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A RUA DA VILA

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ESTRELA VESPERTINA

ESTRELA VESPERTINA

Nessas velozes, inquietas sombras, Caminhei uma vez ao entardecer, Quando uma gentil e calada moça, Bela caminhou ao meu lado, Sozinha andou ao meu lado Como uma noiva, a beleza a lhe envolver.

Pálida, a lua brilhava, Numa campina próxima orvalhada, Sobre rios calmos e prateados, Sobre as montanhas longínquas e altas Sobre o oceano banhado pelo brilho das estrelas Onde o vento, exausto, jaz.

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Devagar e em silêncio, vagamos Da porta aberta da cabana Sob os longos galhos do olmeiro Para o pavimento que dali pendia; Sob o musgoso salgueiro E o plátano agonizante.

Com uma miríade de estrelas em beleza Enfeitadas, o céu se entrevia, Esperanças exultantes me circundavam, Tal qual a luz serena das estrelas, Tal qual o esplendor brando da noite Da rainha noturna irradiante.

Melodias mansas e agradáveis, Audivelmente, as folhas do olmo sussurravam Como a música distante e murmurada De mares inquietos e adoráveis Enquanto os ventos em cochilo silenciavam Nas flores e árvores perfumadas.

Assombrosa e inusitada beleza Parecia tudo ainda adornar, Enquanto meu amor em fábulas eu narrava Sob os salgueiros à beira do riacho, Poderia o coração se manter calado Sobre o amor que era um sonho invulgar?

Num instante seguimos a vagar Na onda sombria do crepúsculo, Moça silenciosa e desdenhosa, Ao meu lado calmamente a caminhar, Com passada serena e majestosa Coberta de beleza e vaidosa.

Vagamente ao seu lado caminhei, Meus olhos sobre o chão se puseram, Céleres e atentas elas eram, Memórias amargas do passado vieram Caíram sobre mim, como a chuva outonal Sobre as folhas mortas cai, ágil e fria.

Sob o olmeiro nos despedimos, Pela porta da humilde cabana, Nenhuma breve palavra fora Por nossos lábios proferida, E triste fui-me embora Tendo no coração uma ferida.

Devagar, em silêncio, andei Para casa, na noite, sozinho, De uma angústia repentina me cerquei, Tal como na juventude nunca havia sentido. Selvagem desordem, como aquela que vem Quando o primeiro sonho noturno fica perdido.

Agora, as folhas do olmeiro para mim sussurram, Loucas e dissonantes melodias, E intensas canções como sombras Os lamentosos salgueiros atormentam, E os plátanos com suas risadas Na brisa da noite lançam suas zombarias.

O luar outonal triste e pálido Suspira através da ramaria, Cada sombra noturna ou matinal À sombra da minha dor é igual! Luta, coração, esquece tua musa! E, alma, deixa de lado quem te abusa.

SOBRE A OBRA

Comigo a poesia não foi um propósito, mas uma paixão. Edgar Allan Poe

O Corvo, com traduções de Machado de Assis e Fernando Pessoa, abre esta coletânea de poemas de terror e mistério, que reúne 53 histórias de arrepiar com uma estrutura propícia, ilustrações que conversam com a obra, estilo gótico, temas ligados à morte, com tom de mistério escritos pelo mestre do suspense Edgar Allan Poe, um autor romântico norte-americano. Essa obra foi publicada no segundo número da American Review, no dia 29 de janeiro de 1845, em Nova Iorque.

Nesse mesmo ano, o poema ganhou uma edição em formato de livro e suas traduções mais notáveis foram rapidamente se espalhando pelo mundo, contando com a participação de autores célebres como Machado de Assis, Fernando Pessoa e Charles Baudelaire.

Em sua tradução, Fernando Pessoa buscou manter a forma original comas rimas internas e externas, como podemos ver abaixo.

Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste, Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais, E já quase adormecida, ouviu o que parecia O som de alguém que batia levemente a meus umbrais. “Uma visita”, eu me disse, “está batendo a meus umbrais. É só isto, e nada mais.”

Machado de Assis trabalha mais na interpretação do enredo em vez do ritmo, sendo que a versão escrita por Fernando Pessoa é mais fiel ao som do original, com a liberdade de ajustar o que é contraditório na obra em inglês.

A tradução proposta por Machado de Assis dividiu os versos ao meio.

Em certo dia, à hora, à hora Da meia-noite que apavora, Eu, caindo de sono e exausto de fadiga, Ao pé de muita lauda antiga, De uma velha doutrina, agora morta, Ia pensando, quando ouvi à porta Do meu quarto um soar devagarinho E disse estas palavras tais: “É alguém que me bate à porta de mansinho; Há de ser isso e nada mais”.

