Um ano contra os retrocessos do governo Temer

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Mandato Deputado Federal Edmilson Rodrigues (PSOL/PA) Um ano contra os retrocessos do governo Temer



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Mandato Deputado Federal Edmilson Rodrigues (PSOL/PA) Um ano contra os retrocessos do governo Temer

BrasĂ­lia, julho de 2017


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FORA TEMER E DIRETAS JÁ

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O BRASIL SOB O IMPÉRIO DA INFÂMIA E A FORÇA DA MULTIDÃO INQUIETA DIREITOS INDÍGENAS

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RELATÓRIO DA CPI DA FUNAI E INCRA É UMA COMPILAÇÃO DE INSANIDADES DIREITO À TERRA E AO TETO

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MP 759: A MEDIDA PROVISÓRIA QUE COLOCA O BRASIL À VENDA AMEAÇA AO MEIO AMBIENTE

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MPS 756 E 758 SÃO GOLPE NA AMAZÔNIA BRASILEIRA ECONOMIA

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LEI KANDIR: A LEI QUE MANTÉM O PARÁ NA COMMODITIZAÇÃO E NA POBREZA SAÚDE E SEGURIDADE SOCIAL

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DRU: MAIS UM SAQUE À SEGURIDADE SOCIAL DESMONTE DA EDUCAÇÃO

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PEC 55 E MP 746, O FIM DO MUNDO E O RETROCESSO DESMANTELAMENTO DE PROGRAMAS SOCIAIS

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GOVERNANDO CONTRA A CONSTITUIÇÃO: RETROCESSOS SOCIAIS E ATAQUE AOS DIREITOS HUMANOS REFORMA DA PREVIDÊNCIA

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REFORMA TIRA DINHEIRO DA PREVIDÊNCIA PARA DAR AO GRANDE CAPITAL FINANCEIRO DIREITOS TRABALHISTAS LEI DA TERCEIRIZAÇÃO E REFORMA TRABALHISTA, O BRASIL DE VOLTA À SENZALA

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FORA TEMER E DIRETAS JÁ:

O BRASIL SOB O IMPÉRIO DA INFÂMIA E A FORÇA DA MULTIDÃO INQUIETA


O

que existe hoje, na situação brasileira, para lembrar de Noan Chomsky, é uma multidão submetida a uma minoria próspera. Talvez isso explique porque a multidão está cada vez mais

inquieta. Porque a crise está instalada globalmente e não é só econômica, mas política, cultural e social. Essa hegemonia é forte, mas permanentemente questionada, porque a racionalidade capitalista não consegue desvencilhar de seu contrário. A dinâmica capitalista é grávida de contradições, de contra-racionalidades à razão do capital que é o lucro, apropriação privada da mais-valia. Isso em grande medida explica as contradições e a derrota do governo baseada no lulismo. Tivemos uma oportunidade importante de governo comandado pelo Lula e pela Dilma. Faltou no Lulismo um projeto contra-hegemônico. Foi abandonada a tese de que ganharíamos o governo por consciência de que não conseguiríamos fazer um governo socialista mediante uma eleição numa sociedade capitalista. No entanto, o nosso governo, por dentro da ordem, trabalharia, potencializaria as ações contra a ordem. Nosso governo seria democrático e popular porque baseado num programa democrático-popular, um conceito construído coletivamente pelas esquerdas brasileiras que participaram do PT. Esse compromisso foi abandonado. Logo, abandonou-se o compromisso com uma práxis contra-hegemônica, porque o programa democrático-popular para o Brasil tinha que contrapor pontos essenciais. Ele deveria dialogar com o mundo, mas com postura soberana. Sem aceitar que uma geopolítica produzida em outros territórios ganhasse corpo, expressão no nosso país, como se fosse uma geopolítica que interessasse ao povo brasileiro. O governo de Michel Temer é a expressão de um golpe. Quando a crise se instalou conjunturalmente, diminuindo as margens de lucratividade dos grandes oligopólios, perceberam que não precisavam mais de um governo que fizesse todo esforço para que seus interesses fossem atendidos. Então, comandaram o golpe. No entanto, quando Temer diz que tem legimitidade, sem ter, e usa o argumento de que era vice-presidente eleito, ele não está mentindo. Ele participou de um projeto hegemônico que tentava dar um ar social a um projeto de manutenção da ordem. Isso é contraditório, apesar de ilegítimo. É golpista porque não havia razão para o impeachment. Mas ele era vice-presidente de Dilma, que talvez estivesse fazendo as mesmas

fotografia: Bruna Menezes

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reformas se ainda estivesse no governo. Seu governo indicou, através do ex-ministro Joaquim Levy, que as poucas conquistas sociais seriam revertidas para dar estabilidade ao lucro, para garantir os interesses dos oligopólios ou monopólios. A lógica de privatização do pré-sal foi radicalizada no governo Temer sob comando dos tucanos. Crime de lesa-pátria, mas quem não se lembra da convocação das forças armadas para garantir o leilão do campo de Libra do pré-sal? Há diferenças significativas. Ter a participação da Petrobras em pelo menos 30% é diferente de entregar 100% para as empresas internacionais. No entanto, a ação do Lulismo não era contra-hegemônica. Mas era legítima. Inclusive conseguiu ter programas sociais. Quando se compara os programas de financiamento da produção agrícola, havia no governo Lula R$ 20 bilhões para produção familiar e R$ 200 bi para o agronegócio. Essa política é mantida pelo Temer, mas antes existia o investimento na pequena produção que nunca existiu. Por isso governos de Lula e Dilma acabaram gerando apelo popular grande. O governo Temer, no entanto, radicaliza todas as políticas destrutivas do futuro brasileiro. O programa denominado “Ponte para o futuro” é, na verdade, uma verdadeira passarela ao passado. Porque representa a destruição da possibilidade de um futuro soberano do país. Não diria definitiva porque temos todas as razões para afirmar a possibilidade desse futuro justo e feliz, tanto que o futuro está em crise, porque há resistência, principalmente dos trabalhadores. Muitos, inclusive, por falta de uma consciência mais clara, apoiaram o golpe e acharam que Temer seria melhor para o país. A ponte para o futuro é a privatização total dos recursos do território. Pensemos nas florestas, e vamos lembrar das Medidas Provisórias 756 e 758 (aprovadas vergonhosamente pelo Congresso Nacional e, a seguir vetadas por força da pressão social, mas que podem voltar na forma de projeto de lei). Pensemos nas terras da união dos estados municipais e lembraremos da MP 759 que entrega até 2,5 mil hectares de terras públicas para proprietários privados. Os recursos do território servindo para acumulação de riquezas às custas das injustiças e aprofundamento da miséria social, pobreza, exploração e opressões do povo brasileiro.

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O projeto que hoje se desenvolve sob comando de Temer é a demonstração de força de países cêntricos do capitalismo e suas geopolítica. Servimos a interesses norteamericanos e europeus e também servimos à geopolítica chinesa. Contraditoriamente, esta última é a mais reacionária do ponto de vista político e abnegada defensora do liberalismo econômico que não tem pudor para fomentar laços econômicos entreguistas dos recursos do território aos países cêntricos e suas corporações. Basta dizer que quando se fala nas hidrelétricas na Amazônia, como Belo Monte, está se falando em sistemas técnicos entregues ao capital chinês. Na China o regime é centralizado, autoritário, tecnocrático, em que há superexploração do trabalho, altíssima concentração de riqueza em empresas estatais e privadas que se consorciaram com estado chinês – expressão da lógica capitalista que se impõe sob o governo Temer. É muito séria a promiscuidade do governo na relação com grandes empresários e a traição na perspectiva de mudança prometida no processo de golpe. Quem tinha consciência, sabia que eram meras promessas vãs, que a ponte do futuro era na verdade o regresso ao passado. No entanto, grande parte do povo acreditou que haveria combate à corrupção, mudança na forma de governar e que as conquistas sociais seriam mantidas. Hoje temos provas irrefutáveis de envolvimento em corrupção, não só de nove ministérios do governo, não só de sua base na Câmara, mas do próprio presidente que já respondia a investigações por conta da Lavajato e agora é alvo de denúncias seríssimas envolvendo a JBS. Ao contrário do que se prometia, montou-se uma verdadeira quadrilha para tomar conta do Estado brasileiro que consegue ter influências tanto no poder judiciário, inclusive Ministério Público, mas principalmente o executivo e o poder legislativo totalmente partícipes de uma ação ampla e poderosa, uma verdadeira ação criminosa a partir de estruturas do estado. É um evento social, um fato histórico, geográfico de grande envergadura, complexidade e difícil compreensão. Por ser comandante de uma organização criminosa, e por estar tentando inviabilizar as investigações na condição de presidente, urge a cassação do mandato de Michel Temer. Seja através da justiça ou do Congresso Nacional, urge o seu impeachment. Urgem eleições diretas, e não apenas para presidente, mas em todos os níveis. Para passar

