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As mudanças que sua geração não pode deixar para depois
Interpretação & Reflexão
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HORA DO
Por que os indicadores da saúde dos adolescentes CHECK-UP no Brasil devem deixar você em estado de alerta
É BEM PROVÁVEL que, como a maioria das famílias brasileiras, a sua goste de fazer um “banquete” durante as festas de fim de ano. Depois de uma boa ceia de Natal ou Ano-Novo, sentimos alegria. Mas no primeiro dia do novo ano, muitos fazem planos de mudança. Comer de maneira balanceada e praticar atividades físicas costumam estar entre as diversas “metas de ano novo”.
Para Ana Ribeiro, 2021 terminou com uma ceia farta: carnes, farofa, arroz (sem passas!) e um pouco de salada. Sua avó é cozinheira de mão cheia e capricha nas massas. O cardápio da semana entre Natal e Ano-Novo teve empadas, pizzas, panquecas e salgados fritos. No entanto, a adolescente de 16 anos se alimenta de forma equilibrada no restante do ano. “Tenho horários definidos para comer e não exagero”, explica. Por outro lado, ela não pratica exercícios físicos, alegando falta de tempo entre as atividades do colégio, trabalho como menor aprendiz, afazeres da casa e estudo para o vestibular. “Acredito que a alimentação balanceada pode ajudar com essa falta”, justifica. Será que isso é suficiente para ter uma vida saudável?
Para a nutricionista Mileni Fernandes Rosa, a resposta é, infelizmente, não. “O exercício físico regular faz parte de um estilo de vida saudável; ele faz parte da manutenção da saúde assim como a alimentação adequada. Tudo que fica parado enferruja, e com o nosso corpo não é diferente”, expõe. Ela é mestra em Políticas Públicas e Gestão Educacional e possui experiência na área de educação alimentar e nutricional em escolas. Por isso, lembra que um estilo de vida sedentário e/ou com alimentação não balanceada está atrelado a problemas de saúde, principalmente à obesidade. “Devido às mudanças demográficas e socioeconômicas, no Brasil – e no mundo – a obesidade está atualmente muito maior que a desnutrição”, revela. Mileni complementa sua fala ao frisar que o excesso de peso está ligado ao surgimento de uma série de problemas de saúde, como hipertensão arterial, doenças cardíacas, diabetes, entre outras.
Antes de mais nada, vamos definir o que é obesidade e o que é sobrepeso. Ambos os conceitos estão relacionados ao excesso de gordura corporal e implicam em riscos à saúde da pessoa. O sobrepeso é um excesso um pouco menor que a obesidade e com riscos menos acentuados. A obesidade, por sua vez, é um excesso mais marcante que inflige dano ao organismo. Por meio do Índice de Massa Corporal (IMC) é possível verificar como o indivíduo está em relação ao acúmulo de gordura no corpo (entenda melhor no box “Você está no peso ideal?”)
De acordo com o Ministério da Saúde, 6,4 milhões de crianças brasileiras estão acima do peso, sendo que 3,1 milhões evoluíram para a obesidade. Quase um terço das crianças entre 5 e 9 anos de idade têm excesso de peso. Entre as crianças menores de 5 anos, 7% já são obesas.
É importante destacar que esses números foram embasados no Índice de Massa Corporal (IMC) de crianças atendidas pela Atenção Primária à Saúde (APS) em 2019 – ou seja, antes
da pandemia de Covid-19. O isolamento social dos últimos dois anos contribuiu para o sedentarismo da população e, consequentemente, para o aumento do índice de sobrepeso e obesidade em todas as faixas etárias. No dia a dia, profissionais de educação física confirmam essa informação. Daniela Cortes faz parte desse grupo: é educadora física e pós-graduada em psicomotricidade. Atua como professora e percebeu que os alunos passaram a ser mais sedentários durante a pandemia. Além de reforçar que a falta de alimentação balanceada e de exercícios físicos é extremamente prejudicial, ela enfatiza que a responsabilidade sobre esse assunto não é apenas da escola ou do colégio que o adolescente frequenta. “Por melhor que seja o trabalho do professor, é preciso que a família esteja envolvida nesse processo. Um adolescente que possui bons exemplos dentro de casa terá maior facilidade para praticar atividade física e se alimentar bem”, comenta. Outra importante fonte de dados sobre o assunto é o Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes (Erica), que mobilizou cerca de 500 pesquisadores de 30 universidades brasileiras (acesse: erica.ufrj.br). Entre 2013 e 2014, eles coletaram informações sobre 75 mil adolescentes de 12 a 17 anos em 1.247 escolas públicas e privadas de 124 municípios. A primeira fase da pesquisa de abrangência nacional revelou que 25,5% dos participantes apresentavam sobrepeso ou obesidade, 9,6% estavam com pressão alta e 47,3% tinham Para que a baixa presença de “colesterol bom” (HDL) no