Revista Fundações Ed.78

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Ano 7

Março de 2017

Nº 78 R$ 27,00

www.revistafundacoes.com.br

OBRAS GEOTÉCNICAS EM ÁREAS DE MINERAÇÃO Saiba como barragens, estradas e terraplenagem para áreas industriais podem ser executadas em solo com materiais granulares

BETONEIRAS: papel importante na construção civil

AVALIAÇÃO E GESTÃO de risco ambiental: importância para empresas

MULHERES NA GEOTECNIA: desafios e avanços



EXPEDIENTE www.revistafundacoes.com.br Rua Leopoldo Machado, 236 – Vila Laís CEP: 03611-020 São Paulo - SP Telefone: (11) 2641-0871 / (11) 95996-6391 *Telefone celular com atendimento também por WhatsApp: das 10h às 18h CONSELHO EDITORIAL São Paulo • Paulo José Rocha de Albuquerque • Roberto Kochen • Álvaro Rodrigues dos Santos • George Teles • Paulo César Lodi • José Orlando Avesani Neto Eraldo L. Pastore • Sussumu Niyama • Fernando Henrique Martins Portelinha Minas Gerais • Sérgio C. Paraíso • Ivan Libanio Vianna Pernambuco • Stela Fucale Sukar Bahia • Moacyr Schwab de Souza Meneze • Luis Edmundo Prado de Campos Rio de Janeiro • Bernadete Ragoni Danziger • Paulo Henrique Vieira Dias • Mauricio Ehrlich Alberto Sayão • Marcio Fernandes Leão Distrito Federal • Gregório Luís Silva Araújo • Renato Pinto da Cunha • Carlos Medeiros Silva • Ennio Marques Palmeira Rio Grande do Sul • Miguel Augusto Zydan Sória • Marcos Strauss Rio Grande do Norte • Osvaldo de Freitas Neto • Carina Maia Lins Costa • Yuri Costa Espírito Santo • Uberescilas Fernandes Polido Associações que apoiam a revista

Fundador e idealizador: Francisjones Marino Lemes (in memoriam) Coordenação editorial e marketing: Jenniffer Lemes (jenni@rudders.com.br) Colaboradores: Gléssia Veras (Edição); Dellana Wolney, Dafne Mazaia (Texto); Rosemary Costa (Revisão); Patricia Maeda (Projeto Gráfico); Elisa Gomes (Arte); Melchiades Ramalho (Artes Especiais) Contatos Pautas: glessia@revistafundacoes.com.br Assinaturas: assinatura@revistafundacoes.com.br Publicidade: publicidade@revistafundacoes.com.br Financeiro: financeiro@revistafundacoes.com.br Foto de capa: Divulgação Maccaferri Impressão: Gráfica Elyon Importante • A Revista Fundações & Obras Geotécnicas é uma publicação técnica mensal, distribuída em todo o território nacional e direcionada a profissionais da engenharia civil. Os artigos assinados são de expressa responsabilidade de seus autores e não refletem, necessariamente, a opinião da revista. Todos os direitos reservados à Editora Rudder. Nenhuma parte de seu conteúdo pode ser reproduzida por qualquer meio sem a devida autorização, por escrito, dos editores. • A publicação segue o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. • Esta publicação é avaliada pela QUALIS, conjunto de procedimentos utilizados pela CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e encontra-se atualmente com classificação B4. • As seções “Coluna do Conselho”, “Artigo” e “Opinião” são seções autorais, ou seja, tem o conteúdo (de texto e fotos) produzido pelos autores, que ao publicarem na revista assumem a responsabilidade sobre a veracidade do que for exposto e o devido crédito as fontes utilizadas.

www.anatec.org.br COLUNA DO CONSELHO Márcio Leão: marciotriton@hotmail.com

REPORTAGEM – BETONEIRAS Aperan: imprensa.aperan@inpresspni.com.br

Márcio Leão: marciotriton@hotmail.com Marcus Vinicius: marcus.geologia@yahoo.com.br

OPINIÃO Jose Lopes: zelopes41@gmail.com

GEOTECNIA AMBIENTAL Roberto Roche robertoroche@rroche.com.br

ENTREVISTA Carlos Medeiros Silva: www.embre.com.br

ARTIGO 1 Vinícius Rocha Gomes Pereira: rgp4vinicius@gmail.com José Orlando Avesani Neto: avesani.neto@geosolucoes. com.br Fagner Alexandre Nunes de França: fagneranfranca@gmail.com

O QUE HÁ DE NOVO – CRYOCRETE Empresa Air Liquide https://www.airliquide.com/pt-br/brasil

HISTÓRIA Arcelor Mittal: www.brasil.arcelormittal.com.br

ARTIGO 2 Débora Cristina Ferreira: deborac.ferreira@hotmail.com Thiago Bomjardim Porto: porto@pucminas.br Carlos Roberto da Silva: engcarlos2015@hotmail.com DESTAQUE Site oficial: http://abef.org.br/

NOTÍCIA 1 http://brasil.arcelormittal.com.br/ NOTÍCIA 2 – MULHERES NA CONSTRUÇÃO Maki da empresa Neomatex: www.neomatex.com.br/ Cassia M. Dinelli de Azevedo: cassia.abms@gmail.com

LIVRO Editora EdUERJ: www.eduerj.uerj.br NOTAS 4º CBT: 4cbt.tuneis.com.br Ana Cristina Sieira: www.abms.com.br/category/nucleos/ rio-de-janeiro/

EM FOCO – OBRAS GEOTÉCNICAS – MINERAÇÃO Eduardo Antonio Gomes Marques: eagmarques1965@gmail.com Sander Elias – Maccaferri: https://www.maccaferri.com/br/ Fabiano Sossai – Empresa Geoestável: http://www.geoestavel. com.br/

Fundações e Obras Geotécnicas

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EDITORIAL MÊS DAS MULHERES

O dia 8 de março é comemorado como “Dia Internacional da Mulher”. A ideia de criar o Dia da Mulher surgiu no final do século XIX e início do século XX nos Estados Unidos e na Europa, no contexto das lutas femininas por melhores condições de vida e trabalho, e pelo direito de voto. Em 26 de agosto de 1910, durante a Segunda Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, a líder socialista alemã Clara Zetkin propôs a instituição de uma celebração anual das lutas por direitos das mulheres trabalhadoras. Nessa edição, a revista Fundações & Obras Geotécnicas apresenta uma matéria sobre o papel e a atuação das mulheres na engenharia geotécnica, os desafios que enfrentam e as barreiras que querem vencer. Esse mês é muito especial para nós aqui da editora, pois a nossa equipe que majoritariamente composta por mulheres se sente honrada por fazer parte da história de trabalho e luta das mulheres no Brasil: Gléssia Veras (Editora), Dellana Wolney (Repórter), Dafne Mazaia (Repórter), Rosemary Costa (Revisora), Elisa Gomes (Designer) e Jenniffer Lemes (Coordenadora Editorial).

DICA – ESTUDANTE

Freepik

Você já ouviu falar da Técnica Pomodoro? Elaborada no fim da década de 1980, o método se baseia na ideia de que fluxos de trabalho divididos em blocos podem melhorar a agilidade do cérebro e estimular o foco. Essa técnica trabalha com períodos de 25 minutos como sendo o tempo ideal para esses blocos, também conhecidos como “pomodoros”. O site “E Guia do Estudante” fez uma matéria explicando como funciona esse método que pode ajudar muitos estudantes a melhorarem a concentração, confira: https://goo.gl/PBy7Dk

DA REDAÇÃO

PATOLOGIAS DAS FUNDAÇÕES Na edição de número 80 da revista (maio), a seção “Em Foco” irá abordar as patologias das fundações que nem sempre são possíveis de serem identificadas durante a elaboração do projeto estrutural, em razão de diversas situações, tais como: comportamento do solo, execução das fundações, ações pós-conclusão das fundações e degradação dos materiais constituintes. Participe! Envie um e-mail para: glessia@revistafundacoes.com.br

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Fundações e Obras Geotécnicas

mídias sociais www.facebook.com/editorarudder twitter.com/fundacoes_news htpps//goo.gl/EC5eMb htpps//goo.gl/nZ7JEJ www.linkedin.com/company/editora-rudder soundcloud.com/editora-rudder issuu.com/editorarudder


EDITORIAL NESTA EDIÇÃO

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16 DESTAQUE

ABEF apresenta prêmio “Personalidade de Destaque” de 2016 e lança a nova edição do Manual de Fundações

20 REPORTAGEM

Betoneiras exercem papel importante na construção civil

24 NOTÍCIA

20 24

Energia eólica representa 6% do total produzido por todas as fontes no Brasil

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Fundações e Obras Geotécnicas

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OPINIÃO Paradigmas de campo x ensaios de laboratório

74 GEOTECNIA

AMBIENTAL Avaliação e gestão de risco ambiental devem estar em consonância com as atividades empresariais

26 NOTÍCIA

“Isso é coisa de mulher”

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ARTIGO Reforço com geossintéticos e solo grampeado: uma solução geotécnica eficiente

42 ARTIGO

Estruturas ancoradas e suas aplicações na geotecnia

56 O QUE HÁ DE

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EM FOCO Obras geotécnicas em áreas de mineração

NOVO Tecnologia utiliza nitrogênio para acelerar resfriamento do concreto de forma eficaz e sustentável

SEÇÕES

04 Jogo Rápido 06 O setor em números 08 Coluna do Conselho 10 Entrevista – Carlos

Medeiros Silva

32 Notas 54 História 78 Livro 79 Agenda


Jogo Rápido

por Dafne Mazaia

Arquitetura japonesa

Novos rumos dos aeroportos

Uma das cidades mais cosmopolitas do mundo, Tóquio, no Japão, será a responsável por sediar os Jogos Olímpicos de 2020. O país decidiu homenagear a tradição da arquitetura japonesa com obras que remetam a ela, por isso, tanto a madeira como o concreto serão os materiais mais empregados nas construções. Para enaltecer os templos xintoístas, por exemplo, o estádio olímpico terá uma cobertura em madeira. No entanto, o comitê organizador preocupa-se em não sair do orçamento estipulado. A arquiteta iraquiana Zaha Hadid – que faleceu em março de 2016 – havia planejado um projeto que custaria 2,08 bilhões de dólares, aproximadamente 7 bilhões de reais. Em outubro de 2015 o governo japonês renunciou ao projeto e conseguiu economizar um bilhão de reais. A nova planta é de autoria do arquiteto japonês Kengo Kuma, responsável por idealizar um desenho que homenageie os templos japoneses. Para permanecer com o orçamento estabelecido, o comitê decidiu modernizar as instalações utilizadas nas Olimpíadas de 1964. Na época, a cidade investiu em estradas, linhas de trem e metrô, o que resultou em 4% do PIB (Produto Interno Bruto) do Japão.

A era dos aeroportos futuristas começou e diferente do que alguns filmes clássicos de Hollywood previam, com táxis flutuantes e luzes fluorescentes, as construções prezam pela funcionalidade e arquitetura. O aeroporto de Pequim, na China, cuja construção foi concluída em 2007, um ano antes dos Jogos Olímpicos foi o empreendimento que abriu as portas para esses projetos em aeródromos. No terminal de Kuwait, no Oriente Médio, por exemplo, há fontes fotovoltaicas que abastecem o sistema de ar-condicionado da construção, com isso, o empreendimento recebeu certificação LEED (Leadership in Energy and Environmental Design) de ouro. Seguindo essa tendência, três dos maiores escritórios de arquitetura do mundo resolveram se unir para elaborar um novo terminal para Londres (Inglaterra). A previsão é que o aeroporto leve aproximadamente 16 anos para ser concluído e se tornará o maior do mundo e com a edificação mais sustentável que existe.

Estudantes do departamento de Belas Artes, da Universidade de Kassel, na Alemanha, desenvolveram um projeto que está chamando a atenção da comunidade de engenharia civil pelo mundo. A proposta original da criação dos alunos era unir uma obra de arte com elementos da construção civil. Sob as orientações do professor Heike Klussmann, os estudantes revestiram um bloco de concreto com corantes orgânicos, que foram retirados de algumas frutas cítricas. Depois de um tempo eles notaram que, além do efeito estético, o material também estava gerando energia. A inusitada placa solar de concreto tem como agregado partículas fotorreativas, que são aplicadas como uma argamassa sobre o concreto e estimulam um processo eletroquímico, quando expostas à luz. O material ainda está em fase de pesquisas e está sendo considerado uma revolução para fachadas de edifícios, devido à sua dupla função: como objeto de decoração e como uma bateria para absorver a energia do sol e transformar em energia.

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Fundações e Obras Geotécnicas

Free Images

Arte e captação de energia solar


Jogo Rápido

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Fundações e Obras Geotécnicas


O setor em números

IGMI-C ÍNDICE GERAL DO MERCADO IMOBILIÁRIO – COMERCIAL

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por Dafne Mazaia

Dando continuidade à sequência programada de divulgações, o IGMI-C está sendo atualizado com informações referentes ao quarto trimestre de 2016. Neste período o índice é calculado a partir de uma amostra composta por 534 imóveis.

RESULTADOS

A série completa do IGMI-C está apresentada na tabela abaixo, expressa em termos dos números-índice para as três versões do indicador, com base 100 no primeiro trimestre de 2000.

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A evolução das taxas de variação trimestrais para com relação ao trimestre anterior. A taxa de retorno anuaas três versões do índice pode ser visualizada no grá- lizada continuou a tendência de redução observada desde o último trimestre de 2013, representada no gráfico abaixo. fico abaixo.

No terceiro trimestre de 2016, as taxas de retorno da renda, capital e total foram de, respectivamente, 2,03%, -0,13% e 1,90%, sobre o trimestre anterior. A taxa de retorno do capital apresentou o terceiro trimestre seguido de queda, desta vez com magnitude ligeiramente menor com relação à do terceiro trimestre de 2016. Mesmo com esta nova queda na taxa de retorno do capital no trimestre, a taxa de retorno da renda desacelerou

No quarto trimestre de 2016, as taxas anualizadas de retorno da renda, capital e total foram de, respectivamente, 8,70%, -0,21% e 8,47%. A taxa anualizada de retorno do capital apresentou neste trimestre o primeiro resultado negativo desde o início da série histórica do IGMI-C. A reversão da tendência de queda das taxas anualizadas de retorno do setor imobiliário comercial continua condicionada à retomada do crescimento do nível de atividade econômica nos próximos trimestres.

Possui mestrado em economia pela USP (Universidade de São Paulo) e doutorado em economia pela University of Illinois, nos Estados Unidos. Atualmente é coordenador do IPC (Índice de Preços ao Consumidor) Brasil do FGV/IBRE (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) e também é professor da FGV, onde ministra aulas em cursos de graduação e pós-graduação.

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Divulgação FGV / IBRE

> PAULO PICCHETTI


Coluna do Conselho

DESINCENTIVO À CIÊNCIA E A NOVA GERAÇÃO DE PESQUISADORES, O QUE ESPERAR?

Arquivo Pessoal

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>MARCIO FERNANDES LEÃO é geólogo, com MBA em gerenciamento de projetos pela USP (Universidade de São Paulo), mestre em geotecnia pela UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), mestre e doutorando, em geologia de engenharia e ambiental, pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Atualmente é pesquisador do LEMETRO-UFRJ (Laboratório de Mecânica e Tecnologia das Rochas), com ênfase em mecânica das rochas, solos e ensaios laboratoriais. É membro de várias associações técnico-científicas dentre elas, ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica) e ABGE (Associação Brasileira de Geologia de Engenharia e Ambiental).

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Vivemos a “Era do Conhecimento”. A grande produção de informações facilitada por distintos e expeditos meios de comunicação rompem barreiras, integrando as pessoas. A necessidade de manter-se atualizado é constante e desta forma, ou aceitamos que somos eternos aprendizes, ou ficamos à margem das oportunidades. Excetuando o autodidatismo, diversas formas de prolongar o aprendizado são disponíveis, desde especializações mais rebuscadas e específicas como também o MBA (Master of Business Administration), direcionados a profissionais mais atuantes em empresas. Para aqueles que detêm um perfil mais acadêmico, os cursos de pós-graduação são os mais indicados. Graças à firmação desses cursos, tradicionalmente responsáveis pelo aprimoramento científico, formação de pesquisadores e futuros docentes, existe a pesquisa científica. A crise atual, em diversas esferas econômicas brasileiras, elevou o índice de desemprego, principalmente em setores técnicos. Distintos profissionais têm sido atraídos aos cursos de mestrado e doutorado, basicamente por dois motivos: o primeiro remete a uma busca pelo aperfeiçoamento até que os “tempos melhorem”, considerando que esses cursos são economi-

camente mais acessíveis comparados a cursos de especialização; um segundo atrativo, são as bolsas oriundas de agências de fomento e projetos de pesquisa, disponibilizadas, que apesar de restritas e com valores insuficientes, acabam sendo uma última alternativa à fonte de renda. Anteriormente, o perfil dos candidatos aos cursos stricto sensu eram recém-graduados aspirantes à carreira científica. Atualmente, apesar da candidatura de recém-graduados, no geral indecisos ante a falta de perspectiva profissional, existe um maioritário número de candidatos que não seguiram a carreira acadêmica e têm suas experiências consolidadas na prática profissional. Essa grande injeção de empirismo em ambientes teóricos anunciaria um novo perfil de pesquisador? Como está a realidade científica brasileira? Em 2016 um artigo publicado pelo The Journal of Physical Chemistry, intitulado Research Landscape in Brazil: Challenges and Opportunities, o autor explicita o cenário científico no Brasil e alguns dados chamam a atenção. (i) O Brasil iniciou tardiamente seus incentivos na pesquisa e tecnologia e, mesmo assim, entre 2009 a 2013, ocupou a 13° posição no ranking mundial em produção


Coluna do Conselho

científica; (ii) Dentre as áreas responsáveis pelo mérito destacam-se as Ciências Agrárias e Ciências da Saúde; (iii) De toda a produção, 50% é oriunda do Estado de São Paulo; (iv) O Fator de Impacto das revistas escolhidas para publicação, mesmo que obtido por métodos subjetivos, é abaixo da média mundial. Os maiores desafios a serem enfrentados pela geração atual e futura, de estudantes e pesquisadores, é garantir o crescimento científico dos últimos tempos, publicando em revistas que denotem elevado fator de impacto, além da transformação do conhecimento em tecnologia inovadora. Tais desafios são dependentes das políticas governamentais, fomento à pesquisa e parcerias entre as universidades e setores públicos e privados. Os novos pesquisadores estariam dispostos a assumir esta responsabilidade considerando as políticas governamentais atuais de incentivo à ciência e tecnologia? Não adianta apenas injetar recursos em nossos pesquisadores e nas estruturas de pesquisa, apesar de ser premissa fundamental. É necessário que a sociedade pense, acredite e confie que a ciência lhe proporcionará o verdadeiro progresso. O que esperar do Brasil, um país com ciência ou um país com cientistas? 9

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Entrevista

O encanto pelas aventuras da geotecnia Maravilhado pelos desafios que a ciência proporciona, Carlos Medeiros Silva tem quase 30 anos de carreira marcados por dedicação e amor à profissão por Dafne Mazaia Fotos: Acervo pessoal

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CARLOS MEDEIROS SILVA

arlos Medeiros Silva nasceu em Campina Grande (Paraí­ ba), em junho de 1966. Sua formação iniciou-se em 1981, quando ingressou no curso técnico em estradas na ETFPB (Escola Técnica Federal da Paraíba). Realizou graduação em engenharia civil na UnB (Universidade de Brasília), em 1989 e fez doutorado em geotecnia no Programa de Pós-Graduação em Geotecnia da Universidade de Brasília, em 2011. Atualmente é coordenador das Comissões Técnicas da ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica), diretor-técnico da EMBRE Engenharia e Fundações Ltda., e do LTEC (Laboratório Técnico de Engenharia Ltda). Já foi coautor de dois livros da área e tem mais de 40 trabalhos técnicos publicados. Já ganhou duas premiações do setor, o Prêmio Professor José Henrique Feitosa Pereira, do Prêmio Costa Nunes da ABMS e o Prêmio CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) Inovação e Sustentabilidade Falcão Bauer. Possui experiência na engenharia geotécnica e já realizou quase 3.000 trabalhos de consultoria, elaboração de projetos e execução de obras. Como surgiu o interesse pela engenharia? Durante a minha adolescência eu fui algumas vezes visitar os meus tios engenheiros rodoviários em Manaus (Amazonas). Um deles, o engenheiro Armando Medeiros, era o chefe do primeiro distrito rodoviário do DNER (Departamento Nacional de Estradas de Rodagem) e, algumas vezes ele me levou para acompanhá-lo em suas visitas técnicas nas frentes de trabalho, eu me recordo de duas delas na BR-319 e na BR-230 (Transamazônica).

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Entrevista

Carlos Medeiros aos cinco anos de idade no Jardim de Infância

Naquela época não era o interesse pelas obras rodoviárias e pela engenharia que me fascinava, o que me atraia era o interesse pelo novo e pela aventura, pois chegar aos canteiros de obras era uma odisseia. Viajávamos em aviões monomotores ou de carro passando por florestas virgens, animais selvagens, índios, estradas enlameadas, pontes e “pinguelas”. Anos depois, eu descobri que no Amazonas eu tive contato com os primeiros problemas e soluções geotécnicas, pois presenciei a execução de aterros sobre solos moles, rupturas profundas, substituição de solo, execução de fundação de pontes em estacas de madeira, entre outros problemas e soluções. A partir daquelas experiências eu decidi que seria um engenheiro civil, especificamente um engenheiro rodoviário. Quais foram as suas influências para essa escolha? 11

Fundações e Obras Geotécnicas

Com os colegas da turma de engenharia, em uma visita à Usiminas (Minas Gerais), em 1988

A influência veio dos meus tios e parentes, pois eu tenho quase uma dezena de engenheiros civis na família. Fato que nos orgulha, pois apesar de serem oriundos de uma família humilde, eles venceram as dificuldades por meio da busca do conhecimento e do trabalho. Outro fato determinante foi a facilidade que eu tinha com as ciências exatas, logo naturalmente nos tempos de colégio eu me dedicava às exatas (matemática e física). Conte-nos um pouco sobre a sua formação acadêmica. A minha formação iniciou-se em 1981 ao ingressar no curso técnico em estradas na ETFPB (Escola Técnica Federal da Paraíba). Naquela época cursávamos as disciplinas curriculares do segundo grau no período da manhã e as disciplinas referente ao curso técnico no período da tarde (projeto de estradas, topografia, labo-

ratório de solos etc). Com o diploma de técnico de estradas, eu retornei para Brasília (Distrito Federal) e em 1984 iniciei o curso de engenharia civil na Universidade de Brasília, período que coincidiu com o início do PPGG (Programa de Pós-Graduação em Geotecnia) da UnB (Universidade de Brasília), composto por motivados professores cujas competências se complementavam. Foi nesse ambiente que em 1986 eu conheci e comecei a trabalhar com o professor José Camapum de Carvalho, inicialmente como aluno, bolsista, orientado e, por fim, como sócio, nós construímos ao longo de três décadas uma relação fraternal de respeito e amizade. Finalmente em 2009 eu entrei no doutorado no PPGG da Universidade de Brasília para consolidar a minha trajetória e participação em algumas pesquisas geotécnicas realizadas no Distrito Fe-


Entrevista

auferido ao autor da melhor Tese de Doutorado defendida em instituição brasileira e o do Prêmio CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) Inovação e Sustentabilidade Falcão Bauer concedido pelo órgão, ao autor da melhor pesquisa aplicado à prática da construção civil.