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a limpo o país, dar legitimidade ao futuro governo, que se baseia no voto popular e no programa assumido. Por isso, 97% do povo concorda com PSOL: todos querem Fora Temer. Nós queremos eleições diretas. Este é um sonho possível, mas que exige ampla mobilização popular. As mobilizações nacionais já demonstraram o poder do povo. O ato em Brasília em maio foi outra demonstração da força do povo. É a capacidade de luta, do povo na rua, da organização da greve geral, da desobediência civil, da ocupação de praças, ruas, e mesmo de órgãos públicos: todas as formas de resistência dos que vivem do trabalho, dos lugares pobres, das periferias urbanas, onde estão a maioria das vítimas de extermínio de jovens negros. Daí vem a resistência. Dela, tenho certeza, virá a vitória do povo brasileiro contra a infâmia que se instalou no Palácio do Planalto. Edmilson Rodrigues Professor, arquiteto, ex-prefeito de Belém (1997-2004). É atualmente deputado federal pelo PSOL-PA.

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DIREITOS INDÍGENAS:

RELATÓRIO DA CPI DA FUNAI E INCRA É UMA COMPILAÇÃO DE INSANIDADES


S

empre foi evidente que a instituição da Comissão Parlamentar de Inquérito, em novembro de 2015, para investigar a atuação da Funai e do Incra na demarcação de terras quilombolas e indí-

genas, foi motivada por interesses do agronegócio por meio de seus representantes na Câmara Federal. O relatório da CPI, assinado pelo deputado Nilson Leitão (PSDB/MT), teve seu texto principal aprovado em maio de 2017 pela maioria da comissão. Este documento cumpre o propósito de estimular a concentração de terras e o controle das políticas florestal e também relacionadas à agropecuária no Brasil. Como membro dessa CPI, fui voz dissonante, fiz oposição a esse teatro de horror que estimula o esvaziamento de órgãos públicos federais, cujas competências são fundamentais para os Direitos Humanos e a valorização das etnias negra e indígena. A CPI quer sepultar a Funai e a política indigenista. A força da bancada ruralista tem efeito sobre o Governo. A Funai, que já estava fragilizada no governo Dilma, sofre agora pressão ainda maior. As denúncias sobre o ex-ministro da Justiça, Osmar Serraglio, ter entregue a Funai para a ingerência política do PSC e a demissão do presidente da fundação, Antônio Fernandes Costa, há duas semanas têm causa: a causa do boi, como ficou demonstrado na Operação Carne Fraca. Essa mesquinha negociação política é inadmissível porque inviabiliza a Funai, um órgão constituído de corpo técnico qualificado. Servidores se aposentaram, cargos comissionados foram extintos e não há previsão de concurso público. Além disso, os gradativos cortes orçamentários aprofundam o comprometimento da atuação da Funai, que, em 2017, conta com um pouco mais de R$ 500 milhões para atender mais de 800 mil indígenas no Brasil todo. Somente o Colégio Dom Pedro II, do Rio de Janeiro, tem orçamento superior a isso, de R$ 650 milhões, este ano. O relatório da CPI revela a completa perda de razoabilidade e de racionalidade da bancada ruralista, movida pelo ódio aos indígenas e aos quilombolas. É escandaloso o indiciamento de 120 pessoas, entre procuradores federais, advogados da União, servidores públicos, pesquisadores e lideranças religiosas, que não foram ouvidas na comissão. Uma das aberrações mais flagrantes, foi o indiciamento do servidor do Incra do Rio Grande do Sul falecido desde o ano de 2008.

fotografia: Mídia Ninja

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Sem dúvida, uma das principais insanidades do relatório reside na agressão à ONU: “Mais parece uma confederação de ONGs do que uma organização que reúne estados soberanos”, diz o texto aprovado na CPI. Além de remeter trechos de uma investigação sigilosa da ABIN sobre lideranças indígenas à OIT, o que repudio duplamente. De um lado por se caracterizar como um ato de violência tal vigilância por parte do Estado aos movimentos sociais. De outro, essa atitude da bancada ruralista manda um claro recado de não reconhecimento da autoridade da ONU para atuar em questões indígenas no Brasil. Essa atitude da CPI é uma contradição e um desrespeito à própria Câmara Federal, ao Congresso Nacional, à República Federativa e ao Estado Brasileiro que, como membro da ONU, não apenas participou da elaboração da Carta das Nações Unidas, que constituiu a própria ONU, como é signatário da Convenção 169 da OIT, que trouxe inclusão social para milhões de pessoas de etnias indígenas e tribais no mundo. A convenção tornou-se lei no Brasil (Decreto 5.051, de 19 de abril de 2004), que foi consolidada por decisão da Câmara e do Senado. O relatório da CPI da Funai e Incra é a expressão da arrogância, do autoritarismo, do ódio e da virulência contra a diversidade étnica mundial e, particularmente, no nosso país. Esse ódio não pode prevalecer, mesmo que a bancada ruralista aprove o relatório em plenário, vamos buscar as forças democráticas para derrubar esse intento, em todas as esferas possíveis. É necessária a reação institucional, através das bancadas, do Ministério Público, dos servidores públicos e das organizações não-governamentais que estão sendo violentadas, assim como a resistência dos povos quilombolas e indígenas. Precisamos reafirmar o direito do povo brasileiro à paz.

Artigo originalmente publicado na Carta Capital em 23/5/2016

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Edmilson Rodrigues foi membro da primeira CPI da Funai e Incra que, foi instalada em novembro de 2015 e encerrada em agosto de 2016 porque perdeu prazo para votação de relatório

•• Os ruralistas, em acordo com o então presidente da Câmara Rodrigo Maia, conseguiram reinstalá-la em seguida

•• O relatório foi aprovado em maio de 2017

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DIREITO À TERRA E AO TETO:

MP 759: A MEDIDA PROVISÓRIA QUE COLOCA O BRASIL À VENDA


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á quase 40 anos o Brasil vem construindo, passo a passo, o direito à regularização fundiária. Com apenas uma canetada, o governo ilegítimo de Michel Temer alterou 18 leis, inclusive

nossa Constituição, passando por cima do que vem sendo trabalhado nestas décadas e avassalando o direito social à terra e ao teto. A MP 759, aprovada pela Câmara em maio de 2017, pretende nada menos do que entregar 88 milhões de hectares (relativos aos assentamentos da reforma agrária) à sanha do pernicioso mercado imobiliário. Pretende-se criar um mercado privado de terras a partir de todo um acervo nacional. Será o fim da reforma agrária, com intensa reconcentração de terras, e a legitimação da grilagem através da anistia aos que cometem esse crime - a apropriação de bens públicos. Sob a falácia de se aperfeiçoar procedimentos, cria-se novos dispositivos e altera-se profundamente leis nacionais ligadas ao uso do território brasileiro para que impere o direito individual de propriedade. A MP 759 se apresenta de forma equivocada e ilegal desde sua natureza: medida provisória. Como pode o governo ignorar algo que vinha sendo construído há décadas por dezenas de entidades e movimentos? Para que este conteúdo se justificasse ser apresentado como medida provisória deveria seguir princípios de relevância e urgência, o que não ocorreu, ferindo o artigo 62 da Constituição Federal. Não há como justificar uma lei que modifica todo o arcabouço legal no qual se sustenta a regularização fundiária no país e interfere nas três esferas da federação provocando um caos nos processos em andamento. Outro aspecto extremamente prejudicial da natureza deste texto é que a medida provisória impede o debate com todos os interessados no tema. Foi editada sem consulta pública às populações atingidas, sem diálogo com os diversos segmentos que compõe o Conselho Nacional das Cidades, bem como o Ministério Público e a Defensoria Pública, sem ouvir os movimentos sociais, sem ouvir profissionais multidisciplinares da União, Estados e Municípios que trabalham com as políticas de regularização fundiária rural e urbana.

