E&M – 2018.12 – Moçambique no Top da AirBnb em África — Elmano Madail

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moçambique

cowork um segmento que não pára de crescer em Maputo o ‘apagão’ da simo O que se passou, como se resolveu e o que vai mudar Doing business o que ainda nos falta para melhorar no ranking mercado comum Livre circulação ainda é só um sonho africano

Verdadeiro ou falso? A E&M analisa o mercado DezemBRo 2018 • ano 01 • no 09 Preço 200 MZN

dos medicamentos


Sumário 6

Observação

A Ponte A imagem do primeiro dia em que as duas margens de uma mesma cidade se uniram

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Radar

Panorama Economia, Banca, Finanças, Infra-estruturas, Investimento, País

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67 ócio 68 Escape Os encantos da Lagoa doce e salgada do Bilene 70 Gourmet Uma viagem pelas Índias no Moksha 71 Adega O Porto Vintage mais pontuado do ano 72 Agenda Música, livros, filmes 73 Arte Uma reflexão sobre os assentamentos informais 74 Ao volante O luxo do Lexus Ux

Macro

14 ‘O apagão’ A história dos cinco dias sem rede SImo, o que não se contou e o que vai mudar 18 Cowork Um segmento a crescer em Maputo e que está a mudar o mercado dos escritórios

26 nação Medicamentos 26 A saúde não tem preço mas... A E&M olha para o mercado dos fármacos e explica de onde vêm os medicamentos falsos e de baixa qualidade que entram em Moçambique 34 Na voz de... Lukusa Pierre, presidente da Associação Nacional de Farmacêuticos

38 provÍncia Nampula O corredor por onde passa o desenvolvimento que parece estar a chegar... e vem para ficar

44 mercado e FinanÇas Doing Business Moçambique melhorou a sua classificação, pela primeira vez em anos, mas ainda falta muito

48 empresas PME Ipanema A história singular da única indústria de calçado em Moçambique

50 Megafone Marketing O que está a acontecer no mundo das marcas em Moçambique e lá por fora Dezembro 2018

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figura do mÊS

MFF Raquel Nobre, directora-geral da Quideia, organizadora do Maputo Fast Forward

54 sociedade Airbnb Um novo (ou nem tanto assim) fenómeno em crescimento exponencial no país e no continente

60 lÁ fora Espaço Único Africano O que falta para a criação de um espaço de livre circulação de pessoas, bens e capitais em África

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Editorial

Doing Business, subimos mas ainda não o suficiente Iacumba Ali Aiuba

uma das apostas estratégicas de Moçambique, nos últimos tempos, no quadro

da promoção do investimento nacional e estrangeiro é a melhoria do ambiente de negócios, através da aprovação de políticas, reformas e adopção de procedimentos, que visam a simplificação e facilitação dos vários processos para fazer (bons) negócios no país. Em consequência da materialização de algumas novas leis e procedimentos, por parte do Governo de Moçambique, constantes da matriz negociada com a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), que tem por objectivo, a remoção de um conjunto ainda alargado de barreiras ao investimento, foi possível, pela primeira vez em vários anos, melhorar a pontuação no conjunto dos dez indicadores que demonstram a capacidade de um determinado mercado servir como destino de negócios, divulgada recentemente pelo Banco Mundial, através do ranking anual do Doing Business. As reformas nas áreas da electricidade, comércio além-fronteiras e pagamentos de impostos foram determinantes para a subida da economia nacional de três posições, de 138 para 135, num conjunto de 190 países avaliados. Muito recentemente, foi realizado o 43º Conselho Consultivo do Banco de Moçambique em que foram apresentados estudos sobre o crescimento das Zonas Económicas Especiais, versus zonas econónomicas especiais e zonas francas industriais de alguns países africanos, tendo-se concluído que o País tem ainda muitos desafios que requerem coragem e ousadia para puder atrair mais e melhores investimentos estrangeiros (a título de exemplo, a necessidade de disponibilização de terras sem muita burocracia e constrangimentos, o acesso e redução do custo de energia, a facilitação de permissão e visto de trabalho, entre outros procedimentos burocráticos). Estas são também algumas das queixas dos investidores no país que devem continuar a ser melhoradas. Dada a relevância destas matérias, este tema é tratado com alguma profundidade nesta edição, pois ‘quem lê sabe mais’.