Um projeto e consultoria de cortina de contenção realizado pelo engenheiro

Recebendo o Prêmio CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), na categoria ‘Pesquisa’, com os professores e amigos José Camapum e André Brasil

deral, fato que já tinha sido reconhecido em 2003 ao ser agraciado com o Prêmio Professor José Henrique Feitosa Pereira, pelas contribuições ao desenvolvimento das pesquisas geotécnicas no Distrito Federal. 12

Fundações e Obras Geotécnicas

Eu concluí o doutorado em 2011 e em 2012 eu recebi o reconhecimento da academia e da indústria, por meio do Prêmio Costa Nunes da ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica),

Quais são as suas experiências com projetos e trabalhos na área de engenharia civil? A minha vida profissional sempre esteve diretamente ligada à iniciativa privada. Em 1988 eu consegui o meu primeiro emprego em uma empresa geotécnica para liberar tubulões, acompanhar a execução de sondagens e ajudar na elaboração dos projetos de fundações e contenções, trabalhos sempre supervisionados pelo excelente engenheiro geotécnico Francisco Oliveiro. Essa convivência com ele contribuiu para o meu crescimento técnico e profissional. Em 1993, eu abri a minha primeira empresa, a Consultec Engenharia Geotécnica que se fundiu em 1995 com a Embre Engenharia e Fundações, dos engenheiros Renato e Cristiane Dias, meus sócios até a presente data. Nessa época eu trabalhei para o metrô de Brasília como terceirizado da empresa Bureau de Projeto, realizando sondagens, amostragens e participando da instrumentação sob a supervisão do engenheiro André Yassuda. Ali eu aprendi que o bom desempenho de uma obra geotécnica inicia-se com a execução de sondagens confiá­ veis, sendo necessário, muitas vezes, ensaios especiais para subsidiar o proje-


Entrevista

to e, por fim, eu também aprendi que a execução e o desempenho da obra deve ser monitorado e controlado. Esse aprendizado foi fundamental, pois ainda jovem eu pude incorporá-lo à minha conduta profissional e empresarial. Recentemente, em 2011, em sociedade com o Professor Paulo Viana, eu fundei o LTEC (Laboratório Técnico de Engenharia). O espaço foi idealizado dentro do Laboratório de Geotecnia da UnB, nós nos encontrávamos no laboratório durante a noite para realizar a campanha de ensaios das teses e estudar. Não posso aqui esquecer da colega geóloga Angela Almeida (in memoriam), pois ela sempre esteve presente naquelas longas madrugadas. As duas empresas quando associadas oferecem ao mercado a diversidade do conhecimento para solucionar os mais variados problemas geotécnicos e estruturais, por exemplo, o projeto e execução de complexas estruturas de contenção e fundações, a recuperação geotécnica e estrutural de barragens, entre outros. É evidente que ao longo dessas quase três décadas muitos obstáculos tiveram que ser ultrapassados e nem tudo aconteceu como planejado, mas todas as experiências e situações sempre trouxeram um novo aprendizado. Como é atuar como coordenador das Comissões Técnicas da ABMS? A minha participação na ABMS iniciou-se com o trabalho dentro do Núcleo Regional Centro-Oeste, onde fui presidente por quatro anos. Apesar de ser voluntário, o meu trabalho dentro da ABMS foi remune13

Fundações e Obras Geotécnicas

Com os amigos da ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica), Paulo Henrique, Nadir Dias, Anna Laura Nunes e Alberto Sayão

rado com novas e sinceras amizades que surgiram nas reuniões, palestras e congressos. A minha atuação iniciou-se com um pedido do então presidente, Alberto Sayão, para que eu acompanhasse dentro do Congresso Nacional e no CONFEA (Conselho Federal de Engenharia e Agronomia) a tramitação de um projeto que afetava diretamente a carreira do engenheiro geotécnico, projeto que eu monitoro até hoje. Em 2011, a convite do Arsênio Negro, eu assumi a secretaria executiva da ABMS, que dentre suas funções visa promover e viabilizar as comissões técnicas. Na minha opinião, as comissões técnicas são a essência da ABMS, pois é dentro delas que as novas as pesquisas, técnicas e materiais são discutidos e divulgados. Nesse caso a minha remuneração é o ganho do conhecimento. Ao assumir a secretaria da ABMS eu verifiquei que existiam apenas três

comissões ativas, então eu incentivei e motivei os colegas associados a ativar e criar novas, trabalho que eu continuei fazendo nas gestões do Jarbas Milititsky, do André Assis e na atual gestão do Alessander Kormann. A função do coordenador basicamente se resume em monitorar as atividades das comissões técnicas, incentivar a promoção de eventos e a produção de documentos técnicos, ou seja, ser um facilitador e uma ponte entre a diretoria e as comissões. Dentre os quase 2.000 trabalhos realizados, qual considera de maior destaque ou que lhe trouxeram mais satisfação? Eu tenho dificuldade em eleger uma obra ou projeto específico, pois a engenharia geotécnica é fascinante e traz desafios e aprendizados a cada nova obra. Uma das que me marcou foi uma obra que certamente não foi a maior ou a mais complexa que


Entrevista

Família do engenheiro reunida para o almoço dominical na casa de seus pais

O engenheiro Carlos Medeiros e sua esposa Marília Veras, juntos numa corrida de ciclismo

eu participei que foi um edifício comercial com 15 pavimentos e cinco subsolos construído no setor de autarquias de Brasília. O interessante nessa obra foi o embate entre o engenheiro e o juiz, situação que certamente muitos de nós, engenheiros já passaram ou irão passar algum dia. Quais pesquisas na área lhe trouxeram mais satisfação? Foi a pesquisa realizada durante a minha tese de doutorado, pois teve o reconhecimento da academia e da prática. Foi desenvolvida e proposta a Metodologia SCCAP (sigla que representa as iniciais dos sobrenome dos engenheiros: Carlos Medeiros da Silva (Silva), do professor José Camapum de Carvalho (CC), do engenheiro Gustavo Araujo (A), e do engenheiro Hoover Paullucci (P)), que 14

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leva qualidade e confiabilidade para os estaquea­mentos executados para os do tipo hélice contínua e escavados. A metodologia é baseada no princípio físico e universal de conservação de energia e é controlada por métodos estatísticos. Basicamente foi comprovado que a capacidade de carga de uma estaca escavada ou do tipo hélice está diretamente relacionada com a energia necessária para sua cravação. Atualmente eu estou trabalhando com os corpos expansivos (expander body), técnica utilizada em outros países e que, provavelmente, terá boa adaptabilidade aos solos brasileiros. O objetivo do expander body é criar uma base na ponta das estacas por meio da instalação de um cilindro sanfonado na ponta das estacas que se expande lateralmente por meio da injeção de argamassa. A finalidade é criar uma base nas estacas escavadas melhorando a sua capacidade de carga nesse tipo de estaca, o processo e rotinas são totalmente controlados por um software específico. A pesquisa conta

com a participação do professor da UnB, Renato Cunha, do professor da Universidade de Santa Cruz de La Sierra, Mario Terceros e dos professores da UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas), David de Carvalho e Paulo Albuquerque. Pensa em lecionar em algum momento? A partir do segundo grau eu sempre estudei em excelentes instituições públicas de ensino e gostaria de retribuir um pouco do que recebi gratuitamente transmitindo o meu conhecimento para os futuros engenheiros. Nos últimos anos, eu recebi alguns convites para ensinar em universidades particulares, mas não os aceitei. Quanto às instituições públicas da minha cidade, os concursos na minha área de atuação foram sempre para dedicação exclusiva, consequentemente não pude participar das seleções pelo conflito com a minha atividade profissional. Aliás, nos cursos de engenharia é um erro a contratação única e exclusiva de professores no regime de dedicação exclusiva,


Entrevista

pois esses professores são impedidos de praticar engenharia e, no entanto, ensinam engenharia. Quais são os seus projetos futuros? Eu acredito que o objetivo de qualquer empresário brasileiro nesse momento de crise é garantir a sobrevivência de suas empresas. Eu, como a maioria dos empresários que atuam na engenharia geotécnica, acreditei no Brasil e investi na modernização dos maquinários e na contratação e qualificação dos novos e antigos colaboradores. Consequentemente, o principal objetivo é administrar a empresa serenamente reduzindo o seu tamanho e consequentemente os custos fixos. Entretanto, nós mantivemos os investimentos em pesquisas e em novas tecnologias, pois o Grupo Embre sempre cresceu e é reconhecido pelas inovações e novas tecnologias que desenvolveu e a oferta ao mercado, eu acredito nesse caminho e continuarei trilhando. Com uma carreira já consolidada atualmente, qual avaliação faz da sua trajetória até aqui? Eu avalio positivamente, evidente que muitas vezes eu trilhei o caminho mais acidentado e tortuoso, mas não me arrependo das decisões e escolhas feitas no passado. Eu tenho orgulho do que fiz até aqui e é evidente que ainda eu tenho muito a fazer. Quais são as suas perspectivas para o mercado brasileiro da engenharia e geotecnia? Eu estou otimista, pois eu estou percebendo uma leve movimenta15

Fundações e Obras Geotécnicas

ção em direção à retomada do crescimento. Quanto ao mercado de geotecnia, as empresas que atuam no segmento fizeram altos investimentos nos últimos anos e estão endividas e com os pátios lotados com seus maquinários, consequentemente o ambiente só melhorará quando esses maquinários estiverem trabalhando e os preços que estão aviltados se recuperarem e isto, na minha avalição, ainda vai demorar. Quais são as suas principais referências no segmento? Eu tenho muitas referências e, certamente, esquecerei de muitas pessoas. Citarei apenas algumas do meu convívio. Os engenheiros Nelson Aoki, Alexandre Duarte Gusmão, Paulo Henrique Dias e Willer Fonseca são referência pela competência e humidade com que encaram a engenharia geotécnica; os professores José Camapum, André Assis, Márcio Muniz, Luciano Décourt e Alberto Sayão, pela forma, muitas vezes, antagônica que olham e interpretam a engenharia geotécnica. No campo empresarial o meu sócio Renato Wilson e o Arsênio Negro pelo pragmatismo com que conduzem as suas empresas. Conte-nos um pouco sobre a sua trajetória pessoal? Eu sou o primogênito entre os cinco filhos de Analice Medeiros Silva e José Berto Sobrinho. Nossa família é muito unida, sempre incentivando e estendendo a mão um para o outro nos momentos de dificuldades. O meu pai era gerente de banco na década de 1970, naquela época a

sua missão era abrir novas agências, consequentemente nós moramos em quase uma dezena de cidades até chegar em Brasília (Distrito Federal), em 1977, onde nossa família fixou residência. Ainda no primeiro grau estudei com a minha esposa adorável e parceira, Marília Veras, e voltamos a nos encontrar já adultos na Universidade de Brasília, eu estudando engenharia e ela estudando psicologia, todo engenheiro geotécnico deveria ter uma psicóloga por perto para manter a cabeça em ordem diante de tantas incertezas que a profissão nos impõe. Nos casamos e temos uma filha, Veronyca, com 27 anos. Elas são o meu porto seguro. O meu hobby e da minha esposa é o ciclismo. Eu acredito que o ciclismo pode colaborar para melhorar a vida de todos nós. Essa melhora pode vir por meio da qualidade de vida, da saúde, ou simplesmente por ter encontrado uma atividade de lazer, no meu caso, somam-se os três benefícios. Atualmente, eu encaro como uma atividade esportiva participando de várias provas no Brasil e no mundo, por exemplo, em 2015 eu concluí uma das provas mais famosas e longas do mundo, o Paris-Brest-Paris. São 1.200 km que devem ser pedalados em um tempo limite de 90 horas. As pessoas que participam desse tipo de prova de longa distância são conhecidas como randonneur. Procuro dosar a minha vida, pois também cultivo as minhas amizades e sempre que posso marco encontro e jantares com ou meus amigos, aqueles que podemos contar “com os dedos das mãos”.


Destaque

ABEF APRESENTA PRÊMIO “PERSONALIDADE DE DESTAQUE” DE 2016 E LANÇA A NOVA EDIÇÃO DO MANUAL DE FUNDAÇÕES Durante o evento foi feito um apanhado geral sobre os desafios e as atividades executadas pela associação no ano passado por Dellana Wolney

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No dia 5 de dezembro de 2016 aconteceu em São Paulo mais uma confraternização da ABEF (Associação Brasileira de Empresas de Engenharia de Fundações e Geotecnia) para a entrega do tradicional Prêmio ABEF, na modalidade Personalidade de Destaque e para o lançamento do Manual de Fundações da ABEF, que teve sua nova edição totalmente revisada, atualizada e ampliada. Estiveram presentes no evento diretores e conselheiros deliberativos da ABEF; diretores e conselheiros fiscais do SINABEF (Sindicato das Empresas de Engenharia de Fundações e Geotecnia do Estado de São Paulo) e representantes de entidades como: ABCIC (Associação Brasileira da Construção Industrializada de Concreto), ABEG (Associação Brasileira de Empresas de Projetos e Consultoria em Engenharia Geotécnica), ABESC (Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Concretagem) e ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica). Também compareceram representantes do CONFEA (Conselho Federal de Enge-

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Fundações e Obras Geotécnicas

nharia e Agronomia), CREA (Conselho Federal de Engenharia e Agronomia), SINDPRESP (Sindicato dos Empregados em Empresas de Prestação de Serviços a Terceiros, Colocação e Administração de Mão de Obra, Trabalho Temporário, Leitura de Medidores e Entrega de Avisos do Estado de São Paulo), SINICESP (Sindicato da Indústria da Construção Pesada do Estado) e SINDUSCON-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo). Durante a cerimônia de abertura o diretor da empresa GEOSONDA e presidente da ABEF, Clovis Salioni Junior fez um apanhado geral sobre as atividades executadas pela ABEF no ano de 2016. Mesmo o momento sendo de celebração, ele enfatizou a grave crise político-econômica que atingiu o Brasil e principalmente o setor da construção civil e, por consequência, as empresas de engenharia de fundações e geotecnia que enfrentaram a falta de serviços.


Fotos: Dellana Wolney / Editora Rudder

Participantes do Prêmio ABEF 2016

Ele ainda comentou que a ABEF foi uma das instituições fortemente atingidas pela crise, tendo como parâmetro o seu quadro associativo, que reduziu consideravelmente. “Contudo, diante de grandes problemas, os fortes fazem-se ainda mais resistentes, aprendem lições e evoluem. É preciso perseverar, acreditar em nosso trabalho e prosseguir, pelo bem de nosso setor e de nosso país”, salienta.

REALIZAÇÕES De forma detalhada Clovis Salioni Junior elencou as principais ações executadas pela ABEF, dentre elas o acompanhamento de normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) relacionadas ao setor de fundações e geotecnia e conclusão do regulamento sobre o SELO ABEF, que foi colocado em “stand by”, por decisão conjunta das empresas associadas à ABEF, tendo em vista a crise econômica

Nova edição do Manual de Fundações da ABEF

e os custos consideráveis que a segunda fase (de habilitação técnica) exigiria, ou seja, despesas com visitas de profissionais para análise das condições técnicas das associadas seja em seus pátios empresariais ou em seus campos de obras. Ainda houve a implementação do Código de Ética da ABEF; con-

clusão da auditoria externa sobre o SEFE (Seminário de Engenharia de Fundações Especiais e Geotecnia) 8, cujos resultados foram tidos como regulares e devidamente disponibilizados para todas as empresas associadas da ABEF; participação em eventos como a Conferência em Tecnologia de Fundações; Fundações e Obras Geotécnicas

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Destaque

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1. O diretor-executivo da ABEF e do SINABEF, Marco Aurélio Alves Costa 2. O diretor da empresa GEOSONDA e presidente da ABEF, Clovis Salioni Junior

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4 3. O engenheiro e vice-presidente da ABEF, Gilberto Vicente Manzalli 4. O presidente do NRSP-ABMS (Núcleo Regional de São Paulo da Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica), Celso Nogueira Corrêa

ação judicial em face do CONFEA para combater alguns efeitos ilegais da Resolução 336/1989, como a exigência de que o responsável técnico pela obra resida no mesmo da obra; início dos preparativos para o SEFE 9, já programado para novembro de 2018 (com possibilidade de ser adiado para 2019, por conta da crise econômica), dentre outras ações relevantes. A revisão do Manual de Fundações da ABEF foi um dos assuntos de destaque na noite. O engenheiro e vice-presidente da ABEF, Gilberto Vicente Manzalli, sócio-diretor da empresa SONDOSOLO, responsável por dirigir os trabalhos de revisão do manual, explicou que a tarefa somente foi possível graças ao apoio 18

Fundações e Obras Geotécnicas

oferecido por seus colegas de diretoria, pela especializada consultoria da engenheira Fernanda Nabão e de Elisabeth Peão. “O subsídio das empresas associadas que, em prol da ABEF e da engenharia de fundações e geotecnia, compartilharam conhecimento e tecnologia, fez toda a diferença. Todas as empresas associadas foram convidadas a participar. Somos gratos a todas, especialmente àquelas que puderam integrar os grupos de trabalho que se responsabilizaram pela revisão e atualização dos textos relacionados com suas respectivas expertises”, recorda Manzalli. Cada capítulo do Manual de Fundações da ABEF discorre, detalhadamente, sobre algum produ-

to, abrangendo fundações profundas, com os vários tipos de estacas, contenções e serviços especiais. O conteúdo ainda indica as mais avançadas técnicas, elementos e equipamentos utilizados atualmente no mercado, além de apontar a normatização correspondente. Além do Manual impresso e editado, a associação disponibilizou a possibilidade de obter-se capítulos separadamente, por meio de arquivos digitais no site da ABEF. Na ocasião, Manzalli pontuou que a associação já vem desenvolvendo textos de engenharia geotécnica, nesse mesmo formato digital. “Para os próximos anos, pretendemos produzir e disponibilizar um rico material. A meta da ABEF, nesse ponto, é a criação de seu


Equipe que participou da confecção do Manual de Fundações da ABEF. Da esquerda para a direita: Fernanda Nabão, Gilberto Vicente Manzalli e Elisabeth Peão

Manual de Geotecnia, além de seu já consagrado Manual de Fundações”.

PREMIAÇÃO No final da noite foi feita a entrega do entrega do Prêmio ABEF 2016, na categoria Personalidade de Destaque. O procedimento para a escolha deu-se como no ano de 2015. A ABEF emitiu uma circular no dia 12 de setembro de 2016 para todas as empresas associadas, solicitando que indicassem nomes para esta homenagem. Em caso de empate, a diretoria da associação votaria secretamente nos nomes empatados. Por maior número de indicações, sagrou-se vitorioso para o prêmio o engenheiro Gilberto Vicente Manzalli. Dentre tantos profissionais merecedores, Manzalli afirma que não esperava o prêmio. “Ao considerar os contemplados anteriores a mim, concluo que todos possuem excelen-

tes qualidades pessoais e profissionais, tendo contribuído muito para o segmento de engenharia de fundações e geotecnia. Sinto-me, portanto, muito honrado de fazer parte desse seleto grupo e, doravante, mais incentivado e com maior responsabilidade para continuar oferecendo minha modesta contribuição à ABEF e a todo o setor”, conclui. Para ele, a atual diretoria da ABEF, composta pelo presidente Clovis Salioni Junior; pelo diretor financeiro, Gustavo Roberto Ganzerli Nahas; pelo diretor de mercado, Rogério Amaral Pinto de Almeida; pelo diretor de eventos, Walter Roberto Iorio e por ele, no papel de vice-presidente, “é um grupo coeso e dedicado, comprometido com os objetivos estatutários da associação e que tem o forte propósito de lutar pela ética de mercado e pela otimização técnica da engenharia de fundações e geotecnia”. Fundações e Obras Geotécnicas

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Reportagem

Betoneiras exercem papel importante na construção civil Novas tecnologias têm sido desenvolvidas para melhorar o desempenho e vida útil destes equipamentos por Dellana Wolney

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Há equipamentos que são essenciais na construção civil e um deles é a betoneira, usada para misturar diversos materiais, como pedra, areia e cimento na proporção e textura adequada, de acordo com o tipo e tamanho da obra. A ferramenta passou por várias evoluções, embora sua história ainda seja bastante recente. Com a finalidade de substituir os misturadores de concreto puxados por cavalos, o inventor e engenheiro armênio-americano, Stephen Stepanian criou um modelo predecessor da betoneira, na qual tentou patentear no ano de 1916. Entretanto, a patente foi rejeitada em abril de 1917. Acredita-se que o escritório de patentes tenha rejeitado a invenção porque um caminhão não seria capaz de suportar o peso de um misturador de concreto em seu topo. O escritório de patentes também observou que não havia nenhuma informação de patenteamento anterior que provasse que a integração entre os dois produtos era possí-

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Fundações e Obras Geotécnicas

vel. Outras fontes também sugerem que a patente foi rejeitada porque Stepanian não era um cidadão americano. No entanto, no dia 21 de dezembro de 1928, após muita insistência, o engenheiro tentou novamente registrar o equipamento, recebendo então a aprovação no dia 21 de novembro de 1933. A ideia de misturar e transportar o insumo simultaneamente firmou-se como uma prática eficiente, por isso, desde então, as indústrias têm se esforçado para aperfeiçoar ainda mais este equipamento, buscando maneiras mais adequadas de homogeneizar o concreto, feito por meio da mistura de cimento com pedras, areia e água, bem como gerar mais velocidade a esse processo.