Especulação imobiliária Por trás destas mudanças residem os interesses especulativos,

fotografia: Green Peace

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tanto dos setores agrários como urbanos. Para ampliar seus negócios, devem expandir seus domínios para as terras públicas e, assim, atender a seus interesses privados. Na cidade, os grandes beneficiados são os especuladores imobiliários com a flexibilização de loteamentos e condomínios de alto padrão que são dispensados de contrapartidas e responsabilidades. Ademais, o licenciamento ambiental que hoje é diferenciado para áreas consideradas de interesse social é eliminado. Por fim, os loteadores irregulares de terras públicas que hoje devem adotar medidas compensatórias passam a não ter essa obrigação, que é transferida para o poder público.

Fim da Reforma Agrária Esta medida representa o fim da reforma agrária porque retira da legislação o que resta de política agrária no país e a modifica favorecendo que se antecipe a emancipação dos lotes. Por trás desta flexibilidade há o interesse que essas terras voltem rapidamente ao mercado, que atua de forma implacável constrangendo os donos dessas terras para que isso aconteça. Ademais, a mudança restringe a participação dos movimentos sociais rurais na negociação dos temas agrários. Para ter dimensão do impacto desta mudança, hoje os assentamentos somam 88 milhões de hectares de terra onde (sendo aproximadamente 40 milhões na Amazônia) residem 1 milhão de famílias que produzem alimentos que vão para a mesa dos brasileiros e brasileiras – ao contrário da soja dos ruralistas.

Grilagem liberada A MP 759 permite, ainda, a concentração de terras e beneficia aqueles que a ocupam ilegalmente. Ela amplia um dos maiores erros do Governo Lula levado a cabo pelo ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência, Roberto Mangabeira Unger: o Programa Terra Legal na Amazônia. Este programa (Lei 11.952/2009) permite a regularização em favor de quem já é proprietário de outro imóvel e para ocupantes após 2004.

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É uma anistia a grileiros e tolera inclusive o desmatamento como forma de ocupação. O Programa Terra Legal permitiu que se legalizasse até 15 módulos de uma região que pode ter até 1500 hectares: terras griladas, roubadas, saqueadas do território nacional. Agora esta medida estende este absurdo a todo país, amplia este limite para 2500 hectares destruindo-se vários procedimentos que vinham se consolidando. Este, sem dúvidas, é o passo que querem dar rumo à venda não só da Amazônia, mas de todo território Brasileiro. Por trás desta medida está o grande objetivo de permitir a venda de terras rurais a estrangeiros, proposta pelo Projeto de Lei nº 4.059/2012, apoiado pelo atual Governo. A aprovação desta medida provisória somada à extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário representam a consolidação do projeto de estrangeirização de nossas terras. De acordo com dados do Incra, hoje temos 2,81 milhões de hectares nas mãos de estrangeiros, o que representa mais do que todo território do estado do Alagoas. O que guia este interesse é o princípio da mercantilização e alienação do território brasileiro. Para que se alcance este objetivo, precisam retirar entraves, exatamente o que esta medida provisória faz. Entregam o patrimônio público e distribuem senhas ao agronegócio provocando intensa violência social.

•• Edmilson foi membro suplente da Comissão Especial que analisou a MP 759

•• Esta medida foi publicada pelo governo Temer em dezembro de 2016

•• Aprovada pelo plenário da Câmara em maio de 2017 •• No dia da votação, 27/5, Edmilson e a bancada do PSOL, junto à oposição, deixaram o plenário depois do governo Temer convocar Forças Armadas para conter a manifestação que ocorria em Brasília. A maior até então contra o presidente que já era investigado 19


AMEAÇA AO MEIO AMBIENTE:

MPS 756 E 758 SÃO GOLPE NA AMAZÔNIA BRASILEIRA


N

ão é de se surpreender que, em um governo subserviente aos interesses do capital, estejam em risco não somente direitos trabalhistas, previdenciários e sociais como os patrimônios

naturais em si. Para acelerar o processo de entrega de nossos bens a madeireiros, grileiros e agronegocistas, Temer se utilizou daquele ins-

trumento que limita o debate e alterações: a medida provisória. Enviou ao Congresso Nacional as ameaçadoras MPs 756 e 758 que colocam em risco quase 600 mil hectares de áreas protegidas em Unidades de Conservação, extensão esta que equivale ao território do Distrito Federal. As medidas causam ao Parque Nacional do Jamanxim a perda de 101 mil hectares, quase 12% de sua extensão, e a Floresta Nacional do Jamanxim, 486 mil hectares, quase 37% da área. Ambos ficam no Pará. O Parque Nacional de São Joaquim, em Santa Catarina, também perde, com a medida, 10,4 mil hectares, cerca de 20% de sua extensão original. As reservas biológicas são assim definidas em reconhecimento à biodiversidade identificada numa determinada área a partir de estudos científicos e cuja preservação é definida em lei por necessidade de perpetuação daquela condição ambiental. No entanto, o governo pretende reduzir as áreas de proteção, rebaixando-as para APAs, categoria que permite a presença humana e o desmate para atividades como agropecuária e mineração. Ou seja, pretendem entregar de presente as terras públicas para grileiros e criminosos ambientais e socais, num país em que existe tanta desigualdade social. Isso é inadmissível! Se a força do capital, aliada ao poder político, é grande, a resistência é maior. Mais de 140 organizações e entidades ambientalistas, indígenas, de direitos humanos e do campo se uniram no #Resista, movimento de resistência contra os retrocessos ruralistas e que entre eles estão a criminosa redução de unidades de conservação. Vale lembrar também a mobilização e manifestações do Ministério Público Federal sobre o assunto, bem como um interessante artigo assinado por todos os ministros que já estiveram à frente do Ministério do Meio Ambiente publicado no jornal Valor Econômico. Sob o instigante título “Uma carta aberta às lideranças do século XXI, estes ex ministros pediam ao presidente em exercício, o veto integral às estas duas MPs. Assim, Temer vetou as duas MPs sob pressão. Ocorre que não há um movimento confiável deste governo e trata-se, mais uma vez de