Dezembro 2018 • Nº 09 PROPRIEDADE Executive Moçambique DIRECTOR Iacumba Ali Aiuba conselho EDITORIAL Alda Salomão; António Souto; Narciso Matos; Rogério Samo Gudo DIRECTORA EDITORIAL GRUPO EXECUTIVE Ana Filipa Amaro EDITOR EXECUTIVO Pedro Cativelos JORNALISTAS Celso Chambisso; Hermenegildo Langa; Cristina Freire, Elmano Madaíl, Rui Trindade; PAGINAÇÃO José Mundundo FOTOGRAFIA Jay Garrido; Vasco Célio PRODUÇÃO Executive Moçambique PUBLICIDADE Departamento Comercial Ana Antunes (Moçambique) ana.antunes@executive-mozambique. com; iona@iona.pt/contacto@iona.pt (Portugal) ADMINISTRAÇÃO, REDACÇÃO E PUBLICIDADE Executive Moçambique; Rua do Telégrafo, nº 109 – Sala 6, Bairro Polana Cimento, Maputo – Moçambique; Tel.: +258 21 485 652; Tlm.: +258 84 311 9150; geral@executive-mozambique.com DELEGAÇÃO EM LISBOA Rua Filipe Folque, nº 10 J – 2º drtº,1050-113 Lisboa; Tel.:+351 213 813 566; iona@iona.pt IMPRESSÃO E ACABAMENTO Minerva Print - Maputo - Moçambique Tiragem 4 500 exemplares Número de Registo 01/GABINFO-DEPC/2018

Director da revista Economia & Mercado

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Dezembro 2018


sociedade

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Moçambique no top do Airbnb em África O mercado de alojamento temporário está a mudar em todo o mundo e Moçambique não é excepção. Após a especulação desenfreada dos primeiros anos da década, há um novo fenómeno (ou já nem tanto assim) com um crescimento exponencial no país e no continente, amplificado pelo plataforma Airbnb desde que se lançou à conquista de África, a Airbnb, startup tecnológica norte-americana que permite às pessoas pesquisarem, anunciarem e reservarem quartos ou casas inteiras na internet, registou para cima de 130 mil anfitriões (“hosts”) no continente, os quais acolheram mais de 3,5 milhões de visitantes. A maioria dos forasteiros chegou apenas no ano passado, como uma erupção súbita que catapultou, num ápice, sete países africanos para o seio dos territórios onde as dormidas aumentaram, no último ano, mais de cem por cento. De tal modo que, no clube restrito dos dez países que mais cresceram dentro da Airbnb a nível planetário se encontram, além da Nigéria e do Gana, o improvável Moçambique, cuja ocupação via Airbnb aumentou, no primeiro semestre do ano, 136 por cento. A aventura conjunta de Maria Cristina Gouveia e Patrícia Tomás, crismada de Amo Maputo – House & Experience e já com nove casas listadas na plataforma Airbnb, é contribuinte líquida para o êxito moçambicano da startup de viagens sediada em San Francisco, Califórnia. E o inverso também ocorre, porque a relação entre a Airbnb e a Amo Maputo, fundada em Agosto de 2017 por Gouveia e Tomás, tem sido proveitosa para Dezembro 2018

todos: “No Airbnb, os hóspedes avaliam-nos e nós a eles, o que protege os ‘hosts’ de pessoas indesejáveis. E a resposta da Airbnb às nossas dúvidas e solicitações é imediata e focada no problema, porque o objectivo de todos é que tudo corra pelo melhor”, alega Gouveia. Tem corrido. Desde logo, para a Airbnb, cuja estatística é esmagadora: criada em 2008 por três jovens estudantes – Brian Chesky, Joe Gebbia e Nate Blecharczyk –, os quais alugaram, via internet, um quarto na casa partilhada para conseguirem pagar a renda, está hoje presente em 191 países (31 com escritórios) e tem mais de 5 milhões de anúncios de alojamento cobrindo virtualmente o Mundo inteiro, com um número médio de dormidas por noite orçado em mais de dois milhões de hóspedes. Serventia no trabalho e no lazer E esses, no caso da Amo Maputo, são tipicamente “pessoas que vêm a trabalho, viajantes profissionais, por temporadas relativamente curtas. Depois, e principalmente em Agosto e Dezembro, e ainda um bocadinho pela Páscoa, temos os turistas, que vêm visitar Moçambique ou familiares dos expatriados que cá estão mas não têm casa capaz de os acolher a todos”,

