveis. Além destes matemáticos, surgem outros como Descartes (1596-1650), Pascal (1623-1662), Wallis (1616-1703) e Barrow (1630-1677), os quais também apresentaram grandes contribuições para o desenvolvimento do CDI. No século XVII ocorreram grandes avanços, principalmente com os estudos de Descartes (1596-1650) e Fermat (1601-1665). Estes dois matemáticos introduziram a representação em coordenadas cartesianas, possibilitando a representação de problemas algébricos em geométricos e o estudo analítico das funções. De acordo com Boyer (1992), o Cálculo Diferencial surgiu de problemas relativos ao traçado de curvas e tangentes em questões envolvendo a determinação de máximos e mínimos de funções. O matemático francês Pierre de Fermat (1601-1665) foi o primeiro a apresentar resultados nessa área, estabelecendo o método para encontrar máximos e mínimos. Se f(x) tem um máximo ou mínimo comum em x e se e é muito pequeno, então o valor de f(x-e) = f(x) e, para tornar essa igualdade correta, impor que e assuma o valor zero. As raízes da equação resultante darão, então, os valores de x para os quais f(x) assume um máximo ou mínimo (EVES, 2004, p. 429). 171


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A partir das conclusões de Fermat, embora ele não tenha representado da forma que conhecemos, seus estudos remetem para o processo de diferenciação que utilizamos hoje na abordagem em sala de aula, tal como a figura 1. Figura 1 - Representação do método de Fermat

Fonte: Boyer (1996, p.225).

As contribuições e avanços sugeridos por Fermat culminam com a fundamentação de importantes definições que vêm se concretizar no Cálculo. Isto é, para Boyer (1996, p.255), [...] Evidentemente, Fermat não tinha o conceito de limite, mas por outro lado seu método para máximos e mínimos se assemelha ao usado no Cálculo hoje, só que agora se usa, em geral, o símbolo h ou Δx em lugar do E do Fermat. O processo de Fermat de mudar ligeiramente a variável e considerar valores vizinhos é a essência da análise infinitesimal.

Mais tarde o físico inglês Isaac Newton (1642-1727) interessou-se pela Matemática e no período de 1665 a 1666, fez uma das descobertas mais importantes nesta área do saber, que é o método dos fluxos. Esse novo método proporcionou determinar máximos e mínimos, tangentes e curvas, curvatura de curvas, pontos de inflexão, convexidade e concavidade de curvas. Newton aplicou-o também a muitas quadraturas e retificações de curvas, além de demonstrar uma alta habilidade de integrar curvas diferenciais. Newton não foi o primeiro a diferenciar ou a integrar, nem a ver a relação entre essas operações no Teorema Fundamental do Cálculo. Sua descoberta consistiu na consolidação desses elementos num algoritmo geral aplicável a todas as funções, sejam algébricas, sejam transcendentes. (BOYER, 2010, p. 274)

No entanto, as obras de Newton, de acordo com Gayo (2010), foram publicadas somente em 1686. Durante este tempo o cientista e matemático alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646–1716) se interessou também pelo assunto e, principalmente, pelo estudo nas obras de Pascal, passando a ser 172


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considerado o corresponsável pelo início da formalização do Cálculo. Diferentemente de Newton, Leibniz pensou primeiro nas variáveis x e y como grandezas que variavam por uma sucessão de valores infinitamente pequenos. Ainda concordando com Boyer (1996), entre 1672 e 1677, Leibniz criou o formalismo básico do Cálculo Infinitesimal, sendo o primeiro a representar a integral pelo símbolo ∫, derivado da primeira letra da palavra summa (soma). Leibniz e Newton desenvolveram seus estudos separadamente, sem contato um com o outro, levando-os a criar notações totalmente diferentes. Newton por ter desenvolvido primeiro o seu raciocínio é considerado pai do Cálculo, no entanto, de acordo com Eves (2004) ambos criaram o Cálculo separadamente, pois Leibniz publicou seus estudos primeiro em 1776, enquanto Newton fez suas publicações dez anos mais tarde. Nos últimos anos do século XVII surgiram muitas contradições nos estudos do Cálculo apresentados até aquele momento. Com isso houve uma necessidade de rever as bases desta área do conhecimento. O italiano Joseph Louis Lagrange (1736-1813) foi o primeiro grande matemático a reconhecer tal necessidade (EVES, 2004). O desenvolvimento do Cálculo continuou com as contribuições de outros matemáticos entre eles Jacques Bernoulli, Johann Bernoulli, Maclaurin, Agnesi, Euler, D’Alembert, L’Hospital e Cauchy, os quais deram continuidade ao trabalho realizado por Newton e Leibniz. Diante disso, considera-se que os elementos relativos aos aspectos históricos do Cálculo possibilitam compreender melhor os objetos matemáticos que são tratados no Cálculo Diferencial e Integral. Além de que oportuniza maior percepção sobre sua importância no processo de ensino bem como as dificuldades de aprendizagem que alguns alunos sinalizam ao estudarem os referidos objetos. Desse modo se apresenta na próxima seção os registros de representação semiótica como possibilidade de abordagem dos objetos matemáticos relacionados ao CDI.

Os Registros de Representação Semiótica Raymond Duval é autor da Teoria das Representações Semióticas. Filósofo, psicólogo e professor, desenvolveu importantes pesquisas em Psicologia Cognitiva no Instituto de Pesquisa em Educação Matemática (IREM) de Estrasburgo, no período de 1970 a 1995. 173


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A palavra semiótica tem origem grega “semeion” que denota signo, melhor dizendo, é a ciência que estuda os signos. Para Santaella (2002, p. 13), a semiótica é a “ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significado e sentido”. Portanto, a semiótica busca revelar as formas como cada pessoa dá significado às coisas que estão ao seu redor. A representação semiótica voltada para a Matemática tem sua finalidade representar, de diversas maneiras, um mesmo objeto matemático dependendo de suas características e as formas de abordagem no processo de ensino e aprendizagem. Considerando que a preocupação com o processo de aprendizagem dos objetos matemáticos é um dos aspectos discutidos pela Educação Matemática, não se pode referenciar o processo de ensino e de aprendizagem da Matemática sem considerar que os objetos matemáticos são acessados por meio de representações. Assim, ressalta-se que os objetos matemáticos são ideias, conceitos e propriedades, sendo que o acesso só é possível por meio de representações simbólicas. Por exemplo, pode-se representar uma mesma função, independente de sua característica de diversas formas: a gráfica, a algébrica, entre outras. Segundo Duval (2009, p.31), “há uma pluralidade de registros de representações de um mesmo objeto, e a articulação desses diferentes registros é condição para a compreensão em matemática, embora várias abordagens didáticas não levem em conta esse fato”. No entanto, quando os objetos matemáticos são explorados, por meio de uma, duas ou três representações, há de se reconhecer que mesmo assim existem várias outras representações, as quais ainda não foram percebidas. À medida que se conhece um objeto matemático por meio de seus registros surge novas características não exploradas, que podem levar a relações e aspectos até então não reconhecidos neste objeto. A utilização dos registros de representação semiótica requer que seja estabelecida a distinção entre as duas características fundamentais que constituem um objeto matemático: o representante (forma) e o representado (conteúdo). De acordo com Duval (2009, p.14): [...] não se pode ter compreensão em Matemática, se nós não distinguimos um objeto de sua representação. É essencial ja174


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mais confundir os objetos matemáticos, como os números, as funções, as retas etc, com suas representações, quer dizer, as escrituras decimais ou fracionárias, os símbolos, os gráficos, os traçados de figura [...] porque um mesmo objeto matemático pode ser dado através de representações muito diferentes (DUVAL, 2009, p. 14)

Pode-se exemplificar a distinção entre representante e representado por meio das inúmeras formas (representante) que o número dezesseis (representado) pode assumir, vejamos este exemplo na Figura 2. Figura 2 - Representações do número dezesseis em operações fundamentais 16

18 - 2

4 +12

4.4

Fonte: Elaborada pelas autoras, 2014.

No entanto, o número dezesseis pode ser observado também na igualdade (i + 1)8 = 16, reconhecendo que o número dezesseis na forma complexa (1 + i)8 requer o domínio de representações que são diferentes das apresentadas na Figura 1, sendo necessário a realização de tratamentos no registro numérico dos números complexos conforme ilustra a Figura 3. Figura 3 - Representação do número dezesseis em números complexos

Fonte: Elaborada pelas autoras, 2014.

Para operar com os registros de representação de um objeto matemático, Duval (2009) considera que, existem três atividades cognitivas funda175


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mentais nesse processo, sendo elas: (i) a formação de uma representação identificável; (ii) o tratamento de uma representação e, (iii) a conversão de uma representação. A seguir explana-se um exemplo de modo que estas três atividades cognitivas sejam percebidas: • A formação de uma representação semiótica: a identificação Representação de um retângulo cuja base tem quatro unidades e sua altura duas unidades. • Tratamento: mesmo registro, porém uma nova representação. A questão levantada nos leva a dois registros geométricos, com a mesma representação apresentadas na Figura 4. Figura 4 - Registros geométricos da forma retangular

Fonte: Elaborada pelas autoras, 2014.

• A conversão de uma representação: mudança de um registro para outro. Em relação ao objeto matemático retangular de base quatro e altura dois, pode-se calcular a medida de sua superfície, ou seja, A = b . h → A = 4 . 2. Esta forma de calcular a área de uma figura retangular é constituinte da geometria, no entanto, esta mesma região pode ser obtida por meio da integral definida utilizando os conceitos do CDI para determinação da medida da superfície de figuras, a qual representa outras formas de registros. Para Flemming (2007), a formalização matemática para estudar os devidos objetos faz emergir novas maneiras de tratá-los, sendo uma delas o uso da integral. Isto é, para esta autora, este tipo de integral nasceu da formalização matemática de áreas e problemas físicos. Sendo assim, tem-se a definição 176


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de integral definida como sendo: “ f uma função definida no intervalo [a , b] e seja P uma partição qualquer de [a , b]. A integral definida f de a até b, é denotada por: ”(FLEMMING, 2007, p. 259-260). No exemplo anteriormente citado observa-se que para determinar a região delimitada de um objeto matemático faz-se necessário converter o registro geométrico do plano cartesiano que será apresentado na Figura 5 para o registro algébrico da integral definida em que se tem f(x)=2 (função constante) definida no intervalo [-2 , 2]. Realizando-se os tratamentos necessários no registro algébrico pode-se obter o valor da área da figura retangular conforme ilustra Figura 5. Figura 5 - Representação algébrica da área da forma retangular por meio da integral definida

Fonte: Elaborada pelas autoras.

As três atividades cognitivas relacionadas à formação, tratamento e conversão são indispensáveis para o processo de compreensão e interpretação dos objetos matemáticos. Vale ressaltar que na grande maioria dos casos os alunos encontram uma significativa dificuldade na conversão de uma representação, pois envolve o domínio de unidades significativas diferentes, além da complexidade de cada sistema de representação. Nesse sentido Duval (2009, p. 34) reforça que: [...] mudar a forma de uma representação se revela ser, para muitos alunos nos diferentes níveis de ensino, uma operação difícil e, por vezes, mesmo impossível. Tudo se passa como se a compreensão que a grande maioria dos estudantes tivesse de um conteúdo ficasse limitada à forma de representação utilizada.