fotografia: Agência Pará de Notícias

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uma ação precedida de golpe. No mesmo dia em que assinou o veto, começou articular enviar ao Congresso um projeto de lei, em regime de urgência, que repõe a desproteção de mais de 480 mil hectares da Floresta Nacional do Jamanxim. É o que declarou o ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho. Na prática, vivemos a mesma ameaça. Segundo o Instituto Socioambiental, as áreas afetadas no Pará têm função estratégica, pois conectam as bacias do Tapajós e do Xingu, uma das regiões de maior biodiversidade da Amazônia, com inúmeras espécies de animais e plantas ameaçadas ou que só existem ali. Se essas áreas forem de fato desprotegidas, a Amazônia será esquartejada, restando fragmentos desconectados, com consequências negativas sobre o clima, os mananciais de água e a biodiversidade Reportagem publicada na Folha de São Paulo no dia 12 de junho mostra que um dos beneficiários dessas medidas, e agora do PL, será o fazendeiro Jaime Zaminhan, que ocupa ilegalmente quase 7 mil hectares na Flona do Jamanxim, já foi multado por extração ilegal de madeira e cuja esposa preside uma das associações que luta pela redução da área protegida. Outro favorecido será o prefeito e fazendeiro de Novo Progresso, Ubiraci Soares da Silva, o “Macarrão”, que foi recentemente flagrado por agentes do Ibama desmatando quase 1 mil hectares e que já acumula R$ 1,9 milhão em multas aplicadas, segundo esse instituto. Não podemos nos esquecer daquele que é considerado o maior desmatador da Amazônia: Ezequiel Castanho. Segundo investigou a Polícia Federal durante uma operação em 2015, ele lidera uma quadrilha que agia em Novo Progresso, Itaituba e Altamira e já provocou dano que ultrapassa meio bilhão de reais. Ele ficou menos de um ano preso e medidas como esta protegem criminosos como ele. Hoje, com a atual legislação, já assistimos detentores de poder econômico e político agindo contra a lei, concentrando terras e enriquecendo às custas da destruição do equilíbrio ecológico, social e dos direitos das comunidades indígenas e quilombolas e de trabalhadores rurais, expulsando e matando. A aprovação desse projeto representa a intensificação desses conflitos. Caso aprovado, estarão abertas as portas para mais alterações e reduções em nossas unidades de conservação, um perigoso fator para mais desmatamentos,

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grilagem e conflitos de terra em todo o País. Além disso, colocará seriamente em risco as metas de combate ao desmatamento, à perda de biodiversidade e às mudanças climáticas acordadas pelo Brasil em acordos internacionais.

•• O presidente Michel Temer enviou ao Congresso Nacional em dezembro de 2016 as Medidas Provisórias MP 756 e 758

•• Elas foram aprovadas pela Câmara em maio de 2017, com voto contrário de Edmilson

•• Sob Pressão, em junho Michel Temer vetou integralmente a MP 756 e parcialmente a 758

•• No mesmo mês, articulava enviar ao Congresso Projeto de Lei com mesmo teor

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ECONOMIA:

LEI KANDIR - A LEI QUE MANTÉM O PARÁ NA COMMODITIZAÇÃO E NA POBREZA


N

a condição de representante do povo do Pará na Câmara Federal, eu não poderia ficar de fora do debate sobre a Lei Kandir (LC 87/1996) que estabelece a incidência de ICMS para exportação

de bens minerais primários ou semi-elaborados. Ela representa um dos maiores entraves ao desenvolvimento de estados mineradores, madeireiros e de potencial ao agronegócio, como o caso do Pará. Sou titular da Comissão Especial que debate a regulamentação da compensação à essa lei, bem como sou entusiasta não do fim dos incentivos fiscais, mas da transformação desse modelo imposto pela Lei Kandir, que colocou o Pará e outros estados em condição de meros exportadores de commodities, sem qualquer estímulo à agregação de valor ao produto internamente, que poderia gerar mais empregos e arrecadação. Não bastasse ser vítima de impactos sociais e ambientais produzidos por essas atividades econômicas e pela produção de energia a partir do modelo de implantação de hidrelétricas, a Lei Kandir golpeou o Pará duplamente: desonerou a cobrança de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) nas exportações de bens primários e semielaborados e também regulamentou a cobrança do ICMS de energia no estado de consumo dessa energia. A Lei Kandir é uma aberração jurídica, tendo em vista que o ICMS é um imposto estadual e que, em uma federação, a autonomia dos entes federados é um princípio pétreo, logo, não pode ser desrespeitado. É, também, uma aberração moral, tendo em vista que não é admissível que um território soberano desenvolva uma política de benefício fiscal a um determinado setor da economia através da Carta Magna do país, uma vez que esse tipo de política deve passar, obrigatoriamente, por periódica avaliação que permita definir por sua manutenção ou não à luz do princípio do interesse público. Porém, tanto o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso quanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiram rasgar a Constituição Brasileira e impor um prejuízo inominável aos estados não industrializados, com destaque ao Pará. A Lei Kandir representa uma intervenção e um constrangimento à autonomia dos estados e inviabiliza qualquer outro modelo econômico que não seja o de “commoditização” da Amazônia e de todo o território. Ocorre que o que se diz ser vantagem é o próprio sepultamento do futuro. Porque não é vantajoso sangrar os recursos do território

fotografia: Agência Pará de Notícias

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em favor de alguns poucos oligopólios à custa do aprofundamento da crise social e do desequilíbrio ecológico expressos tanto nos índices de agressão à biodiversidade, quanto na pobreza estrutural do estado que tem nos colocado na liderança de todas as mazelas: violência, prostituição infantil, trabalho escravo, pobreza, baixa qualidade da educação e da saúde, etc. De que adianta o Pará estar entre os primeiros na pauta de exportação e produção de divisas do país, mas não ter condições de investir em saneamento, saúde e educação a fim de garantir dignidade aos seus quase nove milhões de habitantes?

Impossibilidade de mudança É quase impossível acabar com a Lei Kandir porque ela deixou de ser uma lei infraconstitucional desde que o governo Lula, com amplo apoio do Congresso Nacional, transformou-a lei em dispositivo constitucional. Qualquer proposta de emenda constitucional (PEC) exige três quintos (3/5) dos votos dos congressistas (Câmara e Senado) para ser aprovada. Mesmo porque a isenção que a Lei Kandir oferece à exportação de produtos primários, semielaborados ou os de baixa escala na verticalização industrial serve tanto para a exportação a outros países como, também, para outros estados da federação. Por exemplo, se a Companhia Siderúrgica Nacional (RJ) compra da Albrás/Alunorte ou da Vale os insumos para a sua produção, ela está na verdade sendo beneficiada pela Lei Kandir. O jogo de interesses dos estados pode sofrer mudanças haja vista que o país passa por um processo radical e gradativo de desindustrialização coetâneo ao processo de reprimarização da economia. As commodities produzidas pelo agronegócio tem ganhado relevância na pauta de exportação dos estados industrialmente mais desenvolvidos. Por enquanto, a mudança possível é aperfeiçoar as propostas de regulamentação do dispositivo constitucional. Há algumas sofrendo embargos de gaveta por falta de força política do Pará. A regulamentação em lei complementar está prevista no próprio dispositivo. É essa lei que definirá o que a União deverá repassar aos estados exportadores como compensação da isenção fiscal que o é obrigado a conceder aos exportadores.

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Prejuízos O Brasil deixou de arrecadar em ICMS, R$ 466 bilhões e, especificamente o Pará, 44,168 bilhões, entre os anos de 1997 e 2015, segundo o estudo da Fundação Amazônia de Amparo ao Estudo e Pesquisas (Fapespa). Somente em 2015, a perda do país foi de R$ 47 bilhões e do estado, R$ 3,969 bilhões. No caso do Pará, a perda foi cerca de três vezes a capacidade anual de investimento do governo do estado. Excluindo o montante da energia gerada no estado e tributada no local de consumo, a perda representou, no período de 2010 a 2015, uma média anual equivalente a 29,8% da Receita Corrente do poder público estadual. Ainda, o estudo aponta que a capacidade de investimento do Estado do Pará, em 2015, poderia ser multiplicada em 2,5 vezes, com a arrecadação extra. A Lei Kandir inicialmente contemplava os produtos primários, mas foi modificada para a inclusão dos semi-elaborados. A cidade de Barcarena, no Pará, tornou-se uma grande produtora de cabos, usando tecnologia catalã, e chegou a fornecer 15% da demanda mundial, mas essa atividade está longe de trazer desenvolvimento ao município. Essa legislação foi eternizada, cumprindo papel contrário de política de desenvolvimento local que um benefício fiscal deve ter. Em 2006 foi instalada a pedra inaugural da siderúrgica em Marabá, que não saiu do papel porque não é do interesse da Vale. Da mesma forma, o derrocamento do Pedral do Lourenço que permitiria a navegabilidade da hidrovia Araguaia-Tocantins, não foi viabilizado porque a Vale mantém o uso exclusivo de uma ferrovia, o que prejudica a logística para a atração de outros investidores. A não regulamentação da compensação das perdas fiscais impostas pela Lei Kandir põe os estados de pires na mão diante de um governo federal que vez por outra paga a compensação, sem regularidade ou garantia. O estudo da Fapespa identificou que, mesmo as compensações realizadas, não cobriram os valores estimados da perda imposta pela Lei Kandir. Em 1997, essas compensações correspondiam a 51% dos valores estimados de perda e, em 2015, corresponderam apenas a 7%, o que evidencia a insuficiência do sistema compensatório estabelecido.

