Direito em Tempos de Covid-19: debates e perspectivas

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Universidade do Estado do Rio Grande do Norte Reitor Pedro Fernandes Ribeiro Neto Vice-Reitor Fátima Raquel Rosado Morais Diretora de Sistema Integrado de Bibliotecas Jocelânia Marinho Maia de Oliveira Chefe da Editora Universitária – EDUERN Anairam de Medeiros e Silva Conselho Editorial das Edições UERN Emanoel Márcio Nunes Isabela Pinheiro Cavalcante Lima Diego Nathan do Nascimento Souza Jean Henrique Costa José Cezinaldo Rocha Bessa José Elesbão de Almeida Ellany Gurgel Cosme do Nascimento Ivanaldo Oliveira dos Santos Filho Wellignton Vieira Mendes Diagramação Amanda Mendes de Amorim


SUMÁRIO Agradecimentos Apresentação préfacio CAPÍTULO 1 IMPACTOS DA COVID-19 NO DIREITO DO CONSUMIDOR DIJOSETE VERÍSSIMO DA COSTA JÚNIOR CAPÍTULO 2 COVID 19 E SEUS REFLEXOS NO DIREITO ECONÔMICO Sérgio Alexandre de Moraes Braga Júnior e Maria Rita Bezerra da Silva CAPÍTULO 3 COVID 19 E SEUS IMPACTOS NA POLÍTICA AMBIENTAL: REFLEXÕES E RESPOSTAS DA SECRETARIA MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE URBANISMO DE NATAL (SEMURB CARLOS SÉRGIO GURGEL DA SILVA, THIAGO DE PAULA NUNES MESQUITA E MARIA RITA BEZERRA DA SILVA CAPÍTULO 4 COVID-19 E SEUS REFLEXOS SOBRE O DIREITO À SAÚDE Valéria Maria Lacerda Rocha e Evelinny Alves de Oliveira

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CAPÍTULO 5 MICRO E PEQUENO EMPREENDEDOR E AS MEDIDAS FISCAIS DE URGÊNCIA Marlusa Ferreira Dias Xavier e Maria Rita Bezerra da Silva CAPÍTULO 6 COVID-19 E SEUS IMPACTOS SOBRE O DIREITO E POLÍTICAS INTERNACIONAIS Claudomiro Batista de Oliveira Júnior, Joelma dos Santos Faustino CAPÍTULO 7 IMPACTOS DA COVID- 19 NAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO BRASIL: ENFRENTAMENTO ATRAVÉS DAS MP Nº 927/2020, MP Nº 936/2020 E LEI Nº 13982/2020 Marcelo Roberto Silva dos Santos CAPÍTULO 8 PANDEMIA E PREVIDÊNCIA DO SOCIAL NO BRASIL: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES GLAUBER DE LUCENA CORDEIRO, SULAMITA ESCARIÃO NÓBREGA E MARIA RIRA BEZERRA DA SILVA CAPÍTULO 9 ELEIÇÕES EM TEMPOS DE PANDEMIA: ALGUMAS INDAGAÇÕES E REFLEXÕES SOBRE A TEMÁTICA DISSOCIADA DA POLARIZAÇÃO E DOS INTERESSES NÃO REPUBLICANOS Jose Herval Sampaio Júnior e Karla de Souza Leal

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agradecimentos Agradecemos, primeiramente, a Deus pela oportunidade de elaboração desta obra coletiva. Agradecemos aos colegas professores do Curso de Direito do Campus de Natal da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte que contribuíram com esta obra, em especial aos professores Carlos Sérgio Gurgel da Silva, Claudomiro Batista de Oliveira Júnior, Dijosete Veríssimo da Costa Júnior, Glauber de Lucena Cordeiro, José Herval Sampaio Júnior, Marcelo Roberto Silva dos Santos, Marlusa Ferreira Dias Xavier, Sérgio Alexandre de Moraes Braga Júnior e Valéria Maria Lacerda Rocha. Agradecemos pelas contribuições do laborioso grupo de discentes, que em longas e calorosas discussões, muito contribuíram para formação do presente trabalho, em especial: Evelinny Alves de Oliveira, Érick Jônatas Silva Freire, Joelma dos Santos Faustino, Karla de Souza Leal e Maria Rita Bezerra da Silva. Agradecemos aos nossos familiares pela compreensão pelas horas de ausência. Agradecemos à Editora Universitária (EDUERN) por engrandecer o mundo jurídico com a humilde atuação deste grupo de docentes e discentes. E, por fim, a todos aqueles que de uma maneira ou de outra contribuíram para o desenvolvimento deste projeto.

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Apresentação O presente livro é fruto de um projeto que começou no Curso de Direito da UERN no Campus de Natal durante o período da quarentena da pandemia da Covid-19. Idealizado pelo coordenador do Curso de Direito da UERN no Campus de Natal, professor Carlos Sérgio Gurgel da Silva, as lives, que receberam a denominação Direito UERN Natal na Quarentena tiveram início em 08 de abril de 2020, tendo como primeiro colaborador o professor José Herval Sampaio Júnior, que dividiu a exposição do tema: “adiamento das eleições municipais em face da pandemia? É possível? É necessário? Em que termos?” com o professor Daniel Monteiro (UFRN). Já na primeira live foi anunciada uma parceria que se manteve para as demais. Trata-se de parceria para transmissão no Canal do YouTube do Instituto Novo Eleitoral, o que se mantém até a presente data, quando a parceria já está institucionalizada através do Projeto de Extensão da UERN denominado “Lives Direito UERN Natal”, que tem como coordenador o professor Carlos Sérgio Gurgel da Silva e como membros o professor José Herval Sampaio Júnior e os discentes extensionistas voluntários Érick Jônatas Silva Freire, Evelinny Alves de Oliveira, Karla de Souza Leal, Joelma dos Santos Faustino e Maria Rita Bezerra da Silva. A ideia do e-book surgiu por sugestão do professor Sérgio Alexandre, que propôs que os conteúdos abordados nas lives fossem transformados em E-book. Até a presente data (14 de setembro de 2020) já foram realizadas 28 (vinte e oito) lives abordando temas variados, todos fazendo um link direto ou indireto com a problemática da Covid-19. A ideia é que referidas lives sejam transformadas em capítulos de livros que serão publicados como E-books temáticos, sendo este primeiro composto pelas contribuições dos professores Carlos Sérgio Gurgel, Claudomiro Batista, Dijosete Veríssimo, Glauber Lucena, José Herval, Marcelo Roberto, Marlusa Ferreira, Sérgio Alexandre e Valéria Lacerda. Trata-se de obra singular que surge no contexto em que muitos questionamentos acerca da aplicação do direito têm surgido no seio das relações entre Estado e particulares ou entre estes, em relação de horizontalidade. A obra encontra-se estruturada da seguinte forma: no capítulo primeiro, o professor Dijosete Veríssimo da Costa Júnior aborda o tema: os impactos da Covid-19 no direito do consumidor. No segundo capítulo, o professor Sérgio Alexandre de Moraes Braga Júnior e a discente Maria Rita Bezerra da Silva abordam o tema da Covid-19 e seus reflexos no direito econômico. No terceiro capítulo, o professor Carlos Sérgio Gurgel da Silva, o Secretário Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal, Thiago de Paula Nunes Mesquita e a discente Maria Rita Bezerra da Silva abordam o tema da Covid 19 e seus impactos na política am7


biental: respostas da secretaria municipal de meio ambiente urbanismo de natal (SEMURB). No quarto capítulo, a professora Valéria Maria Lacerda Rocha e a discente Evelinny Alves de Oliveira tratam do tema Covid-19 e seus reflexos sobre o direito à saúde. No quinto capítulo, a professora Marlusa Ferreira Dias Xavier e a discente Maria Rita Bezerra da Silva abordam o tema do micro e pequeno empreendedor e as medidas fiscais de urgência. No sexto capítulo, o professor Claudomiro Batista de Oliveira Júnior e a discente Joelma dos Santos Faustino tratam do tema Covid-19 e seus impactos sobre o direito e políticas internacionais. No sétimo capítulo, o professor Marcelo Roberto Silva dos Santos aborda o tema: impactos da Covid-19 nas relações de trabalho no Brasil: enfrentamento através das MP nº 927/2020, MP nº 936/2020 e Lei nº 13982/2020. No oitavo capítulo, o professor Glauber de Lucena Cordeiro, a professora Sulamita Escarião Nóbrega (Unipê – João Pessoa) e a discente Maria Rira Bezerra da Silva abordam o tema: reforma da previdência e crise econômica atual: correlações e reflexos futuros. Por fim, o professor José Herval Sampaio Júnior e a discente Karla de Souza Leal abordam o tema das eleições em tempos de pandemia: algumas indagações e reflexões sobre a temática dissociada da polarização e dos interesses não republicanos. “Desejamos a todos uma ótima leitura!” Natal/RN, 26 de junho de 2020. Prof. Dr. Carlos Sérgio Gurgel da Silva

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prefácio De início, mister se faz destacar a importância de uma obra como a presente, que se propõe a discutir o direito em tempos de pandemia de Covid-19. Seguindo a aposta de muitos, acredita-se que a vida e o direito no pós-pandemia não serão mais os mesmos. Acredita-se que a revolução tecnológica, já iniciada nas últimas décadas, terá avanços ainda maiores no pós-pandemia, a ponto de tornar a interconectividade na sociedade e nas relações dessa com os setores privados e públicos - incluindo governos - uma realidade inevitável. Este fato, certamente, trará reflexos diretos sobre as relações interpessoais, lançando desafios para a defesa de direitos fundamentais, tais como o direito à privacidade, o direito à liberdade, o direito à verdade e, porque não dizer, o direito à felicidade. Por esta razão, se mostra relevante discutir as alterações que já se observam no direito brasileiro, em todas as suas ramificações. Diante do cenário atual, pergunta-se: como não havia sido prevista situação como essa antes? Por que considerava-se uma pandemia uma realidade tão distante? A surpresa de todos - incluindo governos de superpotências - diante de uma situação como a criada pela pandemia da Covid-19, revelou-se, e ainda tem se revelado com ares de dramaticidade, sacudindo estruturas governamentais e processos econômicos como um todo. A atual realidade revela de uma forma assombrosa e desafiadora que os seres humanos não estão no controle de todas as situações. Por mais hábeis que possam ser ao utilizar ferramentas, técnicas e tecnologias, não têm o poder de evitar uma mutação viral que ocorre no interior de animais silvestres em algum ecossistema distante. Tal fato não minimiza a importância dos mais variados planejamentos estatais, mas acentua ainda mais a responsabilidade dos Estados e da sociedade para com o meio que nos cerca e nos oportuniza vida. O reflexo dessa pandemia no mundo jurídico faz-nos refletir, individual e coletivamente, sobre como a sociedade passa a enfrentar sua mudança comportamental e, como as instituições públicas e privadas observam e reagem às incursões governamentais no trato do clamor social pós-pandêmico. Neste sentido, a proposta do presente e-book, que registra na forma escrita o que tem sido discutido no projeto Direito UERN Natal na Quarentena, que teve início no dia 08 de abril de 2020 e que continua até a presente data, agora sob a qualificação de Projeto de Extensão (Lives Direito UERN Natal), mostra que o corpo docente da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte está comprometido com o estudo e discussão dos temas mais relevantes para a sociedade, não apenas natalense ou norte-riograndense, mas brasileira. Frise-se, por fim, que os impactos em praticamente todos os ramos do 9


Direito e a necessária interdisciplinaridade e transdisciplinaridade demonstram a necessidade de revisitação de muitos temas no chamado pós-pandemia. Logo é imperioso que a sociedade esteja preparada para o que hoje talvez seja o mais importante: a capacidade de adaptabilidade. Espera-se, então, que a nossa geração tenha o equilíbrio necessário de pelo menos coordenar os problemas advindos dessa pandemia para que as próximas possam continuar o encaminhamento das soluções, pois muitos dos contornos serão sentidos por muito tempo e a resiliência da sociedade com seu enfretamento cauteloso parece ser um dos caminhos mais palpáveis nesse peculiar quadro vivido. Prof. Dr. Carlos Sérgio Gurgel da Silva Prof. Msc. José Herval Sampaio Júnior Prof. Dr. Sérgio Alexandre de Moraes Braga Junior

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Capítulo 1 IMPACTOS DO COVID-19 NO DIREITO DO CONSUMIDOR Dijosete Veríssimo da Costa Júnior1 1 INTRODUÇÃO Inicialmente, quer-se deixar claro que esse artigo visa esclarecer sobre os impactos da pandemia provocada pelo coronavírus – Covid-19 – causou nas relações de consumo e seus reflexos para os consumidores, afinal, nesse momento bastante diferenciado, vive-se algo inédito, então a comunidade precisa se adaptar a essa nova realidade, a esse novo normal. Então, primeiramente, quer-se colocar aqui uma explanação inicial, dizendo que atualmente vive-se uma dicotomia entre dois princípios básicos do consumidor: de um lado, a questão da vulnerabilidade e, do outro lado, o momento de crise. E onde é que fica o consumidor dentro dessa dicotomia entre a vulnerabilidade de um lado, alguns autores chegam a falar até da hipossuficiência do consumidor, e do outro lado a questão do momento de crise?

1  Doutorando em Direito pela UFPR (2019-atual). Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2010). Graduação em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1998). Especialização em Direito Processual Civil pela Universidade Potiguar (2003). Lecionou na Universidade Federal do Rio Grande do Norte como Professor Substituto (1998-2000), na Faculdade de Natal (2002-2006) e na Faculdade Natalense para o desenvolvimento do Rio Grande do Norte (2006-2009). Atualmente, leciona na Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (desde 2003 até hoje), ocupando o cargo de Professor Adjunto III. Ex-Defensor Público do Estado do Rio Grande do Norte (foi nomeado e renunciou à posse). Procurador Legislativo Municipal em Natal/RN (desde 2007 até hoje). Advogado militante. Ex-Conselheiro Estadual da OAB/RN (2016-2018). Autor de livros e de diversos artigos científicos publicados.

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Entende-se que se precisa hoje harmonizar os interesses, afinal de contas não se pode nem observar tanto pelo lado do consumidor, nem do fornecedor. Crê-se que o momento hoje é um momento de harmonização de interesses, precisa-se repensar alguns parâmetros existentes, principalmente em relação aos conceitos clássicos em relação, por exemplo, ao dirigismo contratual, pois se faz necessário ter uma relativização desse conceito e principalmente, diante dessa situação que se vive verificar que o consumidor deixou de ser vulnerável, diante dessa pandemia da Covid-19, passando ao estado de hiper vulnerável. 2 IMPACTOS NO SETOR AÉREO E, diante desse cenário, tem-se uma situação bastante interessante, que é em relação, por exemplo, ao setor aéreo. Então, para o consumidor que tinha uma viagem programada para Europa, para os Estados Unidos, para a Ásia ou até mesmo para o Brasil, ficam as dúvidas: “E agora, eu vou poder cancelar essa minha viagem? Vou ter o direito agora de reagendar essa minha viagem? Como é que vai ficar a situação?”, “Queria viajar em julho, porque julho é a época de inverno no Sul e eu queria ver a neve e agora não vou poder mais, então vou poder reagendar agora para dezembro? Vou para Campos de Jordão em dezembro que é uma época de verão e não eu não vou ver neve?”. Porquanto, esse foi um primeiro questionamento e o Governo Federal editou a Medida Provisória (MP nº 925 de 18 de Março de 2020 que foi uma MP que se voltou para o setor aéreo, talvez até como uma medida de querer proteger esse setor, principalmente por ser um setor que, quer queira, quer não, foi bastante afetado com a pandemia2.

2 Medida Provisória nº 925, de 18 de março de 2020 O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei: Art. 1º Esta Medida Provisória dispõe sobre medidas emergenciais para a aviação civil brasileira em razão da pandemia da covid-19. Art. 2º Nos contratos de concessão de aeroportos firmados pelo Governo federal, as contribuições fixas e as variáveis com vencimento no ano de 2020 poderão ser pagas até o dia 18 de dezembro de 2020. Art. 3º O prazo para o reembolso do valor relativo à compra de passagens aéreas será de doze meses, observadas as regras do serviço contratado e mantida a assistência material, nos termos da regulamentação vigente. § 1º Os consumidores ficarão isentos das penalidades contratuais, por meio da aceitação de crédito para utilização no prazo de doze meses, contado da data do voo contratado. § 2º O disposto neste artigo aplica-se aos contratos de transporte aéreo firmados até 31 de dezembro de 2020. Art. 4º Esta Medida Provisória entra em vigor na da data de sua publicação.

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Tem-se, por outro lado, por exemplo, o setor do turismo, que foi extremamente afetado com a pandemia da Covid-19. Ora, vários hotéis, albergues e pousadas, só para exemplificar, tiveram que rever suas reservas, quer-se destacar, a questão de que a MP 925/2020 diz o seguinte, no art. 2º: Nos contratos de concessão de aeroportos firmados pelo Governo Federal, as contribuições fixas e as variáveis, com vencimento no ano de 2020 poderão ser pagas até o dia 18 de dezembro 2020.

E no art. 3° menciona: O prazo para reembolso de valor relativo à compra de passagens aéreas será de doze meses, observadas as regras do serviço contratado e mantida a assistência material, nos termos da regulamentação vigente.

Destarte, observa-se que, no caso, o consumidor queira obter o cancelamento da sua passagem aérea, pela MP 925 de 18 de março de 2020, ou seja, assim que começou a pandemia da Covid-19, entre o dia 17 e 20 de Março de 2020, esse ano que ficará na história mundial, com a obrigatoriedade do isolamento social, como medida preventiva ao contágio, esse ressarcimento poderá ser feito em até 12 meses. Qual é a orientação que deve ser dada? Acha-se melhor não requerer o cancelamento e sim pedir o reagendamento. Imagina-se a pessoa que pagou passagens para quatro membros da família, ela mais três membros, com o valor total de R$ 12.000,00, sendo R$ 4.000,00 por cada membro da família e vai receber esse montante, de acordo com a MP 925/2020, em 12 parcelas de R$ 1.000,00 e sem correção monetária nem juros de mora. Prefira-se reagendar, ficando-se com crédito com a companhia aérea, de tal forma que esse crédito, possa-se utilizar em uma data oportuna. Acha-se que essa é a melhor escolha em relação ao aspecto das passagens aéreas. Além disso, coloca-se na MP 925/2020, no seu artigo 3º, §1º, que: os consumidores ficarem isentos de penalidades contratuais por meio de aceitação de crédito para utilização no prazo de doze meses contados da data do vôo contratado.

Desse modo, tem-se até abril de 2021 para utilizar esse crédito, ao invés de pedir o ressarcimento. Se quiser pedir o ressarcimento, para não haver uma

Brasília, 18 de março de 2020; 199º da Independência e 132º da República. JAIR MESSIAS BOLSONARO Tarcisio Gomes de Freitas

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queda ou prejuízo no setor aéreo, o Governo Federal estabeleceu que esse ressarcimento seria feito em 12 parcelas. Acha-se interessante um ponto bastante importante que o Governo Federal não deu margem, ele não colocou assim: será de até 12 meses ele deixou claro que será de 12 meses; portanto, não tem como dizer assim: “ah, vou lhe ressarcir em 6 meses, em 3 meses”, não tem isso, ou seja, “Quer cancelar? Quero! O seu ressarcimento será de 12 meses e ponto final”. Assim, pois, verifica-se que não há margem de discricionariedade. Por fim, ainda sobre o cancelamento das passagens, tem-se que há pessoas que tinham passagem marcada, aconselha-se a negociar com as empresas aéreas de modo que se possa adiar a data que o bilhete poderia ser utilizado, pois a crise da pandemia da Covid-19 não é só para o consumidor, mas também para o setor. Está em discussão, uma medida legislativa para isentar o consumidor de qualquer tipo de retenção feita por parte das empresas aéreas; então se teria direito ao cancelamento e ao reembolso integral do valor. Sendo assim, para concluir lembre-se que existe a MP 925/2020, que estabelece o ressarcimento em 12 parcelas e dispensando qualquer penalidade. Essa MP diz que “o consumidor ficará isento das penalidades contratuais por meio da aceitação de crédito para utilização de no prazo de 12 meses contado da data do vôo contratado”. Então a MP deixa claro a isenção em qualquer penalidade. 3 IMPACTOS NOS PLANOS DE SAÚDE Sobre a questão dos planos de saúde, que é algo bastante complicado também foi baixada a Resolução Normativa nº 453 da Agência Nacional de Saúde3

3  RESOLUÇÃO NORMATIVA - RN Nº 453, DE 12 DE MARÇO DE 2020 - Altera a Resolução Normativa - RN nº 428, de 07 de novembro de 2017, que dispõe sobre o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde no âmbito da Saúde Suplementar, para regulamentar a cobertura obrigatória e a utilização de testes diagnósticos para infecção pelo Coronavírus. [Retificação]. A Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, em vista do que dispõe o § 4º do art. 10 da Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998; o inciso III do art. 4º e inciso II do art. 10, ambos da Lei nº 9.661, de 28 de janeiro de 2000; e a alínea “a” do inciso II do art. 30 da Resolução Regimental - RR nº 01, de 17 de março de 2017; adota a seguinte Resolução Normativa e determina a sua publicação. Art. 1º A presente Resolução altera a Resolução Normativa - RN nº 428, de 07 de novembro de 2017, que dispõe sobre o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde no âmbito da Saúde Suplementar, para regulamentar a utilização de testes diagnósticos para infecção pelo Coronavírus. Art. 2º O Anexo I da RN nº 428, de 2017, passa a vigorar acrescido do seguinte item, “SARS-CoV-2 (CORONAVÍRUS COVID-19) - pesquisa por RT - PCR (com diretriz de utilização)”, conforme Anexo I desta Resolução. Art. 3º O Anexo II da RN nº 428, de 2017, passa a vigorar acrescido dos itens, SARS-CoV-2 (CORONAVÍRUS COVID-19) - PESQUISA POR RT-PCR cobertura obrigatória quando o paciente se enquadrar na definição de caso suspeito ou provável de doença pelo Coronavírus 2019 (COVID-19) definido pelo Ministério da Saúde,

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que incluiu no rol de procedimentos de todo e qualquer de plano de saúde, no rol de procedimento e evento de saúde no âmbito da saúde suplementar, a cobertura obrigatória em utilização de testes diagnóstico para infecção do coronavírus. Logo, essa Resolução Normativa nº 453, de 12 de março de 2020, incluiu no rol de procedimentos e eventos em saúde no âmbito saúde suplementar, ou seja, qualquer plano de saúde, independentemente do tipo de plano, existe a cobertura obrigatória da utilização de testes diagnósticos para infecção pelo coronavírus. Um destaque que se deve colocar é que o teste e o diagnóstico fica coberto, mas se, por exemplo, o plano de saúde dá direito ao internamento em um apartamento e outro plano dá direito à internação ambulatorial, uma vez testado positivo o paciente para o coronavírus, será internado no apartamento4, se o plano for coberto por apartamento ou em espaços ambulatoriais, o contrato prevê atendimento ambulatorial. Se o paciente não quiser ficar no ambulatório, vai para o Sistema Único de Saúde, se houver vagas, já que as unidades de saúde estão, na sua maioria, lotadas. Logo, essa Resolução Normativa nº 453 de 12 de Março de 2020 possibilitou que toda e qualquer plano de saúde possibilita-se o teste contra o coronavírus, com um detalhe importante: não é chegar no hospital e dizer “ eu quero fazer o teste”; não é assim, precisa-se ter uma requisição médica, para realizar o teste de coronavírus . Se testou positivo, a partir dali será o que está no contrato: vai para o ambulatório ou vai para o apartamento. Todavia, têm alguns planos de saúde que estão disponibilizando um canal de atendimento no sistema de telemedicina. Então, suponha-se que o paciente esteja apresentando os sintomas da doença e liga para o sistema de telemedicina e a distância o médico pode passar uma requisição para que esse possa ir no plano de saúde fazer o teste de Covid-19? A telemedicina foi regulamentada recentemente pelo Ministério da Saúde, principalmente na questão do coronavírus e até por uma questão de proteção ao agente de saúde, tais como: médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, farmacêuticos, dentre outros. Portanto, se o médico diagnosticar a doença pelos sintomas, pode-se passar essa requisição por meio eletrônico com o uso de assinatura e certificação digitais e o paciente será encaminhado para um determinado laboratório para fazer o teste positivo, não há necessidade do atendimento presencial, alguns planos, inclusive, fazem um atendimento domiciliar.

conforme Anexo II desta Resolução. Art. 4º Esta RN, bem como seus Anexos estarão disponíveis para consulta e cópia no sítio institucional da ANS na Internet (www.ans.gov.br). Art. 5º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. ROGÉRIO SCARABEL DIRETOR-PRESIDENTE SUBSTITUTO. 4  Lembrando que esse teste é o teste rápido – RT-PCR. Se for o teste de sorologia, os planos de saúde não estão cobrindo, tendo o paciente que desembolsar para realizar o teste do IgG e do IgM para saber se já teve a doença e se já adquiriu os anticorpos.

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Logo no início da pandemia no Brasil, no mês de março de 2020, vários planos tinham ambulâncias que iam fazer o teste no domicílio. Isso pode continuar? Pode, não tem problema. Agora o plano pode colocar um local de referência, em que o paciente vai, não precisa nem sair do carro, e colhe a amostra para o teste. 4 IMPACTOS NOS CONTRATOS DE LOCAÇÃO De que forma o direito do consumidor, nesse momento de pandemia, aplica-se as relações entre locador e imobiliária ou entre imobiliária e locatário? Nessa relação entre locador e imobiliária, observe-se que a imobiliária presta um serviço ao locador. Por conseguinte, muitas vezes o locador tem uma prestação de serviços através da intermediação que a imobiliária faz na busca de um locatário, e muitas vezes tem-se um contrato que possui um seguro em que caso do locatário se torna inadimplente e mesmo assim a imobiliária tem de pagar ao locador, pois se encontra diante de um contrato de risco. Agora, essa questão é resolvida por um grande viés que é o principal norte em relação a essa pandemia que a chamada autocomposição. Assim, a imobiliária pode chamar o locador e dizer “olha, o locatário está passando por dificuldades, ele é um autônomo ou trabalhador informal e por conta disso ele está inadimplente com o valor da sua locação”. Destarte, nesse caso pode haver uma autocomposição, inclusive diluindo o valor desse aluguel ao longo do contrato. Vê-se como algo que pode ser apresentado com uma solução nesse momento de pandemia. Dessa forma, percebe-se que a relação de consumo se aplica sim nessa relação entre locador e imobiliária. Porém, tem saído a pouco tempo algumas notícias sobre a discussão e aprovação futura de uma lei que isenta o locatário do pagamento dos aluguéis. Sabe-se que isso é uma é uma temática específica e não é uma relação de consumo, a não ser que seja uma relação entre locatário e a imobiliária ou entre locador e a imobiliária, mas se acredita que acaba resvalando para direito do consumidor. Todavia, a questão do contrato locação, pensa-se que a imobiliária atua como intermediária entre o locador e o locatário, então na relação locador e locatário é uma relação de Direito Civil, mas se houve a intermediação de uma imobiliária, quer queira, quer não estar-se a prestar um serviço, e qual serviço? É um serviço de corretagem, havendo a aproximação entre locador e locatário e muitas vezes a imobiliária cobra por esse serviço. Tanto é que tem certas imobiliárias que cobram um percentual em cima do valor do aluguel, às vezes entre 5% e 10%, chega a imobiliária a cobrar até 20% do valor do aluguel. Isso é uma taxa de corretagem que se paga e é uma relação de consumo, não locatário em relação a imobiliária, mas do locador em relação a imobiliária: este contrata um serviço e esse serviço estão sim sobre a ótica do CDC. 16


5 IMPACTOS NAS MENSALIDADES ESCOLARES E uma das perguntas que mais tem chegado dos consumidores, é essa questão dos colégios. Sabe-se que os colégios estão mantendo, a maioria deles, a educação via EAD e a estrutura dos professores diminuiu, por óbvio uma parte dessa estrutura, então de algum modo tem que haver algum tipo de redução de parte dessa mensalidade ou se tem que haver algum tipo de renegociação? Ora, o contrato de prestação de serviços escolares ou educacionais que se assina é um contrato anual. Tanto é que, por exemplo, se o seu filho estuda em uma determinada escola existe a possibilidade inclusive de, por exemplo a escola cobrar a anuidade antecipada. Sendo desse modo, por exemplo, paga-se a anuidade do ano seguinte com base no valor da mensalidade do ano vigente, não se pegando o aumento nas mensalidades que geralmente acontece no mês de janeiro. A questão é a seguinte: as escolas pegam o valor da anuidade e dividem em 12 (doze) parcelas e os pais pensam que estão a pagar por mês, quando na verdade está se pagando 1/12 (um doze avos) de uma anuidade por mês. Nessa toada, quando se contrata o serviço da escola, o consumidor dos serviços educacionais está pagando por serviço que vai ser prestado de forma anual, existindo uma relação de consumo e um fornecimento de um serviço educacional que será por um ano. Aí pode-se dizer assim: “ah, mas a escola parou com a pandemia”. Se a escola parou e ela não está fazendo o serviço através de educação à distância, entende-se que nessa situação o consumidor poderá ver o ressarcimento dessa mensalidade. Por outro lado, se a escola não parou, ela está prestando serviço só que de forma diferenciada, através do ensino à distância ou de forma remota e o serviço educacional não está deixando de ser prestado, entende-se que a mensalidade deve ser mantida, levando-se em conta a possibilidade de concessão de descontos, pois os custos da escola diminuíram com energia, internet, água, dentre outros. Mas, pode haver a questão de “mas os custos diminuíram”, isso vai ser certamente um alvo de uma renegociação contratual já que o próprio CDC, no artigo 6º inciso V deixa claro que há possibilidade de revisão contratual5. O interessante seria, por exemplo, através da associação de pais, estes chegarem e dizerem: “os custos agora são outros, vamos agora rever, você vai me dar a pos-

5  Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

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sibilidade de crédito em relação a esses custos que diminuíram, a final de contas você não teve custo com energia, não teve custo com água, não teve custo para limpeza das salas, a higienização das sala”, enfim, isso pode ser discutido. Acha-se que este é o momento ir buscar no setor financeiro da escola um eventual desconto nas mensalidades, especialmente devido ao isolamento e ao distanciamento social causados pela pandemia da Covid-19. Por fim, respondendo à questão das escolas, tem-se que verificar, nesse momento, não só o lado do consumidor mas também lado do fornecedor e como o contrato é um contrato anual e não um contrato mensal, não se paga para ter aula, na verdade, assina-se o contrato anual. Se o consumidor pagar todo contrato que assinou com a escola, esse deixa claro que será uma prestação de serviço e começar no mês de janeiro e finalizará no mês de dezembro. O consumidor pode pagar tudo de uma vez? Pode e esse pode pagar de forma parcelada. Conclui-se que nessa temática, tem-se que enfrentar dialogando, porque não se pode olhar somente sobre esse viés unilateral, é impossível se olhar só para um lado, principalmente em uma situação excepcional como essa da pandemia da Covid-19. Enfim, mesmo havendo uma proteção para o direito do consumidor, a melhor forma de se compor essas situações, desse momento, é através do diálogo. Uma observação sobre a questão das escolas que agora estão, nesse período de quarentena, disponibilizando conteúdo por videoconferência até como uma forma de justificar a cobrança de mensalidades, acredita-se que deve ser nesse sentido, até porque certos conteúdos têm perdas, porque por exemplo se esteja lidando com crianças com necessidades especiais, crianças com Transtorno de Déficit de Atenção, outras crianças com autismo. E nesses casos os pais teriam direito a algum abatimento da mensalidade? É como já fora dito: nada no direito do consumidor é algo que se pode dizer que aquilo está pré determinado. Um caso excepcional, em que um pai e uma mãe tem um filho autista ou alguém que tenha alguma deficiência física ou mental, pode sim procurar o setor financeiro da escola, dizer que a criança não está acompanhando o EAD e pedir sim, o abatimento do valor do serviço; entende-se que é algo que pode ser sim estabelecido. Cita-se um exemplo: a sala de aula tem uma criança excepcional e a escola está fazendo EAD de forma diferenciada; logo, a professora faz um planejamento de aula para os alunos como todo e faz um planejamento de aula diferenciada para essa criança que tem uma deficiência e ela não está deixando de acompanhar. Então, como se pode ver, a prestação de serviço não deixou de ser feita e ela está tendo um acompanhamento, mesmo em EAD. Agora, se isso não ocorrer, logicamente, há a possibilidade de abatimento e até mesmo uma suspensão dos valores da mensalidade, de forma excepcional. 18


6 IMPACTOS NAS ACADEMIAS DE GINÁSTICAS Agora, pegando um gancho em relação às escolas, vejamos, por exemplo, em relação as academias de ginástica. Se o consumidor fizer um plano anual e as academias estão paradas, há uma suspensão da prestação de serviço, a academia não está prestando serviço à distância, afinal de contas precisa ter um personal trainer ou um professor da academia para poder te dizer “pegue peso tal, ande tanto, pegue tal equipamento”. O que aconteceu? As grandes academias, como a Smartfit, a Bodytec, a Selfit e tantas outras academias grandes, o que fizeram? Deram a opção de cancelar o seu plano ou então esse período que vai de Março/2020 até o final da pandemia, o que eles fizeram? Eles colocaram lá no final do contrato. Logo, há uma suspensão do contrato de prestação de serviço e as academias não estão cobrando. Se o consumidor fez um plano anual, por exemplo, mas a academia pega esses meses que foram suspensas as atividades e jogam para o final do contrato; é o que as academias estão fazendo e também outros cursos, como por exemplo, tem curso de aula de música: se você quiser optar por ter a aula online você pode, ou então aqueles meses e que coloca para o final de contrato, isso pode ser feito. 7 IMPACTOS NO PODER DE POLÍCIA MUNICIPAL Fala-se que as prefeituras teriam caçado alvarás dos estabelecimentos comerciais em razão do abuso de uma venda. Isso não constituiria, um abuso de poder? Ora, existe uma questão de Direito Administrativo, uma questão de legalidade, da inconstitucionalidade da medida por parte do município. Concorda-se plenamente, crê-se que se, por exemplo, um estabelecimento comercial que presta assessoria na empresarial for fechado por uma questão de legislação municipal, certamente é algo que pode levar para ao Poder Judiciário para questionar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade em relação a essa medida. 8 IMPACTOS NAS FESTAS, NOS EVENTOS E NOS SHOWS Em relação ao cancelamento de festas, eventos e shows, verifica-se que há possibilidade de devolução integral para quem tenha pago por um congresso, por um evento, por um show, por uma festa, devido a questão da pandemia do coronavírus da Covid-19. Então, existe esse entendimento de que o consumidor tem direito de pedir a devolução do valor pago, caso não tem interesse em receber um voucher para uso em data futura. Lembrando que se o fornecedor negar essa devolução, isso considera-se sim, uma cláusula abusiva de acordo com o CDC; mas não im19


pede às partes negociarem para que essa evolução seja feita de forma parcelada, ninguém pode agora exigir: “eu paguei tanto quero tanto agora de uma vez só” Por quê? Porque sabe-se muito bem que o comércio está parado, tem muita gente que não está faturando e tem as suas obrigações, e sabe-se que não pode exigir de imediato uma devolução integral, mas uma devolução parcelada. 9 A SAÍDA DOS VOUCHERS PARA USO FUTURO Os salões de cabeleireiro que estão vendendo voucher para utilização futura. Está certo isso? Sem dúvida é uma forma de sobreviver comercialmente no curso da pandemia da Covid-19, não só dos salões de beleza mas também das clínicas de estética, nesse momento difícil. Não se vê como algo abusivo, afinal de contas o(a) empreendedor(a) está colocando a possibilidade de uso em uma data futura, Vê-se que muitas mulheres estão usando desses vouchers, já que muitas vezes acontece um desconto especial, às vezes de 30%, 40% até 50% e muitos estão se utilizando disso para fazer com que aquele salão de beleza, aquela clínica de beleza, aquele salão de cabeleireiro não fechem. Acredita-se que é importante começar-se a valorizar o nosso microempreendedor local; então, se tem um salão de beleza no seu bairro, que você corta o cabelo e este está te dando oportunidade desse voucher, ajuda-o; não se vê como abusivo tanto é que algo que é facultativo. Deixa-se a orientação para o consumidor em relação ao prazo de validade desse voucher, pois o prazo de validade tem que ser de pelo menos seis meses, para que se possa utilizar ou quem sabe até por um ano, porque não sabe até onde vai a questão da pandemia, mas é uma forma de ajudar o comércio local, nesse momento difícil da toda a economia. 10 DENÚNCIAS POR PRÁTICAS ABUSIVAS Passar-se, doravante para algumas considerações sobre como o consumidor pode denunciar, nesse momento, práticas abusivas nas relações de consumo, porque, por mais que se saiba que possa haver práticas abusivas, nesse momento, o momento é de excepcionalidade. Tem-se a ideia que não é o momento normal, tem-se que olhar também o lado do fornecedor de produtos e serviços. Tem-se que preocupar com o direito do consumidor? Tem! Mas no caso do turismo, inclusive, que liga muito ao nosso País, em vez de pedir o cancelamento, pedir o reagendamento, até como forma de ser solidário com o setor turístico. Diante disso, claro que sempre se preocupa com o consumidor, mas práticas abusivas vão continuar acontecendo, sabe-se, mas como se pode se preo20


cupar também em denunciar essas práticas, mas ver esse equilíbrio que se precisa nesse momento? Essa questão é bastante interessante e está acontecendo muito. O preço de uma máscara, de uma caixa de máscara, antigamente, não chegava a R$ 50,00. Hoje tem caixa de máscaras vendidas por R$ 300,00. Isso, sem sobra de dúvidas, se traduz em um ato ilícito e em um abuso de direito, que é vedado pelo próprio Código de Defesa do Consumidor (CDC), tanto no seu art. 6° 6, como nos arts. 39 e 51 do CDC7 , que falam das práticas abusivas. E qual é o mecanismo que

6  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078compilado.htm 7  Art. 6º São direitos básicos do consumidor: I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos; II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações; III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de 2012) Vigência IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços; V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas; VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados; VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; IX - (Vetado); X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral. Parágrafo único. A informação de que trata o inciso III do caput deste artigo deve ser acessível à pessoa com deficiência, observado o disposto em regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência) Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994) I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos; II - recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes; III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço; IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde,

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o consumidor tem para rebater isso?

conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços; V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; VI - executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes; VII - repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos; VIII - colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro); IX - recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais; (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994) X - elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços. (Incluído pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994) XI - Dispositivo incluído pela MPV nº 1.890-67, de 22.10.1999, transformado em inciso XIII, quando da conversão na Lei nº 9.870, de 23.11.1999 XII - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério. (Incluído pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995) XIII - aplicar fórmula ou índice de reajuste diverso do legal ou contratualmente estabelecido. (Incluído pela Lei nº 9.870, de 23.11.1999) XIV - permitir o ingresso em estabelecimentos comerciais ou de serviços de um número maior de consumidores que o fixado pela autoridade administrativa como máximo. (Incluído pela Lei nº 13.425, de 2017) Parágrafo único. Os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento. Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis; II - subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código; III - transfiram responsabilidades a terceiros; IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; V - (Vetado); VI - estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor; VII - determinem a utilização compulsória de arbitragem; VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor; IX - deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o consumidor; X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral;

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Primeiro, tem que fazer uma denúncia no PROCON, como o PROCON está com atendimento telepresencial por causa da pandemia, verificar se há algum canal para ser feito essa denúncia através do Procon via teletrabalho8. Segundo, fazer um Boletim de Ocorrência virtual, através do site da Secretária Estadual de Segurança Pública9 e tem um link chamado “boletim virtual” que a pessoa faz uma denúncia a DECON que é a delegacia do consumidor e já instaura um inquérito policial por crime tanto contra o consumidor, quanto contra a economia popular. E a terceira via, que também acontece, é o site chamado consumidor. gov.br 10. Recomenda-se aos consumidores a fazer uma denúncia nesse canal chamado consumidor.gov.br, que está ligado à Secretaria Nacional do Consumidor e de posse dessa denúncia, se a pessoa tiver sido prejudicada de alguma forma, pode entrar com uma ação no Juizado Especial Cível, que está funcionando de forma remota, inclusive para concessões de liminares, concessão de tutelas de urgência.

