Muito

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Avesso ao mundo das celebridades, Wagner Moura fala de cinema, polテュtica e mテコsica

ANTI-HERテ的

DOMINGO, 16 DE MAIO DE 2010 #111 REVISTA SEMANAL DO GRUPO A TARDE

44 SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 45


2

SALVADOR DOMINGO

16/5/2010

SALVADOR DOMINGO

CARTUM CAU GOMEZ caugomez@atarde.com.br

+ COMPORTAMENTO

+ ARTES + CULTURA DIGITAL

+ LITERATURA

= 2+

2+, todo dia no

seu jornal A TARDE.

B

em-articulado, o baiano Wagner Moura é hoje um dos mais expressivos e talentosos atores da sua geração. Famoso, após protagonizar novelas na Rede Globo e o sucesso do Capitão Nascimento em Tropa de Elite, ele é completamente avesso ao supermercado de imagens da vida privada que circunda boa parte das celebridades brasileiras. Não tem opinião sobre tudo, mas se posiciona quando considera que o tema é importante, como as eleições. Após uma intensa experiência com a montagem da peça Hamlet, está completamente voltado para o cinema. Filmou Tropa de Elite 2 e ainda fará mais dois longas este ano, O Homem do Futuro e A Cadeira do Pai. Antes, faz turnê musical com a banda Sua Mãe. De perto, Wagner Moura é um homem comum. Nadja Vladi, editora-coordenadora

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CARTUM CAU GOMEZ caugomez@atarde.com.br

+ COMPORTAMENTO

+ ARTES + CULTURA DIGITAL

+ LITERATURA

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2+, todo dia no

seu jornal A TARDE.

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em-articulado, o baiano Wagner Moura é hoje um dos mais expressivos e talentosos atores da sua geração. Famoso, após protagonizar novelas na Rede Globo e o sucesso do Capitão Nascimento em Tropa de Elite, ele é completamente avesso ao supermercado de imagens da vida privada que circunda boa parte das celebridades brasileiras. Não tem opinião sobre tudo, mas se posiciona quando considera que o tema é importante, como as eleições. Após uma intensa experiência com a montagem da peça Hamlet, está completamente voltado para o cinema. Filmou Tropa de Elite 2 e ainda fará mais dois longas este ano, O Homem do Futuro e A Cadeira do Pai. Antes, faz turnê musical com a banda Sua Mãe. De perto, Wagner Moura é um homem comum. Nadja Vladi, editora-coordenadora

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ÍNDICE

16.5.2010

DIVULGAÇÃO

ABRE ASPAS O ator Wagner Moura fala MODA O concreto e o urbano inspiram ensaio que privilegia o preto e o branco

de trabalho, aversão à fama e política

MEMÓRIA No Largo Dois de Julho, um

armarinho resiste aos shoppings e ao tempo

08

28

FERNANDO VIVAS / AG. A TARDE

07

BIO

Ângelo Flávio está em Quincas Berro d‘Água, de Sérgio Machado, e cheio de planos

21

ATALHO

Especializado em comida árabe, Magib tem os kebabs como protagonistas

16

CAROLINA PATERNOSTRO / DIVULGAÇÃO

22

MERCADO

Lojas de grifes internacionais incrementam negócio da moda em Salvador

THIAGO TEIXEIRA / AG. A TARDE

32

ARTE

Bel Borba usa as ruas da cidade como uma galeria a céu aberto para suas obras

Filme de Arriaga revisita obsessão do cineasta pela morte

FUNDADO EM 15/10/1912 FUNDADOR ERNESTO SIMÕES FILHO PRESIDENTE REGINA SIMÕES DE MELLO LEITÃO SUPERINTENDENTE RENATO SIMÕES DIRETOR-GERAL EDIVALDO M. BOAVENTURA EDITOR-CHEFE FLORISVALDO MATTOS EDITORA-COORDENADORA NADJA VLADI EDITORA KÁTIA BORGES EDITORES DE ARTE PIERRE THEMOTHEO E IANSÃ NEGRÃO EDITOR DE FOTOGRAFIA CARLOS CASAES DESIGNER ANA CLÉLIA REBOUÇAS. TRATAMENTO DE IMAGEM ROBERTO ABREU. FALE COM A REDAÇÃO WWW.ATARDE.COM.BR/MUITO E-MAIL: REVISTAMUITO@GRUPOATARDE.COM.BR, 71 3340-8800 (CENTRAL) / 71 3340-8990 (ALÔ REDAÇÃO) CLASSIFICADOS POPULARES 71 3533-0855 / ATARDE@ATARDE.COM.BR / WWW.ATARDE.COM.BR VENDAS DE ASSINATURAS BAHIA E SERGIPE (71) 3533-0850 REPRESENTANTE PARA TODO O PAÍS PEREIRA DE SOUZA E CIA. LTDA. / RIO DE JANEIRO 21 2544 3070 / SÃO PAULO 11 3259 6111 PROPRIEDADE DA EMPRESA EDITORA A TARDE / SEDE: RUA PROF. MILTON CAYRES DE BRITO, Nº 204 - CAMINHO DAS ÁRVORES, CEP 41822-900 - SALVADOR - BA. REDAÇÃO: (71) 3340-8800, PABX: (71) 3340-8500. FAX: (71) 3340-8712/8713. PUBLICIDADE: (71) 3340-8757/8731. FAX 3340-8710. CIRCULAÇÃO: (71) 3340-8612. FAX 3340-8732. REPRESENTANTES COMERCIAIS / SÃO PAULO (SP) RUA ARAÚJO, 70, 7º ANDAR, CEP 01200-020. (11) 3259-6111/6532. FAX (11) 3237-2079 SERGIPE E ALAGOAS GABINETE DE MÍDIA & COMUNICAÇÃO LTDA. RUA ÁLVARO BRITO, 455, SALA 35, BAIRRO 13 DE JULHO, CEP 49.020-400 - ARACAJU - SE - TELEFONE: (79)3246-4139 / (79)9978-8962 BRASÍLIA(DF) SCS, QD. 1, ED. CENTRAL, SALAS 1001 E 1008 CEP 70304-900. (61) 3226-0543/1343 A TARDE É ASSOCIADA À SOCIEDADE INTERAMERICANA DE IMPRENSA (SIP), AO INSTITUTO VERIFICADOR DE CIRCULAÇÃO (IVC) E É MEMBRO FUNDADOR DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS JORNAIS (ANJ) IMPRESSÃO QUEBECOR WORLD RECIFE LTDA

O ator Wagner Moura, em foto de Fernando Vivas, na varanda do Edifício Oceania

» MAKING OF, VÍDEOS E FOTOS EM REVISTAMUITO.ATARDE.COM.BR. SUGESTÕES, CRÍTICAS: REVISTAMUITO@GRUPOATARDE.COM.BR SIGA A MUITO EM: TWITER.COM/REVISTAMUITO.

MUITO INDICA CINEMA

Vidas desgastadas Guillermo Arriaga faz mais do mesmo: sentimentos caóticos, mulheres transtornadas, famílias arruinadas e a culpa como condutora da história. Conhecido por escrever os intrincados roteiros filmados por Alejandro González Iñárritu, o mexicano faz em Vidas que se cruzam (péssima adaptação de título para The Burning Plainit) algo parecido com Amores Brutos (2000), 21 Gramas (2003) e Babel (2006). Em sua estreia na direção de longas, Arriaga também mistura passado e presente, vai atrás para mostrar as implicações de uma única ação no drama e sofrimento de todos os personagens. Quatro histórias são ligadas a um fato e se encaixam no avançar do filme. Sylvia (Charlize Theron) se castiga, Geena (Kim Basinger) busca a beleza perdida no sexo, Santiago (J.D. Pardo) tenta viver a vida do pai para entender sua morte e Mariana (Jennifer Lawrence) carrega o fardo de um segredo e de um crime. Juntos, todos são fracos, mesmo que no fim haja um sopro de esperança e alguma abertura para uma nova vida. Arriaga em entrevistas sobre o lançamento do filme disse que a morte é sua obsessão, se isso for verdade, a descrença na vida é seu maior argumento. DANIEL MARQUES «

VIDAS QUE SE CRUZAM Veja a programação o filme no www.cineinsite.com.br


ÍNDICE

16.5.2010

DIVULGAÇÃO

ABRE ASPAS O ator Wagner Moura fala MODA O concreto e o urbano inspiram ensaio que privilegia o preto e o branco