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Na análise das estimativas de perda de arrecadação entre os estados, no período 1997-2015, destacam-se como os mais prejudicados: Minas Gerais com perda de R$ 92,2 bilhões ou 19,7% de participação média no total das perdas no período; seguido pelo Rio de Janeiro com R$ 49,2 bilhões (10,5%) e Pará com R$ 44,2 bilhões (9,5%), Rio Grande de Sul R$ 41,8 bilhões (8,95%) e o Mato Grosso R$ 41,7 bilhões (8,94%), que juntos representam no total das perdas 57,6%. Isto indica que esse debate é suprapartidário, visto que há estados de diferentes regiões vítimas dessa lei, que as mantém na economia extrativista, sem perspectiva de avançar na industrialização. Conscientes de que não há correlação de forças suficientes na atual conjuntura, deve-se pelo menos buscar sua regulamentação para garantir a compensação ao Pará pelas perdas financeiras. Chegou o momento do país construir um modelo de desenvolvimento, que busque a distribuição de renda e a equidade de oportunidades para a população de todo o território brasileiro nem que, para isso, tenha que dar tratamento diferenciado às regiões já fragilizadas, como o caso do Norte, substituindo o modelo atual que explora a riqueza finita das regiões já muito pobres e condenadas ao modelo extrativista, sem a devida compensação no presente e sem pensar o futuro dessas populações.

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SAÚDE E SEGURIDADE SOCIAL:

DRU: MAIS UM SAQUE À SEGURIDADE SOCIAL


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sta legislatura na Câmara Federal, da qual participo pela primeira vez, tem recebido desde o início propostas de ajustes fiscais que colocam na mira os direitos sociais e dos trabalhadores. Enquan-

to isso, propostas que não seguem no caminho do aprofundamento da crise e das desigualdades sociais passam à margem das discussões. Em junho do ano passado, a luta foi contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 87/2015, de autoria da Presidente Dilma, que prorroga a Desvinculação das Receitas da União (DRU) até 2023, e amplia de 20% para 30% o percentual a ser desvinculado. Foi a primeira proposta que o governo Temer levou à cabo e conseguiu aprovação. Esta proposta poderá destinar para onde quiser 30% das contribuições sociais, que deveriam ir para a Seguridade Social, que reúne as áreas da saúde, assistência e previdência. Até 2015, esse valor significava R$ 60 bilhões anuais, de acordo com Tesouro Nacional. Agora, a Câmara estendeu tal desvinculação a diversas receitas de estados e municípios, e com o aumento do percentual de 20% para 30% na desvinculação, esse saque pode chegar a R$ 120 bilhões, de acordo com cálculos do deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB/SP), um entre os três que votaram junto comigo contra o relatório, na Comissão Especial que tratou sobre a matéria. Pela aprovação foram 20 votos favoráveis.

Falácia da destinação da DRU Um dos argumentos utilizados pelos governos Dilma/Temer é de que os recursos desvinculados pela DRU serão destinados para outras áreas sociais. Mas o mesmo Executivo admite que parte será destinado anualmente ao superávit primário, ou seja, a reserva de recursos para o pagamento de uma questionável dívida pública, que deveria ser auditada, conforme manda a Constituição Federal. O próprio relator da PEC na Comissão Especial, Dep. Laudivio Carvalho, admite que uma das funções da DRU é exatamente “contribuir para a geração de superávit nas contas do governo, com o objetivo de interromper a trajetória recente de crescimento da dívida pública”. A argumentação, ainda, esbarra numa contradição. Sem a DRU, os recursos da seguridade apenas podem ir para previdência, assistência

Fotografia: Luis Macedo/Câmara dos Deputados Plenário da Cãmara dos deputados no dia da votação da DRU

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e saúde. Com a DRU, 30% destas receitas podem ir para outras finalidades, inclusive para pagamento da dívida. Portanto, a DRU prejudica a melhoria da saúde, previdência e assistência.

Inconstitucionalidade Para o PSOL, a prorrogação da DRU representa uma violação a cláusulas pétreas da Constituição, em especial o seu art. 6º, o qual estabelece: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. Além do mais, a extensão da DRU para estados e municípios pode ameaçar diversas ações financiadas com receitas específicas, como por exemplo, a prevenção a acidentes de trânsito, que utilizam receitas de multas.

Alternativas A saída para a crise não é cortar gastos sociais, mas não interessa ao governo ilegítimo de Temer, como não interessou o governo de Dilma, discutir saídas que não cortem na carne do trabalhador. Não há espaço para discussão na Câmara, por exemplo, do único dos sete tributos federais previstos na Constituição sem regulamentação até hoje: o imposto sobre grandes fortunas. Em uma situação hipotética, a taxação de patrimônios poderia render anualmente R$50 bilhões de reais se aplicada sobre valores superiores a R$5 milhões. Um cálculo já apresentado por especialistas como o Mestre em Finanças Públicas e ex-secretário de Finanças na gestão da prefeita Luiza Erundina em São Paulo, Amir Khair. Outras alternativas seriam a efetiva tributação dos latifúndios, das grandes empresas do setor primário-exportador (que não pagam ICMS devido à Lei Kandir), e das grandes rendas, inclusive da distribuição de lucros das empresas e os ganhos dos estrangeiros com juros da dívida “interna”, que também contam com isenções de imposto de renda. Portanto, o argumento oficial de “falta de recursos” para os gastos sociais é enganoso, pois na realidade, se trata de uma questão políti-

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ca, ou seja, de qual grupo social é tributado, e qual é privilegiado com recursos do orçamento. Por exemplo: nos últimos anos, o governo optou por se endividar, pagando juros altíssimos ao mercado financeiro, para acumular quase US$ 400 bilhões em reservas internacionais, que rendem juros baixíssimos, pois são aplicadas, em sua maioria, em títulos do Tesouro Americano. Enquanto o governo ofereceu até 17% ao ano de juros para vender títulos da dívida aos bancos neste ano, a taxa de juros obtida com as reservas nos EUA é inferior a um décimo deste valor. Outro caminho que apresentei nessa legislatura é a auditoria da dívida pública, que consome mais de 40% dos recursos do orçamento federal, e também beneficia principalmente os bancos. Em 2015, apresentei emenda ao Plano Plurianual 2016-2019 prevendo esta auditoria, o que foi aprovado pelo Congresso Nacional. Mas infelizmente, esta emenda foi vetada pelo governo Dilma e o veto foi mantido pelo Congresso com apoio da base do governo de Temer. Assim, fica evidente que não está no centro da preocupação do Legislativo e do Executivo - neste governo ou no anterior - a busca de saídas verdadeiras para a crise, que não impliquem no sacrifício dos trabalhadores e da grande maioria do povo. O austericidio que continua sendo executado, agora ainda com ferocidade redobrada, visa beneficiar um cada dia mais restrito grupo de plutocratas ligados ao capital financeiro e à ciranda especulativa. É contra essa verdadeira guerra aos pobres que o PSOL se levanta, para que o povo brasileiro não permita que sejam exterminados direitos sociais tão duramente conquistados na Carta Magna de 1988. Artigo originalmente publicado na Carta Capital em 7/6/2016

•• A DRU deveria acabar em 31 de dezembro de 2015 •• Em julho deste mesmo ano, o governo federal enviou ao Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 87/2015, estendendo novamente o instrumento até 2023