Ainda concordando com Duval (2011), pode-se afirmar que a conversão é uma transformação que faz passar de um registro a outro. Este processo de conversão é um passo importante, e onde talvez esteja a grande dificuldade dos alunos de interpretar e resolver um problema proposto. A metodologia de abordagem dos objetos matemáticos em sala de aula pode influenciar 177


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no processo de compreensão, pois a prática de diversificar os registros de representação semiótica dos objetos matemáticos não é muito comum em sala de aula. Com isso, o aluno acaba se acostumando com apenas aquela maneira de representação adotada pelo professor, que talvez não seja a mais adequada no seu processo de aprendizagem. A Matemática, de maneira geral, permite a representação de seus objetos de várias formas. Considerando-se este aspecto dos objetos matemáticos, é importante que o professor entenda as diversas representações que os mesmos apresentam, para que possibilitem aos seus alunos esta diversidade facilitando o processo de compreensão. O professor deve entender as representações semióticas como uma das possibilidades metodológicas que auxiliam no processo de ensino. Para Damm (2008, p.176), os aspectos mencionados fazem a devida diferença no processo de ensino e aprendizagem uma vez que, [...] a utilização de diferentes registros de representações semióticas é uma maneira didática/metodológica que o professor pode usar quando ele busca a conceitualização, a aquisição de conhecimento. [...] Para isso, é necessário que o professor tenha claro o objeto matemático a ser ensinado: isso lhe possibilitará definir quais os registros de representação semiótica que possibilitarão a construção do mesmo.

Considerando-se todos estes aspectos, as representações semióticas desempenham um papel indispensável na Matemática. A construção do saber matemático está diretamente ligada à semiótica. Duval (2009) afirma que “não há noésis sem semiósis”, ou seja, não há uma apreensão conceitual de um objeto sem a produção de pelo menos mais de uma representação semiótica do mesmo. Os objetos do CDI necessitam dos registros de representação semiótica para serem acessados, mais ainda os processos de derivação e integração os quais precisam de suas inúmeras representações para serem compreendidos pelos alunos. Ou seja, o professor deve utilizar diferentes sistemas de representação para proporcionar as transformações e relações entre as unidades significativas dos objetos matemáticos de modo a tornar a aprendizagem com mais sentido para os alunos. Mediante as considerações apresentadas, pretende-se trabalhar os diferentes sistemas de representação semiótica aplicada ao estudo do CDI, 178


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especificamente das integrais definidas, pois proporcionam aos estudantes algumas maneiras de se representar o cálculo do volume do tronco do cone. Este artigo apresenta a utilização dos registros de representações semióticas na abordagem do CDI, em especial do volume de um sólido de revolução, por meio de uma proposta de atividade a ser apresentada na próxima seção.

O tronco de cone por meio das integrais definidas e os registros de representação semiótica Nesta seção serão apresentas as possibilidades de cálculo do volume de um tronco de cone por meio da utilização dos diferentes sistemas de representações semiótica envolvendo as integrais. De acordo com Giovanni & Bonjorno (2005), os sólidos de revolução são formados a partir da rotação de 360º de uma região plana em torno de uma reta no plano, chamada de eixo de revolução. Por exemplo, considerando-se uma figura geométrica triangular, no caso o triângulo retângulo, de lados R e h e hipotenusa g em torno do eixo de rotação indicado na figura 6. O sólido obtido nessa rotação é o cone da Figura 6, de altura h raio R e geratriz g. Figura 6 - Cone de revolução gerado pela rotação da região triangular

Fonte: http://www.somatematica.com.br/emedio/espacial/espacial17.php

Por definição, o objeto matemático denominado cone, segundo Giovanni & Bonjorno (2005. p. 293) é “a figura geométrica formada pela reunião de todos os segmentos de reta que têm uma extremidade no ponto V e a outra num ponto do círculo C denomina-se cone circular ou, simplesmente cone”, ilustrado na Figura 7. 179


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Figura 7- Representação geométrica do cone

Fonte: http://www.somatematica.com.br/emedio/espacial/espacial17.php

O tronco de cone pode ser classificado de duas maneiras: cone reto (o eixo do cone é perpendicular à base) e cone oblíquo (o eixo é oblíquo à base). Neste artigo será utilizado o cone reto, considerando que este pode ser obtido girando-se uma região triangular, cujo contorno é um triângulo retângulo, em torno de uma reta que contém um dos catetos, como mostra a Figura 6. Quando seccionamos um cone reto por um plano α paralelo à base, obtém-se um círculo na secção transversal do cone. Esta secção origina dois novos sólidos: um cone menor que o original e o sólido delimitado pelo círculo da base do cone original e o círculo da secção transversal, o qual é denominado de tronco de cone ou cone truncado conforme ilustra a Figura 8. Figura 8 - Tronco de cone ou cone truncado

Fonte: http://www.brasilescola.com/matematica/tronco-cone.htm

A obtenção do tronco de cone pode ser de modo análogo ao do cone reto anteriormente sugerido, o qual pode ser obtido pela rotação de uma figura 180


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plana, neste caso um trapézio retângulo, em torno do seu eixo de revolução (eixo x), conforme a Figura 9. Figura 9 - Representação do trapézio retângulo que gera o tronco de cone

Raio do círculo da base do cone

Eixo de revolução

Fonte: Elaborada pelas autoras, 2014.

O sólido geométrico obtido a partir da rotação do trapézio da Figura 8, constitui-se um dos objetos de estudo da geometria euclidiana, o tronco de cone. Este objeto matemático pode ser explorado quanto ao seu volume, a sua superfície lateral e a sua superfície total. Em relação ao volume de um tronco de cone, enquanto conteúdo programático do Ensino Médio, se utiliza a seguinte equação, a considerar os elementos da Figura 8.

No entanto, conforme fora anteriormente mencionado, um objeto matemático pode ser representado por diferentes registros de representação. Desse modo o cone truncado ou tronco de cone pode ser obtido por meio da aplicação de integrais simples, duplas e triplas ao ser tratado no Ensino Superior no estudo da aplicação das integrais definidas especificamente no estudo do volume dos sólidos de revolução. Para a representação da presente proposta de abordagem, este artigo faz a exploração do cálculo do volume do tronco de cone. O exemplo a ser estudado configura-se de um copo, cuja capacidade identificada é de 180 ml. 181


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O seu material de composição é isopor como mostra a Figura 10. As suas características físicas e, enquanto representações de um objeto matemático estão descritas conforme a complexidade explorada na geometria e no CDI.

Figura 10 - Representação do copo utilizado

Fonte: Copilada pelas autoras.

Para a obtenção das medidas para a realização dos cálculos do volume do copo exposto na Figura 10 fez-se necessário a utilização de alguns recursos como a fita métrica, a régua e a calculadora, além dos softwares Winplot e GeoGebra. É importante considerar que a parte superior do copo representada pela saliência exposta na Figura 10 foi desprezada durante a realização dos cálculos, o que configurou uma diferença entre o volume indicado no copo e o volume determinado pelo uso de integrais. Na sequência da atividade iniciou-se a exploração do copo agora sendo analisado como um sólido correspondente a um cone truncado. Para a realização dos cálculos foi necessária a recolha das medidas, quais sejam: o comprimento da circunferência maior e da menor, cujos valores respectivamente medem 21,3 cm e 14,4 cm. Tais valores foram usados para se determinar as medidas do raio maior e menor e a medida da geratriz. Estas medidas foram necessárias para a obtenção da função linear cujo segmento de reta delimita superiormente a região do trapézio (Figura 9) o qual foi rotacionado para gerar o tronco de cone. Assim, tendo conhecidas as medidas do comprimento das circunferências, foi possível determinar a medida dos raios indicados na Figura 11, utilizando-se a equação C = 2. r. π. Para a realização dos cálculos a seguir adota-se π = 3,14. 182


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Figura 11 - Raios das circunferências

Fonte: Copilada e elaborada pelas autoras, 2014.

Como os dados das medidas dos raios ainda eram insuficientes para a obtenção da função linear apresentada na Figura 9, fez-se necessário também medir com a fita métrica a geratriz do tronco de cone representada pelo seg­ mento , cujo valor é de 6,6 cm. A partir destas informações foi possível construir o registro gráfico conforme ilustra a Figura 12. Figura 12 - Representação da medida da geratriz do copo e sua representação no plano

Fonte: Copilada pelas autoras, 2014

A partir do registro gráfico e com o auxílio da geometria analítica e, da conversão deste registro para o registro algébrico, foi possível determinar a 183


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altura do tronco de cone. Para tanto otimizou-se a distância entre dois pontos realizando-se os devidos tratamentos Figura 13) cuja finalidade é a obtenção do valor da abscissa x, que na Figura 10 corresponde a altura do tronco de cone. Figura 13 - Representação do cálculo da distância entre dois pontos

Fonte: Elaborada pelas autoras, 2014.

Agora que se tem as coordenadas dos pontos A(0 ; 2,299) e B(6,5078 ; 3,3917), pode-se realizar a conversão destas coordenadas no sistema de equações do primeiro grau. Neste sistema substitui-se estes pontos na equação reduzida da reta que passa por estes dois pontos ilustrados na Figura 14. Utiliza-se a equação reduzida da reta que é representada por y = ax+b , procedendo-se com a substituição das coordenadas dos pontos A e B conforme segue na Figura 14: Figura 14 - Sistema de equações para obtenção dos valores de a e b

Fonte: elaboração das autoras.

Realizando-se os devidos tratamentos necessários ao processo resolutivo de um sistema de equações consegue-se determinar os valores de a e b indicados na resolução do sistema da figura 14 que segue:

184


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Logo, a função linear que passa pelo segmento de reta e que limita superiormente o tronco de cone que representa o copo é y = 0,1688x + 2,2929. De posse destas informações é possível enunciar o objeto matemático em estudo da seguinte maneira: o tronco de cone que representa o copo é a região limitada pelas retas x = 0, x = 6,5078 e y = f(x) = 0,1688x + 2,2929 e , girando em torno do eixo x, gerando assim um sólido de revolução representado na Figura 15. Figura 15 - Representação da região de rotação que gera o tronco de cone

Fonte: Elaborada pelas autoras, 2014.

Mediante obtenção de todos estes dados bem como a devida representação gráfica do objeto, no caso o copo, tem-se a possibilidade de se realizar tratamentos e conversões a partir da representação gráfica da função que delimita a lateral do copo ou a geratriz do tronco de cone. Neste caso a função f(x) é contínua e não negativa no intervalo [0; 0,65078]. A partir destes dados é possível aplicar os conceitos da integral definida para a obtenção do volume deste sólido de revolução. No entanto, é necessário que se identifique inicialmente a região delimitada pela função no intervalo dado conforme ilustrado na Figura 15. A partir da obtenção da região é possível aplicar outro conceito de integral definida para a se calcular o volume do sólido de revolução gerado pela rotação da mesma região em torno de um eixo, no caso eixo das abscissas, conforme sugere a figura 16. 185


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Figura 16 - Representação do tronco de cone obtido pela rotação em torno do eixo x utilizando-se o software Winplot.

Fonte: Elaborada pelas autoras, 2014.

O volume de um sólido de revolução é, segundo Flemming (2007, p.348), apresentado como sendo “y = f(x) uma função contínua não negativa em [a,b]. Seja R a região sob o gráfico de f de a até b. O volume do sólido T , gerado pela revolução de R em torno do eixo dos x é definido: ”. Aplicando-se o conceito de integral definida aos dados da imagem da Figura 16, torna-se possível determinar o volume do corpo de revolução como mostra o desenvolvimento da Figura 17. Figura 17 - Representação algébrica do cálculo do volume do copo por meio da integral simples

Fonte: Elaborada pelas autoras, 2014. 186


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No entanto, conforme o objetivo do presente estudo, além das representações do volume do copo já propostas na geometria euclidiana e na forma de integral simples por meio do sólido de revolução, também se pode obter o volume deste mesmo corpo por meio da integral dupla. Entretanto, não mais a partir das coordenadas retangulares e sim por meio das coordenadas polares originadas de um sistema de coordenadas bidimensional. A representação geométrica das coordenadas polares pode ser vista na Figura 18. Figura 18 - Representação das coordenadas polares

Fonte: elaborada pelas autoras, 2014.

Para a conversão do sistema de coordenadas retangulares para o de polares é necessário a realização de conversões dos pares ordenados (x,y) para (r, ϴ). Esta conversão é facilitada pela representação gráfica a ser visualizada no triângulo retângulo da Figura 18, o qual é formado pelas relações métricas e trigonométricas que segue:

Considera-se este processo de conversões e tratamentos como uma nova forma de representar o volume de um corpo de revolução. Este processo utiliza das coordenadas polares e da integral dupla, conforme representação algébrica e respectivas conversões, apresentadas por Thomas (2012).

187


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Estes conceitos de integração estão aplicados neste artigo no processo de cálculo do volume de um corpo de revolução, no caso o tronco de cone. Este objeto pode ser agora representado em termos de integrais duplas e em coordenadas polares. De acordo com Thomas (2012), o sistema de coordenadas polares foi o primeiro que surgiu após o sistema cartesiano, sendo este atribuído seu desenvolvimento a Isaac Newton com a finalidade de facilitar os cálculos de algumas integrais. No entanto, para que seja possível o cálculo do volume do tronco de cone em integrais duplas, é necessário visualizá-lo como um objeto composto de dois volumes, sendo um o cilindro e o outro uma região externa que contém este cilindro, conforme ilustra a Figura 19. Assim, esta nova representação é composta pelo volume do cilindro que se encontra dentro do copo, com o raio da base igual ao raio da circunferência menor e o restante do sólido original delimitado internamente pela área lateral do cilindro e externamente pela geratriz do tronco de cone. Figura 19 - Representação do tronco de cone e do cilindro obtido pela rotação em torno do eixo z utilizando-se o software Winplot

Fonte: Elaborada pelas autoras, 2014.]

Neste sistema, o volume do copo, analisado neste artigo como um cone truncado ou tronco de cone, pode ser definido em coordenadas polares, a partir do registro analítico algébrico de suas delimitações da seguinte forma:

No entanto, para obter o volume do sólido original delimitado pela área lateral externa do cilindro e a geratriz do tronco de cone, é necessário a determinação da função z que delimita lateralmente o tronco de cone no plano rz conforme a Figura 20. 188


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Figura 20 - Representação da medida da geratriz do copo e sua representação no plano rz

Fonte: Copilada e elaborada pelas autoras, 2014.

Utilizando os pontos C(2,2929 ; 6,5078) e D(3,3917 ; 0), é possível determinar a equação da reta z = ar + b que passa pelo segmento de reta , por meio de um sistema de equações. 0 = 3,3917a + b 6,5078 = 2,2929a + b

Procedendo-se com os devidos tratamentos, da mesma maneira já reali­zada anteriormente com o auxílio de sistema de equações, obtém-se a = – 5,9226 e b = 20,0876. Desse modo a função que delimita lateralmente o tronco de cone é dada por z = – 5,9226r + 20,0876. Quanto ao cilindro que se encontra dentro do copo, com o raio da base igual ao raio da circunferência menor, que se encontra limitado no eixo z pela altura do tronco de cone, apresenta sua variação de 0 ≤ z ≤ 6,5078. Assim tem-se a representação do volume do tronco do cone em coordenadas polares, contudo representado pelo registro de representação algébrico por meio das integrais múltiplas e definida conforme segue o processo de tratamentos e conversões. Este processo corresponde ao algoritmo de resolução da questão para a obtenção do volume do sólido, no caso o cone truncado ou tronco de cone de acordo com a Figura 21. 189


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Figura 21 - Representação algébrica do cálculo do volume do copo por meio da integral dupla

Fonte: Elaborada pelas autoras, 2014.

Como este artigo se propôs a representar um objeto matemático em seus diferentes registros de representação por meio das integrais definidas, o volume do mesmo cone truncado pode ser representado agora no registro algébrico envolvendo as integrais triplas. Para isso, é necessária a realização de conversões entre as coordenadas retangulares para coordenadas cilíndricas. Este novo sistema de representação foi concebido a partir da definição das coordenadas polares por se tratar de um modelo polar adaptado para o espaço tridimensional, como mostra a Figura 22. Figura 22 - Representação das coordenadas cilíndricas

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Coordenadas_cil%C3%ADndricas. 190


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Assim como acontece nas coordenadas polares, nas coordenadas cilíndricas o volume do copo (tronco de cone ou cone truncado) também deve ser calculado por meio da soma dos volumes do cilindro e do sólido originado pela delimitação da área lateral do cilindro e a geratriz do tronco de cone (Figura 19). Para a utilização deste novo sistema de representação é necessária a conversão das ternas ordenadas (x, y, z) para (p, ϴ, z), em que p e ϴ são as coordenadas polares para a projeção vertical do ponto P no plano xy e z é a coordenada vertical retangular. Para essa conversão temos as seguintes equações relacionando coordenadas retangulares e cilíndricas:

Seguindo estas conversões e os devidos tratamentos, de acordo com Thomas (2012) neste momento pode-se representar o volume de um sólido de revolução por meio da integral tripla.

Desta maneira tem-se que o volume do copo estudado (tronco de cone ou cone truncado) é representado em coordenadas cilíndricas a partir do registro de representação analítico algébrico conforme segue.

Porém, é necessário determinar os limites da coordenada z que delimita o sólido original pela área lateral do cilindro e a geratriz do tronco de cone. Ao aplicar o cálculo da integral dupla, conclui-se que z é a função z = –5,9226r + 20,0876 a qual delimita lateralmente o tronco de cone. Para as coordenadas cilíndricas tem-se que p2 = x2 + y2 e nas coordenadas polares tem-se que r2 = x2 + y2 . Desse modo, ao realizar os devidos tratamentos concluiu-se que p = r e tem-se que 0 ≤ z ≤ –5,9226p + 20,0876. No caso do cilindro, assim como transcorreu na integral dupla, o sólido de revolução é gerado em 0 ≤ z ≤ 6,5078. Com isso é possível obter uma nova representação geométrica com o auxílio de ferramentas computacionais, no caso o software Winplot, conforme ilustra a Figura 23. 191


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Figura 23 - Representação separada do tronco de cone e do cilindro, obtido pela rotação em torno do eixo z utilizando-se o software Winplot

Fonte: Elaborada pelas autoras, 2014.

A partir desta nova visualização do tronco de cone ou cone truncado, pode-se representar o cálculo do seu volume ao utilizar o registro de representação algébrica em coordenadas cilíndricas as quais podem ser expressas pela integral tripla que segue:

Para a determinação do volume é necessário a realização de tratamentos algébricos e numéricos respeitando-se o processo algoritmo de resolução de uma integral tripla. A partir desta integral, obtém-se a terceira representação algébrica do volume do tronco de cone ou do copo analisado, cujo processo resolutivo segue na Figura 24. Figura 24 - Representação algébrica do cálculo do volume do copo por meio da integral tripla

Fonte: elaboração das autoras, 2014. 192


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Ao finalizar os cálculos referentes à abordagem semiótica do cálculo do volume do sólido de revolução, no caso, o cone truncado ou o tronco de cone, percebe-se que há um ganho cognitivo muito positivo para os alunos que realizam determinadas atividades que otimizam a sua exploração nesta perspectiva. Desse modo, apresenta-se a seguir, algumas considerações finais que foram observadas na realização desta tarefa e que beneficiam a formação de professores e novos professores de Matemática por oportunizar a socialização destes conhecimentos.

Considerações finais Este artigo apresentou algumas formas de ilustrar os objetos matemáticos em diferentes sistemas de representação. O objeto escolhido foi o cone truncado ou tronco de cone que é um sólido geométrico estudado desde a Educação Básica. Contudo, dentro da abordagem da geometria espacial tais objetos já são tratados e estes se estendem até o Cálculo Diferencial e Integral no qual estes são relacionados aos sólidos de revolução. Em relação ao CDI utilizou-se a abordagem das integrais definidas que podem ser simples, duplas e triplas e seus registros podem ser em coordenadas retangulares, coordenadas polares e coordenadas cilíndricas. Entre as inúmeras aplicações que se tem para as integrais, situa-se a possibilidade de calcular o volume de diferentes sólidos. Os registros de representação semiótica permitiram a representação do objeto estudado em diferentes sistemas de representação, possibilitando assim que em cada registro se evidenciassem certos aspectos a ele pertinentes, o que, por vezes, num outro registro, não o tornaria tão evidente aos olhos de quem está observando e ou estudando. Assim, as integrais definidas para a obtenção do volume do tronco do cone se constituiu o objeto de pesquisa deste estudo. Durante o estudo, se abordou três maneiras de calcular o volume do tronco de cone adotando-se o uso da integral definida simples, dupla e tripla. Para isso fez-se necessária a conversão simultânea entre as coordenadas retangulares, polares e cilíndricas. Para o desenvolvimento das atividades utilizou-se ferramentas computacionais as quais facilitam a representação geométrica do objeto estudado, no caso os softwares Winplot e GeoGebra. Conclui-se que o volume do tronco de cone obtido pelo cálculo das integrais simples duplas e triplas foi igual dos valores obtidos por meio dos conceitos da Geometria Espacial (equação do tronco do cone), considerando-se 193


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0,016 como um erro insignificante. Assim, a partir dos objetivos propostos e das atividades desenvolvidas para o desenvolvimento deste artigo se pode concluir que os registros de representação semiótica teorizados por Duval (2009) se constituem uma metodologia facilitadora na abordagem dos objetos matemáticos sob o olhar do CDI. Isso é possível reconhecer, no estudo ao se realizar a análise com o tronco de cone ou cone truncado como representação de um copo em diferentes configurações ou representações por meio das integrais definidas. É pertinente salientar que cada uma das representações ilustra aspectos diferentes do objeto matemático analisado. Sugere-se a utilização dos registros de representações semióticas na abordagem de outros objetos matemáticos a fim de tornar o processo de ensino dos objetos matemáticos estudados em Cálculo Diferencial e Integral, mais significativo na formação dos professores de Matemática.

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Recursos para o Ensino de Matemática ao aluno deficiente visual Ranúzy Borges Neves1

Resumo

E

ste artigo objetiva discorrer sobre alguns recursos criados por instituições e professores brasileiros, no intuito de auxiliar o ensino de Matemática para alunos cegos. Sabemos que cabe às instituições governamentais e não governamentais a execução de projetos eficazes que atendam as pessoas com deficiência, possibilitando que todos os indivíduos com necessidades especiais tenham acesso aos mesmos direitos e deveres no meio social, exercendo assim, sua cidadania. E para que esta realidade seja operante também na escola, o professor, em sua formação, deverá estar capacitado a lidar com o estudante deficiente, buscando através de práticas pedagógicas, a inclusão e inserção do mesmo em sala de aula. E que, como profissionais da área de educação, deve-se trabalhar por um presente e futuro dignos de nossos alunos, sendo eles deficientes ou não. Palavras-chave: Matemática Inclusiva. Formação do Professor. Recursos Didáticos. Deficiência Visual. O Ministério da Educação e Cultura determina que: “os sistemas de ensino devem constituir e fazer funcionar um setor responsável pela educação especial, dotado de recursos humanos, materiais e financeiros que viabilizem e deem sustentação ao processo de construção da educação inclusiva” (BRASIL, 2001, p. 23). No entanto, a realidade vivenciada em nossas escolas é bem diferente. O tema inclusão vem sendo fortemente debatido, tanto pela comunidade escolar quanto por seus órgãos superiores. Contudo, as poucas ações realizadas para sua concretização têm sido insuficientes. A lei que se encontra no papel não é a mesma operante em nossa realidade escolar. Infelizmente, as instituições de ensino estão muito aquém da proposta de educação inclusiva. Certas formas de atendimento educacional ao deficiente, como a sala de recursos e a classe especial, ainda estão muito enfraquecidas. 1

Licenciada em Matemática e especialista em Psicopedagogia pela Universidade do Sul de Santa Catarina. Contato: ranuzyneves@yahoo.com.br. 195