sangue. No artigo “Obesidade na adolescência e atividade física seus principais fatores determinantes” (link.cpb. se torne um hábito é preciso com.br/83f07c), as pesquisadoras Carla Cristina Enes e Betzabeth Slater chamam a atenção para as mudanças fisiológicas e psicossociais pelas ter disciplina quais a pessoa passa na adolescência. Elas dese praticar algo tacam ser muito importante o desenvolvimento que você goste de bons hábitos nesse período, pois “é nessa fase que esses hábitos são estabelecidos e muitas vezes mantidos na vida adulta”. Como já foi mencionado, sobrepeso e obesidade não são questões meramente estéticas. As autoras lembram que a obesidade aumenta o risco de doença e morte na população adulta, “enquanto na população jovem esse evento vem se convertendo em um problema que causará profundas repercussões na saúde pública”. Elas ressaltam que a obesidade em crianças e adolescentes está associada ao aparecimento precoce de hipertensão arterial, colesterol alto, diabetes tipo 2 e distúrbios na esfera emocional – sem mencionar os danos à postura e as alterações no sistema locomotor. Nas últimas três décadas, diversos estudos demonstraram uma relação direta entre sobrepeso durante a adolescência e aumento do risco de mortalidade na fase adulta, especialmente por doença coronariana, isto é, obstrução gradual ou súbita de vasos sanguíneos do coração (link.cpb.com.br/472809). Além disso, segundo a pesquisa de Ana Cristina e Betzabeth, a probabilidade de um adolescente obeso ter o mesmo distúrbio aos 35 anos é superior a 30%.
ALIMENTAÇÃO DESBALANCEADA
Uma das principais causas do sobrepeso e da obesidade é a alimentação desbalanceada. O consumo exagerado de alimentos gordurosos ou com alto teor de açúcar, juntamente com uma ingestão deficiente de frutas, legumes e verduras, acentua o ganho de peso.
Ana Cristina e Betzabeth citam, por exemplo, um estudo realizado nos Estados Unidos com 1.817 adultos (link.cpb. com.br/03040b). O experimento revelou uma associação entre sobrepeso/obesidade e o “consumo de bebidas com adição de açúcar, consumo de grandes porções de alimentos, refeições realizadas concomitantemente com outra atividade, e tempo despendido assistindo televisão”.
Felizmente, no Brasil o consumo de refrigerantes por adolescentes caiu de 27,2%, em 2015, para 17,2%, em 2019, conforme indicou a última edição da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), divulgada pelo IBGE no ano passado (link.cpb.com.br/f3c6c0). Por outro lado, caiu o consumo de frutas frescas (de 30,9% para 26,9%) no mesmo período.
Um hábito alimentar ruim e que poucas pessoas sabem que está associado à obesidade é o de não tomar o desjejum. A regularidade no café da manhã favorece o consumo de alimentos saudáveis, como frutas e grãos, diminuindo o percentual de gordura ingerida. Esse hábito também está relacionado a uma regularidade na realização das refeições, o que tende a diminuir a frequência com que se come fora de hora ao longo do dia.
Além disso, hábitos alimentares influenciam fortemente o estado emocional. Para se ter uma ideia, pesquisas apontam que pessoas que seguem uma dieta rica em frutas, verduras, grãos não processados, peixes e carnes magras possuem risco de depressão 35% mais baixo que pessoas que consomem grandes quantidades de gordura e açúcar (link.cpb.com.br/add7ea).
Esses hábitos alimentares são formados desde a infância. Como explica Mileni, “desde cedo, as atitudes familiares interferem em preferências e aversões alimentares. Mas, devido às mudanças no estilo de vida da sociedade, as crianças em idade escolar às vezes passam mais tempo em instituições escolares que com a família, tendo estas agora sua parcela de responsabilidade na formação do comportamento alimentar”. Assim, os ambientes educacionais podem influenciar de forma positiva ou negativa os hábitos alimentares de crianças e adolescentes. Educadores precisam estar conscientes disso, afinal, para muitos estudantes, “eles são a personificação da escola”.
SEDENTARISMO
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil está entre os países mais sedentários. Um estudo feito pela organização e publicado em 2018 revelou que 47% dos brasileiros em idade adulta não praticavam atividade física pelo mínimo de tempo recomendado – de 150 a 300 minutos de exercícios aeróbicos moderados e/ou 75 minutos de atividade intensa por semana (link.cpb.com.br/4fb629). O dado é preocupante, especialmente quando consideramos que o sedentarismo mata mais que o tabagismo.
Ana Cristina e Betzabeth salientam que “a prática de atividade física entre jovens apresenta relação inversa com o risco de doenças crônicas não transmissíveis, dentre elas a obesidade. Além disso, o padrão de atividade na adolescência determina parte dos níveis de atividade física na idade adulta”.