•• A Câmara aprovou a PEC em junho e o Senado em agosto de 2016 •• Edmilson, que foi membro titular da comissão que analisou esta PEC, votou contrariamente ao texto neste espaço e no plenário

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DESMONTE DA EDUCAÇÃO: PEC 55 E MP 746, O FIM DO MUNDO E O RETROCESSO


E

stive negociando com a Polícia Militar a favor do direito dos manifestantes exercerem a sua cidadania plena de estarem nas ruas reivindicando seus direitos e lutando contra as atrocidades que

estavam tentando aprovar no Congresso. Naquele mesmo dia, no Senado, estava ocorrendo a votação da PEC 55, antes denominada PEC 241 e mais conhecida como a PEC do Fim do Mundo, pois destruirá os serviços sociais e reduzirá a longevidade dos brasileiros. A falta de investimento em áreas primárias como educação, saúde, assistência, saneamento e infraestrutura certamente fará com que o Brasil recue no desenvolvimento social. Essa PEC 55 foi comandada por um governo ilegítimo, envolvido em escândalos de corrupção. Com apoio majoritário do Congresso, Temer aprovou a PEC tanto no Senado quanto na Câmara, inviabilizando o desenvolvimento do país, impondo recessão econômica drástica, afetando áreas estratégicas para o desenvolvimento como a educação. Enquanto áreas fundamentais para o povo brasileiro sofrem congelamento, os juros e amortização de dívidas continuam intactos. Uma vergonha para um país que é uma das maiores economias do mundo. Com a PEC do Fim do Mundo os economistas já calcularam: só na saúde talvez sejam R$ 600 bilhões a menos de investimento nos próximos 20 anos. Enquanto se faz essa maldade contra o povo, para a dívida do ano de 2017 serão gastos 50,66% dos recursos públicos. A título de comparação, na saúde será 3,16%; na educação 3,26% e com esporte e lazer apenas 0,03%. Isso é nada! Como tirar a juventude da violência, garantir educação se mais de 50% dos recursos são gastos para enriquecer banqueiros e especuladores internacionais? Eles riem dessa nossa elite que ao invés de dar um basta às perversidades, resolvem perpetrar as desigualdades do nosso país. Os estudantes e professores de todo o país participaram de um grande ato em frente ao Congresso Nacional para dizer não à PEC 55, já aprovada na Câmara. O que queriam os estudantes, professores e outros sindicalistas? O direito, enquanto cidadãos, de acompanhar os debates e votações sobre temas fundamentais que poderão trazer grandes prejuízos à população. São vários estudos já realizados e não há dúvida: as áreas de saúde, educação, saneamento, infraestrutura e outras serão prejudicadas ao longo de 20 anos de congelamento dos gastos do governo. Essa medida não congela os juros das dívidas, não

Fotografia: Jean Brito Reforma do Ensino Médio mobilizou estudantes de todo o país a ocupar escolas

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taxa as grandes fortunas, não propõe a auditoria da dívida pública para poder investir os recursos em áreas para o desenvolvimento do país. Grande parte dos problemas financeiros do Brasil se dá por conta das isenções fiscais, como é o caso do Pará com a Vale e a Cerpasa. São mais de R$ 300 bilhões que deixam de entrar anualmente nos cofres públicos por conta dos benefícios dados às grandes empresas, com o argumento de que elas gerariam empregos, mas não há ou é inexpressivo esse retorno. Em nome da crise resolveram retirar investimentos em áreas sociais, retirando a dignidade do povo. Por isso a população tem o direito de protestar, de resistir contra essas maldades. Outra medida que compromete o futuro do Brasil é a Reforma do Ensino Médio, a MP 746, aprovada na Câmara e no Senado. Com as mudanças propostas, os estudantes serão novamente divididos, como ocorria até a década de 90, empurrando os jovens de baixa renda para carreiras técnicas e subempregos e os mais ricos para as áreas que desejarem atuar, tendo maior chance de ingressar no Ensino Superior. A MP altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e a Lei do Fundeb. De acordo com a Constituição Federal, que prevê a gestão democrática do ensino público, não se faz reforma na educação por meio de Medida Provisória, o que torna essa MP 746 ainda mais grave porque impossibilitou o debate mais ampliado entre representantes do ensino e estudantes. É uma contradição que um governo cujo lema seja o progresso, queira negar o direito dos nossos jovens terem acesso a conteúdos que lhes permitam o pensamento autônomo. É absurdo que negue a possibilidade de se conhecer as correntes da Filosofia e Sociologia, prejudicando o desenvolvimento da capacidade crítica de nossos jovens, o que possibilita a criatividade de produzir mudanças no presente e reinventar novos futuros. Algo que foi alertado por Ana Júlia Ribeiro, de 16 anos, que comoveu o país ao discursar na Assembleia Legislativa do Paraná durante as ocupações das escolas pelos estudantes secundaristas. Em seu discurso, deixou claro que a reforma do Ensino Médio não atende às reivindicações dos estudantes e está voltada muito mais para o ensino técnico e mercadológico do que para a formação cidadã da juventude.

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•• A aprovação da PEC 55 no Senado foi a primeira grande vitória do governo Temer em novembro de 2016. Ela representa uma limitação drástica dos gastos públicos por duas décadas, afetando sobretudo educação e saúde

•• Na Câmara, Edmilson votou não à esta proposta •• A Educação sofreu golpe por outro viés no governo Temer: em setembro de 2016 enviou ao Congresso a Medida Provisória 746 que propôs a Reforma do Ensino Médio, que na prática prioriza a mercantilização da educação e excluiu professores e estudantes do debate

•• A reforma foi razão de centenas de ocupações de escolas em todo o país. Em dezembro de 2016 a Câmara aprovou a medida

•• Edmilson votou contrariamente. •• Foi aprovada pelo Senado em março de 2017

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DESMANTELAMENTO DE PROGRAMAS SOCIAIS:

GOVERNANDO CONTRA A CONSTITUIÇÃO: RETROCESSOS SOCIAIS E ATAQUE AOS DIREITOS HUMANOS


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nquanto o comprometimento do Brasil com o pagamento dos juros e da amortização da dívida externa se eleva assustadoramente a cada ano, enquanto não há taxação de grandes fortunas

nem pautam uma reforma tributária justa, o tratamento do governo de Michel Temer segue no rumo contrário com a destruição gradativa de importantes direitos sociais, especialmente, nas áreas da saúde, educação e habitação, como foram os casos do encerramento ou da severa diminuição de programas como o Farmácia Popular, Minha Casa Minha Vida e Ciência em Fronteiras.

Farmácia Popular Recentemente, o Ministério da Saúde decidiu encerrar o financiamento para as 393 unidades próprias do programa Farmácia Popular, em todo o país, para economizar R$ 100 milhões. As farmácias próprias eram responsáveis pela distribuição de 112 itens, alguns gratuitos, como remédios para hipertensão, diabetes e asma, e outros comercializados com o valor de custo, como preservativos masculinos, fraldas geriátricas e remédios contra rinite, Mal de Parkinson, osteoporose e glaucoma, com preços até 90% mais baratos do que o praticado no mercado. Não adiantaram os apelos do Conselho Nacional de Saúde e nem da Federação dos Farmacêuticos ao ministro Ricardo Barros. Somente em quatro anos, mais de 31 milhões de pessoas foram beneficiadas pelo programa. Portanto, o encerramento desse programa é uma violência perpetrada contra a população pobre. Especialmente, em se tratando de doenças mais graves, como diabetes e hipertensão, retirar ou restringir o acesso ao medicamento é condenar à morte, é transformar o tratamento em despesa ainda maior com leitos nos hospitais.