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Entretanto, é muito válida aquela antiga analogia, feita pelo sociólogo Betinho, que descreve um pequeno beija-flor tentando apagar o incêndio na floresta com a água transportada em seu bico. Se começarmos fazendo a nossa parte, teremos não apenas o direito, mas o dever de entrarmos nessa “briga”, cobrando junto às entidades superiores, um referencial de ensino inclusivo qualificado. É conveniente que as organizações, governamentais e não governamentais, estejam sempre motivadas à prática de uma filosofia ética, verdadeiramente favorável aos objetivos da educação. E para chegar a esta realidade, os órgãos responsáveis terão de adaptar seu planejamento, objetividade e propósito, no intuito de alcançarem o máximo de resultados positivos. Por problemas de preconceito, o deficiente físico ainda é julgado incapaz de viver como uma pessoa sem deficiência e dessa forma, acaba sendo excluído da sociedade e até mesmo privado dos seus direitos de cidadão. Isso ocorre desde os tempos antigos, onde nada se entendia a respeito da deficiência, o que conduzia a pessoa que possuísse qualquer imperfeição ao abandono ou à morte. O conceito formal em relação à deficiência começou a ser formulado por meio de estudos científicos, que descobriram a causa de diversas imperfeições físicas e mentais, o que consideravelmente fez do deficiente uma pessoa detentora de direitos e deveres como qualquer outro indivíduo. Durante a formação do professor, raramente são desenvolvidas técnicas ou práticas pedagógicas que possam ser aplicadas em sala de aula, no momento em que o educador se deparar com um aluno que possua algum tipo de deficiência. E, sem a devida formação, são diversas as dificuldades enfrentadas pelo docente, que parte então, em busca de caminhos e alternativas que possam levar o deficiente ao aprendizado. Em se tratando, especificamente, da deficiência visual, percebemos a difícil realidade enfrentada pelas pessoas cegas para uma efetiva inclusão na sociedade. E, como aluno de uma escola regular, o deficiente visual também se depara com diversos obstáculos impostos à oportunidade de recebimento de um ensino mais amplo e concreto. Todavia, apesar do escasso material disponível para o ensino específico de Matemática ao deficiente visual, existe uma minoria de profissionais que tem feito um excelente trabalho com estes poucos recursos. E, também, há aqueles que vão além e fazem uso diário da superação das barreiras impostas à educação inclusiva, com o objetivo de criar oportunidades para que, tanto 196


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os alunos dotados de visão quanto os cegos, possam aprender Matemática juntos, de forma dinâmica e eficaz. O presente artigo tem como objetivo apresentar alguns recursos disponíveis para o ensino de Matemática a deficientes visuais, discorrendo sobre as leis e normas que regem a política de inclusão no Brasil. De acordo com a Constituição vigente, a educação é um direito assegurado a todos os cidadãos brasileiros, incluindo dessa forma, os indivíduos com necessidades especiais. Entretanto, a realidade dentro da sala de aula, na maioria das vezes, não consegue garantir um ensino com a mesma qualidade àqueles que apresentam alguma deficiência. Levando em consideração a dificuldade de ensinar esse tipo de aluno, eis que surge a curiosidade em saber quais os métodos, materiais e recursos que um professor de Matemática pode utilizar para trabalhar sua disciplina, especificamente, com deficientes visuais.

Alguns pontos sobre a história de indivíduos com deficiência Vivemos numa sociedade em que o preconceito é algo constante na vida das pessoas e a inclusão daquelas que possuem alguma deficiência não é visível ao meio social. O deficiente é rotulado, na maioria das vezes, como incapaz de superar suas limitações e de viver entre as pessoas consideradas normais, sendo impedido de ter os mesmos direitos e deveres que todo cidadão possui. Desde os tempos primitivos era nítido o preconceito com o deficiente, uma vez que ele era totalmente excluído do convívio social. Podemos citar o exemplo de algumas tribos da Antiguidade, nas quais era comum matar ou abandonar as pessoa que fosse acometida por algum tipo de deficiência. Em Atenas, por exemplo, os recém-nascidos que apresentassem alguma anormalidade eram atirados de um precipício sobre pedras pontiagudas pelos próprios pais. Já para os hebreus, uma pessoa com deficiência era considerada indigna e possuída por espíritos malignos. Dessa forma, quase não existiam deficientes na sociedade antiga (LOWENFELD, 1974, apud FRANCO & DIAS, 2005). Segundo Amiralian (1986), somente a partir do ano de 1260 que a deficiência deixou de ser algo dos demônios para se tornar um meio de ganhar os céus. Desde então, começou a se formar um novo conceito em relação ao deficiente. De acordo com a autora, através do Renascimento Cultural e Comercial, nos séculos XV e XVI, a pessoa com deficiência começou a ser vista como um ser digno capaz e com os mesmos direitos que um cidadão dito 197


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“normal”. Esse pensamento foi reforçado então, durante os séculos XVIII e XIX, graças aos avanços na Medicina bem como por meio da Revolução Industrial. Estudos mais aprofundados sobre as causas de algumas deficiências foram realizados nesse período, devido à invenção de diversos tipos de máquinas e equipamentos. Destaca-se que dentre as diferentes formas de manifestação de anomalias nos indivíduos, o caso da cegueira é uma dentre tantas que têm merecido atenção especial, inclusive dentro do sistema educativo. Em se tratando especificamente da cegueira, um grande avanço foi datado no ano de 1784, com a fundação da primeira escola do mundo destinada à educação de pessoas cegas, o Instituto Real dos Jovens Cegos de Paris, criado por Valentim Haüy. E no Brasil, através da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, passou-se a pensar na inclusão do deficiente no ensino regular, sendo criados projetos educacionais que favorecessem essa integração (LOWENFELD, 1974, apud FRANCO & DIAS, 2005). O processo de integração, que busca “normalizar” a pessoa com deficiência e atribuir-lhe a responsabilidade de adequação ao meio social, não propõe, conforme constata Mantoan (1998), nenhuma mudança na estrutura social vigente, cabendo ao indivíduo a responsabilidade de se “adequar” ao sistema. Entretanto, as práticas integracionistas demonstraram que as pessoas com deficiências não precisam e nem devem ser excluídas socialmente.

Exemplos de políticas públicas voltadas ao deficiente O amparo às pessoas que possuem algum tipo de deficiência passou a fazer parte das normas brasileiras através da Constituição Federal de 1988. A partir de então, foram criados dispositivos legais em áreas como educação, trabalho, assistência social e acessibilidade física, no intuito de garantir a inclusão social dos deficientes (BRASIL, 2006). Entre as políticas públicas estabelecidas, tem-se a reserva de cotas nas universidades para os deficientes, assim como nas empresas públicas. A planificação de espaços abertos, as adequações dos meios de transportes e dos meios de comunicação também estão asseguradas em lei (MAZZONI & TORRES, 2005). Na área do trabalho, a Convenção 159 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) assegura a reabilitação profissional e oportunidades de emprego para todas as pessoas com deficiência e o artigo 93 da lei Nº. 198


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213/91 obriga as empresas a contratar um número mínimo de deficientes, que seja proporcional à quantidade total de seus trabalhadores. A legislação brasileira apresenta significativos avanços em relação à inclusão social das pessoas com deficiência, contudo as dificuldades para que as leis sejam implementadas são muitas, pois a aplicação das mesmas enfrenta barreiras decorrentes de uma história de preconceitos, equívocos e dúvidas, especialmente no aspecto que advoga sobre a capacidade dessas pessoas. Tal questão também se confirma no contexto do Sistema Educacional, tanto no Brasil como em outros países, o que requer ampla discussão sobre a formação dos professores que atuarão em classes com alunos que apresentam uma deficiência visual. Quais são, por exemplo, os aspectos que os futuros professores de Matemática precisam levar em consideração ao se depararem com tal situação?

A formação dos professores de Matemática No Brasil, a questão de formação de professores tem sido objeto de estudos, debates e infinitas interrogações em relação ao aperfeiçoamento do educador para o trato com o aluno deficiente. Os futuros docentes, ao invés de aprenderem a levantar questões em relação aos diferentes métodos didáticos, técnicas de pesquisa e teorias da Educação, são direcionados em aprender o “como fazer” e “o que funciona”, como afirma Giroux (1997). A prática pedagógica não deve se tornar algo mecânico e repetitivo, mas sim, como declara Matos (1998), “distinguir a prática como objeto de pensamento, captá-la em estado teórico, torná-la como objeto de conhecimento e como atividade socialmente construída”. Sendo assim, Matos ainda relata que: A educação deve ser entendida como uma preparação para a superação permanente da alienação, desta forma, não deve orientar-se por modelos, que induzem o professor a trabalhar segundo princípios pré-estabecidos, utilizando instrumentos e recursos pré-determinados e em condições de aprendizagem que ignoram a realidade concreta do aluno, da turma, da escola e da própria sociedade. Não há modelos rígidos e imutáveis se a meta fundamental é a formação de um ser humano autônomo, consciente da realidade que o cerca e apto a nela intervir (MATOS, 1998, p. 45). 199


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A missão do professor é buscar caminhos mais coerentes que levem ao aprendizado aluno e, consequentemente, sua realização profissional. É fundamental que sua prática pedagógica contemple também os pilares propostos por Delor’s (2000): aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a viver junto e aprender a ser. Assim, se faz necessário criar oportunidades educacionais que levem os educandos à apropriação do conhecimento de forma crítica e reflexiva, possibilitando a construção e desenvolvimento de competências necessárias para sua autonomia e participação na sociedade, a partir do estímulo e valorização do trabalho em grupo. Sabe-se que o professor ainda não recebe, em sua formação acadêmica, a formação necessária para trabalhar com alunos que possuam algum tipo de deficiência. O futuro professor precisa se apropriar de outras práticas pedagógicas necessárias para um contato menos traumático com esses educandos. Dessa forma, o docente necessita conhecer diferentes técnicas e métodos que deem conta do ensino de sua área de formação sem, no entanto, discriminar o seu aluno deficiente. A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9394/96) reafirma esta tendência, sobretudo no Capítulo V, exclusivo da Educação Especial. O fato de figurar em um capítulo específico é uma inovação, geralmente interpretada como “discriminação positiva”. Mas, apesar das conquistas e avanços na nova LDB, a Educação Especial persiste como apêndice ou subsistema, apartado da concepção de uma educação inclusiva. Cabe assim, a todos os envolvidos no processo de ensino, a busca por novos recursos e metodologias que visam facilitar a aprendizagem dos alunos deficientes (BRASIL, 1996). E em se tratando especificamente dos professores de Matemática, segundo Souza (2009), percebe-se que a inclusão escolar somente acontecerá de fato se houver o comprometimento e participação de todos os profissionais de educação de cada escola, inclusive dos educadores matemáticos (Souza, 2009, p.31, apud, ANJOS, 2015).. Sendo assim, é imprescindível que o docente que leciona Matemática também esteja capacitado para lidar com as dificuldades advindas da deficiência visual, buscando então diminuir as barreiras historicamente impostas pela disciplina bem como aquelas condicionadas pela necessidade especial. Como já foi destacado, sabe-se que as universidades não têm conseguido oferecer o suporte necessário para que após a conclusão de sua licenciatura o professor entre em sala de aula e tenha condições de atender o aluno com deficiência visual de forma plena. Entretanto, cabe ao docente essa busca 200


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constante por capacitação, pois de acordo com Anjos (2015, p.38) “esse comprometimento se mostra quando buscamos formas de ensinar, pesquisando e aperfeiçoando as aulas, as metodologias de ensino e conhecendo a linguagem que o estudante cego utiliza para se comunicar com o mundo”.