informa Patrícia Tomás. Com preços mais acessíveis do que os hotéis e sem as restrições daqueles, as casas da Airbnb são a opção mais interessante, tanto do ponto de vista económico como de acomodação, para os visitantes que dispensam mordomias e tutelas. Segundo dados do primeiro semestre deste ano, a “maioria dos hóspedes que têm ficado nas mais de 1 200 ofertas listadas na Airbnb em Moçambique (casas ou apenas quartos, em proporções iguais) é proveniente de África do Sul, seguida dos EUA e do Reino Unido. Os viajantes internos são o quarto maior grupo”, contabiliza Velma Corcoran, Directora da Airbnb de África do Sul e supervisora da região austral. A experiência de Henrique Granjeia, residente em Moçambique desde 2001 e ligado ao sector bancário, confirma a estatística: com casa de três quartos situada na Ponta do Ouro – a estância balnear mais cobiçada no sul de Moçambique –, os seus hóspedes principais “são de África do Sul, do Botswana, europeus e norte-americanos que se encontram no país ao serviço de multinacionais e das ONG”, diz. Tal como no caso de Granjeia, os viajantes internos africanos são os que melhor aproveitam as vantagens da Airbnb. Embora usada por estrangeiros que vêm

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sociedade à descoberta do continente, ao expandir o leque de opções de estadia para lá dos hotéis e resorts de luxo, o alojamento a preços acessíveis oferecido pela Airbnb alivia alguns padecimentos aos viajantes internos que enfrentam, por toda a África, desafios significativos devido à complexidade processual dos vistos e aos voos dispendiosos. Toque de Midas e trabalhos de Hércules Mas, se bem serve os viajantes, a Airbnb mais apraz aos “hosts”, num conúbio proveitoso para todos. Pelos cálculos de Velma Corcoran, “no continente Africano, os ‘hosts’ já ganharam mais de 400 milhões de dólares desde a fundação da Airbnb”. Alheio às contas dos outros, Granjeia salienta o acréscimo financeiro que a casa na Ponta do Ouro, “ocupada practicamente a tempo inteiro”, proporciona: “A determinada altura, precisei de dinheiro e coloquei a casa na plataforma; passado ano e meio, dá-me mais um ordenado por mês”, diz o bancário que, “se tivesse mais casas para alugar, colocava-as todas no Airbnb”, sublinha. Há quem o faça, dada a soma de rendimentos, o que justifica o crescimento exponencial da oferta listada em Moçambique. No entanto, nem todos conhecem o êxito da Amo Maputo ou de Granjeia; neste negócio, não há lugar ao milagre do mítico Midas, cujo toque converte lixo em ouro. Pelo contrário, o esforço envolvido para alcançar o estatuto de “superhost” – o anfitrião que, reconhecido pela excelência de serviço, se torna mais recomendável na plataforma Airbnb – é, não raro, hercúleo. “Dá resultados, mas também dá muito trabalho”, alerta Granjeia. “É necessário ter um bom empregado, que seja eficiente e de confiança. E a manutenção é fundamental, temos de estar sempre em cima”, refere o único “superhost” da Ponta do Ouro. “Não sei se a concorrência tem os mesmos parâmetros de exigência que nós, tanto do ponto de vista dos serviços oferecidos, como do ponto de vista fiscal e legal”, cogitam Maria Gouveia e Patrícia Tomás, as empresárias que, na área da capital, ostentam o mesmo estatuto que Granjeia e com ele partilham a filosofia do cuidado impoluto. “Temos quatro colaboradores permanentes para manutenção das casas e outros tantos eventuais em caso de necessidade. Porque a qualidade da manutenção – além de ofertas complementares, como guias bilingue da cidade e do que ela tem para usufruir, além de bicicletas disponíveis para excursos sem

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Penthouse em Central Cape Town, um dos muitos destaques do Airbnb, na África do Sul

pressas, por exemplo –, é um requisito fundamental no Airbnb”, dizem. “Fazemos sempre uma vistoria exaustiva no check-in e no check-out dos hóspedes. Nunca facilitamos”. E o reconhecimento dos hóspedes reflecte-se nos encómios ao conforto das casas e à simpatia eficaz das empresárias, que enchem a caixa de comentários da Amo Maputo... Hotelaria de topo ignora concorrência Mas não há bela sem senão, e algumas zonas do globo também começam a não facilitar a vida à Airbnb e respectivos “hosts”. Não obstante, o crescimento exponencial que tem conhecido e o contributo para os cofres municipais de muitas cidades por via da tributação especial aos hóspedes, algumas urbes, como Barcelona, em Espanha, e Berlim, a capital alemã, vedaram as operações à startup californiana. Para não prejudicar sectores já estabelecidos da economia, alegaram. Como a indústria hoteleira. Em África começam a levantar-se algumas vozes nesse sentido, como são os casos da Namíbia e da Tanzânia, onde a plataforma do Airbnb tem enfrentado proble-

