APRESENTAÇÃO
Ao leitor da obra de Jorge Luis Borges (1899-1986) é exigida a vigilância na forma da leitura crítica atenta e a ele é oferecido o espanto, provocador de questionamentos constantes. O escritor, criador de mundo próprio e de uma literatura desafiante em seu tempo, sobretudo na forma de contos, ensaios e poemas, continua provocando leitores ao redor dos mundos, do seu, do nosso... Em um golpe de vista já é possível saber que a obra borgeana é povoada de labirintos, círculos, ruínas, rios, planícies, tigres, espelhos, duelos, subúrbios, cidades, duplos, viagens, heróis, traidores, tempos, jogos, argumentos, tramas, bibliotecas etc. Impossível que o foco seja lançado sobre todos os relevos existentes, esse universo é imenso. O foco, em especial, incidirá sobre o modo como o escritor cria os tempos e as relações entre as várias temporalidades, no tocante a apenas alguns textos. Por se tratar de uma obra literária, fica de antemão estabelecida a necessidade de compreender como os tempos se relacionam no âmbito do texto literário. Ou seja, é preciso saber como o tempo da linguagem, o tempo da escritura, o tempo da narrativa, o tempo como assunto e o tempo da leitura se relacionam entre si, no interior de determinados textos – não são todos os textos que tematizam o tempo, ainda que todos comportem o tempo da linguagem, da escritura e o tempo da leitura –, e quais os problemas que essa relação pode suscitar. Tal é o caso dos ensaios Historia de la eternidad (Borges, 1994a, p. 353-367) e El tiempo y J. W. Dunne (Borges, 1993, p. 24-27), e os contos Aleph (Borges, 1994a, p. 617-628) e El jardín de senderos que se bifurcan (Borges, 1994a, p. 472-480), objetos da abordagem que se fará ao longo dos capítulos. Ao lado do tempo sucessivo da linguagem e da escritura que concatena letras, palavras, frases, raciocínios, obedecendo a uma ordem sucessiva do pensamento e da reflexão, existe o tempo da leitura e o tempo da narrativa que, ao mesmo tempo que obedecem ao tempo sucessivo da linguagem e da escritura, também podem não ser integralmente consoantes à ordem