XI - autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor; XII - obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor; XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração; XIV - infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais; XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor; XVI - possibilitem a renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias. § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence; II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. § 2° A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes. § 3° (Vetado). § 4° É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente requerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser declarada a nulidade de cláusula contratual que contrarie o disposto neste código ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes. 8   E-mail: procon.natal@natal.rn.gov.br 9  https://www3.defesasocial.rn.gov.br/BoletimCidadao/index.jsf 10  https://www.consumidor.gov.br/pages/principal/?1591912664559

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É o caminho utilizado em relação ao abuso de direito do consumidor nesse momento. É terrível, porque se está em um momento de pandemia, mas, infelizmente, existem pessoas não veem que a situação é de mais proximidade com o próximo e que na verdade prejudica o outro. Houve casos de mais de 1.000% de aumento, o álcool em gel do pequeno, antigamente, se encontrava por R$ 2,00, tem gente vendendo por R$ 50,00. O pacote de máscara está sendo vendido a 80/100 reais, realmente não se pode admitir, no momento que mais se precisa disso, é terrível mesmo, tem-se que realmente denunciar. E mais, o pessoal que mais está necessitando hoje são os hospitais, principalmente da máscara NR-95; esses comerciantes inescrupulosos tiraram do mercado essas máscaras, estão vendendo a preços inescrupulosos, estão prejudicando, inclusive, porque essas máscaras Nr-95 só devem ser usadas por profissionais da saúde e estão sendo vendidas a preço de ouro, não só cometendo crime contra a ordem do consumidor e ao mesmo tempo criando caos na saúde pública, pois não há necessidade de que a população use essa máscara NR-95. No caso de se ir em uma farmácia e que se encontre o álcool em gel em um preço exorbitante ou então a máscara, o fornecedor da farmácia podem alegar que já tem comprado o produto com preço elevado e que por isso ele revende por um preço elevado? Então até que ponto está culpa do fornecedor da farmácia no caso? Porque existe toda uma cadeia por trás do preço e a situação é uma situação excepcional. Então, será que isso poderia minimizar a responsabilidade do fornecedor? Sim, sem dúvidas, é tanto que o próprio PROCON, quando vai fazer a fiscalização, pega a nota fiscal do fornecedor primário. Então, se tiver havido um aumento no custo do produto, pode o fornecedor secundário repassar para o consumidor; agora se esse comprou por X e está vendendo por Y e não houve uma comprovação de que a nota fiscal do fornecedor primária houve algum aumento, consequentemente tem-se um provável crime contra o consumidor e contra a economia popular. Agora, isso é alvo de uma investigação criminal, a delegacia do consumidor fará uma investigação sobre o caso concreto. Houve um caso recentemente em Fortaleza-CE, que determinada farmácia estava vendendo o álcool gel que o preço final de venda era R$ 1,99 e com essa pandemia da Covid-19, simplesmente colocou-se um a mais na frente do preço, ou seja, passou-se a vender por R$ 11,99. Um absurdo e um evidente abuso de direito!!! Portanto, isso é algo repugnante e precisa-se ser combatido pelos órgãos de fiscalização e controle, tais como: a Secretaria Nacional do Consumidor, a Delegacia do Consumidor, o Ministério Público, que tem a Promotoria de Defesa do consumidor, dentre outros. Sendo assim, levando-se ao Judiciário, esse terá que realmente aplicar uma multa e existem casos, inclusive, de algumas prefeituras que já estão caçando o alvará de funcionamento das empresas que tem abusado do consumidor.

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11 CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante de todo exposto, tem-se que nesse momento de pandemia, o mais importante é a proteção da vida e da segurança do consumidor. Porém, sem sombra de dúvidas, é necessária a preservação dos contratos firmados entre os consumidores e dos fornecedores, sem que eventuais alterações possam causar prejuízos financeiros para quaisquer das partes. Não se pode deixar de lado de valorizar a vulnerabilidade do consumidor nesse momento de crise, especialmente com a pandemia da Covid-19. Logo, sugere-se que haja a harmonização de interesses entre o consumidor e o fornecedor. Sendo assim, está-se passando por revisões severas nos conceitos clássicos aplicados aos contratos consumeristas. Por conseguinte, orienta-se nesse momento difícil para toda a economia que se intensifique a autocomposição entre os consumidores e os fornecedores de produtos ou de serviços, devendo se ter cuidados com os oportunistas, devendo, pois, serem denunciadas as várias práticas abusivas, com fulcro especialmente nos artigos 42 e 51 do CDC. Por derradeiro, tem-se que buscar nessa época de pandemia à promoção de alívios imediatos para as empresas fornecedoras de produtos ou de serviços, sem deixar de lado os princípios protetores dos consumidores, de modo mais enfático reconhecendo a excepcionalidade do atual cenário. Tais medidas aqui sugeridas trarão uma desejável flexibilidade aos consumidores e aos fornecedores em face da incerteza sobre o tempo de prorrogação dessa pandemia da Covid-19 e a retomada da economia, com a correspondente restabelecimento das atividades laborais e de lazer, sempre ressaltando a urgência na adoção dessas medidas.

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REFERÊNCIAS BRASIL. Poder Executivo da União. Medida Provisória nº 925, de 18 de março de 2020. Brasília/DF, mar 2020. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2019-2022/2020/Mpv/mpv925.htm>. Acesso em 11 jun. 2020. BRASIL. Agência Nacional de Saúde Suplementar. Resolução Normativa – RN nº 453, de 12 de março de 2020. Brasília/DF, mar 2020. BRASIL. Poder Executivo da União. Código de Defesa do Consumidor. Brasília, DF, mar 2020. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/ L8078compilado.htm>. Acesso em: 11 jun. 2020.

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Capítulo 2 COVID-19 E SEUS REFLEXOS NO DIREITO ECONÔMICO Sergio Alexandre de Moraes Braga Junior 11 Maria Rita Bezerra da Silva12 1 INTRODUÇÃO Quem recebeu as primeiras informações sobre o novo coronavírus13 , ainda no final de 2019, não poderia imaginar que três meses depois o número de infectados no mundo chegaria a mais de 190 mil pessoas, em todos os continentes. O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde-OMS14 , Tedros Adhanom Ghebreyesus, no dia 11 de março de 2020, em Genebra, na Suíça, anunciou que a Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, era caracterizada como uma pandemia. No Brasil15 , as primeiras ações ligadas à pandemia da Covid-19 começaram em fevereiro, com a repatriação dos brasileiros que viviam em Wuhan, cidade chinesa epicentro da infecção. Em 15 dias, o país confirmou a primeira contaminação,

11  Doutor em direito pela Universidade Federal de Pernambuco, Mestre em direito pela Universidade Federal do Ceará, Coordenador Operacional do Doutorado Interinstitucional-DINTER da UERN com a UFPR, ex Coordenador do Mestrado Interinstitucional-MINTER da UERN com a UFRN. 12  Acadêmica do sétimo período do Curso de Direito da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte no Campus de Natal, membro do Projeto de Extensão Lives Direito UERN Natal. 13  SANARMED. Linha do tempo do Coronavírus no Brasil. Disponível em: <https://www.sanarmed.com/linha-do-tempo-do-coronavirus-no-brasil>. Acesso em: 20 maio 2020. 14  ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE – OMS. OMS afirma que COVID-19 é agora caracterizada como pandemia. Disponível em: <https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_ content&view=article&id=6120:oms-afirma-que-covid-19-e-agora-caracterizada-como-pandemia&Itemid=812>. Acesso em: 20 maio. 2020. 15  Sanarmed, 2020, extraído da internet.

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quando a Europa já confirmava centenas de casos e encarava mortes decorrentes da Covid-19. O governo federal utilizou-se, inicialmente, da Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 202016 , que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. A atual crise da Covid-19, associada a essa depressão ou recessão econômica, que estamos vivendo, são consequências disso. O Estado, então, passou a fazer uso de instrumentos do Direito Econômico por isso. Em primeiro lugar, para os observadores, tem que se entender o seguinte: o Direito Econômico se propõe a quê? O Direito Econômico se propõe, em determinadas oportunidades, a regular a atividade econômica, atendendo aos princípios constitucionais previstos no artigo 170 da Constituição Federal. Essa regulação, normatização ou, para alguns liberais, até intromissão, visa buscar a estabilidade social, objetiva manter-se qualidade de vida das pessoas, com o menor dissabor possível, com a ação do Estado sobre a Ordem Econômica, de maneira a permitir que todos venham a satisfazer suas necessidades, sem destruir o meio. E para isso, que temos uma Constituição economicista, estratificada justamente com o capítulo da Ordem Econômica (arts.170-181), que estabelece essa principiologia. Graças a esses pressupostos constitucionais, o país possui um SBDC- Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência 17, previsto pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (SAE). Nessa formação, o Direito Econômico atua com essa finalidade, de tentar então formalizar essas relações econômicas, na relação onde o Estado interfere, em alguns momentos críticos. E, essa interferência ou essa ação (ou conjunto de atividades) serve, na verdade, muito mais para apaziguar os possíveis conflitos que venham a existir, seja como a monopolização, oligopolização, cartelização ou com o abuso de poder econômico 18 que se observa.

16  Art. 1º Esta Lei dispõe sobre as medidas que poderão ser adotadas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. 17  BRASIL. Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011. Estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência; dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica e dá outras providências. Diário Oficial da União, 1 dez. 2011. Disponível: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12529.htm>. Acesso em: 20 maio 2020. 18 CF/88. Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. [...] § 4º A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à elimi-

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Salienta-se, como agravante, a coexistência da pandemia da Covid-19 e de crimes específicos para a vitimação de agentes econômicos. Constituem crimes contra a economia popular, em função do superfaturamento de produtos e de serviços essenciais à prevenção de contágio da doença (artigo 61, II, “j”, do Código Penal) e em razão da venda de fármacos inócuos (artigo 273 do Código Penal). Em verdade, além dessas ações delituosas refletirem o desrespeito ao estado de calamidade pública, revelam abusos à boa-fé das vítimas, porquanto podem ocorrer à pretexto de ajuda humanitária, a exemplo das oportunidades financeiras fornecidas por estelionatários e da receptação fraudulenta de recursos19 .  2 DIREITO ECONÔMICO A partir da Primeira Guerra Mundial, a política econômica ganhou evidência, assim como a política social. A exigência crescente de democratização da sociedade exige também mais centralização econômica e maior controle estatal sobre a economia20 . Celso Ribeiro Bastos21 , denota que o período de marco desenvolvimentista do Direito Econômico dispõe como uma composição jurídica afim de regular a intervenção estatal na Economia conota do momento pós-Primeira Guerra Mundial (1914-1918), especificamente quando da noção trazida de Estado do Bem-Estar Social (Welfare State). O Direito Econômico surgiu nesse contexto, da própria necessidade do século 20. Isto ocorreu com a crise de 29 e com a quebra da bolsa de Nova York, através de uma superprodução americana, surge a necessidade da ação estatal. Devido a isto, os Estados Unidos passaram por uma crise que mudou sua identidade. Um século depois, guardadas as devidas proporções, o que se espera entre nós é um direito econômico para uma economia de guerra – mais precisamente, uma matriz jurídica para uma espécie de New Deal num contexto pós-keynesiano, de políticas basicamente fiscalistas e hostil a medidas anticíclicas22 .

nação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros. 19  GABARDO, Emerson. O abuso da leitura moral da Constituição: uma crise dos instrumentos de combate à crise. Crise econômica e Soluções Jurídicas, n. 67, jan. 2016. 20  BERCOVICI, Gilberto. As Origens Do Direito Econômico: Homenagem A Washington Peluso Albino De Souza. Rev. Fac. Direito UFMG, p. 253-263, 2013. Número Esp. em Memória do Prof. Washington Peluso. 21  BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito econômico. São Paulo: Celso Bastos Editor, 2003. p. 51. 22  FARIA, José Eduardo; ROCHA, Jean-Paul Veiga. Um Direito Econômico de ‘guerra’. Jota, 9 maio 2020. Disponível em: <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/um-direito-economico-de-guerra-09052020>. Acesso em: 9 maio 2020.

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O Direito Econômico luta por harmonizar as medidas de políticas econômicas públicas e privadas, através do princípio da economicidade, com a ideologia constitucionalmente adotada. De acordo com Peluso23 é “o ramo do Direito que tem por objeto a regulamentação da política econômica e por sujeito o agente que dela participe. Como tal, é um conjunto de normas de conteúdo econômico que assegura a defesa e harmonia dos interesses individuais e coletivos, de acordo com a ideologia adotada na ordem jurídica” Faria e Rocha24 defendem um direito econômico para tempos de guerra, sem olvidar do caráter diferenciador da era Roosevelt, quando ainda pouco se falava no que Schumpeter descreveria em 1942 como processo de destruição criativa. E quando também não se imaginava o alcance do desemprego estrutural causado pela substituição do trabalho braçal pelo trabalho robotizado nem o fenômeno da transterritorialização dos mercados e o surgimento de cadeias globais de valor, com as indústrias de diferentes países conectadas para a fabricação de um determinado produto. Washington Peluso de Souza25 trata da realidade econômica como objeto do Direito Econômico, ao ressaltar em seus estudos a relação necessária entre o Direito Econômico e os direitos sociais e individuais: Temos, portanto, a realidade econômica como seu objeto mais próximo e ainda não peculiar. Esta peculiaridade decorre da sua visão mais ampla na participação que recebeu da ação dos indivíduos e do Estado, tomada do ângulo de pretensões mais altas, como seja o desenvolvimento, ou dos interesses mais legítimos por uma qualidade de vida melhor, como a decorrência dos controles dos preços, dos freios jurídicos sobre os efeitos da concentração das empresas, das conseqüências dos monopólios e outras formas de abuso de poder econômico; ou, por outro lado, da garantia de oportunidades de emprego, da política salarial, de mais justa distribuição de renda, do tratamento dos efeitos da política monetária, dos frutos da política de estímulos, de planejamento, e assim por diante.

Inclusive, a influência exacerbada das teorias neoconstitucionais e do antipositivismo ideológico26 sobre as autoridades públicas constituem pressupostos jurídicos para o aprofundamento da crise ora elencada, à medida que o protagonismo da moralidade concorre com a aplicabilidade dos direitos fun-

23  SOUZA, Washington Peluso Albino de. Primeiras linhas de direito econômico. Belo Horizonte: Fundação Brasileira de Direito Econômico, 1977. p. 23. 24  SOUZA, 1977, p. 23. 25  SOUZA, Washington Peluso Albino de. O discurso intervencionista nas Constituições brasileiras. Cadernos de Direito Econômico, São Paulo, n. 1, p. 170,1983. p. 11-12. 26  “Não é exagero afirmar que há no Brasil um abuso, por excesso, das teorias neoconstitucionais, bem como do antipositivismo ideológico.” Ver em: GABARDO, 2016.

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damentais27 . Certamente, os tomadores de decisões28 não devem ignorar os fatores materiais econômicos, mas devem buscar , na verdade, um fundamento racional e essencialmente constitucional. No ordenamento jurídico nacional o Direito Econômico está expresso na Carta Maior, no art.24 da CF/88, em caráter concorrente29 , in litteris: “Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico”. No centro do sistema econômico mundial, o direito econômico 30 substituiu, de certo modo, o direito privado e a lógica da codificação como instrumento jurídico garantidor da estabilidade do sistema 31. Analisaremos os fenômenos históricos geradores desse grande processo no próximo tópico do texto. 3 CRISE DE 1929 - GRANDE RECESSÃO - NEW DEAL Ora, isso partiu da percepção de Franklin Delano Roosevelt, presidente americano, que implementou o New Deal. O New Deal é compreendido como “novo acordo”, que foi justamente um novo viés no Direito Econômico, com o caráter intervencionista, fazendo com que o Estado tivesse um papel crucial na saída da recessão.

27  “Uma moralidade que tem assumido tal protagonismo que passou a concorrer tanto com o interesse público quanto com os direitos fundamentais como critério de decisão (ainda que, na busca de uma fundamentação racional, sejam utilizados, simbólica e retoricamente, estes fundamentos).” Ver em: Ibid. 28  “O fato e que não são somente os juízes estão na berlinda; os agentes tomadores de decisão estão em todos os poderes quando se trata de deliberações no exercício da função administrativa - e, atualmente, não se constrangem em aplicar uma justiça de base na moral social que acreditam ser a mais proeminente. O problema é que a “moral social” é perigosa e não tem respaldo constitucional.” Ver em: Ibid. 29  Desse modo, Dallari (2006, p. 4) pondera que: “Uma questão de grande importância, por suas implicações teóricas e práticas, e que tem sido objeto de controvérsias, é o sentido da expressão ‘normas gerais’, usada na Constituição, no § 1o . do artigo 24, para definir a competência legislativa da União, no âmbito das competências concorrentes. Não têm sido raras as vezes em que, por inadvertência ou deliberadamente, o legislador federal tem fixado normas sobre pontos particulares, de caráter regional ou local, de matéria sobre a qual só poderia fixar normas gerais. Nesses casos, aquilo que constar de lei federal e que não se caracterizar, pelo conteúdo, como norma geral será inconstitucional, por exorbitância no exercício da competência legislativa”. DALLARI, Dalmo de Abreu. Normas gerais sobre saúde: cabimento e limitações. Disponível em: <http://saudepublica.bvs.br/lildbi/docsonline/1/2/121-Dalmo_Dallari_Normas_gerais.doc>. Acesso em: 12 nov. 2006 30 BERCOVICI, 2013, p. 253-263. 31 Vide GOMES; VARELA, 1977, p. 17-27, 71-128 e 167-176, entre inúmeras outras passagens.

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Faria e Rocha32 lecionam que pós a quebra da Bolsa de Nova York, no final da década de 1920 quando a Grande Depressão eclodiu, houve quem criticasse qualquer interferência estatal, sob a justificativa de que o mercado saberia se autorregular, na idealização da “mão invisível” de A.Smith. Franklin Roosevelt, um democrata eleito com base num programa de intervenção econômica e social, o New Deal, voltado à recuperação econômica e à proteção das classes mais prejudicadas pela crise. Eles assim expressam: O New Deal não apenas envolvia um conjunto de ações regulatórias nos campos econômico e social, como também abria caminho para a promoção de direitos e implementação de programas sociais fundamentais para a eficácia das liberdades básicas dos cidadãos.

Com a crise de 29 surge o New Deal, pois o presidente Franklin Delano Roosevelt tinha que implementar, com a recessão americana, a busca keynesiana. John Maynard Keynes, professor inglês, veio a implementar a ideia que o liberalismo primitivo não tinha mais vez, pois deveria se ter a possibilidade de o Estado intervir na economia, justamente para fazer com que a atividade produtiva viesse a se ocupar, realizando grandes obras, contratando grande quantidade de pessoas, adquirindo bens e serviços do comércio, vindo a empregar, mesmo que fosse uma economia com atividades primárias, em pequenas localidades distanciadas. É com a Grande Depressão e o New Deal que chega a seu ponto culminante o longo percurso de revisão do capitalismo liberal e dos standards jurídicos erigidos pela Common law. Veja-se, neste sentido, o comentário esclarecedor de Cass Suinstein33 : Para os reformistas do New Deal, o common law não era nem natural nem pré-político. Pelo contrário, ele incorporava uma teuria social determinada, qlle atendia a certos interesses às custas de outros. Particularmente, os New Dealers viam o common law como ummecanismu de insulamento da distribuição existente de riqueza e de benefícios legais em relação ao controle coletivo. O catálogo de direitos do common law incluía, ao mesmo tempo, muito e muito pouco - uma excessiva proteção do interesse estabelecido dos proprietários e uma proteção insuficiente dos interesses dos pobres, idosos e desempregados.

32  FARIA; ROCHA, 2020, extraído da internet. 33  SUNSTEIN, Cass R. O Constitucionalismo após o The New Deal. In: MATTOS, Paulo (coord.). Regulação Econômica e Democracia: O Debate Norte-Americano. São Paulo: Editora 34, 2003. p. 132.

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John Maynard Keynes34 disse em sua Teoria geral: “Cavar buracos no chão, pagando com nossa poupança, aumentará não apenas o emprego, mas o dividendo nacional real de bens e serviços úteis”. Disse: “consiga uma grande quantidade de trabalhadores que eu lhe faço uma grande obra, porque o valor da mão-de-obra vai ser muito baixo” e aí resultado? Durante uma parte do dia um grupo trabalha e vai ganhar, além de um prato de comida, uma pequena quantidade de moedas e, na outra parte do dia, outra quantidade de pessoas vem a trabalhar nessa mesma obra. Isso dá-se o reflexo de que o Estado passa a ser um grande agente econômico, um grande ser indutor e, por essa ação indutora faz com que se dinamize toda a atividade econômica. Exemplo disso é a realidade econômica nordestina. Um reflexo que se teve há mais de 50 anos no Nordeste, se deu justamente o que se chamava da “indústria da seca”, quando os trabalhadores recebiam uma pequena gratificação por dia, para uma “frente de serviço” ou local de trabalho. Hoje se percebe essas ideias, que já tinham sido empregadas em 29, o que se denominou de “teoria dos buracos”. Na periferia do sistema capitalista, o direito econômico se estabelece com o desenvolvimentismo e o início do processo de industrialização, na década de 1930 . Não por acaso, Luiz Gonzaga Belluzzo afirma que o desenvolvimentismo da periferia nasceu no mesmo berço que produziu o keynesianismo no centro35 . Exatamente por estar vinculada à industrialização e às transformações estruturais, a apropriação das ideias keynesianas pelos desenvolvimentistas latino-americanos, como Raúl Prebisch e Celso Furtado, entre outros, irá associar o keynesianismo a uma posição muito mais emancipatória e progressista do que a preponderante no centro do sistema36 . Hoje, com a pandemia, vivemos a era do “home office”, como já era previsto por Tofler 37 há quarenta anos.

34 KEYNES, John Maynard. Teoria geral do emprego, do juro e da moeda. Reino Unido: Palgrave Macmillan, 1936. 35  BELLUZZO, Luiz Gonzaga de Mello. Ensaios sobre o Capitalismo no Século XX. São Paulo: Editora UNESP, 2004. p. 38-39. 36  BERCOVICI, Ibid. 37  TOFFLER, Alvin. A Terceira Onda, Rio de Janeiro: Record, 1980.

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4 ESTADO COMO AGENTE ECONÔMICO O papel do Estado38 , nessa matriz, é justamente realizar a formação de subsídios. E subsídios podem se constituir das mais variadas formas, como uma bolsa para um estudante, como pode ser uma redução de tributação para o empresário. Subsídio pode se configurar, desde o treinamento de mão-de-obra até a oferta de um programa social em massa, então, logicamente, existe um conjunto de enorme de incentivos que podem ser dados planejada ou, até, inadequadamente. Vale lembrar que a discussão que não é só econômica, mas também social, antropológica e jurídica. Neste prisma, o artigo 17439 da Constituição Federal, na ordem econômica, diz que é dever do estado realizar o planejamento, o fomento e a fiscalização. Desse modo, o poder de polícia que se detalha em direito tributário, no artigo 7840 do Código Tributário. O mega poder de polícia, que foi extremamente amplificado, com a agenciação desde o governo Fernando Henrique, com a criação das agências reguladoras 41 do Brasil todo.

38  UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS – UFMG. Pandemia do coronavírus redefine papel do Estado, avaliam professores. Notícias externas, 9 abr. 2020. Disponível em: <https:// ufmg.br/comunicacao/noticias/pandemia-coloca-neoliberalismo-em-xeque-avaliam-professores-do-direito-economico>. Acesso em: 4 maio 2020. 39 CF/88.Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. § 1º A lei estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado, o qual incorporará e compatibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento. 40  Art. 78 do CTN- Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. Parágrafo único - Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder. 41  Gustavo Binenbojm leciona sobre Agências Reguladoras Independentes e Democracia no Brasil: A pedra-de-toque desse regime especial é a independência (ou autonomia reforçada) da agência em relação aos Poderes do Estado. Tal independência assume os seguintes aspectos: 1) independência política dos dirigentes, nomeados por indicação do Chefe do Poder Executivo após aprovação do Poder Legislativo, investidos em seus cargos a termo fixo, com estabilidade durante o mandato. Tal importa a impossibilidade de sua exoneração ad nutum pelo Presidente.

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Após à grande recessão de 1929 e, principalmente, após a segunda guerra mundial, a partir da intensificação da intervenção do Estado na economia42 , o instituto do planejamento passou a ser aperfeiçoado nas economias de mercado. Nesse cenário de pandemia, o desafio da concorrência se impõe aos integrantes de agências reguladoras investidos de atribuições, o qual reflete a necessidade de suficientes proposições de “modelagens competitivas”43 , segundo fundamentos jurídicos e econômicos, para atrair investidores afetos à parcerias público-privadas44 e enfim beneficiar o usuário final do serviço público, principalmente o de saúde no enfrentamento da pandemia da Covid-19. Então, se é dever do Estado realizar essas três tarefas, a função de incentivo/fomento serve justamente para esses momentos cruciais. Porque se o

2) independência técnica decisional, predominando as motivações técnicas para seus atos, que não se sujeitam a recurso hierárquico impróprio. Tal importa a impossibilidade de revisão das decisões das agências pelos Ministérios e mesmo pelo Presidente. 3) independência normativa, necessária à disciplina dos serviços públicos e atividades econômicas submetidos ao seu controle, e caracterizada. segundo parte da doutrina, pelo fenômeno da deslegalização. ls Para parte da literatura brasileira, sobre regulação, por meio da deslegalização as agências passam a gozar de um amplo poder normativo, apto, inclusive, a revogar leis anteriores. 4) independência gerencial, orçamentária e financeira ampliada. por força de rubricas orçamentárias próprias e de receitas atribuídas pela lei às agências. BINENBOJM. G. Agências Reguladoras Independentes e Democracia No Brasil. R. Dir. Adm., Rio de Janeiro, n. 240, p. 147-165, abr./jun. 2005. Disponível em: <file:///C:/Users/Sergio%20Alexandre/Downloads/43622-92342-1-PB.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2020. 42  RANGEL, Rubí Martinez; GARMENDIA, Ernesto Soto Reyes. El Consenso de Washington: la instauración de las políticas neoliberales en América Latina. Política y Cultura, Universidad Autónoma Metropolitana Unidad Xochimilco Distrito Federal, México, n. 37, p. 35-64, 2012. Disponível em: <http://www.redalyc.org/articulo.oa>. Acesso em: 20 maio 2020. 43 “Desafio da concorrência, no sentido empregado no presente artigo, significa que os membros integrantes das agências reguladoras, que receberam atribuições de Poder Concedente, devem estabelecer modelagens competitivas, para atrair investidores, sendo, ainda, necessário o conhecimento de fatores interdisciplinares, com um enfoque econômico, e também jurídico, tendo em vista à necessidade de se seguir as leis gerais e especiais de concessões e permissões de serviços públicos.” Ver em: NOHARA, Irene Patrícia. Regulação no cenário de crise e desafio da concorrência no serviço público. Crise Econômica e Soluções jurídicas, v. 68, jan. 2016. 44  “As alterações processadas nas últimas décadas ao Direito Administrativo brasileiro objetivaram viabilizar novas modelagens contratuais que estimulassem tanto a parceria entre Poder Público, particulares e investidores, por meio das parcerias público-privadas, como também que provocassem o incremento da competição nos serviços públicos, preocupação que não era tão comum há anos atrás, sobretudo no âmbito das atividades titularizadas pelo Estado (Nohara, 2016).” Ver em: NOHARA, 2016.

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Estado não incentivar, a tendência é a depressão aumentar. A tendência é cair se em uma maior crise, do que já se encontra. Logo, não se pode deixar o paciente morrer e o paciente não é só o indivíduo. Considera-se que o paciente também é a economia, o mercado, a microempresa, que vem a ocupar a grande massa de trabalhadores. O professor Giovani Clark define a situação como um “momento de guerra”. Para ele, os governos, em todos os níveis, precisam se abrir para o diálogo com os diversos setores da sociedade 45. O direito econômico, para Fernando Menegat46 , obriga o Estado a refletir sobre que medidas adotar enquanto todos não estiverem trabalhando, e sobre como remediar as consequências assim que as atividades econômicas forem retomadas. Até porque, para além da liberdade de iniciativa, a Constituição Econômica de 1988 resguarda igualmente outros princípios de idêntica magnitude. Paulo Burnier Silveira47 defende a atuação estatal: A garantia de serviços públicos de qualidade, complementada por uma economia de mercado competitiva, impõe o fortalecimento do Estado, sobretudo em dimensões específicas nas quais se incluem aspectos econômicos. Um Estado competente, com recursos adequados, poderá garantir a prestação de serviços públicos de qualidade, o que deve se somar à capacidade de administrar com competência e eficiência a máquina pública, inclusive no que toca à atividade econômica do país.

Está aí a necessidade então de fazermos políticas não só protetivas, mas políticas incentivadoras, de fomento da atividade econômica nessas circunstâncias, de amparo aos direitos sociais. Segundo Konrad Hesse48 , os direitos sociais apresentam uma debilidade intrínseca, por não se constituírem como direitos subjetivos, cujo ultraje faz surgir direito de ação contra o Estado, mas direitos “cuja realização depende de ‘tarefas do Estado’, programas de objetivos sujeitos a amplas margens legislativas e políticas de configuração”.

45  UFMG, 2020, extraído da internet. 46  MENEGAT, Fernando. O que esperar do Direito Administrativo e Econômico em tempos de Coronavírus? Direito do Estado, n. 449, 2020. Disponível em: <http://www.direitodoestado. com.br/colunistas/fernando-menegat/o-que-esperar-do-direito-administrativo-e-economico-em-tempos-de-coronavirus>. Acesso em: 20 maio 2020. 47  SILVEIRA, Paulo Burnier. Coronavírus e Direito Econômico: reflexões sobre desafios e perspectivas. GENJurídico, 20 mar. 2020. Disponível em: <http://genjuridico.com.br/2020/03/20/ coronavirus-direito-economico-reflexoes/>. Acesso em: 20 mar. 2020. 48  HESSE, K. A Força Normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1991. p. 27.

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Notória, por outro lado, é a hostilidade ao capitalismo desenvolvido no país49 , fruto de gestões públicas duvidosas, as quais promoveram um “milagre intervencionista”50 , cujos resultados foram os estoques de imóveis e o desfazimento de contratos de compra e venda. Ainda, a inconveniência gestora é refletida pela retração das atividades de produção, de circulação e de distribuição de riquezas51 . Similarmente, a hostilidade supracitada é evidenciada52 pelo estrangulamento da atividade empresarial, onerada pela complexidade jurídico-normativa, sobretudo aos empresários que não pactuam com relações promíscuas com o Estado. Foi apenas com as profundas e radicais transformações trazidas com as novas constituições sociais do século XX, a democracia de massas e o sufrágio universal que o direito econômico se integrou ao pensamento jurídico53 .

49  “Não pode haver dúvida que o empresário e o advogado brasileiros, acostumados ao ambiente de hostilidade ao capitalismo que ao longo dos anos aprofundou-se no País - prova viva disso são a complexidade e a subjetividade crescente das normas tributárias e ambientais (de que aqui não tratamos em razão do curto espaço), claramente destinadas a propiciar oportunidades de favorecimento a amigos do Poder e punição aos seus inimigos - ao se deparar com o manejo de estruturas tão mais simplificadas como as que acima foram expostas haverão de acreditar, não sem alguma razão, que encontraram o Oceano Azul.” Ver em: ANDRADE, Germano Costa; SANTOS, Armando Dias dos; OZORES, Luiz Felipe. Golpe à paraguaia – em prol de uma menor intervenção estatal como incentivo à atração e manutenção de investimentos. Crise Econômica e Soluções Jurídicas, n. 80, jan. 2016; GABARDO, 2016; NOHARA, 2016. 50  “[...] São altos os estoques de unidades imobiliários para venda e locação - fruto do “milagre intervencionista” de anos recentes - e estima-se que as maiores incorporadoras com atuação local tenham desfeito quase metade de seus contratos de venda no ano de 2015, espelhando, em maior grau, a derrocada nacional deste setor.” Ver em: ANDRADE; SANTOS; OZORES, 2016. 51 “O complexo quadro instalado sugere, para além de futuras significativas dificuldades econômicas fruto da retração das atividades de produção, circulação e distribuição de riquezas, a conformação de maior incidência de crimes econômicos, a despeito de uma possível diminuição de outras formas cotidianas de criminalidade. Isso significa que o ambiente de negócios passa a se encontrar mais vulnerável a ataques externos, vitimando os agentes econômicos, bem como que as empresas devem se atentar para o comportamento de colaboradores e parceiros, para fins de mantença de inquestionáveis formas de conduta conforme as regras do mercado.” Ver em: ARAÚJO, Marina Pinhão Coelho; SOUZA, Luciano Anderson de. Impactos do Coronavírus na criminalidade econômica e programas de complicance. Revista de Direito Penal Econômico e Compliance, v. 2, abr./jun. 2020. 52  “E, enquanto a construção dessa sociedade não é permitida por aqui, persistindo a crença de que a atividade empresarial merece vigilância ao ponto do estrangulamento - sendo visível, por outro lado, que essa mesma complexidade jurídico-normativa serve a conferir diferencial competitivo permanente às megacorporações cujas relações promíscuas com o Estado as caracterizam - é papel profissional nosso, de advogado, apontar ao cliente empreendedor as melhores alternativas para o momento, estejam onde estiverem.” Ver em: ANDRADE; SANTOS; OZORES, 2016. 53  BERCOVICI, Ibid.

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5 MEDIDAS CÍCLICAS E ANTICÍCLICAS Naturalmente, as empresas estando a se recuperar, as pessoas passam a recuperar também o seu emprego, ou a sua atividade laboral, seja ela qual for, mesmo que temporal, o Estado começa a arrecadar e a vida volta ao normal, por tudo isso que se fala em políticas anticíclicas, para justamente acabar com essa percepção da recessão. A sociedade deseja acabar com a recessão, a depressão econômica, o mais breve possível, mesmo que seja imprimindo moeda. Mas não é imprimir moeda simplesmente para se gerar inflação e construir uma obra, é imprimir moeda para salvar as pessoas da miséria, salvar as pessoas da fome, salvar as pessoas da marginalidade. Então, essa ideia é ideia de transformação, por quê? Porque medidas cíclicas foram tomadas pelos governadores, pelos prefeitos pelo país à fora, por exemplo quando fecharam seus comércios, suas atividades econômicas, proibiram determinados serviços particulares. No Brasil, segundo Gadelha54, a relação de causalidade entre gastos públicos e crescimento econômico é tema não consensual no atual debate acadêmico, com importantes implicações de política econômica. Além disso, no momento atual, o esforço fiscal anticíclico do governo ante a crise de liquidez internacional que se alastrou pelo mundo a partir de meados de setembro de 2008 tem‑se baseado em um conjunto de medidas voltadas a estimular o crédito, por exemplo, as desonerações tributárias, o pacote habitacional, redução da meta de superávit primário e a liberação de várias linhas de crédito por parte dos bancos oficiais. Naturalmente, todo mundo valoriza, muito compreensivelmente, a vida. Entretanto, se esses empreendimentos ficarem ao longo do tempo, principalmente os micros e pequenos empresários, fechados, eles não só vão passar por uma crise, ele vão falir. Celso Ribeiro Bastos55 compreende o papel das medidas econômicas, efetuadas por este ramo do direito, ratificam seu sentido autônomo no plano jurídico: Pode-se conceituar o Direito Econômico como sendo o ramo autônomo do Direito que se destina a normatizar as medidas adotadas pela Política Econômica através de uma ordenação jurídica, é dizer, a nor- matizar as regras econômicas, bem como a intervenção do Estado na economia.

54  GADELHA, Sergio Ricardo de Brito. Política fiscal anticíclica, crise financeira internacional e crescimento econômico no brasil. Revista de Economia Política, v. 31, n. 5 (125), p. 794-812, 2011. Edição especial. 55  BASTOS, 2003, p. 51.

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A teoria keynesiana56 tradicional afirma que, no curto prazo, a política fiscal tem um efeito positivo sobre o nível de atividade econômica, através do multiplicador dos gastos. Logo, os gastos públicos são considerados um instrumento exógeno de política econômica, causando mudanças no nível agregado do PIB real no curto prazo e sendo usados para corrigir as flutuações cíclicas da economia. Segundo Silveira57 , os eventuais riscos e perigos sanitários poderiam ser mitigados através de orientações públicas, por exemplo através da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), como agência reguladora58 , em relação às ações anti-cíclicas: A medida poderia contribuir para um maior equilíbrio na equação oferta/demanda e reduzir a pressão no aumento de preços, que decorrem sobretudo do aumento abrupto da demanda. Mais uma vez, a crise sanitária poderá trazer aprendizados sobre a importância de uma regulação jurídica adequada, tanto no seu conteúdo quanto na celeridade de respostas, como instrumento de política pública.

Vescovi59 , ao analisar a relação entre o Direito Econômico e a Economia Política discute sua interdisciplinaridade absoluta, embasa a exata dependência de ambos para que as políticas públicas implantadas pela base governamental se concretizem, trazendo solidez e desenvolvimento para os governados do espaço territorial (nação). Bagnoli60 ilustra que o Estado como agente econômico, atuando com poder controlador e fiscalizatório no desempenho das atividades dos entes particulares, ou ainda no que tange à sua exploração em parceria com a iniciativa privada, respectivamente.

56  GADELHA, 2011. 57  SILVEIRA, 2020. 58 O contexto político. ideológico e econômico em que se deu a implantação das agências reguladoras no Brasil. durante os anos 1990. foi diametralmente oposto ao norte-americano. Com efeito. o modelo regulatório brasileiro foi adotado no bojo de 11m amplo processo de privatizações e desestatizações. para o qual a chamada reforma do Estado se constituía em requisito essencial. É que a atração do setor privado. notadamente o capital internacional. para o investimento nas atividades econômicas de interesse coletivo e serviços públicos objeto du programa de privatizações e desestatizações estava condicionada à garantia de estabilidade e previsibilidade das regras do jogo nas relações dos investidores com o Poder Público. BINENBOJM. 2005. 59 VESCOVI, L. F. O Direito Econômico E A Economia Política: Uma Interdisciplinaridade Necessária. PERSPECTIVA, Erechim, v. 34, n. 126, p. 55-72, jun. 2010. 60  BAGNOLI, Vicente. Direito econômico. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 76.

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E aí o que vem se levantar rapidamente, identificando as medidas cíclicas e anticíclicas, as medidas cíclicas que foram tomadas agora nesse momento da Covid-19, porque o Estado percebeu no mundo todo essa pandemia e só com o isolamento social evitar-se-ía um descalabro da saúde pública, no atendimento à coletividade, porque só o isolamento faria com que a quantidade de contágio fosse menor, atendendo então a um planejamento futuro ao sistema hospitalar. Foi a interação entre Direito e Economia que permitiu a cunhagem de inúmeras ferramentas que passaram a ser adotadas pelo Estado, de acordo com a doutrina de Keynes, como medidas anticíclicas para contornar as crises propiciadas pelos grandes eventos depressivos da economia do século XX61 . A análise dos gastos públicos por grupo de natureza de despesa permite apurar a rigidez da composição dos gastos e a margem de flexibilidade do governo, no que se refere a sua política de gastos, bem como quantificar o alcance dos objetivos governamentais de promoção do crescimento econômico e de redistribuição da renda nacional. Por outro lado, no Brasil, assim como em muitos países, tem‑se destacado a importância da condução de uma política fiscal anticíclica para as dificuldades impostas62 . Momentos como o presente são os que mais demandam do direito econômico. Transversal que é, ele põe na balança o direito administrativo, o direito financeiro e o direito tributário; o direito à saúde e a liberdade de iniciativa. São as ferramentas por ele cunhadas que permitem ao Estado adotar medidas corretivas anticíclicas de diversas naturezas (auxílios extraordinários, fomento de diversas espécies, etc.) para superar períodos de depressão inevitáveis em razão da necessidade de proteção da vida humana63 . Nese momento onde há uma grande crise, e aí os economistas de maneira geral, sejam de ordem liberal, sejam marxistas ou keynesianos, entendem que nessas circunstâncias, até a impressão de moeda é válida. As oscilações dos mercados64 são constantes com a economia globaliza-

61  MENEGAT, 2020, extraído da internet. 62  GADELHA, Ibid. 63  MENEGAT, Ibid. 64  Identificando tudo isso, mesmo empregando o conceito de eficiência de Kaldor-Hicks, a Análise Econômica do Dirreito não é uma teoria dogmaticamente orientada pela eficiência, não é assim definida. — “Em termos mais simples, a análise econômica do Direito — em seu sentido mais tradicional — prega a utilização de técnicas de estudo das consequências econômicas das decisões jurídicas, sempre em termos de eficiência alocativa”. — “O próprio fundamento do direito seria a economia em seu viés neoclássico, tendo como pressuposto a não intervenção estatal (sempre mais defendida do que adotada, já o sabemos) e a eleição da previsibilidade dos mercados como algo superior a outros argumentos (como os fundamentos e garantias constitucionais)”.