Recursos para o ensino de matemática ao deficiente visual No campo da Matemática os professores dispõem de um conjunto de recursos que poderão auxiliá-lo no processo de ensino, dentre eles, o sistema Braille, o Sorobã e outros materiais e tecnologias adaptadas como a régua, o transferidor, o esquadro, bem como a calculadora sonora. O Sistema Braille é um método de leitura realizado através do tato, desenvolvido com o intuito de possibilitar aos deficientes visuais o acesso aos materiais impressos como livros, revistas, jornais, etc. Recebeu esse nome em homenagem ao seu idealizador, o francês Louis Braille. Braille nasceu no dia 4 de janeiro de 1809 na cidade de Coupvray, localizada a 45 km de Paris. Para tentar perfurar um pedaço de couro na oficina de seu pai, Louis utilizou um objeto pontiagudo, que acabou ferindo seu olho esquerdo, causando uma hemorragia muito grave. Devido ao limitado conhecimento médico da época, não foi possível encaminhá-lo a um tratamento adequado, e dessa forma a infecção acabou se transferindo para o outro olho. Com apenas cinco anos, o menino teve perda total de sua visão (VENTURINI & ROSSI, 1978). Contudo, Braille surpreendeu a todos com sua inteligência e dedicação aos estudos, apesar das dificuldades causadas pela deficiência. Segundo Venturini e Rossi (1978), devido a essa superação, Louis Braille recebe, aos 10 anos, uma bolsa de estudos na Instituição Real para Jovens Cegos, em Paris. Nesse centro educacional, Louis entra em contato com o complexo método de leitura feito de letras em relevo, criado por Valentin Haüy, fundador da Instituição. Mesmo com todas as dificuldades existentes, Braille dá prosseguimento a seus estudos de forma excepcional, destacando-se também nas aulas de música clássica, que o tornaram um grande pianista (VENTURINI & ROSSI, 1978). Conforme relato de Venturini e Rossi (1978), enquanto dá prosseguimento a seus estudos no Instituto, o menino conhece um novo modelo de escrita, criado pelo capitão da artilharia do exército francês, Charles Barbier de la Serre. Era um código de pontos e traços em relevo, destinado à comunicação noturna entre os soldados durante a guerra. Todavia, à medida que o novo sistema era explorado na escola, alguns problemas foram detectados. Sendo 201


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assim, após diversos cálculos, experiências e revisões no método de Barbier, que exigiram de Louis muito esforço e dedicação por períodos prolongados, um novo alfabeto havia sido criado com apenas seis pontos e alguns pequenos traços horizontais. Através de 63 combinações dispostas em duas colunas, o alfabeto Braille trazia a representação de todas as letras, acentos, pontuações e símbolos matemáticos. Aos 15 anos de idade, o garoto cego de Coupvray, criava um método (Figura 1) que proporcionaria muito mais independência e liberdade aos deficientes visuais: o Alfabeto Braille. Figura 1 – Alfabeto Braille

Fonte: http://www.senai.br/psai/braille_material.asp

De acordo com Marina (2003), em 1826, aos 19 anos, Braille torna-se oficialmente professor, passando a lecionar, então, as disciplinas de gramática, geografia, aritmética e música. Mas somente em 1843, quando a Instituição Real para Jovens Cegos foi transferida para um novo prédio, o alfabeto Braille obteve aceitação pública e passou a ser utilizado de fato. A partir daí, ocorreu uma expansão do sistema por toda a Europa. Durante o período de dificuldades enfrentadas para que suas realizações fossem aceitas, Braille 202


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também teve de lutar contra uma enfermidade. Aos 20 anos, teve a confirmação que estava com tuberculose e, então, passou a contar com cuidados médicos diários. Lecionou até 1850, quando solicita sua demissão por não haver mais condições físicas suficientes para estar em sala de aula. Venturini e Rossi (1978) destacam que Braille continuou apenas com as aulas de piano. Todavia, um ano depois, sua saúde fica muito comprometida, obrigando-o a permanecer acamado até o dia de sua morte. Em 6 de janeiro de 1852, apenas dois dias após ter completado 43 anos, Louis Braille não consegue mais resistir à sua doença e falece. Além do método do sistema Braille, o deficiente visual dispõe de outros recursos que podem ser integrados na prática pedagógica dos professores e assim, contribuírem com uma aprendizagem mais significativa. Como é o caso do Sorobã, um dispositivo similar ao ábaco que é utilizado no Brasil. Muitos autores têm registrado a incerteza do local onde o Sorobã foi inventado, uma vez que várias versões são conhecidas. Segundo Marinho e Sambatti (2004), a China foi o primeiro país do oriente a ter contato com o Sorobã. E de lá, o instrumento foi levado ao Japão pelo professor Kambei Moori, ainda com o nome de “Suan-Pan”. Após conhecer o completo funcionamento do aparelho de cálculo, Moori escreve um livro, em 1622, intitulado Embrião do Sorobã. A partir dessa data, os orientais, em geral, tiveram acesso à máquina, perpetuando assim seu uso às demais gerações. É muito frequente, nos dias de hoje, o ensino do Sorobã já nas escolas primárias desses países. De acordo com Marinho e Sambatti (2004), no ano de 1908 os imigrantes japoneses trazem o aparelho ao Brasil, uma vez que julgavam imprescindível a utilização do ábaco na resolução de cálculos matemáticos. Contudo, somente em 1956 o instrumento é divulgado no país, com o auxílio do professor Fukutaro Kato. Após ter acesso ao aparelho utilizado pelos japoneses, o professor Joaquim Lima de Moraes escreve o livro Sorobã – aparelho de cálculo para cegos, disponibilizando, então, àqueles que não dispunham mais da visão, um rico material para a aprendizagem da Matemática. O Sorobã passa então, a desempenhar um papel imprescindível no ensino de Matemática ao deficiente visual e Joaquim Lima de Moraes inicia, a partir desse momento, um período de divulgação do novo recurso de aprendizagem para o cego (BRASIL, 2006). 203


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O Sorobã (Figura 2) é composto por eixos verticais divididos por uma barra horizontal, chamada de régua de numeração ou barra central ou barra zero, que apresenta um ponto em relevo, de três em três eixos, que se destinam a separar as classes dos números (unidade, dezena, centena, milhar etc). Os eixos inferiores possuem quatro contas (“bolinhas”) cada e os superiores apenas uma. As contas da parte de baixo da régua de numeração valem uma unidade e as de cima representam cinco unidades. Contudo, essas contas somente têm valor no momento em que estão apoiadas na haste central (TEJÓN, 2007). Figura 2 – O Sorobã

Fonte: http://es.geocities.com/abacosoroban

Para ser utilizado, o Sorobã deve estar posicionado em uma superfície horizontal. Segundo Tejón (2007), as contas inferiores são movimentadas para cima com o dedo polegar e o dedo indicador as afastará da barra horizontal e também moverá as contas superiores. Através deste instrumento, o deficiente visual terá condições de resolver problemas envolvendo adição, subtração, multiplicação, divisão, potenciação, radiciação, exponenciais, logaritmos, M.M.C, M.D.C., trigonometria etc. (TEJÓN, 2007). Os professores de Matemática, que atuam em classes com alunos cegos, nem sempre conseguem ter ao seu dispor todas as ferramentas necessárias para suas práticas pedagógicas. Isso porque nem todos os docentes têm a devida capacitação que possibilite o efetivo uso e manuseio junto ao seu aluno, o que requer dedicação e novas habilidades do professor. Contudo, existem diferentes materiais adaptados que podem ser utilizados e integrados no processo de ensino, que podem auxiliar significativamente os alunos que apresentam deficiência visual, como é o caso da régua, a fita métrica, o transferidor, o esquadro, o quadro de desenho, o kit geométrico e a calculadora sonora. 204


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Na maioria das vezes, o primeiro instrumento utilizado para pequenas medições com o qual a criança tem contato é a régua. Nada mais justo, adaptá-la para que o aluno cego também possa fazer uso desse recurso nas aulas de Matemática bem como em outras disciplinas. A fita métrica adaptada é outro instrumento que pode auxiliar o deficiente visual na identificação do sistema de medidas. Através do transferidor adaptado, o estudante que possui deficiência visual também poderá medir ou traçar ângulos. E para uma aula realmente eficaz do conteúdo de geometria, é de suma importância que o aluno utilize o esquadro. O estudante cego pode fazer uso desse material2 de forma adaptada para que também tenha acesso à medição de ângulos retos e linhas perpendiculares, temas imprescindíveis nas aulas de Matemática. Todos estes recursos são produzidos com pontos em auto-relevo, para que o deficiente visual possa tocar e, assim, fazer a leitura das medidas e ângulos encontrados. Figura 3 – Régua, Fita métrica, Transferidor e Esquadro adaptados

Fonte: A autora.

A Fundação Catarinense tem rica contribuição na confecção e sugestão de materiais que os professores de Matemática podem integrar nas suas aulas para viabilizar a efetiva aprendizagem de alunos cegos. A exemplo dos recursos anteriormente apontados, sugere-se o uso de peças especiais como o Quadro de desenho em relevo com caneta adaptada e um Kit Geométrico. 2

Material(Figura 3) confeccionado pelos servidores da Fundação Catarinense de Educação Especial – FCEE, localizada no município de São José/SC. 205


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O quadro de desenho em relevo com caneta adaptada é produzido através de uma peça retangular emborrachada e com velcro. Já a caneta é adaptada com um dispositivo para encaixar um carretel de lã. Assim, durante o desenvolvimento da atividade, a lã irá se fixando no velcro e o aluno poderá tocar aquilo que foi feito. O Kit Geométrico é composto por quinze formas geométricas feitas de espuma e revestidas de tecido, em diferentes tamanhos. O aluno cego poderá conhecer, também através do toque, as principais figuras estudadas dentro da geometria, e assim, poderá estabelecer as semelhanças e diferenças entre elas. Figura 4 – Peças Especiais: “Quadro de desenho em relevo com caneta adaptada” e “Kit Geométrico”

Fonte: http//www.fcee.sc.gov.br

Para além dos recursos até aqui relacionados, o uso da Calculadora Sonora também tem sido uma boa aliada para aprendizagem de conhecimentos matemáticos de alunos cegos. Certamente, a calculadora é um instrumento muito utilizado nas aulas de Matemática para a resolução de diversos problemas. Agora, através da calculadora sonora (Figura 4), o aluno cego tem a possibilidade de realizar suas operações aritméticas fora do sorobã. O som é emitido cada vez que uma tecla é selecionada. Para realizar a adição 3 + 8 = 11, por exemplo, o aluno apertará na tecla correspondente a cada número e a calculadora “falará” o nome do algarismo, da operação, do sinal de igual e do resultado. Ela “dirá”: “três mais oito, igual onze”. 206


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Figura 5 – Calculadora sonora

Fonte: A autora.

Observa-se que ao longo dos anos, muitas tentativas têm sido realizadas por diferentes pesquisadores, brasileiros ou de outros países, cujo intuito é auxiliar o processo de ensino e aprendizagem de conteúdos matemáticos. Sem dúvida que o uso da calculadora sonora beneficia a aprendizagem dos alunos cegos. Contudo, esta ferramenta tem aplicações limitadas por ter seus recursos enfatizados na utilização de operações matemáticas, o que não é suficiente para que o professor consiga transpor diferentes conteúdos de determinados níveis de ensino. Para tanto, existe também uma ferramenta conhecida como Braimateca (Figura 6), que é um método para o ensino de Matemática a deficientes visuais, desenvolvido pela professora Antonieta Aparecida Gonçalves Pereira Kanso, bacharel em Física pela Unicamp e especialista em Matemática pela mesma universidade. Figura 6 – Braimateca

Fonte: http://styx.nied.unicamp.br:8080/todosnos/imagens/fotos/acess_011.jpg/view.

