A Tarde

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8 BAHIA EDITORA-COORDENADORA

Marlene Lopes EDITOR

Marinaldo Mira

| BAHIA |

XANDO PEREIRA | AG. A TARDE | 30.04.2007

SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 24/12/2007

EDUCAÇÃO

A inauguração de um novo campus em Irecê, prevista para fevereiro, encabeça a pauta de projetos da Uneb para 2008. Orçada em R$ 1,8 milhão, a obra foi bancada pela universidade e pelo governo, através da Superintendência de Construções Administrativas (Sucab).

bahia@grupoatarde.com.br

BARRA ❚ Dizendo estar se sentindo bem, mas ainda cansado devido ao jejum, D. Cappio celebrou missa e concedeu entrevista

Bispo reza e critica políticos EMANUELLA SOMBRA esombra@grupoatarde.com.brl

Na primeira missa celebrada em Barra após receber alta em Petrolina, sábado, D. Luiz Flávio Cappio não apareceu em público. Numa chácara da diocese e afastado do assédio local – só deve reencontrar populares na Missa do Galo, hoje – rezou para sete pessoas, dentre familiares e membros da igreja. Aparentemente recuperado, recebeu A TARDE com a condição de ser fotografado ou dar entrevista somente depois do culto. O dia da internação, relatou, pensou ser o último dos seus 62 anos. Na hora do desmaio, disse lembrar-se de alguém lhe pedindo para respirar fundo, enquanto intercalava momentos de inconsciência e lucidez. Pegando a edição de quinta-feira de A TARDE, em que aparece desacordado numa maca, censurou. "Essa foto fez muita gente sofrer", fazendo menção ao dia em que foi internado, após passar mal em seu 24° dia de jejum, quando o Supremo determinou a continuidade das obras de transposição. Bem-humorado, retrucou sobre os níveis de relevância no fotojornalismo. "Quanto mais feio, melhor, não é isso?" Antes da missa e enquanto conversava, recebeu uma enco-

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O bispo de Barra, D. Luiz Flávio Cappio, criticou o Natal nos dias de hoje, tomado pelo consumismo, segundo ele. Durante a entrevista, o religioso também lamentou a morte de D. Aloísio Lorscheider e elogiou a atuação do religioso à frente da CNBB.

menda um tanto providencial. Um bolo embrulhado em papel, presente da amiga Joana Camandaroba, historiadora conhecida em Barra. Enquanto falava durante a manhã, bebia líquidos, quase sempre água de coco, por recomendações médicas. Também para preservar sua saúde, chegou sem ser visto no sábado, e nem os moradores sabiam de seu paradeiro. O primeiro contato com o São Francisco, na balsa até a cidade de Barra, foi testemunhado por pessoas simples, ribeirinhos locais.

LUIZ TITO | AG. A TARDE

Apesar do ambiente familiar e da solidariedade de alguns moradores, o bispo Cappio se disse um homem de grandes inimigos na cidade margeada pelos rios São Francisco e Grande. Lembrou de quando, certa vez, um vereador local vetou sua sugestão de trazer um médico para a localidade. "Mas se tiver médico aqui, nunca mais vão nos pedir para levá-los a Xique Xique", teria respondido o político. Por lá, a figura do homem considerado um santo é dividida. Para uns, seu lugar deveria ser na capela, enquanto, para outros, a causa é válida, mesmo se sabendo pouquíssimo dos preceitos da transposição. LORSCHEIDER – Durante a pregação, Cappio criticou o Natal dos dias de hoje, comungados no consumismo e em comemorações vazias. O altar foi improvisado na sala-de-estar, dentre móveis simples e uma estante com livros de religião. Depois, concedeu uma coletiva de imprensa no pátio da casa, quando lamentou a morte do cardeal Aloísio Lorscheider, para quem tinha "um profundo respeito pelo serviço prestado à CNBB nos seus tempos áureos, em que ela assumia no Brasil uma posição protética, em favor dos pobres". Garantiu estar bem, mas cansado, devido ao jejum.