de trabalho, aversão à fama e política

MEMÓRIA No Largo Dois de Julho, um

armarinho resiste aos shoppings e ao tempo

08

28

FERNANDO VIVAS / AG. A TARDE

07

BIO

Ângelo Flávio está em Quincas Berro d‘Água, de Sérgio Machado, e cheio de planos

21

ATALHO

Especializado em comida árabe, Magib tem os kebabs como protagonistas

16

CAROLINA PATERNOSTRO / DIVULGAÇÃO

22

MERCADO

Lojas de grifes internacionais incrementam negócio da moda em Salvador

THIAGO TEIXEIRA / AG. A TARDE

32

ARTE

Bel Borba usa as ruas da cidade como uma galeria a céu aberto para suas obras

Filme de Arriaga revisita obsessão do cineasta pela morte

FUNDADO EM 15/10/1912 FUNDADOR ERNESTO SIMÕES FILHO PRESIDENTE REGINA SIMÕES DE MELLO LEITÃO SUPERINTENDENTE RENATO SIMÕES DIRETOR-GERAL EDIVALDO M. BOAVENTURA EDITOR-CHEFE FLORISVALDO MATTOS EDITORA-COORDENADORA NADJA VLADI EDITORA KÁTIA BORGES EDITORES DE ARTE PIERRE THEMOTHEO E IANSÃ NEGRÃO EDITOR DE FOTOGRAFIA CARLOS CASAES DESIGNER ANA CLÉLIA REBOUÇAS. TRATAMENTO DE IMAGEM ROBERTO ABREU. FALE COM A REDAÇÃO WWW.ATARDE.COM.BR/MUITO E-MAIL: REVISTAMUITO@GRUPOATARDE.COM.BR, 71 3340-8800 (CENTRAL) / 71 3340-8990 (ALÔ REDAÇÃO) CLASSIFICADOS POPULARES 71 3533-0855 / ATARDE@ATARDE.COM.BR / WWW.ATARDE.COM.BR VENDAS DE ASSINATURAS BAHIA E SERGIPE (71) 3533-0850 REPRESENTANTE PARA TODO O PAÍS PEREIRA DE SOUZA E CIA. LTDA. / RIO DE JANEIRO 21 2544 3070 / SÃO PAULO 11 3259 6111 PROPRIEDADE DA EMPRESA EDITORA A TARDE / SEDE: RUA PROF. MILTON CAYRES DE BRITO, Nº 204 - CAMINHO DAS ÁRVORES, CEP 41822-900 - SALVADOR - BA. REDAÇÃO: (71) 3340-8800, PABX: (71) 3340-8500. FAX: (71) 3340-8712/8713. PUBLICIDADE: (71) 3340-8757/8731. FAX 3340-8710. CIRCULAÇÃO: (71) 3340-8612. FAX 3340-8732. REPRESENTANTES COMERCIAIS / SÃO PAULO (SP) RUA ARAÚJO, 70, 7º ANDAR, CEP 01200-020. (11) 3259-6111/6532. FAX (11) 3237-2079 SERGIPE E ALAGOAS GABINETE DE MÍDIA & COMUNICAÇÃO LTDA. RUA ÁLVARO BRITO, 455, SALA 35, BAIRRO 13 DE JULHO, CEP 49.020-400 - ARACAJU - SE - TELEFONE: (79)3246-4139 / (79)9978-8962 BRASÍLIA(DF) SCS, QD. 1, ED. CENTRAL, SALAS 1001 E 1008 CEP 70304-900. (61) 3226-0543/1343 A TARDE É ASSOCIADA À SOCIEDADE INTERAMERICANA DE IMPRENSA (SIP), AO INSTITUTO VERIFICADOR DE CIRCULAÇÃO (IVC) E É MEMBRO FUNDADOR DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS JORNAIS (ANJ) IMPRESSÃO QUEBECOR WORLD RECIFE LTDA

O ator Wagner Moura, em foto de Fernando Vivas, na varanda do Edifício Oceania

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MUITO INDICA CINEMA

Vidas desgastadas Guillermo Arriaga faz mais do mesmo: sentimentos caóticos, mulheres transtornadas, famílias arruinadas e a culpa como condutora da história. Conhecido por escrever os intrincados roteiros filmados por Alejandro González Iñárritu, o mexicano faz em Vidas que se cruzam (péssima adaptação de título para The Burning Plainit) algo parecido com Amores Brutos (2000), 21 Gramas (2003) e Babel (2006). Em sua estreia na direção de longas, Arriaga também mistura passado e presente, vai atrás para mostrar as implicações de uma única ação no drama e sofrimento de todos os personagens. Quatro histórias são ligadas a um fato e se encaixam no avançar do filme. Sylvia (Charlize Theron) se castiga, Geena (Kim Basinger) busca a beleza perdida no sexo, Santiago (J.D. Pardo) tenta viver a vida do pai para entender sua morte e Mariana (Jennifer Lawrence) carrega o fardo de um segredo e de um crime. Juntos, todos são fracos, mesmo que no fim haja um sopro de esperança e alguma abertura para uma nova vida. Arriaga em entrevistas sobre o lançamento do filme disse que a morte é sua obsessão, se isso for verdade, a descrença na vida é seu maior argumento. DANIEL MARQUES «

VIDAS QUE SE CRUZAM Veja a programação o filme no www.cineinsite.com.br


SALVADOR DOMINGO

16/5/2010

SALVADOR DOMINGO

THIAGO TEIXEIRA / AG. A TARDE

WELTON ARAÚJO / AG. A TARDE / 20.1.2010

MUITO MAIS NO PORTAL A TARDE ON LINE REVISTAMUITO.ATARDE.COM.BR

MÚSICA Assista a vídeo com a banda

Sua Mãe, de Wagner Moura, que lançou o álbum The Very Best of the Greatest Hits

COMENTÁRIOS

ARTE Confira mais imagens do artista visual Bel Borba, que fez diversas intervenções artísticas pela cidade

16/5/2010 7

ACERVO PESSOAL / DIVULGAÇÃO

6

LITERATURA Leia trechos de textos do poeta, contista, tradutor e crítico literário mineiro Anderson Braga Horta

Mande suas sugestões e comentários para revistamuito@grupoatarde.com.br « MARCO AURÉLIO MARTINS / AG. A TARDE

_Cristais 2

Muito oportuna e esclarecedora a reportagem Memória de Cristal, sobre a fábrica da Fratelli Vita. Eu, que residi na Cidade Baixa durante toda a minha vida, não sabia que a Fratelli, além de fabricar refrigerantes, era produtora também de cristais. Parabenizo Muito pela bela reportagem, aproveitando a oportunidade para incentivar vocês a fazerem mais reportagens sobre a Cidade Baixa. Deise Pereira

Gostaria de parabenizar a equipe da revista pela belíssima matéria sobre Aloísio Menezes. Dono de uma voz impressionante e de um talento grande, Aloísio de fato já deveria estar conhecido no Brasil todo. Que bom que Muito foi sensível a isso. Tenho acompanhado semanalmente a trajetória da revista e vocês estão de parabéns. Ana Tereza Albuquerque

_Saja

A revista Muito se superou em “muito”, cultivando em entrevista a pérola filosofal José Saja. Tive o privilégio de conviver com ele e de desfrutar da sua aura tão elevada e extraordinária qualificação humana. É um humanista irreversível. Paulo Boente

_Cristais 1

A reportagem sobre os cristais Fratelli Vita me emocionou. Lembrei-me da visita que fiz, em Veneza, na Itália, à fábrica de cristais, onde vi, ao vivo, a fabricação de algumas peças da

_Cupuaçu A história dos cristais Fratelli Vita

marca. Tomara que o senhor Jario Vita consiga, de fato, reativar tão importante empreendimento, colocando, novamente, a Bahia no circuito mundial da fabricação de cristais. Parabéns ao repórter Ronaldo Jacobina. Roque Oliveira

Adorei a reportagem desta semana sobre as delícias para o Dia das Mães. Mas a que mais me chamou a atenção foi a sobremesa. Que torta-pavê deliciosa é aquela de cupuaçu com chocolate... Já tinha comido uma vez a torta holandesa nessa Casa do Café que estava maravilhosa, mas essa de cupuaçu me pareceu fantástica. Acho muito válido divulgar o que é bom na nossa cidade, pois não temos muitas opções de tortas e doces de qualidade e com sabor de verdade por aqui. Sandra Barbosa

BIO ÂNGELO FLÁVIO

Atitude, talento, cinema e teatro Texto TATIANA MENDONÇA tmendonca@grupoatarde.com.br Foto MARCO AURÉLIO MARTINS mmartins@grupoatarde.com.br No começo de maio, Ângelo Flávio, 33, esteve em Mucugê filmando o longa À Beira do Caminho, de Breno Silveira. “Foi massa. Pela primeira vez na vida andei de helicóptero”. Um santuário toma o centro da sua casa, no Barbalho. Entre guias e velas, os dois troféus Braskem que ganhou – o primeiro em 2004, pela atuação na peça Evangelho Segundo Maria; e o outro em 2007, quando o Coletivo de Atores Negros Abdias do Nascimento (CAN), que fundou, venceu na categoria revelação com O Dia 14. Filho de empregada doméstica, teve que pedir dinheiro emprestado para se inscrever no curso de direção teatral da Ufba. Conta que estava “sem paciência” para voltar a atuar, mas foi seduzido pelo cinema. Está em Quincas Berro d’Água, de Sérgio Machado, Estranhos, de Paulo Alcântara, e O TrampolimdoForte,deJoãoMattos.“DesistideparticipardeCapitãesdaAreiaporqueacheiquemeupersonagem ia alimentar uma histeria homofóbica”. Do teatro, Ângelo não se afasta. Formado em 2002, o CAN, com o qual tambémmontouoelogiadoACasadosEspectros,persiste.“PensoemfazeruminfantileumespetáculonaEstação da Lapa”. No Rio de Janeiro, já realizou o sonho de dirigir a diva Ruth de Souza, em Transegun. Não teme dizer que sua obra é panfletária. “Arte pela arte não existe. Meu discurso não é para negros, é para o meu País”. «

» MUITO MAIS SOBRE ÂNGELO FLÁVIO EM REVISTAMUITO.ATARDE.COM.BR

_Aloísio Menezes


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MÚSICA Assista a vídeo com a banda

Sua Mãe, de Wagner Moura, que lançou o álbum The Very Best of the Greatest Hits

COMENTÁRIOS

ARTE Confira mais imagens do artista visual Bel Borba, que fez diversas intervenções artísticas pela cidade

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6

LITERATURA Leia trechos de textos do poeta, contista, tradutor e crítico literário mineiro Anderson Braga Horta

Mande suas sugestões e comentários para revistamuito@grupoatarde.com.br « MARCO AURÉLIO MARTINS / AG. A TARDE

_Cristais 2

Muito oportuna e esclarecedora a reportagem Memória de Cristal, sobre a fábrica da Fratelli Vita. Eu, que residi na Cidade Baixa durante toda a minha vida, não sabia que a Fratelli, além de fabricar refrigerantes, era produtora também de cristais. Parabenizo Muito pela bela reportagem, aproveitando a oportunidade para incentivar vocês a fazerem mais reportagens sobre a Cidade Baixa. Deise Pereira

Gostaria de parabenizar a equipe da revista pela belíssima matéria sobre Aloísio Menezes. Dono de uma voz impressionante e de um talento grande, Aloísio de fato já deveria estar conhecido no Brasil todo. Que bom que Muito foi sensível a isso. Tenho acompanhado semanalmente a trajetória da revista e vocês estão de parabéns. Ana Tereza Albuquerque