A Brai­­­­­-ma­­­teca, cujo nome vem da junção de Braille com Matemática, é composta por peças imantadas com códigos e símbolos do alfabeto Braille, formados com alfinetes e uma chapa metálica. As que representam números são quadradas e aquelas que representam letras são retangulares, assim o cego consegue distingui-las apenas pelo toque (KANSO, 2007). 207


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Assim, segundo a mesma autora (2007, p. 7), através deste recurso “o deficiente visual resolve passo a passo uma equação ‘colando’ as peças imantadas na chapa metálica. Ele pode fazer a leitura de qualquer linha, corrigir possíveis erros”. Além da Matemática, outras disciplinas como Química e Física também podem fazer uso da Braimateca, apenas adaptando alguns símbolos e letras que são específicos a cada conteúdo abordado. O Instituto Benjamin Constant, localizado no Rio de Janeiro, atende e capacita os profissionais da área da deficiência visual, assessora escolas e instituições, reabilita os indivíduos com deficiência, também produz material especializado impresso em Braille e publicações científicas que servem de suporte especialmente aos professores de alunos cegos. Uma dessas publicações é a Revista Benjamin Constant, distribuída pelo MEC, que agrupa uma série de artigos de diversas áreas do conhecimento, voltados à educação de deficientes visuais (INSTITUTO BENJAMIN CONSTANT, 2005). Dentre os materiais que são produzidos pelo Departamento Técnico Especializado do Instituto, podem ser destacados alguns específicos da área de Matemática, que são reproduzidos a partir de uma matriz, num equipamento chamado Thermoform: “Relação Circunferência e Diâmetro”, “Eixo Cartesiano”, “Reta Numerada” e “Formas Geométricas Planas”, conforme apresenta a Figura 7. Figura 7 – Materiais em Thermofhorm

Fonte: A autora. 208


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Os jogos como recurso de aprendizagem da matemática de alunos cegos Um exemplo de recurso que o professor pode utilizar para ensinar Matemática tanto ao vidente (pessoa dotada de visão) como ao deficiente visual, garantido assim a inclusão, é conhecido como “Árvore Matemática”. De acordo com a Fundação Catarinense, os objetivos deste material são a ampliação e a estimulação do conceito de número, a exploração das operações de adição e subtração bem como o estímulo do raciocínio lógico do aluno. Outro recurso lúdico que o docente da área de Matemática tem a sua disposição para o ensino de deficientes visuais é o jogo “Brincando com números”, através do qual o aluno cego poderá estabelecer relações dos números com a quantidade correspondente dos objetos que o professor colocará dentro das sacolas de cada algarismo. O jogo “Some e vire” possibilita o desenvolvimento de várias competências do aluno. Através dessa dinâmica, tanto a coordenação motora quanto a habilidade tátil para o reconhecimento dos números poderão evoluir, além do aumento da noção para classificar e conceituar númeral e quantidade. Estes materiais (Figura 8) são confeccionados com tecidos, E.V.A., velcros, palitos, entre outros. Figura 8 – Jogos: “Árvore Matemática”, “Brincando com Números” e “Some e Vire”

Fonte: http//www.fcee.sc.gov.br 209


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Considerações finais Ao longo da história, diversos foram os conceitos formados a respeito da deficiência, sendo nítida a exclusão no meio social, cultural e educacional das pessoas que possuíssem algum tipo de imperfeição. O reconhecimento do deficiente como cidadão digno se deu por meio de estudos científicos, que puderam esclarecer as causas de algumas anomalias. A partir dessas descobertas, formou-se um novo olhar em relação ao deficiente, que passou a ser visto como uma pessoa digna e capaz de viver em sociedade. É fato que aceitar a cegueira e aprender a conviver com ela não é uma tarefa fácil, principalmente para aqueles que a adquiriram depois de adultos. Afinal, é necessário aprender a lidar com situações completamente diferente das quais estavam acostumados e com o processo de reabilitação. Talvez seja um pouco menos doloroso quando essa fatalidade acontece na infância, principalmente quando bebês, pois no decorrer do crescimento vão adaptando-se a sua realidade de forma mais aceitável por eles mesmos. A fim de que haja uma educação inclusiva, é fundamental que os cursos voltados à formação de professores, apontem práticas e métodos pedagógicos que possam ser trabalhados com os deficientes. Para inseri-los no meio educacional, é necessário que a escola ofereça suportes que atendam às necessidades dos que possuem algum tipo de deficiência, disponibilizando educadores capacitados para lidar com deficiências e procure, dessa forma, construir estratégias que favoreçam a aprendizagem para estes educandos. Este trabalho demonstrou que apesar de escassos, existem recursos interessantes que devem ser incorporados pelos professores de Matemática em sala de aula, no intuito de facilitar a aprendizagem para aqueles alunos que apresentem alguma deficiência e, assim, o processo de inclusão seja realmente vivenciado em nossas escolas. O que realmente é válido destacar é que não basta apenas apontarmos os erros e problemas existentes nos métodos utilizados para o ensino de pessoas com necessidades especiais. É necessário e imprescindível tomarmos uma posição frente à realidade de leis regulamentadas, porém inoperantes em nosso país. E que, como profissionais da área de educação, precisamos continuar na luta para que nossos alunos tenham a devida dignidade, sendo eles deficientes ou não, por um presente e futuro que prima pela inclusão e qualidade no ensino. 210


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Gráfico Tabuleiro: a construção e o relato de experiência sobre um jogo no Ensino de Estatística Viviam Giacomelli Pedroso1

Resumo

O

objetivo dessa proposta e relato de experiência é expor um modo alternativo de trabalhar exercícios do conteúdo de Estatística no Ensino Médio e nos cursos técnicos integrados através de um jogo, uma forma que almeja ser mais atrativa aos alunos, conectada com o seu curso de formação e em busca de melhorias de aprendizagem. Esse jogo de tabuleiro teve sua primeira experimentação e ajustes no IFSC Campus Florianópolis e tem sua elaboração, regras e uso totalmente embasados em elementos estatísticos de gráficos, tabelas e medidas de tendência central, visando trabalhar fatores teóricos e práticos do conteúdo, além de abordar o uso da calculadora na unidade curricular. Palavras-chave: Estatística. Ensino Técnico Integrado. Jogos em Matemática. Essa proposta de jogo formulado com conceitos estatísticos teve surgimento a partir da percepção da autora sobre a necessidade de uma abordagem diferente para a aula de exercícios do conteúdo de Estatística nos cursos técnicos integrados do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) Campus Florianópolis. A adoção de diferentes estratégias no processo de ensino tende a proporcionar maior dinamismo e envolvimento dos alunos nas atividades propostas. Além de que, é uma forma que almeja ser mais atrativa aos alunos uma vez que está conectada com o seu curso de formação e corrobora com a busca de melhorias de aprendizagem. O material do jogo foi totalmente produzido com embasamento em elementos estatísticos e visa 1

Professora de Matemática e Estatística do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) - Campus Florianópolis. Licenciada em Matemática. Mestre em Matemática e Computação Científica na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Aplicações Matemáticas (GPAM). Contato: viviam.giacomelli@ ifsc.edu.br 213


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um entendimento de fatores teóricos e práticos do conteúdo, relacionando com o uso da calculadora na unidade curricular. Relativo ao aspecto que envolve os saberes de Estatística, busca-se a definição e perspectiva de Mário Triola (1998, p.2), apresentando que a estatística é uma coleção de métodos para planejar experimentos, obter dados e organizá-los, resumi-los, analisá-los, interpretá-los e deles extrair conclusões. As aplicações da estatística pertencem, direta ou indiretamente, ao cotidiano das pessoas e podem ser exemplificadas de modo vasto. Os fabricantes fornecem melhores produtos a custos menores através de técnicas de controle de qualidade. Controlam-se doenças com auxílio de análises que antecipam epidemias. Espécies ameaçadas são protegidas por regulamentos e leis que reagem a estimativas estatísticas de modificação do tamanho das populações. Visando reduzir as taxas de casos fatais, os legisladores têm melhor justificativa para leis como as que reagem à poluição atmosférica, inspeções de automóveis, utilização do cinto de segurança e da bolsa de ar, e dirigir em estado de embriaguez (TRIOLA, 1998, p. 5).

A atividade em questão teve sua elaboração planejada para ser implementada no curso Técnico Integrado de Química do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) do Campus Florianópolis. Esta proposta de ensino vem sendo implementada e adequada ao longo de três semestres, sendo a autora a proponente, atendendo a orientação de ensino da Assessoria de Matemática que, atualmente, implementa dois Laboratórios de Matemática. Justifica-se a escolha da modalidade técnica integrada, visto que, segundo o Portal IFSC, “são cursos de nível médio realizados em conjunto com o Ensino Médio que objetivam capacitar o aluno com conhecimentos teóricos e práticos nas diversas atividades do setor produtivo” (PORTAL IFSC – Modalidades). Outro ponto a destacar é que, no curso especificamente escolhido, os alunos são capacitados para desempenharem e atuarem em várias frentes e dentre as atividades a serem realizadas por um técnico em Química estão: “ensaios, pesquisas, padronização e controle de qualidade, realizando também amostragens, análises químicas, físico-químicas, bromatológicas, toxicológicas e microbiológicas.” (PORTAL IFSC – Guia de cursos: curso técnico integrado em Química). Todas estas atividades estão intimamente 214


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ligadas com experimentação, o que exige um domínio de conteúdos estatísticos, os quais são trabalhados junto aos alunos durante o curso. Também, a importância da aprendizagem de Estatística na formação do aluno de escola regular tem grande destaque uma vez que é significativamente explicitada nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs (BRASIL, 1998), As habilidades de descrever e analisar um grande número de dados, realizar inferências e fazer predições com base numa amostra de população, aplicar as ideias de probabilidade e combinatória a fenômenos naturais e do cotidiano são aplicações da Matemática em questões do mundo real que tiveram um crescimento muito grande e se tornaram bastante complexas. Técnicas e raciocínios estatísticos e probabilísticos são, sem dúvida, instrumentos tanto das Ciências da Natureza quanto das Ciências Humanas. Isto mostra como será importante uma cuidadosa abordagem dos conteúdos de contagem, estatística e probabilidade no Ensino Médio, ampliando a interface entre o aprendizado da Matemática e das demais ciências e áreas (BRASIL, 1998, p. 45).

Sob outro ponto de vista, Bayer e Echeveste (2003) relatam um fator importante acerca do ensino de conceitos estatísticos, relativo ao aspecto da formação do professor de Matemática para esta área do saber. Isto é, em sua maioria, a quase ausência de contato que o professor de Matemática tem com Estatística durante a sua formação. Esta fragilidade se destaca ao exercer sua profissão, quando precisa ministrar aulas sobre o tema, enfrentando ainda carência de recursos pedagógicos para auxiliá-lo no processo de ensino-aprendizagem. É nesta lacuna que o jogo “Gráfico Tabuleiro” pretende inserir-se e tornar-se uma alternativa para a dinâmica de sala de aula. Vale ressaltar que a aplicação do jogo em uma turma de Ensino Médio regular contribui na tentativa de derrubar um mito de que a utilização de jogos se constitui em perda de tempo e fragiliza a qualidade da aprendizagem dos alunos.

O uso da calculadora nas aulas de Estatística Quanto às recomendações do uso de calculadora no Ensino Médio, os PCNs reforçam que “estudos e experiências evidenciam que a calculadora é 215


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um instrumento que pode contribuir para a melhoria do ensino da Matemática. A justificativa para essa visão é o fato de que ela pode ser usada como um instrumento motivador na realização de tarefas exploratórias e de investigação” (BRASIL, 1998, p.34). A utilização de calculadora ao longo do Ensino Médio deve visar a otimização de tempo e energia consumidos em cálculos repetitivos, priorizando o raciocínio qualitativo sobre o quantitativo ao dar enfoque maior na significação dos dados abordados e na resolução de problemas reais. Desse modo, como, em Estatística, a obtenção de resultados a partir de fórmulas tende a ser demorada para grandes amostras, tem valia apresentar a teoria e fazer manualmente exemplos com pequenas amostras. O maior objetivo, para o aluno, é a compreensão do intuito e da interpretação da definição abordada e dos resultados numéricos obtidos. Para exemplos com grandes amostras, podem-se usar ferramentas estatísticas de uma calculadora científica básica com auxílio de um tutorial para os alunos, no caso, o utilizado consta na Figura 1. Figura 1 - Tutorial para uso das ferramentas estatísticas na calculadora

Fonte: elaborado pela autora. 216


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No caso do curso técnico em Química, o uso da calculadora é de grande ajuda para elaboração de relatórios de unidades curriculares específicas em laboratório, cujos experimentos necessitam de muitas amostras ou exigem cálculos demorados com amostras que necessitam de representação com casas centesimais, caso do pH. Por exemplo, o uso de apenas sete medições, como no Quadro 1, já exemplifica um esforço que não apresenta ganho de aprendizagem no cálculo do desvio padrão manualmente. Em desvio padrão amostral (s), utiliza-se sendo , a média aritmética e n a quantidade de dados observados. Assim, para efetuar esse cálculo de modo manual, o estudante precisaria realizar a seguinte construção do resultado: Quadro 1 – Cálculo do desvio padrão

Fonte: elaborado pela autora.

