Jorge Luis Borges, autor dos tempos

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ao mesmo tempo. Aberto, quanto à forma de exposição, e fechado, quanto ao objeto que impõe sua própria teoria e conceitos. O segundo também tradicionalmente aceito como aberto e fechado. Fechado, quanto à forma que deve estar coordenada pela tensão, intensidade e significação, quando atrai para si um contexto amplo de significados, mas esse alto poder de concentração também aponta para a expansão e a abertura da significação para além da forma, que primeiramente a conformou. Então, tanto o conto como o ensaio são gêneros abertos e fechados. E podem mesclar-se. O conto pode refletir conceitos como o ensaio, o ensaio pode utilizar-se de tensão, intensidade e significação, como o conto. Assim, o mesmo pode ser o outro. À simultaneidade entre o tempo e a atemporalidade, Borges fez corresponder a simultaneidade de leitor e autor, no processo de criação da literatura, e a simultaneidade dos tempos: da linguagem, da escritura, da narrativa, da leitura, e tempo-tema. O leitor é cocriador da literatura, ao lado do autor. A obra, para que exista, precisa da simultaneidade do mesmo e do outro. E os leitores podem, assim como o autor, respeitar o tempo sucessivo da escritura e leitura, ao mesmo tempo que (re)criam as temporalidades e as atemporalidades tematizadas, porque há simultaneidade entre temporalidades e atemporalidades; há simultaneidade entre a palavra e a coisa, entre o mesmo e o outro. A simultaneidade também mantém a obra borgeana aberta a uma vasta gama de leituras e interpretações possíveis, que nunca se esgotarão. Se as interpretações não perdem o elo com o texto do qual partem, elas, no entanto, continuam se desdobrando, tal como o texto. Como falado anteriormente “El concepto de texto definitivo no corresponde sino a la religión o al cansacio”. Tal como o texto nunca definitivo, a leitura também não encontra a ataraxia, pode perseguí-la, mas sabe que não existe essa síntese. Referências ADORNO, Theodor. El ensaio como forma. In: _____. Notas de literatura. Tradução Manuel Sacristán. Barcelona: Ediciones Ariel, 1962. p. 11-36. ARRIGUCCI JUNIOR, Davi. Enigma e comentário: ensaios sobre literatura e experiência. São Paulo: Companhia das letras, 1987. 238p. 62


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