As autoras apontam ainda que o tempo que crianças e adolescentes passam em frente a uma tela de TV, computador ou celular também está relacionado aos hábitos alimentares. Além de não se exercitarem por tempo suficiente, adolescentes que passam mais de duas horas por dia diante de uma tela consomem quantidades menores de legumes e frutas quando comparados a jovens que ficam menos tempo expostos às telas.
Chama a atenção o fato de que o sedentarismo tende a ser maior entre as meninas. De acordo com uma pesquisa publicada
VOCÊ ESTÁ NO PESO IDEAL?
O Índice de Massa Corporal (IMC) é uma medida internacional usada para calcular como a pessoa está em relação a seu peso ideal. Um indivíduo considerado dentro do peso normal para seu biotipo possui um IMC que varia entre 18,6 e 24,9. O cálculo é bem simples (inclusive, você encontra várias “calculadoras de IMC” na internet e apps com essa finalidade):
IMC=
peso altura x altura
Basta pegar seu peso e dividir pela sua altura ao quadrado. Por exemplo: uma pessoa com 1,65 m de altura e 70 kg fará o cálculo assim:
IMC=
70 kg 1,65 m x 1,65 m IMC=
70 kg 2,7225 m IMC= 25,7 Entendendo o resultado:
IMC = 18,5 ou menos
(abaixo do normal): Algumas pessoas possuem baixo peso como característica de seu organismo. Outros podem estar com problemas, como alguma deficiência nutricional. É preciso saber qual o caso. Por isso, procure um médico.
IMC = 18,6 – 24,9
(normal): Você está dentro do padrão esperado. Cultive hábitos saudáveis, como alimentação equilibrada e exercícios físicos regulares, para se manter dentro do peso ideal.
na Revista Brasileira de Enfermagem (link.cpb.com.br/1b94ea), é praticamente consenso em muitas publicações que as moças se exercitam menos que os rapazes. Por exemplo, a edição de 2019 da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) mostrou que 38,5% dos meninos e apenas 18% das meninas eram fisicamente ativos.
Entre as razões disso está o fato de que muitas escolas oferecem poucas atividades voltadas especificamente para as meninas. “Por motivos culturais e/ou estruturais, sabe-se que atividades de massa, como o futebol, por exemplo, são mais executadas por eles, enquanto elas adotam mais exercícios de menor gasto calórico como caminhadas”, explicam os autores da publicação.
O mesmo estudo aponta que quanto maior o poder aquisitivo e a escolaridade do indivíduo, maior a frequência com que ele se exercita. Uma explicação para esse fenômeno, segundo os autores, “talvez seja o fato de as camadas sociais mais populares terem poucos espaços públicos destinados à promoção da prática de exercícios físicos e/ou em virtude da dificuldade de deslocamento para grandes centros urbanos em ambientes propícios para essas atividades”. Daniela Cortes explica que, para que as atividades físicas se tornem um hábito na vida do adolescente, não é preciso apenas ter disciplina. “O adolescente precisa gostar da atividade física que pratica. Você precisa ‘testar’ várias coisas, como esportes diversos, academia, caminhada, corrida, até achar o que gosta”, salienta. De forma semelhante, Mileni também reforça que a alimentação saudável não precisa ser um “fardo”. Ela é, na verdade, uma ressignificação. “A educação alimentar nutricional trabalha com o pensar, agir e sentir para que as pessoas escolham seus próprios alimentos”, conclui.
Portanto, se você estiver em dúvida sobre o que colocar naquela lista de metas para 2022, que tal incluir uma reeducação alimentar e a prática de atividades físicas? Assim, você poderá curtir o banquete do fim do ano com tranquilidade, mantendo, é claro, o equilíbrio.
IMC = 25 – 29,9
IMC = 30 – 34,9
IMC = 35 – 39,9
(sobrepeso): Esta é uma préobesidade. Muitas pessoas nessa faixa já apresentam doenças associadas ao excesso de gordura no organismo, como diabetes e hipertensão. Reveja seus hábitos e busque ajuda para não entrar na faixa da obesidade. (obesidade grau I): Tome cuidado! Você precisa se cuidar, mesmo que seus exames médicos sejam normais. Mude seus hábitos e procure um nutricionista ou endocrinologista para acompanhar você. (obesidade grau II): Você precisa mudar seu estilo de vida. Repense sua alimentação, inicie uma rotina de exercícios leves e moderados e procure um médico para acompanhar seu desenvolvimento. (obesidade grau III): Alerta vermelho! É bem provável que você já tenha alguma doença associada ao excesso de peso. Você deve procurar ajuda médica com urgência e evitar que seu quadro piore.
IMC = 40 ou acima