130 mil casas É o número de habitações que actualmente estão registadas na plataforma Airbnb no continente africano

Dezembro 2018


Airbnb com crescimento brutal em África... e Moçambique Contactado pela E&M, o Airbnb forneceu dados exclusivos sobre o crescimento do número de chegadas e alojamentos locais disponibilizados na plataforma

Moçambique no ‘top 3’ africano de chegadas

oferta de Alojamentos locais ‘explode’

Em percentagem de crescimento de check-in no sistema no primeiro semestre de 2018

Em milhares de casas registadas no sistema

130

nigéria

213 gana

99

141 moçambique

136

61

costa do marfim

113 argélia

105

28 15

egipto

104 zimbabué

104

Em 2018, Moçambique está no ‘top’ dos mercados africanos com maior crescimento de check-in no Airbnb

2014

2015

2016

2017

2018

191%

É a média de crescimento anual do número de alojamentos incritos no Airbnb em toda a África. Desde 2014, cresceu 766% FONTE AIrbnb

mas de regulamentação e licenciamento. Em Moçambique, essa conversa ocorre ainda em surdina. O entendimento, pelo menos dos hotéis de topo, é o de que há espaço para uma coexistência pacífica. “Temos de definir muito bem o produto de que estamos a falar. Os hotéis de cinco estrelas e o alojamento do Airbnb encontram-se em universos completamente diferentes e nada concorrenciais entre si. No Serena Polana Hotel não oferecemos alojamento apenas, mas antes uma série de serviços com garantia de excelência; oferecemos, no fundo – e é isso que nos move – toda uma experiência”, alega Abhishek Singh Negi, director do hotel de cinco estrelas mais famoso de Maputo. O discurso de Negi encontra eco no director de operações do Grupo VIP Hotels em Moçambique. “Eu próprio sou utilizador da Airbnb, mas estamos falar de segmentos de mercado absolutamente distintos. Quem recorre ao Airbnb é mais o turista mochileiro, que nunca teve a intenção, nem o interesse, de ficar num hotel de cinco estrelas”, afirma Dado Gulamhussen. “As pessoas que recebemos no VIP Grand Hotel Maputo são homens de Dezembro 2018

negócios que não pretendem só um sítio para dormir, mas sim todos os serviços que estão associados, como salas preparadas para reuniões, por exemplo”. Maná turístico Numa retórica convergente com os seus pares de outras latitudes, Negi e Gulamhussen alertam, porém, para a necessidade de regulamentar a nova realidade do mercado: “Porque se nós somos taxados – e não é pouco – não vejo razão para que plataformas como a Airbnb não o sejam também e pela mesma medida”, defende Gulamhussen. Negi concorda. “É necessário regulamentar e não tentar impedir. Porque as pessoas estão mais alertadas para os preços do alojamento, fazem pesquisa antes de viajar, e é uma questão de oportunidade e de gosto”, diz. E, com a lucidez dos homens viajados e atentos às novas tendências, não tem dúvidas de que “fenómenos como o da Airbnb não vão parar. Pelo contrário – vão crescer cada vez mais”, afirma. “Mas vai haver lugar para todos”. E todos vão ser muitos, porque no horizonte da Airbnb o continente africano

constitui uma alavanca poderosa para os negócios do futuro. “Estamos a investir, em África e até 2020, um milhão de dólares em projectos de turismo liderados pelas comunidades”, afirmou Velma Corcoran. Como paradigma desse investimento alocado pela Airbnb, referiu o Africa Travel Summit, conferência que decorreu em Cape Town, África do Sul, e organizada pela startup californiana. Um movimento de antecipação, porque o continente conhecido por ser o fornecedor, há centúrias, das matérias-primas que alimentam as indústrias ocidentais e asiáticas, começa agora a explorar um novo filão entretanto inaugurado: o Turismo. Com a vantagem de ser sustentável, está entre os sectores que mais crescem em África, tendo contribuído com quase 178 mil milhões de dólares (cerca de 8,1%) para o PIB do continente em 2017, de acordo com o Conselho Mundial de Viagens e Turismo. E a tendência é não parar de crescer. Até quando? texto Elmano Madaíl fotografia Jay Garrido

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