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da, haja todos os mercados estão conectados, então qualquer alteração, como essa pandemia se expandindo, isso tem um reflexo direto nas economias. Recursos que iam ser investidos em infraestrutura passam a ser destinados ao combate à pandemia e vice-versa. Eduardo Faria, em “O Direito na Economia Globalizada”65 retrata estes cenários. Quando o mercado percebe que num determinado país não há estabilidade jurídica, muito pelo contrário, há uma instabilidade porque os ministérios estão sendo alterados, porque eleva-se o que se chama “Risco Brasil”. Então, aumentando o risco de investimentos no Brasil, muita gente deixa de investir aqui ou então, quem já investiu transfere o dinheiro. Existe uma coisa chamada capital transnacional, não é apenas o capital daquele país, é um capital que está flutuando sobre o Brasil, se esse tiver estabilidade. Se esse mercado não se encontra estável, com simples operações financeiras esse dinheiro já se transfere para Singapura, para os Estados Unidos, para o Reino Unido. E essas oscilações que vêm em decorrência de alterações políticas, de impactos econômicos, isso enlouquece os mercados. Vê-se, claramente isso, ao se observar os jornais de grande circulação nacional nas últimas semanas, Bresser Pereira66 , Henrique Meirelles67 , Abílio Diniz68, grandes economistas, grandes administradores das várias matizes ideológicas, dizendo a mesma coisa: a economia, nesse momento de crise, devem se empregar recursos para que se tenha uma ação anticíclica, ou seja, a implementação de ações contra depressivas. E aí, nesse momento, não se tem que se preocupar com a estabilidade, com o gasto fiscal, com a lei de responsabilidade fiscal ou com o controle necessariamente orçamentário, por quê? Porque é um momento absolutamente excepcional. Como é um momento excepcional, nessa crise, devem se empregar esforços para tirar as pessoas, as famílias do período de alta necessidade, para que não se gere a miséria, para que não se gere a mar-

YEUNG, L.; RODRIGUES, F. A. A (real) importância da análise econômica do Direito. Consultor jurídico, 16 jun. 2020. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2020-jun-16/yeung-rodrigues-analise-economica-direito>. Acesso em:16 jun. 2020. 65  FARIA, José Eduardo. O Direito na Economia Globalizada. São Paulo: Malheiros, 2000. 66  PEREIRA, Luiz C.; BRESSER. País não tem presidente e devia emitir moeda na crise, diz Bresser-Pereira. UOL, 19 abr. 2020. Economia. Disponível em: <https://economia.uol.com.br/ noticias/redacao/2020/04/19/entrevista-luiz-carlos-bresser-pereira.htm>. Acesso em: 20 maio 2020. 67 MEIRELLES, Henrique. Meirelles defende ‘imprimir dinheiro’ contra crise do coronavírus: ‘Risco nenhum de inflação’. BBC News, 8 abr. 2020. Disponível em: <https://www.bbc.com/ portuguese/brasil-52212033>. Acesso em: 20 maio 2020. 68  “GUEDES é liberal, mas na crise somos todos keynesianos”, diz Abilio Diniz. CNNBRASIL, 26 mar. 2020. Disponível em: <https://www.cnnbrasil.com.br/business/2020/03/26/guedes-e-liberal-mas-na-crise-somos-todos-keynesianos-diz-abilio-diniz>. Acesso em: 20 maio 2020.

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ginalidade, para que não se gere um clamor social em larga escala e isso venha a acarretar um colapso não só econômico, mas um colapso social. Não é à toa que Donald Trump nos Estados Unidos fez uma intervenção na General Motors69 para a mesma produzir respiradores, quando poderia estar produzindo veículos automotores, isso é claramente um nível intervencionista. Então, o Estado intervém bem(muitas vezes) e intervém mal, intervém politicamente e intervém negativamente, para que o mercado venha a se restabelecer. Agora, especificamente sobre a fiscalização das contas públicas. Há muito se tenta realizar no Brasil o que se chama da Transparência Brasil 70, do governo prestar contas das suas atividades em um caráter satisfatório a toda a coletividade. Infelizmente, isso não acontece, seja porque o governante desconhece, ou porque ele não pode, ou porque ele não tem interesse em ser mais fiscalizado, para que não se tenha o que se chama hoje de accountability, ou de governança social, de fiscalização coletiva. Então, os programas de cidade inteligente, de governo inteligente ou os chamados programas de governo eletrônico, que prestam contas automaticamente da administração, como já está no quantitativo de salário do servidor, ou na prestação de contas de alguns tribunais, ou na prestação de contas de algumas redes sociais, o governo eletrônico deveria ser implementado a todos os órgãos do Brasil. Resultado: não se tem como fiscalizar, porque não se sabe exatamente como se teria essa informação, sem contar que há exceção orçamentária, quando os dirigentes conseguem uma autorização legislativa para vir a remanejar o recurso, como por exemplo com o DRU71 , da União que acontece na maioria dos estados e municípios, para o caso de emergência social.

69 TRUMP exige que fabricantes façam respiradores nos eua por coronavírus; gm diz que vai produzir aparelhos. O presidente dos Estados Unidos acionou o Ato de Defesa de Produção para obrigar as fabricantes a fornecerem os equipamentos. G1, 27 mar. 2020. Disponível em: <https://g1.globo.com/carros/noticia/2020/03/27/donald-trump-exige-que-ford-e-gm-produzam-respiradores-nos-eua.ghtml>. Acesso em: 27 mar. 2020. 70  A Transparência Brasil é a principal ONG de combate a corrupção nacional. A Transparência Brasil é uma organização independente, sem fins lucrativos que depende do apoio da sociedade para manter atividades de monitoramento do poder público e busca por transparência. TRANSPARÊNCIA BRASIL. disponível em: <https://www.transparencia.org.br/>. Acesso em: 20 maio 2020. 71  A Desvinculação de Receitas da União (DRU) é um mecanismo que permite ao governo federal usar livremente 20% de todos os tributos federais vinculados por lei a fundos ou despesas. A principal fonte de recursos da DRU são as contribuições sociais, que respondem a cerca de 90% do montante desvinculado. Criada em 1994 com o nome de Fundo Social de Emergência (FSE), essa desvinculação foi instituída para estabilizar a economia logo após o Plano Real. No ano 2000, o nome foi trocado para Desvinculação de Receitas da União. https://www12.senado.leg.br/noticias/entenda-o-assunto/dru. Disponível:20.05.2020

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Não é novidade para ninguém que a maioria dos estados estava em crise e, com a Covid 19, a situação piorou. O Plano Mansueto72 , por exemplo, foi deixado de lado e foi ofertada uma outra ajuda aos entes federados. Sem se imaginar quando é que essas finanças poderão ser recuperadas, mas naturalmente, com a razão da medida anticíclica e por um plano social, se tem emergencialmente um novo investimento. Isso quer dizer que a “aparente” dicotomia Direito Economia e mostra eficaz quando se tem o fundamento de um Estado soberano que expresse plano de políticas públicas, em caráter cíclico ou anticíclico, concernentes e viáveis à sua realidade fática e que, para alcançá-las de maneira transparente, com efeito a todos os seus governados (erga omnes), utiliza-se do aparato jurídico existente, se fazendo valer dos seus princípios norteadores73 . 6 PLANO PRÓ BRASIL E daí surgiu um outro possível incremento, que pode ser uma grande solução ou um grande problema para o governo federal, que é o Programa Pró-Brasil74 , que foi lançado dia 12 de maio, pelo Ministério da Casa Civil, na coordenação do General Braga Neto. O Programa Pró-Brasil 75 estabelece, com efeito segundo narração dele, com o ministro dos transportes, identificando que teria sido um investimento de 300 bilhões de reais para ser empregado em grandes obras públicas paralisadas, ou em novas, após a crise. Quais são os problemas que podem se visualizar aí, que pode se levantar um grande sucesso ou um fracasso? Primeiro: a concepção do ministro Guedes da Economia é uma concepção liberal, que não deveria haver investimento público para isso, dever-se-ia haver investimen-

72 O ajuste fiscal, intenção original do Plano Mansueto, além de auxílio financeiro a estados, Distrito Federal e municípios, na discussão inicial do novo pacto federativo era expresso no PLP 149/2019. O PLP 149/2019 havia sido aprovado pela Câmara, porém, no Senado, o relator, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), optou por uma nova proposta (PLP 39/2020) que tinha como prioridade socorrer estados e municípios, o que prejudicou e levou ao arquivamento do Plano Mansueto no Congresso. PLANO MANSUETO. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/05/14/plano-mansueto-precisa-voltar-a-ser-discutido-no-congresso-diz-jean-paul>. Acesso em: 20 maio 2020. 73 VESCOVI, 2010. 74  PROGRAMA PRÓ-BRASIL. Disponível em: <https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/ noticias/2020/4/programa-pro-brasil-22-abr-versao-imprensa-1.pdf>. Acesso em: 20 maio 2020. 75  GOVERNO lança programa PRÓ-BRASIL para voltar as atividades. O Povo, 9 jul. 2020. Disponível em: <https://mais.opovo.com.br/jornal/economia/2020/04/23/governo-lanca-programa-pro-brasil-para-voltar-as-atividades.html>. Acesso em: 20 jul. 2020.

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to somente privado e aí o foco de 50 bilhões seria somente da iniciativa privada, através de concessões, através de permissões, através de privatizações. O Plano Pró-Brasil é um programa do Governo Federal para integrar e aprimorar ações estratégicas para recuperação e retomada do crescimento socioeconômico em resposta aos impactos relacionados ao coronavírus 76. Muito se identificou nessas políticas nacionais que esse Plano Pró-Brasil seria um novo Plano Marshall 77. Aí há um equívoco, porque o Plano Pró-Brasil é nacional, o Plano Marshall é um plano americano de restauração econômica da Europa, com a supremacia americana pós-guerra, não tem nada a ver. Comparando-se o Pró-Brasil com o New Deal aí pode-se fazer até uma conjugação mutatis mutandis meio assemelhada, mas não com o Plano Marshall, pois não existe nenhum grande incremento na economia internacional, seja do Banco Mundial, do Banco Interamericano de Desenvolvimento, do FMI, para se financiar as economias mundo à fora após a crise não, pelo menos por enquanto não surgiu no cenário internacional nada disso. A ideia ainda é o mercado internacional se recuperar nessa formação, nesse incremento pós-crise. Não dá para confundir o Plano Marshall com o Plano Pró-Brasil não. Entretanto, concessão, permissão, privatização (desestatização) já existe há muito tempo no nosso Estado78. Vale lembrar que Bresser Pereira foi um dos autores do Plano Diretor de Reforma do Estado desde o governo Fernando Henrique e que tinha sido levantado antes pelo governo Collor, então isso já é muito antigo, o nosso Programa Nacional de Desestatização79 , não tem nenhuma novidade. E alguns jornalistas fizeram uma listagem de possíveis obras, algumas estavam desde o pacto dois de Dilma e depois de o projeto avançado de Temer, e não foram realizadas até agora. Sabe-se que tem obras no Brasil que

76  PROGRAMA PRÓ-BRASIL, 2020. 77  O Plano Marshall foi um programa de auxílio humanitário oferecido pelos Estados Unidos da América aos países europeus de 1948 até 1951. Foi realizado por meio de assistência técnica e financeira para ajudar a recuperação dos países europeus destruídos pela guerra. Também tinha como objetivo não deixar que certos países passassem à influência do socialismo. Por esse motivo, foi uma forma de estabilizar o capitalismo na Europa Ocidental, bem como garantir a integração dos países europeus. O Plano Marshall (Programa de Recuperação Europeia) leva o nome do general George Catlett Marshall (1880-1959), secretário do Estado dos EUA durante o governo de Henry Truman (1884-1972). Por causa disso, ele receberia o prêmio Nobel da paz em 1953. PLANO MARSHALL. Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/ plano-marshall/>. Acesso em: 20 maio 2020. 78  BRASIL. Plano diretor da reforma do aparelho do Estado. Brasília, 1995. Disponível em: <http://www.bresserpereira.org.br/documents/mare/planodiretor/planodiretor.pdf>. Acesso em: 20 maio 2020. 79  BRASIL. Lei n. 8.031/90, de 12 de abril de 1990. Cria o Programa Nacional de Desestatização, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 13 abr. 1990. Disponível em: http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8031.htm. Acesso em: 20 maio 2020.

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duram dez, 20 anos, por exemplo a Transnordestina80 . Quanto ao licenciamento ambiental81 , possuímos licenças ambientais que duram dez, quinze anos e, ainda assim, o processo é paralisado. 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS O Plano Pró-Brasil pode fazer parte desse conjunto de medidas anti-cíclicas, uma vez viabilizado, que o governo pretende tomar para poder retomar a economia, como investimentos maciços em infraestrutura, por exemplo, investimentos público-privados, as PPPs, concessões e privatizações. Entende-se que como todo Estado deve priorizar seu planejamento, como expresso no art.174 da Constituição Federal, para garantir-se a manutenção não só da atividade econômica, bem como do desenvolvimento social, o Brasil não é diferente, em sua construção federativa, onde os entes estatais possuem seu grau de responsabilidade estabelecidas nas competências constitucionais (arts.21-32 CF/88). Investimentos em ciência, educação, tecnologia e informação, desenvolvem o Estado nacional. A colheita não é presente, a colheita é futura e a longo prazo. Se a atividade não for necessária ao Estado, ou imprescindível, como a própria Constituição diz, segundo o artigo 173 CF/88, imprescindível à segurança nacional ou relevante interesse público, a atividade pode ser privatizada, porque o empresário sabe naturalmente administrar, por interesse primário, seu empreendimento. A discussão inicial é saber-se se essa atividade seja de necessidade fundamental ou não à coletividade. Então privatizar, realizar concessões, realizar permissões, realizar transferências de capital ou compartição de administração público-privada são institutos muito bem-vindos, se vierem a trazer a qualificação não só do nosso capital produtivo, mas do nosso capital social.

80  A CONSTRUÇÃO da ferrovia Transnordestina começou em 2006 e atravessou as gestões Lula, Dilma e Temer. A obra está paralisada desde 2017. Disponível em: <https://diariodotransporte.com.br/2020/03/11/antt-propoe-a-uniao-a-caducidade-da-concessao-da-ferrovia-transnordestina/>. Acesso em: 20 maio 2020. 81  A Resolução 237/97 do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) reporta: Art. 1º - Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições: I – Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso.”

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Então, são ideias em que o governo utiliza-se de instrumentos do Direito Econômico não só para socorrer à coletividade, bem como até para sanear as finanças públicas. Medidas indutoras não só podem garantir uma nova infraestrutura nacional, como tirar o país da crise recessiva, além de que se venha a ocupar mão-de-obra desassistida, que antes da pandemia tinha cerca de 12 a 13 milhões desempregados.

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Referências A CONSTRUÇÃO da ferrovia Transnordestina começou em 2006 e atravessou as gestões Lula, Dilma e Temer. A obra está paralisada desde 2017. Disponível em: <https://diariodotransporte.com.br/2020/03/11/antt-propoe-a-uniao-a-caducidade-da-concessao-da-ferrovia-transnordestina/>. Acesso em: 20 maio 2020. ANDRADE, Germano Costa; SANTOS, Armando Dias dos; OZORES, Luiz Felipe. Golpe à paraguaia – em prol de uma menor intervenção estatal como incentivo à atração e manutenção de investimentos. Crise Econômica e Soluções Jurídicas, n. 80, jan. 2016. ARAÚJO, Marina Pinhão Coelho; SOUZA, Luciano Anderson de. Impactos do Coronavírus na criminalidade econômica e programas de complicance. Revista de Direito Penal Econômico e Compliance, v. 2, abr./jun. 2020. BAGNOLI, Vicente. Direito econômico. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2006. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito econômico. São Paulo: Celso Bastos Editor, 2003. BELLUZZO, Luiz Gonzaga de Mello. Ensaios sobre o Capitalismo no Século XX. São Paulo: Editora UNESP, 2004. BERCOVICI, Gilberto. As Origens Do Direito Econômico: Homenagem A Washington Peluso Albino De Souza. Rev. Fac. Direito UFMG, p. 253-263, 2013. Número Esp. em Memória do Prof. Washington Peluso. BINENBOJM. G. Agências Reguladoras Independentes e Democracia No Brasil. R. Dir. Adm., Rio de Janeiro, n. 240, p. 147-165, abr./jun. 2005. Disponível em: <file:///C:/Users/Sergio%20Alexandre/Downloads/43622-92342-1-PB.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2020. BRASIL. Plano diretor da reforma do aparelho do Estado. Brasília, 1995. Disponível em: <http://www.bresserpereira.org.br/documents/mare/planodiretor/planodiretor.pdf>. Acesso em: 20 maio 2020. BRASIL. Lei n. 8.031/90, de 12 de abril de 1990. Cria o Programa Nacional de Desestatização, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 13 abr. 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8031.htm. Acesso em: 20 maio 2020. 47


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Capítulo 3 COVID-19 E SEUS IMPACTOS NA POLÍTICA AMBIENTAL: REFLEXÕES E RESPOSTAS DA SECRETARIA MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE URBANISMO DE NATAL (SEMURB) Carlos Sérgio Gurgel da Silva 82 Thiago de Paula Nunes Mesquita83 Maria Rita Bezerra da Silva84 1 INTRODUÇÃO Falar sobre direito ambiental nesses tempos da pandemia da Covid-19 é um desafio, porque, em verdade, estamos sem saber ainda o que fazer diante de situação tão complexa como essa que se apresenta. Várias propostas de alterações da legislação ambiental estão em curso. De um dia para o outro surgem me-

82 Doutor em Direito Constitucional pela Universidade de Lisboa - Portugal. Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Especialista em Direitos Fundamentais e Tutela Coletiva pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Rio Grande do Norte, Professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte no Campus de Natal. Conselheiro Estadual da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional-RN. Vice-Presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB/RN. Geógrafo e Consultor Ambiental. Advogado especializado em Direito Ambiental. 83  Graduado no curso de bacharelado em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2008), graduado em tecnologia em Meio Ambiente pelo Instituto Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte (2005), mestre em Bioecologia Aquática pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2009), doutorado incompleto em Engenharia de Petróleo e Gás, Subárea Engenharia Ambiental pela UFRN. Secretário Adjunto da SEMURB em Natal-RN de 16/08/2018 até 05/11/2019. Atualmente Secretário Titular de Meio Ambiente e Urbanismo -SEMURB de Natal e coordenador técnico da Revisão do Plano Diretor de Natal. 84  Acadêmica do sétimo período do Curso de Direito da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, extensionista do Projeto de Extensão Lives Direito UERN Natal.

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didas provisórias que são aprovadas e outras que são colocadas em tramitação. Sobre o tema que nos propomos a escrever, vale lembrar reflexão do professor Guilherme José Purvin de Figueiredo, que diz: “é momento de sair da bolha, de reconhecer que o Direito Ambiental, talvez, não tenha a resposta definitiva para a crise planetária que enfrentamos”85. Nesse sentido, hoje, mais do que nunca, se destaca o paradoxo socrático que diz “só sei que nada sei”, diante de grave situação que vivemos. Vive-se ainda uma guerra de informações, onde dois grupos políticos ou até mais - trocam acusações, alteram e manipulam informações, de modo que a população fica sem saber em que notícia deve acreditar. Infelizmente, o desencontro de informações no que tange a Covid-19 tem sido algo muito problemático. Muitas pessoas têm entrado em desespero por causa de algumas declarações, muitas vezes irresponsáveis, de profissionais da área de saúde e de políticos, mais preocupados com seus espaços no cenário político do que com a população em geral. A legislação ambiental brasileira é apontada mundialmente como uma legislação exemplar. Inclusive, alguns consideram até que a legislação brasileira é rígida, apesar de sabermos que em algumas situações, ela acaba se tornando muito flexível. Chega até a ser ingênuo supor que a cláusula rebus sic stantibus não será acionada no tocante ao cumprimento das obrigações de natureza ambiental, uma vez que estão havendo alterações que independem da vontade das partes, ou seja, independem da vontade do Estado e independem da vontade do agente econômico. Então, diante de uma situação como essa, será que o Direito Ambiental deve ser flexibilizado? Infelizmente temos visto tentativas de se manter estados de calamidade e de se criar, em algumas situações, um verdadeiro estado de terror, no qual informações absurdas são lançadas ao vento no âmbito dos Estados e a nível federal, o que só facilita alguns processos, extremamente nocivos, como por exemplo, a compra superfaturada de respiradores por alguns Estados, alguns desses que nunca foram entregues. Neste sentido, enquanto cidadãos, precisamos estar atentos para não permitirmos que práticas como essas realizadas em nosso país. Nesse sentido, o controle e a fiscalização se revelam essenciais. Quando partimos para um direito ambiental mais administrativo, de procedimentos administrativos, relacionados à emissão de atos administrativos – como as licenças ambientais - não tenho dúvida que nesse contexto de pandemia, se faz necessário flexibilizar sim o licenciamento, desde que tomadas as devidas cautelas.

85 Disponível em: <https://www.oeco.org.br/colunas/guilherme-jose-purvin-de-figueiredo/ em-que-o-direito-ambiental-pode-contribuir-para-a-gestao-da-crise-de-pandemia-covid-19/>. Acesso em 14 set. 2020.

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Sempre é necessário realizar uma avaliação que leve em consideração os aspectos socioambientais, que são fundamentais e, portanto, importantíssimos e inquestionáveis no que diz respeito a indispensabilidade para a qualidade de vida e bem-estar ambiental e humano. No entanto, é preciso fazer com que o aspecto econômico possa ter uma importância e uma relevância similar aos aspectos socioambientais num contexto onde se vê, além da tragédia do “extinção de CPFs” a da “extinção de CNPJs”, uma vez que a crise gerada pelo isolamento social têm levado diversos empreendimentos e empresas à falência. Trata-se de um dos maiores impactos gerados pela pandemia. Há, inclusive, especialistas que consideram que este ano de 2020 está perdido em termos econômicos. Não apenas o ano de 2020, mas os próximos anos. Convém ainda destacar que o tratamento das questões ambientais se tornam fundamentais no país, até porque há uma discussão sobre se a origem da Covid-19 está relacionada à degradação da qualidade ambiental nos ambientes florestais ou até mesmo nas áreas urbanas. Questões como alterações climáticas, geradas pela poluição, podem ter permitido a mutação do vírus, que já existia e tinha baixa letalidade. O fato é que todos estamos em estado de alerta, querendo entender mais sobre o vírus da Covid-19, até para que possamos mudar os rumos do desenvolvimento econômico praticado no mundo, de modo a evitar ou minimizar os riscos de que outras pandemias semelhantes a esta venham a surgir, dizimando um grande contingente populacional em todo o planeta. Neste capítulo trataremos de algumas medidas administrativas que foram adotadas no Brasil, especialmente no Município de Natal/RN como forma de evitar que se some ao agravamento do problema de saúde pública o agravamento de problemas econômicos. PRORROGAÇÃO DE LICENÇAS AMBIENTAIS? RESPOSTA DA SECRETARIA MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE E URBANISMO DO MUNICÍPIO DE NATAL Diante do atual cenário de pandemia, muitos órgãos ambientais de diversos entes federativos têm optado por prorrogar os prazos de licenças ambientais e urbanísticas que estejam se vencendo. Esta é uma medida importante, uma vez que diante de um cenário onde muitos funcionários dos órgãos ambientais estão trabalhando em regime de home office, sem que se tenha toda a infraestrutura para realizar a análise ambiental e urbanística remota, é mais do que razoável que estes prazos precisem ser prorrogados, de modo a se evitar prejuízos ao funcionamento dos estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviços. Não obstante haja essa prorrogação das licenças ambientais e urbanísticas, os órgãos responsáveis pelo licenciamento ambiental e urbanístico devem manter em funcionamento as equipes de fiscalização. Ações de fiscalização de54


vem acontecer, regularmente, dependendo ou não da disponibilidade de agentes de fiscalização, nem que seja necessário que se utilize sistemas tecnológicos (imagens aéreas, satélites, drones) ou que seja definido um regime de escala entre fiscais. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal, pensando no contexto da pandemia da Covid-19 renovou, automaticamente, todas as licenças de 24 de março a 31 de dezembro de 2020, por seis meses. Então, a licença que venceu dia primeiro de abril está, na verdade, automaticamente renovada por mais seis meses. A licença que vencer no dia 30 de dezembro de 2020, está automaticamente renovada por mais seis meses, até junho de 2021. Essa medida foi tomada para poder incentivar os empreendimentos, diminuir custos de investimento com projetos de renovações e com taxas de licenciamento. Neste sentido, as licenças ambientais ficaram automaticamente renovadas por seis meses, a partir da edição do Decreto nº 11.925, de 23 de março de 2020, até 31 de dezembro de 2020. Se preciso, a SEMURB pode até ampliar este prazo A SEMURB, ainda como forma de minimizar os impactos da Covid-19 na economia renovou também, de forma automática, pelo período de 90 dias, todas as certidões negativas de débitos ativos do município de Natal (CNDAs). Desta forma, aquelas pessoas que precisam da referida certidão negativa para iniciar o processo de tramitação de licenciamento ambiental (de renovação, ou da parte urbanística - alvarás de funcionamento ou habite-se) foram diretamente beneficiadas. Sabe-se a crise que as micro e pequenas empresas estão vivendo. Algumas tiveram problemas com o pagamento de impostos e, por esta razão, tiveram suas certidões negadas. Nesse sentido, o órgão ambiental e urbanístico do Município de Natal aceita, a partir do dia 24 de março de 2020 a renovação da última emissão da CNDA, por mais 90 dias. Esta é uma medida que a SEMURB vai reavaliar a necessidade de estender ou não. Como afirmou o Secretário Thiago Mesquita: [...] se for necessário, iremos, sim, estender, para não impedir que as micro e pequenas empresas possam continuar os seus processos de legalização, de licenciamento, ou autorizações administrativas e urbanísticas. Além disso, nós trabalhamos também, e aí vem uma inovação - e eu queria chamar a atenção para isso - que já está servindo de modelo para outros municípios e para outros Estados no Brasil, e veio aqui da nossa SEMURB que é a permissão para que todo e qualquer empreendedor possa, ele mesmo, fazer as suas próprias vistorias86 .

86  Live: Covid-19 e seus impactos ambientais no direito ambiental. Canal Novo Eleitoral, 2020. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=FdjYELq7Zb0&t=3733s>. Acesso em: 26 jun. 2020.

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AUTOLICENCIAMENTO EM TEMPOS DE PANDEMIA. A EXPERIÊNCIA DA SEMURB O autolicenciamento é uma modalidade de licenciamento onde o próprio empreendedor apresenta, por meio virtual ou por meio físico toda a documentação necessária, incluindo estudo que ateste a viabilidade ambiental do projeto, de modo que se possa considerar que o empreendimento em questão já está licenciado. Obviamente que a lei deve descrever de forma taxativa, quais os tipos de empreendimentos que são autorizados a fazer uso do autolicenciamento (levando em consideração o grau dos possíveis impactos ambientais). Este tipo de procedimento no licenciamento ambiental já tem sido adotado em alguns Estados da federação. Trata-se ainda de assunto polêmico, uma vez que alguns entendem que o procedimento transfere a tarefa da análise ambiental do órgão ambiental competente pelo licenciamento para o empreendedor que pode não ter o compromisso de proteger adequadamente o meio ambiente. No entanto, deve-se frisar que a “inversão” das fases do licenciamento não pode dispensar a fiscalização a posteriori do empreendedor, de modo a constatar se as informações por si prestadas são verídicas e se as medidas compensatórias, mitigadoras e até mesmo os condicionantes estão sendo observados. Como destacamos nas linhas anteriores, o autolicenciamento oferece ao empreendedor a possibilidade de ele próprio realizar a vistoria do empreendimento, preenchendo os documentos auto declaratórios. No caso da Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo do Município de Natal tais documentos estão contidos em links disponibilizados no seu sítio da internet, dentro da sua atividade e do seu enquadramento. O empreendedor pode também contratar uma empresa que tenha um vínculo com CREA, com o CAU ou com o CRBio e ele mesmo fica autorizado a fazer o próprio laudo. A confiança é um valor que precisa ser cultivado no Brasil, especialmente diante das peculiaridades atuais. Afinal, existe um profissional assinando uma ART 87 ou outros documentos técnicos. Importante frisar que o processo burocrático muitas vezes revela que se passa um ano em trâmites internos, para se concluir, ao final, que o empreendedor estava certo. Nesse interim, este fica sem ter o ato administrativo, que é indispensável, por exemplo, para que ele possa ir ao banco solicitar um financiamento, ou obter crédito de giro, para que sua a empresa possa “girar” nesse contexto econômico muito difícil em que estamos vivendo. Sendo assim, a SEMURB aceita, baseada em seus formulários oficiais, tanto o laudo, a própria vistoria, como também as auto declarações. E, claro, em momento posterior, irá atuar na fiscalização para buscar se há algum tipo de fraude, se há algum tipo de equívoco, e então fazer os ajustes necessários. Diante do quadro atual, até mesmo para valorizar os princípios da igual-

87  Anotação de Responsabilidade Técnica.

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dade e da proporcionalidade, não é razoável manter um processo como aquele que se faz em tempos de normalidade. Observe-se que se impõe uma nova metodologia de trabalho. A legislação não estabelece a obrigatoriedade do trâmite anterior. Sendo assim, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal, por meio de portarias, estabeleceu a metodologia nesse contexto de Covid-19. Essa realidade permite até mesmo que se emita mais atos administrativos do que antes da Covid-19. Essas medidas mostram que há um feedback extremamente positivo, de estímulo à legalização de empreendimentos, e também ao aquecimento do mercado econômico no Município de Natal. A resposta a todas essas demandas, feita de forma online, tem sido cada vez mais rápida. Com isso, o órgão ambiental municipal conseguiu ajustar e diminuir a queda de sua receita e em contrapartida ainda está estimulando o mercado. Diante de um quadro tão favorável, os empresários podem beneficiar-se da redução da burocracia e, dessa forma, legalizar seus empreendimentos (principalmente os micro e pequenos), de modo que possam obter o ato administrativo que precisam para ir até o banco, fazer suas negociações, buscar os créditos de que necessita (créditos rotativos ou créditos de financiamento) para que dessa forma possa viabilizar seus empreendimentos e garantir a empregabilidade. Como se percebe, não há como se dissociar o aspecto ambiental das necessidades econômicas, uma vez que o homem também constitui parte integrante do meio ambiente e precisa das condições e econômicas para a sua existência. 4 CONSIDERAÇÕES SOBRE O PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA AMBIENTAL As práticas acima expostas, especialmente em tempos de pandemia, valorizam o princípio da eficiência. Trata-se de uma ideia válida. É importante que se invista mais no valor da confiança. Dessa forma, se permite que o empresário faça a auto declaração e realize o auto licenciamento. No entanto, revela-se necessário que o órgão ambiental fique atento, de modo que possa expedir atos disciplinares, no sentido de que, se algo estiver errado, o órgão se faça presente no empreendimento autolicenciado e aplique as sanções cabíveis, devendo essas serem aplicadas com um rigor maior do que se estivéssemos em tempos de normalidade. 5 COMO LIDAR COMO O EXCESSO DE LEGISLAÇÃO EM TEMPOS DE COVID-19? RESPOSTA DA SEMURB Neste sentido, há um questionamento a ser respondido: nesse cenário de pandemia da Covid-19 e da insegurança jurídica formada pelo excesso de legislação que está sendo produzida, o que acontece com o cumprimento das 57


obrigações ambientais? A SEMURB (Município de Natal/RN) tem criado, através de portarias, metodologias que sejam auto declaratórias, estabelecendo um processo de confiança com aquele profissional que tem um link com o seu conselho de classe profissional. No entanto, há sempre aqueles que consideram: “essa auto declaração não funciona!”, “o brasileiro é desonesto por natureza”. Infelizmente, muitos têm esse pensamento como uma realidade imutável. No entanto, não se pode esquecer as experiências positivas que essa metodologia já alcançou no Brasil. Em Fortaleza (CE), há uma experiência administrativa de sucesso com o “Fortaleza Online”. Já se trabalha com auto declarações na grande parte dos licenciamentos, especialmente aqueles licenciamentos mais simplificados de impacto menor - e claro, tem que ser da parte urbanística. Aquelas questões mais complexas, que envolvem estudos ambientais mais complexos inviabilizam esse procedimento. No entanto, a grande maioria dos licenciamentos urbanísticos (em torno de 95%) podem ser realizados dessa forma. E aqui vale destacar uma estatística que é excepcional: quando se realiza a fiscalização in loco, 88% das informações que foram prestadas em toda documentação apresentada no Fortaleza Online88 (esse sistema auto declaratório) se confirmam por completo. Não há qualquer erro, não há qualquer equívoco. Dos 12% restantes, metade deles (ou seja, 6%) os erros e inconformidades são equívocos extremamente irrelevantes, que demandam pequenos ajustes. Diante desse exemplo do parágrafo anterior, percebe-se que não houve má-fé, ou seja, não houve tentativa de burlar a prefeitura ou de enganar o ente público. Quando muito o órgão urbanístico precisou exigir pequenos ajustes do empreendedor. Somente 6%, que é um universo muito pequeno, agiram de má-fé (alguma falsidade ideológica, algum tipo de informação falsa que, de forma proposital, ali foi colocada). Quando isso acontece o órgão ambiental informa o caso ao Ministério Público, para que este tome as providências cabíveis. Observa-se que lá o procedimento foi invertido: o Ministério Público é que é informado, ao invés de estar demandando, às cegas, no órgão ambiental. O Ministério Público deve, claro, continuar vigilante, mas para os casos excepcionais e não como regra de rotina. Não é razoável que o empreendedor e o profissional percam dois anos com o processo normal, com toda a análise que dele se exige, quando os processos menos complexos (mais da metade de todos os processos de licenciamentos ambientais e urbanísticos) poderiam ser simplificados com o autolicenciamento.

88 Para obter mais informações mais detalhadas sobre o Fortaleza Online, conferir: FORTALEZA (Cidade). Fortaleza Online. Disponível em: <https://catalogodeservicos.fortaleza.ce.gov. br/categoria/urbanismo-meio-ambiente/servico/139>. Acesso em: 22 jun. 2020.

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6 FISCALIZAÇÃO EM TEMPOS DE PANDEMIA: A ATUAÇÃO DA SEMURB A fiscalização ambiental é um dever dos órgãos ambientais, especialmente aqueles integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA). A legislação ambiental é muito extensa. Há muitos detalhes e prescrições que precisam ser observadas, especialmente pelos agentes econômicos. Neste sentido, poderíamos fazer em imprescindibilidade da fiscalização ambiental. Trata-se, portanto, de um dever de natureza fundamental. Que dever é esse? Aquele que decorre do artigo 225, caput da Constituição federal de 1988, quando diz que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Como está ocorrendo a fiscalização ambiental no âmbito do Município de Natal/RN? Algumas pessoas questionam também: “os servidores dos órgãos ambientais estão em teletrabalho. Como ficam as ações de fiscalização?”. A preocupação decorre do fato de que a quantidade de agentes está reduzida para realizar o trabalho externo. Nesse contexto, aquela pessoa que já era tendente a degradar se aproveita do momento atual para praticar infrações e cometer crimes ambientais. O Município de Natal/RN tem realizado regularmente ações de fiscalização, determinando o embargo ou a interdição de obras não licenciadas, combatendo invasões de áreas públicas, combatendo a poluição ambiental, em especial a poluição sonora, combatendo o despejo de esgotos sanitários, efluentes contaminados e disposição inadequada de resíduos sólidos em vias ou áreas públicas e particulares89 , além de combater a retirada de vegetação, incluindo quadros de degradação ambiental em APPs e em Zonas de Proteção Ambiental. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo informa90 que está atuando muito forte na fiscalização, tanto ambiental, quanto urbanística. A fiscalização ambiental, com focos bem distintos (esgotamento sanitário, destinação irregular e inadequada de esgotamento sanitário, lançamento irregular de resíduos sólidos urbanos, poluição sonora, poluição visual) está acontecendo - de forma adaptada em face das peculiaridades da Covid-19 - de forma efetiva. Está havendo também fiscalização acerca do cumprimento dos decretos municipais, estaduais e federais em relação ao combate a Covid-19, visando evitar aglomerações. Este órgão municipal está com uma atuação intensa visando com-

89  NATAL (Cidade). Fiscalização da Semurb vai auxiliar no combate ao Coronavírus em Natal. Disponível em: <https://www.natal.rn.gov.br/noticia/ntc-32814.html>. Acesso em: 23 jun. 2020. 90  NATAL, 2020.

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bater a supressão vegetal e a realização de queimadas. No que diz respeito à questão urbanística, tem atuado de forma incisiva sobre empreendimentos que não estão licenciados e que não têm seus alvarás de construção ou suas licenças de operações, e, principalmente, a invasão de áreas públicas. Em termos de funcionamento presencial, o órgão de fiscalização ambiental e urbanística de Natal informa91 que mantém uma equipe de fiscalização de forma presencial, na semana, das oito da manhã às 18 horas e outra em caráter de plantão das 18 à zero horas. Desta forma, a SEMURB está, de segunda a sexta, de oito da manhã até a meia-noite, atuando de forma presencial, alerta a chamadas e denúncias e circulando para combater, junto com a guarda municipal e a polícia militar, a questão de aglomerações. Nos sábados e domingos, o plantão é ainda maior: os agentes ambientais estão na sede da Semurb, nos sábados e nos domingos, das oito às 18 horas e das 18 horas até às cinco horas da manhã, em caráter de espera (plantão). Caso haja alguma denúncia este órgão ambiental acionará os fiscais que estão de prontidão. 7 IMPORTÂNCIA DA POLÍTICA DE RECURSOS HÍDRICOS EM TEMPOS DE PANDEMIA Um dado importante, segundo estudo da Organização Mundial de Saúde, é que 80% das doenças que acometem o ser humano são doenças de veiculação hídrica92 , ou seja, advém de água mal tratada, esgotos a céu aberto, irrigação com água poluída, ou balneabilidade inadequada. Estudos recentes apontam que a propagação do novo coronavírus é acelerada em ambientes insalubres, principalmente naqueles locais onde ocorre a disposição inadequada dos esgotos domésticos. Infelizmente o Brasil é uma vergonha no que diz respeito ao saneamento básico de suas cidades. Um pouco mais de 50% dos municípios brasileiros têm sistemas eficientes de esgotamento sanitário, o que é lamentável. Mais da metade da população brasileira ainda sofre com um problema parcial, ou até mesmo total no que diz respeito ao esgotamento sanitário, além de outros problemas como a destinação inadequada de resíduos sólidos urbanos, a drenagem urbana deficiente, ou abastecimento público sem qualidade. Esses são os quatro eixos do saneamento básico e ambiental. De que forma os governos devem trabalhar para avançar na questão do saneamento básico e ambiental? Com vontade política, visão e investimentos.

91  Ibid. 92  Ler mais em: FUNASA. Caderno de pesquisa em engenharia de saúde pública. Brasília, 2013. Disponível em: <http://www.funasa.gov.br/site/wp-content/files_mf/iiicaderno_pesquisa_2.pdf>. Acesso em: 23 jun. 2020.