Fotografia: Agência Brasil

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Programa Minha Casa Minha Vida foi um dos primeiros programas sociais prejudicados pelo Governo


Minha Casa Minha Vida Outra perversidade foram as decisões contra o Minha Casa, Minha Vida, como a suspensão da terceira etapa do programa para a construção de dois milhões de habitações e a retomada dos imóveis em situação de inadimplência dos mutuários pertencentes à Faixa 1, que é voltada à camada mais pobre da população com renda mensal de até R$ 1.600 por família. Ora, se uma família pobre não tem condições de pagar uma mensalidade que varia de R$ 25 a R$ 80, ao retirar a moradia o governo vai jogar essas famílias para a rua, ampliando a condição de pobreza numa situação de crise profunda pela qual o país atravessa, com desemprego atingindo 14,2 milhões de brasileiros no primeiro trimestre de 2017.

Ciência Sem Fronteiras O fim do Ciência Sem Fronteiras foi outro golpe aplicado pelo governo Temer. O programa que busca a consolidação, a expansão e a internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira por meio do intercâmbio internacional, enviou mais de 73 mil universitários da graduação para cursar um ano em 2.912 universidades de 54 países, incluindo 182 das 200 melhores universidades do mundo. Mas o intercâmbio para a graduação foi encerrado, sendo mantidas somente 5 mil bolsas para a pós-graduação. Para esse governo, a solução é menos saúde, mais analfabetismo, menos investimento em ciência e tecnologia, menos futuro à nossa juventude e ao nosso país. O desmonte de direitos sociais é o maior crime que um presidente da República pode cometer contra uma população, especialmente em tempo de crise econômica, política e moral, em que grande parte das autoridades constituídas, incluindo o próprio presidente, respondem a processos, incluindo organização criminosa, corrupção passiva e obstrução da Justiça.

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•• O Ciência sem Fronteiras foi suspenso para estudantes de graduação no governo Temer. O último edital foi no governo Dilma em 2014

•• Em abril de 2017 o Ministério da Saúde decidiu encerrar o financiamento para as 393 unidades próprias do programa Farmácia Popular

•• Logo que sentou-se na cadeira da presidência, ainda em maio de 2016, Michel Temer abandonou a meta traçada pela presidenta Dilma Rousseff de contratar 2 milhões de moradias do Minha Casa Minha Vida até o fim de 2018

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REFORMA DA PREVIDÊNCIA: REFORMA TIRA DINHEIRO DA PREVIDÊNCIA PARA DAR AO GRANDE CAPITAL FINANCEIRO


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uando, há um ano exatamente, alertávamos que um golpe estava em curso, nos referíamos ao desrespeito à Constituição. Era ela que estava em jogo. Ao rasgar-se uma página

dela, autorizaríamos queimar todo o resto. O governo Temer assumiu há menos de um ano e, provando ter ocupado a cadeira de forma ilegítima, imoral e impopular, tentamos salvar uma página desta Magna Carta que este governo ignora. Ocorre que, desta vez, ele tenta colocar na fogueira aquele direito que atinge a todos os brasileiros e brasileiras diretamente e indistintamente: o direito a se aposentar. A contribuição que o trabalhador vê mensalmente ser descontada de seu contra-cheque pode nunca chegar a seus bolsos. A Reforma da Previdência não pretende outra coisa senão acabar com o direito à previdência, tornando-se uma das maiores arrecadações diretas do governo. Ou um roubo institucionalizado. A proposta do texto é nada menos que cruel. Propõe como ponto principal o estabelecimento da idade mínima de 65 anos para a aposentadoria, para homens e mulheres, sem distinção, o que representa um retrocesso histórico. Além do mais, a cada ano adicional na média brasileira de expectativa de sobrevida aos 65 anos, será acrescentado um ano à idade mínima de 65 anos.

Exclusão dos mais pobres Haverá também a exigência de 25 anos de contribuição, o que representa também grande dano, dado que hoje o mínimo é de 15 anos para a aposentadoria por idade no INSS. Um requisito que coloca à margem milhares de brasileiros, uma vez que o mercado de trabalho brasileiro é caracterizado pela informalidade. De acordo com dados apresentados pela professora Denise Gentil (UFRJ), em 2015, 60% das aposentadorias por idade concedidas foram para trabalhadores que não chegaram aos 20 anos de contribuição. Isto vale dizer que o que garante a aposentadoria, hoje, para grande maioria da população é justamente a idade. Em meu estado, o Pará, por exemplo, esse percentual ultrapassa 90%. Em 2015, quase 80% dos aposentados por idade haviam contribuído por menos que os 25 anos que exige o novo texto. Está claro que essa nova regra vai atingir sobretudo a população mais pobre: que contribue

Fotografia: Otávio Rodrigues Edmilson participa em Belém de atos contra a Reforma da Previdência

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por menos tempo por serem mais sujeitos ao trabalho informal. Qualquer pessoa que frequente a periferia sabe que o sonho de qualquer cidadão é ter um trabalho de carteira assinada. Ter a possibilidade de contribuir, sem interrupção, ainda é privilégio para maioria da população brasileira. Mesmo aqueles que têm a oportunidade de contribuir, será quase impossível se aposentar com a integralidade do salário, visto que é quase impossível se obter os 49 anos de contribuição. Essas mudanças principais dão razão ao temor que levou milhares de brasileiros e brasileiras às ruas no último dia 15: trabalharemos até a morte.

Pensões No caso das pensões, ela será reduzida para 50%, acrescentando-se 10% por dependente (até o limite de 100%). Desta forma, com a morte de seu cônjuge, uma pessoa pode perder até 40% de seu benefício. A Reforma ainda eleva de 65 para 70 anos a idade mínima para se fazer jus ao benefício de Assistência Social, e permite o aumento automático dessa idade sempre que a expectativa de sobrevida aumentar. Além disso, estabelece que o valor do benefício será fixado em lei, em substituição à atual previsão de um salário mínimo.

Regra de transição Haverá apenas uma regra de transição para as pessoas que já estiverem filiadas ao INSS ou RGPS, e que na data de publicação da Reforma já tenham 50 anos ou mais (se homem) ou 45 anos (se mulher), que poderão se aposentar em condições menos piores, mas ainda com regras bem severas. Além do mais, a Reforma revoga o direito de aposentadoria diferenciada para policiais, professores e trabalhadores rurais, portanto a Reforma representa um retrocesso histórico para importantes segmentos da população. Representa ainda um sinal político que retrocede no reconhecimento de diferenças históricas que devem ser corrigidas pela legislação.

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A quem interessa a Reforma Todo o diagnóstico oficial, de que no futuro a relação entre aposentados e trabalhadores ativos irá se multiplicar, se torna irrelevante quando consideramos quem são os verdadeiros privilegiados no orçamento público: os grandes bancos, investidores e empresas. Isto sem mencionar que a arrecadação (inclusive do INSS) tem sido prejudicada pelas constantes desonerações tributárias, e pela recessão econômica (desemprego), resultante das altíssimas taxas de juros, que privilegiam os beneficiários da dívida pública. A Reforma da Previdência tem sido anunciada como uma grande necessidade, supostamente porque haveria um déficit no setor, e que no futuro não haveria dinheiro para pagar os benefícios. Porém, na realidade, o verdadeiro problema das contas públicas não é a Previdência, mas outros fatores que buscam blindar esses que sempre são privilegiados para colocar a conta nas costas do trabalhador. E, desta vez, a conta é a própria vida.

Dívida Pública Indico aqui, por exemplo, a questionável dívida pública, que beneficia principalmente grandes investidores e bancos, que são exatamente os que mais vão ganhar com a precarização da Previdência Pública. Para 2017, o Governo Federal planeja gastar R$ 1,722 TRILHÃO com juros e amortizações da dívida, que jamais foi auditada, e que representa 50,66% do orçamento. Este valor é quase o triplo de todos os gastos previstos com a Previdência Social (INSS e Regime Próprio dos Servidores Públicos), planejados em R$ 650 bilhões. Ao final do ano passado, consegui que o Congresso Nacional aprovasse emenda de minha autoria à Lei de Diretrizes Orçamentárias, prevendo uma auditoria sobre esta dívida obscura, com a participação de entidades da sociedade civil. Porém, Temer vetou minha emenda, e prefere manter este gasto absurdo com a dívida pública, às custas da perda de direitos dos trabalhadores e aposentados.