O poema é narrado por algum homem, não identificado, o que podemos chamar de personagem redonda por conta de sua profundidade psicológica. No início, temos a impressão de que ele é apenas um homem com um pesar profundo, mas, quando conversa com a figura do corvo, paira a dúvida acerca de sua sanidade.

O Corvo trata dos delírios de um homem após a perda de sua amada. À beira da loucura, ele avista um corvo (símbolo de mau agouro e de morte) em sua casa e começa a perguntar-lhe sobre vários assuntos, e para todos recebe a mesma resposta: “nunca mais”. E assim passa a se lamentar amargamente pela perda de sua amada Lenora. Ao fim do poema subentende-se que ele sucumbiu à loucura. O diálogo culmina na última pergunta: se o narrador encontrará novamente sua amada no paraíso, eis a estrofe na tradução de Fernando Pessoa:

“Profeta”, disse eu, “profeta – ou demônio ou ave preta! Pelo Deus ante quem ambos somos fracos e mortais, Dize a esta alma entristecida se no Éden de outra vida Verá essa hoje perdida entre hostes celestiais, Essa cujo nome sabem as hostes celestiais!” Disse o Corvo, “Nunca mais”.

Dessa forma, o poeta acreditava que nada seria mais romântico que um poema sobre a morte de uma mulher. A obra é assustadora ao fazer com que a morte dessa belíssima mulher se transforme em algo poético. Edgar Allan Poe consegue transformar esse tema em um incrível e enigmático poema.

Nesta coletânea de poemas de Poe a tradução poética é mais artística do que técnica, visto que a poesia é, por excelência, de difícil tradução por refletir a visão de mundo peculiar de determinada cultura. Segundo Rónai (1981), “no exercício da tradução poética, mais do que dominar [...] com facilidade um par de línguas, precisamos de inspiração momentânea, de intuição. Quanto maior o domínio que temos de uma língua, mais desenvolvido nosso ‘instinto misterioso’, que nos leva a fazer determinadas escolhas em detrimento de outras, em busca do ideal estilístico.”

OS GÊNEROS LITERÁRIOS

Para melhor compreender uma obra é necessário entender os gêneros literários, que diferenciam um texto literário de um texto não-literário. Comecemos pensando na função de cada um: o literário nos leva à função estética enquanto o não-literário, à utilidade. Ou seja, a literatura nos convida à ficção, ao entretenimento, à arte, enquanto a escrita não-literária nos traz a informação, o convencimento, as explicações.

A linguagem literária é subjetiva, enquanto a não-literária, objetiva. Musicalidade, figuras de linguagem e criatividade estão presentes no texto literário, enquanto no não-literário está a clareza. Enquanto a literatura é baseada na imaginação de quem escreve (inspirando quem lê), a não-literatura se baseia nos fatos.

Há três grandes divisões entre os gêneros literários: o lírico, o narrativo e o dramático. O gênero lírico se caracteriza por textos

poéticos de caráter sentimental, que traz emoções do poeta. O gênero narrativo (que já foi chamado de épico) traz uma história e personagens situados em um tempo e um espaço. Já o dramático se encontra nos textos teatrais que são encenados.

Essa divisão de gêneros foi proposta pelo filósofo grego Aristóteles, que viveu três séculos antes de Cristo, na Antiguidade Clássica. Para Aristóteles, o gênero lírico é como a palavra cantada, o épico (ou narrativo) é a palavra narrada, enquanto o dramático é a palavra representada.

Nessa perspectiva, pode-se afirmar que a escolha do gênero é uma decisão estratégica, pois, ao eleger que gênero usar, o indivíduo analisará qual o gênero que melhor condiz com os seus objetivos. Afinal:

A constituição dos gêneros encontra-se vinculada à atividade humana, ao surgimento e (relativa) estabilização de novas situações sociais de interação verbal. em síntese, os gêneros correspondem a situações de interação verbal típicas (mais ou menos estabilizadas e normativas): cada gênero está vinculado a uma situação social de interação, entro de uma esfera social; tem sua finalidade discursiva, sua própria concepção de autor e destinatário (Rodrigues, 2005, p. 165).

Sobre gênero poético de terror

O subgênero de terror parte da ficção e nada mais é que uma narrativa cujos personagens exploram e despertam seus medos. Um dos principais modos de desenvolver uma história de terror é através de elementos que não possuem uma explicação, ou seja, algo além da realidade. Comumente uma obra de ficção de terror pode ser interpretada como uma metáfora para os grandes medos da sociedade. As antigas origens do gênero foram reformuladas no século XVIII como terror gótico, com a publicação de O Castelo de Otranto (1764) de Horace Walpole.