FUNÇÃO A betoneira mais utilizada no Brasil é a fixa que vem equipada com motor para que a mistura fique homogênea e a semi-


Divulgação Aperan

Reportagem

fixa que é semelhante à fixa, tendo como seu diferencial a facilidade de locomoção, devido às suas rodas. Há também as automáticas movidas por um motor, sincronizadas e equipadas com esteiras rolantes e as semiautomáticas, similares, mas com menos funções. Normalmente, a capacidade de armazenamento de uma betoneira depende da necessidade da obra, podendo ir dos pequenos misturadores semiautomáticos, que comportam pouco mais de 10 kg ou 10 litros de concreto, movidos por um motor com sistema de polias e correias, até caminhões com mais de 10 m³ de capacidade ou 10 mil litros de concreto. As betoneiras mais comercializadas são as de 320 ou 400 litros, em que o “traço” é de aproximadamente um saco de cimento por mistura (betonada). 21

Fundações e Obras Geotécnicas

Construção de uma betoneira com inox

Os sistemas de mistura também são instáveis, sendo os mais corriqueiros: pivotantes, em que o tambor gira em torno de um eixo, ou rotativas, em que o tambor gira sobre roletes. As pivotantes funcionam por meio do giro do tambor e palhetas que cortam a “massa” a ser misturada, seme-

lhante a um liquidificador. Já o sistema rotativo gera o turbilhonamento da mistura com pás, elevando e jogando o material, como em uma roda d’água invertida. Existem também os misturadores planetários que funcionam como um grande reservatório com pás, misturando o material.


Divulgação Aperam

Reportagem

South Madison History / Flickr

Exemplo de betoneira

Operação de mistura de concreto nos anos de 1911-1912 na Washington Avenue

Além do equipamento, capacidade e sistema de mistura, há outras tecnologias complementares que compõem os serviços executados pelas betoneiras. Nas grandes construções ou em casos específicos, usa-­ se uma bomba especial chamada de bomba de concreto que impulsiona o concreto à altura solicitada, junto a uma central dosadora. Quando a área é muito extensa, usa-se o vi22

Fundações e Obras Geotécnicas

brador de concreto, que tem como função adensar a mistura, retirando as bolhas de ar.

TECNOLOGIA Uma das soluções mais recentes que envolvem as betoneiras foi apresentada durante o Concrete Show 2016 pela empresa Aperam South America. Trata-se da aplicação de aço inoxidável em ca-

minhão betoneira, usado para o transporte e mistura de concreto e cargas metálicas, principalmente nos segmentos da construção civil e da mineração. De acordo com o gerente-executivo de marketing e desenvolvimento de mercado da Aperam South America, Roberto Guida, o P410M é um aço inox ferrítico aproximadamente com 11% Cr (Cromo), considerado um dos aços inoxidáveis de menor custo. Apresenta dureza típica de 90 HRB, alongamento acima de 20% e limite de escoamento acima de 400 Mpa (Megapascal), sendo a segunda geração deste aço, onde houve a evolução do limite de escoamento, anteriormente com 320 MPa. “Além de ágil, inovadora e atenta às necessidades do mercado, a solução é inteiramente nacional. A Aperam South America desenvolveu melhorias metalúrgicas das propriedades mecânicas, sem alterar a composição química do aço inox. Na Europa e nos Estados Unidos há uma cultura voltada para a utilização de aços inoxidáveis austeníticos, usando-­ se o tipo AISI 304, que possui um valor mais elevado do que o P410M e menor resistência ao desgaste, por isso, nunca testado e aplicado em betoneira. O aço P410M tem um melhor custo-benefício, sendo mais apropriado a aplicação”, explica. Em ambientes de moderada ação abrasiva, a solução promove excelentes resultados. Para a aplicação


em balões de caminhões betoneiras, com alta umidade inerente ao processo de fabricação de concreto, o aço inox apresenta resistência elevada à corrosão. Além disso, o concreto também é abrasivo e o aço inox P410M promove resistência à abrasão neste meio. Ele exerce a função estrutural, compondo todo o balão betoneira e faz o papel de homogeneização nas lâminas internas do balão.

APLICAÇÃO A aplicação do aço em uma betoneira é feito por meio de um processo de soldagem. Tanto a aplicação do aço inox, como a de aço carbono possuem o mesmo processo de soldagem, conhecido como MIG (Metal Inert Gas), neste caso pode-se mudar apenas os consumíveis (arame de solda, gás etc.). Normalmente, o MIG usa gás de proteção, quando esta for constituída de um gás inerte, ou seja, um gás normalmente monoa­ tômico como argônio ou hélio, e que não tem nenhuma atividade física com a poça de fusão. Este processo foi inicialmente empregado na soldagem do alumínio e geralmente é utilizado com corrente elétrica contínua. Dentre as inúmeras vantagens da aplicação, Guida afirma que a principal é que o aço inox é capaz de aumentar a vida útil da betoneira. “Enquanto o aço carbono sofre com dois fenômenos de degradação superficial, mecânico (abrasão) e químico (corrosão), o aço inox sofre apenas com o efeito mecânico 23

Fundações e Obras Geotécnicas

e de forma atenuada, pois a água do sistema age como lubrificante, principalmente, no aço inox, que mantém a superfície mais suave ou menos rugosa, reduzindo o atrito que causaria desgaste na betoneira. O aço carbono, por exemplo, perde espessura por corrosão não apenas durante a operação, como também quando o equipamento encontra-­ se parado”, descreve. Já o aço inox usado no balão e lâminas internas do caminhão betoneira permite conformações com menores espessuras em comparação ao aço carbono, garantindo resistência estrutural e maior capacidade em volume de carga, além de oferecer maior resistência a abrasivos e ter mais durabilidade, aumentando a vida útil dos componentes dos dispositivos. A principal limitação da aplicação do inox em betoneiras é a espessura, no que diz respeito à disponibilidade de dimensões acima de 1.500 mm de largura. No entanto, essa questão é facilmente contornada pelo processo de soldagem, que mantém o custo-benefício bastante elevado. Para Guida, o Brasil ainda associa o aço inox a produtos de cozinha e materiais cirúrgicos. Pouco se fala sobre o uso do material na indústria, principalmente nesse tipo de aplicação. O inox reduz os custos e o tempo de manutenção dos equipamentos, aumentando a sua disponibilidade para produção. Além das betoneiras manuais, ele pode ser usado em silos de minerais/grãos, vagões de

Arquivo Motors Trade Association of Japan

Reportagem

Betoneiras japonesas de 1959

minerais/grãos, dutos condutores de minerais/grãos, bem como aplicações estruturais. Embora o preço inicial da aplicação de aço inox seja mais alto, em contrapartida ela está em ascensão devido à necessidade de redução dos custos de manutenção, redução das paradas para realização de intervenções por falha do material e consequentemente maior tempo para produção. As principais vantagens estão resumidas em ter maior disponibilidade do equipamento para produção de concreto, maior durabilidade e vida útil da aplicação, menor gasto com manutenção e redução do peso do equipamento.


Notícia

Energia eólica representa 6% do total produzido por todas as fontes no Brasil Com o crescimento do mercado, novas soluções construtivas e tecnologias têm sido desenvolvidas no País por Dellana Wolney

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A Matriz Elétrica Brasileira, que apresenta uma configuração Renovável-Térmica, iniciou em fevereiro de 2017 com uma capacidade eólica instalada de 10,79 GW, a participação dessa fonte na matriz alcançou 7,1%. Desde o ano passado, a produção de energia eólica tem avançado notavelmente. Segundo informações da CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), em 2016 o aumento foi de 53,4% frente a 2015. Essas usinas, que utilizam a força dos ventos para gerar energia, produziram 3.667 MW médios no período. Segundo os dados mensais da ABEEólica (Associação Brasileira de Energia Eólica), a geração total das usinas em operação comercial e em teste de cada fonte atingiu, em dezembro de 2016, 62,01 GW médios, cuja energia eólica foi responsável por 4,03 GW médios dessa geração. Esses montantes de geração foram verificados no centro de gravidade. Com as informações de dezembro completa-se então um novo ciclo de 12 meses de dados, representando 2016. Ao todo, foram ge-

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Fundações e Obras Geotécnicas

rados 33,15 TWh de energia eólica ao longo do ano, sendo em média 6% do total produzido por todas as fontes. Comparando-se ao ano de 2015, a produção de energia gerada pelos ventos foi superior em 52%. O Estado do Rio Grande do Norte foi o principal produtor de energia eólica no País no ano passado. Suas usinas produziram 1.206 MW médios no período, número que representa um aumento de 50% em relação a 2015. A fonte hidráulica, englobando usinas hidrelétricas de pequeno e grande porte, também elevou sua geração, registrando 45.371 MW médios, volume de energia 6,5% superior ao produzido em 2015, quando as usinas da fonte geraram 42.616 MW médios.

CRESCIMENTO Com o crescimento do mercado de energia eólica, novas soluções construtivas estão sendo desenvolvidas. A empresa ArcelorMittal, por exemplo, tem atuado no segmento há mais de uma década e desenvolveu uma solução conjunta para a produção


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Transporte de Equipamento de Energia Eólica para Brotas de Macaúbas (BA) Alberto Coutinho / SECOM

de aços estruturais para fundações, bases e segmentos de torres eólicas. A ArcelorMittal, que já atuava na execução de fundações para torres, iniciou parceria com o Grupo Cortez, no qual faz parte a CTZ Eolic Power. A empresa cearense buscava produtos para a fabricação e montagem de torres eólicas de concreto pré-moldado. Desta associação da fabricante de aço com a CTZ Eolic Power surgiu a Aço Pronto Pecém em 2015. Essa unidade de corte-dobra de aço é voltada para o mercado de energia eólica e fornece soluções em aço para o segmento. A planta está instalada na região do Complexo Industrial e Portuário do Pecém, localizado na Região Metropolitana de Fortaleza, no Estado do Ceará e ocupa uma área de 4,5 mil m². A unidade conta ainda com equipamentos de alta tecnologia, garantindo a produtividade e a qualidade exigida pelo setor. Esta inciativa da ArcelorMittal possibilitou a criação de uma fábrica móvel/itinerante para construir torres eólicas de concreto armado. As “Armaduras Prontas” tem como vantagens a logística, pois a torre é produzida no próprio parque eólico; segurança de transporte, sem o risco de acidente em rodovias e a economia, levando em consideração a nacionalização do produto e sua manutenção. As soluções da ArcelorMittal foram aplicadas na construção de mais de 100 torres de concreto. Um dos exemplos mais representativos são os parques eólicos de Ica-

Adenilson Nunes / SECOM

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Parque de Energia Eólica em Brotas de Macaúbas (BA)

raizinho de Amontada e de Taíba (CE), ambos em operação. Além disso, o Complexo Eólico de Itarema, no mesmo estado, também utilizou as soluções da empresa em sua construção. Maranhão, Piauí,

Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Bahia são outros Estados além do Ceará em que o aço e as soluções da empresa estão sendo utilizados para ampliar a geração de energia eólica no Brasil.


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“Isso é coisa de mulher” Apesar dos desafios que ainda enfrentam, as profissionais acreditam cada vez mais em um ambiente igualitário para as próximas gerações

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por Dellana Wolney

As mulheres ainda enfrentam desafios para conquistar o seu espaço em profissões técnicas, científicas e de gestão

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Historicamente, as mulheres sempre trabalharam e essa trajetória não teve início somente nos períodos de pós-abolição, pós-guerra ou na década de 1970. De 26

Fundações e Obras Geotécnicas

acordo com um estudo de 2014 do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), os primeiros dados de que se tem conhecimento da atividade feminina no


mundo do trabalho apontam que em 1872 as mulheres já representavam 45,5% da força de trabalho. Na época, segundo o levantamento realizado por Brumer (1988) a partir do censo demográfico de 1872, 35% das mulheres estavam predominantemente empregadas na agropecuária, 33% nos serviços domésticos de lares alheios e 20% no serviço de costura por conta própria. Após a década de 1920, a PEA (Participação Econômica Ativa) feminina reduziu expressivamente. Em pleno século XXI, as mulheres ainda enfrentam desafios para conquistar o seu espaço em profissões técnicas, científicas e de gestão, mesmo sendo hoje tão qualificadas como os homens. Não falta mérito. O que quer dizer também que no mundo existe um número igual de mulheres e de homens com inteligência e merecimento, que se esforçam e são bons profissionais em todos os segmentos possíveis. A força feminina na construção civil já é notável. De acordo com dados do Ministério do Trabalho e RAIS (Relação Anual de Informações Sociais), entre os anos de 2002 e 2012 a participação das mulheres no segmento da construção civil aumentou 65%. E o crescimento anual médio dessa atuação é de 20%. O Sinduscon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de São Paulo) acredita que esse crescimento é devido a vários fatores como a falta de mão de obra masculina qualificada, o 27

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A força feminina na construção civil já é notável

aumento da demanda na área, a oportunidade de melhorar a renda e a qualidade de execução do trabalho pelas mulheres.

REPRESENTATIVIDADE Elas estão em todos os lugares, desde as que “colocam o pé na lama” até as que empreendem e investem, provando que a construção civil é, sim, coisa de mulher. Dentre tantas, uma dessas figuras inspiradoras é a engenheira civil, empresária e diretora da empresa Neomatex Fibras e Têxteis Técnicos para Engenharia, Maki Tokudome.

Atuando no setor de fibras e têxteis técnicos para engenharia civil e ambiental, Maki conta que a sua decisão de ser engenheira veio cedo, com 11 ou 12 anos, quando uma professora da disciplina de desenho ensinou a importância e as várias formas de comunicação por meio do desenho (desenho artístico e técnico). Dentre os exemplos que a professora mostrou, ela ficou encantada com a planta de um projeto arquitetônico de uma residência, o que a fez no trabalho final dessa disciplina, medir com trena a casa em que morava, desenhar e apresentar a planta em escala.


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continua atendendo construtoras, empreiteiras e concreteiras para se manter atualizada.

IGUALDADE

Entre os anos de 2002 e 2012, a participação das mulheres no segmento da construção civil aumentou 65%

As influências pela construção que vieram da infância, na fase da lavoura, também tiveram papel fundamental na decisão. “Eu costumava admirar as construções que meu pai investiu no sítio e pude acompanhar a fase da execução: um pequeno galpão rústico em madeira e um galpão em alvenaria estrutural de blocos de concreto e cobertura em estrutura de madeira. Nesse período, meu pai ensinava desenho artístico e técnico para os filhos, uma vez por 28

Fundações e Obras Geotécnicas

semana, após o jantar, na mesa com lampião, pois não tínhamos energia elétrica”, recorda. Técnica em edificações e gradua­ da em engenharia civil, durante a sua carreira profissional passou por funções com conhecimentos diversos como: técnico-comercial e de desenvolvimento de mercado. Além dos trabalhos na construção civil também lecionou sobre prospecção de negócios em cursos de pós-graduação e, atualmente administra a empresa, na qual também é sócia e

Maki Tokudome diz que sua experiência como engenheira tem sido positiva e acredita que mulheres competentes são tão respeitadas quanto os homens. A sua percepção quanto ao estigma de ser mulher em uma profissão predominantemente masculina é que a tolerância às falhas, desempenho e aprendizado para a mulher, é sempre menor. Ela comenta que durante a sua vida profissional não tem lembranças de ter enfrentado preconceito ou marginalização pelo gênero. “Convivi a maior parte da carreira com profissionais homens, a maioria com formação em engenharia. A experiência de aprendizado técnico e profissional foi muito boa. Trabalhei desde o início da carreira com pessoas valiosas que investiram seu tempo para me ensinar sobre a profissão”, recorda. Outro ponto enfatizado pela engenheira é que de uma forma geral, as empresas têm perfis distintos e existem aquelas que reconhecem o valor da mulher como profissional. “Para lutar por um sistema igualitário, podemos aprender com estas empresas e disseminar em outras. A fase está propícia para implantar políticas de igualdade à mulher ou empreender para descobrir como tornar isso possível em sua própria empresa”, afirma.


Muitas companhias ao redor do mundo têm defendido as “cotas para as mulheres”, exemplo disso é a Noruega que entre os anos de 2002 e 2003 instituiu que empresas públicas e privadas de capital aberto adotassem a iniciativa para que houvesse maior presença feminina em seus conselhos diretores. A decisão polêmica foi recebida com previsões desastrosas. Na época, a presença feminina em média era de 7%. De 611 empresas sujeitas às novas regras, 470 não tinham nenhuma mulher em seu corpo diretor. Após quase dez anos, depois da aprovação das cotas, as previsões negativas não se confirmaram e, ao contrário do que era esperado, algumas empresas norueguesas tornaram-se até mais competitivas. Seguindo o mesmo exemplo, países como França, Bélgica, Holanda, Itália e Islândia aprovaram cotas femininas similares, que variam de 33% a 40%. No Brasil também tem sido feito esse tipo de inclusão. A Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados aprovou em setembro de 2016 o Projeto de Lei Nº 1.397/15, do deputado Raimundo Angelim Vasconcelos (PT-­ AC), que obriga empresas que exploram concessões florestais a manter no mínimo 5% de mulheres no quadro de empregados. A relatora na comissão, a deputada Flávia Morais (PDT-GO), explica que a medida está de acordo com 29

Fundações e Obras Geotécnicas

a convenção internacional sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher, em que o Brasil é signatário. “A medida proposta pelo projeto de lei se encontra perfeitamente alinhada com os objetivos da convenção e direitos e garantias fundamentais, em especial com o princípio da igualdade de gênero”, destaca. De acordo com a Câmara dos Deputados, a proposta tramita em caráter conclusivo e ainda será analisada pelas comissões de Finanças e Tributação e pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. O texto já foi aprovado pela Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural em setembro de 2015.

Fotos: Arquivo pessoal

Notícia

A engenheira civil, empresária e diretora da empresa Neomatex Fibras e Têxteis Técnicos para Engenharia, Maki Tokudome

LUTA Cássia Maria Dinelli de Azevedo vem de uma família de mulheres formada por quatro “Marias”, todas atuando na área de exatas. Para ela, a engenharia não foi a primeira opção de curso, mas como diz: “foi a melhor escolha”. Ainda na faculdade ela foi convidada para estagiar na empresa Geomec, recém-criada pelo professor Sérgio Maurício Pimenta Velloso e pelo engenheiro Sérgio Paraíso, onde permanece até hoje, dividindo suas atividades também como secretária-geral do Núcleo Regional de Minas Gerais da ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica). Ela conta que teve a sorte de in-

A engenheira da GEOMEC e secretária-geral do Núcleo Regional de Minas Gerais da ABMS, Cássia Maria Dinelli de Azevedo

gressar em um ambiente que valoriza a mulher. Na empresa, elas são maioria, atuando em diversas áreas como projeto, direção técnica de


Notícia

campo e realização de ensaios dinâmicos. “Mesmo tendo uma rea­ lidade profissional favorável, acredito que as mulheres engenheiras são pouco ouvidas, por este motivo, quando estive á frente do Núcleo Minas Gerais da ABMS criei o evento Mulheres Geotécnicas, em que no mês de março algumas profissionais são convidadas a fazer uma palestra de um tema específico da nossa área”. Ela diz que apesar das mulheres estarem presente até nas lutas de UFC (Ultimate Fighting Championship), ainda há colegas de profissão que fazem julgamento de valores equivocados e comentários grotescos na tentativa de diminuí­ rem a imagem e a atuação feminina, esquecendo que as mulheres disputam um espaço intelectual e não uma igualdade medíocre. Como muitas profissionais, ela enfrentou preconceitos, alguns de forma tênue, mas que sempre serviram como desafios a serem vencidos e não como motivo para desistir. Ela mudou com a experiência, inclusive a sua forma de sonhar. “Hoje vivemos um mundo muito instantâneo e intolerante, as relações são frágeis e pouco consistentes, por isso mais difíceis de serem estáveis e verdadeiras, mas continuo acreditando na capacidade intelectual das mulheres como um diferencial na conquista de um espaço consolidado e permanente na sociedade”.

FUTURO Para Azevedo, a conquista da mulher, principalmente na enge30

Fundações e Obras Geotécnicas

nharia civil é natural e progressiva, uma vez que a engenharia é uma ciência especialmente mental. Ela comenta que muitos associam engenharia somente com obra e esquecem que esse trabalho é a consequência de um projeto bem idealizado, que demanda estudo e conhecimento, portanto independe de força, que no seu ponto de vista é o que diferencia a mulher do homem. “Quando me formei no fim dos anos 1980, as mulheres eram aproximadamente 10% do total dos formandos, as obras não tinham banheiros femininos e as mulheres não ocupavam cargos de chefia. Hoje a realidade é bem diferente. Desde 1988, as mulheres ganharam um reforço nesta luta pela igualdade, quando a Constituição Federal no seu Artigo 5º, que trata dos Direitos Fundamentais, garante a igualdade de gênero ao determinar que ‘homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações’, não havendo mais espaço para qualificação de profissão como ‘masculina’”, salienta. Apesar disso, a diferença salarial é uma realidade, que ela ainda espera poder ler nos jornais ter acabado ou quase ser inexistente para as próximas gerações. “As mulheres realmente são discriminadas quando o assunto caminha para a formação familiar e a ocupação de cargos de confiança ou de promoções na carreira, porque a dupla jornada ainda é um fato para muitas, obrigando-as a se tornarem mais criativas, disciplinadas e fo-

cadas para darem conta de todo o serviço. Por isso, acabam se destacando com um nível de eficiência superior ao dos homens”. Ela observa que neste momento de demissões em massa na engenharia, as mulheres têm sido mais poupadas por terem menores salários e mais capacidade de acumular atividades. No entanto, o respeito é fundamental para que a discriminação acabe. Esse respeito pode começar no momento de educar as próximas gerações, com valores morais que passam pela igualdade e justiça. Maki Tokudome sugere para as futuras engenheiras que se preparem para trabalhar bem em equipe, que desenvolvam habilidades de dialogar e de ser oradora e, acima de tudo, que estude com seriedade e afinco durante o curso de engenharia, pois o nível de conhecimento e a forma de interação serão diferenciais para o crescimento profissional. “Em qualquer atividade profissional,é necessário ter a certeza de estar exercendo uma função cuja experiência/conhecimento será proveitosa para o seu futuro”, pontua. Para aquelas que querem ter o seu próprio negócio, ela completa que a experiência na área comercial fortalece o conhecimento sobre a dinâmica do mercado, interação e negociação com clientes, fluxo de produção, venda, entrega e recebimento, desta forma, um dia esse conhecimento resultará em segurança para empreender na sua própria empresa.