_Saja

A revista Muito se superou em “muito”, cultivando em entrevista a pérola filosofal José Saja. Tive o privilégio de conviver com ele e de desfrutar da sua aura tão elevada e extraordinária qualificação humana. É um humanista irreversível. Paulo Boente

_Cristais 1

A reportagem sobre os cristais Fratelli Vita me emocionou. Lembrei-me da visita que fiz, em Veneza, na Itália, à fábrica de cristais, onde vi, ao vivo, a fabricação de algumas peças da

_Cupuaçu A história dos cristais Fratelli Vita

marca. Tomara que o senhor Jario Vita consiga, de fato, reativar tão importante empreendimento, colocando, novamente, a Bahia no circuito mundial da fabricação de cristais. Parabéns ao repórter Ronaldo Jacobina. Roque Oliveira

Adorei a reportagem desta semana sobre as delícias para o Dia das Mães. Mas a que mais me chamou a atenção foi a sobremesa. Que torta-pavê deliciosa é aquela de cupuaçu com chocolate... Já tinha comido uma vez a torta holandesa nessa Casa do Café que estava maravilhosa, mas essa de cupuaçu me pareceu fantástica. Acho muito válido divulgar o que é bom na nossa cidade, pois não temos muitas opções de tortas e doces de qualidade e com sabor de verdade por aqui. Sandra Barbosa

BIO ÂNGELO FLÁVIO

Atitude, talento, cinema e teatro Texto TATIANA MENDONÇA tmendonca@grupoatarde.com.br Foto MARCO AURÉLIO MARTINS mmartins@grupoatarde.com.br No começo de maio, Ângelo Flávio, 33, esteve em Mucugê filmando o longa À Beira do Caminho, de Breno Silveira. “Foi massa. Pela primeira vez na vida andei de helicóptero”. Um santuário toma o centro da sua casa, no Barbalho. Entre guias e velas, os dois troféus Braskem que ganhou – o primeiro em 2004, pela atuação na peça Evangelho Segundo Maria; e o outro em 2007, quando o Coletivo de Atores Negros Abdias do Nascimento (CAN), que fundou, venceu na categoria revelação com O Dia 14. Filho de empregada doméstica, teve que pedir dinheiro emprestado para se inscrever no curso de direção teatral da Ufba. Conta que estava “sem paciência” para voltar a atuar, mas foi seduzido pelo cinema. Está em Quincas Berro d’Água, de Sérgio Machado, Estranhos, de Paulo Alcântara, e O TrampolimdoForte,deJoãoMattos.“DesistideparticipardeCapitãesdaAreiaporqueacheiquemeupersonagem ia alimentar uma histeria homofóbica”. Do teatro, Ângelo não se afasta. Formado em 2002, o CAN, com o qual tambémmontouoelogiadoACasadosEspectros,persiste.“PensoemfazeruminfantileumespetáculonaEstação da Lapa”. No Rio de Janeiro, já realizou o sonho de dirigir a diva Ruth de Souza, em Transegun. Não teme dizer que sua obra é panfletária. “Arte pela arte não existe. Meu discurso não é para negros, é para o meu País”. «

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SALVADOR DOMINGO

16/5/2010

SALVADOR DOMINGO

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ABRE ASPAS WAGNER MOURA ATOR

O problema do Brasil é essa classe alta»

«

Texto EMANUELLA SOMBRA esombra@grupoatarde.com.br Fotos FERNANDO VIVAS fvivas@grupoatarde.com.br “Olha, ele está bem mais branquinho. Parece que fez tratamento de pele”, diz uma garota de microssaia, enquanto se equilibra num salto plataforma rosa-choque para observar, em cima do palco, o vocalista da banda Sua Mãe durante apresentação em Salvador. Longe dos holofotes, Wagner Moura é o avesso daquela frase de Caetano Veloso. De perto, é normal. Um sujeito de biotipo comum, que, por força do talento, virou sexy symbol de novela das oito. Conversa pausadamente, escolhe muito bem as palavras antes de deixá-las escapar da boca e não esconde o incômodo de ser o personagem principal. É franco: não gosta de formar opinião sobre tudo, aparecer em revista de celebridade, falar sobre a vida pessoal, ser flagrado comprando pão na padaria. Assume que, depois de Hamlet, dará um tempo no teatro e diz que sua obsessão atual é o cinema. Depois de turnê musical, começa a filmar O Homem do Futuro, novo filme de Cláudio Torres. Ano que vem, fará outro longa, A Cadeira do Pai, num momento em que o cinema brasileiro, segundo ele próprio, “começa a parecer mais com o cinema argentino, mal comparando”. E é por este projeto, dirigido por Luciano Moura e com Lima Duarte e Fernanda Torres no elenco, que Wagner Moura demonstra maior empolgação. O público talvez discorde (da comparação ou da empolgação). A sensação de déjà vu ao ver a foto do Capitão Nascimento depois de alguns anos, agora coronel e grisalho, causa maior expectativa. Com estreia prevista para setembro, Tropa de Elite 2, de José Padilha, é um segredo guardado a sete chaves. Suas novas (ou velhas?) discussões, nem tanto.


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ABRE ASPAS WAGNER MOURA ATOR

O problema do Brasil é essa classe alta»

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Texto EMANUELLA SOMBRA esombra@grupoatarde.com.br Fotos FERNANDO VIVAS fvivas@grupoatarde.com.br “Olha, ele está bem mais branquinho. Parece que fez tratamento de pele”, diz uma garota de microssaia, enquanto se equilibra num salto plataforma rosa-choque para observar, em cima do palco, o vocalista da banda Sua Mãe durante apresentação em Salvador. Longe dos holofotes, Wagner Moura é o avesso daquela frase de Caetano Veloso. De perto, é normal. Um sujeito de biotipo comum, que, por força do talento, virou sexy symbol de novela das oito. Conversa pausadamente, escolhe muito bem as palavras antes de deixá-las escapar da boca e não esconde o incômodo de ser o personagem principal. É franco: não gosta de formar opinião sobre tudo, aparecer em revista de celebridade, falar sobre a vida pessoal, ser flagrado comprando pão na padaria. Assume que, depois de Hamlet, dará um tempo no teatro e diz que sua obsessão atual é o cinema. Depois de turnê musical, começa a filmar O Homem do Futuro, novo filme de Cláudio Torres. Ano que vem, fará outro longa, A Cadeira do Pai, num momento em que o cinema brasileiro, segundo ele próprio, “começa a parecer mais com o cinema argentino, mal comparando”. E é por este projeto, dirigido por Luciano Moura e com Lima Duarte e Fernanda Torres no elenco, que Wagner Moura demonstra maior empolgação. O público talvez discorde (da comparação ou da empolgação). A sensação de déjà vu ao ver a foto do Capitão Nascimento depois de alguns anos, agora coronel e grisalho, causa maior expectativa. Com estreia prevista para setembro, Tropa de Elite 2, de José Padilha, é um segredo guardado a sete chaves. Suas novas (ou velhas?) discussões, nem tanto.


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Quando Tropa de Elite ganhou o Urso de Ouro em Berlim, em 2008, a crítica chamou o filme de fascista. O Le Monde disse que ele fazia apologia à tortura. Como você vê esse tipo de crítica? Quando vieram as primeiras críticas, eu fui o primeiro a responder publicamente. O Arnaldo Bloch (de O Globo) foi o primeiro cara que apontou o filme como sendo de direita. E eu me senti muito mal, muito injustiçado como artista, como cidadão. Por quê? Porque eu tenho convicções e acho que, hoje em dia, essas coisas de direita, esquerda, conservador, progressista estão muito diluídas. De certa forma, eu militei, milito ideologicamente sempre a favor de intervenção mais forte do Estado na vida das pessoas, da diminuição da desigualdade social, de benefícios sociais, reforma agrária, que são posicionamentos... (pausa). De esquerda. De esquerda. A mim, pessoalmente, soou estranho, porque eu tinha um envolvimento com o filme. E também porque me pareceu uma crítica descabida. Primeiro pela história do Zé Padilha, que na época tinha feito o Ônibus 174, um filme que, se você tivesse que acusar de alguma coisa, você diria que é de extrema esquerda, porque justificava a ação de um bandido, de um marginal. E depois porque achei primária a crítica. O que pensa o realizador e o que pensa o personagem não coincidem, a gente disse muito isso nas entrevistas. É a mesma coisa de você dizer que o (Francis Ford) Coppola com-

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 11

«As campanhas que tentam colocar no usuário a culpa de toda a violência são campanhas covardes, o usuário é o elo mais fraco» partilha com as ideias do Michael Corleone, que o Fernando Meirelles pensa como o Zé Pequeno. O Tropa de Elite era para ser um documentário, o que está mostrado ali nada mais é do que a verdade. É como dizer que Hector Babenco, quando fez o Carandiru, glorificou a bandidagem. Esse discurso me parece elitista. O problema do Brasil é que essa classe alta não olha para o que está acontecendo lá embaixo. Por outro lado, algumas pessoas dizem que no Brasil faltam filmes sobre a classe média do País. E eu acho que falta. E é esse tipo de filme que A Cadeira do Pai (com direção de Luciano Moura) está trazendo, filme de cotidiano. É por isso que eu estou contente de estar num momento em que o cinema brasileiro começa a parecer mais com o cinema argentino, mal comparando. Por outro lado, eu reconheço a nossa cinematografia como um marco, principalmente pela herança do Cinema Novo. Acho ótimo diversificar, mas é saudável também o Brasil ter filmes ligados à nossa realidade so-

ALEX LIMA / DIVULGAÇÃO

da legalização, é provado que a repressão é ineficaz. Nossa política se aproxima muito mais da política norte-americana que da europeia, que procura tratar o usuário como uma questão de saúde pública.