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Tecnologia, nosso país dispõe. Recursos também. O que é necessário é que a capacidade de infraestrutura faça um link com a questão da tecnologia e dos conhecimentos sobre as características dos solos. O Brasil reúne condições ambientais extremamente satisfatórias para resolver, definitivamente, o problema do esgotamento sanitário. Isso porque dispomos de rios quentes, águas correntes, bem oxigenadas e com pH próximo ao neutro, que são condições ambientais que favoráveis ao tratamento e a destinação pós-tratamento, de modo que se possa finalizar a depuração completa do efluente. O que falta, realmente, vontade de fazer as coisas acontecerem no nosso país. Infelizmente, é isso. Enquanto nós não acabarmos com esse contexto, continuaremos com as piores infraestruturas de saneamento básico da América do Sul, com índices que só superam países como Venezuela, Haiti e Bolívia. 8 O LICENCIAMENTO AMBIENTAL NO ÂMBITO MUNICIPAL De acordo com a Lei Complementar nº 140/2011, os municípios passaram a ter competências específicas no processo de licenciamento ambiental, definidas em seu artigo 9º, inciso XIV. No entanto, os municípios só têm essa autonomia respeitando critérios técnicos, legislações próprias, conselho municipal de meio ambiente e fundo municipal de meio ambiente. No entanto, convém destacar que os municípios só têm autonomia de licenciar empreendimentos que possam gerar impactos locais. Normalmente, os empreendimentos maiores que exigem o Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) praticamente não existem a nível municipal. Nesse caso, vai caber muito mais aos órgãos estaduais conduzirem, se for o caso, audiências públicas online, em relação a atividades de grande impacto ambiental, que exigem, por exemplo, o EIA/RIMA. Como se sabe, uma das exigências do EIA/RIMA é que sejam realizadas audiências públicas. A nível municipal, isso praticamente não se aplicará. Claro que não se pode descartar por completo essa hipótese, por menos provável que seja, pois determinados empreendimentos, no âmbito municipal, podem exigir a apresentação de EIA/RIMA, diante do risco de impactos ambientais significativos. 9 TRINTA ANOS DE DEMOCRACIA NO BRASIL: AVANÇOS E RETROCESSOS AMBIENTAIS A Constituição de 1988 recebeu a alcunha de “Constituição Verde”, pela sua grande preocupação com as questões ambientais. O artigo 225 inaugurou um capítulo inédito na história das constituições brasileiras, destinado exclusivamente ao trato das questões ambientais. Dispõe que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial 61


à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade, o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Com base nesse artigo, se criou todo uma estrutura do direito ambiental, no Brasil, que se irradiou pela legislação infraconstitucional (decretos, resoluções, portarias etc.). E toda essa estrutura normativa tem um único objetivo: criar um Estado de Direito Ambiental no Brasil. Diante de uma situação como essa que o mundo vive, de uma pandemia, estamos sendo colocados no “cantinho da reflexão”. Não adianta apenas pensar no econômico e deixar o ambiental de lado, porque quando se pensa só no econômico e não se pensa no ambiental, podemos ser surpreendidos com notícias de que uma pandemia como a da Covid-19 está se espalhando pelo mundo. Há estudos que apontam para uma relação entre o vírus e as condições insalubres do ambiente. Então, nos perguntamos: de que adianta ter muito dinheiro e ver esse dinheiro ir embora no ralo dos dias, quando você está com o seu empreendimento parado ou quando você está em casa com medo? De que adianta? Uma situação como a presente veio para mostrar que a vida é muito mais importante do que o acúmulo de bens materiais. Não temos dúvidas que estamos vivendo um novo momento. O coronavírus só se espalhou pelo mundo todo porque nós temos um sistema completamente globalizado. E não é só o sistema econômico. Os problemas ambientais e de contaminações são hoje frutos de sistemas completamente globalizados. Como dizem os grandes teóricos da questão ambiental, o meio ambiente não respeita limites e fronteiras territoriais. Não há como impedir que danos ambientais ultrapassem os limites da divisão política de Estados, ainda mais quando há contaminação do lençol freático, do solo e da atmosfera. Diante do cenário atual percebe-se ser necessário reavaliar, não somente a nível de nação, mas a nível de mundo, critérios que possam uniformizar ações de combate a problemáticas globais. Hoje nosso problema é a Covid-19; mas certamente, no futuro teremos outros assuntos a enfrentar. Já enfrentamos o problema do “buraco” na camada de ozônio e enfrentamos, constantemente, problemas relacionados a mudanças climáticas globais. Nesse sentido se faz importante reavaliar, à luz do Direito Ambiental, como também globalizar instrumentos, normas e práticas, de modo que todos os países possam ter mais capacidade, em conjunto, para combater problemáticas globais, como a Covid-19, por exemplo.

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10 COVID-19: DESASTRE AMBIENTAL? A pandemia da Covid-19 se insere no conceito jurídico93 de desastre94 , o que reclama um regime jurídico integrativo dos demais ramos do Direito, para o cumprimento de missões pautadas na manutenção operacional, na estabilidade do direito e na redução da vulnerabilidade95 . Para tanto, é necessária a presteza na resposta emergencial – por exemplo, no procedimento de identificação das vítimas96 –, na compensação das vítimas e na reconstrução do sistema de serviços públicos97 . A consequência de um desastre no universo político-jurídico é de hiperprodução normativa98 , de regimes jurídicos transitórios e de conflitos judiciais possíveis, calcados nos diversos ramos do direito. Isso porque as decisões po-

93  “A partir da constatação de que a pandemia é aglutinada no conceito jurídico de desastre, esse atua como elemento jurídico comum capaz de promover a integração do Direito dos Desastres com as demais áreas jurídicas”. Ver em: CARVALHO, Délton Winter de. A natureza jurídica da pandemia Covid-19 como um desastre biológico: um ponto de partida necessário para o Direito. Revista dos Tribunais, São Paulo, n. 1.017, p. 5, jul. 2020. 94  “Os desastres consistem, conceitualmente, em um cataclismo sistêmico de causas que, combinadas, adquirem consequências catastróficas”. Ver em: CARVALHO, 2020, p. 3. 95  “O Direito dos Desastres irradia aos demais ramos o cumprimento conjunto de diversas funções tais como (i) manter a operacionalidade do Direito, assegurando sua habilidade de operar de acordo com os seus padrões de regras, procedimentos, rotinas e protocolos; (ii) lutar contra a ausência de Direito, pois nos desastres há a necessidade de que seja assegurada uma rápida atuação acerca das possíveis violações jurídicas nas comunidades atingidas por eventos graves; (iii) fornecer estabilização e reacomodação, devendo as vítimas serem abrigadas e, dependendo da gravidade do evento, serem permanentemente realocadas; (iv) promover a identificação das vítimas e responsáveis; e, (v) finalmente, reduzir a vulnerabilidade futura, mediante os processos de aprendizagem com os eventos passados e as experiências bem-sucedidas”. Ver em: Ibid,, p. 5. 96  “De outro lado, o Direito deve exercer funções específicas de prevenção e mitigação, de resposta emergencial, de compensação às vítimas e de reconstrução dos sistemas atingidos (como o de saúde, por exemplo), naquilo que se denomina círculo do Direito dos Desastres”. Ver em: Ibid,, p. 5. 97  Ibid., p. 5. 98  “A configuração de um evento como desastre geralmente ocasiona uma hiperprodução de atos normativos e conflitos judiciais nas mais diversas áreas do Direito, porém, tais devem ser integrados por uma racionalidade comum, tendo duas consequências: i) de um lado, uma função jurídica de, a partir da assimilação da anormalidade, encaminhar as rotinas jurídicas e a própria Sociedade na direção de uma nova normalidade, operacionalmente estável; ii) de outro, cada ramo do Direito acaba assimilando e produzindo suas próprias reações específicas, seja no Direito Constitucional, no Direito Privado, Direito Processual Civil, Direito Ambiental, Direito do Trabalho, Direito Administrativo, Direito Tributário e assim por diante”. Ver em: Ibid., p. 6.

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líticas centram na precariedade99 da norma e na gestão adaptativa100 fundada nas descobertas científicas de controle do desastre. No entanto, a estabilidade buscada tem como características a assimilação do desastre e a reativatividade programada de cada ramo do direito101 . No âmbito do direito ambiental, cabe o uso expressivo do macroinstituto jurídico da Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), o qual apoia atos decisórios102 prévios e complexos que programam o manejo de recursos e de impactos ambientais, a fim de consubstanciar a sustentabilidade institucional, econômica e ambiental nacionais. Além disso, é pertinente a execução da AAE no âmbito regional ou nacional e da Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) na esfera local103 . A partir disso, justifica-se a responsabilidade compartilhada do setor público e privado, à medida que a AIA é adaptada ao contexto socioambiental e consequentemente o próprio licenciamento ambiental104 ; e as atividades do setor privado são fundamentadas pelos Estudos de Impacto Ambiental (EIA)105 . No contexto pandêmico, em que carecem medidas seguras e estáveis, desvel-

99  “Via de regra, as decisões tomadas em tais contextos deverão ser pautadas pela precariedade (possibilidade de revisão a qualquer momento) e guiadas por uma gestão adaptativa (adaptative management), isto é, que podem ser adaptadas ao passo que forem chegando novas informações, preponderantemente científicas”. Ver em: Ibid., p. 7. 100  Ibid., p. 7. 101  Ibid., p. 7. 102  “A AAE, conhecida na literatura inglesa como Strategic Environmental Assessment (SEA), é considerada hoje em dia como o mais pujante instrumento de apoio aos processos decisórios sobre rumos do desenvolvimento regional e nacional, que implicam usos e impactos significativos aos fatores ambientais.” Ver em: MENEZES, Rubens Losada de. Relação da Avaliação de Impacto Ambiental, licenciamento ambiental e Avaliação Ambiental Estratégica. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n. 77, p. 227-264, p. 17, jan./mar. 2015. 103 “Além disso, a avaliação ambiental ao ser exigida em duas escalas espaciais, regional ou mesmo nacional (AAE), e local (AIA), denota-se a responsabilidade jurídica compartida entre Poder público e setores econômicos para que a avaliação da sustentabilidade ambiental ocorra de forma integral.” Ver em: Ver em: MENEZES, 2015, p. 18. 104  “Dada a importância, cabe a doutrina ressaltar a funcionalidade desse macroinstituto jurídico ambiental, especialmente, sua conexão para a adequada operatividade da AIA, consequentemente do licenciamento ambiental, e demais instrumentos jurídicos previstos na PNMA”. Ver em: Ibid., p. 17. Vide Política Nacional do Meio Ambiente (PMNA). 105  “Ao setor público cumpre, participativamente, promover o enfoque adaptativo da AIA, desde o mais alto nível político-institucional. Conseguinte, deve avaliar horizontes de desenvolvimento tendo em mira a aptidão territorial, o que racionalizará o processo de ordenação dos setores produtivos em uma região. Por sua vez, mais especificamente aos empreendedores, cumpre promover a avaliação ambiental de forma pontual, especificamente com os EIA necessários a contextualização prévia das atividades propostas, assim como adotando as pertinentes medidas de acompanhamento ambiental.” Ver em: Ibid., p. 18-19.

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m-se sobremaneira os obstáculos106 na implementação da AAE, quais sejam, da precária participação popular, da indefinição política e de metodologias pouco aperfeiçoadas. Acerca do licenciamento ambiental, este é ato administrativo vinculado, ou seja, sua ocorrência depende da obediência a hipóteses legais – a exemplo da previsão contida na Lei nº 6.938/81 – e da existência de pressupostos para a sua prática. Além disso, este tipo de licença é regido por princípios do direito ambiental107 , quais sejam, da prevenção, da precaução, do controle do poluidor pelo Estado e da cooperação. Processualmente108 , constitui-se pela sequência lógica de procedimentos que garantem a tutela do meio ambiente em face da Administração Pública. Assim sendo, as entidades ambientais de todos os entes federativos têm a prerrogativa de licenciar nesta matéria, sendo o ato mais efetivo quando orientado pela cooperação e consequentemente ausentes as ações judiciais que findam limitando as competências dos entes, sem qualquer fundamento constitucional109 , o que serviria apenas para agravar a morosidade conhecida do licenciamento ambiental e para comprometer os programas de governo de um chefe do Executivo. 11 CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante dos fatos e considerações trazidas ao longo desse capítulo percebe-se que as políticas ambientais, assim como outras políticas precisam se adaptar a esses tempos de pandemia da Covid-19, de modo que os impactos

106 Ver em: PARTIDÁRIO, Maria Rosário. Strategic Environmental Assessment: Key Issues Emerging From Recent Practice. Environmental Impact Assessment Review, n. 16. p. 31-55, 1996 apud MENEZES, 2015, p. 18-19. 107 MOREIRA, Eliane Cristina Pinto. O licenciamento ambiental e a participação dos entes federativos interessados. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, v. 79, p. 3, jul./set. 2015. 108  “Entendido como processo, o licenciamento ambiental é um encadeamento de atos que progressivamente se desenvolvem em várias fases, suscitando a observância de uma série de princípios, tudo com vistas à emissão de um ato administrativo de outorga (a licença ambiental, propriamente dita).” Ver em: SILVA FILHO, Derly Barreto e. A processualidade das licenças ambientais como garantia dos administrados. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, v. n. 7, p. 3, jan./mar. 1997. 109  “Todavia, a exclusão mútua dos entes federativos no bojo do licenciamento ambiental é ainda regra no País e a maior expressão das dificuldades de cooperação se expressam em demandas judiciais que não contribuem em nada para a adequada gestão ambiental e se reduzem a dizer qual o ente federativo competente para o licenciamento, que não resguarda qualquer relação com o texto constitucional. solucionando a questão na superfície, mas deixando sem qualquer tratamento a cooperação tão necessária a este procedimento.” Ver em: MOREIRA, 2015, p. 9.

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já sentidos na saúde humana não venham a se causar estragos ainda maiores nas economias local, regional e nacional. Não obstante essas adaptações sejam necessárias, especialmente no que diz respeito a alterações nos trâmites e nos prazos de licenciamentos ambientais e outros procedimentos firmais, os rigores da fiscalização ambiental devem ser ainda maiores do que em tempo de normalidade. Não se pode esquecer que algumas pessoas, infelizmente, podem querer se beneficiar de uma suposta “paralização das atividades fiscalizatórias” dos órgãos ambientais para praticarem infrações administrativas ambientais e até mesmo crimes ambientais. Por esta razão mais do que suficiente, os órgãos que compõe a estrutura do Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA) não podem descuidar de ações de fiscalização ambiental, mesmo que para suprir eventuais desfalques nas equipes de fiscalização (por conta da pandemia, como por exemplo, fiscais que fazem parte do grupo de risco) este órgão precise investir em tecnologias que permitam a fiscalização à distância ou por meio de equipamentos, como os drones, satélites, ou quaisquer outros. Além de equipamentos tecnológicos, o órgão ambiental deve manter em atividade equipes de fiscalização, em sistema de escala de trabalho, para que possam atender chamados e denúncia de infrações ou crimes ambientais. Este capítulo, em específico, destacou também as ações que vêm sendo desenvolvidas no combate à pandemia no âmbito da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo do Município de Natal, que foram apresentadas pelo Secretário titular da pasta, Thiago de Paula Nunes Mesquita, em live que inspirou este capítulo, disponível no Canal do YouTube do Instituto Novo Eleitoral, através do link: <https://www.youtube.com/watch?v=FdjYELq7Zb0&t=3733s>.

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Referências CARVALHO, Délton Winter de. A natureza jurídica da pandemia Covid-19 como um desastre biológico: um ponto de partida necessário para o Direito. Revista dos Tribunais, São Paulo, n. 1.017, p. 5, jul. 2020. FORTALEZA (Cidade). Fortaleza Online. Disponível em: <https://catalogodeservicos.fortaleza.ce.gov.br/categoria/urbanismo-meio-ambiente/servico/139>. Acesso em: 22 jun. 2020. FUNASA. Caderno de pesquisa em engenharia de saúde pública. Brasília, 2013. Disponível em: <http://www.funasa.gov.br/site/wp-content/files_mf/iiicaderno_pesquisa_2.pdf>. Acesso em: 23 jun. 2020. MENEZES, Rubens Losada de. Relação da Avaliação de Impacto Ambiental, licenciamento ambiental e Avaliação Ambiental Estratégica. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n. 77, p. 227-264, jan./mar. 2015. MOREIRA, Eliane Cristina Pinto. O licenciamento ambiental e a participação dos entes federativos interessados. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, v. 79, p. 77-93, jul./set. 2015. NATAL (Cidade). Fiscalização da Semurb vai auxiliar no combate ao Coronavírus em Natal. Disponível em: <https://www.natal.rn.gov.br/noticia/ntc-32814.html>. Acesso em: 23 jun. 2020. PARTIDÁRIO, Maria Rosário. Strategic Environmental Assessment: Key Issues Emerging From Recent Practice. Environmental Impact Assessment Review, n. 16, p. 31-55, 1996. SILVA FILHO, Derly Barreto e. A processualidade das licenças ambientais como garantia dos administrados. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, v. n. 7, p. 81-91, jan./mar. 1997.

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Capítulo 4 COVID-19 E SEUS REFLEXOS SOBRE O DIREITO À SAÚDE Valéria Maria Lacerda Rocha110 Evelinny Alves de Oliveira 111

1 INTRODUÇÃO No cenário global se vive um momento de frenesi diante da pandemia da Covid-19112 , já considerada a maior do século XXI por seu poder letal em um período tão curto de tempo. Sua velocidade de disseminação tem provocado mudanças profunda em todos os âmbitos da sociedade tanto nacional como internacional. A própria interação diária das pessoas tem sofrido grande reformulação, alterando radicalmente e dramaticamente o que antes era conhecido como normalidade na rotina social.

110  Graduada em Direito pela Universidade Federal do Ceará no ano de 1997. Juíza de Direito, Professora da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, Coordenadora do Comitê Estadual das Demandas da Saúde, Mestre em Direito Constitucional, Doutoranda pela UFPR, Leciona as disciplinas de Direito de Contratos, Obrigações e Direito da Criança e do Adolescente. Junto a Escola da Magistratura do Rio Grande do Norte - Núcleo Região Oeste exerceu a função de Coordenadora Adjunta de Comunicação do período de 2005 a 2008. Coordenadora do CEJUSC-Saúde Natal. 111  Graduanda em Direito pela Universidade Estadual do Rio Grande do Norte - UERN. Graduada em Serviço Social e Especialista em Assistência Sociojurídica e Segurança Pública pelo Centro Universitário Facex – UNIFACEX. 112  Covid-19 é um vírus da família do Coronavírus que causam infecções respiratórias. O novo agente do vírus foi descoberto em 31/12/19 após casos registrados na China. BRASIL. Ministério da Saúde. Sobre a doença. 2020a. Disponível em: <https://coronavirus.saude.gov.br/sobre-a-doenca>. Acesso em: 30 maio 2020

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Apesar das epidemias de Influenza tipo A113 , como a H1N1114 terem ocorrido nos últimos anos causando preocupação nos pesquisadores, o mundo não pareceu disposto a discutir as probabilidades de uma pandemia ocorrer hodiernamente, embora, os estudos e prognósticos epidemiológicos115 demonstrassem o contrário e a história humana ser marcada por inúmeras epidemias e pandemias com letalidade atroz ainda maior do que a Covid-19. Ademais, importante nesse momento, evidenciar o debate sobre o modelo de sociedade sustentável necessário para a sobrevivência da vida humana na terra, diante do comportamento predatório do sistema capitalista através de uma produção intensa e o incentivo a um consumo exacerbado. Isso tem gerado um profundo desequilíbrio com a natureza, ameaçando inúmeras espécies de vida na terra, aprofundando a crise ecológica e causando impactos profundos à vida das pessoas no âmbito da saúde. Assim destaca Zanella (2016)116 , alguns dos fatores para a emergência ou reemergência de doenças é a expansão populacional, o processo de globalização, as mudanças climáticas e a intensa exploração da produção animal. Como já é claro atualmente, a origem das pandemias se dá na relação dos homens com os animais que acabam sendo os agentes transmissores desses vírus. Segundo a autora, já em 2009 um relatório da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) indicava “que mais de 75% das doenças humanas do último século são de origem animal” assim como no relatório de 2013 da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricul-

113 Influenza A subtipo H1N1, também conhecido como A (H1N1 – gripe suína), é um subtipo de Influenzavirus A e a causa mais comum da influenza (gripe) em humanos. WIKIPEDIA. Influenzavirus A subtipo H1N1. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Influenzavirus_A_subtipo_H1N1>. Acesso em: 30 maio 2020b. 114  A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou em 25 de abril de 2009 que a epidemia era um caso de “Emergência de Saúde Pública de Âmbito Internacional”. No dia 11 de junho o nível de alerta subiu ao máximo (nível 6) e é decretada a pandemia, visto esta existir em mais de 75 países e em vários continentes. WIKIPEDIA. Pandemia de gripe A de 2009. 2020a. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Pandemia_de_gripe_A_de_2009>. Acesso em: 30 maio 2020. 115  “Epidemiologia é uma disciplina básica da saúde pública voltada para a compreensão do processo saúde-doença no âmbito de populações, [...] preocupa-se com o desenvolvimento de estratégias para as ações voltadas para a proteção e promoção da saúde da comunidade.” WALDMAN, Eliseu Alves. Vigilância em Saúde Pública. Colaboração de Tereza Etsuko da Costa Rosa. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, 1998. (Série Saúde & Cidadania). v 7. 116  ZANELLA, Janice Reis Ciacci. Zoonoses emergentes e reemergentes e sua importância para saúde e produção animal. Pesq. agropec. bras., Brasília, v. 51, n. 5, p. 510-519, maio 2016. DOI: 10.1590/S0100-204X2016000500011.

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tura (FAO)117 que mais uma vez alertava sobre o surgimento de novas doenças de origem animal, demonstrando a necessidade de um modelo social e econômico integrado com o meio ambiente. No momento, corre-se contra o tempo em busca de uma vacina que amenize a crise que está sendo vivenciada no mundo, de forma a remediar consequências mais drásticas que se sucederão do campo econômico ao social. Neste cenário, tem sido imposta uma série de restrições que requisitam de forma veemente o poder Judiciário no âmbito de ações de combate ao novo coronavírus. E, especialmente, do campo da saúde existe uma imensa inquietação quanto à tutela da saúde coletiva, diante de medidas desafiadoras, e, de como essas demandas chegarão ao judiciário. 2 OS IMPACTOS DA COVID-19 NA JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE No Brasil, a crescente necessidade de concretização dos direitos fundamentais, que foram estabelecidos pela Constituição Federal de 1988, tem nos últimos anos provocado um fenômeno denominado de ativismo judicial. Segundo Barroso, houve um aumento significativo por justiça na sociedade brasileira118 . Cada vez mais a população tem se socorrido do Poder Judiciário para efetivar direitos fundamentais que são oferecidos de forma irregular ou que sequer chegam a ser efetivados pela gestão pública. Essa Jurisdição Constitucional de interpretação e aplicação da Constituição passou a ser cada vez mais utilizada para solucionar problemas de cunho político, não resolvidos na seara do Legislativo e do Executivo. Ainda na visão de Barroso “desde o final da Segunda Guerra Mundial verificou-se, na maior parte dos países ocidentais, um avanço da justiça constitucional sobre o espaço da política majoritária, que é aquela feita no âmbito do Legislativo e do Executivo” .119 Pode-se, então, afirmar que o berço do ativismo judicial ocorreu quando da inércia ou aparente omissão do poder público para concretização e efetivação dos direitos fundamentais, através das chamadas políticas públicas. Seguindo ainda os ensinamentos de Barroso, “a ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos

117  More than 70 percent of the infectious diseases that have emerged in humans since the 1940s could be traced back to wildlife (Jones et al., 2008). FAO. World Livestock 2013 – Changing disease landscapes. Rome, 2013. E-ISBN 978-92-5-107928-7. p. 55. 118  BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 410. 119  BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 13, p. 17-32, 2009. ISSN 11384824.

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outros dois Poderes”.120 Para Barroso, judicialização e ativismo são primos, vem da mesma família, frequentam os mesmos lugares, mas não têm a mesma origem, as causas imediatas os distanciam121 . Enquanto a judicialização é a própria atuação do Judiciário dentro do que foi adotado pela Constituição do país. O Judiciário decide porque é necessário fazê-lo, porque está dentro de sua competência funcional. Já o ativismo judicial é uma escolha, uma forma, um modo de interpretar a constituição, expandindo ou restringindo o seu alcance. A judicialização, no contexto brasileiro, é um fato, uma circunstância que decorre do modelo constitucional que se adotou, e não um exercício deliberado de vontade política. Em todos os casos referidos acima, o Judiciário decidiu porque era o que lhe cabia fazer, sem alternativa. Se uma norma constitucional admite que dela se deduza uma pretensão, subjetiva ou objetiva, ao juiz cabe dela conhecer, decidindo a matéria. Já o ativismo judicial é uma atitude, a escolha de um modo específico e proativo de interpretar a Constituição, expandindo o seu sentido e alcance. Normalmente ele se instala em situações de retração do Poder Legislativo, de um certo descolamento entre a classe política e a sociedade civil, impedindo que as demandas sociais sejam atendidas de maneira efetiva.

Assim, sempre que o Judiciário for chamado para atuar na interpretação e/ou concretização de direitos fundamentais, agindo dentro de uma margem que em tese seria do legislativo ou do executivo, fugindo de sua função tradicional de mera aplicação do direito aos fatos, estar-se-á diante do ativismo judicial. Entretanto, sempre que o Poder Judiciário é chamado para atuar na concretização de políticas públicas destinadas a efetivação de direitos fundamentais, estar-se-á diante da Judicialização da Política Pública. Indo um pouco mais, pode-se afirmar que quando se intervém judicialmente na Política Pública, restringindo ou ampliando direito, e até mesmo decidindo o juiz que isso ou aquilo deve ser levado em conta na tomada de decisão política, estar-se-á diante de uma judicialização das políticas públicas que requer uma decisão estruturante ou baseada no ativismo judicial. Destarte, entendendo que a Judicialização da Saúde é o fenômeno em que o Judiciário é chamado para intervir na política pública garantidora do Direito à Saúde, insculpido na Constituição Federal de 1988, é importante nesse momento de pandemia contextualizar a evolução de referida judicialização nas duas últimas décadas, período esse em que os processos de saúde ganharam bastante repercussão no cenário nacional.

120  BARROSO, 2009, p. 17-32. 121  Ibid., p.21

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Os que se dedicam a estudar, trabalhar e pesquisar na seara da Judicialização da Saúde percebem claramente que existem três cenários muito nítidos nesse fenômeno da Judicialização da Saúde, a saber: 1) O primeiro cenário que ocorre da promulgação da Carta Magna de 1988 e vai até o julgamento do RE 271286, o qual ocorreu no ano 2000. Esse julgado refere-se aos pacientes portadores do vírus HVI e a sua hipossuficiência, e a relatoria foi do Ministro Celso de Mello; 2) O segundo cenário, inicia-se após o julgamento do RE 271286 e perdura até por volta do ano de 2009, quando ocorreu a Audiência Pública nº 4; 3) o terceiro cenário que ocorreu após a Audiência Pública nº 4 e perdura ou perdurou até o advento da pandemia ocasionada pelo coronavírus ou a pandemia da Covid-19. Antes de detalhar os três cenários da judicialização, faz-se necessário mencionar que o recorte do presente artigo é feito a partir da Constituição Federal de 1988, haja vista que embora antes desse período já se tinha no ordenamento jurídico noções sobre direito sanitário, entretanto, somente com a Constituição Federal de 1988 passa-se a ter um quadro definido de saúde como um direito fundamental do cidadão brasileiro. Segundo a Constituição Federal de 1988 “a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção a maternidade e à infância, a assistência aos desamparados” (art. 6º), são direitos sociais que devem ser garantidos pelo Estado, enquanto Poder Público. A Constituição Federal conferiu status de direito social fundamental e consagrou ser dever do Estado a garantia do direito à saúde. O direito à saúde está situado no macro-sistema da seguridade social, assim como a previdência e a assistência. Dispõe o artigo 192 da CF/1988 que “a seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”. Encontra-se dentro desse sistema de prestação e efetivação o direito à saúde, aquele que é fornecido pelo Poder Público, através do Sistema Único de Saúde, e aquele que é prestado de forma particularizada ou supletivamente pelos Planos de Saúde, porém devidamente fiscalizados e regulamentados pela Agência Nacional de Saúde. Tanto a saúde pública como a saúde privada estão diretamente vinculados ao direito à vida, entretanto 122, a saúde pública encontra amparo prestacional no dever do Estado, e a saúde privada ou suplementar encontra amparo prestacional na iniciativa privada.

122  VASCONCELOS, Fernando A. de. O direito a saúde: por uma base constitucional e consumerista. In: SILVA, Anderson Lincoln Vital da (org.). Reflexões sobre o direito à saúde. 1. Ed. Florianópolis: Empório do Direito, 2016. p. 11.

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As operadoras dos planos de saúde prestam um serviço público de forma complementar, assim como sói acontecer na prestação do direito à educação, que também pode ser fornecido por entes particulares. Nesse último caso, a saúde suplementar além da Constituição Federal tem também resguardo legal no Código de Defesa do Consumidor, como bem leciona Vasconcelos, “o CDC, no afã de bem resguardar o direito à saúde, recorre a outro direito fundamental, a informação. É através da informação que o Estado aguarda ofertar meios de o próprio cidadão consumidor proteger sua saúde contra produtos ou serviços impróprios para o uso ou o consumo”. No presente ensaio não será objeto de estudo a saúde suplementar, apenas aqui referida para que se tenha noção que no Brasil, assim como em outros ramos dos Direitos Fundamentais, existe a possibilidade da prestação ser fornecida por entes privados, os quais de forma supletiva e privada atuam na concretização desses Direitos Fundamentais. Essas ações desenvolvidas pela iniciativa privada são fiscalizadas por agências reguladoras, as quais fiscalizam de modo a impedir que haja abuso por parte dos seus prestadores. Entretanto em que pese terem fundamentos na Constituição Federal, quando prestado pela iniciativa privada, o viés interpretativo deverá levar em consideração a relação contratual existente entre as partes, evitando-se de todo modo o abuso do direito de defesa ou a ilegalidade na prestação do serviço. Na saúde pública há o dever prestacional do Estado, na saúde suplementar ou privada há uma proteção consumerista para o usuário do plano ou seguro saúde, conforme leciona Gregory, a Constituição Federal de 1988 estabelece os serviços de saúde como um estado de bem-estar social, que conta tanto com a participação do setor público quanto da iniciativa privada123 , mas mesmo sendo entregue a iniciativa privada por relacionar-se a um bem maior, não pode ser explorado de toda e qualquer maneira. Assim, mesmo na saúde suplementar cuja base legal muitas vezes é uma relação contratual, por se tratar de um direito público subjetivo e fundamental estará a cargo da fiscalização dos órgãos públicos e até do próprio Judiciário. Retomando ao tema Direito à Saúde enquanto dever do Estado, cabe aqui as lições de Sarlet , no sentido de que saúde é um “pressuposto à manutenção e gozo da própria vida – e vida com dignidade, ou seja, vida saudável e com certa qualidade – assim como para garantia das condições necessárias à fruição dos demais direitos, fundamentais ou não, inclusive no sentido de viabilização do livre desenvolvimento da pessoa e de sua personalidade” 124

123  GREGORY, M.S. Planos de saúde: a ótica da proteção do consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 27. 124  SARLET, Ingo Wolgang; FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. Notas sobre o direito fundamental à promoção da saúde na ordem juridico-constitucional brasileira. In: ASESNSI, Felipe Dutra;

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O direito à saúde é consectário do Direito à Vida, não basta apenas se garantir a sobrevivência e a dignidade da pessoa humana, se não se tratar da saúde como um todo do cidadão brasileiro. Vale aqui destacar que o Estado, ente público garantidor desse direito, deve garantir o direito à saúde, e não o direito à doença. Quando o cidadão busca o Judiciário para o recebimento de fármacos ou a submissão a procedimentos médicos, não está tratando da saúde e sim da doença, que já se instalou em seu organismo, e muitas das vezes, são enfermidades que poderiam ser evitadas, caso houvesse um tratamento preventivo. Deve-se compreender que o direito à saúde antecede ao direito ao tratamento médico, o Poder Público antes de tratar a doença, deve promover ações que visem fomentar à saúde da população brasileira. De nada adianta tratar as doenças de base, se não se trata ou se promove a sua não ocorrência, através de ações preventivas. E a própria prevenção também está entre os objetivos e ações a serem desenvolvidas na ação prestacional dos entes públicos. Desta forma, contextualizado todo esse cenário da Judicialização da Saúde, que passa pela compreensão do Direito à Saúde como Direito Fundamental garantido pelo Poder Público até as inúmeras ações que se avolumam atualmente nas varas de Fazenda Pública, voltar-se-á aos cenários da Judicialização da Saúde no Brasil. Alhures afirmou-se que existem três cenários, e que o recorte histórico foi feito a partir da Constituição Federal de 1988, porque foi o marco legislativo que alçou o Direito à Saúde a um direito público, subjetivo, social e fundamental. Assim, o primeiro cenário de judicialização que é apontado é o que se inicia com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e vai até o julgamento do RE 271286. Durante todo esse período de 1988 até 2000, ano em que ocorreu esse julgamento, pouquíssimas ações chegaram as portas do judiciário, e as que chegaram eram indeferidas ou muitas vezes julgadas inapropriadamente haja vista que as normas relativas aos direitos sociais eram consideradas normas programáticas, e como tais dependiam da oportunidade e conveniência do gestor público. Então pode-se afirmar que nessa primeira etapa da judicialização houve pouquíssima atuação do Judiciário, até mesmo porque a população talvez ainda não tivesse consciência de seus direitos. No ano 2000, um caso emblemático e histórico julgado pelo STF se deu com o julgamento do RE 271286, esse processo dizia respeito aos pacientes portadores do vírus HVI e a sua hipossuficiência, o julgado cuja relatoria foi do Ministro Celso de Mello, traz em seu voto o seguinte destaque:

PINHEIRO, Roseni (org.). Direito Sanitário. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012. p. 31.

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O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa consequência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ- LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado [...] .125

Mello reconheceu em seu voto que as normas programáticas não são promessas constitucionais inconsequentes que ficam ao livre arbítrio do gestor público. A sociedade precisa que o seu direito seja efetivado dentro de um prazo razoável. A partir de seu pronunciamento, o Judiciário não poderia mais se omitir na apreciação das causas envolvendo o direito à saúde, mesmo que a norma fosse programática. Começa aqui o segundo cenário da judicialização da saúde, o qual irá permanecer até a Audiência Pública nº 4. Estava formalmente reconhecida e superada a tese de que normas programáticas necessitam da conveniência e oportunidade do administrador. Sim, as normas programáticas dependem dessa iniciativa, mas não podem ficar em um limbo jurídico ad eternum, sem uma resposta concreta por parte da Administração Pública. Como consequência, diante de um cenário tão desigual entre concretização de direitos e serviço prestacional por parte da administração pública, o Judiciário a partir de então passou a ser acionado constantemente para solucionar conflitos de interesses em processos individuais e coletivos de saúde. Ocasio-

125  RE 271286 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 12/09/2000, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJ 24-11-2000 PP-00101 EMENT VOL-02013-07 PP-01409.

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nando do período de 2000 a 2009 uma crescente judicialização da saúde, principalmente, da saúde pública. De acordo com Clenio Shulze, a crise do Estado-legislador e a crise econômico-financeira do Estado-administrador, permitiu que a população na ânsia de se socorrer para efetivar direitos essenciais a sua sobrevivência se socorresse cada vez mais do Poder Judiciário para a garantia e concretização de direitos fundamentais, em especial o direito à Saúde. 126 Destarte nesse segundo cenário, que se inicia com o julgamento do RE 271286 e que perdura até a Audiência Pública nº 4, as ações se avolumaram, os juízes sem o conhecimento técnico adequado quanto as causas de saúde, até mesmo porque não são formados em medicina, decidiam com base na teoria jurídica, e muitas vezes motivado pela emoção, já que não queriam ser responsáveis pela morte de ninguém. Preocupado com essa situação do aumento desenfreado das ações de saúde, Gilmar Mendes em 2009, na condição de presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça, convocou a Audiência Pública de nº 04, e após a oitiva de mais de 50(cinquenta) atores dos diversos campos da judicialização da saúde, passou a fazer uma série de recomendações aos juízes de todo o pais. Começa aqui o que chamamos de terceiro cenário da judiciliazação da saúde no Brasil. Como resultado dessa audiência pública foi formado um grupo de trabalho, instituídos através da Portaria nº 650, de 20 de novembro de 2009, o qual tinha como objetivo principal traçar metas de atuação para orientação e controle dos processos judiciais de saúde. Do trabalho dessa comissão foi elaborada a Recomendação nº 31, de 30 de março de 2010, a qual previu diretrizes aos magistrados e tribunais quanto às demandas judiciais que envolvem a assistência à saúde, como a necessidade de manifestação técnica nos processos judiciais, a oitiva dos demandados e o não deferimento de produtos não registrados na ANVISA. Em 6 de abril de 2010, o CNJ publicou a Resolução n. 107, que instituiu o Fórum Nacional do Judiciário para monitoramento e resolução das demandas de assistência à Saúde – Fórum Nacional da Saúde. O Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde é formado por um comitê executivo nacional, conforme disciplinado pela Portaria n. 40, de 25 de março de 2014, o qual tem como objetivo traçar as metas e ações para os tribunais nas matérias relacionadas à Judicialização da Saúde. Mais recentemente, sob a presidência do Ministro Ricardo Lewandowski, foi editada a Resolução n.º 238, de 06 de setembro de 2016, que dispôs sobre a criação e manutenção pelos Tribunais de Justiça e Regionais Federais dos Comi-

126  SHULZE, Clenio Jair. Direito à saúde, análise à luz da judicialização. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2015. p. 29.

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tês Estaduais da Saúde, bem como a especialização de vara em comarcas com mais de uma vara de fazenda Pública. Vale destacar, que os Comitês Estaduais já existiam desde a criação do Fórum Nacional da Saúde, mas somente fora disciplinado em 2016 com a Resolução nº 238. O Fórum e os Comitês têm a função precípua de subsidiar com informações e estatísticas os magistrados, e, a sociedade como um todo, monitorando assim as demandas judiciais que envolvem a assistência à saúde, discriminadas na Recomendação n.º 31, de 30 de março de 2010. 127 Entre as atividades do Fórum Nacional, além da criação dos Comitês Estaduais, forma ainda desenvolvidas as Jornadas de Direito à Saúde, a criação dos Núcleos Técnicos e mais recentemente a criação da plataforma e-Natjus. As Jornadas de Direito à Saúde, são eventos que reúnem especialistas da área, operadores do direito e gestores públicos, em intensos debates sobre as principais demandas surgidas. Já se realizaram três Jornadas de Direito à Saúde, tendo a última ocorrido nos dias 18 e 19 de março de 2019, no Estado de São Paulo. Durante a realização dos fóruns, além dos debates científicos, são votados enunciados de direito à saúde, cujo principal objetivo é a orientação das práticas jurisdicionais nas decisões judiciais em matéria de saúde, de modo que o juiz esteja sensível as questões orçamentárias da administração pública. Como ressalta Shulze “os enunciados contemplam resumos de práticas de sucesso e sugestões para os diversos atores do sistema judicial e do sistema de saúde”.128 O objetivo maior é a uniformização dos procedimentos adotados na efetivação das decisões judiciais em matéria de saúde. Outro instrumento de auxílio aos juízes que foi promovida com a criação do Fórum Nacional da Saúde foi a implantação nos Estados da Federação dos Núcleos de Apoio Técnico (NAT) ou das Câmaras Técnicas, órgãos responsáveis pela emissão de pareceres ou notas técnicas, fundamentados em medicina baseada em evidência. Os Núcleos de Apoio Técnico (NATJUS), conforme nomenclatura atual, auxiliam os magistrados na tomada de decisão liminar ou na emissão da sentença, fornecendo ao magistrado um parecer sobre a medicação ou o procedimento médico requerido. Shulze elenca algumas das atividades desenvolvidas pelos núcleos de apoio, são: “(1) se o medicamento postulado está registrado na ANVISA; (2) é eficaz e eficiente ao tratamento da doença; (3) existe outro medicamento com menor preço, com o mesmo princípio ativo ou já fornecido

127 “Recomenda aos Tribunais a adoção de medidas visando a melhor subsidiar os magistrados e demais operadores do direito, para assegurar maior eficiência na solução das demandas judiciais envolvendo a assistência à saúde”. 128  SHULZE, 2015, p. 84

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administrativamente pelo SUS;(4) eficiência, eficácia e custo-efetividade do tratamento” .129 Um novo projeto se delineia sob a coordenação do Fórum Nacional da Saúde, é o e-NAT, esse projeto trata-se de uma plataforma digital, que reuni um banco nacional de pareceres de saúde, disponível a toda e qualquer consulta pública. Esse banco de dados é alimentado pelos NATJus dos Estados, e de acordo, com o próprio site do CNJ: O objetivo do e-NatJus, cadastro nacional de pareceres, notas e informações técnicas, é dar ao magistrado fundamentos científicos para decidir se concede ou não determinado medicamento ou tratamento médico a quem aciona a Justiça. A plataforma digital oferece base científica para as decisões dos magistrados de todo o País quando precisarem julgar demandas de saúde. 130

Assim, nesse segundo cenário, que começou com a Audiência Pública nº 4, e que perdurou até o início da Pandemia da Covid-19, o que se percebe é que houve a preocupação por parte do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça em municiar a magistratura nacional de mecanismos para racionalizar e qualificar a decisão, além claro de permitir que a Judicialização, mesmo ocorrendo não inviabilizasse a política pública da saúde. Ocorre que embora haja todas essas orientações e recomendações nos processos de saúde por parte do CNJ, cujo objetivo principal é a minoração dos efeitos da judicialização na autonomia e independência do Poder Executivo, quanto as escolhas das políticas públicas, a possibilidade de bloqueio judicial nas contas públicas autorizada pela jurisprudência da corte máxima do país131 , causa

129  Ibid., p. 83. 130  Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/forum-da-saude/e-natjus>. Acesso em: 20 jun. 2020. 131  EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTOS. FORNECIMENTO A PACIENTES CARENTES. OBRIGAÇÃO DO ESTADO. I - O acórdão recorrido decidiu a questão dos autos com base na legislação processual que visa assegurar o cumprimento das decisões judiciais. Inadmissibilidade do RE, porquanto a ofensa à Constituição, se existente, seria indireta. II - A disciplina do art. 100 da CF cuida do regime especial dos precatórios, tendo aplicação somente nas hipóteses de execução de sentença condenatória, o que não é o caso dos autos. Inaplicável o dispositivo constitucional, não se verifica a apontada violação à Constituição Federal. III - Possibilidade de bloqueio de valores a fim de assegurar o fornecimento gratuito de medicamentos em favor de pessoas hipossuficientes. Precedentes. IV - Agravo regimental improvido. (AI 553712 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 19/05/2009, DJe-104 DIVULG 04-06-2009 PUBLIC 05-06-2009 EMENT VOL-02363-09 PP-01777 RT v. 98, n. 887, 2009, p. 164-167)

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um imenso desequilíbrio nas contas públicas. Mesmo com todo esse cuidado, a judicialização ainda tem um impacto financeiro grande nas contas públicas. E isso talvez seja a pior consequência da judicialização. O direito à saúde é um direito que se tem acompanhado de perto desde 2012 quando surgiu aqui no Rio Grande do Norte a necessidade de fortalecimento do Comitê Estadual das Demandas da Saúde.132 No ano de 2019 foi divulgado pelo CNJ um relatório realizado pelo Instituto de Ensino e Pesquisa – INSPER, ocasião em que foram constatados “um crescimento acentuado de aproximadamente 130%, no número de demandas de primeira instância relativas ao direito à saúde de 2008 para 2017” sendo os assuntos principais: Plano de Saúde, Seguro e Saúde, Tratamento Médico-Hospitalar e/ou Fornecimento de Medicamentos, sendo o assunto Saúde referente à saúde pública que representa 11,782% dos casos. (CNJ, p. 46, 48, 2019). Todo o cenário que surgiu após a audiência pública nº 4 foi no sentido de estar o Judiciário preparado para decidir essas demandas. Esse terceiro período, tem como ponto principal a preocupação do CNJ em municiar os magistrados de modo que as decisões passassem a ser técnicas e racionais. Não seria prudente que a fundamentação da decisão judicial fosse baseada apenas na teoria jurídica, haja vista a tecnicidade das causas. A preocupação era garantir o direito da parte, mas manter o sistema público funcionando. A judicialização da saúde não poderia impactar a administração pública a ponte de inviabilizar a gestão pública. Destarte, estava-se diante de todo esse cenário de intensa atuação do Judiciário, onde se buscava qualificar a decisão judicial e reduzir os impactos da judicialização da saúde nos cofres públicos, quando começou a pandemia do coronavírus. Em março de 2020, o mundo, incluindo o Brasil, começou uma dolorosa e fatigante quarentena com isolamento e distanciamento social. A pandemia da Covid-19, como já foi declarada pela Organização Mundial de Saúde – OMS133 , não é somente uma doença nova, mas, um inimigo invisível do qual ainda não se tem informações concretas. Estava-se diante de um intenso trabalho de qualificação e de redução dos impactos da judicialização quando começou a pandemia. De repente, aquilo que

132  “Os Comitês de Saúde foram criados a partir da Resolução do Conselho Nacional da Justiça (CNJ) n.º 238/2016 que determinou sua efetivação no âmbito dos Tribunais de Justiça e Regionais Federais, bem como uma vara especializada em demandas da saúde.” 133  A OMS (Organização Mundial da Saúde) ou WHO (World Health Organization), é uma agência especializada das Nações Unidas, fundada em 7 de abril de 1948 e comprometida com a defesa da saúde de todos os povos através da cooperação massiva dos indivíduos e Estados. A OMS tem um entendimento de Saúde como um estado completo de bem-estar psicológico, físico, mental e social. WHO. Who we are. 2020. Disponível em: <https://www.who.int/about/ who-we-are>. Acesso: 1 jun. 2020.