O bispo D. Cappio, na companhia de outros religiosos, conversa com uma criança antes da entrevista coletiva

“Jaques Wagner é menino de recados” Dom Luiz Flávio Cappio | Bispo de Barra

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QUEM É | Paulista de Guaratinguetá, Luiz Flávio Cappio, 61 anos, é bispo de Barra desde 1997. De família rica, optou pelo sacerdócio, ainda jovem, tornando-se padre franciscano e estudando teologia em Petrópolis (RJ). Foi ordenado em 1974.

rjacobina@grupoatarde.com.br FERNANDO VIVAS | AG. ATARDE

N

AT | E como o senhor avalia o posicionamento do governador Jaques Wagner? LFC | Jaques Wagner é menino de recados do presidente, sempre o interlocutor de Inácio da Silva. Quando estava no meu 11º dia de jejum em Cabrobró, da primeira vez, ele chegou – era o então ministro Wagner – e, depois de cinco horas e meia trancados numa capelinha, conseguimos chegar num acordo. Naquele momento, Luiz Inácio leu por telefone o teor do acordo, e respondeu que dava sua chancela. A partir daí, nós abolimos o primeiro jejum. Nos dois anos, de lá pra cá, tentamos de todas as maneiras dialogar, protocolamos junto ao Planalto o pedido de reabertura da discussão e a resposta foi o início das obras. Na campanha política para o governo do Estado, eu disse pra Wagner: “Olha, o senhor era o ministro do presidente, agora o senhor é candidato a ser governador

cas que foram até determinado momento, depois pararam pelo meio. A obra vai enquanto tiver dinheiro, e isso não vai demorar muito tempo. A transposição ainda não é um projeto de conhecimento popular, enquanto a CPMF, por exemplo, é um problema do Brasil inteiro, então há uma pressão nacional.

dos baianos, seu papel é outro.” Eu diria que a grande maioria da bancada do PT, com honrosas exceções, age sem querer melindrar o presidente. AT | E quanto ao ministro Geddel Vieira Lima ? LFC | Gostaria de alertar o presidente para que ele tenha mais cuidado na escolha dos ministros, pois, para uma pasta tão importante, que é a de Integração Nacional, é preciso um homem idôneo, capaz, conseqüente. Pelo menos, educado, de trato, que saiba se relacionar. No momento em que Geddel tomou posse, disse em alto e bom som ser contrário à transposição. Mas quando tomou a pasta, disse que ela teria de ser feita – palavras textuais – a ferro e a fogo. Quando questionaram, disse não conhecer antes o projeto. Ora, se não conhecia, como poderia ser contrário? AT | O povo ainda acha que Lula é o melhor presidente . O povo é mal informado ou Lula está fazendo uma boa gestão? LFC | Boa parte do nosso povo é pobre, para não dizer miserável. E quando chega o presidente que dá esmola, todo mundo corre atrás. Eu nunca me esqueço do discurso inaugural, quando ele lançou o Fome Zero. Chorando de emoção, eu fui para a capela e agradeci. Mas pensávamos que o projeto fosse funcionar através de políticas públicas que garantissem ao povo miserável dignidade, não esmola. E esse projeto social transformou o povo em esmolé. AT | Qual o sentimento hoje, já que o objetivo não foi alcançado? Valeu? LFC | Não diria isso. Eu diria que a luta tem várias etapas. Num diálogo, para que ele não seja monó-

AT | Teme alguma reprimenda do Vaticano? LFC | O posicionamento da CNBB foi um divisor de águas, transformou a causa do Dom Luiz na deles. Mas, claro, há alguns bispos contrários, e eu respeito. Recebi uma carta do Vaticano insistindo firmemente que eles me queriam vivo, pedindo para eu cuidar do meu povo e realizar meu trabalho. Nunca recebi reprimenda, mas sentimento de respeito.

logo, ambas as partes têm de ceder. Meu princípio foi sempre o diálogo e, se for necessário que a gente recue, a gente recua. Eu me preocupo seriamente com o Estado de Direito da nação brasileira. Quando a gente vê um Poder Executivo que tem debaixo do seu braço esquerdo o Poder Legislativo, debaixo do seu braço direito o Poder Judiciário e, nas mãos, a mídia – que é o quarto poder – isso pra mim é um governo totalitário. O projeto de transposição está sendo realizado pelo Exército Brasileiro. Cabrobró parece um parque de guerra. A mídia nacio-

Ministro e governador rebatem as declarações RONALDO JACOBINA

o pátio de uma chácara da Diocese de Barra, acompanhado por familiares e padres da região, dom Luiz Cappio recebeu a imprensa numa coletiva, na qual esteve presente a repórter Emanuella Sombra, de A TARDE, e fez duras críticas a Lula e aos políticos baianos. Sem sinais aparentes de fraqueza física, bebendo bastante água-de-coco, o bispo fez questão de trocar a roupa que usava (calça jeans e camisa pólo) por um traje franciscano na hora das fotos.