cial. O João Moreira Salles ser um banqueiro e querer entender a realidade do tráfico na favela, eu acho muito saudável, ruim é o banqueiro que passa no sinal e fecha o vidro com medo dos malabares. E aquele filme dele (Notícias de uma guerra particular, de 1999) me fez entender o conflito urbano no Rio, que tem três lados na linha de fogo direto, o do morador da favela, do traficante e do policial. E foi esse lado que Tropa de Elite trouxe, de mostrar com muito realismo a visão do policial nessa guerra. Evidente que é a visão de um policial, os protagonistas do filme são policiais, é impossível você não se identificar em algum momento com aquelas pessoas. Agora, você pode se identificar com elas do ponto de vista do personagem e ter um juízo crítico a respeito do que está fazendo esse personagem, de como age esse policial. O mesmo juízo crítico que o Arnaldo Bloch e as pessoas que acusaram o Tropa de fascismo tiveram, nós temos. Só que eu, como ator, não posso entrar em cena julgando o personagem. Um cara falou para mim: “Mas você humanizou o Capitão Nascimento”. Mas meu trabalho é esse. E esse discurso de que a classe média financia o tráfico ao comprar droga? Os consumidores de drogas financiam o tráfico assim como os consumidores de cerveja financiam a indústria da cerveja. Isso não é uma descoberta incrível. Agora, as campanhas que tentam colocar no usuário a culpa de toda a violência são campanhas covardes, o usuário é o elo mais fraco da cadeia. Sou a favor

Você disse que sempre defendeu ideias de esquerda. Em quem vai votar? Eu gosto muito do tipo de política que a Marina (Silva) representa, de pensar desenvolvimento do jeito que ela pensa. Falar hoje em desenvolvimento sustentável, reforma agrária, respeito ao meio ambiente transcende a questão climática. Ecologia é um conceito que daqui a pouco vai ser urgente, tem a ver com nossa relação interpessoal, com cidadania. A Marina me parece um tipo de política que Obama ainda não é, e o Brasil pode dar um exemplo muito legal para o mundo. Mas me preocupa muito a relação dela com a religião, nada contra ela ser evangélica, mas o quanto a religião influencia suas decisões políticas. Ser contra a pesquisa com células-tronco, eu acho um perigo. Alguém me disse que a Marina – não sei se é verdade, quero ouvi-la falar – apoia o ensino do criacionismo nas escolas, isso é assustador. Não dá para votar numa pessoa que quer ensinar para as crianças que o mundo foi criado por Deus, Adão e Eva. Tendo a votar nela, mas queria que a campanha começasse. Faria campanha política para alguém? Eu fiz no ano passado para (Fernando) Gabeira, fui para a televisão dizer que achava uma boa o Gabeira ser prefeito do Rio. Logo depois, naquele escândalo das passagens no Congresso, descobriu-se que ele tinha mandado a filha (Maya Gabeira, surfista) para o Havaí com passagens pagas por nós. Na mesma hora eu me arrependi. Se eu cruzar com o Gabeira hoje, eu vou perguntar: “Que parada foi essa das passagens, véio?” Porque eu me senti mal. Capitão Nascimento grisalho, em cena de Tropa de Elite 2

«Marina me parece um tipo de política que Obama ainda não é, mas me preocupa muito a relação dela com a religião»

Então não faz mais? Acho que não, a não ser que seja uma coisa que realmente me mobilize muito. Continuo achando Gabeira um cara legal, um tipo de político diferenciado dos demais. Mas na campanha dele agora para governador, um dos aliados era o César Maia. Não é estranho? Outro dia fui num encontro de um político do PV, na casa de (Gilberto) Gil até, e ele disse assim: “Sou a favor da legalização das drogas, só que eu


10 SALVADOR DOMINGO

16/5/2010

Quando Tropa de Elite ganhou o Urso de Ouro em Berlim, em 2008, a crítica chamou o filme de fascista. O Le Monde disse que ele fazia apologia à tortura. Como você vê esse tipo de crítica? Quando vieram as primeiras críticas, eu fui o primeiro a responder publicamente. O Arnaldo Bloch (de O Globo) foi o primeiro cara que apontou o filme como sendo de direita. E eu me senti muito mal, muito injustiçado como artista, como cidadão. Por quê? Porque eu tenho convicções e acho que, hoje em dia, essas coisas de direita, esquerda, conservador, progressista estão muito diluídas. De certa forma, eu militei, milito ideologicamente sempre a favor de intervenção mais forte do Estado na vida das pessoas, da diminuição da desigualdade social, de benefícios sociais, reforma agrária, que são posicionamentos... (pausa). De esquerda. De esquerda. A mim, pessoalmente, soou estranho, porque eu tinha um envolvimento com o filme. E também porque me pareceu uma crítica descabida. Primeiro pela história do Zé Padilha, que na época tinha feito o Ônibus 174, um filme que, se você tivesse que acusar de alguma coisa, você diria que é de extrema esquerda, porque justificava a ação de um bandido, de um marginal. E depois porque achei primária a crítica. O que pensa o realizador e o que pensa o personagem não coincidem, a gente disse muito isso nas entrevistas. É a mesma coisa de você dizer que o (Francis Ford) Coppola com-

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 11

«As campanhas que tentam colocar no usuário a culpa de toda a violência são campanhas covardes, o usuário é o elo mais fraco» partilha com as ideias do Michael Corleone, que o Fernando Meirelles pensa como o Zé Pequeno. O Tropa de Elite era para ser um documentário, o que está mostrado ali nada mais é do que a verdade. É como dizer que Hector Babenco, quando fez o Carandiru, glorificou a bandidagem. Esse discurso me parece elitista. O problema do Brasil é que essa classe alta não olha para o que está acontecendo lá embaixo. Por outro lado, algumas pessoas dizem que no Brasil faltam filmes sobre a classe média do País. E eu acho que falta. E é esse tipo de filme que A Cadeira do Pai (com direção de Luciano Moura) está trazendo, filme de cotidiano. É por isso que eu estou contente de estar num momento em que o cinema brasileiro começa a parecer mais com o cinema argentino, mal comparando. Por outro lado, eu reconheço a nossa cinematografia como um marco, principalmente pela herança do Cinema Novo. Acho ótimo diversificar, mas é saudável também o Brasil ter filmes ligados à nossa realidade so-

ALEX LIMA / DIVULGAÇÃO

da legalização, é provado que a repressão é ineficaz. Nossa política se aproxima muito mais da política norte-americana que da europeia, que procura tratar o usuário como uma questão de saúde pública.

cial. O João Moreira Salles ser um banqueiro e querer entender a realidade do tráfico na favela, eu acho muito saudável, ruim é o banqueiro que passa no sinal e fecha o vidro com medo dos malabares. E aquele filme dele (Notícias de uma guerra particular, de 1999) me fez entender o conflito urbano no Rio, que tem três lados na linha de fogo direto, o do morador da favela, do traficante e do policial. E foi esse lado que Tropa de Elite trouxe, de mostrar com muito realismo a visão do policial nessa guerra. Evidente que é a visão de um policial, os protagonistas do filme são policiais, é impossível você não se identificar em algum momento com aquelas pessoas. Agora, você pode se identificar com elas do ponto de vista do personagem e ter um juízo crítico a respeito do que está fazendo esse personagem, de como age esse policial. O mesmo juízo crítico que o Arnaldo Bloch e as pessoas que acusaram o Tropa de fascismo tiveram, nós temos. Só que eu, como ator, não posso entrar em cena julgando o personagem. Um cara falou para mim: “Mas você humanizou o Capitão Nascimento”. Mas meu trabalho é esse. E esse discurso de que a classe média financia o tráfico ao comprar droga? Os consumidores de drogas financiam o tráfico assim como os consumidores de cerveja financiam a indústria da cerveja. Isso não é uma descoberta incrível. Agora, as campanhas que tentam colocar no usuário a culpa de toda a violência são campanhas covardes, o usuário é o elo mais fraco da cadeia. Sou a favor

Você disse que sempre defendeu ideias de esquerda. Em quem vai votar? Eu gosto muito do tipo de política que a Marina (Silva) representa, de pensar desenvolvimento do jeito que ela pensa. Falar hoje em desenvolvimento sustentável, reforma agrária, respeito ao meio ambiente transcende a questão climática. Ecologia é um conceito que daqui a pouco vai ser urgente, tem a ver com nossa relação interpessoal, com cidadania. A Marina me parece um tipo de política que Obama ainda não é, e o Brasil pode dar um exemplo muito legal para o mundo. Mas me preocupa muito a relação dela com a religião, nada contra ela ser evangélica, mas o quanto a religião influencia suas decisões políticas. Ser contra a pesquisa com células-tronco, eu acho um perigo. Alguém me disse que a Marina – não sei se é verdade, quero ouvi-la falar – apoia o ensino do criacionismo nas escolas, isso é assustador. Não dá para votar numa pessoa que quer ensinar para as crianças que o mundo foi criado por Deus, Adão e Eva. Tendo a votar nela, mas queria que a campanha começasse. Faria campanha política para alguém? Eu fiz no ano passado para (Fernando) Gabeira, fui para a televisão dizer que achava uma boa o Gabeira ser prefeito do Rio. Logo depois, naquele escândalo das passagens no Congresso, descobriu-se que ele tinha mandado a filha (Maya Gabeira, surfista) para o Havaí com passagens pagas por nós. Na mesma hora eu me arrependi. Se eu cruzar com o Gabeira hoje, eu vou perguntar: “Que parada foi essa das passagens, véio?” Porque eu me senti mal. Capitão Nascimento grisalho, em cena de Tropa de Elite 2

«Marina me parece um tipo de política que Obama ainda não é, mas me preocupa muito a relação dela com a religião»

Então não faz mais? Acho que não, a não ser que seja uma coisa que realmente me mobilize muito. Continuo achando Gabeira um cara legal, um tipo de político diferenciado dos demais. Mas na campanha dele agora para governador, um dos aliados era o César Maia. Não é estranho? Outro dia fui num encontro de um político do PV, na casa de (Gilberto) Gil até, e ele disse assim: “Sou a favor da legalização das drogas, só que eu


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16/5/2010

não vou dizer isso na minha campanha, pois é um tema impopular e eu quero me eleger”. A partir desse dia, eu não posso ouvir falar desse cara. Se há uma coisa que é importante para os políticos é transparência.

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 13

THIAGO TEIXEIRA / AG. A TARDE

«Esse tipo de imprensa, da fofoca, da pinta, de pessoas que se vendem com suas casas incríveis, nunca me interessou»

trovérsia muito grande com relação à gestão de Márcio (Meirelles), que é meu amigo, como secretário de Cultura. Tenho ouvido reclamações dos profissionais de teatro com relação ao trabalho de Márcio. Por outro lado, sei que ele tem feito muitas coisas legais em outras áreas, especialmente no interior. Começo a acompanhar agora a questão da sucessão do governo da Bahia, mas ainda não sei direito o que eu acho. E eu procuro acompanhar o Vitória (risos).

entrevista para a Veja, assim como não dou entrevista para a Caras, Quem, Istoé Gente, Contigo.

Você se sente muito à vontade em Salvador. Já vi uma foto sua sem camisa, andando pela Barra, comendo acarajé. Eu quero andar na rua, normal que nem todo mundo. Eu odeio ser fotografado no meio da rua, e não é porque eu estou à vontade. Me pergunte uma profissão que eu nunca seria na vida, é essa, de paparazzi.

Por que você não dá entrevista à Veja? Olha (pausa). Entrevista não é a coisa que eu mais gosto de fazer. Eu sou jornalista também, dou entrevista por dois motivos: quando eu estou fazendo alguma coisa que preciso de divulgação e quando tem um assunto, por exemplo, a transposição do São Francisco, assassinato de trabalhadores rurais no Pará – escrevi outro dia sobre banalização da figura dos artistas na mídia. Acho que se criou esse mundo dos atores, das pessoas conhecidas, de aparecer na revista por aparecer, dá uma pinta. E esse tipo de imprensa, da fofoca, da pinta, das pessoas que se vendem com suas casas incríveis, nunca me interessou. E a Veja especialmente é uma revista – engraçado – de direita, elitista, conservadora, poderosa e, portanto, autossuficiente, arrogante. Me lembro que, na época do estatuto do desarmamento, ela deu uma capa desfavorável e tendenciosa. Elogiou Tropa justamente por esses motivos, que não eram os motivos pelos quais eu fiz o filme. E tem uma política, na parte cultural, de ser muito grosseira, implacável com os atores. Faz matérias maldosas com vários colegas. O Diogo Mainardi já falou mal de mim.

Faz mais de dez anos que você se mudou para o Rio de Janeiro. E essa coisa da violência crescente aqui? Eu moro no Rio, né. Sinceramente, como morador da zona sul, me sinto tão inseguro lá quanto aqui.

Mas ele atira para todo lado... É. O Diogo Mainardi escreve na Veja, outro motivo. Eu não leio e não dou

O que você ouve falar da Bahia? Tento acompanhar culturalmente a cidade, sei que tem havido uma con-

Você comprou um apartamento no Edifício Oceania. Passar tempos em Salvador é fugir um pouco disso? Eu quero ter uma casa aqui também, me sentir na minha cidade, não quero que meu filho não se sinta baiano. Oceania é um prédio histórico, a arquitetura é linda, de frente para aquele cartão-postal. É um prédio que tem apartamentos grandes, pequenos, então você convive com todo tipo de gente diferente, gente que tem muita grana, gente dura, mais velha, mais nova. Há uma diversidade maneríssima.

Ela é igual a mim, acha desnecessário. Meus pais têm orgulho de mim tanto quanto têm da minha irmã. Criaram duas pessoas legais, honestas, que trabalham, voltam para suas casas, suas famílias. Em entrevista à Trip, você disse que chorou em Tropa de Elite 2, numa cena que tinha a ver com paternidade. Como foi? Infelizmente, não posso contar. Por conta da pirataria do primeiro filme, a gente está muito defendido nesse, o roteiro é mantido em segredo. Na verdade, a menina me perguntou qual foi a última vez que eu chorei, eu disse que tinha sido numa cena de Tropa 2, que nem tem essa importância toda no filme. As pessoas descontextualizam. E a Mônica Bergamo (colunista da Folha de S.Paulo), que falou que eu quero ser amigo da Mallu Magalhães? Eu fiquei parecendo um idiota, um tiozão. Eu disse que, quando eu gosto de uma pessoa, admiro um artista, eu me aproximo. Citei várias pessoas, como o Lázaro Ramos, o Rodrigo Amarante, que eu chamei para fazer a trilha do Hamlet, o Selton (Mello), a Malu, que é uma graça.

Te incomoda a foto? Eu podia estar de smoking. Eu não quero que me fotografem se eu não estiver trabalhando, não tenho que aparecer se eu não estiver divulgando o que eu quero, para mim não faz muito sentido. Eu comprando pão na padaria? Isso interessa a quem? Certa vez, um repórter do Pânico na TV foi te entrevistar e passou uma gosma no seu cabelo. Eu escrevi um artigo para o jornal na época. Eu não saio, não vou em pré-estreias, não ando na noite, não vou para a balada. Então eles me veem muito pouco, né. Sua mulher se incomoda em ser a mulher do Wagner Moura?

No palco, com a banda Sua Mãe, em show realizado na Madrre, em Salvador

Não querer dar entrevista vem dessas distorções? Eu só acho que tudo é muito banal. “Ah, vamos falar dos pinguins, o que você acha dos pinguins?”. Não tenho interesse em falar sobre coisas que não sei, não tenho interesse em aparecer. O meu trabalho já me expõe muito. Quanto menos as pessoas souberem de mim, da minha vida, melhor e mais crível será o meu personagem. Ainda tem isso.


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não vou dizer isso na minha campanha, pois é um tema impopular e eu quero me eleger”. A partir desse dia, eu não posso ouvir falar desse cara. Se há uma coisa que é importante para os políticos é transparência.

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 13

THIAGO TEIXEIRA / AG. A TARDE

«Esse tipo de imprensa, da fofoca, da pinta, de pessoas que se vendem com suas casas incríveis, nunca me interessou»

trovérsia muito grande com relação à gestão de Márcio (Meirelles), que é meu amigo, como secretário de Cultura. Tenho ouvido reclamações dos profissionais de teatro com relação ao trabalho de Márcio. Por outro lado, sei que ele tem feito muitas coisas legais em outras áreas, especialmente no interior. Começo a acompanhar agora a questão da sucessão do governo da Bahia, mas ainda não sei direito o que eu acho. E eu procuro acompanhar o Vitória (risos).

entrevista para a Veja, assim como não dou entrevista para a Caras, Quem, Istoé Gente, Contigo.

Você se sente muito à vontade em Salvador. Já vi uma foto sua sem camisa, andando pela Barra, comendo acarajé. Eu quero andar na rua, normal que nem todo mundo. Eu odeio ser fotografado no meio da rua, e não é porque eu estou à vontade. Me pergunte uma profissão que eu nunca seria na vida, é essa, de paparazzi.

Por que você não dá entrevista à Veja? Olha (pausa). Entrevista não é a coisa que eu mais gosto de fazer. Eu sou jornalista também, dou entrevista por dois motivos: quando eu estou fazendo alguma coisa que preciso de divulgação e quando tem um assunto, por exemplo, a transposição do São Francisco, assassinato de trabalhadores rurais no Pará – escrevi outro dia sobre banalização da figura dos artistas na mídia. Acho que se criou esse mundo dos atores, das pessoas conhecidas, de aparecer na revista por aparecer, dá uma pinta. E esse tipo de imprensa, da fofoca, da pinta, das pessoas que se vendem com suas casas incríveis, nunca me interessou. E a Veja especialmente é uma revista – engraçado – de direita, elitista, conservadora, poderosa e, portanto, autossuficiente, arrogante. Me lembro que, na época do estatuto do desarmamento, ela deu uma capa desfavorável e tendenciosa. Elogiou Tropa justamente por esses motivos, que não eram os motivos pelos quais eu fiz o filme. E tem uma política, na parte cultural, de ser muito grosseira, implacável com os atores. Faz matérias maldosas com vários colegas. O Diogo Mainardi já falou mal de mim.

Faz mais de dez anos que você se mudou para o Rio de Janeiro. E essa coisa da violência crescente aqui? Eu moro no Rio, né. Sinceramente, como morador da zona sul, me sinto tão inseguro lá quanto aqui.

Mas ele atira para todo lado... É. O Diogo Mainardi escreve na Veja, outro motivo. Eu não leio e não dou

O que você ouve falar da Bahia? Tento acompanhar culturalmente a cidade, sei que tem havido uma con-

Você comprou um apartamento no Edifício Oceania. Passar tempos em Salvador é fugir um pouco disso? Eu quero ter uma casa aqui também, me sentir na minha cidade, não quero que meu filho não se sinta baiano. Oceania é um prédio histórico, a arquitetura é linda, de frente para aquele cartão-postal. É um prédio que tem apartamentos grandes, pequenos, então você convive com todo tipo de gente diferente, gente que tem muita grana, gente dura, mais velha, mais nova. Há uma diversidade maneríssima.

Ela é igual a mim, acha desnecessário. Meus pais têm orgulho de mim tanto quanto têm da minha irmã. Criaram duas pessoas legais, honestas, que trabalham, voltam para suas casas, suas famílias. Em entrevista à Trip, você disse que chorou em Tropa de Elite 2, numa cena que tinha a ver com paternidade. Como foi? Infelizmente, não posso contar. Por conta da pirataria do primeiro filme, a gente está muito defendido nesse, o roteiro é mantido em segredo. Na verdade, a menina me perguntou qual foi a última vez que eu chorei, eu disse que tinha sido numa cena de Tropa 2, que nem tem essa importância toda no filme. As pessoas descontextualizam. E a Mônica Bergamo (colunista da Folha de S.Paulo), que falou que eu quero ser amigo da Mallu Magalhães? Eu fiquei parecendo um idiota, um tiozão. Eu disse que, quando eu gosto de uma pessoa, admiro um artista, eu me aproximo. Citei várias pessoas, como o Lázaro Ramos, o Rodrigo Amarante, que eu chamei para fazer a trilha do Hamlet, o Selton (Mello), a Malu, que é uma graça.

Te incomoda a foto? Eu podia estar de smoking. Eu não quero que me fotografem se eu não estiver trabalhando, não tenho que aparecer se eu não estiver divulgando o que eu quero, para mim não faz muito sentido. Eu comprando pão na padaria? Isso interessa a quem? Certa vez, um repórter do Pânico na TV foi te entrevistar e passou uma gosma no seu cabelo. Eu escrevi um artigo para o jornal na época. Eu não saio, não vou em pré-estreias, não ando na noite, não vou para a balada. Então eles me veem muito pouco, né. Sua mulher se incomoda em ser a mulher do Wagner Moura?

No palco, com a banda Sua Mãe, em show realizado na Madrre, em Salvador

Não querer dar entrevista vem dessas distorções? Eu só acho que tudo é muito banal. “Ah, vamos falar dos pinguins, o que você acha dos pinguins?”. Não tenho interesse em falar sobre coisas que não sei, não tenho interesse em aparecer. O meu trabalho já me expõe muito. Quanto menos as pessoas souberem de mim, da minha vida, melhor e mais crível será o meu personagem. Ainda tem isso.


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SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 15

«Eu tive que ter muita coragem para recusar papéis interessantes com medo de ficar marcado como um ator nordestino» Num Arquivo Confidencial do Faustão, de 2007, exibiram uma entrevista sua, moleque, com um sotaque bem pernambucano, falando da barragem que inundaria sua cidade. O que mudou naquele Wagner? Rodelas fica na divisa entre Bahia e Pernambuco, nosso sotaque era muito mais pernambucano que baiano. Quando eu vim para estudar em Salvador, foi muito diferente. Salvador era uma cidade grande, eu estudava em escolas públicas, vim para estudar numa escola particular, não me adequei. Fui encontrar uma turma quando comecei a fazer teatro, não tinha muito a ver com o lugar onde eu estava. Tinha uma amiga, a Micheline, que era a única amiga na escola, que fazia teatro na Casa Via Magia. “Olha, você tem talento, vamo lá”. Eu fui, e se abriu um mundo. As pessoas eram outras, as conversas eram outras. Eu encontrei uma galera. Foi na época que eu conheci o pessoal da banda. Seus primeiros papéis de projeção, como em Deus é Brasileiro e O Caminho das Nuvens, você interpretava nordestinos. Como se livrou do estereótipo? Eu me preocupei muito com isso na época, porque o mercado aposta no certo. Quando você funciona bem fazendo uma coisa, eles não querem

arriscar te botando para fazer outra, tudo é muito caro, filme é dinheiro. Arriscar num ator que não funcione é um perigo. Eu tive que ter muita coragem para recusar papéis interessantes com medo de ficar marcado como um ator nordestino. Foi mais ou menos nessa época, depois de Deus é Brasileiro especialmente. Atores como Lázaro Ramos e Vladimir Brichta se projetaram quando saíram da Bahia, como você. Para ter sucesso, é preciso ir para o Rio de Janeiro, São Paulo? No nosso caso, de nós três, foi o mesmo momento. Nós saímos juntos para fazer uma peça (A Máquina, de João Falcão). Depende do que o ator quer, o teatro de Salvador é um dos melhores do Brasil, que tem um dos melhores diretores, melhores atores, técnicos. A Bahia, nos anos 1990 especialmente, viveu um excelente momento. Não tenho visto muita coisa, mas tenho certeza de que a Escola de Teatro faz um trabalho incrível. O Teatro Vila Velha também é um grande celeiro produtor de artistas. Agora, o que esse ator hipotético quer? Televisão? Então ele tem que ir para o Rio de Janeiro. Ele pode até ter uma carreira de cinema aqui, talvez; o João Miguel fez um pouco esse caminho. Fez teatro, começou a fazer cinema e tem uma história no

cinema. Mas ele mora em São Paulo hoje. É como um ator americano. Se ele quer fazer cinema, não pode morar no Texas. Ele tem que morar em Los Angeles. Você não assina contrato com a Globo, recentemente recusou um convite para fazer a próxima novela de Gilberto Braga. O que acha da teledramaturgia brasileira? Em termos de novela, de folhetim, acho que ninguém no mundo faz melhor que a Globo. Os americanos fazem séries melhor do que ninguém, mas novela mesmo, quem faz melhor é a Globo. Mas as novelas da década de 1990 para trás são consideradas muito melhores. A gente tem muito saudosismo. Eu próprio penso “Pô, bom era Roque Santeiro, Saramandaia, Que rei sou eu?, Renascer”. As gerações novas estão aí vendo novela igual antigamente, achando legal. Talvez eles cheguem à minha idade pensando “bom era Tempos Modernos”. Algum novo projeto no teatro? O Hamlet foi uma experiência muito intensa, acho até hoje que é o meu melhor trabalho. Eu nem gosto de dizer “melhor trabalho”, porque, para mim, todos são importantes, um leva ao outro. Mas, se eu tiver que dizer um trabalho que me mobilizou muito, do qual eu me orgulho, é o Hamlet. Eu sou mesmo um ator de teatro, na minha essência, não podia ter escolhido uma peça mais intensa. Quando eu penso em fazer teatro, eu me pergunto: o que eu vou fazer agora, depois que eu fiz isso? Eu tô meio sem nenhum projeto, e os que vêm eu não me interesso. E além disso, por conta da peça, eu tive de adiar muitos filmes. Eu acho que a gente está num momento superbom no cinema e tenho pena de não participar. Esse A Cadeira do Pai é um filme de um roteiro tão interessante, muito diferente dos filmes brasileiros. Acho que agora a gente começa a ter filmes mais intimistas, e esse é um. O cinema brasileiro ainda gosta de falar do todo, de tentar entender o País, filmes como Tropa, por exemplo. Já pensou em tentar carreira internacional? Não me interessa estar num filme americano só para aparecer num filme americano. Se eu tiver uma proposta de fazer um personagem legal, num bom filme, pode ser um

personagem pequeno, mas numa boa cena, por que eu não vou? Já surgiu essa oportunidade, mas não assim como eu quero. Qual foi o filme? Olha (pausa). Não é legal falar das coisas que a gente não fez (risos). E a Sua Mãe? Vocês querem “profissionalizar” a banda? A banda está fazendo 18 anos. Quando começou, Mallu Magalhães nem tinha nascido (risos). A gente se encontrava sempre, nunca parou de tocar, trocar informações, ir fundo nessa mistura do rock inglês dos anos 1980 com os compositores da música superpopular brasileira. Estou doido para esse termo pegar, vamos parar de chamar os caras de bregas, isso é uma caretice elitista, coisa de Veja. Eu ia divulgar o Hamlet no Circo do Edgar, e ele descobriu essa história da banda. “Ah, quero trazer sua banda, meu programa é musical”. Daí liguei para a galera: “E aí, querem aparecer na televisão?”. A partir desse dia, a gente começou a ser convidado para tocar. Essa profissionalização que você diz começou assim. Não incomoda que falem “a banda do Wagner Moura”? Não, tudo bem. Gosto de fazer as coisas para as pessoas conhecerem. Esses artistas que fazem coisas para 12 pessoas, filmes para passar na nas salas de arte, não quero saber disso. Quero que meu disco venda nas Lojas Americanas. Se o fato de ser coSUA MÃE nhecido ajudar as pessoas a conheSua Mãe Records myspace.com/bandasuamae cerem o trabalho, melhor. «


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SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 15

«Eu tive que ter muita coragem para recusar papéis interessantes com medo de ficar marcado como um ator nordestino» Num Arquivo Confidencial do Faustão, de 2007, exibiram uma entrevista sua, moleque, com um sotaque bem pernambucano, falando da barragem que inundaria sua cidade. O que mudou naquele Wagner? Rodelas fica na divisa entre Bahia e Pernambuco, nosso sotaque era muito mais pernambucano que baiano. Quando eu vim para estudar em Salvador, foi muito diferente. Salvador era uma cidade grande, eu estudava em escolas públicas, vim para estudar numa escola particular, não me adequei. Fui encontrar uma turma quando comecei a fazer teatro, não tinha muito a ver com o lugar onde eu estava. Tinha uma amiga, a Micheline, que era a única amiga na escola, que fazia teatro na Casa Via Magia. “Olha, você tem talento, vamo lá”. Eu fui, e se abriu um mundo. As pessoas eram outras, as conversas eram outras. Eu encontrei uma galera. Foi na época que eu conheci o pessoal da banda. Seus primeiros papéis de projeção, como em Deus é Brasileiro e O Caminho das Nuvens, você interpretava nordestinos. Como se livrou do estereótipo? Eu me preocupei muito com isso na época, porque o mercado aposta no certo. Quando você funciona bem fazendo uma coisa, eles não querem

arriscar te botando para fazer outra, tudo é muito caro, filme é dinheiro. Arriscar num ator que não funcione é um perigo. Eu tive que ter muita coragem para recusar papéis interessantes com medo de ficar marcado como um ator nordestino. Foi mais ou menos nessa época, depois de Deus é Brasileiro especialmente. Atores como Lázaro Ramos e Vladimir Brichta se projetaram quando saíram da Bahia, como você. Para ter sucesso, é preciso ir para o Rio de Janeiro, São Paulo? No nosso caso, de nós três, foi o mesmo momento. Nós saímos juntos para fazer uma peça (A Máquina, de João Falcão). Depende do que o ator quer, o teatro de Salvador é um dos melhores do Brasil, que tem um dos melhores diretores, melhores atores, técnicos. A Bahia, nos anos 1990 especialmente, viveu um excelente momento. Não tenho visto muita coisa, mas tenho certeza de que a Escola de Teatro faz um trabalho incrível. O Teatro Vila Velha também é um grande celeiro produtor de artistas. Agora, o que esse ator hipotético quer? Televisão? Então ele tem que ir para o Rio de Janeiro. Ele pode até ter uma carreira de cinema aqui, talvez; o João Miguel fez um pouco esse caminho. Fez teatro, começou a fazer cinema e tem uma história no

cinema. Mas ele mora em São Paulo hoje. É como um ator americano. Se ele quer fazer cinema, não pode morar no Texas. Ele tem que morar em Los Angeles. Você não assina contrato com a Globo, recentemente recusou um convite para fazer a próxima novela de Gilberto Braga. O que acha da teledramaturgia brasileira? Em termos de novela, de folhetim, acho que ninguém no mundo faz melhor que a Globo. Os americanos fazem séries melhor do que ninguém, mas novela mesmo, quem faz melhor é a Globo. Mas as novelas da década de 1990 para trás são consideradas muito melhores. A gente tem muito saudosismo. Eu próprio penso “Pô, bom era Roque Santeiro, Saramandaia, Que rei sou eu?, Renascer”. As gerações novas estão aí vendo novela igual antigamente, achando legal. Talvez eles cheguem à minha idade pensando “bom era Tempos Modernos”. Algum novo projeto no teatro? O Hamlet foi uma experiência muito intensa, acho até hoje que é o meu melhor trabalho. Eu nem gosto de dizer “melhor trabalho”, porque, para mim, todos são importantes, um leva ao outro. Mas, se eu tiver que dizer um trabalho que me mobilizou muito, do qual eu me orgulho, é o Hamlet. Eu sou mesmo um ator de teatro, na minha essência, não podia ter escolhido uma peça mais intensa. Quando eu penso em fazer teatro, eu me pergunto: o que eu vou fazer agora, depois que eu fiz isso? Eu tô meio sem nenhum projeto, e os que vêm eu não me interesso. E além disso, por conta da peça, eu tive de adiar muitos filmes. Eu acho que a gente está num momento superbom no cinema e tenho pena de não participar. Esse A Cadeira do Pai é um filme de um roteiro tão interessante, muito diferente dos filmes brasileiros. Acho que agora a gente começa a ter filmes mais intimistas, e esse é um. O cinema brasileiro ainda gosta de falar do todo, de tentar entender o País, filmes como Tropa, por exemplo. Já pensou em tentar carreira internacional? Não me interessa estar num filme americano só para aparecer num filme americano. Se eu tiver uma proposta de fazer um personagem legal, num bom filme, pode ser um

personagem pequeno, mas numa boa cena, por que eu não vou? Já surgiu essa oportunidade, mas não assim como eu quero. Qual foi o filme? Olha (pausa). Não é legal falar das coisas que a gente não fez (risos). E a Sua Mãe? Vocês querem “profissionalizar” a banda? A banda está fazendo 18 anos. Quando começou, Mallu Magalhães nem tinha nascido (risos). A gente se encontrava sempre, nunca parou de tocar, trocar informações, ir fundo nessa mistura do rock inglês dos anos 1980 com os compositores da música superpopular brasileira. Estou doido para esse termo pegar, vamos parar de chamar os caras de bregas, isso é uma caretice elitista, coisa de Veja. Eu ia divulgar o Hamlet no Circo do Edgar, e ele descobriu essa história da banda. “Ah, quero trazer sua banda, meu programa é musical”. Daí liguei para a galera: “E aí, querem aparecer na televisão?”. A partir desse dia, a gente começou a ser convidado para tocar. Essa profissionalização que você diz começou assim. Não incomoda que falem “a banda do Wagner Moura”? Não, tudo bem. Gosto de fazer as coisas para as pessoas conhecerem. Esses artistas que fazem coisas para 12 pessoas, filmes para passar na nas salas de arte, não quero saber disso. Quero que meu disco venda nas Lojas Americanas. Se o fato de ser coSUA MÃE nhecido ajudar as pessoas a conheSua Mãe Records myspace.com/bandasuamae cerem o trabalho, melhor. «


CONCRETO 16 SALVADOR DOMINGO

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SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 17

MODA PRETO&BRANCO

Vestido Tarcísio Almeida Preço sob consulta. Maiô Rosa Chá Acervo. Colares Acervo

O preto no branco, de concreto o contraste entre linhas de cor, volumes e formas em peças de roupa que vestem o gesto. Uma geometria urbana, acelerada e distorcida da vida cotidiana Fotos, texto, estilo e produção MAYRA LINS mayralins@gmail.com

Vestido Maria Bonita Preço sob consulta


CONCRETO 16 SALVADOR DOMINGO

16/5/2010

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 17

MODA PRETO&BRANCO

Vestido Tarcísio Almeida Preço sob consulta. Maiô Rosa Chá Acervo. Colares Acervo

O preto no branco, de concreto o contraste entre linhas de cor, volumes e formas em peças de roupa que vestem o gesto. Uma geometria urbana, acelerada e distorcida da vida cotidiana Fotos, texto, estilo e produção MAYRA LINS mayralins@gmail.com

Vestido Maria Bonita Preço sob consulta


18 SALVADOR DOMINGO

16/5/2010

Blusa e vestido Tarcísio Almeida Preço sob consulta

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 19

Macacão e sandália Maria Bonita Preço sob consulta

Camisa Adidas Originals Preço sob consulta. Calça Animale R$ 289


18 SALVADOR DOMINGO

16/5/2010

Blusa e vestido Tarcísio Almeida Preço sob consulta

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 19

Macacão e sandália Maria Bonita Preço sob consulta

Camisa Adidas Originals Preço sob consulta. Calça Animale R$ 289


20 SALVADOR DOMINGO

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SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 21

AGRADECIMENTOS Larissa Ylla, modelo da DS Models (71 3492-2104), Cris Sirc (produção e estilo), Cris Feitosa (cabelo e maquiagem), Ópera Chic Salão de Beleza (71 3354-4086) e Faculdade de Arquitetura da Ufba ONDE COMPRAR Adidas Originals (Shopping Iguatemi, 71 3450-0197); Animale (Salvador Shopping, L2 – 71 3878-2198); Maria Bonita (Salvador Shopping, 71 3342-2872/ 2173), e Tarcísio Almeida, em Dona Brígida (Av. Tancredo Neves, 1.632, 71 3112-2160) e Galpão de Estilo (Rua Prof. Sabino Silva, 836, 71 3237-8570

ATALHO MAGID

Kebab na área do Rio Vermelho

Vestido Maria Bonita Preço sob consulta

Das culinárias internacionais servidas em Salvador, a árabe parece ser a que melhor se adaptou ao modelo fast-food. O Magid, inaugurado em 2009, não foge a esta regra. Mas prefere desobedecer a outras. Para acompanhar o chope, sua aposta não é na dupla kibe e esfiha (esta, aliás, entre as melhores da cidade) e sim nos kebabs. São 15 recheios, entre R$ 13,90 e R$ 17,90. Na dúvida, prefira os tradicionais, como o Nasser (falafel, molho taratour e salada), aos mais “brasileiros”, como o Saad (combinação camarão ao alho e óleo, coalhada seca, tomate, cebola e alface). Outras opções são o Magid (shawarma de cordeiro, molho e salada) e, para vegetarianos, o Kalid (coalhada seca, alface, azeitona verde, hortelã e azeite). Quer provar todos? Tem rodízio às terças (R$ 19,90). Se gosta de doce muito doce, prove a belewa (massa folhada, nozes e mel). Há outras opções de doce. O cuidado com os ingredientes, frescos e bem preparados, repete-se no atendimento, rápido e atencioso. No fim, dá para pedir narguile (R$ 18,50) e dividir com amigos. « Texto DIEGO DAMASCENO ddamasceno@grupoatarde.com.br

MAGID KEBAB LOUNGE: R. Borges dos Reis, Rio Vermelho (em frente à Paróquia Santana do Rio Vermelho). DESTAQUE: às quartas, das 21h às 23h30, apresentações de dança do ventre ocorrem na área interna do bar. Mas da varanda também dá para acompanhar.

Fotos THIAGO TEIXEIRA tiagoteixeira@grupoatarde.com.br


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SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 21

AGRADECIMENTOS Larissa Ylla, modelo da DS Models (71 3492-2104), Cris Sirc (produção e estilo), Cris Feitosa (cabelo e maquiagem), Ópera Chic Salão de Beleza (71 3354-4086) e Faculdade de Arquitetura da Ufba ONDE COMPRAR Adidas Originals (Shopping Iguatemi, 71 3450-0197); Animale (Salvador Shopping, L2 – 71 3878-2198); Maria Bonita (Salvador Shopping, 71 3342-2872/ 2173), e Tarcísio Almeida, em Dona Brígida (Av. Tancredo Neves, 1.632, 71 3112-2160) e Galpão de Estilo (Rua Prof. Sabino Silva, 836, 71 3237-8570

ATALHO MAGID

Kebab na área do Rio Vermelho

Vestido Maria Bonita Preço sob consulta

Das culinárias internacionais servidas em Salvador, a árabe parece ser a que melhor se adaptou ao modelo fast-food. O Magid, inaugurado em 2009, não foge a esta regra. Mas prefere desobedecer a outras. Para acompanhar o chope, sua aposta não é na dupla kibe e esfiha (esta, aliás, entre as melhores da cidade) e sim nos kebabs. São 15 recheios, entre R$ 13,90 e R$ 17,90. Na dúvida, prefira os tradicionais, como o Nasser (falafel, molho taratour e salada), aos mais “brasileiros”, como o Saad (combinação camarão ao alho e óleo, coalhada seca, tomate, cebola e alface). Outras opções são o Magid (shawarma de cordeiro, molho e salada) e, para vegetarianos, o Kalid (coalhada seca, alface, azeitona verde, hortelã e azeite). Quer provar todos? Tem rodízio às terças (R$ 19,90). Se gosta de doce muito doce, prove a belewa (massa folhada, nozes e mel). Há outras opções de doce. O cuidado com os ingredientes, frescos e bem preparados, repete-se no atendimento, rápido e atencioso. No fim, dá para pedir narguile (R$ 18,50) e dividir com amigos. « Texto DIEGO DAMASCENO ddamasceno@grupoatarde.com.br

MAGID KEBAB LOUNGE: R. Borges dos Reis, Rio Vermelho (em frente à Paróquia Santana do Rio Vermelho). DESTAQUE: às quartas, das 21h às 23h30, apresentações de dança do ventre ocorrem na área interna do bar. Mas da varanda também dá para acompanhar.