Este tipo de gênero literário pode como nas demais obras ficcionais, apresentar uma sequência de ações imaginárias como se fossem reais, envolvendo personagens em um determinado tempo e espaço para assustar o leitor. Em certos casos, o terror não passa de um exercício estético que procura, como qualquer obra literária, provocar um efeito em quem o lê. É um misto de incerteza e expectativa sobre o desenrolar dos acontecimentos.

Este recurso literário foi originado do folclore, pois, devido às tradições religiosas, focava a morte, demônios, bruxas, vampiros, lobisomens e fantasmas.

Assim, entre os maiores autores de terror, destacam-se Edgar Allan Poe, que tem espaço garantido entre os jovens, H.P. Lovecraft, Stephen King e Guy.

Como esse gênero segue diferentes vertentes, o autor Lovecraft define o verdadeiro gênero de horror como “algo mais que sacrifícios secretos, ossos ensanguentados ou formas amortalhadas fazendo tinir correntes em concordância com as regras. Há que estar presente uma certa atmosfera de terror sufocante e inexplicável ante forças externas ignotas; e tem que haver uma alusão, expressa com a solenidade e seriedade adequada ao tema, à mais terrível concepção da inteligência humana — uma suspensão ou derrogação particular das imutáveis leis da Natureza, que são a nossa única defesa contra as agressões do caos e dos demônios do espaço insondado”.

O autor Stephen King, também expressa que “a boa história de terror vai se embrenhar no seu centro vitale encontrar a porta secreta para a sala qua você acreditava que ninguém além de você conhecia – como Billy Joel e Albert Camus apontaram, o desconhecido nos amedronta, mas nós adoramos dar uma olhadinha nele às escondidas.”

SOBRE O AUTOR

Edgar Allan Poe, nasceu no dia 19 de janeiro de 1809, é considerado o grande mestre do terror, além de ser o primeiro autor a escrever títulos do gênero policial. Norte-americano, veio de uma família de atores e seu pai, David Poe Jr., abandonou a família em 1810 e depois no ano seguinte sua mãe Elizabeth Arnold Hopkins Poe morreu após o parto da irmã mais nova de Poe, Rosalie. Em 1811, ele foi adotado por Frances Allan e seu marido John Allan, de quem recebeu o nome do meio. Fez seus primeiros estudos em Glasgow, na Escócia, e em um internato em Londres, onde a família se estabeleceu.

O autor começou a publicar poemas na coleção anônima Tamerlane and Other Poems, depois passou a escrever prosas e então começou a publicar em jornais e revistas da época. No ano de 1835, casou-se com sua prima Virginia Clemm que tinha apenas 13 anos de idade. Em 1845 que publicou seu maior sucesso, o poema The Raven (O Corvo). Foi quando seu sucesso se consolidou.

O mestre Edgar Allan Poe também influenciou muitas obras e artistas com os elementos sombrios de suas histórias. Um grande exemplo foi o cineasta Alfred Hitchcock que declarou que Poe ser uma das suas maiores inspirações. Também foram produzidos diversos filmes e séries sobre seus contos como The Following e o filme O Corvo, com versões lançadas em 1935 e 1963. As referências às obras do mestre do terror e até mesmo à sua figura são inúmeras.

Em 1835 Allan Poe tornou-se editor literário da Soltber Literary Messenger. Seu problema com a bebida se agravou, sendo despedido do emprego. Muda-se para Nova Iorque, trabalha em alguns periódicos e escreve suas obras. Em 1847 sua mulher morre, agravando ainda mais o seu vício com o álcool.

Desequilibrado e de uma alma atribulada Poe levou sempre uma vida de miséria e de desespero, mas ao mesmo tempo, foi a maior figura do romantismo americano e o mais universalmente conhecido dos seus escritores. Sua própria vida foi um desses romances vividos que fornecem alta matéria para os romancistas. Poe sempre teve uma vida difícil e por isso era sempre muito parecida com suas histórias - ele teve um final trágico. No dia 3 de outubro de 1849, ele foi encontrado em uma rua, bêbado, em um estado de delírio mental e vestia roupas que não eram dele. Foi encontrado e levado ao hospital de Washington, mas ninguém nunca soube exatamente o que havia acontecido com ele. Mas as últimas palavras de Poe ficaram na existência para motivos de reflexão: “Lord, please, help my poor soul!” (“Senhor, por favor, ajude minha pobre alma!”).

Sobre o tradutor

Adriana Buzzetti, bacharel em jornalismo e letras é tradutora literária, com experiência também no ensino de inglês, gerenciamento, edição e produção de material didático.

Uma líder nata, percebeu que muitas obras importantes para a literatura brasileira, não tinham sido publicadas em português. Então intensificou seu trabalho de tradução para que o público brasileiro tivesse acesso a grandes materiais literários e históricos.