Os dados apresentados no Quadro 1 são obtidos mediante realização de operações repetitivas as quais tomam expressivo tempo que poderia ser utilizado numa discussão mais enriquecedora sobre o significado e aplicação de desvio padrão, por exemplo. Após essa etapa, ainda faz-se necessário somar os valores da terceira coluna e dividi-los por n-1 para obter s = 0,03. Isso reforça a importância do uso de calculadora para o tratamento de saberes estatísticos. E para tornar o processo de aprendizagem ainda mais dinâmico e atrativo, propõe-se o uso de jogos que instigam o envolvimento dos alunos nas tarefas propostas e tornam a aprendizagem mais cativante.

A estrutura do jogo e o seu momento de aplicação Essa atividade não foi elaborada para ser implementada numa etapa inicial da apresentação dos conteúdos aos alunos e sim uma estratégia de fixação de saberes. Trata-se de um momento de recapitulação e confronto dinâ217


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mico de averiguação dos elementos matemáticos já estudados e apresenta-se como uma alternativa para dinamizar a aula de exercícios e exemplificar de modo prático os conteúdos estudados. A proposta é apresentar o jogo após a teoria de tabelas, gráficos, medidas de tendência central e medidas de dispersão. No caso do curso técnico de Química, podem-se abordar também os conteúdos de distribuição normal e testes Q e F. O jogo de tabuleiro é composto por: (i) um tabuleiro gráfico de barras múltiplas a ser elaborado conforme o andamento do jogo (Figura 2), (i) três cartas de ação impressas para cada equipe (Figura 3), (ii) um guia impresso da atividade, para cada equipe, (iii) um cronômetro (que pode ser de celular) e, (iv) um aparelho de projeção com apresentação de uma seleção de perguntas abordando o tema na área do curso da turma em questão (ou questões retiradas de reportagens, dados do IBGE, entre outros). O tabuleiro, feito em cartolina ou em acrílico, para maior durabilidade, trabalha a interpretação e construção de um gráfico de barras múltiplas, conforme é visto na Figura 2. Usa-se o tabuleiro como um gráfico, pois a pontuação final das equipes é elaborada através de média ou mediana das três barras referentes aos seus três meios de mostrar conhecimento sobre o conteúdo ao longo do jogo (barras de: questões respondidas em até 90 segundos; questões respondidas em até 180 segundos; desafios). Assim pode-se analisar o entendimento do aluno da relação entre informação coletada (valores obtidos pela equipe em cada quesito recém citado) e sua representação gráfica. A escolha por gráfico de barras justifica-se pela proximidade visual entre gráficos de barras e histograma, sendo assim, um dos primeiros discernimentos necessários, por parte do estudante, o entendimento de que os dados não estão organizados em classes, sendo necessária uma leitura da situação exposta para saber que tipo de cálculo ele adotará para obter a pontuação da equipe. A atividade tem a estrutura de um jogo de perguntas e respostas dividido em rodadas tendo duração total de cerca de 1h30min. A partir da experimentação do jogo em sala de aula ao longo de três semestres, foi possível observar que a destinação de cerca de 1h20min para explicação, execução e avaliação da atividade, é uma boa escolha para execução da proposta. 218


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A quantidade ideal de membros por equipe é de quatro alunos, mas nada impede equipes maiores. A formação de muitas equipes traz a desvantagem do jogo ficar mais lento, podendo o aluno ficar ocioso por muito tempo e perdendo foco da atividade. Cada equipe recebe uma versão física dos materiais apresentados nas Figuras 2 e 3 e o conjunto de perguntas sobre o conteúdo fica parcialmente exposto (apenas a pergunta da vez) em uma apresentação de slides via projetor na sala de aula, visível para toda a turma. A escolha da pergunta analisada pela equipe é feita conforme escolha de um número natural que represente o número do slide com uma pergunta ainda não utilizada no jogo. Na falta de projetor, podem-se utilizar cópias em papel das perguntas, porém com o recurso tecnológico a atividade flui de modo mais dinâmico. Figura 2 – Exemplo de gráfico de barras múltiplas a ser elaborado

Fonte: elaborado pela autora.

Cada equipe terá sua vez de responder as perguntas lançadas. No seu turno, a equipe escolhe um número, correspondente a um slide e, consequentemente, a uma pergunta. A pergunta é projetada, lida em voz alta pelo professor e então o cronômetro tem de ser acionado para marcar o tempo de resposta da equipe. A resposta correta, fornecida pela equipe em até 90 segundos, vale dois pontos positivos na respectiva coluna. A resposta correta, dada entre 90 e 180 segundos, vale um ponto na barra de respostas em 219


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até 180 segundos. A resposta errada, apresentada em até 90 segundos, vale menos dois pontos e é computada na primeira coluna de barras da equipe. A resposta errada, entre 90 e 180 segundos, ou caso não fornecida, vale menos um ponto e é computada na segunda coluna de barras da equipe. A seguir, apresentam-se as três cartas disponibilizadas no jogo (Figura 3). Cada carta pode ser utilizada apenas uma vez pela equipe e tem a finalidade de instigar: a formulação de uma resposta bem fundamentada para as perguntas, o interesse das outras equipes enquanto não é a sua vez no jogo e a construção lógica de estratégias para conseguir maior pontuação a partir do gráfico, em relação às outras equipes. Figura 3 – Cartas de ação

Fonte: elaborado pela autora.

Cada equipe tem três cartas de ação em mãos: • PASSO A VEZ: Quando é a vez da equipe responder, ela pode se abster de responder e, neste caso, utilizando essa carta, a sua pontua­ ção na rodada é zero. • DESAFIO: Quando, em seu turno, a equipe exige que outro grupo específico responda a pergunta. A equipe originalmente detentora da vez fica com pontuação nula na rodada e a que responder terá o valor de mais três pontos se respondida corretamente e menos três pontos se respondida erroneamente, sendo marcado na coluna desafio (Figura 2). Tempo para resposta do desafio é fixado em até 180 segundos. • JUSTIFICAR: Pode ser usada fora da vez do dono da carta. Se a equipe questionada mostrar que sabe explicar e elaborar as contas que justificam a resposta fornecida, ganha um ponto. Se não souber, ela perde dois pontos. Essa pontuação constará na barra de desafios de quem foi questionado. O professor julgará a validade da explicação. 220


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Não é necessária a utilização de todas as cartas ao longo do jogo e a pontuação final será obtida a partir de uma medida de tendência central. Essa escolha ocorrerá por sorteio. Para tanto, tem-se as seguintes opções: •

Média aritmética simples entre as pontuações das barras da equipe;

Mediana entre as pontuações das barras da equipe.

A equipe que estiver com a maior medida de tendência central sorteada é a vencedora do jogo. Por exemplo, se, na primeira rodada cada time com suas perguntas respectivas e uso de cartas teve o seguinte desempenho: 1. A equipe A respondeu corretamente em 80 segundos; 2. a equipe B lançou a carta “desafio” com sua pergunta para a equipe D, que acerta a resposta em 140 segundos; 3. a equipe C acertou em 95 segundos a resposta e explicou o raciocínio de modo válido, explicação necessária pois recebeu a carta “justificar” da equipe A; 4. a equipe D usou os 180 segundos e não respondeu, esquecendo que poderia fazer isso com a carta “passo a vez”. Assim, o gráfico apresenta a seguinte evolução no tabuleiro: Figura 4 – Exemplo de construção do gráfico durante o jogo

Fonte: elaborado pela autora. 221


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Até esse momento, na situação simulada, se a pontuação fosse sorteada para ser calculada via média aritmética, o placar seria: 1ª posição: empate entre as equipes A, C e D com pontuação 0,67; 2ª posição: equipe B com pontuação 0. Além de apresentar um guia impresso com as regras do jogo, é interessante que o professor simule esses tipos de situações antes do início do jogo, para melhor entendimento da atividade.

Algumas considerações sobre o jogo A seguir, serão apresentados alguns tipos de perguntas como sugestão a serem utilizadas no jogo, atendendo a especificidade do nível de ensino, o Ensino Médio ou Cursos Técnicos Integrados, no caso o de Química. • Para um público de Ensino Médio regular: 1. “Por que, na escolha do tipo de pontuação da atividade, não há a opção moda?” Pergunta que trabalha com o fator teórico do conteúdo, explorando as diferenças entre os tipos de medidas de tendência central e sua interpretação numa determinada situação. 2. “Para uma emissora de televisão que transmite seu sinal em uma cidade com 5.000 habitantes, realizou-se uma pesquisa sobre pontos de audiência por mês no horário nobre. Se o resultado foi apresentado com auxílio do Gráfico 1, determine o abuso de estatística ocorrido na apresentação dos dados.” Gráfico 1 – Audiência da emissora

Fonte: elaborado pela autora. 222


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Esse modelo de questão lida com o abuso de estatística, fator muito utilizado quando há distorção de dados. É interessante que o aluno perceba a necessidade de se analisar um gráfico antes de confiar na informação que aquela representação visual transmite. 3 - Questões com cálculos de medidas de dispersão, para exercitar o uso da calculadora. • Para um público de Ensino Técnico Integrado (exemplo do curso de Química): 1 – “O esgoto e os poluentes industriais lançados em um corpo de água podem reduzir a concentração de oxigênio dissolvido e afetar negativamente espécies aquáticas. Em um estudo, foram feitas leituras semanais no mesmo local em um rio durante um período de dois meses. Utilize o teste Q para fazer a determinação de rejeição ou não de valor extremo superior em um nível de confiança de 95%.” Tabela 2 – Concentração de oxigênio

Fonte: Questão adaptada do livro Skoog, D.A; West, D.M; Holler, F.J. & Stanley, R.C. Fundamentos da Química Analítica, Tradução da 8ª edição norte americana. São Paulo, Ed.Thomson, 2007.

Esse tipo de questão sobre testes presentes em análises laboratoriais do curso de Química é de extrema valia para a prática do aluno. O teste apresentado no exemplo trata do parâmetro que rege a manutenção ou não de um valor colhido na amostra, valor que se mantido erroneamente pode modificar toda a análise de dados. 223


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2 – “A Associação Brasileira de Indústria Química (ABIQUIM) realizou um levantamento de dados sobre o faturamento da indústria química por setores, de 2010 a 2012 em R$ bilhões. Os dados obtidos constam no Quadro 2: Quadro 2 – Faturamento da indústria química brasileira

Fonte: Associação Brasileira de Indústria Química.

Deseja-se fazer o uso de um gráfico adequado para representar o faturamento nos setores de fibras, tintas, produtos químicos e farmacêutico nesses três períodos. Qual seria uma boa opção de representação gráfica? É interessante levar ao aluno como o mercado de trabalho dessa área descreve seu desempenho através da estatística e pedir a interpretação do estudante diante tal fato. Em todas as etapas da realização da atividade, foi fornecido o acesso às tabelas necessárias (teste Q, teste F, distribuição normal). Essas tabelas são necessárias em alguns testes específicos, pois trazem o valor crítico referencial para a quantidade de dados trabalhados. No caso do exemplo da concentração de oxigênio, se ao realizar seus cálculos, o aluno obtém um valor de Q calculado menor que o valor Q crítico tabelado, então deve manter o dado inspecionado durante o resto da análise. Já sobre o formato escolhido para a atividade, o mesmo atende às orientações sugeridas nos parâmetros curriculares para o ensino da Matemática. De acordo com os PCNs, [...] Os jogos constituem uma forma interessante de propor problemas, pois permitem que estes sejam apresentados de modo atrativo e favorecem a criatividade na elaboração de estratégias de resolução e busca de soluções. Propiciam a simulação de situações problema que exigem soluções vivas e imediatas, o que estimula o planejamento das ações; possibilitam a construção de uma atitude positiva perante os erros, uma vez que as situações sucedem-se rapidamente e podem ser corrigidas de forma natural, no decorrer da ação, sem deixar marcas negativas. (BRASIL, 1998, p. 46) 224


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Ainda discorrendo sob mesma linha de pensamento, Borin (2007) esclarece que a utilização de jogos possibilita amenizar os bloqueios que um estudante possa ter quando exposto à analise e interpretação de um conteúdo. Na presente proposta, houve a motivação para a formulação de uma atividade que possibilitasse o entendimento do uso de gráfico de barras múltiplas, a tomada de decisões sobre que ação escolher para formar gráficos favoráveis para sua equipe tanto para pontuação em média, quanto em mediana, reforço do conteúdo já apresentado em aula, presença de situações do dia a dia da turma e melhoria no modo de uso da calculadora.