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já se tinha como realidade, conhecimento e objetivos ficou paralisado diante de tantos desafios, seja para a saúde pública como para a saúde suplementar. Entretanto, mesmo diante desse novo cenário, o Judiciário tem trabalhado a partir das diretrizes que vão sendo traçadas no meio desse contexto conturbado, sendo ainda muito cedo, e uma tarefa difícil, prever e dimensionar os impactos tanto no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS134 como as demandas que surgirão ao Poder Judiciário. A grande preocupação no momento, justamente, é identificar quais demandas estão a surgir, para então, se discutir as medidas a serem adotadas e se preparar minimamente para o contexto pós-pandemia quando provavelmente o Judiciário estará lidando com uma enxurrada de ações enquanto consequência dessa crise. Esse cenário pós-pandêmico, com certeza será o que se pode chamar de 4ª fase da Judicialização da Saúde no Brasil. Esse cenário pós-pandemia com certeza ditará uma nova fase da judicialização da Saúde. Nesse momento de crise, percebe-se que as demandas da saúde poderão surgir no sentido de requisição pelo Governo de leitos privados ou equipamentos de segurança, acompanhamento do cumprimento de medidas para o enfrentamento da Covid-19, remanejamento de funcionários que fazem parte de grupo de risco, convocação de novos funcionários, entre tantas outras demandas a surgir, sendo necessário um alinhamento político entre os Poderes do Estado para que as ações desenvolvidas tenham poder efetivo nesse combate. São questões desafiadoras a qual o Judiciário deve responder, e esse alinhamento deve ser reafirmado no âmbito constitucional da responsabilidade solidária, consolidada pelo entendimento do STF no Tema 793135 , e, claro, observando as orientações dos Órgãos Internacionais. Somente um esforço conjunto de todos os entes internacionais é capaz de combater uma pandemia de alto nível letal como essa.

134  O Sistema Único de Saúde – SUS foi constituído a partir da Constituição Federal de 1988 que reconheceu a saúde enquanto um direito fundamental à vida de todos os indivíduos, descrito nos artigos 196 a 200, como um sistema único formado por ações e serviços públicos de saúde através de uma rede regionalizada e hierarquizada no país. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. 135  RE 855178: “Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.” SUPERIOR TRIBUNAL FEDERAL – STF. Tema 793. 2020b. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciaRepercussao/ verAndamentoProcesso.asp?incidente=4678356&numeroProcesso=855178&classeProcesso=RE&numeroTema=793>. Acesso: 1 jun. 2020.

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Dessa forma, algumas ações já têm sido visualizadas nesse âmbito, como a proposta da criação de um Comitê Nacional de Órgãos de Justiça e Controle136 para prevenção de litígios que adentrará todos os âmbitos do conhecimento jurídico como a área trabalhista, a área empresarial, tributária, enfim, se está falando de uma crise que afligirá todos os setores social, e mais impactante nesse momento, a área da saúde pública. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem buscado a criação de uma plataforma que ofereça a todos os tribunais uma nova forma de realização de sessões de conciliação e mediação de forma totalmente on-line. Os trabalhos têm ocorrido, com algumas dificuldades, porém estão se adaptando a nova realidade. Já houve num primeiro momento suspensão de algumas atividades para que todos pudessem se adequar a essa nova realidade, mas o trabalho no sistema judiciário segue cumprindo seu papel na sociedade e no enfrentamento dessa crise.137 No momento presente, a orientação é que o judiciário não intervenha de forma individualizada, mas, siga alinhado com o poder público, privilegiando as medidas que os gestores públicos estão desenvolvendo. Essa é praticamente a orientação dos grupos de estudo seja a nível nacional, seja a nível estadual. Um ponto fundamental no enfrentamento da Covid-19 é o isolamento social. Em que pese, as consequências negativas na área econômica, infelizmente, até o presente momento, até que se encontre uma vacina, é o que se tem de mais efetivo para o combate a propagação da doença. O isolamento social que já tem gerado inúmeros debates e problemáticas deve ser observado pelo Judiciário, como uma orientação dos órgãos de saúde. Porém mesmo que haja posicionamentos em sentido contrário, acredita-se que o Judiciário deve se abster de decretar qualquer medida de “lockdonw”, deixando a escolha também por parte do gestor público. Uma ação radical como essa precisa ser exaustivamente discutida com a população para que essa possa entender a importância dessa medida, mesmo com os efeitos colaterais amargos que todos sofrerão. No entanto, diante da mudança repentina os conflitos são inevitáveis, e a tomada de atitudes mais enérgicas acaba por serem necessárias. Estados e Municípios têm procurado adotar medidas administrativas e até mesmo penais para conseguir cumprir o isolamento social como multas e até detenção. No entanto, o debate perpassa sobre o direito constitucional de

136  Projeto de Lei emergencial altera a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, para instituir o Comitê Nacional de Órgãos de Justiça e Controle. BRASIL, 2020b. 137  AB2L. CNJ lançará plataforma on-line para conflitos relacionados à covid-19. 2020. Disponível em: <https://www.ab2l.org.br/cnj-lancara-plataforma-on-line-para-conflitos-relacionados-a-covid-19/>. Acesso em: 1 jun. 2020.

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ir e vir do cidadão, quando a Constituição garante exceções apenas em caso de estado de sítio 138, que só poder ser decretado pelo Presidente da República, conforme artigos 137 a 139 da CF/88. Dentre as controvérsias, o Supremo Tribunal Federal – STF foi motivado pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB através da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 672139 a apaziguar o entendimento sobre a competência para imposição dessas restrições, quando o Ministro Alexandre de Moraes pontuou enfaticamente sobre a necessária ampliação de cooperação entre os três poderes nesse momento de crise, enquanto instrumento imprescindível em defesa do interesse público .140 Destarte, acredita-se que as questões surgidas pós-pandemia demandarão um Judiciário muito mais qualificado e voltado para questões macros. Buscando soluções dialogadas com os demais poderes da República. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Buscou-se nesse breve ensaio traçar um panorama da judicialização da Saúde no Brasil, considerando um contexto antes, durante e pós-pandêmico. Compreende-se que antes da pandemia do coronavírus, a judicialização da saúde no Brasil vinha nas duas últimas décadas em um processo de amadurecimento e qualificação das decisões judiciais, de modo a garantir a concretização dos direitos fundamentais e ao mesmo tempo reduzir os impactos da judicialização nos orçamentos públicos. Porém durante esse processo de amadurecimento e aperfeiçoamento, o Judiciário foi surpreendido com a pandemia. Não só o Judiciário, mas todas as instituições públicas e privadas, bem como a sociedade como um todo, todos foram pegos de surpresa por esse quadro instalado com a Pandemia da Covid-19. Está-se diante de um cenário incerto, onde a cada dia se apreende algo novo e inesperado. São novos tempos, novos comportamentos e novas perspectivas. Toda uma estrutura de comportamentos e ações foi modificada para se adaptar ao que os estudiosos estão chamando de “novo normal”.

138  Instauração de uma legalidade extraordinária, por determinado tempo e em certa área (que poderá ser o território nacional inteiro), objetivando preservar ou restaurar a normalidade constitucional, perturbada por motivo de comoção grave de repercussão nacional ou por situação de beligerância com Estado estrangeiro. (SILVA, 2003, p. 640). 139  Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp>. sob o código 7E45-E467-391A-6532 e senha 2E6A-6071-45D3-3BF2. 140  SUPERIOR TRIBUNAL FEDERAL – STF. Ministro assegura que estados, DF e municípios podem adotar medidas contra pandemia. Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=441075&ori=1>. Acesso em: 2 jun. 2020a.

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E algumas indagações surgem diante desse novo ambiente em que a humanidade se encontra envolvida, a saber: como será a judicialização após a pandemia? Como ficarão todas as conquistas realizadas na judicialização nos últimos anos? O que esperar do gestor público diante dos problemas que terá que enfrentar após a pandemia? A essas perguntas ainda não se tem respostas corretas, mas uma coisa é certa, todas as instituições deverão se preparar para as novas demandas e juntas devem buscar a solução. Mais do que nunca deve se fortalecer o diálogo interinstitucional, e as soluções devem ser buscada de forma macro e planejada, sob pena de se aumentarem ainda mais os prejuízos advindos com a pandemia. Espera-se que tudo que foi construído nesse passado recente em termos de judicialização da saúde possa ajudar nas soluções do futuro, e que junto com os demais órgãos públicos a política de saúde pública seja efetivada, garantindo a todos o acesso universal e igualitário do sistema único de saúde. Acredita-se também que o ideal seria que não houvesse nenhum prejuízo para a população carente, a qual necessita fazer uso do sistema público. Ademais espera-se também que o gestor apesar de todas as dificuldades enfrentadas, possa garantir efetivamente, mesmo diante do reduzido orçamento público, a saúde do cidadão brasileiro.

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Referências AB2L. CNJ lançará plataforma on-line para conflitos relacionados à covid-19. 2020. Disponível em: <https://www.ab2l.org.br/cnj-lancara-plataforma-on-line-para-conflitos-relacionados-a-covid-19/>. Acesso em: 1 jun. 2020. COMITÊ DA SAÚDE DO RN. Apresentação do comitê. Disponível em: <http://comite.tjrn.jus.br/index.php/home-2/apresentacao>. Acesso em: 29 maio 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Sobre a doença. 2020a. Disponível em: <https:// coronavirus.saude.gov.br/sobre-a-doenca>. Acesso em: 30 maio 2020. BRASIL. Projeto de Lei: altera a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Altera a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, para instituir o Comitê Nacional de Órgãos de Justiça e Controle para prevenir ou terminar litígios, inclusive os judiciais, relacionados ao enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente da covid-19. 2020b. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/ Projetos/PL/2020/msg95-mar%C3%A7o2020.htm>. Acesso em: 1 jun. 2020. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática. Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional, Madrid, n. 13, p. 1732, 2009. ISSN 1138-4824. BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ. Recomendação n.º 31, de 30 de março de 2010. Disponível em: <https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/atos-normativos?documento=877>. Acesso em: 29 maio 2020. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ. Judicialização da saúde no Brasil: perfil das demandas, causas e propostas de solução. Insper, 2019. COVID-19 e seus reflexos sobre o direito à saúde: live. Canal Novo Eleitoral, 2020. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=IAl-SSD9UT4&t=981s>. Acesso em: 29 maio 2020. FAO. World Livestock 2013 – Changing disease landscapes. Rome, 2013. E-ISBN 84


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ZANELLA, Janice Reis Ciacci. Zoonoses emergentes e reemergentes e sua importância para saúde e produção animal. Pesq. agropec. bras., Brasília, v. 51, n. 5, p. 510-519, maio 2016. DOI: 10.1590/S0100-204X2016000500011.

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Capítulo 5 MICRO E PEQUENO EMPREENDEDOR E AS MEDIDAS FISCAIS DE URGÊNCIA Marlusa Ferreira Dias Xavier141 Maria Rita Bezerra da Silva142 1 INTRODUÇÃO A responsabilidade que o Estado deve ter com o processo de retomada da economia parte do conceito de responsabilidade que pressupõe liberdade no agir do homem para optar entre algumas alternativas de ação143 . A partir do próprio conceito de responsabilidade, que pressupõe no direito à questão da liberdade, onde o homem é inteiramente livre em suas escolhas, de modo a optar por agir ou não agir. Partindo da premissa exposta, se pretende fazer uma abordagem dos aspectos fiscais e econômicos emergenciais, instituídos pelo Governo em prol dos Micro e pequenos empreendedores. O marco inicial será a crise gerada pela pandemia da Covid-19 que teve início na China, mais precisamente em dezembro de 2019, estendendo-se por todos os continentes, trazendo reflexos econômicos e sociais, atingindo a produção, o comércio internacional, a quebra da confiança dos consumidores, empresas, investidores, tudo isso dentro de um complexo sistema globalizado, gerando um efeito dominó, atingindo os mercados financeiros que precisarão ampliar as linhas de créditos para dar suporte

141  Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Especialista em Direito Tributário, Especialista em Auditoria, Graduada em Direito pela Faculdade Mather Chirsti, Graduada em Contabilidade pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Professora da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Doutoranda em Direito pela Universidade Federal do Paraná. 142  Acadêmica do sétimo período do Curso de Direito da UERN no Campus de Natal, membra do Projeto de Extensão Lives Direito UERN Natal. 143  CORTINA, Adélia. Neuroética y neuropolítica: sugerencias para la educación moral. Madri: Editorial Tecnos, 2011. p. 163.

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aos empresários que estão sendo devastados, diante da velocidade com que a pandemia se dissemina no globo. Portanto, para se entender o alcance de todas as medidas econômicas e fiscais de socorro aos micro e pequenos empreendedores, é preciso entender um contexto mais amplo, que abrange os aspectos estruturais de um negócio, aos quais se incluem os custos fixos, tais como locação de bens, água, energia, fornecedores, instalações e salários. A partir de uma visão macro, pode se ver que esse processo atingiu o seu ápice quando todos puderam observar o mundo parado, a partir das medidas sanitárias recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), definindo o isolamento social como medida de urgência aplicada para conter o avanço do vírus, afetando o comércio, a indústria e o setor de serviços, causando queda no PIB e baixo rendimento econômico, que segundo o IPEA144 a evolução dos indicadores econômicos se mostraram em queda, pelo processo de redução das atividades econômicas, demostrando assim, que todas as empresas são responsáveis pela economia. Figura 1 – Evolução dos indicadores econômicos

Como o cenário econômico não se restringiu as grandes empresas, a vida econômica dos micro e pequenos empreendedores do país, que se viram obrigados a fechar as portas, tornou-se insustentável, dentro de uma demanda impositiva do poder estatal, tornando-se necessário implementar-se políticas de socorro de urgência pelo Estado, o que ocorreu em âmbito Nacional e Estadual, porém, no cenário em análise, percebe-se que só foram eficientes as medidas de caráter primário que representam as ações diretas para conter o avanço do vírus.

144  INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA – IPEA. Visão geral da conjuntura. 30 mar. 2020. Disponível em: <https://www.ipea.gov.br/cartadeconjuntura/index.php/2020/03/30/visao-geral-da-conjuntura-6>. Acesso em: 1 jun. 2020.

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No entanto, as medidas emergências de caráter secundário, que se resumem nas ações que serão capazes de levar equilíbrio econômico aos micro e pequenos empreendedores, até que seja possível o retorno ao padrão de normalidade, não trouxeram os efeitos esperados pelos micro e pequenos empreendedores do País vestem não serem capazes de atingir todo o processo de manutenção mínima da vida econômica dos empreendedores envolvidos. Todas as restrições partem do planejamento estratégico de contenção do avanço do vírus a nível Nacional. Portanto, para melhor compressão, classificam-se como ações primárias todas as que se relacionam com o controle da pandemia, e, secundários, todos que estão diretamente relacionados com o desempenho econômico durante e após a pandemia. Necessário uma compreensão da sociedade sobre os efeitos das ações primários refletindo nos resultados das ações secundários a curto e médio tempo, estando esses efeitos primários diretamente ligados às ações para enfrentamento da pandemia capazes de atenuar a curva epidemiológica. Nesse desiderato, as críticas quanto às ações primárias – ações para controle da pandemia – que se reflete nos discursos negativos dos empresários, dos grandes investidores pelos prejuízos oriundos da prorrogação por período extenso do isolamento social, refletindo na fragilidade das ações emergências e ausência de um planejamento eficaz que possa permitir o retorno econômico. O planejamento adotado pelo Governo e as ações emergenciais, suas falhas e incoerências denotam a necessidade de se compreender melhor a importância de um bom planejamento. Para tanto, se analisa fato histórico, no ano de 1967, foi editado um decreto que trazia de forma explicita, descrito no Decreto-Lei nº. 200, de 1967145 , que constitui uma das funções básicas da administração pública, seguindo-a a organização, o comando, a coordenação e o controle, no qual o Estado ou a empresa determinam, antecipadamente, em consonância com normas e diretrizes prefixadas, a programação a ser atingida na execução de seus objetivos. Os objetivos buscados pelo Estado, diferente do almejado pelas empresas, estão entrelaçados pelos resultados advindos do cenário que se instalou, mas é necessário se entender que tudo tem um efeito real na economia pós-pandemia, por estar diretamente relacionado com os efeitos das ações primárias que buscam atenuar a curva epidemiológica através da suspensão das atividades não prioritárias. Todas as ações implementadas em prol do controle eficiente do avanço da pandemia, aos quais se tem as medidas de isolamento, assim como o controle de atuação do sistema público de saúde, a partir das orientações da Organização

145  QUEIRÓS, José Wilson Nogueira de. Direito Econômico. São Paulo: ed. Forense, 1982. p.117.

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Mundial da Saúde – OMS, proposta a nível global, refletirão nos resultados econômicos ao final da pandemia. A partir dos objetivos iniciais, ou seja, controle da pandemia, passa-se a análise dos aspectos econômicos, os processos utilizados pelo Estado com vistas a amenizar os impactos nocivos à economia provocado pelas medidas impostas no processo de controle da pandemia, que foram diretamente afetados com a diminuição do potencial de produção, da capacidade de gerir negócios, e, da vida social. Então o que nós temos? Qual o planejamento adotado pelo Estado que se concretize na possibilidade de reerguimento da economia dos micros e pequenos empreendedores? No que Landauer146 define como sendo a direção das atividades econômicas por um organismo da coletividade, que ele define como sendo o Estado assumindo o seu caráter intervencionista, preocupado com a economia, atuando de forma a permitir aos micro e pequenos empreendedores um retorno pós-pandemia. Dentro da atual conjuntura econômica do Brasil, no núcleo do processo de pandemia, o retrato de um governo é essencial para que pós-pandemia exista o retorno econômico, o que só será possível se houver ações secundárias nesse sentido, como as ações que visem a queda de juros, reprogramação de pagamentos, de liquidação de obrigações, ampliação de instrumentos de socorro as famílias de menor fonte de renda, tudo isso em uma condução de um processo para o pós-pandemia. Mas diferentemente do que deve ser feito, o que temos hoje são várias medidas que estão sendo adotadas, as quais são preocupantes quando se faz uma análise comparativa com as medidas implementadas por outros países. Nesse sentido, questão pertinente a ser discutida, trata-se do Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET)147 . Este impõe uma restrição ao entendimento dos chamados eventos impre-

146  LANDAUER, Carl. Teoria de la Planificación Económica. México: Fondo de Cultura, 1945. p. 21. O Projeto de Lei nº 1.179/2020 apresentado pelo presidente interino do Senado Federal, Antonio Anastasia, dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do coronavírus (Covid-19). Ver em: RJET. Planalto, 2020. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20192022/2020/Lei/L14010.htm. Acesso em: 1 de junho de 2020. 147  Vide art. 7 do Projeto de Lei nº 1.179/2020, cuja transcrição é “Não se consideram fatos imprevisíveis, para os fins exclusivos dos art. 478, 479 e 480 do Código Civil, o aumento da inflação, a variação cambial, a desvalorização ou substituição do padrão monetário”. Embora a jurisprudência entenda tais variáveis não sejam consideradas fatos imprevisíveis, o desequilíbrio econômico provocado por elas pode ensejar onerosidade excessiva, ou seja, a vantagem lucrativa de uma parte em face de outra. Ver em: O PROJETO de Lei 1.179 e os possíveis impactos nas relações securitárias. DR&A Advogados. Disponível em: http://www.draadv.com.

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visíveis ou extraordinários. Sendo assim, não considera como tais “o aumento da inflação, a variação cambial, a desvalorização ou substituição do padrão monetário” para a finalidade de resolução dos contratos por onerosidade excessiva. Malgrado, as variáveis elencadas poderão interferir nas relações econômicas dos brasileiros e, conforme previsto no projeto de lei, ensejar-se-á o distanciamento da tutela jurisdicional em face dos casos concretos. Ainda, dentro do contexto global, o Brasil editou Medidas Provisórias, inseridas no planejamento de socorro emergencial. As medidas provisórias que estão vigorando de caráter emergencial, como as que foram publicadas no DOU de 07/04/2020 - Edição Extra, Decreto nº 10.316/2020 que regulamenta a Lei nº 13.982/2020148 , que estabelece medidas excepcionais de proteção social a serem

br/artigos-e-noticias/pt/o-projeto-de-lei-117920-e-os-possiveis-impactos-nas-relacoes-securitarias/39. Acesso em: 1 de junho de 2020. 148  DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO, Publicado em: 07/04/2020 | Edição: 67-B | Seção: 1 - Extra | Página: 10 , DECRETO Nº 10.316, DE 7 DE ABRIL DE 2020, Regulamenta a Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020, que estabelece medidas excepcionais de proteção social a serem adotadas durante o período de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19). O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84,caput, incisos IV e VI, alínea “a”, da Constituição, e tendo em vista o disposto na Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020, D E C R E T A: Disposições gerais Art. 1º Este Decreto regulamenta o auxílio emergencial de que trata o art. 2º da Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020. Art. 2º Para fins do disposto neste Decreto, considera-se: I - trabalhador formal ativo - o empregado com contrato de trabalho formalizado nos termos do disposto na a Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e o agente público, independentemente da relação jurídica, inclusive o ocupante de cargo temporário ou função temporária ou de cargo em comissão de livre nomeação e exoneração e o titular de mandato eletivo; II - trabalhador informal - pessoa com idade igual ou superior a dezoito anos que não seja beneficiário do seguro desemprego e que: a) preste serviços na condição de empregado, nos termos do disposto no art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943, sem a formalização do contrato de trabalho; b) preste serviços na condição de empregado intermitente, nos termos do disposto no § 3º do art. 443 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943, sem a formalização do contrato de trabalho; c) exerça atividade profissional na condição de trabalhador autônomo; ou d) esteja desempregado; III - trabalhador intermitente ativo - empregado com contrato de trabalho intermitente formalizado até a data de publicação da Medida Provisória nº 936, de 2020, ainda que não perceba remuneração;

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adotadas durante o período de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente da corona vírus (covid-19) e, a Portaria MC nº 351/2020 que regulamenta os procedimentos de que trata o Decreto nº 10.316/2020, a respeito do Auxílio Emergencial instituído pela Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020. 149 Mas elas não são suficientes, causando descrença no micro e pequeno empreendedor que sofrem com o impacto das ações de isolamento social, que traz a seguinte problemática: se esses negócios conseguirão retornar pós-pandemia. Talvez todos se perguntem o motivo e a resposta sempre estará vinculado ao conceito de essencial, imprescindível, indispensável, porque as atividades

IV - família monoparental com mulher provedora - grupo familiar chefiado por mulher sem cônjuge ou companheiro, com pelo menos uma pessoa menor de dezoito anos de idade; e V - benefício temporário - assistência financeira temporária concedida a trabalhador desempregado, nos termos do disposto na Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990, inclusive o benefício concedido durante o período de defeso, nos termos do disposto na Lei nº 10.779, de 25 de novembro de 2003. Ver em: DECRETO 10.316. Art. 3º O auxílio emergencial, no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais), será concedido pelo período de três meses, contado da data de publicação da Lei nº 13.982, de 2020, ao trabalhador que, cumulativamente: I - tenha mais de maior de dezoito anos de idade; II - não tenha emprego formal ativo; III - não seja titular de benefício previdenciário ou assistencial, beneficiário do seguro-desemprego ou de programa de transferência de renda federal, ressalvado o Programa Bolsa Família; IV - tenha renda familiar mensal per capita de até meio salário mínimo ou renda familiar mensal total de até três salários mínimos; V - no ano de 2018, não tenha recebido rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70 (vinte e oito mil quinhentos e cinquenta e nove reais e setenta centavos); e VI - exerça atividade na condição de: a) Microempreendedor Individual - MEI, na forma do disposto no art. 18-A da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006; ou b) contribuinte individual do Regime Geral de Previdência Social e que contribua na forma do disposto no caput ou do inciso I do § 2º do art. 21 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991; ou c) trabalhador informal, seja empregado, autônomo ou desempregado, de qualquer natureza, inclusive o intermitente inativo, inscrito no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal - Cadastro Único ou que cumpra o requisito a que se refere o inciso IV do caput. Ver em: BRASIL. Decreto nº 10.316, de 7 de abril de 2020. Regulamenta a Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020, que estabelece medidas excepcionais de proteção social a serem adotadas durante o período de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19). Diário Oficial da União, ed. 67-B, p. 10, 7 abr. 2020. Seção: 1 – Extra. Disponível em: <http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-10. 316-de-7-de-abril-de-2020-251562799>. Acesso em: 1 jun. 2020. 149  CONGRESSO NACIONAL. Medidas provisórias em tramitação. 2020. Disponível em: <https://www.congressonacional.leg.br/materias/medidas-provisorias>. Acesso em: 1 jun. 2020.

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que estão na linha de não essencialidade, muitas estão diretamente relacionadas aos Microempreendedores Individuais, às pequenas e médias empresas, e essas são as que ainda não se viram socorridas. Esclarecendo o aspecto da medida provisória 927, ao tratar das ações emergenciais se preocupou em trazer socorro através de medidas que preservassem os empregados, atuando na esfera social, sob argumentos de medidas no âmbito econômico, via reflexo empregador. Nada que pudesse viabilizar uma sobrevida dos empresários se lê nas medidas. Percebe-se que as medidas do Conselho Gestor do Simples Nacional150 foram única e exclusivamente no sentido de socorrer os empregados e postergar pagamentos, permitindo ao microempreendedor ou ao simples nacional, que aqueles impostos pagos de forma unificada no DAS possam ser quitados pós pandemia. Ou seja, no que isso ameniza os custos diretos e indiretos, quando se percebe que os empresários já se encontram comprometidos com os negócios já realizados. Quando se percebe uma ação que exigiu a suspensão imediata das atividades econômicas, uma das medidas adotadas pelo Governo, publicada no DOU de 25/03/2020, Circular CAIXA nº 893/2020, dispõe sobre a suspensão da exigibilidade do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) referente às competências março, abril e maio de 2020, diferimento dos respectivos valores sem incidência de multa e encargos, regularidade do empregador junto ao FGTS. Além das ações voltadas ao socorro funcional, o Governo Federal editou Medida Provisória que criou linha de crédito exclusiva para trazer socorro financeiro, com o fim de estabelecer o poder econômico e de negócios dos microempreendedor151 através da Lei nº 13.999, de 18 de Maio de 2020 ao qual Institui o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), para o desenvolvimento e o fortalecimento dos pequenos negócios; e altera as Leis nos 13.636, de 20 de março de 2018, 10.735, de 11 de setembro de 2003, e 9.790, de 23 de março de 1999, que permite empréstimos com juros de 3.5% ao ano. Ao questionar o porquê de tais medidas, chegamos às respostas evidentes, quais sejam, que as empresas possam cumprir com as suas obrigações. Quando se fala do aspecto fiscal, se aborda a cadeia que representa a estrutura

150  BRASIL. Resolução CGSN nº 154, de 03 de abril. Dispõe sobre a prorrogação de prazos de pagamento de tributos no âmbito do Simples Nacional, em razão da pandemia da Covid-19.2020. Receita Federal, 2020. Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action>. Acesso em: 1 jun. 2020. 151  DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO, Brasília, DF, ano CLVIII, n. 94, terça-feira, 19 maio 2020. Disponível em: <http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=19/05/2020&jornal=515&pagina=1>. Acesso em: 1 jun. 2020.

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financeira e fiscal da empresa, ou seja, do fornecedor até o empregado, e essa cadeia, com a redução do processo econômico, vai se desconstruindo em virtude da quebra de um ciclo, essa quebra ocorreu na hora em que não houve a possibilidade de gerir os negócios e de auferir rendas. As medidas que visam diminuir o desembolso imediato e, postergam para o momento pós-pandemia o pagamento de impostos e contribuições, apenas gera uma fragilidade econômica, porque ao suspender os pagamentos, não trouxe solução que viesse a possibilitar o retorno desse micro e pequeno empreendedor. Negociação salarial com suspensão de contratos como está na medida provisória 944, socorre diretamente o empregado e, indiretamente a empresa. A medida provisória 944 que trata do plano emergencial, permite a suspensão de contratos, os planos de assistência, de auxílios, todo aquele processo montado ao suporte direto trabalhista permitindo a manutenção do emprego, inclusive, a classe doméstica. Só que as demais matérias que envolvem os custos diretos e indiretos relacionados ao negócio, não estão sendo colocados como necessários no planejamento de ações emergenciais. Entender o caos que se instalará pós-pandemia passa pela análise dos custos inerentes aos negócios em discussão, ou seja, para cada item classificado como custo fixo de uma empresa, será necessária uma medida de negociação, com o imóvel locado, os insumos adquiridos, fornecedores, causando um endividamento para quando for necessário retornar as atividades. A partir dessa análise se percebe que as empresas constituídas como microempreendedor e pequeno empreendedor, não conseguirão restabelecer os negócios após a pandemia neste modelo atual. No entanto, tratando-se de grandes empreendimentos econômicos, como as indústrias e comércio, sociedades de capital, sociedades anônimas, modelos de negócios de grande porte, podem se valer de mecanismos contábeis e fiscais que proporcionará um alívio imediato nesse momento de crise, no entanto, quando se fala das MEI e dos pequenos empreendedores, não tem fórmula milagrosa para solucionar o conflito pontual. O que as Medidas Provisórias em vigor trazem, resume-se a pequeno auxílio para os micro e pequeno empreendedores, como no caso de suspensão dos impostos e contribuições, como o FGTS, a previdência social, o DAS, mas eles terão que cumprir com a obrigação quando retornar as atividades. Nesse contexto, em uma análise econômica e fiscal, as empresas terão que cumprir com as suas obrigações futuras, porém como realizarão tal feito se não houver um planejamento eficaz do Governo para salvar a economia é a grande problemática pós pandemia. Essa falta de planejamento para um socorro aos microempreendedores e pequenos empreendedores, que possa permitir a sobrevida destes, leva a grandes discussões se terão o fôlego necessário para cumprir com as obrigações fiscais no futuro incerto e, com as obrigações que estão se avolumando em um birô? E nesse cenário pode se ver que essa suspensão das medidas de cobran94


ça, protestos e exclusão de parcelamentos partiu das medidas que saíram do Ministério da Fazenda, através da portaria 103, e 7821, que veio trazer isenções e facilidades relacionadas a equipamentos médicos, isenções de IPI, imposto de importação. Ou seja, atuações voltadas as ações primárias, que se referem ao controle da disseminação do vírus no momento da pandemia.152 Os aspectos fiscais do micro e pequeno empreendedor precisam de análises especializadas para que se editem medidas provisórias capazes de garantir o retorno necessário no processo de retomada dos negócios, já que as medidas provisórias que foram editadas e estão vigorando, trazem benefícios de efeitos imediatos, porém, insuficientes para permitir que pós-pandemia eles possam retornar a ter uma vida fiscal saudável. Diante da controvérsia que surgiu sobre a eficácia ou não das medidas de isolamento social e, os reflexos econômicos no retorno pós-pandemia, tem-se como certo que, quanto mais eficazes as medidas primárias, mais rápidos os efeitos positivos nas ações secundárias pós pandemia. Afirmativa de tal natureza exigiu uma análise por especialistas da área economia a nível global, Com a diminuição da circulação de pessoas, fechamento de setores de serviços, tem-se na ponta da produção, as indústrias que terminaram desacelerando, seguindo na onde da queda de produção e fornecimento, o agronegócio procura manter o abastecimento normalizado. Ao final, menos negócios, menos faturamento em toda a cadeia econômica de bens e serviços. A redução dos negócios influencia o IDH, o que resultará na queda substancial do PIB nacional, o que impactará as contas públicas e toda a sociedade. Sendo que tais aspectos não afetarão apenas o Brasil, mas todo o mundo por se tratar de uma pandemia, o que transpõe fronteiras nacionais. 2 OS ASPECTOS TRIBUTÁRIOS Sobre o aspecto tributário, é necessário entender toda a cadeia que envolve o negócio. As cadeias de suprimentos e as relações entre empresas, parte das áreas específicas de atuação, do porte e do volume de negócios que ela é capaz de realizar. Cada uma dessas abordagens tem suas origens em áreas distintas do conhecimento, como economia, a administração de empresas, a fiscalidade, entre outras, possuindo, assim, diretrizes e pressupostos de aplicações e focos de análise diferentes, logo, cria-se uma pirâmide onde se coloca as bases para poder definir se essas ações emergenciais são ou não suficientes153 .

152  PROTOCOLO de manejo clínico do Coronavírus (Covid-19) na atenção primária à saúde. Disponível em: <https://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2020/April/08/20200408-ProtocoloManejo-ver07.pdf>. Acesso em: 1 jun. 2020. 153  MAIA, Jonas Lúcio; CERRA, Aline Lamon. Relacionamentos entre empresas na cadeia de

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No estudo apresentado por Azevedo154 , as trocas, o estabelecimento de acordos ou qualquer transação entre os agentes econômicos geram custos, é necessário se definir as condições nas quais tais custos deixam de ser desprezíveis e passam a ser elemento importante de análise nas decisões dos agentes econômicos. (Fiani 2002)155 . Portanto, quando se realiza um negócio, uma atividade econômica, se tem além dos custos com pessoal (funcionário), teremos as instalações, matéria prima, energia, água e, os tributos e contribuições na linha da pirâmide do negócio. Se tem todo um processo que permite a produção e comercialização com o fim de obter rendimentos. Quando o negócio deixa de cumprir com o seu objetivo principal que é auferir renda, e essa suspensão não foi programada, mas por imposição como medida de controle do avanço da pandemia, como o processo de isolamento social – ações de natureza primária - objetivo de controle do avanço da curva epidemiológica, tem-se outro aspecto relevante que deve ser analisado, o avanço da pandemia é capaz de gerar um desequilíbrio econômico maior do que o que se prevê agora. Logo, não pode se negar a necessidade de ações futuras para permitir o retorno das atividades. Mas o que se tem são ações que visam o auxílio emergencial, sem, no entanto, haver uma forma de superar as perdas reais que garantam suprir os custos diretos e indiretos do negócio que estavam na quota das obrigações já geradas até a suspensão das atividades e que reflete diretamente na vida da empresa. Eles apenas permitem que o indivíduo não fique à míngua de pão e água, sendo que esse aporte que o Estado coloca, serve única e exclusivamente para dar sobrevida à pessoa, sem conseguir chegar ao coração da empresa. Os Governos precisam ter consciência da necessidade de ações voltadas ao combate a crise pontual como diz Juan Carlos Moreno Brid156 “A incerteza sobre a magnitude da crise detonada pelo Coronavírus não exime os Governos: na verdade, obriga-os a lançar mão, preferivelmente de maneira concertada, do arsenal de instrumentos de políticas contra cíclicas”. Portanto, necessárias ações que visem quebrar os efeitos cíclicos da pandemia na economia. Quando se fala em aspectos fiscais, precisa discutir a estrutura econômica fiscal da empresa, não apenas em parte como ocorre com a suspensão dos

suprimentos de uma montadora de motores – uma discussão a partir dos elementos da Teoria de Custos de Transação. Revista de Economia, ano 32, v. 34, n. 1, p. 51-75, jan./abr. 2008. Disponível em: <https://revistas.ufpr.br/economia/article/view/11552/8231>. Acesso em: 1 jun. 2020 154  AZEVEDO, P. F. Integração Vertical e Barganha. 1996. Tese (Doutorado) – Departamento de Economia FEA, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1996. 155  MAIA; CERRA, 2008. 156  PANDEMIA do Coronavírus mergulha a economia no desconhecido. El País, 2020. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/economia/2020-03-15/pandemia-do-coronavirus-mergulha-a-economia-no desconhecido.html>. Acesso em: 1 jun. 2020.