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Empresas devedoras Questiono, ainda, por que as empresas devedoras ao INSS não são cobradas? De acordo com dados da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), R$ 426 bilhões não são repassados pelas empresas ao INSS. O valor da dívida equivale a três vezes o chamado déficit da Previdência em 2016. A maior parte dessa dívida está concentrada na mão de poucas empresas que estão ativas, como a JBS e Bradesco. Somente 3% das companhias respondem por mais de 63% da dívida previdenciária. A procuradoria estudou e classificou essas 32.224 empresas que mais devem, e constatou que apenas 18% são extintas. A grande maioria, ou 82%, são ativas.

Falácia do Déficit As justificativas usadas pelo governo para defender essa reforma são absurdas. É preciso desmentir os dados diariamente divulgados pela imprensa, sobre um suposto “déficit” na previdência dos servidores públicos e no Regime Geral (INSS). No caso do INSS, o governo anuncia “déficit” de R$ 181,2 bilhões em 2017. Porém, fabrica-se esse “déficit” omitindo-se que a Previdência Social está inserida na Seguridade Social (que abrange as áreas de Saúde, Assistência e Previdência), e conta com expressivas receitas, como a COFINS e a CSLL. Em 2015, houve um Superávit de R$ 11,17 bilhões, segundo a Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil. Já no Regime Próprio de Previdência dos Servidores (RPPS), o governo federal anuncia “déficit” em 2017 de R$ 35,12 bilhões na Previdência dos Servidores Civis, e R$ 52,16 bilhões no total (incluindo-se os militares). Porém, fabrica-se esse déficit por meio do desmonte do Estado. De 1991 a 2015 (em 24 anos), o número de servidores civis ativos do Poder Executivo cresceu apenas 8% (de 662 mil para 717 mil). No mesmo período, a população brasileira cresceu 39%. Desta forma, é lógico que as contribuições dos ativos não irão cobrir as aposentadorias. Além do mais, não é verdade que o gasto com previdência dos servidores está explodindo. O gasto com pessoal (incluindo-se aposentados e pensionistas, de todos os Poderes) caiu de 54,5% da Receita

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Corrente Líquida em 1995 para 38% em 2015. Se investisse-se mais em pessoal, ampliando o número de fiscais, haveria uma melhora na fiscalização da Previdência Social, combatendo a sonegação. Por fim, indico aqui como possibilidade de o INSS ter resultados positivos, acabar com as desonerações e contribuições previdenciárias sobre a folha de pagamento das empresas, revisar as isenções previdenciárias para as entidades filantrópicas e acabar com a aplicação da Desvinculação de Receitas da União sobre o orçamento. A Reforma da Previdência não é uma saída para corrigir um falso déficit. Trata-se de uma escolha política que pretende retirar mais direitos, retroceder em avanços trabalhistas e sociais para atender a quem sempre lucrou neste país. Caso se desejasse buscar saídas para esse problema, a Comissão Especial da Reforma da Previdência na Câmara, seguramente, teria mais tempo de existência e chamaria a todos os interessados para um amplo debate democrático e plural. Exatamente o contrário do que temos vivido nesse espaço. A saída, não é outra: esta Reforma cairá pelas mãos da pressão popular. Artigo originalmente publicado na Carta Capital em 29/3/2017

•• No final de 2016, o governo encaminhou à Câmara a Reforma da Previdência

•• A comissão que a analisou foi instalada em fevereiro de 2017 e Edmilson foi membro suplente

•• O texto foi aprovado na comissão, com voto contrário do deputado, em maio de 2017

•• Até o fechamento desta edição ela ainda não havia sido votada em plenário. E esperamos que nunca seja

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DIREITOS TRABALHISTAS: LEI DA TERCEIRIZAÇÃO E REFORMA TRABALHISTA, O BRASIL DE VOLTA À SENZALA


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projeto da Terceirização é do ano de 2004 e é vergonhoso que algo de tamanha complexidade, estando há 11 anos nesta Casa, não tenha sido analisado e construído um consenso. É

surpreendente que não tenha balizado um acordo na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, o que prova a injustiça de ter-se discutido o projeto nessas condições. Porque ele nega princípios constitucionais, como o artigo 7º, inciso 32, que estabelece a necessidade de igualdade de direitos entre os trabalhadores terceirizados e os trabalhadores da empresa tomadora. Compromete a isonomia em todos os âmbitos, de salário e exercício dos direitos ao trabalho, por exemplo. Compartilho a preocupação com a pejotização das relações de trabalho, o que hoje tem se tornado comum nas empresas que não querem cumprir com as obrigações trabalhistas e contratam trabalhadores transformados em pessoas jurídicas, em que assumem sozinhos toda a responsabilidade pela sua vida trabalhista. Trabalhei, portanto, para que este projeto fosse retirado de pauta. Se não houve acordo antes na CCJ é porque no discurso argumentavam que esta lei defende os interesses de 12 milhões de trabalhadores já terceirizados. Mas, sabemos, esta lei não só irá precarizar esses como também os cerca de 90 milhões que compõem a força de trabalho brasileira. Essa Lei da Terceirização é a oficialização em pleno século XXI de um território brasileiro como uma verdadeira senzala. É a síndrome do escravocrata. É isso o que está sendo aqui manifestado. Essa marca perversa da formação socioespacial brasileira se reproduz nos discursos de defesa dos terceirizados quando, na prática, nas várias experiências pelo mundo, já ficou provado por instituições sérias que já há precarização dos terceirizados e nós não podemos universalizar esse quadro. Ao aprovar este projeto, a Câmara assumiu papel de casa grande ao assumir o objetivo de transformar milhões de brasileiros em escravos. A aprovação desta lei cristalizou a desmoralização dessa Casa. As violências contra os trabalhadores terceirizados não podem se estender aos outros em nome do lucro das grandes empresas. Outra violência contra os trabalhadores é a Reforma Trabalhista colocada em pauta pelo governo. Originalmente, o projeto tinha 9 páginas e alterava 7 artigos da CLT. Ao ser apresentado pelo relator, o projeto passou a ser 132 páginas e a alterar mais de 100 dispositivos

Fotografia: Otávio Rodrigues Greve Geral em Belém em maio de 2017

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da CLT. A bancada governista cometeu um crime contra a humanidade ao destruir a dignidade do povo brasileiro. E essa é apenas mais das medidas destrutivas desse governo. Esse projeto da Reforma da Trabalhista interfere de forma muito profunda na qualidade de vida dos trabalhadores, coloca-os no risco de aumento de jornada de trabalho, para 12 horas e até 14 horas diárias, e diminuição dos salários. Essa Reforma Trabalhista destrói a CLT, o país está naufragando e precisamos superar essa crise sem atacar direitos dos trabalhadores. Fala-se em modernização das leis trabalhistas por meio dessa reforma, mas de moderna não tem nada. As maiores atrocidades contra os trabalhadores são autorizadas por ela, como o ataque ao direito a férias e ao 13º salário; coloca em risco mulheres grávidas por permitir que trabalhem em situações insalubres, dentre outros absurdos. É uma reforma criminosa proposta por um presidente com popularidade em queda e envolvido em esquemas de corrupção. A resistência precisa ser ainda mais forte, devemos estar atentos na luta contra a retirada de direitos.

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•• A Câmara dos Deputados aprovou em março de 2017 o PL 4302/1998 que libera a terceirização para todas as atividades das empresas

•• Edmilson votou não a este projeto. Temer sancionou este PL no mesmo mês

•• A Reforma Trabalhista foi proposta pelo mesmo governo e aprovada em abril de 2017 na Câmara dos Deputados

•• Edmilson votou contrariamente a esta reforma •• Até o fechamento desta edição, ela aguardava votação no Senado

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