Resultados obtidos: análise da experiência A atividade foi executada durante três semestres consecutivos, com turmas distintas de 6ª fase do curso Técnico Integrado em Química do IFSCFlorianópolis, totalizando 50 participantes. Destaca-se que os alunos se envolveram empolgadamente nesta atividade e lhes foi apresentado uma espécie de recompensa no dia da avaliação destes conteúdos para as equipes que ganhassem o jogo. Assim, aos vencedores foi oferecida a possibilidade de anular uma questão da prova, cujo critério de escolha ficava por conta deles ao realizarem a avaliação, visto que já tinham demonstrado empenho e conhecimento sobre o tema. Essa bonificação ajudou na motivação para participação na atividade e, consequentemente, no estudo de preparação para a avaliação que são as aulas de exercícios que a precedem, com enfoque no jogo. Foi interessante observar o processo de argumentação dentro das equipes antes de responderem cada pergunta, que possivelmente tem a ver com esse estudo preparatório para a atividade. Esse momento pode se tornar rico pela troca de ideias, pelo estudo em grupo e surgimento de novas hipóteses. O professor deve incentivar essa interação. Após a realização do jogo, os estudantes receberam um questionário formado por cinco perguntas objetivas e uma discursiva, as quais eram respondidas anonimamente sobre a experiência. Os resultados a estes questionamentos são apresentados a seguir sob a forma de gráficos para as questões de 1 a 5 e a análise para as transcrições das respostas para questão 6. O enfoque abordado nas questões leva em consideração, tanto a importância do uso do jogo enquanto estratégia de ensino, quanto a forma e o tipo 225


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de conteúdos nele abordados. Na primeira questão, deseja-se saber como os alunos perceberam o seu envolvimento no jogo e a devida socialização de suas ideias, como sugere o Gráfico 2. Gráfico 2 – Questão 1: Sobre a discussão e a troca de ideias com colegas no experimento, como você avalia o jogo?

Fonte: elaborado pela autora.

Os alunos aprovaram esta estratégia de atividade aplicada em sala de aula. Sendo que 98% do total de alunos a consideram positiva, pois as discussões que surgem em virtude da adoção desta proposta de metodologia favorece a troca de ideias entre os colegas. A opção de avaliar como ruim também estava disponível, porém não houve aluno que assinalou essa resposta. Ou seja, 64% dos alunos avaliam como excelente o uso do jogo para checarem os seus conhecimentos estudados. Gráfico 3 – Questão 2: Sobre a ideia de como trabalhar o conteúdo, como você avalia a atividade?

Fonte: elaborado pela autora. 226


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Do mesmo modo, os alunos questionados avaliam positivamente a forma como a professora desempenha a organização de apresentação, revisão e fixação dos conteúdos. Para a questão 2, as opções de avaliar como ruim ou razoável também estavam à disposição, porém não houve aluno que assinalou alguma dessas respostas. A maioria dos alunos considera que a adoção desta estratégia é excelente. Gráfico 4 – Questão 3: Você traçou alguma estratégia para uso das cartas de ação?

Fonte: elaborado pela autora.

Nesse item, nota-se que a construção da pontuação em cada barra do gráfico, em sua maioria não foi planejada com antecedência, ou seja, sugere que as cartas foram utilizadas simplesmente por necessidade na rodada e não num pensamento de como tornar a pontuação do seu gráfico vencedor ao fim do jogo. Talvez, seja necessária uma simulação a respeito desse raciocínio antes da realização da atividade. Gráfico 5 – Questão 4: Você acredita que, sob a forma de experimento, a aprendizagem na retomada do conteúdo foi mais efetiva do que seria em uma aula de revisão?

Fonte: elaborado pela autora. 227


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Destaca-se que os alunos consideram muito produtivo o uso do jogo como estratégia de fixação de conhecimentos, pois eles são intensamente envolvidos no processo de revisão dos conteúdos até o momento tratados uma vez que não privilegia uma revisão centrada no professor e com alunos meros espectadores. Tais considerações são referenciadas nas respostas dos alunos, pois 76% deles sinalizaram que a aprendizagem é mais efetiva, conforme sugere o Gráfico 5. Gráfico 6 – Questão 5: Você participaria de outras atividades do gênero?

Fonte: elaborado pela autora.

A questão 5 traduz plenamente que os alunos sinalizam o quanto é importante que o professor lhes proporcione a efetiva participação nas atividades a desenvolver e sugerem que seus professores otimizem mais momentos desta natureza, oportunizando-lhes o uso do jogo ou outras estratégias de ensino. No Gráfico 6, evidencia-se que os alunos gostariam que essa ideia fosse levada para outras atividades de ensino-aprendizagem. O que reforça que há necessidade de investir na formação do professor e apontar diferentes formas de implementar e enriquecer a metodologia pedagógica. Na sequência, são pontuadas as considerações dos alunos relativas às críticas e possíveis sugestões sobre a adoção do jogo para revisão e fixação de conteúdos no ensino de Estatística, de acordo com a questão 6 do questionário. Observa-se que nem todos os alunos deram sugestões. Alguns preferiram falar o que acharam da experiência, ao final da aula. Entre as respostas obtidas, tem-se: “Ter uma atividade dessas para cada prova” (Aluno A). 228


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Para alguns alunos, seria importante que o jogo oferecesse maior número de rodadas e assim seria possível aprofundar a temática abordada até o momento. Entre as citações tem-se a do Aluno B que cita: “Acrescentar mais rodadas. Ficou legal e deu para fazer mais que com a professora explicando questões da lista no quadro. Uso o atendimento pra tirar dúvida de exercício quando faço a lista... aula de exercícios normal não me ajuda... já está tudo pronto”. O aluno C também manifestou o desejo por mais turnos no jogo, “Pelo menos mais duas rodadas”, o que também foi comentado pelo aluno D, um dos poucos a questionar o uso das cartas: “Ter mais vezes pra responder e ser obrigado a usar todas cartas”. Quanto à pontuação, o aluno E sugere uma mudança na pontuação em caso de resposta errada: “O erro valer dois pontos não importa o tempo. Acho injusto quando perde um ponto só.” Sobre a questão da interatividade e forma alternativa de apresentar o conteúdo, o Aluno E trouxe a sugestão de utilizar jogos para a avaliação de construção gráfica computacional, que normalmente a turma faz sob a forma de um trabalho com uso do software GeoGebra: “Usar um jogo assim pra dar nota pra gente pelo que a gente sabe de GeoGebra para estatística no laboratório de informática, fazer trabalho em casa é mais monótono”. Além disso, é citada a troca de ideias como um fator favorável numa aula de revisão/exercícios: “Na aula de exercícios, tem que ficar quieto. Estudo melhor conversando com meus amigos sobre a matéria. Gostei” (Aluno F). Nota-se que a diferença no uso de um tipo de medida de tendência central em relação a outro é um fator sentido na prática ao fim da atividade, como demonstra o Aluno G: “Teria vencido com a média, não cuidei da mediana. Posso jogar outra vez? ” e há relato também sobre a percepção da escolha do tema de perguntas, focada no tipo de formação da turma: “Gostei que os exemplos são para nós. Diminuiu distância entre a matéria teórica e a prática” (Aluno H). Foi recebido o seguinte comentário como ponto negativo: “Ter contagem de tempo me deixa nervosa. Parece prova” (Aluno I), trazendo à tona a reflexão de que o formato de jogo pode ser visto por alguns estudantes com um tipo de atividade que o pressiona, de como o medo de errar está presente na sala de aula, sem que alguns vejam no erro a oportunidade de aprendizado. 229


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Como aponta Bueno (2010), Deve-se tirar proveito de momentos significativos dos jogos, em que obstáculos trazem consigo situações-problema sobre as quais devem ser levantadas hipóteses e tomadas decisões. Os erros e acertos, as vitórias e derrotas são passíveis de análise, momento em que o professor aponta, ou coloca em discussão, os motivos dos sucessos e insucessos no contexto da disciplina, e levanta hipóteses sobre a situação-problema vivenciada. (BUENO, 2010, p. 255)

E sob esse aspecto, houve situações bem sucedidas e mal sucedidas na utilização do jogo. Começando pela mal sucedida, as cartas de ação deveriam ser um ponto a mais de estratégia e discussão nos grupos para aprimoramento de pontuação, mas pelo gráfico da questão 3 é possível ver que esse fator, em sua maioria, não foi notado ou utilizado estrategicamente. Quanto às situações favoráveis, em todas as turmas, houve receptividade ao jogo, sugestões de melhorias, bom desempenho durante a atividade e a prova sobre o conteúdo. Dos 50 alunos, apenas 9 ficaram em recuperação do conteúdo. Uma surpresa foi apresentada na argumentação de alguns alunos sobre o porquê preferiam o jogo à aula normal de exercícios, como pode ser visto na transcrição das sugestões (questão 6). A ideia era gerar uma aula pré prova com formato mais atrativo, mas percebeu-se que para alguns alunos, a aula de exercícios tradicional nem os atingia como um momento de estudo, que esses alunos ganharam mais um espaço de aprendizagem com o jogo. Na estrutura de jogo, o conteúdo teve uma linguagem mais dialógica, se aproximou da realidade do aluno. Os resultados apresentados no questionário mostram que o estudante quer mais contextualização, fazer parte do conteúdo, interagir mais e que precisa perceber com seus erros a possibilidade de outras hipóteses. Quanto a modificações futuras, é preciso fazer melhorias na dinâmica do uso das cartas de ação e a sugestão de levar o jogo para a parte computacional e trabalhar o conteúdo estatístico no software livre GeoGebra, durante a atividade, merece ser estudada e testada para uma metodologia de trabalho favorável.

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Referências bibliográficas ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE QUÍMICA. A Indústria Química. Disponível em: www.abiquim.org.br/a-industria-quimica. Acesso em 03 de junho de 2014. BAYER, A.; ECHEVESTE, S. O desenvolvimento dos conteúdos de estatística no ensino fundamental e médio. II Congresso Internacional de Ensino da Matemática. Canoas, RS, 2003. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: matemática. Brasília:MEC,1998. BORIN, J. Jogos e resolução de problemas: uma estratégia para as aulas de matemática. 6. ed. São Paulo: IME-USP, 2007. BUENO, Fabrício. Jogo Educacional para o Ensino de Estatística. In: IX SBGames. Florianópolis, SC, 2010. PORTAL IFSC. Guia de cursos: Curso Técnico Integrado em Química. Disponível em: https://curso.ifsc.edu.br/info/tecnicointegrado/tecnicointegradoquimica/FLN. Acesso em 02 de janeiro de 2015. ____________. Modalidades: dúvidas frequentes. Disponível em: http://www.ifsc. edu.br/imprensa/duvidas. Acesso em 02 de janeiro de 2015. SKOOG, D. A; WEST, D. M; HOLLER, F. J. & STANLEY, R. C. Fundamentos da Química Analítica, Tradução da 8ª edição norte americana. São Paulo, Ed. Thomson, 2007. TRIOLA, M. F. Introdução à Estatística. 7º Ed., LTC. Rio de Janeiro, RJ, 1998.

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Este livro foi impresso para a Editora Insular em marรงo de 2016.


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