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contratos de trabalho, reduzo o custo com pessoal, cumpro com a regra de estabilidade, mantendo o funcionário por mais 60 dias de estabilidade pós-crise, no entanto, se precisara de um capital, porque quando se fala em MEI e pequenas empresas, se fala de um modelo de negócio que não tem capital de giro, não tem fluxo de caixa positivo, que trabalham com receita de giro imediato, ou seja: “eu ganho, eu pago, eu ganho, eu pago”. Pensar dessa forma, no contexto econômico atual, em que resultados indicam para 2020, uma redução de 1,87% na taxa de crescimento do PIB nacional, mostra a ineficácia dos planejamentos157 . As medidas emergenciais trazem um socorro momentâneo aos micro e pequenos empreendedores, oferecendo um alívio com a possibilidade de postergar 60(sessenta) dias o vencimento do seu tributo para que após o retorno dos negócios, possa quitar as obrigações fiscais. Porém, o cenário que se projeta pelas análises econômicas e fiscais, através das diversas variáveis econômicas em jogo, traz a preocupação com a realidade desse tipo de negócio, tais como o micro e pequeno empreendedor não possuir capital de giro, ausência de reserva financeira para quitar as obrigações postergadas, deixando visível a fragilidade financeira e a necessidade de socorro financeiro através de linhas de crédito para reestruturar os negócios. A fragilidade do alcance das medias está na impossibilidade de garantir a sobrevivência dos negócios no pôs pandemia como já se projeta. Muitos negócios já fecharam as portas, muitos pensam como vão retornar, porém se deparam com a dura realidade, a primeira questão que eles levantam é: como surgirá o capital para isso? Através de pesquisa realizada pelo SEBRAE, percebe-se o quadro real da situação econômica dentro do cenário atual. De acordo com a pesquisa SEBRAE158 micro e pequenas empresas que fecharam as portas em razão do isolamento social, somam 600 (seiscentas), desse universo, 30% dos empresários tiveram que buscar empréstimos para manter seus negócios, dos quais não conseguiram êxito imediato; na busca de socorro financeiro, 55% dos micro e pequenos empresários terão que pedir empréstimos para manter os negócios funcionando sem gerar demissões. Ainda de acordo com a pesquisa do Sebrae, 10,1 milhões de empresas pararam de funcionar durante a pandemia, sendo 2,1 milhões por decisão da empresa, enquanto a paralisação de 8 milhões de companhias foi determinada pelo governo. Percebe-se pelos dados apresentados que o setor mais afetado com as

157  PORSSE, A. A. et al. lmpactos Econômicos do COVID-19 no Brasil. Nota Técnica NEDUR-UFPR No 01-2020. Núcleo de Estudos em Desenvolvimento Urbano e Regional (NEDUR) da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, abr. 2020. 158  O IMPACTO da pandemia de Coronavírus nos pequenos negócios. SEBRAE e FGV Projetos, 2020. (Pesquisa Online – de 30/04 a 05/05/2020). Disponível em: <https://bibliotecas.sebrae. com.br/chronus/ARQUIVOS_CHRONUS/bds/bds.nsf/c9d50d3412270611e9e9a9999a40c0a5/$File/19510.pdf>. Acesso em: 1 jun. 2020.

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medidas de baixo impacto emergencial pós-pandemia, foi o setor responsável por mais circulação de dinheiro e negócios, os micro e pequenos empreendedores. Portanto, será necessário planejar ações que visem à recuperação financeira desse setor. 3 META FISCAL E OS DECRETOS DE CALAMIDADE PÚBICA As peças e as engrenagens presentes na teorização dos fenômenos pandêmicos da sociedade atual assemelham-se aos conjuntos de peças que se encaixam para fazer girar um motor, ou mesmo uma máquina. Não tem como dissociar a crise econômica do aspecto fiscal do Estado, dentro do modelo de Estado federado ao qual temos na Constituição de 1988. A principal fonte de recurso do Estado moderno são os tributos. A administração Pública está sujeita a limitações, na qual sua capacidade de gastos depende da capacidade de auferir renda com os tributos pagos pelos contribuintes, demonstrando que a tributação tem significativa relevância na manutenção do Estado brasileiro. Ocorrendo queda na arrecadação como reflexo direto das medidas de isolamento social que reduziram os negócios em mais de 60%, a arrecadação também sofreu redução de mais de 30%, ou seja, quando o que está no eixo do motor, ou mesmo, na engrenagem que faz girar a máquina é a própria sociedade, propulsora e geradora de negócios com seus hábitos e suas necessidades consumistas, deixa claro a necessidade de medidas orçamentárias emergenciais. Ao flexibilizar a meta fiscal, permitindo ao Gestor realizar gastos direcionados ao combate à pandemia de corona vírus e regulamentar a execução de emendas impositivas, pretende o senado federal agilizar as ações que se classificam como medidas primárias. Nessa contextualização, o presidente da República sancionou a Lei 13.983/2020, que facilita os gastos do governo. A Lei nº 13.983/2020 proporcionou ao Executivo ter margem orçamentária para aumentar gastos para lidar com as consequências econômicas, sociais e de saúde pública da doença, uma vez que as alterações ajustam a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) ao estado de calamidade reconhecido pelo Congresso Nacional em março de 2020. As medidas que foram incluídas na Lei nº 13.983/2020 manteve a meta para o déficit primário do governo central em R$ 124,1 bilhões (Tesouro Nacional, Previdência Social, Banco Central) e em R$ 3,8 bilhões (dispêndios com estatais), mas foi inserida a previsão de um déficit primário de R$ 30,8 bilhões para estados e municípios no exercício de 2020. Com as mudanças, o setor público consolidado, conforme a LDO, terá como meta um déficit de R$ 158,7 bilhões159 .

159  MUDANÇA na LDO para facilitar gastos com a pandemia. Senado Federal, 2020. Disponí-

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Ainda assim, com a decretação do estado de calamidade pública flexibilizou-se o processo de controle dos gastos públicos que dispensa o cumprimento dessas metas fiscais, levando ao gestor estimar que as ações de combate aos efeitos da covid-19 resultarão em um déficit, devido às despesas superarem as receitas. Déficit fiscal significa dizer que a receita pública, classificada em corrente e de capital, correspondendo ao ingresso de receitas tributárias, de contribuições, segundo previsto no art. 11 da Lei nº 4.320/1964160 , serão inferiores as despesas realizadas com os insumos e ações emergenciais implementadas pelo Estado. Conclui-se que, todas as ações que foram tomadas para controlar os impactos da pandemia da Covid-19 no Brasil, assim como no mundo, terão reflexos direto na economia que poderá ter uma recuperação mais rápida se, as medidas forem eficazes, como também, repercutirão de forma negativa no setor econômico pela necessidade de isolamento e desestímulo a circulação de pessoas e fechamento de negócios. Tal fator se deve ao caráter das ações governamentais implementadas que, não conseguem atingir os micros e pequenos empresários, responsáveis que são por 70% das vagas de emprego. Por outra perspectiva, os resultados são reflexos das ações inadequadas que causam insegurança na sociedade e, refletem na pouca confiança nos negócios, gerando baixa movimentação econômica, causando o fragilidade nos negócio, gerando resultados negativos a nível econômico com a impactante realidade para os defensores da economia de que não basta abrir as empresas, será necessário restabelecer sentimento de segurança no cidadão para que ele possa confiar no Estado e voltar a consumir provocando o movimento nas engrenagens da máquina econômica.

vel em: <http://www.SENADO.leg.br/noticias/materias/2020/04/06/mudanca-na-ldo-para-facilitar-gastos-com-a-pandemia-e-sancionada-com-um-veto>. Acesso em: 1 jun. 2020. 160  ROSA, Luiz Emygdio F. da. Manual de Direito Financeiro e Tributário. 19. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 47.

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Capítulo 6 COVID-19 E SEUS IMPACTOS SOBRE O DIREITO E POLÍTICAS INTERNACIONAIS Claudomiro Batista de Oliveira Júnior 161 Joelma dos Santos Faustino 162 1 INTRODUÇÃO A pandemia da Covid-19 surge em um mundo globalizado, o que contribuiu para a sua disseminação e acarreta inúmeras consequências, em maior ou menor nível, para o mundo como um todo, seja no campo da sociedade, da política ou da economia. Pode-se afirmar que esta pandemia configura-se como um dos maiores desafios desse século, pois além da perda que ocasionou em termos de vidas, destacou para a sociedade as debilidades pré-existentes nas estruturas de poder, tanto nacionais como internacionais; assim como, demonstrou a dificuldade destas estruturas no gerenciamento dos desafios de uma crise global. Nesta conjuntura, em live transmitida no dia 15 de maio de 2020 pelo canal do Youtube Novo Eleitoral, direcionada à comunidade acadêmica da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), assim como a todos os pesquisadores e estudiosos da área ou a quem temática interessar, realizou-se uma

161  Graduado em Direito e em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1995 e 2001). Advogado inscrito na OAB do RN (1996). Especialista em Direito Processual Civil (2005) pela UnP. Mestre em Direito Público pelo Programa em Pós-Graduação em Direito da UFRN (2009). Atualmente é Professor Adjunto IV, tendo ingressado em 2005 no curso de Direito da UERN (Universidade do Estado do RN) sendo membro do Grupo de Pesquisa “Direito e Desenvolvimento”. É Doutorando em Direito Constitucional pela Facultad de Derecho de la Universidad de Buenos Aires desde 2012. Foi membro do Comitê de Ética em Pesquisa da UERN no período 2013-2014. Entre 2015 e 2016 exerceu a função de Coordenador do Curso Superior em Tecnologia de Gestão Pública promovido pela UERN e Escola de Governo do Estado do RN. É membro da Academia Macaibense de Letras desde setembro de 2017. 162  Acadêmica do quinto período do Curso de Direito da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte no Campus de Natal, membra do Projeto de Extensão Lives Direito UERN Natal.

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discussão a respeito dos impactos causados pela pandemia da Covid-19 no âmbito do direito e das políticas internacionais. Destaca-se que não é possível compreender o cenário político interno sem que haja interação com o cenário político internacional, pois a influência dessas interações é ainda mais evidente e intensa do que se pode imaginar. Na verdade, a sociedade encontra-se vivenciando um grande fluxo de transformações nacionais e internacionais que vem se acelerando nos últimos 5 (cinco) anos. E este, como todo processo de mudança, é um processo turbulento. E essas turbulências são observadas tanto no Brasil quanto no exterior. 2 A OMC E A CRISE ECONÔMICA A crise derivada da pandemia da Covid-19 afetou, dentre os diversos âmbitos da sociedade, de forma ainda mais direta, o da economia. Em relação a esta, é possível afirmar que o comercio internacional enfrentará muitas dificuldades nos próximos anos. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)163 , visando realizar uma projeção a respeito do comercio mundial, sendo está de caráter especulativo, utilizou os dados de projeções para a queda do PIB mundial disponibilizados pela a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a Organização das Nações Unidas (ONU), o Institute of International Finance (IIF) e a Economist Intelligence Unit (EIU), para realizar projeções quanto ao cenário do comercio mundial ao sofrer as repercussões da pandemia. Estima-se que em um cenário básico onde o PIB mundial viesse a cair 2,0% haveria uma queda de 20% do comércio mundial em 2020, assim como, uma queda de 15% em um cenário otimista e de 25% em cenário pessimista. Destaca-se que alguns fatores, como a duração da pandemia e as instabilidades políticas dos países, podem ocasionar resultados ainda piores que os estimados 164. A Organização Mundial do Comércio (OMC) foi fundada em 1995, sendo planejada durante a II Guerra Mundial na Conferência de Bretton Woods em 1944, e idealizada como uma organização internacional que visa evitar o protecionismo, assim como, fomentar o livre-comércio, missão essa que se encontra em um período no qual se faz ainda mais necessária e ao mesmo tempo de mais difícil concretização. A OMC encontrava-se passando por um momento de crise devido, principalmente, ao protecionismo adotado pelos países desde 2014, e agora tal crise

163  O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) é uma fundação pública federal vinculada ao Ministério da Economia, as suas atividades de pesquisa fornecem suporte técnico e institucional às ações governamentais visando a formulação de políticas públicas e programas de desenvolvimento no Brasil. 164  INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA – IPEA. Nota Técnica n. 32 (Diest): Estratégias de coordenação governamental na crise da Covid-19. Brasília: Ipea, 2020.

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vem a ser ainda mais agravada devido a evidente intensificação do protecionismo e de recentes desdobramentos na estrutura interna da própria organização. A crise na OMC encontra-se associada a questão da não renovação dos mandatos dos juízes do tribunal, são 7 (sete) magistrados dos quais 6 (seis) deles esgotaram seus mandatos no final do ano passado não havendo, até o momento, a renovação necessária; e assim sendo, o órgão encontra-se passando por um momento de paralisia. Destaca-se também, o recente anúncio de Roberto Azevedo, diretor-geral da OMC, de que irá antecipar sua aposentadoria em um ano. Ressalta-se que ele pode ser considerado um dos fundadores da OMC, pois faz parte desta desde 1997; assim como é um dos dois brasileiros que conseguiram ocupar o mais alto cargo em uma organização internacional até hoje, sendo o outro Augusto Cansado Trindade na Corte Internacional de Justiça. 3 A GRÃ-BRETANHA, O BREXIT E A CRISE ECONÔMICA Em âmbito internacional, um dos países a se destacar é a Inglaterra que vivencia um verdadeiro teste de fogo na sua política de isolamento pós Brexit .165 Entretanto, cabe ressaltar que os britânicos sempre afirmaram se encontrar sob teste de fogo, tal declaração decorre do fato de terem sobrevivido a uma série de eventos como a invasão da Inglaterra pelos romanos, depois pelos saxões, em seguida foram os vikings, e logo após os normandos; e então vieram os Espanhóis que tentaram dominar a Inglaterra com a Invencível Armada; em seguida veio Napoleão; e então a I Guerra Mundial, a II Guerra Mundial, a União Soviética; e, nos últimos anos, levantou-se a hipótese de que a Grã-Bretanha iria acabar devido ao Brexit, o que não aconteceu. Observa-se que, do ponto de vista econômico, não há muitas transformações advindas com Brexit, uma vez que, apesar de fazer parte da União Europeia (UE), a Grã-Bretanha nunca aderiu ao euro. Assim sendo, no tocante a transmissão de crises financeiras, não fazer parte da zona do euro, de certa forma, blinda a economia britânica do resto do continente, tanto é que, se analisarmos os dados dos últimos 30 (trinta) anos, ela, assim como a Alemanha são as duas economias com os melhores índices de crescimento na Europa. Destaca-se que um evento da magnitude desta pandemia vir a ocorrer no meio desse processo de separação não deixa de causar as suas sequelas, pois o acordo do Brexit estipula que os britânicos e a União Europeia possui o prazo de até o dia 31 de dezembro de 2020 para negociar os termos de um tratado de livre comércio166 que passará a gerir as relações entre ambos, entretanto é pos-

165 O termo Brexit vem da junção das palavras inglesas “Britain” (Bretanha) e “Exit” (saída) e denomina o processo pelo qual o Reino Unido retira-se da União Europeia. 166  Os tratados de livre-comércio consistem em acordos internacionais entre países que vi-

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sível questionar se será possível concluir um tratado de livre comércio que seja bem sucedido dentro do prazo estipulado, tendo em vista que esses tratados são complicados por excesso de minúcias. Caso não aconteça, ou seja, as partes não entrem em acordo no prazo previsto, vigorará provisoriamente as regras da OMC. Ressalta-se que, diante da pandemia da Covid-19, as perspectivas não são positivas. Os britânicos, como o resto da Europa, deverão passar por uma severa recessão, a previsão é que a zona do euro terá um crescimento negativo de -7%. Todavia, ao menos para os britânicos, há duas vantagens provisórias: 1. Eles estão menos suscetíveis a sofrer uma crise financeira devido a não pertencerem a zona do euro, assim como, por serem o centro financeiro da Europa, o que lhes concede mais liberdade. 2. Eles pularam do barco na hora certa, encontrando-se fora da UE os britânicos não estão obrigados a pagar os encargos como estado-membro ou a fazer parte de qualquer pacote de socorro para os outros países da UE. E, é isso está que está dividindo a União Europeia ao meio. Os países mediterrâneos como Portugal, Espanha, França, Itália e Grécia querem a mutualização da dívida, ou seja, somar as dívidas de todos os países e dividir por igual. O problema é que existem alguns países que seguem uma linha ortodoxa de controle rígido do déficit público como a Alemanha, Holanda, Áustria, Dinamarca e Finlândia, os países do norte da Europa que não concordam com a mutualização. Então, surge um dilema que remete aquela fábula da formiga e da cigarra; as formigas são do norte e as cigarras são do sul. Os países do norte da Europa não estão querendo pagar a conta daquilo que eles consideram irresponsabilidade fiscal dos países sulistas. Nesse ponto, os britânicos encontram-se fora dessa contenda. 4 IMPACTOS NA CONCEPÇÃO DE ESTADO Devido à situação atual, de constantes transformações e incertezas, diversos questionamentos veem sendo levantados e alguns deles referem-se à própria concepção do Estado. Se de um lado questiona-se a possibilidade de falência do Estado, por outro se questiona se seria o fim da ideia do estado liberal diante da necessidade de intervenção do Estado para o enfrentamento dos efeitos da pandemia, e outros também questionam se doravante as pessoas não passarão a ser mais exigentes com gastos públicos. Em relação ao primeiro questionamento afirma-se que não é a falência do Estado, mas que tal como as duas guerras mundiais, esta é uma crise que vai formatar o Estado.

sam conceder determinados benefícios mútuos como, por exemplo, eliminar tarifas alfandegárias ou estabelecer quotas na importação e exportação de bens e serviços.

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Os sistemas de saúde públicos, de agora em diante, deverão ser considerados, possivelmente, tão essenciais quanto as forças armadas. Observa-se que grande parte das populações do mundo, incluindo o Brasil, são dependentes de um sistema de saúde público; e que talvez a melhor forma de se proteger de uma nova pandemia, ao considerar que essa não é a primeira e não será a última, é com um sistema de saúde público amplo e disseminado. Sendo assim, uma questão a ser colocada em contraponto é: será que em um contexto desses, quando teremos aumento de gastos públicos para um sistema necessário, porém oneroso, como o de saúde as pessoas estarão dispostas a bancar que o Estado tenha uma rede de saúde sucateada, mas mantenha, por exemplo, uma empresa de petróleo? Seria admissível uma autoridade política, um deputado estadual ou um vereador, manter 20 (vinte) assessores dentro de um gabinete? É de se esperar que a partir de agora a tendência seja de que o público estará mais atento a questão da qualidade do gasto público. Um dos fatores que explica o quadro político interno no Brasil consiste no fato de que, na última década, há um pagador de impostos que se tornou saturado ao observar o seu dinheiro sendo descontado na fonte, encaminhado para o poder público e este realizando uma má gerência desse recurso. Para exemplificar, no caso da saúde pública, ao se observar os recursos que a rede de saúde pública recebe, ao se analisar os dados desde que o Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado, é um valor na escala de centenas de bilhões de reais e, entretanto o país encontra-se em uma situação onde as pessoas estão morrendo por falta de uma estrutura básica de atendimento. Deste modo, é possível afirmar que diversas atribuições do Estado passarão a ser questionadas. Se por um lado a forma de Estado de bem-estar social não morreu, do outro a ideia, por exemplo, de Estado mínimo, em que o Estado se concentra em funções de saúde, educação e segurança pública, será repensada, pois até que ponto deve-se entregar os recursos financeiros ao Estado se estes forem destinados a custear certas coisas de utilidade, no mínimo, duvidosas? Não é possível entender a dinâmica política interna do Brasil contemporâneo se não entender (ou não quiser entender) que existe um pagador de impostos que está saturado com o desperdício; e não digamos nem desperdício do dinheiro público, digamos do dinheiro do pagador de impostos, pois o Estado não gera riqueza apenas consome a riqueza gerada pelos outros (indivíduos, famílias e empresas) através de tributação e a administra; e no entanto, muitas vezes, administra mal. 5 RELAÇÕES DO MUNDO COM A CHINA Atualmente há uma crescente conturbação nas relações entre a China e outros países que decore, principalmente, do fato desta ter sido o ponto inicial da pandemia da Covid-19, assim como, dos questionamentos que vem sendo 106


levantados a respeito de como a China gerenciou a pandemia quando no início; destes fatores provém um movimento de diversos países no sentido de desinvestir no mercado Chinês. Consta que, as relações entre a China e os EUA, que já não eram muito boas, vieram a ser agravadas neste período de crise; outros países também demonstram a intenção de retirar suas industrias do território chinês sendo estes, por exemplo, a Coréia do Sul, Japão, Austrália, Alemanha, França, Grã-Bretanha e Índia. A título de ilustração, Hubei, considerado o centro da pandemia, é um dos maiores centros industriais de produção automotiva, uma significativa parte das grandes corporações no setor possuem fábricas localizadas na região. Ressalta-se que apesar desta retirada ser mais intensa em relação a China, pois a pandemia levantou questionamentos quanto a dependência dos demais países quanto ao ela, também ocorre em relação a outros países e que se esta tendência se consolidar poderá implicar em uma retração quanto a globalização167 . Destaca-se que a Austrália se manifestou no sentido de requerer uma investigação internacional independente sobre a forma como foi gerenciada a crise da Covid-19 na China. Esta ação se dá devido a que, afastando-se as teorias de conspiração, está começando a se desenvolver um consenso de que o governo Chinês agiu no sentido de ocultar a epidemia em seu início. Tal afirmação decorre de alguns fatores como, a China ter vindo a assumir a pandemia somente no dia 29 de dezembro de 2019 enquanto que o primeiro caso teria sido 17 de novembro de 2019 e devido a que no mês em que estavam negando a pandemia proibiram a exportação de equipamentos médicos ao mesmo tempo em que aumentaram a compra dos mesmos no exterior. Deste modo, há uma sinalização, que está sendo cada vez mais forte, de que quando passar o pior da pandemia começarão a sentar-se à mesa e serão cobradas as devidas satisfações. Contudo, a impressão que se tem é que houve um trabalho no sentido de minimizar os efeitos da pandemia e até de omitir a erupção da doença. Outro detalhe interessante a ser aludido, diz respeito a estar havendo um questionamento sobre o real número de vítimas na China. Nota-se que a todo momento está havendo uma pequena correção para cima nesses números. E é possível se questionar sobre como, em época anterior ao isolamento, uma cidade como Shanghai que é quase do tamanho de São Paulo, que tem em média 200 voos por dia considerando apenas o tráfego aeroviário, a doença conseguiu ficar contida basicamente em uma única província da cidade? Essa pergunta está sendo exteriorizada. Até algum tempo atrás, os chineses estavam negando que teria havido casos em Shanghai, entretanto observa-se que esta é a maior metrópole da China, talvez a maior do mundo, com 24 milhões de habitantes; e na verdade, já começaram a aparecer listas de contaminados e de mortos. Todavia,

167  IPEA, 2020.

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houve sim uma quebra de confiança e as consequências serão de longo alcance, e serão elas que determinarão o tom das relações internacionais nos próximos anos. Isso talvez seja parte do novo normal. 6 A OMS E SUAS ATRIBUIÇÕES No que concerne a Organização Mundial de Saúde (OMS)168 alguns questionamentos são levantados no sentido de aprimorar a sua atuação tanto na crise atual, causada pela Covid-19, como em uma possível futura crise, e até mesmo a respeito da implementação de ações que visariam evitar tais crises. Sobre este prisma é possível realizar um comparativo com a atuação da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) 169 que realiza fiscalizações nos Estados-nações signatários do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP) e que ao notar o descumprimento de suas recomendações, pode recorrer diretamente ao Conselho de Segurança. Destaca-se que a OMS obteria mais efetividade ao possuir poderes e atribuições tais quais os da AIEA. No entanto, esta seria uma proposta de difícil operacionalização, pois a OMS possui todas as virtudes e os defeitos de ser uma organização internacional, ou seja, ela terá tanto poder quanto os Estados-nações o deleguem. Deste modo, cabe questionar se, por exemplo, os chineses iriam admitir uma mudança dessas no Estatuto da Organização, provavelmente não; assim como, cabe questionar se as grandes potências como, por exemplo, a Rússia, que possuem programas de pesquisa de armas biológicas, concordariam. Ressalta-se que esta é uma ideia boa e desejável ao considerar-se que poderá ocorrer uma nova pandemia e está poderia ser uma das ações a serem adotadas visando evitá-la. Observa-se que, na história da humanidade já ocorreram pandemias muito piores. Durante a peste negra, uma pessoa começava apresentar sintomas da doença em 8, 10, 12 horas e podia estar morta em 72 horas. Calcula-se que pode ter morrido de 1/3 (um terço) à metade da população da Europa. De certo modo estamos vivendo uma época que, se for analisada do ponto de vista histórico, em que observa os acontecimentos passados e se vislumbra o que poderá se repetir, não causa espanto, pois da mesma forma que houve uma pandemia com o nível de letalidade da peste negra, que devastou a Eurásia, toda da China, até a Europa, pode ocorrer um outro evento dessa natureza. Entretanto, acreditar que os países

168  A Organização Mundial de Saúde (OMS) é uma agência especializada em questões relativas a saúde, fundada em 7 de abril de 1948, subordinada a Organização das Nações Unidas e que objetiva garantir o mais alto grau de Saúde para todos os seres humanos. 169  A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) foi fundada em julho de 1957, é uma organização das Nações Unidas e o centro internacional de cooperação no campo nuclear. Ela visa promover o uso seguro, protegido e pacífico das tecnologias nucleares e para tal realiza fiscalizações quanto ao uso de energia e armas nucleares em todo mundo.

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irão concordar em aumentar o nível de poder da OMS, já é outra história. 7 DISPUTAS DE PODER E CRISE POLÍTICA NO BRASIL Sendo tarefa do Estado a proteção de seus cidadãos, se este falha põe em xeque a própria legitimidade de suas instituições; se o Estado encontra-se em um cenário em que estas já são questionadas, como é o caso do Brasil nos últimos anos, a situação torna-se ainda mais problemática ao se somar a crise causada por uma pandemia como a da Covid-19, pois este tipo de crise suscita ainda mais vulnerabilidade nas instituições que já se encontravam vulneráveis170 No Brasil os três poderes se encontram desbalanceados e em crise há muito tempo. O ativismo está prejudicando muito, inclusive, o próprio judiciário, pois pode conduzir a um grau de politização no qual toda a decisão judicial passará a ser questionada. “Ah, o magistrado fez essa decisão em favor do Governador”, “Tal magistrado deu essa decisão em favor do Prefeito”. E ressalta-se que, muitas vezes, a decisão possui uma fundamentação normativa sólida, mas o fato de se observar muita interferência política ou uma atuação excessivamente politizada põe a credibilidade da decisão, e da própria instituição, em xeque. Um livro essencial para se entender a realidade brasileira é “Os Donos do Poder” de Raimundo Faoro; este realiza um apanhado que percorre desde a formação do Estado português na Ibéria e até os anos 1960 no Brasil e pondera que é graças as peculiaridades de nascimento, de criação institucional e de formação do Estado que no Brasil há um fenômeno onde, muitas vezes, o executivo administra em proveito próprio, o legislativo legisla em proveito próprio e o poder judiciário acaba julgando em proveito próprio; e afirma que tal ocorrência se encontra diretamente ligada a baixa participação e fiscalização da população em relação aos três poderes, o que por alguns é denominado de “democracia de baixa intensidade”. Nesta conjuntura, o executivo quer extrapolar os seus limites, o legislativo em alguns momentos parece assumir uma pauta inteiramente corporativa e no judiciário os Ministros do Supremo batem boca ao vivo em sessão plenária; neste último cabe questionar a respeito de até que ponto é saudável transmitir ao vivo as sessões do Supremo Tribunal Federal. Sendo assim, é possível afirmar que estas situações estão causando o desgaste das instituições. O Vice-presidente Hamilton Mourão publicou um artigo afirmando que o momento é de responsabilidade e união, que não se pode minimizar a importância da tragédia que nós estamos passando e que este não é o momento para disputas políticas. No entanto, o que se nota é que todos os atores políticos estão disputando o poder

170  BOIN, A. The transboundary crisis: why we are unprepared and the road ahead. Journal of Contingencies and Crisis Management, v. 27, n. 1, p. 94-99, 2019.

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nesse momento. A casa está pegando fogo e estão brigando pelo sofá sem ver que a casa pode acabar caindo em cima de todo mundo. 8 OUTRAS CONSIDERAÇÕES A pandemia da Covid-19 tem acarretado diversas transformações tanto no âmbito interno dos Estados quanto no âmbito internacional, sendo uma delas, o aceleramento das mudanças no que se refere aos meios tecnológicos aplicados nas mais diversas áreas da convivência em sociedade como, por exemplo, na do trabalho. Destaca-se, por exemplo, o processo de informatização dos tramites judiciais, este que no Brasil que teve como marco inicial de transição a Lei n° 11.419/06 doravante deve ser ainda mais acelerado. Ressalta-se que, no cenário futuro, qualquer meio que evite de contato humano será válido de ser implementado. Essa crise veio para evidenciar os ramos da economia, política, da sociedade como um todo que podem estar caminhando para a obsolescência, ao mesmo tempo que demostra os setores que estão dispostos a se reciclar e reinventar. Outro ponto a ser destacado consiste na movimentação de pessoas entre os países. A estimativa é que as viagens internacionais doravante passarão a ser mais complicadas, com sistemas mais rigorosos, e com bloqueios visando realizar uma verificação ainda mais severa em relação as pessoas que buscam cruzar as fronteiras, principalmente, no que concerne as especificações referentes a saúde como, por exemplo, verificar se a carteira de vacinação encontra-se atualizada. Outra consequência acarretada pela pandemia trata-se do adiamento eleitoral, uma vez que, havia duas eleições presidenciais marcadas, uma para o dia 3 (três) de maio na Bolívia e outra para o dia 10 (dez) na Polônia, com ambas tendo sido adiadas. Quanto ao Brasil, a expectativa é a de que dependerá do desenrolar da pandemia. Observa-se que no Código Eleitoral brasileiro há a possibilidade de que, em situação excepcional, se possa realizar um adiamento, uma prorrogação do prazo. Ainda assim, consiste em um problema inusitado. 9 COOPERAÇÃO INTERNACIONAL E CONSIDERAÇÕES FINAIS Devido a globalização, os acordos e trados entre os países, o princípio de cooperação internacional presente no art. 1o Carta das Nações Unidas de 1945 e da cooperação entre os povos presente no art. 4o, inciso IX da Constituição Federal de 1988, não é estranho esperar-se que os países viessem a buscar uma solução para a crise de forma conjunta, trabalhando em cooperação; entretanto o que se observou foi um elevado número de ações protecionistas por parte destes.

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Neste contexto, destaca-se a situação da União Europeia que se configura como a experiência de cooperação internacional mais sofisticada de toda a história mundial, não havendo nenhuma comparação anterior. Entretanto, dentro da Europa, qual foi a primeira ação realizada na crise? Os países fecharam as fronteiras mutuamente entre si. Sendo assim, observa-se que o protecionismo se fez presente, inclusive, em meio a EU. Isso se evidencia com as ações da França e da Alemanha ao proibirem a exportação de produtos necessários ao combate a pandemia ao mesmo tempo que outros países carecia destes, houveram, inclusive, alguns incidentes como, por exemplo, a República Tcheca que confiscou medicamentos que vinham da Alemanha a caminho da Itália; outro conflito configura-se na questão da mutualizaçao da dívida dos países da UE, em como realizar o auxílio financeiro para os países que sairão abalados da pandemia da Covid-19171 . Destarte, se nem os Europeus conseguiram unidade para enfrentar essa crise, na América Latina, pode-se afirmar que o Mercosul172, em termos de cooperação na crise, deixa ainda mais a desejar. Argentina se fechou em uma concha. Paraguai e Uruguai, como sempre, estão esperando pelas decisões do Brasil. E o Brasil, este encontra-se em um processo decisório vivendo perpetuamente em uma crise política nos últimos meses e não conseguindo cooperar internamente quanto mais externamente. Observa-se que, no que concerne a estratégia dos Estados para conter a crise destaca-se dois caminhos: retroceder, dissociando-se dos sistemas modernos e voltando-se para um sistema mais simples e isolado; ou avançar, fortalecer o gerenciamento de crises ao aceitar que estas podem ocorrer e investir na detecção precoce e na intervenção oportuna173 . Ressalta-se que, enquanto a primeira opção consiste em uma solução para a vigência da crise, e que inclusive alguns países demostram se inclinar para ela neste momento; a segunda opção destina-se mais as possíveis crises vindouras e a como se prepara para enfrentá-las. Em uma conjuntura atual, no enfretamento da crise gerada pela Covid-19, os caminhos escolhidos pelos Estados encontram-se conturbados e voltados para o protecionismo; e sendo assim, percebe-se que a cooperação internacional está sendo muito prejudicada, demonstrando que bem ou para o mal o nacionalismo não morreu, pois na hora da crise, cada um acaba se fechando e

171  DUARTE, Fernando. Coronavírus: as tensões diplomáticas que a pandemia provocou ao redor do mundo. BBC News Brasil, 12 abr. 2020. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52239168>. Acesso em: 25 maio 2020. 172  Mercado Comum do Sul (Mercosul) firmado pelo Tratado de Assunção em 1991, é uma organização intergovernamental que estabelece uma zona de livre comercio e uma política comercial comum. Seus membros são Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. 173  BOIN, 2019.

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buscando suas próprias soluções. Entretanto, no entender de Roberto Azevedo, diretor-geral da OMC, a integração e cooperação internacional são o caminho para uma resposta viável e sustentável a crise provocada pela pandemia, pois “desafios globais exigem soluções globais” . Ressalta-se que seria necessário realizar-se um estudo quanto a situação em que se encontra cada Estado, tanto em âmbito interno como quanto as suas relações internacionais, para que se possa afirmar qual seria a melhor forma de gestão de crise ou as suas perspectivas para o futuro. Entretanto observa-se que o que impera é a necessidade de haver a devida cooperação entre os Estados no âmbito internacional e entre as instituições públicas em âmbito interno.

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Referências ALEGRETTI, Laís. Pandemia deixará ‘cicatrizes’ no comércio global, diz brasileiro diretor-geral da OMC. BBC News Brasil, 25 maio 2020. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52754077>. Acesso em: 26 maio 2020. BOIN, A. The transboundary crisis: why we are unprepared and the road ahead. Journal of Contingencies and Crisis Management, v. 27, n. 1, p. 9499, 2019. BUENO, Clodoaldo; CERVO, Amado Luiz. História da política exterior do Brasil. 5. ed. Brasília, DF: Editora UNB, 2015. COUTO E SILVA, Golbery do. Geopolítica e poder. Rio de Janeiro: Editora UniverCidade, 2003. DUARTE, Fernando. Coronavírus: as tensões diplomáticas que a pandemia provocou ao redor do mundo. BBC News Brasil, 12 abr. 2020. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52239168 . Acesso em: 25 maio 2020. FRIEDMAN, George. Os Próximos 100 Anos. Rio de Janeiro: Best Business Editora, 2009. INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA – IPEA. Nota Técnica n. 32 (Diest): Estratégias de coordenação governamental na crise da Covid-19. Brasília: Ipea, 2020. MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2007. PARLAMENTO EUROPEU. Resolução do Parlamento Europeu, de 17 de abril de 2020, sobre a ação coordenada da UE para combater a pandemia de COVID-19 e as suas consequências. Bruxelas, abr. 2020. Disponível em: <https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/TA-9-2020-0054_PT.html>. Acesso em: 25 maio 2020. SARAIVA, José Flávio Sombra. História das Relações Internacionais Contemporâneas. 2. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2007. SPYKMAN, Nicholas J. Geography and Foreign Policy, I. The American Poli113


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Capítulo 7 IMPACTOS DA COVID- 19 NAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO BRASIL: ENFRENTAMENTO ATRAVÉS DAS MP Nº 927/2020, MP Nº 936/2020 E LEI Nº 13982/2020 Marcelo Roberto Silva dos Santos174 01 INTRODUÇÃO A Covid-19 provocou uma grande mudança na vida os brasileiros, em face da decretação do estado de calamidade pública em 20.03.2020, pelo Decreto Legislativo nº 06/2020. Trata-se de uma pandemia mundial, reconhecida pela Organização Mundial de Saúde (OMS). O cenário atual é preocupante, na medida em que já houve mais de 131.736 óbitos por Covid-19 e mais de 4.335.066 casos confirmados somente no Brasil, segundo dados da Covid Visualizar que coleta dados do Ministério da Saúde175 . O horizonte do mundo do trabalho, das relações de trabalho e do impacto do coronavírus é de uma dimensão sem precedentes, na medida em que permanecem em vigor as regras do isolamento social, bem como face ao decurso de prazo de mais de 90 dias da pandemia no Brasil e, ainda, a ausência de uma vacina até a presente data. Frise-se que a conjuntura do trabalho já merecia muita atenção e preocupação, antes mesmo do coronavírus. Segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE176 , de fevereiro de 2020, quando não existia ainda

174  Possui graduação em turismo pela Faculdade para Executivos - FACEX (1993) e graduação em direito pela Universidade Potiguar- UnP (1999). É especialista em Administração Judiciária, É especialista em Direito e Processo do Trabalho. Mestre em Administração, Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Paraná.. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito e Processo do Trabalho. É membro da Comissão de Ensino Jurídico da OAB/RN. Professor da UERN - Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. 175  Veja mais em: <https://covidvisualizer.com>. Acesso em: 14 set. 2020. 176  Veja mais em: <https://www.ibge.gov.br/explica/desemprego.php>. Acesso em: 20 jun. 2020.

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essa epidemia, já havia mais 12,4 milhões de desempregados e aproximadamente 38 milhões de trabalhadores informais, que não possuíam o vínculo empregatício celetista. Portanto, os dados revelam que a preocupação com o mundo do trabalho é anterior a pandemia do coronavírus. O Direito do Trabalho sofreu um enfraquecimento desde a Lei nº 13467/2017177 , conhecida com a Lei da Reforma Trabalhista, que entrou em vigor em novembro de 2017 e, depois com vários ataques a Justiça do Trabalho, com alguns setores da imprensa noticiando, sem conhecer, inclusive com base em fake news, que a justiça do trabalho só existia no Brasil, o que não é verdade. Nos países mais desenvolvidos do mundo existe a justiça do trabalho, destacando-se a presença nos seguintes países: França, Inglaterra, Alemanha, Irlanda, Dinamarca, Austrália, América Latina, Israel, Nova Zelândia, Singapura, Suíça, Suécia e Noruega. O Direito do Trabalho foi enfraquecido, pós Reforma Trabalhista, porque houve uma aproximação com o Direito Civil e o Direito do Trabalho é um desprendimento do Direito Civil e se justifica a partir de possuir princípios próprios. Hodiernamente vivencia-se um fato extraordinário que levou a determinação do fechamento de empresas pública e privadas para garantia e proteção da coletividade. A suspensão das atividades laborais, não por vontade do empregado ou do empregador e, sim em face da questão de saúde coletiva que demanda a necessidade de isolamento social, foi inclusive positivada na legislação Federal e Estadual, com base no interesse público previsto na Constituição Federal. O Direito do Trabalho e a Justiça do Trabalho estão demonstrando agora a sua essencialidade, porque é uma justiça social e um direito social, um direito constante no rol dos Direitos Sociais, no art. 7º da Carta Magna, e o valor do trabalho também possui previsão constitucional. Ocorre que, a crise econômica vem se agravando na medida em que, desde março/2020, diversas medidas de isolamento social foram tomadas pelo Governo Federal, Decreto Legislativo nº 6178 , 20/03/2020, bem como especialmente a normas do Estado do Rio Grande do Norte, que proíbem e impossibilitam a realização da atividade laboral, através dos Decretos Estaduais nº 29.534/2020179

177  Veja mais em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm#:~:text=Art.,vigorar%20com%20as%20seguintes%20altera%C3%A7%C3%B5es%3A&text=%C2%A7%201%C2%BA%20O%20direito%20comum%20ser%C3%A1%20fonte%20subsidi%C3%A1ria%20 do%20direito%20do%20trabalho>. Acesso em: 15 jun. 2020. 178  Veja mais em: <https://legis.senado.leg.br/norma/31993957>. Acesso em: 14 set. 2020. 179  Veja mais em: <http://diariooficial.rn.gov.br/dei/dorn3/docview.aspx?id_jor=00000001&data=20200318&id_doc=677489>. Acesso em: 14 set. 2020.