Notícia

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Notas

por Dafne Mazaia

4º CBT acontece em abril e reúne especialistas nacionais e internacionais Um dos maiores encontros do setor tuneleiro ocorrerá em abril, em São Paulo Entre os dias 3 e 6 de abril, acontecerá um dos maiores encontros do setor tuneleiro da América Latina, o 4º CBT (Congresso Brasileiro de Túneis) e Seminário Internacional LAT 2017 (Latin American Tunneling), em São Paulo. O encontro é organizado pelo CBT (Comitê Brasileiro de Túneis) ao lado da ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica). Nessa edição, serão abordados 17 temas voltados aos profissionais que trabalham no segmento de estruturas subterrâneas, com o objetivo de promover troca de experiências e atualização técnica dos participantes. Dentre os temas que serão debatidos durante o congresso, destacam-se: planejamento urbano e uso do espaço subterrâneo; investigações geológicas, aspectos hidrogeológicos e geotécnicos; túneis convencionais e mecanizados, entre outros, assim como terá cases e as suas lições aprendidas. Em dois dias do evento será realizado um curso de atualização e aprimoramento na área de túneis. Outros temas serão apresentados nos cursos do evento, como geologia de engenharia aplicada a túneis; métodos construtivos de poços; instrumentação geotécnica; entre outros tópicos. A matéria com a cobertura completa do evento será publicada na edição de número 80 da revista Fundações & Obras Geotécnicas (maio de 2017).

ABMS-RJ realiza evento para apresentar teses premiadas

Divulgação ABMS-RJ

Cerimônia foi realizada no Clube de Engenharia, no Rio de Janeiro Durante o Cobramseg 2016 (Congresso Nacional de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica), realizado em Belo Horizonte (Minas Gerais), foi divulgado o resultado das melhores teses em geotecnia no Brasil. Para prestigiar os autores, a ABMS-RJ organizou um evento para que fossem divulgados os trabalhos premiados. A presidente da ABMS-RJ, Ana Cristina Sieira, informa que o encontro realizado em novembro de 2016 teve o objetivo de mostrar à comunidade geotécnica do Rio de Janeiro os trabalhos que estão sendo desenvolvidos na região. “Tivemos quatro alunos premiados e surgiu a ideia de realizar um evento para prestigiá-los, para que a comunidade geotécnica local tenha conhecimento das importantes pesquisas realizadas aqui”, conta. A melhor tese de doutorado foi a ‘Evaluation of the Behavior of Reinforced Soil Walls Under Working Stress Conditions’, de Seyedhamed Mirmoradi, da COPPE-UFRJ (Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro). Também foi divulgada a dissertação de mestrado “Previsão do Comportamento da Argila Mole da Baixada de Jacarepaguá: o Efeito da Submersão do Aterro e do Adensamento Secundário”, de Raphael Carneiro, da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Foi exibida ainda a tese de Iman Hossein Pour Babaei, a ‘Test Embankment on Geotextile Encased Granular Columns Stabilized Soft Ground’” e “Contribuição ao Estudo das Relações Tensão-Deformação-Resistência-Tempo das Argilas Moles”, de Vitor Nascimento Aguiar. 32

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Melchiades Ramalho / Editora Rudder

por Dafne Mazaia


O setor em Números

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Artigo

REFORÇO COM GEOSSINTÉTICOS E SOLO GRAMPEADO: UMA SOLUÇÃO GEOTÉCNICA EFICIENTE MSc. Vinícius Rocha Gomes Pereira São Paulo (SP), RGP4 Construtora Ltda. rgp4vinicius@gmail.com

DSc. José Orlando Avesani Neto São Paulo (SP), docente na Universidade de São Paulo e colaborador na GeoSoluções-Strata avesani.neto@geosolucoes.com.br

DSc. Fagner Alexandre Nunes de França Natal (RN), docente na Universidade Federal do Rio Grande do Norte fagneranfranca@gmail.com

RESUMO Este artigo apresenta um caso de obra, localizado em São José de Ribamar (MA), em que a estabilização de um talude natural com a técnica de solo grampeado foi complementada com um aterro em solo reforçado com geogrelhas. Trata-se de uma residência de alto padrão, de propriedade particular, construída sobre falésias e cuja porção inferior é um talude natural 34

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até a cota da praia. Colapsos anteriores e a visibilidade da obra demonstram sua importância e complexidade. A construção do aterro reforçado com geossintéticos, em conjunto a chumbadores para estabilização do talude natural, resultou na recuperação e ganho de área do terreno acima da estrutura, perdida nesses escorregamentos. Adicionalmente, o sistema de face empregado (Lock and Load®) permitiu um excelente acabamento estético e com fins paisagísticos. Palavras-chave: Geossintéticos, Estrutura de Solo Reforçado, Solo Grampeado, Lock and Load.

INTRODUÇÃO As estruturas de solo reforçado com geossintéticos encontram-se entre as opções da engenharia geo­ técnica para a execução de aterros com face vertical ou subvertical. Nelas, os materiais geossintéticos são utilizados com a função de reforço, isto é, utiliza-se do comportamento tensão-deformação do geossintético para melhorar o comportamento mecânico do solo (ou de outros materiais de constru-

ção) (NBR ISO 10318; IGS Brasil, 2015). Koerner (2012) destaca o efeito sinérgico da inclusão de geos­sintéticos num maciço de solo compactado, gerando um compósito de maior resistência e menor deformabilidade. Essas estruturas são construídas, basicamente, com a execução de camadas de solo compactado, intercaladas com a disposição dos materiais geossintéticos, em geral geogrelhas e geotêxteis. A interação solo-geossintético promove a referida melhoria do comportamento mecânico da obra, resultando em projetos de grande apelo técnico (por exemplo: vantagens construtivas, possibilidade de uso de solo local, versatilidade geométrica e de associação com outras técnicas) e econômico (por exemplo: custo competitivo e alta velocidade de execução). Nos sistemas de solo reforçado com geossintéticos, a interação solo-geossintético permite que as tensões transferidas pelo solo sejam mobilizadas completamente pelas inclusões, tornando dispensável uma face com função estrutural (Portelinha, 2012), porém recomenda-se a execução de um


faceamento na estrutura, que assume outras funções (exemplos: prevenção de erosão, degradação do geossintético e vandalismo, apelo estético, aspectos construtivos). Entre as diversas técnicas empregadas, destacam-se os blocos segmentais e placas de concreto pré-moldado. O sistema Lock and Load® é um exemplo de sistema de faceamento de estruturas reforçadas com geossintéticos em que placas de concreto pré-moldado são utilizadas. Nele, placas retangulares (800 mm x 400 mm) de concreto armado são utilizadas com contrafortes que, ao se unirem, permitem o confinamento e a compactação mecanizada de material granular junto à face. Como resultado, tem-se um conjunto de elevado peso próprio, de fácil manuseio e sem a necessidade de içamento, e alta capacidade de drenagem junto à face do paramento. Adicionado a isso, destaca-se, devido à presença dos contrafortes, a possibilidade de compactação mecanizada junto à face, o que conduz a uma maior rapidez no processo executivo das contenções (GeoSoluções-Strata, 2015). A utilização de materiais geossintéticos em obras de solo reforçado permite grande flexibilidade de opções ao engenheiro geotécnico, com adaptações publicadas corriqueiramente no meio técnico, que destacam novos aspectos considerados, geometrias de obra diversificadas e a associação com muitas outras técnicas consagradas para execução de cortes 35

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Wikipédia, 2014; Google, 2016)

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Figura 1 – a) Localização do município de São José de Ribamar; b) Fotografia das proximidades do local da obra, com destaque ao ambiente costeiro

e aterros. Portelinha (2012), por exemplo, avaliou a influência do avanço da frente de umedecimento em protótipos de um solo fino reforçado com geotêxteis. Em relação à geometria da obra e a carregamentos pouco convencionais, Santos et al. (2014) apresentaram a construção de uma estrutura de solo reforçado com geometria arrojada e que deveria suportar o tráfego de guindaste destinado à montagem da cobertura de um estádio de futebol. França e Pereira (2012) e Campos et al. (2014), por sua vez, apresentaram casos de obras em que o reforço de solos com geossintéticos foi empregado juntamente com outras técnicas consagradas (solo grampeado e tirantes). Esses casos exemplificam fortemente a versatilidade de aplicação dos geossintéticos como reforço em estruturas de contenção. Este artigo apresenta um caso de obra no qual a versatilidade dos geossintéticos é destacada. Trata-se da associação entre o uso de chumbadores metálicos (solo grampeado), para estabilização de um talude natural e a execução de uma estrutura de solo reforçado com geossintéticos para recupe-

ração e ganho de área do terreno superior, perdida após escorregamentos anteriores, bem como a promoção do aspecto estético da contenção. A obra foi construída em uma região costeira, de falésias, com desnível de cerca de 50 m. Apenas o trecho superior da falésia foi alterado, visto que a porção inferior é um talude natural estável até a cota da praia. Deu-se considerável importância ao acabamento estético da obra, no sistema de faceamento, uma vez que se trata de uma residência de alto padrão e que o proprietário (particular) demandou esse aspecto.

1 CARACTERÍSTICAS DA OBRA 1.1 Localização A obra foi realizada no município de São José de Ribamar, situado na Região Metropolitana de São Luís (MA). Trata-se da estabilização de um talude natural e ampliação do terreno da porção superior, onde se localiza a residência do proprietário (particular). A Figura 1a apresenta a localização do município de São José de Ribamar e a Figura 1b mostra uma fotografia das proximidades do local da obra, salientando tratar-­


GeoSoluções-Strata

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Figura 2 – Aspecto inicial do local de implantação da obra em estudo, com destaque para a estrutura de contenção préexistente após colapso Figura 3 – Seção transversal esquemática da solução adotada na obra

se de uma região costeira, bastante próxima à zona de praia.

Figura 2 ilustra a situação encontrada no local da obra em uma primeira visita técnica, realizada no 1.2 Descrição mês de agosto de 2015. Percebe-­ do problema de se claramente a presença de uma engenharia O problema de engenharia des- estrutura de contenção executada crito neste artigo diz respeito à es- anteriormente, a qual havia sofritabilização de um talude natural, do colapso. Verificou-se a necessidade de acima do qual está construída uma residência de alto padrão. Esse promover a estabilização do talutalude natural é um exemplo de de natural. Os escorregamentos falésia, encostas íngremes de sedi- anteriores resultaram numa redumentos pré-quaternários do grupo ção da área do terreno acima da Barreiras, verificadas ao longo do falésia, onde a residência está lolitoral nordestino (Scudelari et al., calizada. Assim, um dos requisitos 2005). A residência está construí- para a concepção deste projeto foi da a cerca de 50 m acima do nível a recuperação da área perdida no do mar. Anteriormente a execução topo da falésia. Além disso, por se da obra, foram construídos mu- tratar de um local de grande visiros de contenção em outros dois bilidade, próximo à praia, que é momentos. Ambos sofreram co- frequentemente utilizada por dilapso em um pequeno intervalo versos usuários, foi uma exigência de tempo, demonstrando tratar-­ do proprietário a atenção ao asse, portanto, de um caso que exi- pecto estético da obra, fator que ge grande atenção do engenheiro ganhou grande importância. geotécnico na escolha da melhor solução. As obras que ruíram so- 1.3 Solução de maram cerca de 500.000 mil reais engenharia proposta Este problema de engenharia necessários para sua execução. A 36

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diz respeito a estabilização de um talude natural, sobre o qual está construída uma residência de alto padrão no município de São José de Ribamar (MA). Entre os aspectos exigidos pelo proprietário da obra, tem-se a necessidade de recuperação da área superior perdida em escorregamentos anteriores e a atenção ao aspecto estético da face da estrutura. Após visita ao local e avaliação dos boletins de sondagem disponibilizados pelo proprietário, a solução geotécnica proposta consistiu na utilização da técnica de solo grampeado para estabilização de taludes em situação de corte, associada a uma estrutura de solo reforçado com geogrelhas, com face em sistema Lock and Load®. A face foi projetada com duas jardineiras, nas quais foram plantadas plantas ornamentais. As jardineiras foram executadas no sistema Lock and Load® por meio do recuo da face do muro em alturas preestabelecidas. Essa solução permitiu a recuperação da área do aterro, perdida em escorrega-


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mentos anteriores e um excelente acabamento estético da obra. A Figura 3 ilustra a seção transversal considerada para a solução adotada neste caso de obra. A estabilização do talude em solo grampeado empregou 315 chumbadores metálicos com 9 m e 12 m de comprimento e 100 mm de diâmetro (barras de aço CA-50, 20 mm de diâmetro envoltos em calda de cimento) dispostos numa malha de 1,5 x 1,4 m (horizontal x vertical). A ampliação do terreno superior foi realizada por meio da execução de um aterro de solo reforçado com geogrelhas uniaxiais de poliéster, fabricadas pela Strata, modelo StrataGrid, com resistência à tração nominal de 60 kN/m e 100 kN/m. O faceamento da contenção foi executado, como mencionado, com o sistema Lock and Load®, com dois recuos ao longo da altura da contenção para a instalação de jardineiras. Salienta-se que a obra foi construída na porção superior do talude, com altura média de 10 m e 65 m de extensão. A porção inferior da falésia não apresentava problemas de instabilidade. O material de aterro utilizado em toda a obra foi uma areia média a grossa, de jazida próxima ao local, imprimindo uma considerável redução nos custos construtivos. O comprimento de reforço por geogrelhas foi definido de forma que atingissem a face do solo grampeado. Isso garantiu uma cobertura da camada desde a face em Lock and Load® 37

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até o talude de corte estabilizado por chumbadores metálicos. A interação entre os chumbadores e as geogrelhas foi garantida por meio da ligação física entre esses elementos com um dispositivo de conexão, formado por uma barra de aço CA-50 de 20 mm de diâ­ metro inserida em um tubo de PVC (Policloreto de Polivinila) com 40 mm de diâmetro e preenchido com calda de cimento. Esse conjunto foi apoiado nos ganchos (“esperas”) dos chumbadores, uma para cada linha de chumbadores. As geogrelhas com cotas coincidentes à linha de chumbadores envolveram o dispositivo de conexão e retornaram para dentro do aterro, em pelo menos 1,50 m. As “esperas” dos chumbadores também foram protegidas mecanicamente, sendo envolvidas em tubos para drenagem preenchidos com calda de cimento. A solução adotada também incluiu a execução de 23 drenos horizontais profundos (DHPs) ao longo da extensão do muro, em uma única linha situada a cerca de 3 m de sua base. Os DHPs foram especificados com 12 m de comprimento e 40 mm de diâmetro envolvidos com tela de nylon. Na base do aterro foi executado um sistema de drenagem com trincheiras e tubos drenos. Durante a execução da obra ocorreram fortes chuvas e foi possível observar o sistema de drenagem funcionando perfeitamente. O item 2 a seguir apresenta as diversas etapas de execução da obra.

2 EXECUÇÃO DA OBRA A obra para estabilização do talude natural e recuperação do terreno perdido em deslizamentos anteriores relatadas neste artigo foi executada entre os meses de novembro de 2015 e abril de 2016 e envolveu diferentes etapas. A seguir são descritas as várias fases de sua execução.

2.1 Limpeza e correção do terreno A obra teve início com a realização de alguns serviços preliminares de investigação do local, limpeza manual do terreno, remoção do solo desagregado, demolição dos destroços das obras anteriores que ruíram. Foi observado que uma parte da contenção que ruíra, na região central do terreno, foi bastante danificada. Ela teve sua verticalidade de face alterada, mas não atingiu o colapso completo. Apesar de ter havido uma significativa movimentação vertical do solo no tardoz da contenção, esse muro comprometido ainda funcionava como uma contenção de solo em um trecho de, aproximadamente, 2,5 m de altura e 20 m de extensão, porém esse muro não foi considerado nas avaliações para o dimensionamento da obra.

2.2 Execução dos chumbadores A estabilização do talude no trecho central do terreno, acima da porção de solo remanescente do último colapso da estrutura foi realizada com a instalação de 315


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terreno levaram à necessidade de regularização da base do aterro em uma área maior que a área em que estariam dispostas as geogrelha (2 m à frente da contenção). Um aterro de solo-ciFigura 4 – a) Execução de chumbadores metálicos; b) Talude estabilizado com o sistema solo grampeado e a mento compactado foi preparação da base para execução do aterro. Detalhe para o dispositivo de conexão entre os chumbadores executado longitudimetálicos e as geogrelhas nalmente em frente da contenção, para garantir um embutimento mínimo dessa estrutura, de modo a prevenir possíveis problemas de erosão na base da canaleta. Uma canaleta foi executada após o início da execução do aterro reforçado, Figura 5 – Início da etapa de construção da estrutura de solo reforçado com geossintéticos: a) Vista localizada; b) Vista geral disposta longitudinalmente à contenção. A chumbadores metálicos, dispostos geogrelha empregadas como reforFigura 5a apresenta o em malha de 1,5 m x 1,4 m (hori- ço do solo. O processo de escava- trecho do talude natural em solo zontal x vertical) (Figura 4a). Eles ção e remoção desses escombros grampeado, as primeiras placas de foram executados em furos de 100 ocorreu concomitantemente à concreto armado do sistema Lock mm de diâmetro e com 9 m e 12 m execução dos chumbadores e, ao and Load® e a canaleta para drenade comprimento, preenchidos em término desta etapa, foi possível gem na base da estrutura. A Figura duas etapas: bainha (vazio entre a demolir definitivamente o trecho 5b mostra uma visão geral da obra barra de aço e as paredes do furo) danificado pelos escorregamentos nessa fase executiva. e uma fase de reinjeção. Emprega- anteriores e remover o solo do loGeogrelhas uniaxiais de poliésram-se barras de aço CA-50, com cal. A Figura 4b ilustra o talude ter com resistência à tração nomi20 mm de diâmetro para compor estabilizado pelo sistema de solo nal igual a 60 kN/m e 100 kN/m os chumbadores e o fator água-ci- grampeado e a base preparada para e deformação na ruptura igual a mento igual a 0,5 (bainha) e 0,7 execução do aterro. 10% foram empregadas como ele(reinjeção). Um comprimento em mentos de reforço na estrutura de excesso das barras foi deixado no 2.3 Execução da contenção. O comprimento da inlado externo dos furos e dobrado estrutura em solo clusão foi determinado pelo comem um trecho de cerca de 300 mm reforçado com primento disponível entre a face (“esperas”). Esse trecho foi empre- geossintéticos da contenção e a face do talude esgado para unir os chumbadores às As condições topográficas do tabilizado com chumbadores. As 38

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Figura 6 – Detalhe da ligação entre geogrelhas e chumbadores metálicos

geogrelhas dispostas nas cotas das linhas de chumbadores foram unidas a eles por meio de um dispositivo constituído por uma barra de aço CA-50, inserida em um tubo de PVC de 40 mm de diâmetro e preenchido com calda de cimento. Tais dispositivos foram envolvidos pelas geogrelhas posicionadas nas mesmas cotas dos chumbadores e dispostos sobre as “esperas” mencionadas no item 3.2. As “esperas” foram adequadamente protegidas por um tubo dreno preenchido com calda de cimento. As geogrelhas envolveram o dispositivo de conexão e foram posicionadas novamente para dentro do aterro, num comprimento de, no mínimo, 1,5 m. A Figura 6 permite a visualização das “esperas” para ligação entre as geogrelhas e os chumbadores metálicos. A aplicação do sistema Lock and Load® possibilitou a execução de uma obra com elevado acabamento estético. Adicionalmente, a utilização de recuos para a implantação de jardineiras tem o propósito de permitir uma melhor integração com a vegetação 39

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Figura 7 – Vistas gerais da obra próxima à sua conclusão. a) Destaque para recuos na face (jardineiras) e DHPs; b) Visibilidade da obra para usuários da praia

Figura 8 – Fase final da execução da estrutura de solo reforçado com geogrelha. a) Execução da última camada de solo pouco permeável; b) Aspecto final da obra

circundante a obra. Esses aspectos ganham bastante destaque não apenas pela exigência do proprietário, mas também pela grande visibilidade da obra pelos usuários da praia adjacente (Figura 7). Destaca-se ainda a execução de drenos horizontais profundos com 12 m de comprimento e 40 mm de diâmetro, com espaçamento horizontal constante de 3 m, num total de 23 DHPs. A Figura 7a mostra uma vista geral da obra próxima à sua conclusão, com a indicação das jardineiras (recuos da face) e os DHPs. A Figura 7b, por sua vez, ilustra a vista da praia, indicando a visibilidade da obra para seus usuários e transeuntes.

A estrutura de solo reforçado com geogrelha foi finalizada com a execução de uma camada de argila plástica de baixa permeabilidade na superfície. A obra foi entregue em abril de 2016, seis meses após o início dos serviços e o seu dimensionamento atendeu completamente a critérios técnicos e estéticos. A falta de espaço físico para o desenvolvimento dos trabalhos, bem como a complicada logística da obra resultou em significativo atraso no tempo de execução. A Figura 8 apresenta a execução da última camada de solo compactado (solo fino pouco permeável) (Figura 8a) e o aspecto final da obra (Figura 8b).


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3 VANTAGENS TÉCNICAS, CONSTRUTIVAS E ECONÔMICAS OBTIDAS O caso de obra relatado neste artigo destaca-se como um exemplo da versatilidade de aplicação dos geossintéticos com a função de reforço, que diz respeito à geometria que a estrutura pode assumir e a sua associação com outras técnicas. Salienta-se, também, o aspecto inovador na concepção de um projeto em que chumbadores metálicos foram conectados às geogrelhas utilizadas como reforço na estrutura de contenção. Por fim, destaca-se também o emprego do sistema Lock and Load® como face da obra, o que conferiu um aspecto estético excelente para a obra e a possibilidade da construção de jardineiras, além de possibilitar a recuperação/ganho de cerca de 300 m² de área de terreno. Diante desses aspectos, percebe-se que as principais vantagens técnicas que podem ser destacadas nessa obra devido à utilização de geossintéticos referem-se, principalmente, a flexibilidade de associação com outras técnicas, a rapidez executiva e ao aspecto estético da obra. Em termos construtivos, a simplicidade executiva, comum para obras de solo reforçado com geos­ sintéticos, implicou numa grande facilidade para formação das equipes que trabalharam na obra. A utilização de equipamentos de menor porte foi necessária devido à limitação de espaço físico e aten40

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dida com a técnica escolhida. Adiciona-se a esses aspectos o fato de o sistema Lock and Load® permitir a compactação mecânica com equipamentos mais pesados próximo da face da contenção e não necessitar de içamento das peças, levando a um aumento na capacidade produtiva das equipes. Em termos econômicos, optou-se por guardar sigilo devido a obra ser particular, no entanto, destaca-se a utilização de solo local, que resultou numa redução expressiva dos custos construtivos. Outras técnicas exigem a aquisição e transporte de solos específicos e blocos de rocha (rachão), elevando o custo da obra. Além disso, a ausência de estruturas de concreto armado e da necessidade de fôrmas, armadura e tempo de espera para lançamento e cura do concreto promove a construção de uma obra menos onerosa. Assim, pode-se entender as soluções com geossintéticos para reforço de solos com um grande apelo econômico em relação a outras técnicas consagradas na engenharia geotécnica.