Sobre o ilustrador

Franco de Rosa é desenhista, jornalista, escritor, editor e roteirista de histórias em quadrinhos. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1956. Em 1971, aos 14 anos, começou a fazer tiras de humor para o jornal do colégio. Quatro anos depois estreou na imprensa diária fazendo as tiras de aventuras do cangaceiro Capitão Caatinga. Em seguida fez as séries em quadrinhos Chucrutz, Praça Atrapalhado, Recruta Zero, O Fantasma, Hanna-Barbera, Klik, Vaca Amarela, Eros, Zamor, Ultraboy e Zorro - capa e espada. De 1982 a 1992 foi chargista, articulista sobre quadrinhos e ilustrador dos jornais Folha da Tarde, DCI e Shopping News. Entre 1993 e 2008 foi editor de quadrinhos das empresas Maciota Press, Best News, Nova Sampa, Mythos, Opera Graphica e Editora Escala. De 2000 até atualidade produz revistas e livros de quadrinhos, além de cursos de desenho para diferentes editoras, como autor independente. Desde 2012 se dedica a criação de roteiros e desenhos para adaptações de clássicos da literatura brasileira para os quadrinhos, como Noite na Taverna, O Alienista e Triste fim de Policarpo Quaresma. Foi premiado com vários troféus Angelo Agostini e HQMIX, importantes prêmios nacionais do cenário de histórias em quadrinhos.

Algumas obras de Edgar Allan Poe publicadas no Brasil

Contos Extraordinários de Edgar Allan Poe. [adaptação em quadrinhos de Ronaldo Antonelli e Francisco Vilachã] São Paulo. Editora Caraminhoca, 2020. Contos de Edgard Poe. [tradução Januário Leite]. Colecção ‘Obras Primas - Anthologia Universal’. Rio de Janeiro: Annuario do Brasil, 1926. O escaravelho de ouro e Os assassinios da rua Morgue. Edgar Allan Poe. [tradução Álvaro Pinto de Aguiar; ilustrações E. Grandeit]. São Paulo: Melhoramentos, c. 1928. Edgar Allan Poe - ficção completa: poesias & ensaios. [organização, tradução e anotações Oscar Mendes com a colaboração Milton Amado; prefácio Hervey Allen]. Porto Alegre: Globo, 1944. Contos de imaginação e mistério. Edgar Allan Poe. [tradução Aurélio Lacerda]. Rio de Janeiro: Pinguim, 1947. O fantasma da rua Morgue. Edgar Allan Poe. [tradução Frederico dos Reis Coutinho]. Rio de Janeiro: Vecchi, 1954. Histórias extraordinárias. Edgar Allan Poe. [seleção e tradução José Paulo Paes]. São Paulo: Cultrix, 1958. Antologia de contos de Edgar Allan Poe. [seleção e tradução Brenno Silveira]. São Paulo: Civilização Brasileira, 1959. Poemas e ensaios. Edgar Allan Poe. [organização e tradução Oscar Mendes e Milton Amado; revisão Carmen Vira Cerne]. Porto Alegre: Globo, 1960. O corvo. Edgar Allan Poe. [tradução Benedicto Lopes]. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1970. O passageiro clandestino (Arthur Gordon Pym). Edgar Allan Poe. [adaptação Marques Rebelo]. Rio de Janeiro: Tecnoprint, 1973. Contos escolhidos. Edgar Allan Poe. [tradução Oscar Mendes e Milton Amado]. Rio de Janeiro: Editora Globo, 1985. Eureka. Edgar Allan Poe. [tradução Marilene Felinto; introdução Julio Cortázar]. São Paulo: Max Limonad, 1986. O corvo: em quadrinhos. Edgar Allan Poe. [adaptação Luciano Irrthum]. O gato preto e outros contos. Edgar Allan Poe. [tradução Guilherme da Silva Braga]. São Paulo: Hedra, 2009.

Impressão e acabamento Oceano Indústria Gráfica e Editora Ltda

O Corvo é um dos poemas mais famosos da história. Publicado pela primeira vez em janeiro de 1845, foi traduzido e tornou-se conhecido em diversos idiomas. Apresenta um ritmo de perfeito equilíbrio entre a sonoridade das palavras em rima e a narrativa dramática para contar sobre a visita misteriosa do pássaro a um homem que sofre a perda da mulher amada.

Assustador e comovente ao mesmo tempo, este poema é a porta de entrada para o universo de Edgar Allan Poe, autor norte-americano cuja obra, especialmente por seus poemas e contos, é consagrada mundialmente. Neste livro apresentamos uma coletânea de mais de cinquenta poemas escritos por aquele que é considerado por muitos o mestre da literatura de terror.

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