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;29541/2020180 ; 29.634/2020181 ; 29.668/2020182 e 29.742/2020183 . Pois bem, com essas limitações impostas pelas legislações, Federal e Estadual, vivencia-se um novo problema, que se refere aos trabalhadores que possuem o vínculo de emprego, mas as empresas para as quais eles laboram estão impossibilitadas de realizar as atividades empresariais em face da situação de descontrole da Covid19. Agravado, também pela impossibilidade de realização das atividades pelos autônomos e microempreendedores individuais que não podem desenvolver suas atividades, face as limitações do isolamento social. Neste passo, o Governo Federal publicou várias Medidas Provisórias para o enfrentamento da crise da Covid-19, visando amenizar os efeitos nas relações de trabalho, com o objetivo especial de preservar os empregos e a renda face a emergência de saúde. Evidentemente que se impõe o reconhecimento, independentemente de quem seja o governante, que várias medidas foram tomadas para combate a crise do coronavírus. Embora, também precisa-se apontar a falta de coordenação entre legislativo e executivo, principalmente no desempenhar dessas medidas. Prova disso, foi a problemática da Medida Provisória do trabalho verde e amarelo, MP 905/19184 , que mesmo aprovada pela Câmara Federal, face aos sinais de não aprovação pelo Senado Federal, foi revogada pelo Presidente, visto que não seria apreciada no prazo de 120 dias. A referida norma, trazia uma série de modificações visando aumentar a quantidade de empregos formais. O Governo Federal, na medida do possível, vem buscando, pelo menos com a edição de Medidas Provisórias, tanto no que pertine às relações de trabalho, quanto no que se refere a economia, reduzir as consequências da pandemia. Mas, não há integração nenhuma, comunicação nenhuma ou mínima, entre o executivo e o legislativo e, essa falha cria uma dificuldade muito grande, podendo, como mencionado, ocorrer o inclusive caducamento de algumas medidas, fato que demonstra a falta de coordenação, além de contribuir diretamente para dificultar o combate a pandemia de saúde. Vejamos as Medidas Provisórias editadas pelo Governo Federal, tendo por objetivo o combate ao coronavírus, com a preservação de empregos e da renda,

180  Veja mais em: <https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=391262>. Acesso em: 14 set. 2020. 181  Veja mais em: <https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=393452>. Acesso em: 14 set. 2020. 182  Veja mais em: <https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=394576>. Acesso em: 14 set. 2020. 183  Veja mais em: <https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=396529>. Acesso em: 14 set. 2020. 184  Para saber mais, acesse: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/Mpv/ mpv905.htm>.

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dentre as quais buscar-se-á apontar os pontos polêmicos das MPs nº 927/2020185 e 936/2020186 , bem assim no que toca a Lei nº 13,982/2020. 2 MEDIDA PROVISÓRIA Nº 927/2020 A Medida Provisória 927, de 22.03.2020, possibilitou a realização de acordo individual, para garantia de permanência do vínculo empregatício. Algumas das medidas elencadas pela norma: o teletrabalho; a antecipação de férias individuais; a concessão de férias coletivas; o aproveitamento e a antecipação de feriados; o banco de horas; a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho; e o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). A MP trouxe a previsão de alteração do contrato de trabalho, face a situação de pandemia, para a realização das atividades mediante o teletrabalho, trabalho remoto, ou outro tipo de trabalho à distância, podendo determinar o retorno das atividades presenciais, independentemente de acordos individuais ou coletivos, dispensando inclusive o registro da alteração no contrato individual. Trilhando esta mesma esteira de raciocínio, o Conselho Nacional de Justiça através da Resolução nº 313/2020187 , de 19 de março de 2020, uniformizou o trabalho dos órgãos judiciais, visando a prevenção do Coronavírus, com a suspensão dos trabalhos presenciais de servidores, magistrados, colaboradores e estagiários nas unidades judiciárias, privilegiando a realização do trabalho remoto, bem como mediante a suspensão dos prazos processuais. No Rio Grande do Norte, o Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região, adotou idêntico posicionamento, através do Ato TRT GP nº 40/2020, em que foi determinada a suspensão dos prazos processuais, suspensão do trabalho presencial, adoção do teletrabalho ou trabalho remeto para execução das tarefas no âmbito da Corte Regional do Trabalho, seguindo a mesma linha do Ato Conjunto CSJT. GP.VP e CGJT nº 1188 , de 19/03/2020. Ponto também alterado pela Medida Provisória foi a antecipação de férias, possibilitando que o empregador, com antecedência de 48hs, mediante comunicação escrita ou eletrônica, procedesse a concessão das férias, não inferior a 5 dias, noticiando o período de gozo, mesmo que não houvesse ocorrido o cumpri-

185  Para saber mais, acesse: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Mpv/ mpv927.htm>. 186  Para saber mais, acesse: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/mpv/ mpv936.htm>. 187  Veja mais em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/03/Resolu%C3%A7%C3%A3o-n%C2%BA-313-5.pdf>. Acesso em: 12 set. 2020. 188  Veja mais em: <http://www.csjt.jus.br/documents/955023/7190423/ato+conjunto+01-2020. pdf/244edf67-97fa-4dd1-2538-c978ace8eb4d?t=1585254634091> Acesso em: 12 set. 2020.

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mento do período aquisitivo, possibilitando o pagamento do adicional de férias até o dia 20/12/2020, bem como condicionando o pagamento do abono pecuniário a concordância do empregador. Possibilitou, ainda, a concessão de férias coletivas, dispensando a comunicação prévia ao órgão local do Ministério da Economia e aos sindicatos representativos da categoria profissional. As férias, por previsão legal do art. 136, CLT189 , são aprazadas pela conveniência do empregador, necessitando de comunicação expressa com antecedência de 30 dias. Todavia, houve na Medida Provisória a redução do prazo de para avisar ao empregado, para 48hs, visando possibilitar a concessão rápida, como forma de enfrentamento da pandemia, na medida em que o isolamento social é a grande recomendação. Outro ponto positivo, para que os empregadores possam ter um fôlego, foi a possibilidade do pagamento do terço constitucional de férias até o dia 20.12.2020. Para o empregador também haverá a possibilidade de contar com a força total do empregado para enfrentar o pós-pandemia. Aproveitamento e a antecipação dos feriados também foi previsto na MP, desde que o empregado seja notificado com a antecedência mínio de 48hs, com indicação expressão do feriado não religioso antecipado, podendo ocorrer a compensação do saldo em banco de horas. Para os feriados religiosos, a norma exigiu a concordância do empregado, mediante manifestação em acordo individual escrito. Outro ponto importante para reforçar o isolamento social, tão recomendado em tempos de pandemia. No Rio Grande do Norte, por exemplo, houve a antecipação do feriado do dia 03.10.2020, dos Mártires de Cunhaú e Uruaçu, que neste ano cairia num sábado, para o dia 12.06.2020, sexta-feira, de modo a aumentar o período de isolamento, já que a quinta, 11.06.2020, era o feriado de Corpus Christi, através do Decreto nº 29752, de 10.06.2020 190. A Medida Provisória retro mencionada autorizou a interrupção das atividades pelo empregador e a constituição de regime especial para compensação de jornada, mediante banco de horas, em favor do empregador ou do empregado, estabelecido por acordo individual ou coletivo, para a compensação no prazo de 18 meses, após o encerramento da pandemia. Ficando autorizada a compensação mediante a prorrogação da jornada em duas horas, desde que não exceda a dez horas diárias. A adoção desse regime permitirá a possibilidade de compensação do tempo de interrupção das atividades, face ao estado de calamidade pública e quarentena quando do reinício das atividades laborais, com a majoração do prazo para 18

189  Veja mais em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 12 set. 2020. 190  Veja o texto completo em: <http://diariooficial.rn.gov.br/dei/dorn3/docview.aspx?id_ jor=00000001&data=20200611&id_doc=685805>. Acesso em: 10 set. 2020.

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meses, sendo necessária a realização de ajuste individual. Face a necessidade do isolamento social, foi determinada a suspensão, de igual forma, da obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, mormente pela situação dos equipamentos de saúde, bem como em decorrência da alta possibilidade de contágio nestes locais, ficando prorrogada a realização para o prazo de sessenta dias após o encerramento do estado de calamidade pública. Possibilitou a dispensa do exame demissional, na hipótese de ter sido realizado há menos de cento e oitenta dias. Foi suspensa a obrigatoriedade de realização de treinamentos periódicos e eventuais dos atuais empregados, havendo a dilação de prazo para realização noventa dias após o encerramento da calamidade pública, ficando autorizada a realização mediante o ensino a distância. Houve a prorrogação dos mandatos das comissões internas de prevenção de acidentes até o encerramento da pandemia, ficando suspensos os processos eleitorais. Esse conjunto de alterações tem como base a manutenção do isolamento social, acredita-se que as medidas são positivas, visto que buscam, neste momento, a preservação da saúde e segurança dos trabalhadores. Outra suspensão, autorizada pela MP 927/2020, foi referente ao recolhimento do FGTS pelos empregadores, dos meses de março, abril e maio/2020, independentemente do número de empregados, regime de tributação, natureza jurídica, do ramo de atividade econômica e de adesão prévia. O pagamento dessas competências poderá ser realizado de forma parcelada, em até seis parcelas mensais, com vencimento da primeira em julho/2020, sem a incidência de multa e encargos. Os certificados de regularidade emitidos antes da entrada em vigor da MP foram prorrogados por 90 dias. No que se refere ao parcelamento do FGTS, convém destacar que os empregadores permanecem obrigados a declarar as informações até o dia 7 de cada mês, por meio do Conectividade Social e E-social, bem como apontar que haverá, para os que optarem pelo parcelamento, o pagamento de duas GFIO/SEFIP mensais, de julho a dezembro, face ao pagamento do mês normal. Ocorre que, diversos dispositivos da Medida Provisória 927/2020 foram objeto de Ações Diretas de Inconstitucionalidade, através das ADI 6377, ADI 6380; ADI 6342; ADI 6375, ADI 6344; ADI 6346, ADI 6348, ADI 6352, ADI 6354, ADI 6375, perante o Supremo Tribunal Federal. Nesta linha, o art. 29, previa a não consideração dos casos de Covid-19 como ocupacionais, bem assim o art. 31, que previa a função orientadora dos Auditores Fiscais do Ministério da Economia, tiveram sua eficácia suspensas. 3 MEDIDA PROVISÓRIA 936/2020 A Medida Provisória 936/2020 publicada em 01/04/2020, institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pú120


blica da Covid-19, tem por objetivo a preservação do emprego e renda, garantir a continuidade das atividades laborais e empresárias e reduzir o impacto social decorrente das consequências do estado de calamidade pública e de emergência de saúde pública. A criação do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, a ser pago pelo Governo Federal foi a forma de enfrentamento utilizada para possibilitar a percepção do benefício nas seguintes hipóteses: redução proporcional da jornada de trabalho e de salário e suspensão temporária do contrato de trabalho. A norma prevê a possibilidade de redução de jornada e de salários e a suspensão do contrato de trabalho, com vistas a preservar o emprego e a renda. A redução poderá ser feita, exclusivamente, nos percentuais de 25%, 50% ou 70%, da forma demonstrada no quadro abaixo, mantido o valor do salário hora. Figura 1 – Percentuais de redução.

Fonte: Medida Provisória 936/2020191 . A suspensão do contrato de trabalho poderá ser realizada mediante ajuste individual, para os trabalhadores que recebem até 3 salários mínimos (R$ 3.135,00), bem como para os trabalhadores que recebem salários superiores a duas vezes o teto do RGPS, R$ 12.202,12, e sejam portadores de diploma de nível superior. Em ambos os casos, é necessária a comunicação ao sindicato no prazo de dez dias, contados da celebração. Ressalte-se a possibilidade de realização da suspensão do contrato de trabalho mediante negociação coletiva.

191  Disponível em: <https://www.congressonacional.leg.br/materias/medidas-provisorias/-/ mpv/141375>. Acesso em: 14 set. 2020.

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Essa comunicação, foi alvo de uma decisão liminar proferida pelo Ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, ad referedum, em processo movido pela Rede Sustentabilidade, a qual não foi referendada pelo Pleno do STF, nos autos da ADI, permanecendo intacta até a presente data. A Advocacia Geral da União relatou, durante o julgamento acima mencionado, que houve mais de 3 milhões de acordos individuais celebrados após a edição da medida provisória que permite a redução de salário e da jornada. Nestas hipóteses de suspensão, o empregador que tiver receita bruta superior a R$ 4.800.000,00, no calendário de 2019, deverá pagar uma ajuda compensatória no importe de 30% sobre o valor do salário do empregado. Os cálculos para a percepção do Benefício foi o que gerou as maiores dúvidas, face aos parâmetros definidos na Norma. Pois bem, tentaremos simplificar a interpretação da legislação, por meio de exemplos práticos. Vejamos. Para os trabalhadores que tiveram redução inferior a 25% não há qualquer direito a percepção do BEm – Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e Renda. Para as demais hipóteses será necessário o conhecimento prévio as regras para percepção do seguro desemprego, visto que o cálculo ocorre com base nos referidos valores. Vejamos o quadro abaixo, para melhor entendimento dos valores relativamente ao recebimento do Seguro Desemprego. Figura 2 – Valores do seguro desemprego

Fonte: Medida Provisória 936/2020 . O cálculo do BEm tem por base o percentual da redução da jornada. Logo para os que tiveram redução entre 25%, terão direito a 25% sobre o valor a que teria direito o trabalhador a título de Seguro Desemprego. Para quem teve a redução de 50% terá direito a 50% do valor que teria direito a título de Seguro Desemprego e, quem teve redução de 70%, terá direito a 70% sobre o valor que teria direito a título de seguro desemprego. Vejamos, o caso prático hipotético, José Emmanuel de Melo Neto percebe remuneração de R$ 2200,00 face suas atividades laborais na empresa XôCovid-19. Qual o valor do Seguro Desemprego?

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SD=1279,69 + R$ 300,19=R$1.579,88. Onde esse valor de R$ 300,19 foi obtido através da diferença entre R$ 2.200,00 – R$ 1599,61= R$ 600,39. Desse valor foi utilizado 50%, como manda a regra, chegando-se aos R$ 300,19. Portanto, o valor correspondente ao seguro desemprego de José Emmanuel de Melo Neto é de R$ 1579,88. O valor do BEm seria = a 50% do valor referente ao seguro desemprego. Para o caso em análise= R$ 790,00, (com o arredondamento, previsto no § 4º, art. 6º da MP 936/2020). Nessa hipótese em que houve a redução de carga horária de 50%, o empregador XôConvid19 é obrigado a proceder ao pagamento de metade da remuneração, ou seja, R$ 1.100,00. O valor total recebido pelo empregado será de R$ 1.790,00. Para que o trabalhador possa receber o BEm é necessário o cumprimento das exigências pelo empregador, no que se refere ao cumprimento dos prazos para efetivação das comunicações, visto que efetivado o ajuste no contrato de trabalho, deverá ocorrer a comunicação ao Ministério da Economia no prazo de dez dias. Frise-se, ainda, que mesmo diante da celebração da suspensão do contrato, poderá a empresa, respeitando o prazo de dois dias corridos, encerrar a suspensão com a retomada das atividades normais no estabelecimento empresarial ou de forma remota. O recebimento do BEm não impede a percepção futura do seguro desemprego, desde que atendidas as exigências legais. O pagamento efetivado pelo Governo Federal a título de BEm, assim como a ajuda compensatória de 30% adimplida pelos empregadores terão natureza indenizatória. Ressalte-se que os trabalhadores incluídos na suspensão do contrato ou redução de jornada, terão garantia provisória no emprego de 120 dias, referentes ao período de 60 dias da suspensão/redução e o prazo de 60 dias após esse período. 4 LEI Nº 13.982/2020 A Lei nº 13,982, de 02.04.2020, foi a norma instituidora do auxílio emergencial de R$ 600,00, alterando a Lei 8742/1993, para possibilitar um benefício assistencial temporário, num primeiro momento por três meses, já havendo atualmente face a manutenção da pandemia, possibilidade de extensão por mais dois meses. O referido benefício de enfretamento a pandemia não requer a qualidade de segurado por parte dos beneficiários, podendo inclusive ser estendido para autônomos e microempreendedores individuais que se encontram impossibilitados de desenvolver suas atividades. Ponto que merece destaque é a possibilidade de acréscimo de mais R$ 600,00, totalizando R$ 1200,00 quando a mulher é a chefe de família, visando a garantia da subsistência daquela família monoparental.

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A lei estabeleceu cinco os requisitos cumulativos, para a percepção do auxílio emergencial, razão pela qual há a necessidade de todos serem preenchidos e uma condição, dentre três possíveis, quais sejam: I - seja maior de 18 (dezoito) anos de idade, salvo no caso de mães adolescentes; (Redação dada pela Lei nº 13.998, de 2020) II - não tenha emprego formal ativo; III - não seja titular de benefício previdenciário ou assistencial ou beneficiário do seguro-desemprego ou de programa de transferência de renda federal, ressalvado, nos termos dos §§ 1º e 2º, o Bolsa Família; IV - cuja renda familiar mensal per capita seja de até 1/2 (meio) salário-mínimo ou a renda familiar mensal total seja de até 3 (três) salários mínimos; V - que, no ano de 2018, não tenha recebido rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70 (vinte e oito mil, quinhentos e cinquenta e nove reais e setenta centavos); e VI - que exerça atividade na condição de: a) microempreendedor individual (MEI); b) contribuinte individual do Regime Geral de Previdência Social que contribua na forma do caput ou do inciso I do § 2º do art. 21 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991; ou c) trabalhador informal, seja empregado, autônomo ou desempregado, de qualquer natureza, inclusive o intermitente inativo, inscrito no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) até 20 de março de 2020, ou que, nos termos de autodeclaração, cumpra o requisito do inciso IV.

Cumpre-se destacar que a emenda de redação do Senado Federal incluiu expressamente o trabalhador celetista com contrato de trabalho da modalidade intermitente, desde que se encontre inativo, tendo em vista os milhares de profissionais sob essa modalidade de contratação que se encontram impossibilitados do desenvolvimento de suas atividades profissionais e, por via de consequência, estão sem qualquer remuneração. Para aferição do cumprimento dos requisitos os solicitantes do auxílio não necessitam de inscrição prévia, como condição de liberação, perante o CADÚNICO ou RGPS, tendo em vista que os trabalhadores informais, como já noticiado em linhas pretéritas, representam mais de 38milhões. Importante salientar que nos termos do art. 833 192, IV e X, do Código de Processo Civil os benefícios emergenciais são impenhoráveis, porquanto se trata de valores destinados ao sustento do beneficiário e de sua família. Nesta esteira o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 318/2020193 , que em seu art. 5º recomenda:

192  Veja mais em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm#:~:text=Todos%20os%20julgamentos%20dos%20%C3%B3rg%C3%A3os,p%C3%BAblicos%20 ou%20do%20Minist%C3%A9rio%20P%C3%BAblico>. Acesso em: 9 jul. 2020. 193 Veja mais em: <https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3308>. Acesso em: 9 jul. 2020.

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Recomenda-se que os magistrados zelem para que os valores recebidos a título de auxílio emergencial previsto na Lei no 13.982/2020 não sejam objeto de penhora, inclusive pelo sistema BacenJud, por se tratar de bem impenhorável nos termos do art. 833, IV e X, do CPC. Parágrafo único. Em havendo bloqueio de valores posteriormente identificados como oriundos de auxílio emergencial, recomenda-se que seja promovido, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, seu desbloqueio, diante de seu caráter alimentar”.

Na prática isso representa que mesmo que a conta do beneficiário esteja com saldo negativo junto ao banco, o que é muito comum neste momento de crise econômica, não poderá a instituição financeira apropriar-se desse valor para a quitação da dívida, face o momento da pandemia e o objetivo a que se destina o auxílio emergencial. O Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região determinou a observância da Resolução 318/2020, tendo em vista que foram rapidamente detectados inúmeros bloqueios via sistema bacenjud, dos auxílios emergenciais, notadamente porque muitos dos beneficiários possuem demandas trabalhistas em seu desfavor. 5 TRABALHO PÓS PANDEMIA O momento é de união da sociedade e dos poderes, legislativo, executivo e judiciário. O momento é para o bom senso, para salvar vidas e empregos e não para palanque político, diante de tanta dificuldade e da ausência de controle da Covid-19. A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (Fecomércio) e a Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas (FCDL) recentemente, publicaram194 uma manifestação dos empresários do Estado do Rio Grande do Norte, do ramo de comércio e serviços, uma nota conjunta informando que 46 mil estabelecimentos fechados no Estado, afetando diretamente 54 mil empregados formais e deixando de ser recolhidos 65% do total de ICMS do Estado. Surgindo, dessa forma, uma grande preocupação que é em não havendo receita da própria através do ICMS como o Estado vai conseguir pagar as contas, notadamente os salários do funcionalismo estadual, que atualmente encontram-se com dois meses não recebidos, por ausência de receita, referentes ao ano de 2018. E importante destacar dois assuntos que preocupam bastante, neste momento de crise, são algumas atividades que estão vivenciando um verdadeiro

194  Veja mais em: <https://agorarn.com.br/edicao_jornal/entidades-listam-prejuizos-e-pedem-reabertura-gradual-do-comercio-no-rn/>. Acesso em: 9 jul. 2020.

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crescimento face ao isolamento social, dentre elas estão os que trabalham com sistema de entrega, principalmente no ramo da alimentação e farmácias, com o crescimento da sua atividade empresarial, fazendo com que a utilização das plataformas digitais ganhem papel especial no ambiente empresarial. Porém, estes profissionais responsáveis diretos pelas citadas entregas também não têm vínculo direto formalizado. Então, verifica-se o crescimento da informalidade no nosso país, o que gera preocupação porque essas pessoas que trabalham dessa forma, recebem um percentual sob aquela entrega realizada. Logo, existe a ausência do vínculo formal, fato que impossibilita os trabalhadores acesso aos benefícios celetistas. O segundo ponto é que neste momento de crise, verifica-se a entrada no mundo digital é um caminho sem retorno. O teletrabalho ganhou adeptos e quebrou paradigmas, visto que muitas empresas estão funcionando totalmente através do trabalho remoto. Já existem robôs, dentro do poder judiciário, realizando diversas atividades. Há também a utilização da inteligência artificial para que sejam proferidas decisões em determinados casos, cujos processos são identificados, com matéria em que já houve um posicionamento claro sobre o tema por uma determinada unidade judiciária. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Como serão as relações de trabalho pós pandemia? Será que as empresas ainda irão gastar valores com a convocação de empregado para a realização de reuniões em sua sede? Será que as empresas ainda irão querer manter 100% dos empregados trabalhando na forma presencial? Será que as empresas irão mudar o comportamento em face dessa pandemia? O consumidor irá continuar comprando por aplicativos com entrega em casa? Acredita-se que muitas práticas adquiridas, ou melhor, impostas pela pandemia chegaram para ficar. A atividade empresarial vai mudar, muitas empresas irão fechar porque será bem mais vantajoso atuar apenas no e-commerce. Imaginar que através do trabalho não presencial, as empresas tiveram grande redução de custos e o aumento da produtividade, mas que se retornará a situação antes da pandemia, com a presença de 100% dos trabalhadores de forma presencial não parece viável. As audiências estão sendo realizadas totalmente à distância, com a utilização das plataformas virtuais com êxito, sem deslocamento de partes, advogados, servidores, testemunhas e magistrados, que inclusive encontram-se em Estados diferentes e, até mesmo fora do Brasil. Destarte, o que já vinha sendo feito de forma eventual, para evitar expedição de carta precatória, está sendo aprimorado, derrubando a pré-concepção de quem acreditava que só seria eficiente se realizadas na forma presencial, agora, com não podem ser realizadas presencialmente nesse momento, várias pessoas

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estão percebendo que essas medidas são interessante e acabam se tornando até bem mais eficientes. O ambiente digital, as novas tecnologias chegaram para ficar, de uma forma que não tem mais retorno para o que era antes. Um exemplo bem simples: antigamente o primeiro contato com telefone celular foi através daqueles aparelhos analógicos, onde, num primeiro momento, havia a cobrança para receber chamadas. Isso mesmo! Pagava-se para receber ligações. Hoje não se vive sem a internet nos celulares, que são computadores portáteis. É viável imaginar o regresso para um aparelho analógico? Ou um aparelho digital sem internet? Da mesma forma isso vai acontecer nas relações do mundo do trabalho. É preciso reconhecer os avanços da MP nº 927, MP nº 936 e da Lei nº 13.982/2020, para o enfrentamento ao momento extraordinário provocado pela pandemia da Covid-19. Mas, as referidas alterações ainda não são suficientes para esse enfretamento, embora representem uma iniciativa.

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REFERÊNCIAS ANTUNES, Ricardo; BRAGA, Ruy. Infoproletários: degradação real do trabalho virtual. São Paulo: Boitempo, 2009a. ANTUNES, Ricardo; BRAGA, Ruy. Os sentidos do trabalho:ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. 2. ed. São Paulo: Boitempo, 2009b. ANTUNES, Ricardo; BRAGA, Ruy. Adeus ao trabalho? ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 12. ed. São Paulo: Cortez, 2007. ANDRADE, Everaldo Gaspar Lopes de. O Direito do Trabalho na filosofia e na teoria social crítica: os sentidos do trabalho subordinado na cultura e no poder das organizações. São Paulo: LTR, 2014 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452, de 1 de maio de 1943. Aprova a consolidação das leis dotrabalho. Lex-coletânea de legislação: edição federal, São Paulo, v. 7, 1943. Suplemento. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. BRASIL. Medida Provisória nº 905, de 11 de novembro de 2019. Institui o Contrato de Trabalho Verde e Amarelo, altera a legislação trabalhista, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 11 nov. 2019. BRASIL. Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020. Dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (Covid-19), e dá outras providências. Diário Oficial da União, 22 mar. 2020a. BRASIL. Medida Provisória nº 936, de 1 de abril de 2020. Institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19), de que trata a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 1 abr. 2020b. BRASIL. Decreto nº 10.316, de 7 de abril de 2020. Regulamenta a Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020, que estabelece medidas excepcionais de proteção social a 128


serem adotadas durante o período de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (Covid-19). Diário Oficial da União, 7 abr. 2020c. DELGADO, Mauricio Godinho. Capitalismo, trabalho e emprego: entre o paradigma da destruição e os caminhos de reconstrução. 2. ed. São Paulo: LTr, 2015. SIGNES, Adrián Todolí. O Mercado de trabalho no século XXI:on-demandeconomy, crowdsourcing e outras formas de descentralização que atomizam o mercado de trabalho. In: LEME, Ana Carolina Reis Paes; RODRIGUES, Bruno Alves; CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende (coord.). Tecnologias disruptivas e a exploração do trabalho humano. São Paulo: LTr, 2017.

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Capítulo 8 PANDEMIA E PREVIDÊNCIA DO SOCIAL NO BRASIL: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Glauber de Lucena Cordeiro195 Sulamita Escarião Nóbrega 196 Maria Rita Bezerra da Silva197 1 INTRODUÇÃO Todos são unânimes em afirmar que o mundo após a eclosão da pandemia de Covid-19 não será mais o mesmo que tínhamos até dezembro de 2019, quando foram notificados os primeiros casos dessa doença, na província de Wuhan, na China. Em um intervalo muito curto de tempo, a civilização passou por uma transformação tão forte e célere em suas vidas quanto foi a disseminação global dessa moléstia. Facilitada pela maior circulação de pessoas de um país para outro, como ocorria até pouco tempo atrás, a moléstia conseguiu se espalhar em todo o planeta, recebendo a configuração de pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 11 de março de 2020. O modo de vida da civilização foi consideravelmente modificado, tendo ela que conviver agora com comportamentos que eram pouco pensados para uma escala planetária. Atitudes como isolamento social, quarentena, utilização de máscaras ao sair de suas residências, dentre outras, eram, até então, relatos de tempos passados (como aconteceu na época da denominada gripe espanhola, em 1918/1920). No máximo, presenciavam-se algumas precauções sanitárias em ocorrências mais recentes de outras pandemias de doenças respiratórias, como a de H1N1, em 2009/2010; mas que não havia atingindo um enorme ponto de contágio e mortes, como está sendo propagada com a Covid-19.

195  Doutor em Direito pela UERJ, Mestre em Ciências Jurídicas pela UFPB, Graduado em Direito pelo UNIPÊ, Professor Adjunto do Curso de Direito da UERN, Professor Titular e Coordenador do Mestrado em Direito do UNIPE, Advogado. E-mail: glauberdelucena@yahoo.com.br 196  Mestranda em Direito no UNIPE. Professora do Curso de Direito do UNIPE. Advogada 197  Acadêmica do sétimo período do Curso de Direito da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte no Campus de Natal, membra do Projeto de Extensão Lives Direito UERN Natal.

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Os governos de cada país, por óbvio, tiveram que desenvolver políticas das mais diversas naturezas para proteger a sua população dos efeitos nocivos que a moléstia propagou por onde passou, bem como de evitar que um mal maior fosse instalado em seu território. Tais ações foram voltadas, em sua maioria, no campo da saúde. Porém, outras tantas ficaram estabelecidas para amenizar suas economias das sequelas nocivas dessa peste. Independente da Nação, foram e ainda são necessárias uma serie de intervenções estatais para conter ou minorar as consequências dessa crise sanitária e econômica causada pelo coronavírus. Tais ações do Poder Público geram gastos e renúncias fiscais que, ao passar desse momento mais abrupto da crise, necessitarão de outras medidas para que o Estado possa sanear os déficits nas suas contas públicas. No Brasil encontraremos a mesma realidade. Apesar do Governo Federal não possuir uma atitude proativa para com as políticas de isolamento social da população (e registre-se que estes autores consideram esse comportamento governamental um erro crasso, que resulta num enorme prejuízo para a saúde da população brasileira); aquele teve que construir uma série de políticas econômicas e sociais para conter a repentina e brusca queda no consumo da população, da atividade financeira do país, e por consequência, na arrecadação de suas receitas. Medidas essas que vão da postergação do vencimento de tributos, passando pela concessão de crédito mais amplo e desburocratizado às empresas, medidas de flexibilização das relações trabalhistas, maiores transferências de recursos para estados-membros e municípios gastarem com ações de saúde, dentre outras. Todas essas ações já impactam e irão impactar consideravelmente nas contas públicas futuras dos entes federativos, no que se refere ao aumento dos gastos estatais; e que, consequentemente, necessitarão de mais políticas de austeridade estatal para o saneamento de seus déficits. Este artigo pretende fazer uma pequena análise do comportamento e impactos da Covid-19 no direito previdenciário brasileiro e quais poderão ser as perspectivas para previdência social pública no país após passada essa pandemia, principalmente levando em conta que tivemos uma Reforma da Previdência, em 2019 (Emenda Constitucional n. 103, de 13 de novembro de 2019), e que muitos estados-membros e municípios brasileiros ainda estavam implementando, ou tentando implementar, as disposições daquela reforma em seus respectivos regimes próprios dos servidores públicos. Trata-se de artigo que tem como base a participação que um dos autores deste arrazoado (Glauber de Lucena Cordeiro) realizou no ciclo de palestras sobre os impactos da pandemia no direito, produzida pelo Curso de Direito da UERN, campus de Natal, em parceria com o Instituto Novo Eleitoral, em 06 de maio de 2020. Naquele instante, o professor estava na companhia dos docentes Herval Sampaio e Carlos Sergio Gurgel, os quais, em somatório com o professor, Sergio Alexandre Braga, coordenam essa obra, tão atual e que abrilhanta, com louvor, a bibliografia do direito potiguar. Desde já, parabeniza-se pela louvável 131


iniciativa, passando-se, neste instante, a iniciar essa pequena contribuição para o debate. 2 PREVIDÊNCIA SOCIAL NO BRASIL: ORGANIZAÇÃO E INFLUÊNCIA DA DEMOGRAFIA EM SEU MODELO Considera-se que um dos principais direitos sociais que foram conquistados a partir do início do século XX neste país foi, sem sombra de dúvidas, a previdência social pública. Motivados pelas mesmas lutas dos trabalhadores europeus em busca de proteções estatais que garantissem a manutenção financeira quando em situações que o impossibilitassem de prover seu próprio sustento pelo trabalho, quando ocorressem situações acidentárias, de doenças, morte, idade, dentre outras; a partir de meados do século XIX198 ; os trabalhadores brasileiros conquistaram, gradativamente, essa política social, de forma nacionalizada, a partir da década de 20 do século passado, com o Decreto-Legislativo nº 4.682/23 (denominada Lei Eloy Chaves), que criou as Caixas de Aposentadorias e Pensões199 . Desde então, outras conquistas no campo previdenciário foram alcançadas, fruto da lutas e reivindicações sindicais para que o trabalhador pudesse ter uma garantia de segurança financeira, caso houvesse um infortúnio em suas vidas ou chegasse o momento em que ele não conseguiria mais trabalhar. A previdência brasileira é contributiva e tem por base um modelo denominado de repartição simples, em que a população ativa contribui para o sustento daqueles inativos. Assim, todos os trabalhadores contribuem com parte de sua remuneração para uma conta única administrada pelo Estado. Caso haja alguma eventualidade ou situação disposta em lei como garantidora de um benefício, o trabalhador irá usufruir daquela renda, já que houve a sua contribuição durante toda sua vida ativa. Esse modelo tem como principais fontes de contribuição, obviamente, não só a do trabalhador, mas do Estado e também das empresas – isso no caso do Regime Geral da Previdência Social (RGPS), porque há outro regime de previdência, denominado de Regime Próprio dos Servidores Públicos (RPSP), cujo financiamento se dá apenas pelos aportes de um ente federativo, do respectivo servidor efetivo estatutário e de alguns inativos do próprio regime previdenciário. Nesses modelos de repartição simples, a questão da demografia populacional influi consideravelmente na administração financeira e atuarial do regime previdenciário. Afinal, se as pessoas estão na ativa, ou seja, trabalhando legalmente, também estarão contribuindo; e como existe uma conta única para recebimento das contri-

198  IBRAHIM, Fabio Zambitte. Curso de direito previdenciário. 17. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2012. p. 46. 199  Outras leis já tinham sido editadas no país com natureza previdenciária anteriormente a Lei Eloy Chaves, mas em função de ter consolidado a base da previdência no Brasil, considera-se como sendo o marco estruturante dessa política social.

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buições e pagamento dos benefícios dos inativos, aquelas exações dos ativos irão manter os benefícios dos inativos. Assim, para que haja um equilíbrio das contas previdenciárias, o número de contribuintes deve ser alto para cobrir as despesas com os inativos, que devem ser uma parcela bem menor da população. Caso haja poucos trabalhadores contribuindo para o regime, uma percentagem de inativos considerado alta, bem como uma maior facilidade em conseguir os benefícios e seus valores serem de grande monta, o sistema previdenciário acumulará déficits e poderá entrar em colapso, por falta de recursos. O Brasil atualmente sofre com essa questão demográfica em seu sistema previdenciário. A taxa de fecundidade do país diminuiu consideravelmente nos últimos tempos (na década de 50 do século anterior, tinha-se uma taxa em torno de 6%; e na década passada estava em um índice de pouco mais de 2%, com projeção de queda para os próximos anos)200 . A proporção de pessoas com mais de 60 anos no país já é de algo em torno de 15% da população, e a estimativa é de que esse percentual irá aumentar brevemente. O reflexo dessa conjuntura é que os gastos com previdência já consomem, segundo estudiosos, algo em torno de 30% dos gastos do governo, se contados os regimes geral e próprio dos servidores públicos201 . Assim, pode-se resumir a influência da demografia na previdência social brasileira da seguinte maneira: se houver mais pessoas trabalhando e, por consequência, contribuindo, ter-se-á entrada de recursos nos cofres previdenciários. Já que houve a diminuição no índice de fecundidade e o aumento da expectativa de vida do povo brasileiro, fazendo com que os inativos estejam recebendo seus benefícios por mais tempo; o gasto governamental com a previdência aumentou e a entrada não corresponde mais ao valor das despesas realizadas202 .

200  CEI, Nena Gerusa; MUNHÓS, José Luiz. Crescimento vegetativo e envelhecimento da população – impacto na previdência social brasileira. Revista Brasileira de Previdência, v. 1, nov. 2012. Disponível em: <http://www.revistabrasileiradeprevidencia.org/revista/edicoes-anteriores/vol-1-novembro-de-2012/crescimento-vegetativo-e-envelhecimento-da-populacao-impacto-na-previdencia-social-brasileira/>. Acesso em: 23 jun. 2020. 201  VARTANIAN, Pedro Raffy; SCARANO, Paulo Rogerio; RODRIGUES, Arthur Felix Monteiro. Fatores que comprometeram a sustentabilidade do regime geral de previdência social brasileiro. Revista Brasileira de Previdência, v. 10, jul./dez. 2019. Disponível em: <http://www. revistabrasileiradeprevidencia.org/wp-content/uploads/2019/07/FATORES-QUE-COMPROMETERAM-A-SUSTENTABILIDADE-DO-REGIME-GERAL-DE-PREVID%C3%8ANCIA-SOCIAL-BRASILEIRO.pdf>. Acesso em: 23 jun. 2020. 202  Diga-se de passagem, que esses não são os únicos problemas que assolam a situação financeira da previdência social atual no pais, incluem-se também: má gestão administrativa na previdência social, a criação de benefícios sem a devida fonte de financiamento para manter sua sustentabilidade, a destinação de recursos da previdência para cobrir outros gastos governamentais, desonerações tributárias concedidas pelos governos sem que houvesse motivo justo, as fraudes na concessão de benefícios, a corrupção, dentre outras.

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Para tentar diminuir os gastos com a previdência social no país, sob a alegação de tentar deixá-la sustentável para os próximos anos, houve a promulgação de uma nova Reforma da Previdência (a terceira após a Constituição de 1988203 ), Emenda Constitucional n. 103, de 13 de novembro de 2019, que modificou consideravelmente as regras de concessão e, principalmente, os cálculos nos valores dos benefícios, tanto do RGPS quanto do RPSP. Tal reforma, segundo suas justificativas, mesmo não sendo a desejada pelo atual Ministro da Economia, Paulo Guedes, conseguiu satisfazer o Governo Federal, em razão de uma perspectiva de economia de R$ 800 bilhões no sistema de seguridade social federal nos próximos dez anos. Também agradou os governos estaduais e municipais, pois a reforma, além de implementar disposições que permitem o aumento das contribuições sociais de seus servidores, abriu caminho para que tais entes pudessem fazer as próprias reformas nos respectivos regimes próprios dos servidores públicos, podendo trazer uma economia de até R$ 55,4 bilhões em até 10 anos. Juntamente com outras medidas legislativas, incluindo as novas regras de aposentadorias dos militares, havia uma estimativa de economizar até R$ 1,308 trilhão em dez anos204 . Essa era a expectativa que os governos possuíam para os seus sistemas de previdência até a chegada da Covid-19 em nosso país. Muitos desses cálculos deverão ser refeitos em razão dos gastos com saúde pública que todos os entes federais estão realizando, e continuarão a fazer por um bom tempo, para minorar os efeitos negativos que a epidemia grou. Nas próximas linhas continuaremos a tecer maiores comentários sobre essa projeção. 3 CRISE GERADA PELA COVID-19 E OS REFLEXOS NAS FINANÇAS DO SISTEMA DE PREVIDÊNCIA SOCIAL NO BRASIL Sem sombra de dúvidas a questão previdenciária toca na vida de qualquer pessoa da população. Afinal, trata-se um dos feixes (se não o único para muitos!) que envolvem o futuro financeiro daquele segurado e de sua família. Assim, qualquer movimento que possa alterar, seja positivamente, seja negativamente (o que é mais comum de ocorrer nos tempos atuais) na forma da concessão de benefícios ou de seu cálculo, tem a capacidade de atrair olhares de determinada camada da população para ela. É certo que muitos governantes quando se encontram em estado de crise ou déficits das contas públicas procuram reduzir os gastos públicos, prioritariamente,

203  As outras foram: Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998 e Emenda Constitucional n. 41, de 19 de dezembro de 2003. 204  BRASIL. Empresa Brasileira de Comunicações – EBC. Governo revisa para R$ 855,7 bi economia com reforma da Previdência. Agência Brasil, 9 dez. 2019. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2019-12/governo-revisa-para-r-8557-bi-economia-com-reforma-da-previdencia>. Acesso em: 23 jun. 2020.