CONCLUSÃO Este artigo apresentou um caso de obra referente à estabilização de um talude natural (falésia) e ao ganho e recuperação de uma área perdida em escorregamentos anteriores no local, no município de São José de Ribamar (MA). Após a avaliação do problema, optou-se pela execução de chumbadores no talude natural, vinculados a uma

estrutura de solo reforçado com geo­ grelhas. A obra foi executada no trecho superior da falésia, pois a porção inferior apresentou estabilidade satisfatória. Uma residência de alto padrão localiza-se acima da falésia em questão. É importante salientar a versatilidade apresentada pela solução em solo reforçado com geossintético, uma vez que foi possível associá-lo com a técnica de solo grampeado e conectar as inclusões (geogrelhas) a chumbadores utilizados para estabilizar o talude natural. Dessa forma, foi possível recuperar a área perdida no topo da encosta devido a escorregamentos recentes e, portanto, aumentar o lote no topo da estrutura de contenção. Outro aspecto importante desta obra é referente ao seu componente estético. Como exigência do proprietário, e devido à visibilidade da obra aos usuários da praia adjacente, houve uma demanda considerável por uma solução com acabamento externo de grande valor estético e a possibilidade de integração com a vegetação circundante. A solução com o sistema Lock and Load® permitiu a construção de uma estrutura de solo reforçado com geo­ grelha com excelente acabamento externo e com a presença de jardineiras, formadas por recuos na disposição das placas de face em alturas pré-definidas. Além disso, esse sistema proporcionou reduções de custo executivo, uma vez que permitiu a compactação mecânica próxima à face


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e que não necessita de içamento das peças de concreto. Este caso de obra ganhou destaque por se tratar de uma obra peculiar, construída em uma geo­ metria complexa, numa falésia, com associação com outra técnica consagrada, como o solo grampeado, e num ambiente de grande vi-

sibilidade. É, portanto, uma ótima oportunidade, bastante interessante de demonstrar o potencial de aplicação dos geossintéticos com a função de reforço e impulsionar sua utilização.

AGRADECIMENTOS Os autores agradecem às em-

presas Geosoluções-Strata e RGP4 Construtora Ltda., pela disponibilização dos dados referentes ao caso de obra descrito neste artigo e ao Departamento de Engenharia Civil e ao Centro Acadêmico de Engenharia Civil da Universidade Federal do Rio Grande do Norte pelo suporte técnico para sua elaboração.

REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE GEOSSINTÉTICOS – IGS BRASIL (2015). Funções dos geossintéticos. Disponível em: <http://igsbrasil.org.br/wpcontent/uploads/2015/08/ Fun%C3%A7%C3%B5es-dos-­ Geossint %C3%A9ticos.pdf>. Acesso em: 30 abril 2016. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (2013). NBR ISO 10318:2013, Geossintéticos – Termos e definições. CAMPOS, M.V.W.; AVESANI NETO, J.O.; PEREIRA, V.R.G.; FRANÇA, F.A.N. (2014). Associação de técnicas tradicionais e inovadoras de estabilização e reforço de maciço de solo. Revista Fundações & Obras Geotécnicas. v.52, p. 50-55. FRANÇA, F.A.N.; PEREIRA, V.R.G. (2012). Emprego de geossintéticos para recomposição de talude com recuperação da geometria original e uso de solo local. Revista Fundações & Obras Geotécnicas. v.26, p. 56-64. GEOSOLUÇÕES – STRATA (2015). Lock+Load – Valor estético + Viabilidade econômica. Disponível em: <http://www.geosolucoes.com/#!blank/c1yl0>. Acesso em: 30 abril 2016. Google (2016). Imagem da Av. Atlântica. Disponível em: <https://www.google.com.br/ maps/@-2.4658869,44.1999197,3a,75y,195.51h,84.6t/data=!3m6!1e1!3m4!1s14GkehYCwSNyMu0Q-krDQw!2e0!7i13312!8i6656!6m1!1e1>. Acesso em: 4 maio 2016. KOERNER, R.M. (2012). Designing with geosynthetics, 6ed., vol. 1. Xlibris Press. PORTELINHA, F.H.M. (2012). Avaliação experimental da influência do avanço do umedecimento no comportamento de muros de solos finos reforçados com geotêxteis nãotecidos. Tese de Doutorado. Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. SANTOS, P.J.; ANANIAS, E.J.; FERRETI, P.C.B.; PRADO, J.A. (2014). Estádio em Itaquera – Muro de contenção em solo reforçado com geossintéticos. Revista Fundações & Obras Geotécnicas. v.51, p. 52-57. São Paulo. SCUDELARI, A.C.; BRAGA, K.G.; COSTA, F.A.A.; SANTOS JÚNIOR., O.F. (2005). Estudo dos processos erosivos instalados na praia de Pipa – RN. Brazilian Journal of Aquatic Science and Technology, v.9, p. 31-37. WIKIPEDIA (2014). São José de Ribamar. Disponível em: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/6/62/Maranhao_Municip_SaoJosedeRibamar.svg/758px-Maranhao _Municip_SaoJosede Ribamar.svg.png>. Acesso em: 4 maio 2016.

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Fundações e Obras Geotécnicas


Artigo

ESTRUTURAS ANCORADAS E SUAS APLICAÇÕES NA GEOTECNIA

Débora Cristina Ferreira Engenheira Civil, Belo Horizonte (MG) deborac.ferreira@hotmail.com

Dr. Thiago Bomjardim Porto Professor-adjunto IV na PUC Minas (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais) – Belo Horizonte (MG) Diretor-técnico – COSMARA Engenharia porto@pucminas.br

Msc. Carlos Roberto da Silva Professor assistente III na PUC Minas (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais) – Belo Horizonte (MG) Consultor estrutural engcarlos2015@hotmail.com

RESUMO Desde sua primeira aplicação em 1880 no reforço da Barragem de Cheurfas na Argélia, as ancoragens sofreram sucessivas evoluções e suas aplicações tornaram-se bastante frequentes em diversas situações como: a estabilização de escavações subterrâneas; execução de estruturas de contenção para estabilização de taludes; reforço de estruturas de arrimo pré-existentes; ancoragens aplicadas na construção de barragens e estruturas auxiliares; resistência a forças de subpressão em estruturas enterradas; fundações de estruturas sujeitas a esforços inclinados; estaiamento de coberturas sujeitas especialmente à ação do vento; fundações de obras especiais, como mastros, torres, teleféricos, correção de deslocamentos de estruturas pré-existentes; execução de microestacas como reforço de fundações; montagem de provas de carga “in situ”, entre 42

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outros. No Brasil, a primeira aplicação de ancoragem executada em solo foi em 1957, na rodovia Rio-Teresópolis, constituídas basicamente por uma única barra de aço imersa em um furo preenchido com calda de cimento, possuindo capacidade de carga geotécnica entre 100 kN e 200 kN. Com o passar dos anos, esta capacidade de carga foi aumentando devido o crescimento de obras de grande porte, consequentemente a necessidade de maiores cargas. Esse ganho de resistência apenas foi possível graças ao surgimento das ancoragens reinjetáveis e protendidas. Em 1970 houve a primeira tentativa de normalizar a utilização de ancoragens em terreno brasileiro em caráter de projeto e metodologia executiva, porém, a primeira norma foi publicada apenas cinco anos mais tarde, desenvolvida a partir da experiência adquirida nas obras do metrô de São Paulo e Rio de Janeiro. A ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) desenvolveu em 1975 a NB-565 referindo sobre a qualidade, desempenho e aceitação das ancoragens, regulamentando os ensaios para esse elemento. Essa norma foi reconhecida em 1977 como NBR 5.629:1977 – “Estruturas ancoradas no terreno: Ancoragens injetadas no terreno”, colocando em vigor os parâmetros obrigatórios a serem analisados em estruturas ancoradas no terreno, provisórios ou permanentes. No ano de 1996 a referida norma foi mais uma fez alterada para NBR 5.629:1996 – “Execução de tirantes ancorados no terreno”, que tinha o objetivo de firmar as condições necessárias à conferência, execução e análise dos tirantes ancorados em solos. Nesta norma, fatores de segurança distintos foram atribuídos para ancoragens provisórias e permanentes. Dez anos depois foi criada a NBR 5.629:2006 – “Execução de tirantes ancorados no terreno”. Neste documento foi incluído um novo anexo sobre a classificação de agressividade dos meios (terrenos


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e águas freáticas). Atualmente, essa norma está em processo de revisão, motivada principalmente em função do aparecimento de novos tirantes no mercado e em função da mudança entre os limites no fator água/cimento para a calda de cimento de injeção. Este trabalho tem o objetivo de apresentar a evolução das aplicações de ancoragens na engenharia geotécnica no Brasil nos últimos 40 anos, destacando a origem desses aperfeiçoamentos técnicos motivados pelo desenvolvimento da engenharia nacional. Palavras-Chave: Cortina Atirantada, Estruturas An­coradas, Tirantes, Evolução Histórica da Ancoragem.

INTRODUÇÃO As ancoragens são definidas como peças que introduzidas no terreno possuem a função de suportar tensões de tração e transmitir esses esforços ao maciço ao qual foram ancoradas. A utilização de ancoragens em maciços rochosos tem aplicação pioneira de grande relevância desde 1934, como solução de reforço da barragem de Cheurfas na Argélia (CAMBEFORT, 1964). De acordo com Porto (2015), a Barragem de Cheurfas, construída em 1880 foi idealizada para funcionar como estrutura de gravidade. No entanto, em 1885 sofreu um colapso, sendo reconstruída sete anos depois (1892). Em 1930, a barragem voltou a ter problemas, na ocasião, na fundação. Diante do cenário citado, tornou-se necessário recorrer a uma nova intervenção na barragem, garantindo, assim, o restabelecimento da integridade estrutural do maciço. A solução de engenharia consistiu basicamente na inserção de 37 ancoragens. Em 1957, na rodovia Rio-Teresópolis foi utilizada o sistema de ancoragem para auxiliar na estabilização de encostas. Nesta obra, a ancoragem era formada por única barra de aço imersa em um furo preenchido com calda de cimento, possuindo capacidade de carga geotécnica entre 100 kN e 200 kN (COSTA NUNES, 1978). Habib (1969) afirma que com o passar dos anos essa capacidade de carga foi aumentando devido o crescimento de obras de grande porte em diferentes lugares, havendo a necessidade de aumento de carga para aumentar a segurança da obra. Esse ganho de resistência apenas foi possível graças ao surgimento das ancoragens reinjetáveis e protendidas. 43

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Figura 1 – Atirantamento em Túneis (Adaptado de Costa Nunes, 1987)

1 APLICAÇÕES DAS ANCORAGENS Com o passar dos anos, as finalidades de aplicação das ancoragens em solo foram se diversificando à medida que ganhavam a confiança dos técnicos. Costa Nunes (1976) destaca a utilização de ancoragens para várias finalidades.

1.1 Estabilização de escavações subterrâneas, túneis, metrôs e subsolos A utilização de tirantes em túneis teve início no Brasil no ano de 1975, na construção do metrô das cidades de São Paulo (SP) e Rio de Janeiro (RJ). Atualmente o espaço subterrâneo vem sendo utilizado devido a grande valorização de terrenos superficiais e também aos problemas relacionados à mobilidade urbana, ao qual estão submetidos os grandes centros urbanos. A Figura 1 apresenta um croqui exemplificando a utilização de ancoragens em túneis.

1.2 Execução de estruturas de contenção para estabilização de taludes Desde o milagre econômico no governo de Juscelino Kubitschek (entre 1956 e 1961) uma série de rodovias foram construídas no País. Para que essas obras de infraestrutura fossem possíveis foi necessária a utilização de


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Figura 4 – Utilização de Ancoragens em Barragens (Adaptado de Costa Nunes, 1987) Figura 2 – Ancoragens na Consolidação de Taludes (Adaptado de Costa Nunes, 1987)

ção da carga de empuxo sobre a estrutura de contenção, podendo assim rompê-la. Nessas situações a ancoragem torna-se alternativa única para solucionar tal problema. A Figura 3 representa o exemplo de atirantamento em estruturas já existentes.

1.4 Ancoragens aplicadas na construção de barragens e estruturas auxiliares

Figura 3 – Ancoragem de muros existentes (Adaptado de Costa Nunes, 1987)

ancoragens passivas e ativas para garantir a estabilidade de taludes (corte e aterro). Nessa categoria de obras, destaca-se o sistema de contenção cortina atirantada e solo grampeado. A Figura 2 representa o exemplo de atirantamento em taludes.

1.3 Reforço de estruturas de arrimo pré-existentes Em muitas situações práticas é comum a modifica44

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Assim como em estruturas convencionais de contenção, as ancoragens também podem ser utilizadas como elementos de reforço em barragens de terra ou concreto. Exemplo clássico é o reforço da barragem de Cheurfas na Argélia. As barragens Pacajus e Rosário, ambas localizadas no Estado no Ceará, são exemplos de barragens que tiveram que ser reforçadas em virtude da magnitude das cavidades de erosão formadas a jusante das estruturas. As intervenções foram feitas com o propósito de proteger a fundação da barragem, evitando assim a expansão da cavidade erosiva (FONTENELLE et al., 2007). A Figura 4 representa o exemplo de atirantamento em barragens.

1.5 Resistência a forças de subpressão em estruturas enterradas A utilização de tirantes em canais possui aplicações diversas, destacando-se: reforço da estrutura de conten-


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ção, garantindo assim menor deslocabilidade horizontal da estrutura; combate a subpressão da laje de fundo, no caso do nível da água estiver muito alto. A Figura 5 representa o exemplo de atirantamento em canais.

1.6 Fundações de estruturas sujeitas a esforços inclinados Geralmente ocorre devido a configurações de algumas estruturas que favorecem a excentricidade, resultando em momentos de tombamento. As ancoragens são executadas como elementos de fundação posicionadas na vertical ou inclinada. São soluções para estabilizar a fundação, ou seja, um contrapeso que compensa as ações introduzidas pelos momentos de tombamento. Nesse tipo de situação, geralmente necessita-se de ancoragens com elevada capacidade de carga, sendo o mais adequado à realização da ancoragem em terreno com SPT acima de 30 ou em terrenos rochosos. A Figura 6 representa o exemplo de estruturas sujeitas a esforços inclinados.

Figura 5 – Tirantes em Canais (Adaptado de Costa Nunes, 1987)

1.7 Estaiamento de coberturas sujeitas, especialmente, à ação do vento A utilização de ancoragens não se limita exclusivamente para estruturas de contenção. Esse dispositivo pode ser utilizado também no estaiamento de coberturas sujeitas, especialmente, à ação do vento. No Brasil um exemplo foi na obra de reforço da cobertura do Estádio Olímpico João Havelange, mais conhecido como “Engenhão”, no Rio de Janeiro (RJ). Após um laudo técnico em sua cobertura no ano de 2013 foi necessário um projeto de reforço, que consistia na instalação de dois cabos estaiados nos lados oeste e leste do estádio, com o objetivo de distribuir as cargas das estruturas comprometidas. (Minuto Engenharia, 2016). A Figura 7 representa o estaiamento da cobertura do estádio.

Figura 6 – Representação esquemática de estrutura sujeita a esforço inclinado (Autoral)

1.8 Fundações de obras especiais, como mastros, torres e teleféricos De acordo com Quental (2008), as torres de linhas de transmissão são elementos estruturais que servem de suporte a instalação de cabos com a finalidade de transmitir a energia elétrica. São classificadas quanto à voltagem da linha e seu tipo estrutural, que varia entre: 45

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Figura 7 – Representação do estaiamento na cobertura do Estádio Engenhão (Fonte: Minuto Engenharia)


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Figura 8 – Representação de atirantamento em torres de linhas transmissão e torres de telecomunicação (Autoral)

- Torres Autoportantes: estruturas metálicas de grande porte que podem ser rígidas, flexíveis e semi-flexíveis, que possuem capacidade de resistir a grandes esforços, transmitindo-os diretamente às fundações, podendo atingir elevados valores de momentos fletores junto à linha de solo. Essas torres podem variar, podendo ser de suspensão, ancoragem de transposição e de fim de linha (QUENTAL, 2008). - Torres Estaiadas: estruturas flexíveis utilizadas em locais planos e em trechos de linha sem ângulo. Elas são enrijecidas por estais, sendo estes responsáveis pela absorção de parte dos esforços que são transmitidos para as ancoragens e a outra parte é transmitida pela própria estrutura (QUENTAL, 2008). A Figura 8 representa o atirantamento em torres.

Como alternativa ao combate de recalques excessivos em edificações tem-se a possibilidade de utilizar microestacas ou estacas tipo presso-ancoragem como reforço de fundações. No caso dessa última, tem-se a opção também de se fazer um “melhoramento” das propriedades de resistência do maciço geotécnico, coesão (c), e ângulo de atrito (f ). Isso é possível uma vez que a estaca tipo presso-ancoragem funciona como um tirante, portanto, existe injeção de nata de cimento sob pressão. Como ponto negativo, tem-se o preço desse tipo de solução técnica. Trata-se de alternativa onerosa para o executor/contratante. Em função disso, essa solução deve ser utilizada apenas em soluções extremas. A Figura 9 mostra o atirantamento em reforços de fundações.

1.9 Execução de microestacas ou estacas tipo presso-ancoragem como reforço de fundações

1.10 Montagem de provas de carga “in situ”

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As provas de carga “in situ” são usualmente feitas


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como alternativa para o controle tecnológico de obras de fundações executadas com estacas. Segundo a NBR 6.122/2010 – Projeto e Execução de Fundações, para cada 100 estacas executadas, uma delas deve ser ensaiada, aferindo-se assim as previsões de capacidade de carga geotécnica feitas inicialmente na etapa de projeto com a situação de campo (real). Para a montagem do sistema de reação da prova de carga, usualmente utiliza-se ancoragens reinjetáveis e protendidas. A Figura 10 representa um modelo típico de ancoragem como sistema de reação para provas de carga in situ.

2 CLASSIFICAÇÕES DAS ANCORAGENS De acordo com Costa (2014), ancoragem provisória é aquela que possui seus elementos estruturais temporários, com uma vida útil de até dois anos. Já nas normas europeias da Suíça (SIA V191/1995, 1996) – Tirants d’ancrage précontraints – e do Reino Unido (BS8081, 1989) – Code of practice for ground anchorages – a vida útil das ancoragens é parametrizado face ao risco de utilização dividindo-as em subcategorias: Construção temporária: caracterizada por não utilizar proteção contra a corrosão devido a sua durabilidade máxima de seis meses; Suporte semi-permanentes: caracterizada pela vida útil entre quatro a seis meses, sendo recomendado medidas contra corrosão; Contenções definitivas: caracterizada pela vida útil superior a 24 meses, sendo exigido o uso de proteção contra a corrosão. As ancoragens definitivas ou permanentes são caracterizadas por serem elementos estruturais permanentes que asseguram a estabilidade da obra em longo prazo. A NBR 5.629 considera a vida útil de uma ancoragem permanente equivalente há 50 anos. Para o correto dimensionamento geotécnico e estrutural de uma ancoragem permanente, leva-se em conta variáveis como: solicitação geotécnica no tirante, estabilidade interna e externa do maciço geotécnico, condicionantes relacionadas à relaxação e fluência do bulbo de ancoragem, entre outros. Para que seja garantida a longevidade de 47

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Figura 9 – Representação de atirantamento em reforço de fundações (Adaptado de Costa Nunes, 1987)

Figura 10 – Representação de ancoragem em prova de carga in situ (Autoral)

uma ancoragem tornam-se necessários estudos paralelos relacionados à condicionantes de agressividade química do meio, evitando assim, por exemplo, corrosão da armadura. Outra alternativa para garantir a longevidade de ancoragens reinjetáveis e protendidas é a execução de


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Figura 11 – Esquema de um chumbador injetado usado em solo grampeado (Autoral)

Figura 12 – Barra usada para grampear o solo (Torcisão)

Figura 13 – Exemplo de Sistema de Ancoragem Passiva (Torcisão)

tratamento anticorrosivo do tirante, por exemplo, aplicação de tintas especiais. As ancoragens passivas, também conhecidas como grampos são muito utilizadas na estabilização de encostas com o sistema solo grampeado e/ou pregado. Neste tipo de contenção a ancoragem não é protendida, e apenas solicitada mediante mobilização do maciço geo­ 48

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técnico. Para tanto, essa solução geotécnica pode ser utilizada apenas em corte e nunca em aterro, conforme pode ser visto na Figura 12. Usualmente, para este tipo de solução geotécnica, utiliza-se tirantes de monobarra. Fios e cordoalhas não são utilizados. Para solicitações baixas, permite-se também a utilização de vergalhões da construção civil, como por exemplo, aços CA-50, que pode ser visto na Figura 12. Existem peças fundamentais que compõem o sistema passivo de ancoragem, assim como representado na Figura 13. A ancoragem é formada pelo tirante, luvas de emenda, anel, arruela e sistema de injeção. Já as ancoragens ativas, também conhecidas no mercado simplesmente como “tirantes”, são peças introduzidas no terreno com a principal função de suportar tensões de tração e transmitir esses esforços ao maciço ao qual foram ancoradas. A ancoragem no terreno é feita através de equipamentos especiais, denominados macacos hidráulicos, acionados por bombas hidráulicas de alta pressão. Para a execução do furo, usualmente é utilizada uma perfuratriz. No entanto, existem também os tirantes autoinjetáveis, Figura 14, onde o tirante funciona simultaneamente como elemento perfurante e elemento estrutural. O sistema de ancoragem convencional é usualmente formado por placa metálica de distribuição tensão, bloco de ancoragem, clavetes, cordoalha,


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espaçador e tubo de injeção. Este tipo de ancoragem é muito utilizado em cortinas atirantadas, paredes diafragma atirantadas, retangulões atirantados e estruturas subterrâneas ancoradas. Usualmente, para este tipo de solução geotécnica, utiliza-se tirantes de cordoalha, como na Figura 15. As cordoalhas são muito utilizadas no caso de grandes solicitações geotécnicas. A Figura 16 representa a cordoalha com sete fios. Observa-se que a cordoalha é composta por conjunto de fios contorcidos entre si. A Figura 17 mostra esse exemplo. A escolha do melhor sistema de estabilização geotécnica depende de uma série de fatores, como por exemplo, tipo de solo, natureza da obra, metodologia executiva, entre outros. Apresenta-se na Tabela 1 às vantagens e desvantagens das ancoragens ativas e passivas.

3 NORMATIZAÇÃO No Brasil, a primeira tentativa de elaboração de uma norma técnica de ancoragens foi proposta por Fonseca (1970) apud Porto (2015), em caráter de projeto, e metodologia executiva, porém, Kuhn (1970) apud Porto (2015), cita que a primeira norma brasileira sobre o assunto só foi publicada cinco anos mais tarde (1975) por meio da experiência adquirida nas obras do metrô de São Paulo e do Rio de Janeiro. Quando as escavações das obras do metrô solicitaram escoramentos metálicos mais robustos e eficientes, logo, mais caros, exigiu-se a necessidade de ancoragens com capacidade de carga entre 400 kN e 600 kN. No mundo, a primeira norma referente às ancoragens foi elaborada na Alemanha em 1972, a DIN 4125 – Soil and rock anchors, temporary soil anchors, analysis, structural design and testing (DIN 4125, 1972), referente a ensaios em ancoragens em solo. Em 1975, com base na DIN 4125 ABNT, criou a NB-565, que discorria sobre a aceitação, qualidade e desempenho das ancoragens, regulamentando os ensaios para esses elementos. Dois anos mais tarde, em 1977, essa norma foi reconhecida como NBR 5.629:1977 – Estruturas ancoradas no terreno – Ancoragens injetadas no terreno (ABNT, 1977), com o objetivo de fixar as condições exigíveis 49

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Figura 14 – Representação de Tirantes Autoinjetáveis (Incotep Sistemas de Ancoragem)

Figura 15 – Representação da Cordoalha de aço (Longarone)

Figura 16 – Cordoalha sete fios (Incotep Sistemas de Ancoragem)

Figura 17 – Representação de um fio de aço de proteção (Cofer)


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Tabela 1 – Vantagens e desvantagens dos tipos de ancoragem Ancoragem Passiva

Vantagens

Desvantagens

Execução prática e rápida

Contenção flexível, portanto, permite deslocamentos horizontais altos

Baixo custo de execução

Inviável onde não é permitido grandes deslocamentos

Contenção rígida, portanto, não permite deslocamentos Exigência de mão de obra especializada horizontais altos Adapta-se bem a novas solicitações geotécnicas, uma vez que as ancoragens são reinjetáveis e sua Alto custo de execução capacidade de carga geotécnica pode ser aumentada, mediante uma nova protensão.

Ativa

Fonte: os autores.

Figura 18 – A evolução das normas relacionadas às ancoragens no Brasil (Adaptado de Porto, 2015)

Figura 19 – Evolução das técnicas de contenção no Brasil (Adaptado de Porto, 2015)

para a ancoragem de tirantes em terreno, tanto para fins provisórios como fins permanentes. De acordo com Porto (2015), essa norma sofre várias alterações, como ocorreu em 1996, tornando-se a NBR 5.629:1996 – Execução de tirantes ancorados no terreno (ABNT, 1996). Esta norma estabelecia as condições necessárias à execução, conferência e análise dos tirantes ancorados nos solos responsáveis por suportar cargas provisórias ou permanentes. Ela ainda determinava os equipamentos e acessórios imprescindíveis à execução dos serviços, assim como os materiais e a mão de obra necessária. Passados dez anos, foi elaborada a NBR 5.629:2006 – Execução de tirantes ancorados 50

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no terreno. No ano de 2013 foi criada uma nova comissão para atualizá-la. Esta foi para análise em outubro de 2015 pelo Comitê Brasileiro de Construção Civil da ABNT (ABNT/CB-02, 2015). Entre os principais motivos levantados para a necessidade de revisão estão: a inserção de novos tipos de tirantes, atualização das nomenclaturas dos elementos que compõem os sistemas de contenção de acordo com os termos utilizados atualmente, dimensionamento, projeto, a utilização de sistemas de proteção contra corrosão, fatos de segurança e os requisitos da recente norma de calda de cimento, a NBR 7.681:2013 (ABNT, 2013), que estipula o fator água-cimento inferior a 0,4, não sendo


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aplicável aos tirantes da atual norma em vigor. A Figura 18 mostra a linha do tempo das normas brasileiras de ancoragem. A técnica de contenção utilizando ancoragens protendidas teve início no Brasil no meio do século passado logo após ser inserida nos países europeus como Alemanha, França e Itália. O país se adaptou rapidamente a esse tipo de contenção, aprimorando os métodos de cálculos e de execução desses elementos, já que a construção de edifícios de grande porte que demandavam profundas escavações era cada vez maior nos centros urbanos, como nas obras da cidade de São Paulo (PORTO, 2015). A Figura 19 apresenta a linha do tempo com datas importantes relacionadas ao emprego de ancoragens protendidas no Brasil de acordo com o IESP (2006) e elencadas como: 1957 – Realização das primeiras obras de contenção com ancoragem em solo utilizando tirantes protendidos, sendo executadas em rodovias do Rio de Janeiro. Essa técnica foi empregada anos mais tarde para estabilidade de encostas devido ao conhecimento insuficiente da época quanto ao comportamento das ancoragens no decorrer do tempo; 1970 – No início da década de 1970 iniciou-se a construção do metrô de São Paulo, sendo inseridos no Brasil os tirantes reinjetáveis e protendidos, apresentando, estes, uma capacidade de carga de até 1500 kN; 1975 – Publicação da primeira norma referente aos tirantes injetados e protendidos no Brasil, a NB-565; 1980/1990 – Com o desenvolvimento da indústria automobilística, deu-se continuidade à técnica de contenção por meio de tirantes em todo o Brasil devido às inúmeras construções de edifícios com vários subsolos nas grandes cidades. Atualmente existe um elevado uso das técnicas de ancoragens em solo, especialmente nos grandes centros urbanos, sendo utilizados tirantes de capacidade de carga de até 1.500 kN. Entre as ancoragens tem-se as ativas e as passivas. Ambas possuem os mesmos elementos, no entanto, as ativas possibilitam a aplicação da força de protensão e as passivas apenas trabalham mediante mobilização do maciço geotécnico e não são protendidas. Nos últimos 20 51

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anos não houve tanto aprimoramento nas ancoragens ativas comparação com a evolução das técnicas em solo grampeado. Esse fato ocorreu principalmente devido: a estabilização de encostas a partir da solução em solo grampeado é em média 1/3 do custo de uma contenção em cortina atirantada, e embora o custo da solução em solo grampeado seja bastante atrativo, esse tipo de conteção ainda carece de muitos estudos, principalmente no que se refere à deformação de maciços mobilizados.

CONCLUSÃO Com base no levantamento de dados bibliográficos apresentados nesta pesquisa, percebe-se que houve uma evolução das técnicas de ancoragem na geotecnia, principalmente em centros urbanos, com capacidade de carga de até 1.500 kN. Sua aplicação se estende desde a utilização na sustentação de túneis, suporte de muros já existentes, ensaio “in situ” a atirantamento de novas estruturas de contenções e fundações de torres eólicas. Percebe-se que a norma brasileira NBR 5.629 – Execução de tirantes ancorados no terreno está em constante mudança (evolução/adequação) devido ao melhoramento de equipamentos, acessórios e técnicas que possam ser ajustadas com o objetivo de aumentar a eficácia e segurança da aplicação de um tirante. Por fim, ratifica-se neste documento, a importância de uma boa investigação geotécnica no terreno para garantir o sucesso do projeto de estabilização, seja ele qual for, e consequentemente, a eficácia da tecnologia de ancoragens em obras de infraestrutura. A definição incorreta dos parâmetros de resistência do terreno podem criar projetos inadequados, gerando assim, a falsa impressão de que o sistema de ancoragens não é seguro ou mesmo, economicamente desinteressante.

AGRADECIMENTOS Agradecemos a Consmara Engenharia por disponibilizar o material técnico-instrutivo sobre o assunto. Gostaríamos de agradecer também o Instituto Politécnico da PUC Minas pelo apoio irrestrito a este trabalho.


Artigo

REFERÊNCIAS ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NB-565 – Estruturas ancoradas no terreno – Ancoragens injetadas no terreno: Procedimento. Rio de Janeiro, 1975. ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 5.629 – Estruturas ancoradas no terreno – Ancoragens injetadas no terreno: Procedimento. Rio de Janeiro, 1977. ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 5.629 – Execução de Tirantes Ancorados no Terreno. Rio de Janeiro, 1996. ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 5.629 – Execução de Tirantes Ancorados no Terreno. Rio de Janeiro, 2006. ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6.122 – Projeto e Execução de Fundações. Rio de Janeiro, 2010. ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 7.681-2: 2013 – Calda de cimento para injeção Parte 2: Determinação do índice de fluidez e da vida útil — Método de ensaio. Rio de Janeiro, 2013. ABNT/CB-02. Execução de tirantes ancorados no terreno – Texto Base, Comitê Brasileiro de Construção Civil da ABNT. São Paulo, SP. 2015. ARAÚJO, Clovis F.; DOMINGOS, Solange S. Construção de barragens de enrocamento para contenção de resíduos de mineração. 2011. Trabalho de conclusão de Curso do curso de Engenharia Civil da Universidade Anhembi Morumbi. <Recuperado a partir de http://engenharia.anhembi.br/tcc-11/civil-10.pdf>. Acesso em: 15 de Jul. 2016. BS-BRITISH STANDARD. BS 8081 – Code of practice for ground anchorages.England 1989. CAMBEFORT, H. “Injection des sols”. Tomos I e II, Éditions Eyrolles, Paris. 1964. COSTA, José M. D. A utilização de ancoragens em centrais hidroelétricas. Casos de obra. 2014. Dissertação de Mestrado da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Disponível em <https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/73525/2/100491.pdf>. Acesso em: 12 de Jul. 2016. COSTA NUNES, A. J. 20 Anos de experiência em ancoragens. Conferência no Instituto de Engenharia de São Paulo. 1978. COSTA NUNES, A. J. Aplicações Geotécnicas da Protensão – II Seminário Nacional do Concreto Protendido – IBS/ABPE. 1976. COSTA NUNES, A. J. Ground Prestressing – First Casagrande Lecture. VIII CPAMSEF, Cartagena, Colombia. 1987. DIN – Deutsche Norm. DIN 4125 – Soil and rock anchors, temporary soil anchors, analysis, structural design and testing. Germany, 1972. FONTENELLE, A. de S. Proposta Metodológica de Avaliação de Riscos em Barragens do Nordeste Brasileiro – Estudo de Caso: Barragens do Estado do Ceará. 2007. 210 f. Tese. Doutorado em Engenharia Civil – Universidade Federal do Ceará, Centro de Tecnologia, Fortaleza, 2007. HABIB, P. Les Ancrages em Terrains Meubles. VIII COMOSEF. 1969. IESP. Parecer técnico de tirantes em áreas urbanas. INSTITUTO DE ENGENHARIA DE SÃO PAULO – IESP, São Paulo. 04 abr. 2006. Disponível em: <http://ie.org.br/site/ieadm/arquivos/arqnot128.pdf >. LEAL, Matheus Marques da Silva. Projeto de uma cortina ancorada para estabilizar um muro de arrimo rompido. 2014. Projeto de Graduação do Curso de Engenharia Civil da Escola Politécnica, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Disponível em <http://monografias.poli.ufrj.br/monografias/monopoli10010728.pdf>. Acesso em: 23 de Jul. 2016. PORTO, Thiago B. Ancoragens em solos – comportamento geotécnico e metodologia via web para previsão e controle. 2015. Tese de Doutorado da Universidade Federal de Ouro Preto. Disponível em <http://www.nugeo.ufop.br/ uploads/nugeo_2014/teses/arquivos/tese-thiago-rev-2016-v1-revisado.pdf>. Acesso em: 12 de Jul. 2016.

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Fundações e Obras Geotécnicas


Artigo

QUENTAL, Jamily C. Comportamento das Torres de Linha de transmissão Recife II/Bongi. 2008. Dissertação de Mestrado da Universidade Federal de Pernambuco. Disponível em <http://repositorio.ufpe.br/bitstream/handle/123456789/5315/arquivo2432_1.pdf?sequence=1&isAllowed=y>. Acesso em: 20 de Jul. 2016. SIA V191/1995 – Tirants d’ancrage précontraints. Géotechnique. Schweizer Norm, Zurich, 1996. SILVA, Carlos R. Comportamento de estacas tipo presse-ancoragem. 1994. Dissertação de mestrado do curso de Geotecnia da Universidade de São Carlos, SP.

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Fundações e Obras Geotécnicas


Centro de Memória da ArcelorMittal Brasil

História

Obra: Construção do Memorial da América Latina (Projeto do arquiteto Oscar Niemeyer). A empresa ArcelorMittal Brasil forneceu cordoalhas para o concreto protendido e telas para a obra Local: São Paulo / São Paulo Data: Fevereiro de 1989

Obra: Construção do Memorial da América Latina (Projeto de Oscar Niemeyer). A empresa belgo-mineira, desde 2007 ArcelorMittal Brasil, forneceu cordoalhas para o concreto protendido e telas para a obra Local: São Paulo / São Paulo Data: Fevereiro de 1989

Estas imagens foram retiradas do banco de imagens Arquigrafia da USP (Universidade de São Paulo)

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Fundações e Obras Geotécnicas


O setor em Números

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Fundações e Obras Geotécnicas


O que há de novo

Tecnologia utiliza nitrogênio para acelerar resfriamento do concreto de forma eficaz e sustentável O método controla a temperatura visando reduzir fissurações de origem térmica por Dellana Wolney

Fotos: Divulgação Air Liquide

A

Equipes especializadas acompanham todo o processo de aplicação do Cryocrete

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Fundações e Obras Geotécnicas

A empresa Air Liquide, especializada em gases, tecnologias e serviços para a indústria e saúde, desenvolveu uma solução inovadora, para o resfriamento do concreto utilizado, principalmente na construção de grandes estruturas. A aplicação chamada de CryoCrete é feita com nitrogênio, que tem a função de acelerar o processo de redução da temperatura do concreto até o nível considerado adequado, evitando futuras rachaduras, bem como outros tipos de fissuras em obras de barragens, pontes, viadutos, túneis, usinas entre outras. Importada dos Estados Unidos, onde já é utilizada há mais de 15 anos, a solução chegou ao mercado brasileiro no ano de 2011, em virtude da construção da terceira usina da CNAAA (Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto), Angra III. A Air Liquide foi acionada pela construtora do empreendimento para fazer a aplicação da tecnologia no resfriamento do concreto que seria utilizado na obra. O gerente de produto da Air Liquide, Demis Faria Santos, explica que a unidade CryoCrete consiste em uma lança de nitrogênio líquido que é inserida ou retraída, por um sistema pneumático, no balão


O que há de novo

de uma betoneira de concreto. O sistema pneumático é operado com gás nitrogênio ou ar comprimido, que é controlado por meio de uma válvula solenoide. Já a injeção de nitrogênio líquido, pela lança dentro do balão, é operada por uma válvula de esfera de acionamento pneumático. Todo o processo é sequenciado a partir de um painel de controle. A injeção inclui luzes indicadoras, que possuem a finalidade de alertar o operador sobre o andamento do processo de injeção.

FUNCIONAMENTO O processo de resfriamento do concreto com o uso de nitrogênio líquido diretamente na betoneira do caminhão é feito por um sistema automático. O nitrogênio é aplicado em baixíssimas temperaturas, podendo chegar até -196ºC. Este procedimento é acompanhado por uma equipe técnica especializada e pode ser empregado diretamente na obra ou na concreteira, visto que o equipamento é móvel. De forma detalhada, a aplicação de nitrogênio ocorre depois de feita a mixagem do concreto, ao passo que, na sequência, o caminhão betoneira encosta sob o equipamento CryoCrete. Neste momento, o operador aciona a lança para injeção direta na betoneira do caminhão. Antes desta etapa é definido o delta de temperatura a ser atingido, que é regulado no painel de controle com tempo determinado. “A Air Liquide não define a temperatura do concreto, ou seja, essa 57

Fundações e Obras Geotécnicas

Nitrogênio para resfriar concreto é aplicado a -196ºC

definição é decidida pela equipe de engenharia da obra, de forma que, ao nos contratar, descrevem o delta de temperatura a ser atingido e, com base nisso, definimos o volume de nitrogênio a ser utilizado. As temperaturas variam de acordo com as dimensões dos projetos e localização, como por exemplo, em obras nas regiões Norte e Nordeste que, via de regra, requerem maior delta de resfriamento”, destaca Santos. A importância do resfriamento é que durante o preparo do concreto, fatores como a temperatura dos componentes, fazem com que a temperatura final da mistura seja maior em relação à do ambiente. Essa diferença pode comprometer a

resultado da aplicação e fazer com que surjam rachaduras na construção, já que o cimento não foi “curado”, ou seja, hidratado e resfriado adequadamente.

VANTAGENS O uso do Cryocrete se apresenta eficaz em vários aspectos. Com a aplicação direta do nitrogênio nas betoneiras, por meio de equipamento automatizado, o processo se torna muito mais profissional e potencializado do ponto de vista operacional, reduzindo a mão de obra empregada na operação, além dos riscos ligados à segurança. Em relação à eficiência, não há limitação para o resfriamento de temperatura, além disso, a solu-


O que há de novo

Lança de nitrogênio líquido inserida diretamente na betoneira de concreto

Tecnologia da Air Liquide desenvolvida nos Estados Unidos está no mercado brasileiro desde 2011

Experiência Um dos casos mais relevantes da aplicação do CryoCrete no Brasil foi na obra de Angra III. Neste caso, o nitrogênio líquido foi uma solução encontrada pelo cliente para complementar o controle de temperatura do concreto fresco e, consequentemente, do concreto nas estruturas, visando controle da fissuração de origem térmica, haja vista que o método anterior não atingia as especificações necessárias. A conclusão do cliente é que a tecnologia CryoCrete é uma alternativa altamente recomendável para eliminar a rejeição de concreto, devido a inobservância da temperatura de lançamento. A rápida redução de temperatura proporcionada pelo CryoCrete também mostrou a eficácia do sistema e a comprovação de sua facilidade de aplicação para correções da temperatura do concreto.

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Fundações e Obras Geotécnicas

ção elimina a reprovação de cargas, diminui o consumo de energia e, usa menos água no processo, se for considerada a eliminação do gelo. Não há restrição para o uso da tecnologia e determinado tipo de obra, ou seja, a partir do momento em que a construção de um empreendimento requerer resfriamento, o CryoCrete pode ser empregado. “Todavia, é mais comum o uso em obras em que as dimensões do concreto são maiores”, acrescenta Santos. Ele ainda diz que a solução vem evoluindo de forma muito positiva no Brasil, principalmente por ser uma aplicação conhecida e aprovada pelas consultorias em concreto. “Naturalmente que, para o cliente/usuário que nunca acompanhou uma operação com o uso desta aplicação, sempre fazemos uma operação piloto para que conheçam o produto, pois em alguns casos os contratantes trabalham com o método do uso do gelo há anos, que é o mais comum”, enfatiza. Tecnologias desta natureza podem ajudar a “modernizar” a construção civil no Brasil e também contribuir para a sustentabilidade. Demis Faria Santos acredita que qualquer empresa que diminua a utilização de água na obra, ainda que neste caso seja água em forma de “gelo”, no caso da aplicação de nitrogênio, certamente está pensando no meio ambiente e trabalhando de forma mais sustentável. O maior exemplo para a Air Liquide é a substituição do uso do gelo pela tecnologia CryoCrete no concreto utilizado na construção de bases para torres eólicas, em que justamente busca-se energia alternativa.


Perfil

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Fundações e Obras Geotécnicas


Em foco

OBRAS GEOTÉCNICAS EM ÁREAS DE MINERAÇÃO

E

Em áreas onde há atividade de mineração normalmente são executados quase todos os tipos de obras geotécnicas e hidrogeológicas, dentre as quais, destacam-se obras de aterros como: barragens, estradas e terraplenagem para áreas industriais que podem ser executadas em solo ou com materiais granulares; obras de contenção e estabilização de taludes, como cortinas atirantadas, solo grampeado, retaludamentos, telas atirantadas, muros de contenção; por fim, nas minas subterrâneas são feitas escavações de túneis, galerias e a implantação de sistemas de estabilização. Tanto a geotecnia quanto a hidrogeologia fazem, ou pelo menos devem fazer, parte fundamental dos projetos de mineração, desde as fases de pesquisa até a implantação, operação e descomissionamento das minas, sejam elas, a céu aberto ou subterrâneas. Para adequar-se à realidade da mineração, as obras são executadas com determinadas especificidades, por exemplo, enquanto fora da mineração as obras sobre solos moles são rea­ lizadas sobre terreno natural, na mineração, em alguns casos, essas obras são executadas em reservatórios de rejeitos e/ou aterros de materiais lançados hidraulicamente, e estes, às vezes, têm comportamento semelhante ao dos solos moles.

EXECUÇÃO Normalmente as áreas de geotecnia e hidrogeologia das empresas mineradoras são focadas na operação dos empreendimentos, 60

Fundações e Obras Geotécnicas

atuando desde as fases de projeto até as fases de monitoramentos durante a operação das minas. Nem todas as empresas mineradoras possuem estrutura própria de geotecnia e hidrogeologia (engenheiros geotécnicos, hidrogeólogos, técnicos especializados etc.), tornando-se necessário e fundamental a contratação de consultorias especializadas. Esta situação pode gerar uma série de transtornos operacionais tanto em barragens quanto em pilhas de estéril e minas (a céu aberto e/ou subterrâneas), pois devido à complexidade e relevância destas obras é de extrema importância o acompanhamento e monitoramento de todas as etapas (empilhamento de estéril, construção e/ou alteamento de barragens, construção e operação de poços) de forma constante e preferencialmente em todos os turnos da obra. As obras de mineração seguem, basicamente, o mesmo procedimento de obras civis, porém há um rigor maior no quesito saúde e segurança do trabalho, em virtude da necessidade de um controle mais rigoroso no ambiente da mineração, resultado da maior exposição a riscos de acidentes. As obras, inclusive, são usualmente mais onerosas e morosas, em função da inclusão de processos de mobilização e procedimentos de controle e acompanhamento. Além disso, há um custo elevado com transporte e fretes, pois as áreas de mineração quase sempre são distantes dos centros urbanos.


Arquivo Marcio Leão

Em foco

Exemplo de área impactada pela mineração. Barragem para contenção de rejeitos inserida na floresta

Outra distinção de trabalhos feitos na mineração é a escala de algumas obras. No caso de cavas a céu aberto, existem taludes com mais de cem metros de altura que devem ter sua estabilidade controlada por meio de estudos, monitoramentos e inspeções, o que usualmente não ocorre em obras civis. Além disso, o fator econômico tem impacto significativo em práticas adotadas na operação de uma mina, sendo constantes as avaliações tradeoff. Taludes de cavas operacionais, por exemplo, podem não seguir, em curtos espaços de tempo, as recomendações das normas vigentes quanto ao atendimento do fator de segurança, por conta da viabilidade econômica. Por fim, também existe a limitação de escolha, já que uma mina está restringida a ser implantada onde há minério, ou seja, não é possível escolher qualquer lugar para a atividade. 61

Fundações e Obras Geotécnicas

Arquivo Marcio Leão

PECULIARIDADES

Antiga área de um garimpo onde se observa a área degradada. Foi elaborado um PRAD para a reabilitação da área, em que a alternativa selecionada foi a revegetação com espécies nativas

Uma diferença marcante entre a área de mineração e as demais áreas em que se pratica a engenharia civil geotécnica são as dimensões. Na área de mineração a céu aberto o tamanho das máquinas e a intensidade das cargas é muito maior do que em outras áreas. Cortes com alturas de 300 m ou 400 m e aterros com 10 a 20 milhões de m³ são comuns dentro de uma mina.

RECUPERAÇÃO O trabalho de mineração causa diversos impactos ambientais, fazendo com que as áreas, muitas vezes, tenham que ser recuperadas. Geralmente, os tipos de serviços mais utilizados são a reconformação geométrica das áreas, correção de drenagem superficial e a estabilização de taludes e encostas. No caso de recuperação de cavas a céu


Arquivo Marcio Leão

Em foco

Arquivo Marcio Leão

Exemplo de lago seco para deposição de resíduo sólido, exibindo gretas de contração

Área degradada devido à implantação de uma barragem de rejeito. Supressão de características naturais do local

aberto, existem os trabalhos de reconformação de taludes visando o atendimento às normas vigentes quanto à estabilidade, juntamente com a implantação de um sistema 62

Fundações e Obras Geotécnicas

de drenagem superficial. O mesmo conceito é utilizado em pilhas de estéril e acessos operacionais que não terão mais função. Já as barragens requerem maior

atenção, pois em alguns casos específicos elas podem conter em seu reservatório, substâncias químicas altamente tóxicas. Nestes casos, é necessária a remoção e tratamento de todo o material contaminado ou a proteção adequada deste material, tanto por meio de execução de camadas que formem barreiras hidráulicas e dificulte a comunicação das águas superficiais com o material contaminado, quanto por meio da percolação e da comunicação das águas contaminadas existentes no reservatório com a superfície, pelo efeito da capilaridade. No caso de barragens de água ou contenção de sedimentos ou rejeitos inertes, avalia-se a melhor alternativa de descaracterização da estrutura, que pode ser desde a sua remoção completa, até a sua manutenção, adequando-se as estruturas de drenagem superficial para atendimento das normas vigentes, bem como os taludes para aumentar a segurança, visto que haverá uma tendência de crescimento do intervalo entre inspeções. Outra forma de reabilitação de áreas impactadas com barragens, no caso de estruturas de pequeno porte é o enchimento do seu reservatório com material sólido, de maneira que não ocorra acúmulo de água ao montante. A expertise da geotecnia e da hidrogeologia da mineração se destaca nesta área, pois devido ao grande volume de informações e dados oriundos das pesquisas geo­ lógicas para fins de cubagem das jazidas é possível elaborar mapas e


Arquivo Marcio Leão

Em foco

Aspecto de material remobilizado durante o processo da mineração

modelos geotécnicos e hidrogeo­ lógicos que se aproximam muito da realidade do terreno afetado, diferentemente de outros tipos de obras, como a construção de edifícios, por exemplo, em que a pesquisa de subsolo normalmente fica limitada somente ao lote em que o edifício será construído. Nem sempre são feitas campanhas de sondagem com recuperação de testemunhos, trabalhando-­ se apenas com RQD (Rock Quality Designation) ou descrição de amostras de calha, devido ao alto custo de uma sondagem geológica com recuperação de testemunhos. Os serviços geotécnicos e hidrogeo­ lógicos em áreas degradadas por mineração vão desde os projetos de descomissionamento (da pilha de estéril, barragem ou mina) até o monitoramento contínuo destas áreas, independente do futuro que elas tenham. 63

Fundações e Obras Geotécnicas

Existem exemplos práticos de descomissionamento de minas desativadas que proporcionam retornos socioeconômicos e ambientais interessantes para a sociedade, e principalmente para a comunidade local. Dentre estes exemplos pode-­ se citar a Mina de Passagem, localizada em Mariana (MG). Trata-se de uma mina subterrânea de ouro, em que não há mais atividade de lavra, porém se tornou uma atração turística, gerando oportunidade de empregos e renda. Ainda, sobre a recuperação de áreas degradadas com a implantação de barragens, caso opte-se por manter a estrutura, contendo água e/ou rejeitos, a empresa deve manter os mesmos procedimentos de inspeção e manutenção preventiva e corretiva exigidos pela legislação vigente, ficando com um passivo por tempo indeterminado. Em todos os casos de recuperação de

áreas degradadas com barragens, deve-se elaborar um estudo para adequação da drenagem superficial e trânsito de cheias pela área, de maneira a garantir o atendimento das normas vigentes e boas práticas da engenharia para obras de descomissionamento.

PRAD É importante salientar que a mineração, diferentemente de várias outras atividades humanas, não permite a flexibilidade de escolha para a implantação das minas, já que é fundamental que se instale a lavra especificamente nos locais onde haja ocorrência de minérios com volumes e teores que justifiquem economicamente tal investimento. A necessidade de intervenção humana e alteração das características ambientais da região para que a extração mineral seja efetivada, acarreta o surgi-


Em foco

Soluções da Maccaferri aplicadas em obras de mineração

mento de áreas degradadas durante e após a extração. Por representar uma atividade econômica e fundamental para a humanidade, detentora de intrínseca 64

Fundações e Obras Geotécnicas

e peculiar relação com o meio ambiente, a imposição da recuperação da área degradada serve como mecanismo de compatibilização com a proteção ambiental. A atividade mi-

neral consolida a concepção de que este segmento produtivo compreende um uso temporal ou transitório do solo e subsolo, cabendo à fase de recuperação, encaminhar a área


Em foco

afetada pela exploração a um nível de estabilidade que permita um uso futuro da área. Desta forma, existe o PRAD (Plano de Recuperação de Áreas Degradadas), que contém diretrizes e conceitos que, na época de sua elaboração, foram os mais viáveis e utilizados para a reabilitação de áreas degradadas. Sua principal função é integrar ao meio ambiente uma área anteriormente impactada. Ao final dos trabalhos é necessário que a área recuperada tenha uma função que considere as modificações morfológicas originadas pela mineração. A reabilitação da área pode tanto ser voltada para a reintegração ao ambiente, quanto ter outro fim completamente diferente das condições originais. Na mineração é recomendável que haja um plano de descomissionamento da mina, que englobe tanto a desativação da lavra, quanto a reabilitação ambiental e a mitigação dos impactos socioeconômicos advindos da cessão da mineração. Além disso, o plano deve contemplar toda a área impactada direta e indiretamente pela atividade. Existem algumas particularidades sobre este tema no que se refere à mineração. Uma delas é que elaborar um PRAD para ser implantado décadas depois, pode acarretar defasagem quanto às alternativas tecnológicas e as boas práticas da engenharia. Somado a isso, a mudança morfológica causada pela mineração pode modificar completamente o cenário ambiental utilizado para o estudo. 65

Fundações e Obras Geotécnicas

Onde havia uma montanha com o minério, após a sua exploração, restará um grande espaço vazio em que comumente a região mais profunda (fundo da cava) está abaixo do lençol freático, o que resultará na formação de um lago após o encerramento do bombeamento para rebaixamento do nível d’água. Em outras áreas, vales se transformarão em montanhas de material estéril, algumas vezes, empilhados sobre nascentes. Alguns vales serão represados com barragens e formarão lagos ou depósitos de rejeitos de mineração ou sedimentos carreados das áreas impactadas a montante. Todas estas intervenções modificarão o tênue equilíbrio morfológico e ambiental daquela região e muitas vezes, a melhor alternativa de reabilitação seja tentar adequar a área impactada para imitar as condições previamente encontradas na região. Por fim, a mineração é muito dependente dos preços e flutuações do mercado. Historicamente, podem-se observar variações nos ciclos de oferta e procura de produtos oriundos da mineração. Existem minas, cuja previsão de exploração era de 20 anos e que estão em operação por mais de 40 anos, ainda com previsão de operação por mais 20 anos, mudando completamente a situação final da lavra originalmente projetada.

locais. No caso de obras de mineração, devem ser previstas todas as medidas necessárias para recuperação e restabelecimento das áreas que são degradadas no processo produtivo. Devem ser elencadas as particularidades bióticas e abió­ ticas desses locais, impactos causados ao meio ambiente, além da sucessão proveniente da atividade exploratória. Assim, o PRAD deve ser embasado teoricamente, contemplando todas as variáveis ambientais de forma que não destoe do ecossistema da região. O PRAD segue atualmente a resolução normativa N°4/2011 do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), que define as premissas mínimas e orientações para todas as etapas contempladas no PRAD (elaboração, análise, aprovação e supervisão da eficiência do documento). Essa norma prevê ainda a elaboração do PRAD simplificado, ou seja, um instrumento que deve atender às particularidades locais, mas que não necessita seguir as diretrizes integrais que regem a elaboração de um documento completo. Cabe ressaltar que, geralmente, cada estado pode especificar regras próprias, em função das características da área a ser explorada ou afetada.

NORMATIVA

Toda técnica de remediação deve seguir uma estratégia. Nesse âmbito existem as estratégias cor-

De uma forma geral, cada PRAD deve se ater às necessidades

TÉCNICAS DE RECUPERAÇÃO


Divulgação Maccaferri

Em foco

Soluções da Maccaferri aplicadas em obras de mineração

retivas, em que o problema é reconhecido e caracterizado, sendo identificados os locais potencialmente afetados pelo impacto da 66

Fundações e Obras Geotécnicas

atividade. No caso da eliminação de um passivo ambiental, são recomendadas estratégias de cunho preventivo e objetivo, suprimindo

o impacto da contaminação no solo e aquíferos, durante o encerramento das operações. Considerando a vida útil da


Em foco

mina, inúmeros passivos ambientais são gerados, comprometendo o tempo de operação caso não seja eliminado, então, nesses 67

Fundações e Obras Geotécnicas

casos é recomendada uma estratégia proativa, visando à solução imediata e previsão de problemas futuros. Podem ser necessárias em

qualquer etapa da atividade. Entretanto, quando há o fechamento de determinada área explorada, há uma maior urgência na adoção de medidas. Para adoção de uma técnica determinada de recuperação, devem ser considerados os processos físicos, como movimentos de massa e erosão e, os processos químicos, como por exemplo, as drenagens ácidas oriundas da atividade. Desta forma, a mineração deve ocorrer em harmonia com o ecossistema buscando sempre a sustentabilidade. Em termos de execução, as técnicas podem ser variadas, indo desde alterações nas rotinas operacionais, a ações mais brandas, que contemplam atividades de menor impacto. Nesse âmbito são consideradas passíveis de tratamento as áreas lavradas (cavas, frentes de lavra, trincheiras e galerias), locais para deposição de resíduos sólidos oriundos da exploração (pilhas de minério, estéreis, solos principalmente superficiais, bacias para beneficiamento do minério), espaços destinados à infraestrutura (unidades de beneficiamento, estocagem, além dos escritórios e vias de circulação). Dessa forma, as técnicas de recuperação devem se ater, principalmente a duas metas distintas: uma recuperação provisória, que se refere às ações para manutenção da atividade, sem que haja uma recuperação definitiva da área; e a recuperação definitiva em si, ou seja, quando já existe a definição


Em foco

Obras de mineração que utilizaram produtos da Maccaferri Cliente: Vale S11D Local: Canãa dos Carajás (PA) Solução: Terramesh para contenção de talude Cliente: Anglo American – MG Local: Barão de Cocais Solução: SteelGrid para contenção de e proteção de taludes rochosos Cliente: CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) – MG Local: Congonhas Problema: a CSN precisava executar um muro de contenção para ampliação do “Drive Unit”, que é um britador primário em sua mina Casa de Pedra, localizada em Congonhas (MG). A CSN contratou os serviços do Grupo MPE e Araguaia Engenharia para executar o muro com seção crítica de 13 m de altura e 102 m de extensão, o qual deveria suportar um guindaste de montagem de 250 toneladas trabalhando muito próximo ao paramento frontal da contenção. O projeto inicial indicava a solução em concreto à flexão, porém as empresas contratadas buscaram outras soluções que fossem tecnicamente confiáveis, de rápida execução, pois o cronograma já estava atrasado e o custo competitivo para apresentar ao cliente CSN. Solução: por meio da filial de Belo Horizonte (MG), a Maccaferri do Brasil teve a oportunidade de discutir a solução técnica que comtemplava um muro em Terramesh System associado com camadas reforçadas pelas geogrelhas MacGrid® WG 200. Devido à rápida execução da solução em Terramesh System, a possibilidade de utilização do solo local para o aterro arrimado, a facilidade executiva e o melhor custo em relação à solução inicial de concreto à flexão, a solução Maccaferri foi viabilizada com sucesso, juntamente com um contrato Turn Key.

do futuro uso pretendido para o solo. As medidas disponíveis para recuperação podem ser dividas em termos da área-objeto e acabam por estar alinhadas à própria estabilidade da obra geotécnica. O controle de taludes e das águas é um fator importante para alcançar a estabilidade de áreas mineradas. Em situações de mineração a água (principalmente as subterrâneas) são um dos fatores que mais geram instabilidade. Isto se manifesta por meio 68

Fundações e Obras Geotécnicas

de deslizamentos de superfície e transporte de partículas ou movimentos de massa dos depósitos estéreis e/ou taludes das cavas, em virtude da saturação e/ou das condições lubrificantes da água, causando sedimentação nos cursos das águas. As técnicas para controle da sedimentação nos cursos de água e controle de taludes são as seguintes: • Instalação de represas ou escavações de lagoas para facilitar a deposição do sedimento proveniente da

lavra, antes que este se deposite nos córregos ou rios; • Recomenda-se que, caso ocorra problema de assoreamento, deve-se remover do leito natural o entulho já depositado, o que envolverá catação de grandes blocos, limpeza com retroescavadeira etc. O trabalho de desmonte hidráulico é inadmissível sem prévia decantação em barreiras adequadamente dimensionadas e construídas com as mais diversas tecnologias disponíveis. O mais adequado é a construção de barragens com estéril provenientes da mina; • As áreas já conturbadas devem ser recuperadas progressivamente, sem esperar seu abandono após a mineração. A área minerada deve ficar exposta o mínimo de tempo possível, reduzindo assim, os impactos ambientais e também os custos futuros com as obras de descomissionamento da mina; • O estéril deve ser depositado de maneira controlada, envolvendo uma camada drenante na base da pilha, algum tipo de drenagem interna, uma base estabilizada de rocha, bancadas que drenem de fora para dentro e para as laterais do depósito; • A construção de terraços também é reconhecida como uma prática viável para a recuperação de áreas degradadas pela mineração. A formação de terraços aumenta a estabilidade e favorece a recuperação. A largura dos terraços costuma variar de três a 15 m, com uma média de 10 m. A distância vertical varia de oito a 20 m, deve-se evitar o alto grau de declividade entre os terraços;


Em foco

• Construir terraços ou banquetas com solo compactado e coberto com vegetação vigorosa ao pé das escavações da mineração. Estes terraços diminuirão a velocidade da enxurrada e receberão seus depósitos de sedimentação antes que estes atinjam o curso d’água.

Durante a vida útil de uma mina há muita geração de resíduos sólidos significativos, compostos principalmente por estéreis e rejeitos, o que impacta o meio ambiente qualitativa e quantitativamente. A geração de custo na própria atividade exploratória e produtiva, alinhada ao aprimoramento das técnicas de exploração permitiu o aproveitamento de minérios de baixo teor econômico, gerando um aumento substancial nos volumes de rejeito. O principal desafio encontrado em projetos geotécnicos aplicados à mineração é reflexo da metodologia de disposição dos materiais, que consideram fatores operacionais e características locais de condicionamento sendo, portanto, projetos únicos, apesar de terem uma base teórica semelhante. Outro ponto são as diversas metodologias disponíveis para disposição do rejeito, garantindo grande heterogeneidade em termos de propriedades geotécnicas que devem ser contempladas nos projetos. As barragens de contenção têm sido escolhidas como principal es69

Fundações e Obras Geotécnicas

Sanches, 2005

DESAFIOS GEOTÉCNICOS NA MINERAÇÃO

trutura para a disposição final desses materiais, devido ao próprio material gerado (estéril e rejeito de beneficiamento). Em contrapartida há o impacto ambiental e os elevados custos envolvidos, principalmente nos processos de contenção e aproveitamento da água no processo produtivo, resultando em um grande desafio na recuperação dessas áreas. Uma alternativa adotada por empresas no mundo e também brasileiras trata da disposição de resíduos em áreas já mineradas, por meio da codisposição ou disposição combinada (rejeitos e estéreis). Vale lembrar que essa e outras alternativas demandam estudos geológico-geotécnicos detalhados baseados na planta de beneficiamento e nas condições de disposição do rejeito. Outro desafio encontrado durante a execução de uma obra

geo­ técnica e/ou hidrogeológica em áreas de mineração, tem sido a falta de mão de obra especializada e com experiência necessária para acompanhar as obras. Na mineração muito tem se falado em falta de “senioridade”, ou seja, no Brasil não há muitos profissionais sêniores suficientes para atender a todas as demandas de geotecnia e hidrogeologia, principalmente nas obras e serviços ligados as barragens e as atividades de rebaixamento de lençol freático. Isso também afeta os órgãos de licenciamento ambiental, principalmente a nível estadual, dificultando e atrasando as análises de processos ligados a mineração.

VANTAGENS E LIMITAÇÕES As principais vantagens das atividades de geotecnia e hidrogeologia na mineração são as possibilidades


Em foco

de aumento das reservas de minério, uma vez que, os projetos levem em consideração e deem a devida importância às premissas geotécnicas e hidrogeológicas das minas, permitindo avanços de lavra mais audaciosos e com a devida segurança operacional e ambiental. Ainda falando-se em vantagens e desvantagens dos estudos e obras geotécnicas e hidrogeológicas na mineração, podemos destacar a questão do uso futuro das áreas mineradas, já que, a estabilidade (taludes, saturação do solo, qualidade das águas, etc.) é a principal premissa para definição de novos usos da área após a devida regeneração, conforme representado no diagrama adaptado de Sanches, 2005.

PRODUTOS E TECNOLOGIAS A empresa Maccaferri dispõe de uma linha completa de geossintéticos produzidos no Brasil, como geomembranas, geogrelhas, geotêxteis e geocomposto para drenagem, dentre outros. Além da linha de produtos confeccionados em malha hexagonal de dupla torção, como gabiões, sistema de contenção para solo reforçado Terramesh e um completo sistema denominado MacRo (Maccaferri Rockfall Protection) de malhas metálicas de alto desempenho e barreiras de impacto para controle e combate contra queda de rochas. Para o gabião existem inúmeras aplicações, sendo geralmente usado para formar estruturas flexíveis, permeáveis e monolíticas, tais como 70

Fundações e Obras Geotécnicas

muros de contenção, canalizações retangulares e trapezoidais e grandes contenções para britagem. Recentemente as malhas que confeccionam os gabiões receberam um novo revestimento metálico chamado Galmac® 4R, que proporciona maior durabilidade e vida útil, além de maior desempenho técnico e funcional as obras geotécnicas, diminuindo eventuais intervenções e manutenções, o que é muito importante para o segmento da mineração, que preza por eficiência em suas obras.

IMPACTO Considerando que a questão ambiental, de longa data, vem sendo negligenciada em diversos empreendimentos e em anos recentes vem gradativamente ganhando espaço é irreversível a prática de estudos e desenvolvimento de projetos sustentável em obras de grande impacto como a mineração. Não é possível deixar de minerar, já que é um dos setores básicos de grandes economias mundiais, inclusive a brasileira, mas isso deve ser feito de forma sustentável. No ano de 2013, o PIB (Produto Interno Bruto) da atividade chegou a 5% do percentual nacional e apesar da especulação do crescimento ser lento ou rápido para os próximos anos, a mineração ainda se faz presente na geração de recursos importantes para o desenvolvimento nacional, pois agrega produtos essenciais à sociedade, fornecendo bens minerais que resultam em produtos e serviços, permitindo o desenvolvi-

mento de áreas despovoadas ou de pouco desenvolvimento. Como toda atividade que necessita o manejo de grandes á­ reas­, o impacto ambiental é muito grande, podendo ser inerentes ou não à atividade, gerando impasses e embates entre as mineradoras e a sociedade, quando não é devidamente remediado. Nesse sentido é necessário unir a atividade mineradora com a sustentabilidade, por meio de conceitos como a utilização dos recursos não-renováveis, admitindo que exista seu restabelecimento sob taxa natural, potencializando a eficiência na utilização desses recursos, além de manter a geração de resíduos ao meio ambiente em níveis adequados. Atualmente existem no Brasil, principalmente em Minas Gerais (estado tipicamente minerador) diversos fóruns, grupos multidisciplinares e projetos de pesquisas com o objetivo de estudar e desenvolver uma mineração cada vez mais sustentável, principalmente para as comunidades que serão muito impactadas, do ponto de vista socioeconômico, após a exaustão das minas, a exemplo do QFe2050 (Quadrilátero Ferrífero) que vem sendo desenvolvido pela Escola de Minas da UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto) e do Projeto Nova Mineração pela parceria FAPEMIG (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais) / CEFET-MG (Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais).


Arquivo pessoal

> FABIANO JERÔNIMO MOREIRA SOSSAI é engenheiro civil pela UFV, (2003) e mestre em Engenharia Civil (2006) também pela mesma instituição. Atua na coordenação e elaboração de projetos na área de mineração desde 2003. É sócio-diretor, engenheiro e consultor de obras geotécnicas na empresa GEOFT Engenharia e Consultoria.

> MARCIO FERNANDES LEÃO é geólogo pela UFRJ, possui MBA (Master of Business Administration) em Gerenciamento de Projetos pela USP (Universidade de São Paulo), É mestre em Geotecnia pela UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), mestre e doutorando em Geologia de Engenharia e Ambiental, pela UFRJ. Atualmente é pesquisador do LEMETRO (Laboratório de Experimentos em Mecânica e Tecnologia de Rochas) da UFRJ, membro do Conselho Editorial e coordenador da seção “Geotecnia Ambiental” da Revista Fundações & Obras Geotécnicas.

Arquivo pessoal

> MARCUS VINÍCIOS ANDRADE SILVA é geólogo pela Escola de Minas da UFOP, especialista em Hidrogeologia pela UFBA (Universidade Federal da Bahia) e pós-graduado em Engenharia de Segurança do Trabalho pela PUC-Minas (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais). Atualmente é hidrogeólogo sênior da empresa Vale Fertilizantes S.A. e professor de Hidrogeologia do Instituto Minere. Paralelamente às atividades profissionais desenvolve projetos científicos ligados à geologia e hidrogeologia de terrenos cársticos como sócio pesquisador do Instituto do Carste e participa do Projeto Nova Mineração da FAPEMIG/CEFET-MG.

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Arquivo pessoal

> EDUARDO ANTONIO GOMES MARQUES é geólogo pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), possui mestrado e doutorado em Geologia pela mesma instituição. Atualmente é professor titular da UFV (Universidade Federal de Viçosa) nas disciplinas Geologia de Engenharia e Mecânica das Rochas (graduação) e Geologia para Engenheiros, Mecânica das Rochas Avançada e Impactos Ambientais em Obras de Engenharia (pós-graduação). É colaborador em diversas revistas como: Soil & Rocks, Engineering Geology, Journal of Geological Resource and Engineering e da Revista Geotecnia, sendo ainda membro do Conselho Editorial da Editora UFV.

Arquivo pessoal

Arquivo pessoal

Em foco

> SANDER ELIAS RODRIGUES é engenheiro civil e mestre pela UFOP e especialista em Gestão de Projetos pela FDC (Fundação Dom Cabral). Atualmente é o coordenador responsável pelo desenvolvimento dos mercados de Mineração e Ambiental na empresa Maccaferri Brasil.

Fundações e Obras Geotécnicas


Opinião

PARADIGMAS DE CAMPO X ENSAIOS DE LABORATÓRIO

Arquivo pessoal

A

> JOSÉ LOPES é geólogo formado pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e mestre pela UFPR (Universidade Federal do Paraná), com mais de 50 anos de vida profissional ligada ao setor de transportes, particularmente o rodoviário. Atuou em quase todos os Estados do Brasil e em países limítrofes. Foi professor de Geologia, Solos, Mecânica dos Solos, Geotecnia e Avaliação de Impacto Ambiental em universidades públicas e privadas e em cursos de especialização. Publicou mais de 50 trabalhos técnicos versando sobre Geologia, Geologia Aplicada, Geotecnia e Meio Ambiente, no Brasil e exterior, além do livro “Gestão Ambiental de Empreendimentos”.

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Fundações e Obras Geotécnicas

A geotecnia inclui ciências naturais e ciências de engenharia e, assim sendo, utiliza metodologias de natureza observacional/indutiva/fenomenológica, de difícil matematização e experimentais/ dedutivas mais facilmente matematizáveis. Um dos campos em que essa dicotomia é mais facilmente observável é na questão das estimativas de estabilidade de encostas naturais. Os métodos usuais: Fellenius, Bishop, Spencer, Morgenstern/ Price etc., utilizam como dados de entrada, valores de parâmetros mecânicos obtidos de ensaios de laboratório que, teoricamente, reproduzem os desenvolvidos pelos materiais no campo. Esses métodos “canônicos” utilizam dominantemente, superfícies de ruptura semicirculares que facilitam a matematização do processo, distribuídas alea­toriamente. As massas contidas no interior dessas superfícies são divididas em fatias e os cálculos executados para cada uma delas. O cômputo final é elaborado de acordo com assunções particulares – independência de fatias; ação/reação entre fatias etc. – para cada método específico e a partir daí são estabelecidos os

Fatores de Segurança, adotando-se para a encosta o menor obtido. O método de Jambu permite utilizar-se superfícies quaisquer e o de Rendulic, utiliza uma espiral logarítmica que prescinde da divisão em fatias em razão do formato especial da curva, mas o centro da espiral é, também, definido por tentativas. A característica comum a todos eles, além da necessidade de utilização de ensaios de laboratório (cujas dimensões reduzidas, vis-a-vis as dimensões das encostas, limitam muito a validade dos resultados) é sua base fortemente matemática que exige, por isso mesmo, simplificações e generalizações das características dos materiais idealizados como delas constituintes. Desse modo, eles se adaptam muito bem a taludes homogêneos ou, pelo menos, “organizadamente heterogêneos” como os “de construção” (aterros e barragens) em que as “heterogeneidades” podem ser modeladas. Quando se trata, entretanto, de encostas naturais, seu emprego esbarra na extrema variabilidade das características geológicas e disposições relativas dos materiais encontrados, herdadas de uma história geológico/pedo-


Espaço aberto

lógica onde deixaram sua marca, turas. Para tal, iam sendo propos- zes, para estabelecer pares ângulos/ a natureza da(s) rocha(s)-mãe(s); tas características e parâmetros alturas que correspondam à condisuas particularidades – xistosida- que satisfizessem a ruptura, isto é, ção de estabilidade limite; Queiroz des, acamamentos e bandeamen- que determinassem um Fator de (1986) utilizando os critérios de tos; os eventos superimpostos – Segurança teórico igual ou próxi- Lopes (1981), elaborou um ábaco fraturas, falhas e dobramentos; os mo de um para o talude rompido. altura x inclinação do talude para efeitos resultantes dos processos Mais recentemente, vários mé- uma condição geológica particular. de esculturações de suas formas e todos e ou adaptações deles têm Argumentos contrários a esses pedogenéticos – impregnações, li- sido propostos para torná-los mais métodos têm sido levantados, tais xiaviações, coluviação etc. – torna “racionais”: Acevedo et al. (1981) como as incertezas sobre a localizaabsolutamente inviável ção das superfícies de amostrar com represenruptura; a ocorrência NA BUSCA DE CONTORNAR ESSA tativamente esses maciços possível de trincas de SITUAÇÃO, FOI DESENVOLVIDO e modelar, com acuidade, tração e a presença ou OUTRO GRUPO DE MÉTODOS ‘OS as influências dessas canão, nelas, de água; ESTUDOS DE REGRESSÃO’ QUE DÃO raterísticas no comportao desconhecimento mento do conjunto. das pressões neutras MAIOR IMPORTÂNCIA À OBTENÇÃO Na busca de contornar no maciço e a possiDE VALORES REPRESENTATIVOS DOS essa situação, foi desenbilidade de rupturas PARÂMETROS DE RESISTÊNCIA QUE volvido outro grupo de progressivas. Essas métodos “os estudos de AO RIGORISMO MATEMÁTICO E, PARA objeções, entretanregressão” que dão maior to, não invalidam os TAL, UTILIZAM-SE DE RUPTURAS importância à obtenção métodos, visto que as OBSERVADAS de valores representatisuperfícies de ruptura vos dos parâmetros de raramente estão sufiresistência que ao rigorismo mate- estima os valores mais prováveis cientemente mascaradas para não mático e, para tal, utilizam-se de a partir de uma “área” de valores permitir o estudo; as fendas de trarupturas observadas (ensaios em possíveis; Wesley e Leelaratmann ção só começam a aparecer quando escala natural), para estimar os pa- (2001) utilizam uma convergên- a ruptura é iminente e a máxima râmetros de resistência desenvol- cia a partir de uma pesquisa pre- resistência disponível é mobilizavidos durante sua ocorrência. Este liminar pelo método de Bishop; da; as rupturas progressivas estão, tipo de estudo contorna o proble- Cachapuz (1978) realizou uma aparentemente, mais para regra ma da variabilidade dos materiais, mescla de parâmetros obtidos que exceção na natureza e consepois os parâmetros estimados se- em laboratório e em retroanálise, quentemente, os cálculos de estarão valores médios mobilizados. utilizando os ábacos de Hoeck bilidade serão mais seguros se utiInicialmente, eles seguiam uma (1972); Gomes (2003) utiliza a lizarem parâmetros que as evitem linha de trabalho puramente “por forma da superfície de ruptura, e, pelo menos em climas úmidos, tentativas”, isto é, adotando-se um comparando-a à da superfície “crí- rupturas raramente ocorrem sem dos métodos “canônicos” acima tica” obtida do Método de Bishop a presença de água. Assim sendo, descritos e estabelecendo-se, com Simplificado; Lopes (1981) utili- dificilmente as assunções utilizadas base em observações de campo e zou as relações de Hoeck (1972) nestes métodos serão mais críticas ou suposições, as condições em entre os parâmetros c/ϕ e as fun- que as que envolvem a utilização que deveriam ter ocorrido as rup- ções Y/X com a forma das cicatri- de ensaios de laboratório. 73

Fundações e Obras Geotécnicas


Aberdeen Proving Ground / Flickr

Geotecnia ambiental

Reabilitação de uma superfície industrial e descontaminação do subsolo

AVALIAÇÃO E GESTÃO DE RISCO AMBIENTAL DEVEM ESTAR EM CONSONÂNCIA COM AS ATIVIDADES EMPRESARIAIS Progressivamente, as empresas têm se preocupado com os impactos que as suas atividades podem causar ao meio ambiente por Dellana Wolney

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Fundações e Obras Geotécnicas


Geotecnia ambiental

C

Com o desenvolvimento urbano e industrial, também vem o impacto ambiental. A sociedade tem se conscientizado progressivamente sobre a importância de preservar o meio ambiente, com a adoção de práticas que reduzem os danos ambientais provenientes do progresso econômico e social. Ainda é uma tarefa difícil quantificar e julgar a relação antrópica com o meio, bem como fazer uma análise sobre a proteção ambiental e o impacto que ela tem sobre o crescimento urbano. Uma das alternativas encontradas para este impasse é a Avaliação de Riscos Ambientais, que tem se tornado um instrumento elucidativo e igualitário, fornecendo as informações necessárias para que decisões bem fundamentadas sejam tomadas, com a finalidade de buscar, principalmente, o equilíbrio socioambiental. De acordo com um estudo do ano de 2007 da CETESB (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), os acidentes industriais ocorridos nos últimos anos, em particular na década de 1980, contribuíram para despertar a atenção das autoridades governamentais, da indústria e da sociedade como um todo, no sentido de buscar mecanismos para a prevenção de eventos que comprometam a segurança das pessoas e a qualidade do meio ambiente. Assim, as técnicas e os métodos já amplamente utilizados nas indústrias, de forma geral, passaram a ser adaptados para a realização de estudos de análise e avaliação dos riscos associados a outras atividades industriais, em especial nas áreas de petróleo, química e petroquímica. Estas avaliações de risco e suas consequências estão sendo gradativamente implantadas no mundo inteiro. No Brasil, esta preocupação também tem vindo em primeiro lugar em diversos segmentos, inclusive na construção civil, exemplo disso, são as normativas regulamentadoras criadas pelo Ministério do Trabalho, as resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente e as leis ambientais do Ministério do Meio Ambiente, além de novas entidades governamentais criadas com esta finalidade como a ANA (Agência Nacional de Águas) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.

DEFINIÇÃO De acordo com o biólogo marinho, perito ambiental do Ministério Público, mentor e orientador de carreira em QSMS-RS (Qualidade, Segurança, Meio Ambiente, Saúde e Responsabilidade Social) e sustentabilidade, Roberto Roche, a melhor definição para análise/avaliação de risco geoambiental é que se trata de uma estimativa prévia da probabilidade de ocorrência de contaminação no solo e/ou lençol freático e a avaliação das suas consequências sociais, econômicas e ambientais. Esse instrumento, de forma geral, aborda a identificação de situações de risco em um empreendimento em funcionamento, bem como caracteriza as consequên­cias potenciais ao meio ambiente, à comunidade, ao empreendimento e seus funcionários, caso um acidente com impacto ambiental ou contaminação ocorra. 75

Fundações e Obras Geotécnicas


“Uma vez constatada a ocorrência de contaminação ou impacto no solo, ou no lençol freático, é necessária a recuperação da área impactada. Para isso, novas técnicas têm sido desenvolvidas, objetivando a avaliação do risco ambiental em cenários de contaminação do solo. No Brasil, entretanto, ainda faltam metodologias próprias que levem em consideração as características típicas nacionais”, afirma Roche. Ele cita, dentre as inúmeras técnicas de descontaminação existentes, as metodologias americanas: RESRAD-CHEM e RBCA e a holandesa C-SOIL. A RESRAD-CHEM é uma metodologia de análise de risco à saúde humana que auxilia na avaliação de áreas contaminadas por compostos químicos. Tal procedimento faz parte das metodologias de análise de risco denominadas “Família RESRAD”, desenvolvidas e codificadas, em modelos computacionais, pela Divisão de Avaliação Ambiental do Laboratório Nacional de Argonne dos Estados Unidos. Já a metodologia de Ação Corretiva Baseada em Risco, mais conhecida como RBCA segundo os autores Léa Lignani Xavier e Celso de Oliveira Loureiro no trabalho “Análise de Risco Ambiental em Cenários de Contaminação do Solo: Uma Avaliação Metodológica Comparativa”, foi criada pela ASTM (American Society for Testing and Materials – Sociedade Americana para Testes e Materiais) para funcionar como um procedimento de avaliação dos critérios de limpeza e remediação em áreas contaminadas. 76

Fundações e Obras Geotécnicas

Gléssia Veras / Editora Rudder

Geotecnia ambiental

Simultaneamente aos Estados Unidos, a Holanda tem desenvolvido um programa para a avaliação de contaminação do solo e das águas subterrâneas e o estabelecimento de valores orientadores de níveis de intervenção. Como resultado destas ações foi elaborado o procedimento de avaliação de risco C-SOIL, desenvolvido pelo Ministério da Habitação, Planejamento e Meio Ambiente da Holanda no ano de 1991 e revisado em 1994. No Brasil, as três metodologias já vêm sendo utilizadas por algumas empresas de consultoria para a aplicação em casos de contaminação no solo e nas águas subterrâneas.

GESTÃO A gestão ambiental é outro instrumento importante e vastamente utilizado atualmente. Popularmente conhecido como SGA (Sistema de Gestão Ambiental), ele possui procedimentos semelhantes a qualquer nível gerencial de uma empresa moderna, como por exemplo, a gestão financeira, de produção, marketing e recursos humanos. Roche comenta que existem em-

presas que dispõem de departamentos voltados para as questões ambientais da companhia como uso racional de matérias-primas, insumos, energia, água e ar. Além disso, estas empresas estão se preocupando em utilizar processos produtivos que causem menores danos à natureza mediante a redução de lixo, despejos e degradação ambiental em geral. “Normalmente, as empresas também se preocupam com a questão ambiental, à medida que elas se tornem grandes poluidoras ou quando as exigências legais ambientais são fortemente restritivas. Esses pontos por si só evidenciam a importância que os sistemas de gestão ambiental vêm alcançando em várias companhias para atenderem objetivos específicos internos ou requisições externas”, pontua. Dentre os principais objetivos da gestão ambiental destacam-se: o gerenciamento das tarefas da empresa no que diz respeito às políticas, diretrizes e programas relacionados ao meio ambiente interno e externo da companhia; a manutenção, geralmente em conjunto com a área de segurança do trabalho e saúde dos trabalhadores; a produção com a colaboração de dirigentes e trabalhadores, produtos ou serviços ambientalmente compatíveis e a colaboração com setores econômicos, comunidade e órgãos ambientais para que sejam desenvolvidos e adotados processos produtivos que evitem ou reduzam as agressões ao meio ambiente. Os resultados da gestão ambiental empresarial servem para melhorar o desempenho das empresas que a ado-


Geotecnia ambiental

tam ou a aperfeiçoam. Sua finalidade é bastante abrangente e pode incluir os seguintes pontos: entender como ação/objetivo, evitando o desperdício, reduzindo, reciclando, reutilizando e melhorando os principais elementos existentes no meio ambiente. As finalidades básicas da gestão ambiental empresarial também podem ser resumidas em orientar consumidores quanto à compatibilidade ambiental dos processos produtivos e dos seus produtos ou serviços; servir de material informativo junto a acionistas, fornecedores e consumidores para demonstrar

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Fundações e Obras Geotécnicas

o desempenho empresarial na área ambiental; orientar novos investimentos, privilegiando setores com oportunidades em áreas afeitas ao meio ambiente e/ou que diminuam danos ambientais. Por fim, os objetivos e as finalidades inerentes a um gerenciamento ambiental nas empresas devem

estar em consonância com o conjunto das atividades empresariais, portanto, eles não podem e nem devem ser vistos como elementos isolados. Vale aqui lembrar o trinômio das responsabilidades empresariais: responsabilidade ambiental, responsabilidade econômica e responsabilidade social.

COORDENADOR DA SEÇÃO "GEOTECNIA AMBIENTAL" > MARCIO FERNANDES LEÃO É geólogo pela UFRJ, possui MBA (Master of Business Administration) em Gerenciamento de Projetos pela USP (Universidade de São Paulo), É mestre em Geotecnia pela UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), mestre e doutorando em Geologia de Engenharia e Ambiental, pela UFRJ. Atualmente é pesquisador do LEMETRO (Laboratório de Experimentos em Mecânica e Tecnologia de Rochas) da UFRJ.


Livro

CIDADES E GEOLOGIA

A

Além dos trágicos desastres associados a enchentes e deslizamentos, mais conhecidos por sua ampla repercussão jornalística, as cidades brasileiras arcam com vários outros graves e crônicos problemas decorrentes de erros técnicos cometidos em seu avanço sobre os terrenos naturais. Ocorrendo de uma forma mais difusa, mas não menos deletéria do ponto de vista econômico, social e ambiental, agregam-se às enchentes e deslizamentos, entre outros, os seguintes problemas: abatimentos e recalques de terrenos com comprometimento de edificações de superfície, solapamentos de margens de cursos d’água, colapso de obras superficiais e subterrâneas, patologias diversas em fundações e estruturas civis, contaminação de solos, contaminação de águas superficiais e subterrâneas, deterioração precoce de infraestrutura urbana, acidentes ambientais, degradação do meio físico-geológico e hidrológico, perda de mananciais. No âmbito das providências necessárias de melhor equacionar as relações técnicas das cidades com as características do meio físico natural por elas afetado, assim evitando as graves decorrências negativas referidas, destaca-se a necessidade de existência de termos legais que definam e estabeleçam como obrigatórios determinados cuidados e expedientes técnicos que devam ser adotados pelo poder público municipal e pela sociedade em suas ações de ocupação dos espaços urbanos. É nesse exato sentido que, como sequência à discussão técnica dos principais problemas urbanos de ordem geológica, são propostas 11 minutas de projetos de lei de

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Fundações e Obras Geotécnicas

Autor: Álvaro Rodrigues dos Santos Ano: 2017 Editora: Rudder

caráter municipal, estadual ou federal que, uma vez adotadas e implementadas, muito colaborariam para exitosos programas de redução dos graves e já crônicos problemas e disfunções associados à relação das cidades com o meio físico geológico que as recebem. O livro tem como público-alvo os administradores e gestores municipais, senhores prefeitos e vereadores, técnicos municipais, profissionais e estudantes nas áreas de arquitetura, urbanismo, geologia de engenharia, engenharia geotécnica, geografia, defesa civil e áreas afins e organizações da sociedade civil voltadas à humanização de nossas cidades.


Agenda

NACIONAL

3 5

9 11

4º CONGRESSO BRASILEIRO DE TÚNEIS E ESTRUTURAS SUBTERRÂNEAS São Paulo, São Paulo 4cbt.tuneis.com.br/index.php Organizado pelo CBT (Comitê Brasileiro de Túneis), junto com a ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica), o 4º Congresso Brasileiro de Túneis e Estruturas Subterrâneas é um dos eventos mais esperados pela comunidade tuneleira na América Latina. Em sua quarta edição, o evento ocorrerá simultaneamente ao 9th ISSMGE (International Symposium on Geothecnical Aspects of Underground Construction in Soft Ground – TC-204) e abordará 17 temas direcionados aos profissionais que atuam no setor, além de apresentar novas tecnologias e trabalhos técnicos do Brasil e da América do Sul.

MUNDO GEO CONNECT São Paulo, São Paulo mundogeoconnect.com/2017/ Realizado anualmente pela empresa MundoGEO, grupo que atua no segmento geoespacial e de drones, o evento é considerado um dos maiores do segmento. Em sua última edição, o encontro reuniu especialistas, empresários, pesquisadores de vários países da América Latina e demais continentes, com a presença de mais de 3.200 pessoas e 120 palestrantes.

a

ABRIL

EXTERIOR

27 29 a

ABRIL

3RD BOLIVIAN INTERNATIONAL CONFERENCE ON DEEP FOUNDATIONS Santa Cruz de la Sierra, Bolívia O evento tem como finalidade apresentar e debater a prática e os novos desenvolvimentos na área de fundações profundas. O tema central do congresso será design, execução, monitoramento, interpretação e métodos de fundações profundas. Entre os destaques da conferência está a apresentação dos resultados de ensaios de carga em estacas individuais. Além disso, haverá uma exposição com demonstrações de campo, organizadas com a participação dos principais fabricantes de equipamentos de fundações e máquinas. 79

Fundações e Obras Geotécnicas

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MAIO

1 4 a

MAIO

OFFSHORE TECHNOLOGY CONFERENCE Houston, Estados Unidos 2017.otcnet.org/ Criada em 1969, a OTC (Offshore Technology Conference) é realizada anualmente, em Houston, nos Estados Unidos. Consagrado mundialmente, o congresso é considerado como o maior evento para a indústria de petróleo e gás, com uma participação de, em média, 2.400 expositores e participantes de 120 países em cada edição. O encontro tem como objetivo reunir os profissionais de energia para o compartilhamento de ideias e experiências, além de ser um espaço para a atualização das principais tendências científicas e técnicas para recursos offshore e questões ambientais.


Jogo Rápido

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