A TARDE | O senhor diz que a luta não parou. Como é que vai ser daqui por diante? LUIZ FLÁVIO CAPPIO | Nós estamos no governo do Inácio da Silva, porque o Lula infelizmente morreu. O Lula era a grande esperança da nação brasileira e, durante toda a minha vida de militante, eu vesti a sua camisa, lutei a minha vida inteira para vê-lo sentado onde ele está agora. O problema é que, durante o seu governo, os movimentos sociais foram totalmente marginalizados. Ele se esqueceu que surgiu como líder político sindical e que foram os movimentos sociais que o colocaram onde ele está. Quando eu fui pra Sobradinho, depois de tantas tentativas de estabelecer um diálogo, foi o momento de os movimentos sociais se unirem, para se devolver a esperança de novos dias.

POLÊMICA ❚

nal está totalmente dependente, só começou a noticiar após a pressão da mídia internacional, com exceção dos jornais (impressos), que são veículos de comunicação de elite no Brasil, pois o povo não lê jornal. Então, se esse gesto nosso teve a capacidade de trazer à tona essa realidade nacional, só por isso valeu. AT | Quanto às obras, o senhor acha que elas irão continuar? LFC | Essa transposição não vai acontecer, é totalmente inviável. Temos experiências na história recente do Brasil de obras faraôni-

“Nós estamos no governo do Inácio da Silva, porque o Lula infelizmente morreu. O Lula era a grande esperança da nação brasileira e, durante toda a minha vida de militante, eu vesti a sua camisa”

AT | O que achou de alguns veículos insinuarem que o senhor estava burlando a greve? LFC | Eu mandei dizer às pessoas que fizeram estas matérias uma coisa: se eu quisesse comer escondido, não seria melancia, mas uma fatia de pizza, um bode assado. Esse pessoal tem uma falta de criatividade danada. Da mesma forma que se esconde uma melancia, se esconde um bife. AT | Repetindo alguns diagnósticos de seus opositores, acha que a greve de fome vira moda? LFC | Quando estava fazendo greve de fome, Antony Garotinho me ligou, e eu lhe disse: “Garotinho, eu sou muito solidário à sua pessoa, mas não à sua luta. Esse tipo de coisa a gente faz por uma grande causa, que envolve milhões de pessoas. O que o senhor está fazendo é em defesa própria, vão ficar sozinhos o senhor e sua esposa. Isso vai cair no ridículo, vai ser piada nacional”, e foi o que aconteceu. O presidente diz que vai ser moda, mas não vai não. AT| ComoéretornaraBarra,depois de 24 dias de jejum e de um desfecho desfavorável? LFC | É como retornar ao lar materno, e eu jamais deixaria de passar o Natal com meu povo.

O ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, recebeu com bom humor as declarações do bispo de Barra, dom Luiz Flávio Cappio, que o chamou de mal-educado. De forma polida, Geddel afirmou ser um “homem de concórdia e do entendimento“ e que deverá procurar dom Cappio em breve para discutir uma forma de ele (o bispo) contribuir com o projeto de transposição. “Quero ver com ele qual a melhor maneira de ele nos ajudar a concretizar este projeto que é importante para a Bahia e para o Brasil“, disse. Geddel afirmou ainda que não tem nenhum problema pessoal com o bispo de Barra. “Ele pode me agredir do jeito que for que estarei sempre humildemente pronto para ouvi-lo“, disse. O ministro ressaltou que recebe estes comentários de forma muito tranqüila, mas que irá procurar melhorar as suas falhas. SUCINTO – O governador Jaques Wagner, que está descansando numa fazenda, respondeu, por sua assessoria de Comunicação, às declarações de dom Cappio de forma sucinta e preferiu não comentar alguns dos pontos das afirmações do bispo, como o fato de tê-lo chamado de menino de recado do presidente Lula. “O governador não vai comentar isso“, disse o secretário de Comunicação, Robinson Almeida. Com relação às críticas do bispo de que Wagner teria se aproveitado do fim da sua primeira greve de fome para buscar o apoio da região oeste na sua campanha, o governador afirmou que sempre teve a mesma posição sobre o projeto de transposição do Rio São Francisco. “Disputei e ganhei a eleição compartilhando da mesma opinião do presidente da República“, disse Wagner. O governador reiterou a sua posição sobre o projeto afirmando que “tanto eu, quanto o presidente Luis Inácio Lula da Silva, somos favoráveis à integração das bacias“, disse. Wagner disse ainda que ”é um exagero do bispo achar que a única verdade absoluta sobre esse tema é a dele“.


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