1 minute read

Paris, um dia qualquer

Paris, um dia qualquer

Inverno chegando. Desordem geral. Notícias do Brasil, cartas, pessoas.

Advertisement

Algumas falam, mas não ouvem, cada um com seus problemas. A noite se faz escura e fria, com Dylan ao fundo. O vento gela as orelhas, ouço barulho de tamancos no corredor.

Talvez tua figura apareça mais forte. E talvez eu esqueça. Juro que queria esquecer ao menos um dia, juro, menina. E deixar as coisas a descoberto.

Talvez o ser criança, o te olhar devagar, direto, bonito, triste e cheio de sono. O te dizer, de repente, qualquer coisa ao telefone. Qualquer coisa que já sabes.

Alguém diz não sei na minha frente, num português que parece tcheco. Eu penso no mundo e nas coisas da vida. Nesses mundos que não são nossos. Nessas gentes que nos procuram. Nessa vaga noite de arrepios, cheia de domingos e de Tom.

Vontade de te contar a vida, os sorrisos, as estrelas, o mês de setembro, o menino de olho grande na esquina. Te contar da vontade de tomar vinho, dos olhos arregalados. Das gentes, dos livros, dos discos novos. Das velhas cartas.

Dos planos de viagens para a Índia com a Aninha. Ou do gosto de Liebfraumilch na garganta. Tu, o negro dos dias, a folha pesada. Essa luz incrível de lua cheia, um barulho de domingo à noite, verão.

Tu podias aparecer de repente. Não, é melhor que eu fique sozinha agora. Palavras mortas que eu engulo, gastas. Alguém assobia um velho ar de “Fascination”. Eu me senti sozinha numa quarta-feira de céu azul. De repente, me senti feliz e confusa. E não tinha ninguém para quem contar.

86

O que queres de mim? Te dei meu sorriso, minha tristeza. Meus olhos contra os teus que olham fundo, tentando talvez descobrir alguma coisa. Não descubro, mas adivinho teu segredo. Porque, no fundo, quero que seja igual ao meu.

87

This article is from: