FRANZ BRENTANO ______________
O CONCEITO DE VERDADE ______________
veritas
usj CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
O CONCEITO DE VERDADE
FRANZ BRENTANO
O CONCEITO DE VERDADE
São José CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ 2014
CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ - USJ Reitora: Elisiane C. de Souza de F. Noronha EDITORA CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ Editor executivo: Evandro Oliveira de Brito Assessor editorial: Débora Medeiros COMISSÃO EDITORIAL ACADÊMICA Adarzilse Mazzuco Dallabrida Carolina Ribeiro Cardoso da Silva Fernando Mauricio da Silva Keila Villamayor Gonzalez Jason de Lima e Silva José Cláudio Morelli Matos Maria Solange Coelho Rogério Tadeu Lacerda Vera Regina Lúcio
140 B839c
EDITORA ASSISTENTE Zuraide Silveira EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Assessoria de Comunicação USJ CAPA: Zuraide Silveira REVISÃO: Adriano Picoli TRADUÇÃO: Evandro O. Brito FICHA CATALOGRÁFICA Coordenação de Biblioteca do USJ
O conceito de verdade / Franz Brentano; tradução: Evandro O. Brito – 1. ed. – São José, SC: Centro Universitário Municipal de São José, 2014. 78 p. ISBN 978-85-66306-06-4 (impresso) ISBN 978-85-66306-05-7 (e-book) Inclui bibliografia 1. Verdade. 2. Correspondência. 3. Evidência 4. Teoria do conhecimento. I. Brentano, Franz, (1838-1917). II Título CDD 140
Atribuição - uso não-comercial Vedada a criação de obras derivadas
Sinceros agradecimentos aos incentivadores deste projeto. Especialmente Udo Tellmann, Katy Rdjabi e Jacqueline Schreyer do IIK D端sseldorf
Ninguém, nem antes e nem depois de mim (e Husserl não está excluído), foi capaz de se expressar clara e incisivamente sobre isso, tal como eu fui. Franz Brentano.
SUMÁRIO
PRIMEIRAS PALAVRAS .................................................... 11 PREFÁCIO ............................................................................ 13 1.1 Uma chave interpretativa para apresentar o conceito brentaniano de verdade ............................................... 13 1.2 A exposição brentaniana do conceito de verdade e os problemas a ela concernentes ...................................... 17 1.3 A orientação cartesiana para dissolução dos equívocos concernentes ao conceito de verdade ......... 27 1.4 A interpretação brentaniana e a evidência do juízo como dissolução para os equívocos concernentes ao conceito de verdade ..................................................... 34 1.5 A verdade como correspondência ................................ 39 1.6 Considerações finais .................................................... 41 1.7 Referências .................................................................... 42 APRESENTAÇÃO ............................................................... 47 O CONCEITO DE VERDADE ............................................ 51
PRIMEIRAS PALAVRAS O texto principal de Franz Brentano, aqui traduzido, consiste na conferência intitulada Über der Begriff der Wahrheit, apresentada à Sociedade Jurídica de Viena em 1889, e publicada como primeiro capítulo da obra Wahrheit und Evidenz, Hamburg, Felix Meiner, 1930. Antecede o texto principal uma introdução elaborada pelo tradutor e uma apresentação do próprio Brentano adaptada para este fim. Esta última consiste na tradução do suplemento XI, intitulado Vom Psychologismus, o qual foi publicado em 1911 como uma parte dos apêndices da edição denominada Klassifikation der psychischen Phänomene. A primeira edição da tradução da obra O conceito de verdade foi publicada comercialmente pela Editora Bookess em 2013. Sem finalidade comercial, esta edição acadêmica do USJ está destinada à divulgação gratuita e contou com pouquíssimas revisões.
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PREFÁCIO1
1.1
Uma chave interpretativa para apresentar o conceito brentaniano de verdade
Com o objetivo de apresentar não apenas a análise, o problema e a solução, mas principalmente o conceito de verdade formulado por Franz Brentano neste livro, seguiremos seus passos na exposição sistemática do conceito aristotélico de verdade como correspondência. Deste modo, indicaremos os aspectos fundamentais da filosofia brentaniana do psíquico, tal como foram formulados no contexto da sua comunicação apresentada à comunidade filosófica de Viena em março de 1889. Essa comunicação recebeu o título Sobre o conceito de Verdade (Über den Begriff der Wahrheit) e foi publicada como primeiro capítulo da obra Verdade e Evidência (Wahrheit und Evidenz: Erkenntnistheoretische Abhandlugen und Briefe) 2. Este texto, elaborado com o propósito de apresentar ao leitor o problema da verdade analisado por Franz Brentano, consiste em uma adaptação de duas versões anteriores, as quais estavam destinadas a outros propósitos. Sua primeira versão, um pouco mais ampliada, apareceu como uma seção do capítulo III da tese doutoral intitulada O Desenvolvimento da ética na filosofia do psíquico de Franz Brentano (BRITO, 2012). Sua segunda versão, um pouco mais reduzida, foi publicada na Revista Guairacá com o título Franz Brentano, Correspondência e Verdade: uma exposição esquemática da análise de Franz Brentano apresentada no texto Über den Begriff der Wahrheit (1889), (BRITO, 2012). Sua escolha como texto introdutório para esta tradução se deu em função da sua pertinência para esclarecer o tema tratado no livro. 2 Editada por Oskar Kraus, a obra “Verdade e Evidência” (Wahrheit und 1
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A análise presente nesta introdução será desenvolvida à luz da interpretação da filosofia brentaniana do psíquico inaugurada por Roderick Chisholm (1969, 1976, 1986) e consolidada nas duas últimas décadas por filósofos da mente como Albertazzi (2006), Crane (2006), Fisette e Fréchette (2007), Mulligan (2004), Simon (1995), Smith (1994), entre outros. Ao tomarmos por base o modo de análise destes filósofos da mente, evitaremos os equívocos interpretativos cometidos por Linda McAlister e seus seguidores, bem como algumas polêmicas levantadas por pupilos de Brentano, como Husserl e Meinong. O problema da verdade tratado nesta introdução, além de ter como horizonte interpretativo a análise de Porta (2002) acerca do problema da equivocidade do ser, pressupõe os resultados das análises que publicamos recentemente em dois trabalhos dedicados à apresentação daquilo que Brentano definiu como esfera conceitual (Gedankenkreise) de sua Psicologia Descritiva. Analisamos, em um desses trabalhos3, algumas considerações de Chisholm sobre as mudanças presentes na definição brentaniana de fenômeno psíquico, tal como foi apresentada nos trabalhos de 1889-91 que compuseram a obra Psicologia Descritiva4. Expusemos, além disso, a tese de Evidenz: Erkenntnistheoretische Abhandlugen und Briefe) foi publicada em três edições (1930, 1958 e 1974). BRITO, Evandro O. A descrição da atividade intencional da consciência na obra psicologia descritiva de Franz Brentano. Kínesis, Vol. IV, n° 07, Julho 2012. P. 174-187. 4 A obra póstuma Deskriptiven Psychologie foi composta por alguns trabalhos e palestras oferecidos por Brentano a partir de 1887. As referências que faremos a tal obra no decorrer da nossa análise correspondem principalmente aos trabalhos de 1889-90. No entanto, assumimos que a esfera conceitual (Gedankenkreise) da Psicologia 3
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Introdução
Chisholm que apontou as mudanças na doutrina da in-existência intencional do objeto apresentada na Psicologia do ponto de vista empírico, em 1874. De modo mais específico, mostramos como Chisholm encontrou tais mudanças na descrição brentaniana dos fenômenos psíquicos e as atribuiu ao abandono da ontologia aristotélico-tomista que fundamentava a doutrina da inexistência intencional do objeto. A análise de Chisholm apresentou, ainda, uma nova definição brentaniana de fenômeno psíquico formulada na obra Psicologia descritiva. Com o propósito de evidenciar essa nova definição, nós destacamos o modo como o novo fundamento epistemológico apontado pela tese de Chisholm descreveu a relação intencional própria de todo ato psíquico. Finalmente, destacamos a virtude da tese chisholmeana para interpretar a recepção de Descartes na obra Psicologia descritiva e sua nova classificação dos fenômenos psíquicos. Nosso segundo trabalho5 ocupou-se da análise do manuscrito Psicognose (Psychognosie), título original das leituras apresentadas por Franz Brentano na Universidade de Viena em 1890. Tratamos, especificamente, da nova descrição dos atos psíquicos intencionais, explicitada por Brentano a partir da análise da consciência desenvolvida nesse manuscrito. Assim, nossa investigação apresentou o modo como Brentano descreveu a unidade da consciência como o todo, distinguido em suas partes, o qual constitui o objeto da Psicognose. Além disso, o ponto fundamental da nossa investigação mostrou que, assumindo a interpretação inaugurada por Chisholm (1969), a nova descrição dos atos psíquicos, como relação entre as partes da consciência, Descritiva de Brentano está explicitamente definida nos trabalhos produzidos entre 1887 e 1891. 5 BRITO, Evandro O. Franz Brentano e a descrição dos atos psíquicos intencionais: uma exposição esquemática do manuscrito Psychognosie de 1890, p. 87. 15
Evandro O. Brito
introduziu algumas mudanças fundamentais na teoria brentaniana da intencionalidade, ao descrever dois tipos distinguíveis de relações intencionais, caracterizadoras dos atos intencionais de representação e dos atos intencionais de juízo. Nossa análise mostrou, de modo mais específico, que Brentano descreveu a representação como “a classe das partes dos pares de correlatos intencionais”6 e, com base nessa descrição, a representação seria um ato intencional dirigido ao seu respectivo correlato, caracterizado como objeto imanente. Além disso, mostramos que o juízo foi descrito como “a classe das partes meramente distincionais da relação psíquica primária e secundária [Diploseenergie]”7 e, com base nessa descrição, o juízo seria um ato intencional dirigido a uma representação. Por isso, destacamos ali o fato de que o juízo se dirige à representação como um todo, à medida que a representação se dirige ao objeto imanente. Deste modo, enquanto “dienergia” psíquica (Diploseenergie), o juízo teria a representação (como um todo e não o objeto imanente da representação) como objeto primário, enquanto tem a si mesmo como objeto secundário. Portanto, a descrição da atividade intencional do ato de julgar como a classe das partes meramente distincionais da relação psíquica primária e secundária (Diploseenergie) é o pressuposto brentaniano fundamental para a análise do conceito de verdade como correspondência. Assim, passemos à exposição textual sem perder este pressuposto de vista. “die Teile des intentionalen Korrelatenpaares„. BRENTANO, Franz. Deskriptive Psychologie, p. 25. 6
“bloß distinktionelle Teile der psychischen Diploseenergie, (primäre und sekundäre psychische Beziehung)„. BRENTANO, Franz. Deskriptive Psychologie, p. 25. 7
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Introdução
1.2
A exposição brentaniana do conceito de verdade e os problemas a ela concernentes
A análise brentaniana, desenvolvida em seu trabalho Sobre o conceito de Verdade (Über den Begriff der Wahrheit), apresentou uma retomada da clássica definição aristotélica de verdade compreendida como adaequatio rei et intelectus. Essa análise, que se opôs à interpretação tradicional desse conceito aristotélico de verdade como correspondência, orientou-se pelas definições, distinções e classificações apresentadas pelo próprio Brentano em sua tese doutoral, a qual desenvolveu uma teoria acerca dos múltiplos sentidos do Ser segundo Aristóteles. Deste modo, Brentano permaneceu sustentando em 1889, tal qual fizera em 1874 com base em pressupostos aristotélicos, que a verdade e a falsidade tomadas no sentido próprio se encontravam no juízo, fosse ele positivo ou negativo8. É interessante ressaltar, de modo mais específico, que a análise de Brentano foi pontual e apontou diretamente aquela que seria a principal definição aristotélica de verdade, ao mencionar e interpretar a seguinte passagem da Metafísica. Uma vez que, como a pesquisa anterior mostrou, as palavras „Verdadeiro‟ e „falso‟ são usadas por Aristóteles com significados diferentes, tudo se
A verdade e a falsidade tomadas no sentido próprio encontram-se no juízo. Todo juízo é, assim, ou verdadeiro ou falso. [„die Wahrheit und Falschheit im eigentlichen Sinne findet sich im Urteil. Und zwar ist jedes Urteil entweder wahr oder falsch“]. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 6. 8
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resume em determinar, agora, quais destes significados são utilizados quando se trata do e do . Esta questão não parece difícil de resolver, porque na Metaph. E, 428, com uma clareza que não deixa nada a desejar, Aristóteles diz que o e o se encontram apenas no juízo, seja ele positivo ou negativo: „o que é, no sentido do verdadeiro, e o que não é, no sentido do falso, encontram-se na união e na separação, e entre ambos, por sua vez, compartilham a contradição. De fato, o verdadeiro compreende tanto a afirmação do unido como a negação do separado; o falso, por sua vez, compreende a contradição de ambos... Pois o verdadeiro e o falso não estão nas coisas, [...] mas no entendimento, e quando se trata de conceitos simples, nem mesmo neste‟. É claro que o juízo é, aqui, o que se denomina verdadeiro ou falso, e, portanto, Ser ou não Ser. 9 A delimitação do juízo como lugar da verdade e falsidade enunciadas em seu sentido próprio, tal como Brentano mostrou ter encontrado aqui na teoria aristotélica, serviu de pedra de toque para a descrição brentaniana do juízo como um ato psíquico de atribuição de verdade e falsidade (ou valoração, da representação de “algo”, como verdadeiro ou falso). Essa descrição, tal como veremos adiante, estava caracterizada pelo fato de que o juízo, analisado sob a ótica da Psicologia descritiva brentaniana de 1889, possuía uma estrutura e, além disso, tal estrutura consistia na predicação existencial de uma representação (ato de representar “algo”), fosse ela BRENTANO, Franz. Sobre los múltiples significados del ente según Aristóteles, p. 72-73. 9
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Introdução
simples [(A)é] ou composta [(A é B)é]. Assim, Brentano explicou e exemplificou o ato de juízo nos seguintes termos: O próprio juízo é o sujeito ao qual se atribuí o Ser como predicado. O Ser aqui mencionado não é, portanto, a cópula que na própria proposição liga sujeito e predicado – especialmente quando se considera que um juízo negativo também é chamado de Ser, e um juízo afirmativo de não Ser. Trata-se, antes, de um Ser que se predica de um juízo completo, já enunciado. Um exemplo pode esclarecer isso. Suponha que alguém quer provar para outro que um triângulo tem como soma de seus ângulos dois (ângulos) retos e, como ponto de partida de sua demonstração, pede para ser admitido que o ângulo externo é igual à soma dos dois ângulos internos opostos. Pergunta-se, pois, é isso ou não? Quer dizer, é verdadeiro ou falso? – É isso, quer dizer, é verdade!10 É oportuno ressaltar que Brentano desenvolveu a análise do conceito aristotélico de verdade tomando como base os fundamentos de sua descrição do fenômeno psíquico de julgar, definida a partir de 1889 como relação psíquica primária e secundária (Diploseenergie). Nesses termos, o juízo foi descrito como um ato psíquico intencionalmente dirigido à representação e esta, por sua vez, foi descrita como um ato psíquico intencional dirigido a um objeto imanente. Em função dessas orientações teóricas, Brentano considerou que a definição correta de verdade poderia ser estabelecida por meio da análise da resposta aristotélica para a seguinte questão:
BRENTANO, Franz. Sobre los múltiples significados del ente según Aristóteles, p. 73. 10
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“Quando um juízo é falso e quando é verdadeiro?”11 Tal como descreve a citação a seguir, a resposta para essa pergunta colocou o ponto de partida da análise brentaniana: Aristóteles responde que o juízo é verdadeiro quando aquele que julga o concebe em conformidade com as coisas, no caso contrário é falso. ‟Quando alguém toma por separado o que é separado, unido o que é unido, seu juízo é verdadeiro. E ele erra quando concebe as coisas de modo contrário ao que são‟. (Metafísica, IX, 10, 1051 b3). Com isso, tal verdade foi esclarecida pela concordância de um juízo com as coisas reais (wirklichen Dingen).12 Ao apresentar a definição aristotélica acima, a análise brentaniana reconheceu a necessidade de dissolver os „Wann ist nun aber nach ihm ein Urteil wahr?, wann falsch?“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 7. 11
„ARISTOTELES antwortet darauf, wahr sei es, wenn der Urteilende sich den Dingen entsprechend, falsch, wenn er sich ihnen entgegengesetzt verhalte.„ Wenn Einer, was geschieden ist, für geschieden, was verbunden ist, für verbunden hält, urteilt er wahr, und er irrt, wenn er sich entgegengesetzt verhält, wie die Sachen (Metaph. IX, 10, 1051b 3)“. Damit war eine Wahrheit für die Übereinstimmung des Urteils mit den wirklichen Dingen erklärt. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 7. 12
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Introdução
problemas que envolviam a noção de “correspondência”. Vejamos o primeiro deles. Brentano reconheceu que seria preciso esclarecer o modo aristotélico de conceber a ligação daquilo que está ligado e a separação daquilo que está separado. Tratava-se, disse ele, das seguintes afirmações de Aristóteles: Aristóteles diz, em seu livro „De Interpretação‟, que juízo consiste em uma interligação de pensamentos e que ele seria uma composição (). E essa consiste no fato de que, quando se julga, toma-se uma coisa real como unida ou como separada de alguma outra coisa que é igualmente real (Grifos nossos). Tomando-se por coisas unidas, aquelas efetivamente unidas, e por coisas separadas, aquelas que são efetivamente separadas, então se julga verdadeiro. No caso contrário, falso, quando se procede contrariamente para com as coisas..13 Segundo a análise brentaniana, essa definição de verdade incorria em ambiguidades, pois ela sustentava a interpretação proposta por “[...] aqueles que, por verdade,
„ARISTOTELES sagt in seinem Buch De Interpretatione, das Urteil bestehe in einer Verflechtung von Gedanken (), es sei eine Zusammensetzung (). Und diese bestehe darin, daß man, wenn man urteile, etwas Reales mit etwas Realem für verbunden, für eins oder etwas Reales von etwas Realem für getrennt, geschieden halte. Halte man für verbunden Dinge, die wirklich verbunden, für getrennt Dinge, die wirklich getrennt seien, so urteile man wahr; falsch dagegen, wenn man sich entgegengesetzt wie die Dinge verhalte“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 18-19. 13
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imaginam dada certa relação de identidade ou similitude, ou mesmo semelhança, entre um pensamento e uma realidade (Realität)” 14. Orientado pela teoria do juízo fundada na filosofia do psíquico, desenvolvida a partir de 1889, Brentano considerou que “[...] a proposição segundo a qual a verdade seria a concordância do juízo com a coisa (ou toda formulação similar) ou é necessariamente falsa ou deve ser compreendida de uma maneira inteiramente diferente”15. De fato, Brentano pretendeu afirmar a segunda hipótese dessa bifurcação, para sustentar a tese de que a verdade seria a concordância entre o juízo e “algo”, embora esse “algo” não fosse uma “coisa real”. Assim, por meio de um silogismo disjuntivo, ele apresentou as clássicas contradições que envolviam a possibilidade de concordância entre alguns juízos e as coisas reais. Tais contradições envolviam tanto os casos de alguns juízos negativos, como os casos de alguns juízos afirmativos. Com o propósito de apontar textualmente o problema, exporemos separadamente cada uma dessas classes de impossibilidades que Brentano pretendeu eliminar de sua teoria da verdade, começando pelas primeiras. A possibilidade de correspondência, entre os juízos negativos e as coisas, foi exemplificada por Brentano, como descreve a citação a seguir, a partir do fato de que aquilo que deveria ser o correspondente do juízo negativo verdadeiro não
„Welche bei der Wahrheit eine gewisse Relation der Identität oder Gleichheit oder Ähnlichkeit von einem Denken und einer Realität gegeben glauben“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 23. 14
„Wir sehen: der Satz, die Wahrheit sei die Übereinstimmung des Urteils mit der Sache (oder wie man sich ähnlich ausdrücken mag), muß entweder grundfalsch oder ganz anders zu verstehen sein“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 23. 15
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Introdução
existe como coisa real. Ou, nos termos brentanianos, é um existente não-real. A dúvida explicita-se de maneira particularmente clara no caso da simples negação. Se a verdade „não existe dragão‟ consistisse em uma concordância de meu juízo com uma coisa (Ding), qual deveria ser então esta coisa (Ding)? Não o dragão, o qual nem se quer existe (nicht vorhanden sein). Nem tampouco, no entanto, qualquer real (irgendwelches Reale), o qual (como concordante) pudesse ser considerado.16 O argumento exposto, como sustenta Brentano, propõe a refutação da tradicional interpretação da noção de correspondência de um juízo a uma coisa real, baseando-se no fato de que os juízos negativos verdadeiros, assim o são, independentemente da realidade daquilo que está sendo afirmado. Isto significa que Brentano já está analisando a correspondência dos juízos negativos baseado nos critérios de sua Psicologia descritiva. Em outras palavras, ele está pressupondo apenas a realidade do ato de representar “algo” (cuja existência pode ser real ou não real) e não a realidade daquilo que é representado. O mesmo ocorre, como destacamos na citação que se segue, com o juízo negativo de existência.
„Besonders im Falle der einfachen Leugnung tritt das Bedenkliche klar hervor. Wenn die Wahrheit: ‚es gibt keinen Drachen„ in einer Übereinstimmung zwischen meinem Urteil und einem Dinge bestände, welches sollte dann dieses Ding sein? Der Drachen doch nicht, der ja dann gar nicht vorhanden ist. Aber ebensowenig ist irgendwelches Reale da, das (als übereinstimmend) in Betracht kommen könnte“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 22. 16
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Algo completamente similar ocorre, no entanto, no caso onde eu não nego uma coisa (Ding) de modo absoluto, mas nego apenas algo (etwas) como determinação real (reale) de outro. Quando eu digo “algum homem não é negro”, é necessário então para a verdade da sentença, como nós já dissemos, não um negro separado do homem, mas sim a falta de negro no homem, a qual existe na realidade (der in Wirklichkeit ist). Esta falta, este não-negro, é como tal coisa alguma (kein Ding), assim é novamente coisa alguma (kein Ding) dada na realidade (in Wirklichkeit gegeben) que concorda com este meu juízo. Aponta-se assim, como dissemos, garantido primeiramente por todos os juízos negativos (e inequivocamente pelas negações simples), que não existia aquela relação de concordância entre juízo e realidade (Realität), a qual pretensamente pertenceria a cada juízo verdadeiro.17
„Ganz ähnlich aber verhält es sich auch in den Fällen, wo ich ein Ding nicht schlechtweg leugne, sondern nur etwas einem anderen als reale Bestimmung abspreche. Wenn ich sage: irgendein Mensch sei nicht schwarz, so ist -- wir sagten es bereits - zur Wahrheit des Satzes nicht ein Schwarz getrennt von Mensch, sondern der Mangel eines Schwarz an dem Menschen, der in Wirklichkeit ist, erforderlich. Dieser Mangel, dieses NichtSchwarze aber ist als solches kein Ding; also ist wieder kein Ding als das, was mit diesem meinem Urteile übereinstimmte, in Wirklichkeit gegeben. - So zeigt sich denn, wie gesagt, zunächst bei allen wahren, negativen Urteilen (und am unverkennbarsten freilich bei den einfachen negativen), daß jene Relation der Übereinstimmung zwischen Urteil und Realität, die angeblich zu jedem wahren Urteil gehören würde, nicht vorhanden ist“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz,p. 22. 17
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Introdução
Indicada a primeira impossibilidade de correspondência, passemos à segunda classe de contradição que envolve a impossibilidade de correspondência entre os juízos e as coisas reais. Ainda segundo Brentano, além dos juízos negativos verdadeiros, os juízos afirmativos verdadeiros também explicitam a impossibilidade de correspondência entre um juízo e uma coisa real. Tal como descreve a citação a seguir, a impossibilidade torna-se evidente quando aquilo que deveria ser o correspondente desse juízo verdadeiro não existe necessariamente como coisa real, ou seja, quando se trata de uma coleção de coisas, de partes da coisa, de limites de tal coisa, de algo no futuro ou no passado etc. Portanto, em função desta inexistência de coisas reais, que são necessariamente correspondentes aos juízos afirmativos verdadeiros, Brentano concluiu que a interpretação tradicional da concepção adaequatio rei et intellectus estava completamente abatida. Vejamos seu argumento. O outro caso, onde parece se mostrar a mesma coisa, nós encontramos imediatamente quando examinamos de modo claro toda a extensão do âmbito no qual se exerce a função afirmativa. Nós descobrimos, então, que embora o juízo afirmativo se refira frequentemente às coisas (Dinge), também não deixa de tratar de objetos (Gegenstände) – eu clarificarei agora a partir de alguns exemplos – os quais não são designados de modo algum com o nome “coisa” (Dinge). Onde, então, um juízo afirmativo se refere às coisas (Dinge), seja ele o que simplesmente reconhece uma coisa (Ding), seja ele o que atribui outra determinação real (Reale) a uma realidade (Realität), nós certamente poderíamos mostrar, no caso da verdade, uma concordância das coisas (Dinge) com o juízo. Onde não fosse o caso, no entanto, como deveríamos ser 25
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capazes de dar conta de semelhante concordância? De fato, nossos juízos afirmativos verdadeiros, às vezes dizem respeito a uma coisa, a um coletivo de coisas, às vezes a uma parte, um limite de tal coisa etc – meros objetos (Gegenstände), os quais são eles mesmos coisas alguma (keine Dinge). Ou, no entanto, se alguém se atrevesse ainda a afirmá-los, ele pretenderá, talvez ainda do mesmo modo, afirmar um ser que se encontra fora de mim como uma coisa (Ding), o qual eu conheço como passado remoto ou como futuro distante? E ainda, o que acontece quando eu reconheço a falta e quando eu reconheço a ausência de uma coisa? Ele dirá que essa falta, que esta ausência em uma coisa, é também uma coisa? E ainda, quando eu digo que existe uma impossibilidade ou existe certas verdades eternas – por exemplo, as leis matemáticas – ele acreditará aqui talvez que, algo semelhante às ideias platônicas, existiriam no mundo ou fora dele seres eternos concordantes com meu juízo? Certamente não. Parece que o conceito de adaequatio rei et intellectus foi aqui completamente desfeito.18
„Der andere Fall, wo sich dasselbe zu zeigen scheint, begegnet uns sofort, wenn wir den Umfang des Gebietes, in welchem die affirmative Funktion geübt wird, klar überblicken. Wir finden dann, daß sich das affirmative Urteil zwar oft auf Dinge bezieht; aber auch - ich werde dies sogleich an Beispielen verdeutlichen - daß es oft auf Gegenstände geht, die keineswegs mit dem Namen "Dinge" zu benennen sind. Wo sich nun ein affirmatives Urteilen auf Dinge bezieht, sei es daß man einfach ein Ding anerkennt, sei es daß man einer Rea1ität eine weitere reale Bestimmung zuspricht, da werden wir allerdings im Falle der Wahrheit eine Übereinstimmung der 18
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Introdução
A partir da exposição de tais impossibilidades, a análise brentaniana inferiu a necessidade de uma nova interpretação para aquilo que seria a concepção aristotélica de concordância entre o juízo e “algo”. Apresentado o ponto de partida brentaniano, passemos agora à apresentação do problema filosófico da verdade, para o qual Brentano apresenta uma solução no interior da sua filosofia do psíquico.
1.3
A orientação cartesiana para dissolução dos equívocos concernentes ao conceito de verdade
O problema filosófico norteador do conceito de verdade, tal como a análise brentaniana o expôs, foi Dinge mit dem Urteil aufweisen können. Wo aber nicht, wie sollten wir da noch ebenso dasselbe zu tun vermögen? Und tatsächlich geht unser wahres, affirmatives Urteilen, wie manchmal auf ein Ding, so ein anderes Mal auf ein Kollektiv von Dingen; dann wieder einmal auf einen Teil, auf eine Grenze von einem Ding und dergleichen lauter Gegenstände, die selber keine Dinge sind. Oder, wenn einer dies doch noch zu behaupten wagte, wird er vielleicht ebenso noch behaupten wollen, ein Wesen, das ich als längst vergangen oder als fern zukünftig erkenne, sei außer mir als Ding zu finden? Und weiter noch! Wie ist es, wenn ich den Mangel, wenn ich das Fehlen eines Dinges anerkenne? wird er sagen, dieser Mangel, dieses Fehlen eines Dinges sei auch ein Ding? Und wieder, wenn ich sage, es bestehe eine Unmöglichkeit oder es gebe gewisse ewige Wahrheiten, wie z. B. die mathematischen Gesetze; wird er da vielleicht glauben, daß, ähnlich etwa den platonischen Ideen, mit einem Urteile übereinstimmende ewige Wesen irgend wo in oder außer der Welt beständen? Gewiß nicht. - Der Begriff der adaequatio rei et intellectus scheint hier ganz und. gar in Brüche zu gehen“]. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 22-23.
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Evandro O. Brito
introduzido na história da filosofia pelo sofista Górgias. Tomando esse fato histórico-filosófico por base, a argumentação brentaniana tomou como boneco de palha a clássica problematização apresentada por Górgias, pois, ao analisar as teses pré-socráticas e sofísticas, Górgias havia sido o primeiro a apontar as consequências problemáticas decorrentes da noção de verdade como correspondência. Brentano sintetizou a crítica de Górgias à noção de verdade como correspondência do seguinte modo: Górgias nega, consequentemente, que algo real seja conhecido e, ainda que fosse o caso, que o conhecimento poderia ser comunicado entre um e outro. A não ser consigo mesmo, nada corresponde completamente a qualquer coisa. O que está fora de mim, não está em mim. O que está em mim e permanece, não passa para outro. Não há, assim, verdade e não há meio possível de comunicar a verdade. Se alguma coisa por nós pensada precisasse ser designada como verdadeira, dizia Górgias, então tudo o que nós pensamos seria designado como verdadeiro, pois cada pensamento é um consigo mesmo e diferente de todos os outros. O fato de que, no entanto, cada pensamento fosse designado como verdadeiro, também o seria quando eu pensasse em uma batalha de carroças sobre o mar, o que seria uma contradição.19
„GORGIAS leugnet daraufhin, daß irgend etwas Wirkliches erkennbar, und daß, wenn dies sogar der Fall wäre, die Kenntnis von einem dem anderen mitteilbar sei. Vollkommen stimmt nichts mit etwas überein außer mit sich selbst. Was außer mir ist, ist nicht in mir, was in mir ist und bleibt, geht nicht in einen anderen über. Also 19
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Introdução
Ainda que a questão de Górgias não tenha sido apresentada de modo rigoroso, o propósito de Brentano era descrever o modo como o problema da verdade colocado por Górgias, caracterizado como problema fundamental da teoria do conhecimento, poderia ser dissolvido pela sua filosofia do psíquico. De que modo? Por meio da aplicação dos critérios de análise encontrados na descrição das relações entre as partes e o todo da consciência, norteadores dos fundamentos teóricos da sua Psicologia descritiva. A análise brentaniana explicitou que a solução para o problema levantado pelo sofista Górgias “[...] estava baseado na confusão acerca de uma diferença que Descartes classificou como distinção entre realidade formal e realidade objetiva”20. Ressaltou, no entanto, Brentano, acerca dessa solução cartesiana, “[...] bem antes dele, Aristóteles já havia elucidado inteiramente, o que lhe permitiu superar as absurdidades e os sofismas de Parmênides, Empédocles, Górgias, Protágoras, entre outros”21. Tal como comenta a ist keine Wahrheit und keine Mitteilung von Wahrheit möglich. Wenn etwas, was wir denken, wahr zu nennen wäre, meinte GORGIAS, so wäre alles, was wir denken, wahr zu nennen; denn jeder Gedanke ist mit sich eins und jeder von allen anderen verschieden. Daß aber jeder Gedanke wahr zu nennen wäre, auch wenn ich einen Wagenkampf auf dem Meere denke, sei ein Widersinn“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 7-8. „Es beruht auf der Verkennung eines Unterschiedes, den DESCARTES als den Unterschied von formaler und objektiver Realität bezeichnet“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 17. 20
„den aber lange zuvor schon ARISTOTELES ins volle Licht setzte und dadurch die Absurditäten und die Sophistereien des PARMENIDES, EMPEDOKLES, GORGIAS, PROTAGORAS u.a. Überwand“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 17. 21
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citação a seguir, a solução do problema consistia em distinguir, em um ato psíquico de crença, os elementos constituintes da realidade formal e os elementos constituintes da realidade objetiva: Quando eu creio algo, esta crença está “formalmente” em mim. Quando mais tarde eu me recordo dessa crença, então ela está, segundo a expressão de Descartes, “objetivamente” em mim. Trata-se do mesmo ato individual de crença, mas no primeiro caso eu o exerço e no outro caso ele é apenas o objeto imanente da atividade de rememoração, a qual eu exerço.22 A análise de Brentano, exposta na citação acima, pressupõe as seguintes interpretações para os contextos da realidade formal e da realidade objetiva. No contexto da realidade formal, o ato psíquico de crer consistiria formalmente na crença. Nesse caso, a crença seria o ato psíquico em seu pleno exercício (ou, nos termos brentanianos, um juízo). Assim, caracterizado como juízo, o ato psíquico de crer pressuporia um ato psíquico de representar “algo”. As seguintes proposições podem ilustrar a análise de Brentano. A proposição “creio que ouço tal som” deve ser reduzida a sua forma psíquica “é verdade, que ouço tal som”. Além disso, estes dois modos são descritos como „Wenn ich etwas glaube, so ist dieser Glaube "formal" in mir. Wenn ich mich später dieses Glaubens erinnere, so ist er nach DESCARTES Ausdruck "objektiv" in mir; es handelt sich um denselben individuellen Glaubensakt; aber das einemal übe ich ihn aus, das andere Mal ist er nur der immanente Gegenstand der Erinnerungstätigkeit, die ich übe“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 18. 22
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Introdução
predicações existenciais do tipo [(A)é], pois “A” descreve “ouço tal som” e “é” descreve o ato judicativo de atribuição do modo de existência afirmativo à proposição “A”. Do mesmo modo, a proposição “não creio que ouço tal som” deve ser reduzida a sua forma psíquica “não é verdade, que ouço tal som”. Estes dois modos também são descritos como predicações existenciais do tipo [(A) não é], pois “A” descreve “ouço tal som” e “não é” descreve o ato judicativo de atribuição do modo de existência negativa à proposição “A”. No contexto da realidade objetiva, o ato psíquico de lembrar estaria constituído objetivamente da crença. Pergunta-se, então, de que modo? Neste caso, a crença seria o objeto imanente ao ato psíquico de lembrar, caracterizado como uma representação. Podemos recorrer às proposições anteriores para exemplificar o ponto analisado por Brentano. Tomadas como atos psíquicos básicos, o ato de ouvir “algo” e o ato de lembrar “algo” seriam representações, ou seja, atos de representar objetos imanentes correlatos. Nos exemplos que apresentamos, o correlato do ato de ouvir seria “o som ouvido” e o correlato do ato de lembrar seria “o ato de ter acreditado que ouvi algo”. Assim, para Brentano, aquilo que era um ato de 2º tipo (juízo como crença) passava a ser concebido como uma parte distinguível de um ato de 1º tipo (lembrança, como representação de “uma crença em algo”). Vejamos os detalhes dessa distinção quando aplicada aos critérios de análise encontrados na descrição das relações entre as partes e o todo da consciência, norteadores dos fundamentos teóricos da Psicologia descritiva. No caso da realidade formal da crença, o ato de julgar positivamente (crer) seria distinguível em objeto primário e objeto secundário. O objeto primário teria, por um lado, o ato de representar dirigido ao objeto imanente. E, este último, por outro lado, constituiria o correlato representado. O objeto secundário teria, por um lado, o ato de julgar afirmativo 31
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(crer) atribuindo realidade (o ser-real) ao objeto primário (ato de representar o objeto imanente), mas, no caso da realidade objetiva da crença, o ato de lembrar algo consistiria num ato de representar e, portanto, estaria dirigido a um objeto representado. A crença seria, assim, esse objeto imanente representado. Se aplicarmos as distinções propostas pelos critérios brentanianos de análise, podemos afirmar que, enquanto realidade formal, a crença consistiria na atividade objetiva secundária do ato de julgar; enquanto realidade objetiva, a crença consistiria no correlato do ato de lembrar, ou seja, no objeto imanente dado nessa relação intencional. Ao tomar por base seus critérios de descrição da relação entre as partes e o todo da consciência, e descrever distintamente esses dois modos cartesianos de atividade psíquica (realidade formal e realidade objetiva), Brentano encontrou a sua tese sobre a verdade como correspondência. Essa tese considerava que apenas a descrição da realidade formal poderia explicitar, de modo evidente, a correspondência que seria própria da atividade de conhecimento. Seriam os juízos, à medida que estavam estruturados pelas relações psíquicas primárias e secundárias (Diploseenergie), e não as representações constituídas por realidades objetivas, que explicitariam a noção de verdade como correspondência na teoria brentaniana do conhecimento. Esse era, para Brentano, o argumento fundamental para a rejeição da atribuição de verdade à classe das representações. Por isso não havia como conceber as representações como conhecimento. É importante notar que essa distinção, estruturada pelas relações psíquicas primárias e secundárias (Diploseenergie), constituiu não apenas as atividades psíquicas de segunda classe (juízos), mas também as atividades
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Introdução
psíquicas de terceira classe (sentimento de amor ou ódio). Tal como Brentano ressalta na citação seguinte, esse deveria ser o locus de toda teoria do conhecimento e, inclusive, da teoria do conhecimento moral: Algo análogo ocorre com todas as outras funções psíquicas como vontade, desejo, aversão etc. Com o ato psíquico, o qual é dado formalmente, algo é dado como objeto imanente do ato psíquico, portanto objetivamente para falar como Descartes, ou intencionalmente, como nós consideramos melhor expressar a fim de evitar mal-entendidos. Evidentemente, não há qualquer contradição em que algo individual seja intencional em mim e não seja formal, ou o contrário, o que poderíamos explicitar por meio do exemplo da memória e outros mil. O desconhecimento deste fato manifesta-se como um retorno à pré-história da teoria do conhecimento.23
“Ähnlich ist bei jeder anderen psychischen Funktion, Wollen, Begehren, Fliehen usw. Mit dem psychischen Akt, der formal gegeben ist, etwas als immanenter Gegenstand des psychischen Aktes, also mit DESCARTES zu reden objektiv, oder wie wir, um Mißverständnisse zu vermeiden, uns besser ausdrücken werden, intentional gegeben. Und es enthält offenbar gar keinen Widerspruch, daß individuell dasselbe intentional in mir und formal nicht in mir sei oder umgekehrt, was wie durch das Beispiel der Erinnerung durch tausend andere anschaulich gemacht werden könnte. Die Verkennung dieser Tatsache erscheint wie ein Rückfall in die rohesten Zeiten der Erkenntnistheorie“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 18. 23
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O exposto é suficiente para apresentar a estrutura psíquica utilizada por Brentano para interpretar a noção aristotélica de verdade como correspondência.
1.4
A interpretação brentaniana e a evidência do juízo como dissolução para os equívocos concernentes ao conceito de verdade
Passemos, então, à interpretação brentaniana propriamente dita, tomada à luz dos critérios de análise da obra Psicologia descritiva. Vejamos o que ele disse: De modo semelhante a Aristóteles, quando ele esclarece que um juízo é verdadeiro quando ele considera unido o que está unido e assim por diante, nos podemos de todo modo dizer daqui em diante: é verdadeiro o juízo quando afirma de algo (etwas) que é, que ele é. E, nega que algo (etwas) que não é, que ele seja (de modo contrário, falso, uma vez que, em vista disto que é e disto que não, o juízo adotaria uma posição contrária).24
„Und so können wir denn, ähnlich wie ARISTOTELES, wenn er erklärt, wahr sei ein Urteil, wenn es für zusammen geeinigt halte, was zusammen geeinigt sei, und wie er sich des weiteren ausdrückte, allerdings nunmehr sagen: wahr sei ein Urteil dann, wenn es von etwas, was ist, behaupte, daß es sei; und von etwas, was nicht ist, leugne, daß es sei (falsch aber, wenn es mit dem, was sei und nicht sei, sich im Widerspruch finde)“. Brentano, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 24. 24
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Introdução
A citação acima nos coloca diante da relação entre verdade e ser. Antes de abordarmos esse ponto, é interessante ressaltar os pressupostos da análise brentaniana. Brentano sustentou a tese aristotélica de que a verdade e a falsidade, tomadas no sentido próprio, se encontravam no juízo25, mas, segundo sua análise, isso significava que o juízo consistia na predicação existencial da representação, fosse ela simples [(A)é] ou composta [(A é B)é]. Por isso, a análise brentaniana precisou definir o estatuto epistemológico desse modo de ser caracterizado pela predicação existencial. Brentano movimentou-se dentro dos limites da sua própria tese doutoral e valeu-se da teoria dos múltiplos sentidos do ser para distinguir entre realidade e existência. Assim, em 1889, as partes constituintes de um ato psíquico de juízo foram distinguidas também em função dos múltiplos sentidos do ser que caracterizam os componentes distinguíveis mais elementares. Por um lado, o correlato do ato constituinte da relação psíquica primária seria existente ou não existente. Nesse caso, enquanto relação intencional básica, a representação referia-se ao correlato que seria “algo” existente, mas também seria “não algo” ou não existente. Por outro lado, o ato constituinte da relação psíquica secundária seria o modo de atribuição de realidade ou negação de realidade. Nesse caso, enquanto atividade psíquica, o juízo seria real em sentido positivo e negativo. Essa realidade (Wirklichkeit) consistiria na própria atividade da consciência. Enquanto relação intencional complexa (Diploseenergie), o juízo se dirigiria (valoraria) positivamente ou negativamente a representação de “algo” e “A verdade e a falsidade tomadas no sentido próprio se encontram no juízo. Assim, todo juízo é verdadeiro ou falso“. [„Die Wahrheit und Falschheit im eigentlichen Sinne findet sich im Urteil. Und zwar ist jedes Urteil entweder wahr oder falsch“]. Brentano, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 6. 25
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“não algo” correlata. Embora fosse uma reorientação relativamente simples, o próprio Brentano reconheceu que a tradição filosófica não se apercebeu das vantagens dessa distinção: Enfim, nós não estaremos tentados a confundir, como é recorrente, o conceito de real (des Reale) com o conceito de existente (des Existierenden). Já faz dois mil anos que Aristóteles analisou os múltiplos sentidos do ser (des Seienden). É lamentável, mas verdadeiro, que ainda hoje a maioria nenhum proveito tenha tirado de suas investigações.26 Essa reorientação epistemológica assumida por Brentano no interior do pensamento aristotélico e cartesiano teve outra implicação. Ela estabeleceu o critério que sustentava as quatro consequências fundamentais da definição de verdade como correspondência. Vejamos como isso ocorreu. Em primeiro lugar, tal como estabelece a citação a seguir, esse critério permitiu que Brentano reconhecesse o campo coberto pelo juízo como ilimitado. Em outras palavras, ao ser caracterizado como uma relação psíquica secundária, todo juízo tinha por base uma representação que se caracterizava como relação psíquica primária. Assim, qualquer representação poderia fazer parte do campo de atividade do ”Wir werden endlich nicht, wie es immer und immer wieder geschieht, den Begriff des Realen und den des Existierenden zu verwechseln versucht sein. Ein paar tausend Jahre ist es her, seitdem ARISTOTELES die mannigfachen Bedeutungen des Seienden untersuchte; und es ist traurig, aber wahr, daß noch heute die meisten aus seinen Forschungen keine Frucht gezogen haben“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 27. 26
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Introdução
juízo. Ora, isso significava que poderia ser julgada como verdadeira ou falsa a representação que supunha “algo” (existente), como correlato do ato de representar, mas também poderia ser julgada verdadeira ou falsa a representação que supunha “não algo” (não existente) como correlato do ato de representar. E, por que isso foi possível a partir de 1889? Porque o fenômeno psíquico do juízo foi descrito como uma atribuição de realidade (ser-real ou não-ser-real) à atividade psíquica de representar. Desse modo, disse Brentano: Quanto à extensão do domínio, ele é totalmente sem limite. O material pode ser escolhido de maneira totalmente arbitrária. Certamente, algo (Irgend etwas) é sempre julgado. Mas o que significa esse algo (Irgend etwas)? É um termo, o qual poderia ser aplicado a Deus, ao mundo, a cada coisa (jedes Ding) e não-coisa (Unding).27 Em segundo lugar, o modo de referência intencional do juízo à representação explicitou uma estrutura bipolarizada em afirmativa e negativa. Isso significava, tal como afirmou Brentano, que “[...] este domínio totalmente ilimitado se divide de imediato em dois”28: o juízo afirmativo e juízo negativo. Além disso, essa “[...] oposição entre juízo afirmativo e juízo negativo implica que, em cada caso, de fato, „Was den Umfang des Gebietes betrifft, so ist es schlechterdings unbegrenzt. Die Materie kann ganz beliebig gewählt werden. ‚Irgend etwas„ wird freilich immer beurteilt. Aber was bedeutet dieses ‚Irgend etwas„? Es ist ein Terminus, der auf Gott und die Welt, auf jedes Ding und Unding angewendet werden könnte“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 24. 27
“Dieses völlig grenzenlose Gebiet scheidet sich nun aber sofort in zwei Teile“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 24. 28
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uma única das duas modalidades será apropriada, enquanto a outra não será”29. Ainda segundo Brentano, tratava-se aqui “[...] disto que nós exprimimos ordinariamente quando dizemos que, de dois juízos contrários, um é sempre verdadeiro e outro é falso”30. Por isso, tratava-se, em terceiro lugar, das descrições do domínio afirmativo do juízo como atribuição de ser-real à representação e do domínio negativo como atribuição de ser-não-real à representação. Como partes do todo psíquico, o ser-real constituinte da atividade de julgar estaria relacionado de alguma maneira com o existente, ou seja, com o constituinte do correlato do ato de representar. Essa relação, como ressalta Brentano a seguir, é o primeiro indicativo da harmonia ou correspondência entre as partes do ato psíquico: O domínio para o qual a forma afirmativa de julgar é apropriada, nós o chamamos então domínio do existente (Existierenden). Um conceito que deve, certamente, ser distinguido de conceitos tais como coisal (Dinglichen), consistente (Wesenhaften) e real (Realen). O domínio para o qual a forma negativa de julgar é apropriada, nós o chamamos domínio do não existente 31 Nichtexistierenden).
“Der Gegensatz des bejahenden und verneinenden Urteils bringt es nämlich mit sich, daß in jedem Falle die eine und aber auch nur die eine von den beiden Beurteilungsweisen passend und die andere unpassend ist“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 24. 29
“Was wir gemeiniglich so ausdrücken, daß wir sagen, von zwei kontradiktorischen Urteilen sei immer das eine wahr und das andere falsch“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 24. 30
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“Das Gebiet, für welches die bejahende Beurteilungsweise die
Introdução
Brentano tomou, então, o que se explicitou a partir desses três pontos para definir a noção de verdade como correspondência ou concordância. Sua análise considerou que a clássica definição aristotélica deveria reconhecer que a verdade é a justa atribuição de realidade (ser-real) e irrealidade (sernão-real). Nesse caso, a contribuição da filosofia do psíquico está na possibilidade de descrever a justeza desse ato de julgar.
1.5
A verdade como correspondência
A verdade é um juízo, relembrava Brentano constantemente em suas referências aos argumentos aristotélicos. Essa tese deveria ser concebida, no entanto, no seguinte sentido. A atividade psíquica do juízo consistiria na relação intencional estruturada como relações psíquicas primárias e secundárias (Diploseenergie). Assim, o ato psíquico de julgar seria a atividade secundária que atribuiria realidade (ser-real) ou irrealidade (ser-não-real) à relação psíquica primária chamada ato de representar um objeto imanente (existente ou não-existente), ou seja, a representação. Por isso, esse ato explicitaria o ponto fundamental da teoria do conhecimento, a saber, o fato de que a correspondência ou concordância não poderia ser uma identidade ou semelhança, mas deveria ser concebida como a harmonia, a pertinência ou a correspondência. Essa harmonia ocorreria entre a atividade passende ist, nennen wir nun das Gebiet des Existierenden, ein Begriff, der also wohl zu unterscheiden ist von dem Begriffe des Dinglichen,Wesenhaften, Realen; das Gebiet, für welches die verneinende Beurteilungsweise die passende ist, nennen wir das des Nichtexistierenden“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 24.
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de atribuição de realidade ou irrealidade (relação psíquica secundária dirigida à relação psíquica primária) e a atividade de representação de existentes ou não existentes (relação psíquica primária chamada ato de representar um objeto imanente, seja ele “algo” ou “não algo”). Vejamos, então, essas duas características fundamentais que explicitam a noção de verdade pressupostas no que acabamos de estabelecer. Primeiramente, a harmonia ou correspondência de um juízo verdadeiro, descrita por Brentano como justeza, explicitava-se a partir de ambos os domínios afirmativos e negativos do juízo. Em outras palavras, toda descrição do domínio afirmativo do juízo (onde ocorreria a valoração da verdade) mostraria que o verdadeiro se explicitava em dois domínios. Por um lado, o verdadeiro explicitava-se na justa atribuição de realidade (ser-real) à representação (quando ela era uma referência a “algo” – ao existente). Por outro lado, o verdadeiro explicitava-se na justa atribuição de irrealidade (ser-não-real) à representação (quando ela era uma referência a “não algo” – ao não existente). Além disso, e de modo contrário, toda descrição do domínio negativo do juízo (onde ocorreria a valoração da falsidade) mostraria que o falso também se explicitava em dois domínios. Por um lado, o falso explicitava-se na injusta atribuição de realidade (ser-real) à representação (quando ela era uma referência a “não algo” – ao não existente). Por outro lado, o falso explicitava-se na injusta atribuição de irrealidade (ser-não-real) à representação (quando ela era uma referência a “algo” – ao existente). Desse modo, tornava-se compreensível o esforço teórico de Brentano anunciado a seguir, ao redefinir a noção de correspondência como harmonia ou concordância: Em nenhum dos outros tantos modos ditos, além dos que foram ditos aqui, se estabelece a concordância do juízo verdadeiro com o objeto
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Introdução
(Gegenstande). Concordar não significa aqui ser idêntico ou parecido, mas corresponder, ser apropriado, ser pertinente, se harmonizar com, ou outra expressão equivalente que se possa aplicar aqui.32 Nesses termos, portanto, Brentano definiu a noção de verdade como aquela noção que se originava da justa atribuição psíquica de realidade (ser-real) e irrealidade (ser-não-real). Tratava-se da justeza entre dois elementos reais (zwei wirklichen Elemente): um elemento psíquico (a atividade de juízo) e outro elemento também psíquico (a atividade de representação). 1.6
Considerações finais
Como parte de um projeto inacabado em 1889, essa definição brentaniana de verdade assumiu uma posição central na filosofia do psíquico de Franz Brentano. Ao lado dos problemas oriundos da fundamentação da noção de relação intencional, os problemas relacionados à verdade dos juízos evidentes e à evidência da preferência justa passaram ao centro da análise brentaniana a partir de 1889. Posteriormente, Brentano levou os resultados de sua filosofia do psíquico às últimas consequências e propôs, a „In nichts anderem als dem, was ich hier sage, besteht die Übereinstimmung des wahren Urteils mit dem Gegenstande, von der soviel gesprochen wurde. Übereinstimmen heißt hier nicht gleich oder ähnlich sein; sondern übereinstimmen heißt hier entsprechend sein, passend sein, dazu stimmen, damit harmonieren, oder was für andere äquivalente Ausdrücke man hier noch anwenden könnte“. BRENTANO, Franz. Wahrheit und Evidenz, p. 25. 32
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partir de 1905, uma reformulação radical do seu projeto de filosofia do psíquico. Essa virada radical, chamada de Reísmo, caracterizou-se pela fase em que Brentano descreveu o modo concreto ou individual como modo exclusivo de existência das coisas. No entanto, não se tratou de um abandono puro e simples da sua teoria da relação intencional, com suas implicações no conceito de verdade evidência e no conceito de justa preferência moral. Pelo contrário, tal virada consistiu na radicalização da sua teoria da relação intencional com o propósito de assegurar a evidência do conhecimento verdadeiro e justa preferência moral. Deste modo, a análise aqui exposta consiste no passo fundamental para a compreensão da fase final do pensamento brentaniano. Por esse motivo, também, torna-se extremamente relevante a apresentação da interpretação brentaniana do conceito aristotélico de verdade como correspondência, bem como sua reelaboração baseada na descrição da atividade psíquica do juízo, como fonte originária do conhecimento do verdadeiro e do falso.
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APRESENTAÇÃO33
A minha teoria do conhecimento foi acusada de psicologismo; uma palavra surgida recentemente, em função da qual alguns filósofos religiosos se benzem como se nela estivesse o próprio diabo, tal como alguns católicos ortodoxos por causa do nome Modernismo. Para responder a uma acusação tão séria, eu devo primeiramente questionar o que realmente se quer dizer com isso, pois se está recorrentemente com esse nome à mão, também onde se trata de coisas muito diferentes. Quando eu pedi um esclarecimento em um amigável encontro com Husserl, e oportunamente com outros que tinham na boca esse novo termo por ele introduzido, disseram-me que com isso se define uma teoria a qual contesta a validade universal do conhecimento, uma teoria segundo a qual outros seres, além dos humanos, poderiam ter conhecimentos (Einsichten) que se opõem diretamente ao nosso. Entendido neste sentido, eu não apenas não sou psicologista, mas eu sempre rejeitei enfaticamente e combati tal subjetivismo absurdo. Este texto de Franz Brentano, introduzido aqui deliberadamente como apresentação da sua análise acerca do conceito de verdade, não fez parte da referida palestra e nem mesmo fui anexado a essa no momento de sua publicação. Esta apresentação consiste, na verdade, no suplemento XI, intitulado Vom Psychotogismus, o qual foi publicado em 1911 como uma parte dos apêndices da edição denominada Klassifikation der psychischen Phänomene. Achamos por bem introduzi-la aqui como apresentação, pois o tema nela tratado cumpre perfeitamente essa função. Sua primeira tradução foi publicada recentemente na Revista Peri. Cf. BRENTANO, 2013, p. 169-172. 33
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Franz Brentano
Acerca disso, contudo, eu ouço em retribuição que eu ainda sou psicologista e suprimo a unidade da verdade universal, pois esta consiste apenas no fato de que o juízo verdadeiro corresponde a algo fora do espírito (Geistes), o qual é um e o mesmo para todo aquele que julga. No caso dos juízos negativos e nos casos daqueles que descrevem algo como possível, impossível, passado ou futuro, esse algo não poderia entretanto ser uma coisa. Como eu sustendo como algo existente, ao lado das coisas, também as não coisas indeterminadas, não seres (Nichtsein), possibilidades, impossibilidades, seres-passados, seres-futuros e similares, eu deixei escapar aqui a unidade da verdade universal. Eu respondo que, mesmo se a eliminação da universalidade do conhecimento fosse consequência de tal negação, ainda não se poderia me rebaixar como psicologista, pois eu mesmo não aponto essa consequência. Poder-se-ia dizer apenas, algo como, eu apenas estabeleci frases nas quais as conclusões poderiam levar ao psicologismo. Nem isto também está correto, pois por que não poderia ser autoevidente, também sem a pressuposição de tais não-coisas, que dois juízos, dos quais um reconhece de certo modo o que o outro rejeita do mesmo modo, também não são ambos corretos quando duas pessoas diferentes os fazem ambos, que quando uma e a mesma pessoa os faz? Certamente, ninguém afirmará que mesmo que tais não-coisas existam, a percepção (Wahrnehmung) dessas não-coisas, e sua comparação com os próprios juízos, deva preceder o conhecimento da verdade ou falsidade de nossos juízos na concordância ou na não concordância de um com o outro. De modo contrário, será sempre o caso que percepções imediatamente evidentes de coisas, e negações imediatamente evidentes de relações que são dadas na nossa representação, ofereçam o suporte último para nossa avaliação crítica do pensamento de outrem, bem como do nosso próprio pensamento. 48
Apresentação
Isto tudo para me defender da fala depreciativa, e de minha parte difícil de acreditar, que se teriam ouvido da boca de alguns dos meus próprios alunos. De modo contrário, então, e para excluir algo pior, eu deveria interpretar isso como sinal de extrema fraqueza de memória. [Se ainda hoje muitos que falham ao reconhecerem a natureza da evidência, confundem a validade lógica com a necessidade genética do pensamento, seja para o indivíduo, seja para a totalidade do gênero humano. Eu pelo menos, tanto em minhas preleções como em meus escritos, sempre distingui com clareza entre o sentido da necessidade natural e o sentido da corretude de um ato. Sim. Ninguém, nem antes e nem depois de mim (e Husserl não está excluído), foi capaz de se expressar clara e incisivamente sobre isso, tal como eu fui.]. Mas, não! Existe ainda uma terceira hipótese. Sabemos como são os humanos e como seus conceitos mudam imperceptivelmente, de onde se segue que, em decorrência das equivocidades, eles não sabem exatamente o que dizem. Assim, algo humano de tal espécie pode ter ocorrido com os que me chamam de psicologista. Nesse caso, não apenas o subjetivista, mas também deveria ser acusado de psicologismo aquele que crê que a psicologia tem qualquer palavra a acrescentar na lógica e na teoria do conhecimento. Mas, quanto mais eu condeno o subjetivismo, menos eu serei levado pela sedução de ignorar essa verdade. Pelo contrário, ela está tão firmemente determinada para mim, que me deveria parecer paradoxal e até absurdo se alguém negasse que conhecimento é juízo e o juízo pertence ao domínio da psicologia. Considera-se também que, se outros seres além de nós compartilham conosco o conhecimento, aquilo que eles compartilham deve estar no domínio psíquico humano e apenas aqui é diretamente acessível para a investigação científica. Franz Brentano. 49
O CONCEITO DE VERDADE Trabalho apresentado à Sociedade filosófica de Viena em 27 de março de 1889 1. Quando Aristóteles fundou a ciência, em sua maior amplitude, ele precisou de uma terminologia científica que não existia. Aristóteles precisou estabelecê-la para si e, com isso, comprovou sua grande prudência e seu fino tato científico. Ele introduziu uma série de nomes completamente novos. Outros nomes, os quais ele tomou emprestado da linguagem ordinária, ele definiu-os precisamente quando eram imprecisos e, quando eram ambíguos, ele distinguiuos seus múltiplos sentidos, esclarecendo-os todos pela separação entre os componentes conceituais dos conteúdos. 2. Equívocos inimagináveis foram, então, explicitados a partir do nome causa, do nome parte e também do próprio nome ser. Certas formas de equívocos foram encontradas quase universamente em cada palavra ou, ao menos, em classes inteiras de palavras. Por exemplo, a ambiguidade em virtude da qual nós designamos com um mesmo nome seja uma atividade, seja uma capacidade, seja uma disposição para ação. Frequentemente, nós dizemos de um homem que ele vê, em oposição ao cego, ainda quando ele tem os olhos fechados: ele tem a capacidade de ver. Frequentemente, nós dizemos de alguém que ele não ouve, e com isso queremos dizer que ele é surdo. Dizemos, o homem é um ser pensante, computando ainda sem contradição alguém que está desmaiado. Dizemos que saber é conhecer a partir das causas, mas atribuímos sabedoria ao erudito, ainda quando dorme, em razão da permanência das disposições adquiridas. Dizemos, de modo contrário, sei o que ele quer, embora admitamos que nem sequer estamos seguros de que ele pensa tal coisa no momento. Dizemos de alguém, do mesmo modo, 51
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que ele toca flauta, algumas vezes querendo dizer que ele efetivamente a toca, outras vezes atribuindo-lhe apenas a arte de tocá-la etc. 3. Aristóteles não eliminou estes equívocos que são recorrentes e, como dizem, pertencem ao espírito da língua. De modo contrário, ele os imitou e os multiplicou. Ninguém que considere corretamente o assunto fará contra ele, por isso, uma acusação. Assim, deveriam calar, então, muitas das acusações que se mantêm contra Aristóteles por causa das ambiguidades de seus termos. Não se pode negar, certamente, que os mal-entendidos são originados pela concisão de seu estilo e pela forma de escrever que propriamente pressupõe um novo Aristóteles como leitor. 4. Aristóteles conhecia os perigos lógicos da equivocidade. Ele estudou profundamente esse fenômeno linguístico e distinguiu três classes: equívocos contingentes; equívocos causados por uma analogia; equívocos causados pelas relações de outros termos para com um, o qual possui o nome no sentido mais próprio. 5. Os equívocos contingentes estão quase sempre limitados a um único idioma. Os trocadilhos quase sempre são perdidos nas traduções. Os outros, os quais se assentam em um tipo de conexão de ideias, as quais são comuns a diversos idiomas, nós os encontramos frequentemente de modo uniforme em todos. 6. Assim, isto ocorre também, então, com os equívocos que Aristóteles expôs no tradicional e importante termo . O que ele disse sobre este vale exatamente como se ele tivesse diante de si o latim verum ou o alemão wahr. Deste modo, as distinções dos significados de verdadeiro, como em geral as determinações do conceito de verdade dadas por Aristóteles, puderam se tornar válidas, como de fato ocorreu, muito além das fronteiras do helenismo e se mantiveram durante os milênios nos quais a tocha da filosofia passou nas mãos dos povos estrangeiros. 52
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7. Ouçamos, portanto, como o poderoso espírito científico que mais influenciou a engenhosidade humana explica o termo verdade. Os termos verdadeiro‟ e falso, diz ele, são ambíguos em função da diversidade de relações para com um, ao qual o nome pertence em sentido próprio. Chamamos muitas representações de verdadeiras e falsas, por exemplo, falsas alucinações. Chamamos conceitos de verdadeiros e falsos. Chamamos juízos de verdadeiros e falsos. Chamamos suposições, esperanças e preocupações de verdadeiras e falsas. Chamamos um coração, um espírito de verdadeiro e falso (un esprit faux). Chamamos as coisas externas de verdadeiras e falsas. Chamamos provérbios de verdadeiros e falsos, um comportamento de verdadeiro e falso, expressões, letras e muitos outros sinais de verdadeiros e falsos. Nós chamamos um amigo, chamamos ouro de verdadeiro e falso. Nós dizemos verdadeira felicidade e falsa felicidade. Esta última em sentido bem diverso. Às vezes, porque ela é apenas uma felicidade aparente, mas às vezes porque ela é uma felicidade que nos abandona deslealmente. Neste sentido, nós dizemos ocasionalmente que uma mulher é falsa, quando uma jovem flerta conosco para nos enganar. Em outro sentido, uma falsa mulher seria um homem que se faz passar por uma mulher, como às vezes um ladrão é preso em trajes femininos. Em outro sentido, quando alguém que não tem esta pretensão e mesmo assim é tomado como uma mulher, tal como, por exemplo, ocorreu comigo em um crepúsculo à porta da fortaleza de Würzburger. Eu trajava uma batina e o susto pela decepção foi enorme e muito cômico. 8. A ambiguidade da expressão verdadeiro salta aos olhos por meio desse uso diverso. Do mesmo modo, nota-se facilmente a relação para com um que será determinante em todos os casos. Ela é tal como a expressão saudável que nós aplicamos seja a um corpo, seja à cor da face, seja a um prato, a um medicamento, a um lugar ou a um passeio. O corpo sadio é 53
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saudável no sentido próprio. Tudo o mais é considerado saudável em relação a sua saúde. A cor, porque a simboliza. As outras coisas, porque a oferecem, a fomentam ou a produzem. 9. E qual é este um? Onde se encontra a verdade no sentido próprio? Ela encontra-se no juízo, diz Aristóteles. Todas as outras coisas chamadas verdadeiras e falsas possuem este nome em relação à verdade e à falsidade no juízo. Algumas, porque enunciam um juízo verdadeiro ou falso, como uma falsa alegação, uma falsa declaração. Outras, porque originam um juízo verdadeiro ou falso. Por exemplo, uma alucinação, uma palavra mal pronunciada ou mal escrita, um metal tomado como ouro por causa da similitude de sua cor. Algumas, porque pretendem produzir um juízo verdadeiro ou falso. Por exemplo, uma verdadeira animosidade, um falso comportamento. Outras, porque alguém que as toma por reais, as julga verdadeiras ou falsas. Por exemplo, um verdadeiro Deus, uma verdadeira pedra, ao invés de pintados. Nós chamamos alguns conceitos verdadeiros ou falsos em relação àquilo que é congruente ao seu conteúdo, pois aquele que o concebe julgaria verdadeira ou falsamente. Por exemplo, se dissermos que uma figura de quatro ângulos não é o verdadeiro conceito de quadrado, e assim por diante. 10. Portanto, a verdade e a falsidade, tomadas no sentido próprio, encontram-se no juízo. Todo juízo é, assim, ou verdadeiro ou falso. 11. Quando, segundo ele, um juízo é verdadeiro? Quando é falso? Aristóteles responde que o juízo é verdadeiro quando aquele que julga o concebe em conformidade com as coisas, no caso contrário é falso. “Quando alguém toma por separado o que é separado, unido o que é unido, seu juízo é verdadeiro. E ele erra quando concebe as coisas de modo contrário ao que são”.
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(Metafísica, IX, 10, 1051 b3). 12. Com isso, tal verdade foi esclarecida pela concordância de um juízo com as coisas reais. 13. Esta definição estava preparada há muito tempo. a) Os antigos jônicos deixaram-nos conhecer as matérias e as forças exteriores a nós por meio de matérias semelhantes em nós.
Empedokles. b) As teses paradoxais dos sofistas também lidam com as dificuldades que estão conectadas a essas opiniões preliminares. Górgias nega, consequentemente, que algo real seja conhecido e, ainda que fosse o caso, que o conhecimento poderia ser comunicado entre um e outro. A não ser consigo mesmo, nada corresponde completamente a qualquer coisa. O que está fora de mim, não está em mim. O que está em mim e permanece, não passa para outro. Não há, assim, verdade e não há meio possível de comunicar a verdade. Se alguma coisa por nós pensada precisasse ser designada como verdadeira, dizia Górgias, então tudo o que nós pensamos seria designado como verdadeiro, pois cada pensamento é um consigo mesmo e diferente de todos os outros. O fato de que, no entanto, cada pensamento fosse designado como 55
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verdadeiro, também o seria quando eu pensasse em uma batalha de carroças sobre o mar, o que seria uma contradição. c) Havia, no entanto, outro sofista que defendeu esta tese oposta. Nada é falso, disse Protágoras, mas é verdadeiro tudo em que é sempre possível alguém acreditar. Como ele pensa o ser, assim é o ser. Como ele não o pensa, assim ele não o é. Está muito claro para nós, eu creio, o modo como Protágoras chegou a essa idéia. Se cada crença é verdadeira devido à perfeita concordância com algo existente, então toda crença é verdadeira, pois é idêntica a si mesma. Também Aristóteles remete, para esclarecer, à conexão com as doutrinas da escola jônica, com as quais também está relacionada à tese oposta de Górgias. Como um autêntico sofista, como o mais autêntico, isto é, como o sofista de Platão e Aristóteles, não como ele se encontra caracterizado por Grote que viveu um pouco mais tarde, Protágoras fez do paradoxo (como está explícito) no qual ele havia sucumbido, o ponto de partida de um animado jogo. (os pugilistas estendidos no chão) é o nome do escrito no qual ele defendeu a tese. Parece que ali se distribuem golpes e se defendem de objeções óbvias. À objeção de que a mesma coisa, ao mesmo tempo, é e não é, parece ter respondido que não é absurdo. Ela simplesmente é apenas para um e não é para o outro. Que uma justificação cientificamente fundamentada não foi apresentada, ou mesmo ensaiada, observa-se pelo fato de que nem Platão e nem Aristóteles, que tiveram esse escrito diante dos olhos, puderam compreender diretamente como Protágoras chegou a essa tese, senão que estavam totalmente orientados por conjecturas, as quais foram obtidas com mais sucesso por Aristóteles, que estava plenamente familiarizado com a história anterior e, em todos os casos, se mostrava ricamente dotado de sentido histórico. 56
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Eu explicitei os trilhos do caminho que levam à tese protagórica. „„diss e também Parmênides. O que há de mais próximo do paradoxo de que todo pensamento é verdadeiro?Cada pensamento está de acordo consigo, pois sob essa condição concorda plenamente com seu objeto. 14. Não permaneçamos mais na pré-história da definição aristotélica de verdade. Em vez disso, veremos como ela repercutiu na posteridade. Nós veremos, então, que ela prevaleceu, desde aquela época até os dias atuais, com exceções infinitamente pequenas. 15. A idade média também disse que o verdadeiro e o falso no sentido próprio se encontram no juízo e definiu a verdade como adaequatio rei et intellectus. 16. Na lógica cartesiana, que Arnauld nos apresenta na lógica de Port Royal (parte 2, capítulo 3), é dito que Les propositions se divisent encore selon la matière en vraies et en fausses. Et il est clair, qu'il n'y en peut point avoir, qui ne soient ni vraies ni fausses; puisque toute proposition marquant le jugement que nous faisons des choses est vraie, quand ce jugement est conforme à la verité (Wirklichkeit), et fausse, lors qu'il n'y est pas conforme. A grande revolução, portanto, que Descartes realizou, deixou inabalável a definição Aristotélica da verdade. 17. Se nós acreditamos em Windelband, outra coisa se consumou naquela outra grande revolução ocorrida filosoficamente na Alemanha, enquanto a França rompia politicamente com a tradição do passado. Kant teria sido o primeiro a reformar o conceito aristotélico ou, como diz Windelband, socrático de verdade. Nisso estaria a verdadeira proeza de Kant, e não naquilo em que outros querem encontrar. Em seu Präludien (p. 140 e 149), diz ele, “compreende-se mal todo o propósito de Kant e interpreta-se sua doutrina tão distorcidamente quanto 57
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possível, quando se pensa que ele havia demonstrado que a ciência poderia obter apenas a figuração do mundo dado como fenômeno, de coisas em si, que, no entanto, não pediam ser conhecidas. A verdade é..., que uma figuração da realidade (Wirklichkeit) não faz sentido para ele”. Esta questão faz sentido apenas para os socráticos que mantêm firmemente o conceito de verdade como concordância entre a representação e a coisa (dever-se-ia chamar juízo e coisa) e, por isso, ainda também para os filósofos franceses do século XVIII que, com uma espécie de indício cético, negam ao ser humano a capacidade de reconhecer as coisas tais como elas são em si. Kant não conhece tal barreira para o nosso conhecimento. Ele mudou justamente o conceito de verdade. Verdade é, segundo ele, aquilo que está em concordância com a norma do espírito e não aquilo que está em concordância com o objeto. Dever-seia entender como objeto, portanto, nada mais que essa regra. A verdade também se encontra, segundo Kant, não apenas no juízo, no pensamento, ela encontra-se igualmente em todos os outros campos da atividade espiritual, no querer, no sentir, se eles forem normais. 18. Nós vemos, assim, realizada no magnífico sentido, a reforma do conceito de verdade que tanto se fez esperar. O que mais poderia divergir os filósofos, se eles buscam por uma verdade em sentido completamente diverso, deste modo apenas nominal em si mesma, e de fato buscam por fins completamente diversos. Windelband divide, assim, todos os filósofos entre os retrógrados socráticos e os progressistas kantianos. A vitória pertence a estes, os outros já não mais existem. “Todos nós”, diz ele no prefácio, “nós que filosofamos no século XIX, somos alunos de Kant”. 19. Bem, meus senhores, se vocês, por exemplo, também me toleram e me computam entre os filósofos, então vocês devem reconhecer o exagero dessa declaração. Eu considero toda a filosofia kantiana uma aberração que levou a erros ainda maiores e, finalmente, ao completo caos filosófico. 58
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Eu acredito, porém, que aprendi muito a partir de Kant, mas não aquilo que ele queria me ensinar. Eu aprendi, sobretudo, como é atrativa para a filosofia de massa, e como é enganosa a glória que a história da filosofia vincula a um nome. O homem que marca uma época deve ter uma poderosa personalidade, mas se sua influência foi uma benção ou um desastre, e se fizemos bem ao tomá-lo como modelo e como mestre, isso continua sendo muito questionável. 20. Outra coisa, no entanto, torna suspeita a fidedignidade da história de Windelband. Como? Kant não ensinou, entretanto, que, dada a coisa em si, ela é teoricamente desconhecida para nós? Ele não acreditava com base em motivos práticos que um Deus pertence a essas coisas em si e seria apenas teoricamente não provado? Ele não acreditava ter estabelecido um limite para o nosso conhecimento, dizendo que nós podíamos conhecer apenas os fenômenos, porque nós teríamos apenas a intuição sensível e não temos qualquer intuição intelectual, como talvez realmente a tenham outros como nós? Eu preciso dizer aqui em voz alta que o contrário do que diz Windelband é afirmado enfaticamente pelos que conhecem Kant e pelo próprio Kant? 21. Porque nós deveríamos não duvidar de quem (eu não sei a partir de qual sede de inovação e impulsionado por quais reivindicações picantes) relata tão engenhosamente os principais ensinamentos de Kant, como se ele não nos narrasse também um conto de fadas sobre o conceito kantiano de verdade? Ele não nos apresenta sua própria concepção doutrinária sob o nome Kant, de modo que, talvez, nós não devêssemos computar o próprio Kant entre esses chamados kantianos ou, talvez, toda filosofia não deveria ser dividida em socrática e kantiana, mas em socrática e windelbandiana? 22. Temos à mão a Crítica da Razão Pura e o próprio Windelband disse que se ateve exclusivamente a ela, assim o livro deve decidir.
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Ouçam e surpreendam-se com a capacidade de um historiador alemão da filosofia ao apresentar um filósofo alemão ao público filosófico, especificamente esse que ele declara ser o maior entre eles e, em todo caso, o mais célebre atualmente. a) Onde se encontra, segundo Kant, a verdade em sentido próprio? Windelband diz: em todas as áreas da atividade espiritual, não apenas no pensamento, mas também na vontade e similares. O que diz o próprio Kant? Na Lógica transcendental, parte 2, que ele denomina “Dialética Transcendental”, nós lemos de imediato o seguinte na primeira página (Hartenstein, Ed 1838 v. II, p 276)34: “a verdade ou a aparência não estão no objeto, à medida que é intuído, mas no juízo sobre ele, à medida que é pensado. Pode-se pois dizer que os sentidos não erram, não porque o seu juízo seja sempre certo, mas porque não ajuízam de modo algum. Eis porque só no juízo, ou seja, na relação do objeto com o nosso entendimento, se encontram tanto a verdade como o erro e, portanto, também a aparência, enquanto induz a este último. Num conhecimento, que concorde totalmente com as leis do entendimento, não há erro” Em relação à primeira pergunta, (onde, segundo Kant, a verdade se encontra?), não é mais preciso qualquer palavra. b) O que é, então, a verdade que segundo Kant se encontra apenas no juízo?
A referida citação da Crítica da Razão Pura encontra-se em B350. Optamos por apresentá-la na língua portuguesa a partir de sua tradução elaborada para a 5ª. Edição por Manoela Pinto dos Santos e Alexandre Fradique Mourão. KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura. Fundação Calouste Gulbenkian: Lisboa, 2001. P 321. 34
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Ele não entende, acerca dela, nada mais que a concordância do juízo com o objeto, como haviam feito os antigos? Nós ouvimos o que Windelband disse acima, ouçamos também o que Kant tem a nos dizer. “O que é a verdade?”, pergunta Kant na Introdução à Lógica Transcendental, cap. III, p. 9335, e responde ele que “a definição nominal do que seja a verdade, que consiste na concordância do conhecimento com o seu objeto, admitimo-la e pressupomo-la aqui; pretende-se, porém, saber qual seja o critério geral e seguro da verdade de todo o conhecimento”. O que, então, ensina Kant aqui? Que seria falso algo como o que foi dito antes, que a verdade seria a concordância de um juízo com seu objeto? Pelo contrário, ele a assume como antecipadamente conhecida e, sem dúvida, no sentido familiar. Ouçamos também o que se segue imediatamente (p. 94)36: “se a verdade consiste na concordância de um conhecimento com o seu objeto, esse objeto tem, por isso, de distinguir-se de outros; pois um conhecimento é falso se não concorda com o objeto a que é referido, embora contenha algo que poderia valer para outros objetos”. Não nos parece que Kant protesta contra aquilo que Windelband lhe imputa, como se ele tivesse alterado a antiga definição, ao menos em seu sentido, ao conceber outra coisa como objeto, ou seja, uma regra do espírito? Supondo a hipótese “embora contenha algo que poderia valer para outros objetos”, o que ele pretendia dizer? Outras regras? Regras existentes para outros espíritos? Quem seria tão benevolente para aceitar cair em tal truque de interpretação? Kant não se cansa. Ele continua a falar da regra e a difere dos objetos (p. 94) 37: “Ora, um critério geral da KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001. P. 119. 36 Idem, ibidem. 37 Idem, ibidem. 35
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verdade seria aquele que fosse válido para todos os conhecimentos, sem distinção dos seus objetos. É, porém, claro, que, abstraindo-se nesse critério de todo o conteúdo do conhecimento (da relação ao objeto) e referindo-se a verdade precisamente a esse conteúdo, é completamente impossível e absurdo perguntar por uma característica da verdade desse conteúdo dos conhecimentos e, portanto, é impossível apresentar um índice suficiente e ao mesmo tempo universal da verdade. Como acima já designamos por matéria o conteúdo de um conhecimento (= juízo), teremos de dizer: não se pode exigir um critério geral da verdade do conhecimento, quanto à matéria, porque tal seria, em si mesmo, contraditório” assim por diante até a p. 9638 “por mais vazio e pobre que possa parecer, que” etc. Eu penso que ninguém entre nós ainda exigiria outras afirmações decisivas após provas tão contundentes. Nosso tempo também não seria suficiente para apresentá-las todas. Permitam-me apresentar apenas algumas pequenas citações muito indicativas de que Kant não pensa que o objeto influencia e conduza, como uma regra, a função do pensamento. “Todas as representações, como representações, têm o seu objeto e podem, por seu turno, ser objeto de outras representações. Os fenômenos são os únicos objetos que nos podem ser dados imediatamente, e aquilo que neles se refere imediatamente ao objeto chama-se intuição. Ora esses fenômenos não são coisas em si, mas somente representações que, por sua vez, têm o seu objeto, o qual, por consequência, já não pode ser intuído por nós e, por isso, é designado por objeto não empírico, isto é, transcendental = X.”39
Idem, ibidem, p. 121. Idem, ibidem. p. 175-176. [Brentano cita Kehrbach (1838, P. 122.) e HA (Hartenstein), p. 646]. 38 39
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“O conceito puro deste objeto transcendental (o qual na realidade em todos os nossos conceitos é sempre = X) é o que em todos os nossos conceitos empíricos em geral pode proporcionar uma relação a um objeto, isto é, uma realidade objetiva (objektive Realität).”40 “O entendimento, falando em geral, é a faculdade dos conhecimentos. Estes consistem na relação determinada de representações dadas a um objeto. O objeto, porém, é aquilo em cujo conceito está reunido o diverso de uma intuição dada. Mas toda a reunião das representações exige a unidade da consciência na respectiva síntese. Por consequência, a unidade de consciência é o que por si só constitui a relação das representações a um objeto, a sua validade objetiva portanto, aquilo que as converte em conhecimentos, e sobre ela assenta, consequentemente, a própria possibilidade do 41 entendimento”. Nós também recebemos, desse modo, as informações sobre a segunda pergunta diretamente da fonte mais confiável. 23. Sem dúvida! Kant também mantém a definição aristotélica de verdade como concordância entre o juízo e a realidade (Wirklichkeit). Nós podemos dizer, assim, acerca de todos os pensadores que apareceram depois de Aristóteles e marcaram sua época, que eles não encontraram motivos para fazer uma mudança aqui, por mais revolucionários que tenha sido em outras questões. 24. De modo contrário, no entanto, vocês bem veem a partir do exemplo de Windelband que não faltaram tentativas de se liberar. Alguns outros, de modo similar a Windelband, caíram na ideia de substituir o conceito de concordância com o objeto pelo conceito de normativo e, se não de normativo em geral (como fez Windelband), de juízos 40
Idem, ibidem. Idem, ibidem. p. 163. [Brentano cita Kehrbach (1838, P. 662.) e HA (Hartenstein) p. 131-132]. 41
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normativos e prescritivos. Em Sigwartz, por exemplo, encontram-se tais declarações que recuam novamente ao antigo conceito de verdade, ainda que muitas vezes de modo inconsistente. Toda a lógica de Sigwart nada aqui em águas turvas. 25. Essa pretensa tentativa de reforma é facilmente refutável. Se verdade fosse realmente a conformidade dos juízos com a regra, então estaria errado todo juízo insuficientemente fundado ou totalmente cego. Esse, no entanto, não é o caso. A intuição (Einsicht) deve ser sempre verdadeira, mas pode ser tanto verdadeira, ou falsa, uma suposição leviana, um mero preconceito, uma opinião pouco autorizada que eu assumo ou suponho porque ela é consensual. Já Aristóteles salientou que se chega frequentemente a uma conclusão verdadeira a partir de premissas falsas. Minha convicção estaria, então, em desacordo com a norma e, a partir desse princípio, desaprovada. No entanto, isso acerca do qual estaria convencido seria verdade. 26. Nós temos, assim, entre as definições tradicionais, apenas aquela antiga que, dada já pelo fundador da lógica, permanece como tal e tem nosso assentimento. 27. Não se pode negar, no entanto, que ela está repleta de dificuldades. 28. Impõe-se, acima de tudo, uma reflexão que, no essencial, é também a reflexão do velho Górgias. Pensada no sentido mais amplo, concordância é identidade. Parece, de fato, que aqui ela teria este significado. Pois, em certos aspectos também existe uma concordância entre Pedro e Paulo. Se meu juízo, por meio do qual reconheço Pedro, não concordasse mais com Pedro que com Paulo, então ele não seria verdade, ao menos não seria a verdade de Pedro. Se ele está, no entanto, plenamente de acordo consigo, então ele é idêntico a Pedro. Ele é, assim, o próprio Pedro que, no entanto, está no exterior e não no meu espírito. Ouçam, por 64
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exemplo, como argumenta o professor berlinense Dilthey, a partir desse ponto de vista, contra a possibilidade de conhecimento do mundo exterior, tal como ele é em si mesmo. Em sua Introdução às Ciências do Espírito I, p. 518, ele fundamentou sua tese com as seguintes palavras: “assim, uma representação nunca pode ser idêntica a uma coisa, à medida que esta é concebida como uma realidade (Realität) independente (Dilthey concebe o juízo como uma associação de representações). Ela não é uma coisa colocada dentro da alma e não pode ser acomodada a um objeto pressuposto. Enfraquece-se o conceito de igualdade por meio do conceito de semelhança, pois esse conceito pode não ser aplicado aqui em seu sentido exato: a representação da concordância escapa em sua indefinição.” Dilthey também não acredita que nós não poderíamos conhecer as intenções e convicções alheias, tal como são em si mesmas. Um crítico, no entanto, observou acertadamente que Dilthey consequentemente deveria afirmar a impossibilidade de se conhecer o erro de alguém. “Para que conhecêssemos, assim, o erro de outrem, precisaríamos ter seu erro introduzido em nossa alma. Isto, porém, é impossível. Se isso fosse possível, então nós não reconheceríamos corretamente que ele erra, pois nós teríamos nos tornado partícipes de seu erro”. Em função disso, seria bem melhor considerar equivocada a definição de verdade como concordância do pensamento com o objeto. De fato, se Sigwart em sua Lógica se empenha em fazê-lo, é esse pensamento que o impulsiona, como também parece ter influenciado Windelband. 29. Este argumento está, no entanto, completamente injustificado. Ele baseia-se no desconhecimento de uma diferença, a qual Descartes designou como diferença entre a realidade formal e realidade objetiva (formaler und objektivur Realität), a qual, no entanto, há muito tempo Aristóteles já elucidou e, com isso, superou as absurdidades e os sofismas de Parmênides, Empédocles, Górgias, Protágoras entre outros. 65
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Quando eu creio algo, esta crença está “formalmente” em mim. Quando mais tarde eu me recordo dessa crença, então ela está, segundo a expressão de Descartes, “objetivamente” em mim. Trata-se do mesmo ato individual de crença, mas no primeiro caso eu o exerço e no outro caso ele é apenas o objeto imanente da atividade de rememoração, a qual eu exerço. Algo análogo ocorre com todas as outras funções psíquicas como vontade, desejo, aversão etc. Com o ato psíquico, o qual é dado formalmente, algo é dado como objeto imanente do ato psíquico, portanto objetivamente para falar como Descartes, ou intencionalmente, como nós consideramos melhor expressar a fim de evitar malentendidos. Evidentemente, não há qualquer contradição em que algo individual seja intencional em mim e não seja formal, ou o contrário, o que poderíamos explicitar por meio do exemplo da memória e outros mil. O desconhecimento deste fato manifesta-se como um retorno à pré-história da teoria do conhecimento. 30. Se, no entanto, essa dúvida foi realmente eliminada já há muito tempo, permanecem outras, as quais não parecem tão fáceis de eliminar. Uma parte delas está ligada à peculiaríssima formulação de Aristóteles, a qual está condicionada pelas imperfeições em sua concepção geral dos juízos. Essas dúvidas desaparecem tão logo esses erros sejam corrigidos. Outro caso, no entanto, não se deixa eliminar desse modo. 31. Em primeiro lugar, algumas palavras sobre as primeiras. Aristóteles diz, em seu livro „De Interpretação‟, que juízo consiste em uma interligação de pensamentos , o qual seria uma composição (). E essa consiste no fato de que, quando se julga, toma-se uma coisa real como unida ou como separada de alguma outra coisa que é igualmente real. Tomando-se por coisas unidas, aquelas efetivamente unidas, e por coisas 66
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separadas, aquelas que são efetivamente separadas, então se julga verdadeiro. No caso contrário, falso, quando se procede contrariamente para com as coisas. 32. Aqui estão algumas coisas que devem causar incômodo. Isto se aplica, sobretudo, à afirmação de que uma separação, uma existência separada das coisas, as quais correspondem ao sujeito e predicado nos juízos, seria necessária para a verdade dos juízos negativos, bem como para a falsidade dos juízos afirmativos. Se eu digo de um cão que ele é um gato, então é perfeitamente certo que aqui o sujeito (um cão) e o predicado (um gato) existem separados, e que eu julgo falsamente quando considero esse cão como um gato. Meu juízo não é falso, no entanto, porque esse cão e um gato existem separados. Se não existissem gatos, nem unidos com o cão e nem separados do cão, ainda assim meu juízo seria seguramente tão falso como agora. 33. Se ainda fosse necessário, isso também poderia ser esclarecido pela comparação com outros casos. Se eu julgo, por exemplo, que certo tom dó é a vigésima oitava de lá, então eu julgo certamente tão falso como se eu o concebesse como a primeira oitava de lá, embora apenas esse se encontre separado e não aquele tom dó completamente imaginário. Por isso, em vez de dizer que o juízo negativo é verdadeiro quando o predicado se encontra diferente do sujeito na realidade (Wirklichkeit), nós devemos dizer que o é quando não se encontra unido a ele. A definição de verdade seria então, num primeiro momento, assim: um juízo é verdadeiro quando atribui a uma coisa algo que na realidade (als Realität) é dado unido a ela, ou nega em uma coisa o que na realidade (in Wirklichkeit) não é dado unido a ela. 34. Essa mudança, no entanto, apesar de conter uma correção substancial, ainda não foi suficiente. Nosso juízo afirmativo, então, é sempre a união de uma determinação real com outra determinação real? É fácil demonstrar que este não 67
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é o caso. Quando eu creio que um determinado objeto real é um cão ou um corpo, ou também que ele é redondo ou vermelho, então se impõe a mim certamente a ligação de uma determinação real com outra. O que ocorre quando eu acredito, não que um cão ou um corpo é uma determinada coisa, mas simplesmente na existência de uma coisa, enquanto eu julgo que uma determinada coisa existe? Alguns acham realmente que aqui ocorre uma ligação, enquanto se junta a existência à coisa. Pergunta-se o que, então, eles entendem por essa existência (Existenz), e então eles respondem que um existente (Existierendes) quer dizer uma coisa (Ding) no sentido mais indeterminado e geral. Diz-se, assim, que alguma coisa é, tal como se diz que alguma coisa é uma coisa. Uma estranha interpretação, a qual Aristóteles já reconheceu que não poderia estar correta. Assim, ele esclareceu no livro nono de sua Metafísica que em tal caso não se encontra qualquer crença em um estar unido e, de modo geral, nenhuma união de muitas ideias, pois nesse caso o pensamento é um ato muito simples. 35. Precisamente por esse motivo, segundo Aristóteles, também Deus como ser perfeitamente simples conhece a si mesmo em sua existência por meio de um pensamento perfeitamente simples, sem qualquer ligação de sujeito e predicado. 36. Deixemos a Metafísica e permaneçamos com o resultado geral da sua doutrina do juízo. Evidentemente, nós estamos lidando aqui com uma modificação substancial e precisamente tal que, como eu acredito ter provado minuciosamente em minha Psicologia do ponto de vista empírico, envolve uma correção significativa da interpretação acerca dos juízos. 37. No entanto, essas considerações cerca da ligação e separação, acerca das quais nós ouvimos anteriormente, permanecem sempre perturbadoras em Aristóteles e em lugar algum talvez isso se coloque mais do que aqui. Se ele admitiu 68
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precisamente que o assentimento afirmativo não é sempre a crença em uma ligação, no obstante ele se manteve inflexível no fato de que a negação deve ser sempre a crença em uma separação, de modo que segundo ele a afirmação de um predicado se opõe à negação de um predicado, mas a afirmação simples não se opõe à negação simples. Em conformidade com isso, nos também lemos nos livros sobre a alma, que a verdade também se encontra no pensamento simples, mas o erro sempre se encontra no pensamento composto. Ele também declara explicitamente na Metafísica que aquilo que se opõe a um juízo simples verdadeiro não é o erro, mas a simples ignorância (). 38. Eu não vou me prolongar em esclarecimentos sobre como esta opinião errônea está relacionada com a anterior. Por notório que seja o erro, e considerando a obscuridade acerca da essência do juízo existencial, a qual existiu e existe em quase todos os filósofos até dias recentes, nós temos toda razão de julgá-lo com benevolência. 39. Nós também o eliminamos da definição aristotélica da verdade e do erro, assim nós chegamos à seguinte versão: A verdade de um juízo consiste no fato de que ele atribui, a uma coisa (einem Dinge), algo real (etwas Reales) que é dado com ela como uno, ou nega-lhe uma parte real (einen realen Bestandteil) que não existe com ela como uno, ou ainda, se ele é um juízo do tipo mais simples, no fato de que ele afirma que algo real é, quando esse o é, e não é quando esse mesmo não o é. Nisso consistiria a correspondência do juízo verdadeiro com as coisas efetivas (wirklichen Dingen). 40. No entanto, novas dificuldades emergem. Há casos em que essa definição também se mostra incorreta. Eu vou limitar-me a nomear as duas principais classes. 41. Antes de tudo, mostram-se incorretos todos os juízos negativos que negam total e absolutamente a coisa em si mesma ou (como se diz de modo não muito apropriado) lhe 69
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negam a existência (Existenz). Eu digo não muito apropriado, pois ninguém pensa que em tal caso a coisa (Ding) talvez subsista (bestehen), embora sem uma existência (Existenz). 42. A dúvida explicita-se de maneira particularmente clara no caso da simples negação. Se a verdade „não existe dragão‟ consistisse em uma concordância de meu juízo com uma coisa (Ding), qual deveria ser então esta coisa (Ding)? Não o dragão, o qual nem se quer existe (nicht vorhanden sein). Nem tampouco, no entanto, qualquer real (irgendwelches Reale), o qual (como concordante) pudesse ser considerado. 43. Algo completamente similar ocorre, no entanto, no caso onde eu não nego uma coisa (Ding) de modo absoluto, mas nego apenas algo (etwas) como determinação real (reale) de outro. Quando eu digo “algum homem não é negro”, é necessário então para a verdade da sentença, como nós já dissemos, não um negro separado do homem, mas sim a falta de negro no homem, a qual existe na realidade (der in Wirklichkeit ist). Esta falta, este não-negro, é como tal coisa alguma (kein Ding), assim é novamente coisa alguma (kein Ding) dada na realidade (in Wirklichkeit gegeben) que concorda com este meu juízo. Aponta-se assim, como dissemos, garantido primeiramente por todos os juízos negativos (e inequivocamente pelas negações simples), que não existia aquela relação de concordância entre juízo e realidade (Realität), a qual pretensamente pertenceria a cada juízo verdadeiro. 44. O outro caso, onde parece se mostrar a mesma coisa, nós encontramos imediatamente quando examinamos de modo claro toda a extensão do âmbito no qual se exerce a função afirmativa. Nós descobrimos, então, que embora o juízo afirmativo se refira frequentemente às coisas (Dinge), também não deixa de tratar de objetos (Gegenstände) – eu clarificarei 70
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agora a partir de alguns exemplos – os quais não são designados de modo algum com o nome “coisa” (Dinge). Onde, então, um juízo afirmativo se refere às coisas (Dinge), seja ele o que simplesmente reconhece uma coisa (Ding), seja ele o que atribui outra determinação real (Reale) a uma realidade (Realität), nós certamente poderíamos mostrar, no caso da verdade, uma concordância das coisas (Dinge) com o juízo. Onde não fosse o caso, no entanto, como deveríamos ser capazes de dar conta de semelhante concordância? 45. De fato, nossos juízos afirmativos verdadeiros, às vezes dizem respeito a uma coisa, a um coletivo de coisas, às vezes a uma parte, um limite de tal coisa etc. – meros objetos (Gegenstände), os quais são eles mesmos coisas alguma (keine Dinge). Ou, no entanto, se alguém se atrevesse ainda a afirmálos, ele pretenderá, talvez ainda do mesmo modo, afirmar um ser que se encontra fora de mim como uma coisa (Ding), o qual eu conheço como passado remoto ou como futuro distante? E ainda, o que acontece quando eu reconheço a falta e quando eu reconheço a ausência de uma coisa? Ele dirá que essa falta, que esta ausência em uma coisa, é também uma coisa? E ainda, quando eu digo que existe uma impossibilidade ou existe certas verdades eternas – por exemplo, as leis matemáticas –, ele acreditará aqui talvez que, algo semelhante às ideias platônicas existiriam no mundo ou fora dele seres eternos concordantes com meu juízo? Certamente não. Parece que o conceito de adaequatio rei et intellectus foi aqui completamente desfeito. 46. Nós vimos que a proposição segundo a qual a verdade é a concordância do juízo com a coisa (Sache) – ou como semelhantemente se expressa –, ou deve ser necessariamente falsa, ou deve ser compreendida de uma maneira inteiramente diferente daquela sucedida aos que, por verdade, imaginam dada certa relação de identidade ou
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similitude, ou mesmo semelhança, entre um pensamento e uma realidade (Realität). 47. Dessas duas hipóteses que nos restaram, a última é a correta e depois do mencionado se torna fácil esclarecer o verdadeiro sentido da fórmula utilizada por tanto tempo de modo obscuro pelos filósofos. Para realizá-lo, nós devemos nos atentar, por um lado, para a extensão do domínio que os juízos podem cobrir e, por outro lado, para a oposição da relação entre os juízos afirmativos e negativos. 48. Quanto à extensão do domínio, ele é totalmente sem limite. O material pode ser escolhido de maneira totalmente arbitrária. Certamente, algo (Irgend etwas) é sempre julgado. Mas o que significa esse algo (Irgend etwas)? É um termo, o qual poderia ser aplicado a Deus, ao mundo, a cada coisa (jedes Ding) e não-coisa (Unding). 49. Este domínio totalmente ilimitado se divide de imediato em dois. A oposição entre juízo afirmativo e juízo negativo traz imediatamente consigo o fato de que, em cada caso, uma única das duas formas de julgar será apropriada, enquanto a outra não será. É o que nós exprimimos ordinariamente quando dizemos que, de dois juízos contrários, um é sempre verdadeiro e outro é falso. 50. O domínio para o qual a forma afirmativa de julgar é apropriada, nós o chamamos então domínio do existente (Existierenden). Um conceito que deve, certamente, ser distinguido de conceitos tais como coisal (Dinglichen), consistente (Wesenhaften) e real (Realen). O domínio para o qual a forma negativa de julgar é apropriada, nós o chamamos domínio do não existente (Nichtexistierenden). 51. De modo semelhante a Aristóteles, quando ele esclarece que um juízo é verdadeiro, quando ele considera unido o que está unido e assim por diante, nos podemos de todo modo dizer daqui em diante: é verdadeiro o juízo quando afirma de algo (etwas) que é, que ele é. E, nega que algo 72
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(etwas) que não é, que ele seja (de modo contrário, falso, uma vez que, em vista disto que é e disto que não, o juízo adotaria uma posição contrária). 52. Em nenhum dos outros tantos modos dito, além dos que foram ditos aqui, se estabelece a concordância do juízo verdadeiro com o objeto (Gegenstande). Concordar não significa aqui ser idêntico ou parecido, mas corresponder, ser apropriado, ser pertinente, se harmonizar com, ou outra expressão equivalente que se possa aplicar aqui. 53. Nós também esclarecemos o conceito ainda por meio de um paralelo óbvio. Também no domínio afetivo encontra-se uma oposição, a saber, aquela oposição entre o amor e o ódio. O que quer que possa entrar em questão, um dos dois modos dessa atitude será apropriado, e o outro inapropriado, em cada caso. Consequentemente, tudo o que é pensável decompõe-se em duas classes, das quais uma contém tudo para o qual é apropriado o amor; e a outra contém tudo para o qual é apropriado o ódio. O que pertence à primeira classe, nós o denominamos bom, e mau o que é compreendido na outra classe. Assim, nós podemos declarar justo ou injusto um amor ou um ódio, uma vez que nós amemos o bem ou odiamos o mal, ou, ao contrário, se nós odiamos o bem ou amamos o mal. Além disso, (nós podemos declarar) que no caso de uma atitude justa, nossa atividade sentimental corresponde ao objeto (Gegenstande), está de acordo com seu valor (Werte) e, de modo contrário, ela o objeta no caso da atitude errônea, está em desarmonia para com seu valor (Werte). 54. Nós chegamos a um análogo exato do que representa a concordância do juízo verdadeiro com seu objeto (Gegenstande) ou com a existência (Existenz) e não existência (Nichtexistenz) de seu objeto (seines Gegenstandes). No caso, entretanto, não se trata absolutamente de um ser (Seienden) no
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sentido do real (Realen), coisal (Dinglichen), consistente (Wesenhaften). 55. Nós perguntarmos, no entanto, pela relação da verdade com a realidade (Realität), assim resulta simplesmente o seguinte, a partir do fundamento das nossas reflexões: 1. Para uma parte dos juízos verdadeiros existe, como dizemos, uma relação direta de sua verdade com algo real (etwas Realem). São aqueles nos quais a representação que serve de base para o juízo tem um conteúdo real (realen Gehalt). É claro que a verdade do juízo afirmativo e, no sentido contrário, a verdade do juízo negativo são condicionadas pela subsistência, aparição ou desaparição da referente realidade (Realität). Sem que o juízo mesmo seja modificado, frequentemente o juízo adquire ou perde sua verdade se, para além dele, a referente realidade (Realität) é produzida ou destruída. 2. Para os demais juízos, nos quais a representação não tem conteúdo real (realen Gehalt), existe uma dupla possibilidade. a. Ou eles não são em sua verdade de modo algum dependentes de uma realidade (Realität), o que é o caso de todos os juízos onde o objeto (Gegenstand) é absolutamente necessário ou absolutamente impossível em si mesmo. Fazem parte deles, por exemplo, o princípio de não-contradição e todos os juízos analíticos. b. Ou eles são, se também não diretamente, ao menos indiretamente dependentes de uma realidade (Realität). Em outras palavras, embora a representação não tenha qualquer conteúdo real (realen Gehalt), o fato de que seu objeto pertence ao existente (Existierenden) ou ao não-existente (Nichtexistierenden) é uma consequência de que uma certa realidade (Realität) ou certas realidades 74
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(Realitäten) e não outras existem, existiram ou existirão. Assim um espaço vazio – e em geral uma falta, uma faculdade, uma coisa meramente pensada e ao que mais for possível se referir – existe, surge e desaparece, em ligação com e na dependência das transformações reais (realen Veränderungen). 56. Eu acredito que, com isso, foi dito essencialmente o que seria necessário para esclarecer a definição de verdade como correspondência do juízo com o objeto (Gegenstande), a qual possibilitou tantos mal-entendidos. 57. Eu não sei se alguns não se sentirão desapontados com os resultados obtidos. No caso, a definição parece agora dizer muito pouco e nada além do que é dito quando se diz que um juízo é verdadeiro se ele julga um objeto (Gegenstand) justamente, ou seja, quando ele é, diz que ele é, ou quando ele não é, diz que ele não é. “Julgar verdade” e “julgar justamente” parece consistir em uma simples tautologia e o restante parece ser apenas uma explicação por meio de expressões correlatas. Quando nós explicamos o conceito de verdade do juízo afirmativo por meio do termo correlato existência do objeto (Existenz des Gegenstandes) e o conceito de verdade do juízo negativo por meio do termo correlato de não existência do objeto (Nichtexistenz des Gegenstandes), nós procedemos semelhantemente àquele que define o conceito de efeito por meio da sua relação para com o conceito de causa ou o conceito de grande por meio da sua relação para com o conceito pequeno. O que se ganhou aqui? Uma expressão é tão conhecida e usual como a outra. 58. Contudo, as nossas investigações podem nos ser instrutivas em alguns aspectos. (1) É interessante agora que nós não mais procuremos atrás da definição, além do dado na realidade (Wirklichkeit). 75
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A definição também não aparece agora propriamente sem valor. As expressões tautológicas, mesmo desprovidas da menor análise conceitual, sempre apresentam vantagens substanciais para o esclarecimento, se, de dois termos sinônimos, um deles não sucumbe tanto quanto o outro às más interpretações. No entanto, esse não seria, em princípio, o caso na definição “concordância com o objeto” (Übereinstimmung mit dem Gegenstande), então fiquemos atentos com extravios na aproximação da afirmação e negação adequadas com o análogo adequado no âmbito de amor e do ódio. Assim, nós agora estamos protegidos ante a confusão conceitual, e também por isso diante de muitos outros mal entendidos, pelos quais muitos se deixaram induzir por meio de mal-entendidos da definição. a) Nós, por exemplo, não dividiremos a verdade dos juízos em formal e material, tal como se faz. Está claro, de modo contrário, que aquilo que alguns denominam verdade formal (ou seja, a não contradição interna) não deve ser absolutamente verdade no sentido próprio, mas verdade em sentido impróprio, como similarmente nós poderíamos muitas vezes chamar de verdade aquilo que não é juízo. b) Nós não pensaremos, como alguns ingenuamente o fazem, que onde se reconhece uma verdade é preciso comparar uma coisa real (ein reales Ding) com um juízo. Eles não suspeitam que, no juízo, não se trata sempre de coisas reais (reales Dinge) e, além disso, também não percebem que, ainda onde é esse o caso, a coisa real já deveria ter sido reconhecida como tal por mim, para que a comparação de uma coisa real e um juízo seja possível. Essa teoria nos levaria a uma regressio ad infinitum. Enfim, nós não estaremos tentados a confundir, como é recorrente, o conceito de real (des Reale) com o conceito de existente (des Existierenden). Já faz dois mil anos que Aristóteles analisou os múltiplos sentidos do ser (des Seienden).
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É lamentável, mas verdadeiro, que ainda hoje a maioria nenhum proveito tenha tirado de suas investigações. 59. 2. Nossas conclusões também devem ser interessantes a partir de outra perspectiva. Falamos inicialmente da equivocidade e observamos, tal como Aristóteles, que há uma grande ameaça para o sucesso dos nossos esforços intelectuais quando ela não é considerada. Pode-se obter um claro quadro do significado desse risco quando se observa como uma fórmula sempre pronunciada, por causa da equivocidade da expressão “Ser” (Seiendes), levou os mais ilustres pensadores ao erro ao não obterem clareza sobre algo fundamental? 60. Finalmente 3) também poderíamos extrair de nossa investigação outra lição e poderíamos guardá-la para sempre conosco. Em nossa investigação, tratou-se de uma definição, ou seja, da elucidação de um conceito associado a um nome. Em tais casos, muitos acreditam que sempre se deveria recorrer às determinações gerais e esquecem, com isso, que o meio definitivo e eficaz deve consistir sempre em uma referência à intuição do individual, a partir de onde derivam todos nossos conceitos gerais. De que valeria toda explicação dos conceitos vermelho ou azul, se eu não expusesse um vermelho ou um azul diante dos olhos de alguém? Os que se ocuparam da definição nominal da verdade, cuja história nós percorremos, não se atentaram para isso. Se, como eu espero, nós conseguimos esclarecer o conceito que estava obscuro, foi unicamente porque examinamos melhor os exemplos de juízos verdadeiros, onde não tardamos a constatar que esta relação de igualdade – o que quer que ela possa ser – não poderia ser uma verdade, pois afirmação e negação não se relacionam sempre com coisas reais (realen Dingen). Mesmo agora, depois de esclarecermos todo mal entendido, a definição nada diria para aquele a que faltasse a intuição. Esta deveria ser nossa conquista. Ela é certamente suficiente para uma questão tão limitada como a 77
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nossa, onde se trata, em resumo, apenas de explicar uma expressĂŁo que um uso cotidiano tornou acessĂvel a todo mundo.
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O livro O conceito de Verdade (Über den Begriff der Wahrheit), apresenta a interpretação proposta por Franz Brentano, em 1889, para a clássica definição aristotélica de verdade compreendida como "adaequatio rei et intelectus". Além de apresentar o diálogo brentaniano com a tradição filosófica, a relevância do livro encontra-se no fato de que, ao lado dos problemas oriundos da fundamentação da noção de intencionalidade, ele explicita também os problemas relacionados à verdade dos juízos evidentes, e à evidência da preferência justa, os quais passaram ao centro da filosofia brentaniana do psíquico a partir de 1889.
usj CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