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com medidas que restringem políticas sociais à população. A previdência social é uma delas. Argumentam que tais os gastos são vultuosos para o Estado e que podem ser mais restringidos para que aquele valor economizado possa ser remanejado em direção à outras políticas mais prioritárias naquele instante para o Estado. O que se pode notar é que, a despeito da extrema importância que a previdência social tem para a população, principalmente a mais carente, para muitos governantes e defensores do modelo econômico neoliberal, essa política estatal é considerada de menor prioridade, podendo ser reduzida, para que sobre verbas para serem destinadas em outras práticas governamentais preferenciais. Também ocorre que muitas vezes alguns governos com pretensões obscuras utilizam algum movimento de alteração nos sistemas de previdência social para desviarem o foco da população de outros temas, que talvez, naquele instante, sejam de maior importância da sociedade. Uma espécie de “cortina de fumaça” momentânea, com a utilização de um discurso da necessidade de alteração nas regras previdenciárias para chamar a atenção da grande maioria das camadas sociais, principalmente a mais leiga, desviando do verdadeiro foco central de prioridades da população. Pode-se trazer a seguinte situação: para esconder uma crise política ou administrativa que está ocorrendo, o governante lança um discurso da urgência de modificação das regras previdenciárias, para que a população fique mais interessada nos debates sobre aquela alteração legislativa, e não se preocupe mais com a institucionalização daquela crise que antes tomava conta das discussões sociais. Seja na primeira situação descrita ou nessa segunda relatada, o que se verifica é que muitas vezes o debate sobre a manutenção e sustentabilidade previdência social acaba atraindo a atenção da sociedade, pois como já enfatizado, a previdência se relaciona diretamente com o futuro do segurado e de sua família. Com a questão da pandemia da Covid-19 e da crise sanitária e econômica que o Brasil está enfrentando em função daquela, tem-se uma situação diferenciada. Até a chegada da moléstia no país, muitos estados-membros e municípios estavam com seus esforços voltados na tentativa de implementação das respectivas reformas dos regimes próprios de previdência205 . Alguns deles, como é o caso do Rio Grande do Norte 206, estavam com seus projetos tramitando nos respectivos órgãos legislativos,

205  Apesar da Emenda Constitucional n. 103/19 ter trazido uma série de dispositivos de aplicação imediata aos Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, o seu texto versou principalmente das modificações no Regime Próprio de Previdência dos Servidores da União e no Regime Geral da Previdência Social, que também é administrado por aquele ente. Por força de dispositivos daquela Emenda, como: § 9º, do art. 4º; § 7º, do art. 10; § 4º, do art. 20; dentre outros, foi possibilitado àqueles entes federativos de menor dimensão disciplinar suas reformas nos respectivos regimes próprios de servidores, não se submetendo às mesmas regras previdenciárias impostas aos servidores federais. 206  O projeto de Reforma da Previdência dos servidores do Estado do Rio Grande do Norte foi apresentado pelo Executivo estadual ao respectivo Poder Legislativo em 13 de fevereiro

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enfrentando sérios embates e protestos por parte dos servidores públicos, categoria diretamente atingida pela reforma. Após a descoberta dos primeiros casos de Covid-19 nas suas respectivas regiões, acertadamente tais reformas deixarem de ser prioridade, ficando as mesmas sobrestadas para que as atenções públicas ficassem direcionadas para o combate do novo coronavírus e de seus negativos efeitos econômicos e sociais. Nesse ponto dar-se razão a esses entes federativos que suspenderam as tramitações de suas reformas e foram cuidar da população. Mas, tão logo o clímax da pandemia tenha sido atingido e o número de casos de contaminação pela Covid-19 diminua ao ponto dos cidadãos ficarem mais aliviado com a pandemia, os governos voltarão suas atenções à tramitação dos seus respectivos projetos, até com maior voracidade para tentar recuperar o “tempo perdido” na sua tramitação. Assim, com o intuito de diminuir os déficits fiscais acumulados no período, bem como tentar reverter o cenário de caótico de gastos realizados pelos governos estaduais e municipais durante o período de enfrentamento da Covid-19, a expectativa desses governos é de retomada da tramitação de suas respectivas reformas previdenciárias tão logo seja possível. 4 MEDIDAS PREVIDENCIÁRIAS ADOTADAS DURANTE NO PERIODO DA COVID-19 NO BRASIL Como ocorreu na imensa maioria dos países, para evitar uma maior propagação da Covid-19 na população, medidas de isolamento social foram implementadas no Brasil. Muitos estados-membros e municípios indicaram (sendo que algumas vezes os governos destes determinaram) que sua população se guardasse em suas residências para que não houvesse uma proliferação maior dos casos da doença. Com o intuito de colaborarem com essas medidas de isolamento social, grande parte das entidades previdenciárias de todas as esferas de governo implementaram algumas políticas previdenciárias para facilitar a vida da população que necessitasse requerer ou manter seus benefícios, bem como proteger a integridade dos servidores públicos lotados naquelas repartições, evitando-se aglomerações e o possível contágio da doença por meio do contato de pessoas contaminadas com outras sãs. Desta feita, a utilização de sistemas e aplicativos da internet, bem como outros meios remotos, como o serviço telefônico para requisição e consulta dos benefícios previdenciários, que já estava sendo utilizado em boa parte dessas entidades previdenciárias, a exemplo do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, tiveram sua expansão de forma considerável. Com isso, vários serviços dessas entidades puderam ser requeridos pela população sem a necessidade de se dirigirem até aquele órgão

de 2020 (PEC 02/2020), sendo que até a data de feitura desse artigo, o projeto se encontrava tramitando na Comissão Especial criada por aquela Casa Legislativa para sua discussão e debates iniciais.

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público; até mesmo porque, durante esse período da pandemia, as repartições previdenciárias estiveram fechadas. Outra medida previdenciária importante implementada por muitas entidades durante esse período de pandemia foi a dispensa da chamada “prova de vida” dos aposentados e pensionistas207 208 . Como a imensa maioria dos beneficiados que precisam fazer essa prova são idosos, sendo estes uma camada populacional considerada “grupo de risco” da Covid-19, achou-se por bem que eles fossem dispensados de se dirigirem a outros locais fora de suas residências, evitando-se que se expusessem à doença. Talvez a alteração na legislação previdenciária de maior importância nesse período de pandemia foi a trazida pela Lei Federal nº 13.982, de 02 de abril de 2020. Seu art. 4º possibilitou que os segurados do Regime Geral da Previdência Social pudessem gozar de uma antecipação do benefício do auxílio-doença, sem a necessidade de perícia médica a ser realizada pelo INSS, desde que possuam a carência exigida do benefício e juntem em seu requerimento atestado médico que confirme a condição temporária de incapacidade laborativa do beneficiário, nos termos estabelecidos em regulamento próprio. Tal antecipação será por um período de até três meses, no valor de um salário mínimo209 . Com isso, o segurado que necessite do benefício poderá fazer o seu requerimento de auxílio-doença pela internet e juntar atestado emitido por qualquer médico, desde que atenda os padrões estipulados na legislação, e já começar a receber o benefício, na quantia que a lei determinou, sem que espere por uma perícia por parte daquela autarquia previdenciária. Como se trata de uma antecipação do valor do be-

207  A prova de vida, também conhecida como “renovação de senha” ou “fé de vida” consiste na necessidade que alguns beneficiários possuem de regularmente comparecerem ou na própria entidade previdenciária ou no banco onde possuem a conta para recebimento do seu benefício, munidos de suas documentações, para confirmar que estão vivos e poderem continuar a receber suas prestações previdenciárias. 208  Como exemplo de tal medida, cita-se por todos, a Portaria PBPREV n. 08, de 19 de março de 2020, da Paraíba Previdência, entidade previdenciária do regime próprio dos servidores públicos do Estado da Paraíba. 209  Eis o inteiro teor do dispositivo: Art. 4º Fica o INSS autorizado a antecipar 1 (um) salário-mínimo mensal para os requerentes do benefício de auxílio-doença de que trata o art. 59 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, durante o período de 3 (três) meses, a contar da publicação desta Lei, ou até a realização de perícia pela Perícia Médica Federal, o que ocorrer primeiro. Parágrafo único. A antecipação de que trata o caput estará condicionada: I - ao cumprimento da carência exigida para a concessão do benefício de auxílio-doença; II - à apresentação de atestado médico, cujos requisitos e forma de análise serão estabelecidos em ato conjunto da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e do INSS.

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nefício, quando houver a oportunidade de realizar a perícia administrativa que ateste a concessão do mesmo em definitivo, serão pagos retroativamente a diferença entre os valores excedentes aos que já foram pagos, caso o beneficiário faça jus. A antecipação permite que aquele que está impossibilitado de trabalhar tenha uma renda para sustentar a si e a sua família durante o período em que as agências estão fechadas e as perícias mais difíceis de se realizarem. Há de se mencionar, ainda, que a própria Lei nº 13.982/20 estabelece a possibilidade de prorrogação do prazo da referida antecipação (03 meses) por ato do Poder Executivo, enquanto não terminar o período de enfrentamento da Covid-19 (art. 6º). Isso desburocratiza e dá celeridade na extensão dessa medida, caso seja necessário. A referida Lei nº 13.982/20 ainda trouxe dispositivo versando sobre a possibilidade de desoneração das contribuições previdenciárias das empresas, caso algum de seus empregados não venham a trabalhar por ter sido contaminado pela Covid-19. No caso, se o segurado empregado for contaminado e fique sem trabalhar, os quinze primeiros dias de salário, que seriam pagos pelo empregador, poderão ser deduzidos no valor das contribuições deste ao sistema previdenciário, até o limite do teto de contribuição do RGPS. Com isso, as empresas, ou àqueles equiparados por lei a elas, terão um pequeno alívio financeiro, caso algum empregado seu seja contaminado pela doença e não venha a exercer suas atividades laborativas (art. 5º) 210. Algumas outras ações previdenciárias foram adotadas pelas entidades de previdência dos servidores públicos para facilitar o acesso do segurado aos seus benefícios nesse período, evitando que as pessoas tenham de sair de suas casas durante esse período de pandemia. Exemplo disso, e parecido com o que foi comentado sobre a Lei Federal nº 13.982/20, é a dispensa de perícia médica para a concessão e convalidação de benefícios, concedendo-se antecipadamente o seu valor; bem como processos de readaptação de função; dentre outros211 . Todas essas medidas de caráter excepcional são necessárias para dar tranquilidade aos segurados previdenciários, bem como àqueles que fazem parte das repartições públicas que atuam nessa área. Quanto mais o Estado possa resguardar sua população dos efeitos negativos da propagação da moléstia, seja no âmbito sanitário ou no econômico, ele estará cumprindo com o seu papel de entidade promotora do bem-estar coletivo.

210  Eis o inteiro teor do dispositivo: Art. 5º A empresa poderá deduzir do repasse das contribuições à previdência social, observado o limite máximo do salário de contribuição ao RGPS, o valor devido, nos termos do § 3º do art. 60 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, ao segurado empregado cuja incapacidade temporária para o trabalho seja comprovadamente decorrente de sua contaminação pelo coronavírus (Covid-19). 211  Por todos esses exemplos, cita-se a Portaria NATALPREV n. 08, de 18 de março de 2020, que é entidade previdenciária dos servidores públicos do município de Natal - RN.

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Porém, há de se falar que todas essas medidas auxiliadoras do combate à pandemia vão custar caro não só para os cofres das previdências públicas do país, mas para as finanças estatais, como um todo. Os tesouros dos entes federativos brasileiros não estavam em situação confortável antes da doença, sendo que muitos já apresentavam conjuntura uma caótica. Com a necessidade de gastos em saúde, assistência social e em outras áreas direta ou indiretamente voltadas à luta contra a Covid-19, as estimativas futuras para as finanças públicas são muito negativas, o que vai necessitar ainda mais políticas de austeridade econômicas pelo Estado, gerando mais sacrifícios da população. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este texto apresentou um pequeno panorama do comportamento da previdência social durante o período de pandemia no Brasil. Como visto, os regimes previdenciários baseados no modelo de repartição simples, como é o nosso, precisa de uma série de fatores para se manterem sustentáveis, como os de natureza demográfica, além da necessidade de se ter um número considerável de pessoas contribuindo para o sistema e financiar os benefícios dos inativos. Com o cenário de crise econômica já identificada pelo avanço da Cobvi-19 no país, que está gerando uma grande quantidade de desempregados em função da redução drástica da capacidade produtiva das empresas, ou o fechamento de muitas delas; menos receitas serão observadas nos cofres governamentais. Por consequência, a arrecadação previdenciária ficará muito aquém do que se planejava para antes da pandemia, sendo que o quantitativo de novos benefícios supostamente não será reduzindo. Pelo contrário! Isso abrirá um déficit maior nas contas previdenciárias, que poderá vir a afetar a concessão e manutenção dos atuais e futuros benefícios. Nos regimes próprios de previdência a situação poderá ser mais grave, pois os entes federativos estão realizando vultuosos gastos na prevenção da população contra a moléstia e no tratamento daqueles já adoentados. O problema se agrava em função da retração da economia que faz as arrecadações serem consideravelmente menores que em outros períodos. Diante dessa conjuntura negativa para o país e da expectativa de não se ter um horizonte econômico melhor a curto e médio prazo, será muito provável que novas alterações na legislação previdenciária sejam realizadas para conter os déficits atuais e futuros. À primeira vista presume-se que quando a situação da epidemia de Covid-19 estiver mais controlada, os entes federativos que ainda não realizaram as respectivas reformas irão enviar os seus respectivos projetos ou dar encaminhamento mais célere aos que já estão tramitando nas Casas Legislativas. Também se espera que alguns desses projetos que poderiam ser considerados mais suaves aos servidores do que aqueles estabelecidos aos do serviço público federal pela Emenda Constitucional n. 103/19, tenham modificações para torná-los mais 139


rígidos na concessão dos benefícios ou nos seus valores. Acredita-se, ainda, que possam ser modificadas as alíquotas das contribuições previdenciárias para maior, não só dos regimes próprios, mas principalmente, nas contribuições das empresas para o regime geral da previdência social. Tal medida, caso venha a acontecer, ao invés de trazer um alívio nas contas públicas, com o aumento de arrecadação previdenciária, poderá trazer um revés pior para o setor produtivo, já que a carga tributária ficará maior, e isso pode gerar desestimulo nas empresas em atuarem nos mercados, gerando ainda mais efeitos econômicos negativos. Mesmo já tendo havido consideráveis modificações nos cálculos e concessão dos benefícios do RGPS pela Reforma da Previdência, em 2019, não será surpresa que novas modificações nas legislações infraconstitucionais previdenciárias sejam realizadas para dificultar a concessão de novos benefícios os segurados. Todas essas medidas podem ser esperadas para um futuro próximo para tentar amenizar a situação de grave crise econômica que será enfrentada pelo Estado brasileiro no porvir. As finanças da previdência social por muito tempo sofrerão as consequências negativas da pandemia, pois a queda na arrecadação estatal será muito alta, e os custos com os benefícios serão aumentados, em especial no que se refere ao número de pensões, em funções das mais de cinquenta mil mortes que o Brasil teve até a data de finalização deste artigo. E por falar nessas tantas vidas já perdidas, os autores deste artigo transmitem os sinceros votos de solidariedade a todas as famílias vitimadas pela Covid-19 e pela desatenção dos governantes em cuidar da população nesse período.

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Referências: BRASIL. Empresa Brasileira de Comunicações – EBC. Governo revisa para R$ 855,7 bi economia com reforma da Previdência. Agência Brasil, 9 dez. 2019. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2019-12/governo-revisa-para-r-8557-bi-economia-com-reforma-da-previdencia>. Acesso em: 23 jun. 2020. BRASIL. Lei n. 13.982, de 02 de abril de 2020. Altera a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, para dispor sobre parâmetros adicionais de caracterização da situação de vulnerabilidade social para fins de elegibilidade ao benefício de prestação continuada (BPC), e estabelece medidas excepcionais de proteção social a serem adotadas durante o período de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (Covid-19) responsável pelo surto de 2019, a que se refere a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2 abr. 2020. Seção 1 – Extra. CEI, Nena Gerusa; MUNHÓS, José Luiz. Crescimento vegetativo e envelhecimento da população – impacto na previdência social brasileira. Revista Brasileira de Previdência, v. 1, nov. 2012. Disponível em: <http://www.revistabrasileiradeprevidencia.org/revista/edicoes-anteriores/vol-1-novembro-de-2012/crescimento-vegetativo-e-envelhecimento-da-populacao-impacto-na-previdencia-social-brasileira/>. Acesso em: 23 jun. 2020. IBRAHIM, Fabio Zambitte. Curso de direito previdenciário. 17. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2012. PARAIBA (Estado). Paraíba Previdenciária – PBPREV. Portaria PBPREV n. 08, de 19 de março de 2020. Diário Oficial do Estado, João Pessoa, PB, 20 mar. 2020. Seção 1. NATAL (Cidade). Instituto de Previdência Social dos Servidores do Município de Natal - NATALPREV. Portaria NATALPREV n. 08, de 18 de março de 2020. Diário Oficial do Município, Natal, RN, 19 mar. 2020. Seção 1. VARTANIAN, Pedro Raffy; SCARANO, Paulo Rogerio; RODRIGUES, Arthur Felix Monteiro. Fatores que comprometeram a sustentabilidade do regime geral de previdência social brasileiro. Revista Brasileira de Previdência, v. 10, jul./dez. 2019. Disponível em: <http://www.revistabrasileiradeprevidencia.org/wp-content/uploads/2019/07/FATORES-QUE-COMPROMETERAM-A-SUSTENTABILIDADE-DO-REGIME-GERAL-DE-PREVID%C3%8ANCIA-SOCIAL-BRASILEIRO.pdf>. Acesso em: 23 jun 2020. 141


Capítulo 9 ELEIÇÕES EM TEMPOS DE PANDEMIA: ALGUMAS INDAGAÇÕES E REFLEXÕES SOBRE A TEMÁTICA DISSOCIADA DA POLARIZAÇÃO E DOS INTERESSES NÃO REPUBLICANOS José Herval Sampaio Júnior212 Karla de Souza Leal 213 1 INTRODUÇÃO Temos algumas perguntas a fazer acerca desse tema no dia de hoje, como: A eleição será adiada? Qual será então a data se adiar? Há justificativa desse adiamento? Todos estes questionamentos fazem parte de uma resposta que poderíamos chamar de dinâmica, e não temos ainda como tirar uma posição mais consolidada, justamente porque a resposta precisa depende da própria evolução da pandemia. Se nós formos analisar o momento de feitura do texto, realmente a eleição está acontecendo com o calendário eleitoral rigorosamente em dia e em pleno vigor, devidamente adaptado as peculiaridades da pandemia, com os prazos

212 Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Paraná, Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (2007), Professor da pós-eleitoral da Faculdade Baiana de Direito, Professor da Escola Superior da Magistratura do Estado do Rio Grande do Norte, professor de pós graduação da Universidade Potiguar, Professor da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Ex-Diretor do Fórum comarca Mossoró Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, juiz de direito - Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte. Atualmente, preside a AMARN (Associação dos Magistrados do Estado do Rio Grande do Norte) e é Vice-Presidente de Integração da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros). Membro fundador do Instituto Novo Eleitoral. Ex- Juiz de Direito do TJBA 213  Discente da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, no 7° período do curso de direito, atual extensionista do projeto Lives Direito UERN Natal, participante do projeto Debate, café e Cinema, estagiária na Procuradoria Geral do Município de Natal.

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sendo cumpridos e a Justiça não parou em nenhum momento, tendo cumprido todo esse calendário. Entretanto, convidamos os leitores para entender toda essa polêmica do ponto de vista dinâmico, a partir do que foi decidido no último dia 6 de maio de 2020, em que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), através da ministra Rosa Weber criou um grupo de trabalho, exatamente para monitorar e estudar de modo criterioso, compilando os dados e ao mesmo tempo avaliando as condições materiais em que eventualmente a realização do pleito marcado para outubro poderá ou não acontecer, fato que também está seguindo a mesma toada pelo atual Presidente do TSE, que mesmo sinalizando a possível mudança, sempre pondera que essa decisão é do Congresso Nacional.214 2 PARTICULARIDADE DO PROCESSO ELEITORAL EM TEMPOS DE PANDEMIA A particularidade de todo esse processo é muito mais fática, pelo menos num primeiro momento, do que jurídica e reside justamente na observação, que deve ser diária, ou seja, da evolução e a involução dos casos, mortes e a questão dos demais parâmetros das autoridades sanitárias e médicas, e como a eleição é nacional, sequer se poder falar em peculiaridades de alguns locais da pandemia do novo coronavírus, e tudo também está sendo monitorado pela Justiça Eleitoral215. Portanto, utilizando uma expressão popular, a Justiça “está dançando conforme a música”. Eu diria que a música não parou, mas não é hora de cancelar, não é hora de adiar a eleição. Particularmente, até acho que a eleição será adiada e quando esse texto estiver sendo publicado, talvez já tenha sido, mas a questão já será outra 216. O que é necessário cumprir até hoje e tudo rigorosa-

214  Vimos que a mudança para o dia 15 de novembro foi feita pelo Congresso Nacional e levando em consideração, tão somente, a peculiaridade da pandemia, não tendo a Emenda Constitucional 107 tratado de outra matéria, logo a situação é bem tópica e não deve influenciar os demais processos eleitorais vindouros, ressaltando, apenas a questão do uso das tecnologias, na qual não se deve abandonar no futuro. 215  A PEC 18 em andamento no Congresso Nacional abre possibilidade bem excepcional e peculiar que alguns Municípios possam ter eleições em dias diferentes justamente pela evolução da pandemia ser setorizada e como a extensão do Brasil é muito grande, alguns locais cessa e outros pioram. 216  De fato, como podemos ver hodiernamente, o sistema eleitoral de 2020 vem apresentando mudanças para a concretização das votações. Aprovada no Senado Federal, a PEC 18 tem como objetivo o adiamento das eleições em 42 dias, mantendo, contudo, os prazos presentes no calendário eleitoral previsto. Dessa forma, todo o procedimento para que o processo de eleições seja realizado não foi estagnado, apenas as datas previstas passou a ser postergada, assim como a data do procedimento de votação nas urnas eleitorais. Então, procedimentos como escolha dos candidatos pelos partidos, propaganda eleitoral, por exemplo, não deixa-

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mente o foi, como, por exemplo, o prazo das transferências e alistamento eleitorais no início de maio, a própria justiça eleitoral que volto a dizer que, ela não para, não parou e não vai parar. A Justiça Eleitoral está encontrando soluções para viabilizar esses prazos. Então, o que nós observamos nas eleições anteriores, infelizmente é comum do brasileiro deixar tudo para última hora formando aquelas filas nos cartórios eleitorais, para fazer essa transferência eleitorais em alguns casos, até existe transferências irregulares, mas isso já de algum modo se antecipou em relação aos pré-candidatos, que desejavam se alistar no domicílio eleitoral, portanto obter uma condição de elegibilidade previstas no Artigo 14 da Constituição Federal, pois se teve, por exemplo, normalmente, até o dia 4 de abril como o prazo final não só para filiação, mas também para se ter domicílio eleitoral e possível transferência, enfim o fechamento do cadastro eleitoral para as eleições que se avizinham, tudo devidamente adaptado no mundo virtual. 3 AS DIFICULDADES DO MOMENTO ELEITORAL DE 2020 A grande dificuldade é realmente a questão do atendimento presencial, a justiça eleitoral deu soluções para isso, permitiu o agendamento e a priorização dos pré-candidatos. Agendamento ou até recebeu documentos via e-mail e ali demonstrando a possibilidade de se fazer o registro eleitoral, alistamento e inscrição dentro do prazo para não prejudicar essa questão de elegibilidade, com esse exemplo afirmamos aqui é que a justiça eleitoral não pode parar e por ela envolver um direito fundamental que é o direito dos cidadãos, que está relacionado a capacidade de votar, mas também de ser votado, ela tem que trabalhar intensamente, dialogando com a Ordem Advogados do Brasil (OAB) e outros setores da sociedade, tudo para encontrar soluções para que o calendário eleitoral continue sendo cumprido à risca e é mesmo o que está acontecendo e continuará acontecendo em relação ao processo como um todo e já se cumpriu em relação a algumas fases anteriores. É óbvio que a medida que mais à frente nos preocupa e a própria Justiça

rão de acontecer, por óbvio, por serem da essência das eleições em si, mas a previsão para o início desses atos, foi adiada para os dias 31 de a agosto e 27 de setembro, respectivamente. É necessário salientar, ainda, a manutenção de todos os atos já realizados, ficando, em tese, alterados, apenas os atos eleitorais futuros. Com a PEC 18, o TSE, em caso de eleições dos municipios, tem possibilidade de adaptar para deixar de realizar as eleições na data postergarda (15 de novembro). A PEC dependerá da aprovação da Câmara dos Deputados para ser publicada, todavia, tal medida procura harmonizar todo o sistema eleitoral. Aqui dois vídeos de um dos autores sobre a referida PEC https://www.youtube.com/watch?v=TAT8g_blE-A e https:// www.youtube.com/watch?v=TAT8g_blE-A

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Eleitoral já encontrou a solução, é a questão das convenções partidárias , que serão virtuais, na qual naturalmente se tem infelizmente o registro de aglomeração de pessoas ( pré-campanha 217 ) e isso não deveria ocorrer, e a partir do 16 de agosto com a questão da campanha eleitoral e quem faz comícios e carreatas218 daqui até lá certamente a justiça já terá debatido as questões técnicas e materiais inclusive aliado ao monitoramento da evolução da COVID-19, inclusive as políticas públicas oficiais dos governos Federais, estaduais e municipais e certamente a esta altura teremos uma posição mais definida da Justiça Eleitoral, mas seja no sentido de, provavelmente, adiar para o mês de novembro ou de dezembro, como até já sinalizou no caso o atual Presidente do TSE, Ministro Barroso. É claro que todo o processo eleitoral ele já é realizado, respeitando as regras específicas eleitorais e funcionais, mas também obedecendo outras regras que são aplicadas de maneira subsidiária, por exemplo, o respeito às questões ambientais, mas isso já aconteceu, independente da pandemia, temos regras que já impediu determinada quantidade excessiva de decibéis, o horário respeitando o direito do silêncio, a questão voltada as regras do próprio Detran através do código de trânsito relativos aos adesivos na traseira dos vidros dos carros, então o processo eleitoral, ele já acontecia adaptado à outras regras. Nessa parte, não temos nenhuma novidade! 4 ADAPTAÇÕES NO PLEITO ELEITORAL? A depender da maior ou menor intensidade que o pleito eleitoral possa acontecer com adaptações às novas regras, verifica-se que o direito de reunião para exercício do direito de manifestação serão limitados com as questões íntimas do processo eleitoral, se fosse mantida a data original e até mesmo a data que possivelmente ocorrerá, logo provavelmente teremos eleições com adaptações às novas normas que estão em vigor. Isso é um aspecto que poderia responder uma das perguntas, no sentido

217  Sobre a compreensão do que seja a pré-campanha, vejam a nossa série de textos (doze) nosso site representado aqui pelo último <http://www.novoeleitoral.com/index.php/artigos/ hervalsampaio/1344-aspectos-controvertidos-da-propaganda-antecipada-irregular-para-as-eleicoes-2020-parte-final>. 218  Como todas as datas dos atos eleitorais tiveram mudanças com o adiamento das eleições, a data para o início das campanhas eleitorais também. A propaganda eleitoral, inclusive pela internet, tem como data de início 27 de setembro e no dia 9 de outubro a propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão relativa ao primeiro turno tem sua previsão de início. No que se refere aos comícios e carreatas, nenhuma medida fora emitida, tendo sua permissão garantida até o presente momento, devendo se cumprir, por óbvio, as recomendações sanitárias e médicas, pois a lei eleitoral não permite que se ganhe imunidade para descumprimento de nenhuma outra.

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de viabilizar o processo das novas normas de proteção contra a Covid-19 que podem continuar ou serem atenuadas ou mesmo intensificadas. A equipe de monitoramento do TSE vai decidir se é hora de continuar avançando, se é hora realmente de decidir quando será possível continuar adaptando ou é hora de pensar em realmente adiar, mas a mudança em si é decisão do Congresso Nacional, repita-se. Isso depende da evolução das coisas, o modo de ser das coisas. Amanhã a gente pode ter uma notícia boa, notícia de que tudo regrediu que cada vez mais precisamente isso que aconteceu, ou não, pode acontecer de se estender, intensificar. Então faz vídeo conferências e reuniões. O brasileiro e as eleições podem ser reinventadas na sua forma de fazer, tudo para praticar o processo democrático, este é um aspecto que precisa também ser pensado, contudo o processo eleitoral em si no que tange, por exemplo, a própria campanha tem que ter contato, daí porque se a doença evoluir como vem acontecendo, o adiamento já ocorrido, pode ainda novamente ocorrer, o que demonstra a adaptabilidade que se requer nesse momento peculiar. . A equipe de monitoramento do TSE vai decidir se é hora de continuar avançando, se é hora realmente de decidir quando será possível continuar adaptando ou é hora de pensar em realmente adiar, mas a mudança em si é decisão do Congresso Nacional, repita-se. Isso depende da evolução das coisas, o modo de ser das coisas. Amanhã a gente pode ter uma notícia boa, notícia de que tudo regrediu, que cada vez mais precisamente isso que aconteceu, ou não, pode acontecer de se estender, intensificar. E aí é de acordo com esse cenário que a Justiça Eleitora não tem parado, ela vai adaptar o processo, poderia ser junto, via mecanismo de internet virtual a distância, em tese poderia ser uma dessas novas tecnologias dessa nova realidade que já tá virando aí um costume de todo brasileiro, que tá em isolamento, distanciamento social também inevitável. Claro que tem um ponto crucial aí que seria a questão da campanha em si e o dia da votação, realmente é uma massa de milhões de pessoas no Brasil todo que teriam que se deslocar para no dia da votação, na qual inevitavelmente haverá aglomerações, assim, podemos pensar que esse grupo de trabalho vai levar muito em conta este, como dizer, divisor de águas, porque no dia da votação, auge do processo eleitoral, tanto é que os prazos de desincompatibilização do calendário eleitoral têm como referência referido dia da votação. Então, seis meses antes da eleição para isso ou para aquilo, três meses antes, tantos dias depois da eleição, então é um dia marco realmente para se levar em consideração o adiamento ou não às eleições, que como vimos os líderes partidários começaram a decidir de meados de junho para frente com a intermediação do Presidente do TSE. Portanto, o Congresso Nacional fez a sua parte, até mesmo porque também não parou, esteve em regime virtual e até mesmo alguns parlamentares 146


estiveram presentes nas Casas com plenário virtual, votações estão, claro, ocorrendo e inclusive priorizando os projetos relativos ao combate a pandemia, uma verdadeira operação de guerra mundial, combate ao coronavírus e enfrentaram também a questão das eleições e terão outras batalhas conexas. A Justiça Eleitoral, também, utiliza de todas as possiblidades materiais para continuar trabalhando, com segurança e os devidos cuidados com a saúde de seus servidores e funcionários, buscando a preservação da legitimidade do sufrágio. Existe a necessidade, ainda, dos três Poderes da República atuarem estritamente dentro da harmonia e independência que a Constituição Federal de 1988 estabelece, essa é uma grande oportunidade para que este artigo de fato seja respeitado. Dependendo do que se avance, também em razão disso, isso existe outra peculiaridade que é o princípio da anualidade, preconizado no artigo 16 da Constituição Federal de 1988, ele determina que nenhuma regra do processo eleitoral poderá ser alterada e aplicada dentro de um ano antes da eleição, exatamente para garantir as regras do jogo, para que não sejam alteradas dentro ou às vésperas do pleito eleitoral quando o jogo democrático estiver acontecendo, evitando-se, com isso, a questão do famigerado abuso de poder que as mudanças de vésperas propiciavam.219 Lembramos aqui a lei 13600 de 2006, era o projeto do fim da verticalização, o congresso aprovou e o presidente sancionou dentro do prazo de um ano e o STF foi instado pela OAB a se manifestar sobre isso e na ocasião entenderam que era constitucional, mas com aplicação só para o pleito seguinte porque tem que respeitar esse prazo de um ano antes da eleição. Então, em 2006 tivemos esse precedente e vários outros precedentes em outras situações. Essa é uma questão que o Supremo Tribunal Federal em algum momento, após essa possível PEC aprovando a nova data da eleição, alguém ou alguma instituição poderá provocar o STF a fim de ratificar essa constitucionalidade em confronto ao artigo 16 princípio na anualidade e outros possíveis óbices constitucionais, ou seja, ainda temos esse ponto aí a ser debatido. Agora, desde já, fique claro, situações excepcionais, exigem medidas excepcionais! O Direito Eleitoral não pode fechar os olhos para os fatos sociais presentes no momento atual. Não se trata de uma simples situação, igualmente simples de ser solucionada por completo: estamos frente a um precedente nunca visto depois das grandes guerras mundiais. O isolamento social tem se tornado a ferramenta mais eficaz de contenção do vírus global e expor os cidadãos para que o processo eleitoral aconteça também apresenta problemática, uma vez

219  Sobre a temática indicamos o nosso mais novo livro recém lançado. Veja mais em: <https://www.editorajuspodivm.com.br/abuso-do-poder-nas-eleicoes-triste-realidade-de-politicaagem-brasileira-2020>. Acesso em: 9 ago. 2020.

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que estamos tratando de outro direito fundamental: a saúde pública e a vida de toda uma sociedade. A medida cogitada sobre unificar as eleições prorrogando mandatos prejudica, em tese, a democracia e a República e fere princípios constitucionais, pois os parlamentares que estão com mandato em curso seriam beneficiados, prejudicando os outros que possam concorrer às eleições municipais. A justificativa levantada, para a aplicação de tal medida, seria de que as eleições de cinco em cinco anos (ou quatro em quatro, com coincidência de mandatos municipais, estaduais e nacionais) traria para União uma situação economicamente favorável e um ordenamento ideológico entre os políticos eleitos nas esferas nacionais. Políticos que estão em mandato, a gente já viu isso acontecer na inclusão da reeleição que acabaram sendo beneficiados devido isso acontecer em relação a vários outros aspectos, como o próprio fundo especial de financiamento de campanha. Porque fica parecendo que estão advogando em causa própria, usando um pretexto de interesse público, mas que na verdade é um interesse pessoal, acaba sendo então beneficiado por esta razão. Então a sociedade vai olhar com uma certa desconfiança. Quanto à questão da prorrogação esse debate pode ser feito em um momento mais à frente, para não ficar parecendo um oportunismo, até mesmo porque essa discussão já existia antes independente da pandemia. Ou não existia? A Justiça Eleitoral não pode determinar a destinação de recursos do fundão para o combate a pandemia, nem pode obrigar o Congresso Nacional a fazer isso, porque está dentro da liberdade e autonomia do Congresso Nacional e também do Executivo Federal e que está sendo debatido, mas observamos que deve ser uma pressão, na qual particularmente pensamos ser uma discussão interessante. Será que essa pressão é legítima? Não é legítima? A unificação das eleições traria alguns complicativos, por exemplo, votar de presidente a vereador, deputado estadual, deputado federal, senador (às vezes dois), prefeito e governador. São muitos os candidatos a vereador na eleição. As eleições municipais são muito mais densas de quantidades de candidato a vereador. Então, é um debate que deve ser feito mais à frente e se houver modificação que não seja em causa própria que não atinge os mandatários que seja um ponto de transição para outras eleições e bem programado para que o eleitor possa votar sabendo que quando ele votar, vai votar com o cargo de 5 anos ou de 6 anos. Então, não devemos falar apenas economicamente, claro que se haveria uma grande economia, é verdade, porque você deixaria de ter gastos milionários com eleição municipal, certamente a estrutura montada para uma eleição geral dos vereadores a presidente economizaria, de cada dois anos, só teríamos eleições a cada quatro anos. Muitos além de monetizar o processo eleitoral, o questionamento prin148


cipal a ser feito é se a unificação afetaria a ordem política brasileira, fortificada pela soberania popular e democrática que cada cidadão tem ao colocar seu voto nas urnas eleitorais, ainda que tal ato não seja a única tomada de decisão política do povo, mas sem dúvidas é uma das mais relevantes. A constante apresentação de legitimidade popular que o calendário eleitoral traz não deve ser atacado. O Tribunal Superior Eleitoral começou a se preocupar e lançou a portaria 220 242 para organizar através de grupo de trabalho, e partir deles tivemos várias ações acerca do que será feito nessa eleição municipal, para começar a ter com o aumento dos casos de COVID-19, analisando praticamente dia a dia. A justiça eleitoral está acompanhando tudo isso. Quando é feito uma politização do ponto de vista das emoções, da irracionalidade, das paixões, deixa-se de lado o que pode ser construtivo, o que pode ser enriquecedor no sentido de apontar soluções concretas de ajudar toda sociedade e sair dessa fase e se passa apenas a trocas de acusações num radicalismo exacerbado, muitas vezes o repasse de ambiente para o repasse das chamadas fake News, a sociedade sai dos debates racionais para essas questões apaixonadas. Na arena eleitoral e política é natural que os personagens politizem os principais problemas da sociedade, daquela localidade. Isso não é novidade, quantas eleições municipais já se viu esse tema, vai aparecer, ou seja, a politização dos problemas sociais, e diríamos até que isso é necessário e importante que os pré-candidatos que os partidos políticos debatam estas questões. Ninguém da razão e ninguém tem uma solução pronta, ainda mais para uma situação que jamais aconteceu. Para o debate com troca de farpas, apenas de questões pessoais, deve ser combatido, expurgando-se tais questões, porque em nada contribui para o fortalecimento da democracia. Agora o debate, a politização do ponto de vista dos argumentos jurídicos, dos argumentos técnicos em uma solução coletiva avançado na posição em que se tem a verdade absoluta, mas que as soluções vão sendo construídas gradativamente. Democracia não é o governo de uma só voz, muito pelo contrário, o governo de um país Continental como o nosso é normal que se participe das reuniões, justamente para evitar esse tipo de polarização.

220  A portaria n. 242, de 28 de maio de 2020, objetiva, como o próprio expõe: “Altera o prazo do trabalho remoto dos servidores, empregados públicos, estagiários, colaboradores e prestadores de serviços do Iphan para a mitigação dos riscos decorrentes da doença causada pelo Novo Coronavírus (covid-19) e estabelece suspensão de prazos processuais em tramitação.”

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5 CONCLUSÃO É imprescindível destacar, ainda que já tenha sido discorrido ao longo do presente texto, a instabilidade do momento vivido, e por tal razão, todas as previsões das decisões futuras que podem ser tomadas para solucionar a problemática das eleições de 2020 ficam sob um manto nebuloso e incerto, ou seja, a espera de como caminhará com precisão a solução. Ainda assim, medidas estão sendo apresentadas para que um dos direitos democráticos mais relevantes não sejam suprimidos: as votações eleitorais. A Emenda Constitucional nº 107 aprovada recentemente pelo Congresso Nacional, concretiza as soluções buscadas para que o sistema eleitoral tenha previsão para ser realizado na maior medida possível, ou seja, o adiamento das eleições é a medida mais coerente a ser feita nesse momento, não restando outro meio para solucionar de fato a problemática, mesmo não sendo o ideal, pois equilibra a saúde das pessoas e da própria democracia. Entretanto, é fundamental entender que conforme a pandemia ganhe mais intensidade, se esse for o caso, novas medidas passam a ser essenciais para o enfrentamento e a manutenção da liberdade e dignidade humana presente no regime democrático, garantindo a normalidade e a legitimidade do poder de sufrágio, podendo, no futuro, terem que ser tomadas outras medidas, mas não se fazendo agora exercício de futurologia. Portanto, o assunto do adiamento que teremos da eleição sempre deve ser tratado de forma técnica, longe das paixões e da politicagem que regra geral tem imperado no meio político e pensando no bem da sociedade e da democracia, com eleições seguras, observando-se o protocolo de segurança sanitária e médica, o povo possa escolher legitimamente os seus representantes. Novos dilemas passam a ser enfrentados com a aprovação da referida emenda constitucional. Ainda que o adiamento das eleições fora fruto de fatores externos e muito mais superiores que o exercício regular de mudança de poder, a segurança e estabilidade da democrática oferecida pela preservação regular dos atos eleitorais ganha fragilidade com tais medidas. Nenhuma providência tomada diante da pandemia vivenciada será totalmente acolhida e imune de futuros questionamentos. A Justiça Eleitoral está entre a supressão de dois direitos fundamentais: o direito de liberdade e o direito de saúde pública; e ela vem continuamente tentando equilibrar os dois direitos para que nenhum seja negligenciado, obedecendo, assim, o princípio da proporcionalidade e razoabilidade. O tempo merece análises singulares para que muito além de pensar em soluções econômicas, se pense no bem estar e na concretização de democracia objetivadas nas eleições, tudo devidamente equilibrada com a saúde das pessoas, garantindo-se o bem maior, as nossas vidas.

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REFERÊNCIAS CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. 13. ed. Bauru: Edipro, 2008. COSTA, Adriano Sores da. Instituições do direito eleitoral (…). 3. ed. rev. ampl. e atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2000. MENDONÇA JÚNIOR, Delosmar. Manual de direito eleitoral. Salvador: Juspodivm, 2006. PINHEIRO, Igor Pereira. Condutas vedadas aos agentes públicos em ano eleitoral: aspectos teóricos e práticos. São Paulo: Chiado Editora, 2016. PINTO, Djalma. Direito Eleitoral: Improbidade administrativa e responsabilidade fiscal – Noções gerais. 2. ed. São Paulo: Atlas. 2005. PONTES DIAS JÚNIOR, José Armando. Elegibilidade e moralidade: O direito fundamental à moralidade das candidaturas. Curitiba: Jurúa, 2010. SAMPAIO JÚNIOR, José Herval. Processo constitucional: nova concepção de jurisdição. Rio de Janeiro: Método, 2008. SAMPAIO JÚNIOR, José Herval. Abuso do poder nas eleições: ensaios. Salvador: Juspodvim, 2020. SANTOS, Boaventura de Souza. O discurso e o poder: ensaio sobre a sociologia da retórica jurídica. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1988.

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