Fotos THIAGO TEIXEIRA tiagoteixeira@grupoatarde.com.br


22 SALVADOR DOMINGO

Tony Tawil, da Tommy Hilfiger e Lacoste

16/5/2010

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 23

VITRINE DO MUNDO F Lojas de marcas internacionais, como Calvin Klein e Armani Exchange, põem Salvador no negócio rentável das grifes

Texto RONALDO JACOBINA rjacobina@grupoatarde.com.br Fotos THIAGO TEIXEIRA thiagoteixeira@grupoatarde.com.br

oi-se o tempo em que os baianos precisavam atravessar os limites do Estado, ou mesmo do País, para comprar roupas de marcas estrangeiras. Emboraaindanãopossamosnosconsiderarincluídos no mercado fashion global, aos poucos grifes internacionais começam a descobrir que no Nordeste há um público consumidor ávido por estes produtos. Vai lá que não são ainda Louis Vuitton, Prada ou Chanel, mas já pode ser um bom começo. E quem valoriza esses pequenos delírios consumistas deve ter percebido que os principais shoppings da cidade contam agora com algumas marcas famosas,

como Calvin Klein Jeans, Armani Exchange, Tommy Hilfiger, Vuarnet e Lacoste, em seus mixes de lojas. Por trás delas, estão empresários baianos – ou quase –, a maioria com larga experiência no mercado varejista, que apostaram no mercado e, passados alguns anos, já colhem os lucros. É o caso de Ângela Freitas, 50, que há 14 atua no ramo do comércio de moda. Há cerca de três anos, a empresária, natural de Petrolina (PE), trocou uma das mais badaladas grifes nacionais, a Fórum, pela Calvin Klein Jeans. Ângela conta que foi a própria marca que a convidou para se tornar sua franqueada. “O diretor foi da Fórum e já me conhecia. Quando resolveram partir para o Nordeste,mechamaramparaumaconversa. Quando conheci o produto, vi que tinha a ver com os baianos, topei na hora”. A primeira loja foi aberta no Iguatemi, em 2007. A empresária conta que pesou na sua decisão a posição da marca no mercado mundial e, sobretudo, os investimentos num marketing forte. No começo, conta, as pessoas se encantavam com a logomarca estampada na fachada, conferiam a vitrine, mas não entravam. “Provavelmente com receio de ser muito cara”. Experiente, Ângela decidiu colocar os preços das peças na vitrine. A iniciativa deu tão certo que, dois anos depois, abriu a segunda loja em outro shopping da cidade. O passo seguinte foi apostar num outro segmento da marca: o underwear, ou seja, roupa íntima. Hoje, quatro das dez lojas que a empresária possui em Salvador são da Calvin Klein. Duas jeans e duas underwear. “Estou muito satisfeita porque o baiano se identificou”, afirma Ângela, que, emboranãogostedefalardefaturamento, revela que comercializa, a cada estação, cerca de 5,5 mil peças. Ela explica que o público é o mesmo das

Sabrina Machado Furtado, proprietária da Martha Paiva


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Tony Tawil, da Tommy Hilfiger e Lacoste

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VITRINE DO MUNDO F Lojas de marcas internacionais, como Calvin Klein e Armani Exchange, põem Salvador no negócio rentável das grifes

Texto RONALDO JACOBINA rjacobina@grupoatarde.com.br Fotos THIAGO TEIXEIRA thiagoteixeira@grupoatarde.com.br

oi-se o tempo em que os baianos precisavam atravessar os limites do Estado, ou mesmo do País, para comprar roupas de marcas estrangeiras. Emboraaindanãopossamosnosconsiderarincluídos no mercado fashion global, aos poucos grifes internacionais começam a descobrir que no Nordeste há um público consumidor ávido por estes produtos. Vai lá que não são ainda Louis Vuitton, Prada ou Chanel, mas já pode ser um bom começo. E quem valoriza esses pequenos delírios consumistas deve ter percebido que os principais shoppings da cidade contam agora com algumas marcas famosas,

como Calvin Klein Jeans, Armani Exchange, Tommy Hilfiger, Vuarnet e Lacoste, em seus mixes de lojas. Por trás delas, estão empresários baianos – ou quase –, a maioria com larga experiência no mercado varejista, que apostaram no mercado e, passados alguns anos, já colhem os lucros. É o caso de Ângela Freitas, 50, que há 14 atua no ramo do comércio de moda. Há cerca de três anos, a empresária, natural de Petrolina (PE), trocou uma das mais badaladas grifes nacionais, a Fórum, pela Calvin Klein Jeans. Ângela conta que foi a própria marca que a convidou para se tornar sua franqueada. “O diretor foi da Fórum e já me conhecia. Quando resolveram partir para o Nordeste,mechamaramparaumaconversa. Quando conheci o produto, vi que tinha a ver com os baianos, topei na hora”. A primeira loja foi aberta no Iguatemi, em 2007. A empresária conta que pesou na sua decisão a posição da marca no mercado mundial e, sobretudo, os investimentos num marketing forte. No começo, conta, as pessoas se encantavam com a logomarca estampada na fachada, conferiam a vitrine, mas não entravam. “Provavelmente com receio de ser muito cara”. Experiente, Ângela decidiu colocar os preços das peças na vitrine. A iniciativa deu tão certo que, dois anos depois, abriu a segunda loja em outro shopping da cidade. O passo seguinte foi apostar num outro segmento da marca: o underwear, ou seja, roupa íntima. Hoje, quatro das dez lojas que a empresária possui em Salvador são da Calvin Klein. Duas jeans e duas underwear. “Estou muito satisfeita porque o baiano se identificou”, afirma Ângela, que, emboranãogostedefalardefaturamento, revela que comercializa, a cada estação, cerca de 5,5 mil peças. Ela explica que o público é o mesmo das

Sabrina Machado Furtado, proprietária da Martha Paiva


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«Quando conheci o produto, vi que tinha a ver com a Bahia, topei na hora. Estou satisfeita porque o baiano se identificou» Ângela Freitas, Calvin Klein

outras marcas nacionais que possui, ou seja, classes A e B. O preço, segundo pesquisa feita pela reportagem, também anda alinhado com o das nacionais de maior prestígio. Na CKJ, há peças a partir de R$ 79. Na CK Underwear, as cuecas custam a partir de R$39.Astrêslojasdaempresáriatêmcerca de 100 funcionários. Só na franquia da marcaamericana,hámaisdesetemilclientes cadastrados. Muitos moram no interior da Bahia e no Estado vizinho, Sergipe.

MARCA DO CORAÇÃO Com Tony Tawil, 56, a escolha por uma marca estrangeira foi motivada por questões afetivas. Nascido na França, o empresário, que vive na Bahia há 27 anos, deixou a carreira de bancário há 17. Desde a adolescência, identificava-se com a francesa Lacoste. “Procurei os representantes no Brasil, convidei para ir até a minha casa e mostrei meu guarda-roupa, repleto de peças da Lacoste”, conta aos risos. Abriu a primeira há 16 anos no Shopping Barra. Depois vieram as outras três.

No ano passado, Tony, que hoje é o presidente do Clube dos Diretores Lojistas (CDL), decidiu ampliar o negócio e, mais uma vez, optou por uma marca estrangeira. Desta vez, a americana Tommy Hilfiger. Tornou-se concorrente dele mesmo, visto que o carro-chefe das duas marcas é a camisa polo, cujo preço é a partir de R$ 190. “Não gosto de concorrentes”, brinca. A escolha por marcas estrangeiras é porque existia uma brecha no mercado. “Há bons criadores de moda no País, mas havia umalacunaparaamodauniversal”.Porcoleção, ele chega a vender mais de 25 mil peças nas quatro lojas. Para a consultora de moda e estilo Cristina Franco, a entrada das grifes estrangei-

rasnoBrasiltornouotradelocalaindamais profissional e competitivo. “Abriu-se um mercado novo no País, tem muito mais gente consumindo, e as marcas estrangeiras perceberam isso. Com a globalização, ficou tudo muito igual, a moda deixou de ter fronteiras”, explica a especialista, que afirma que a tendência é que esse negócio cresça cada vez mais. Foi essa lacuna que também motivou o Grupo Armani a entrar no Nordeste. Desde novembro do ano passado, uma das marcas da holding italiana, a Armani Exchange, ostenta sua sofisticada logomarca num dos pisos do Salvador Shopping. Para a CEO do grupo no Brasil, Patrícia Gaia, 44, quando a matriz orientou a ex-

«Sentimos que havia uma brecha no mercado de luxo masculino. A ideia era vender estilo, moda e conceito» Sandro Soares, da Bilbao

pansão do grupo no País, Salvador foi escolhida para ser a porta de entrada nas regiões Norte e Nordeste. “Fizemos um trabalho de pesquisa e percebemos que o nosso produto tinha a cara do baiano. Era exatamente o que buscávamos para colocar o pé nessas duas regiões”. Menos de seis meses depois, os resultados superaram as expectativas do empresário. No final deste mês, a grife lança a segunda coleção na Bahia. “Ao longo desses cinco meses, conhecemos, na prática, o gosto do público baiano, por isso, essa nova coleção, certamente, agradará ainda mais aos nossos clientes”. Na Armani Exchange, o preço das peças variaentreR$99eR$1.790.Aexecutivado grupo diz que havia uma demanda reprimida na cidade por produtos mais exclusivos.Tantoque,emboranãoqueiraadiantar muito os planos, a empresa deve expandir a marca para outros Estados das duas regiões. A entrada das marcas estrangeiras, na verdade, se deu bem antes das lojas pró-

Sandro Soares, da Bilbao: sete grifes. Ângela Freitas, da Calvin Klein

prias. Multimarcas, como a Bilbao e a Martha Paiva, foram pioneirasnacomercializaçãoderoupasdegrife.Aprimeira,abertaem 2003, inaugurou o conceito de maison, comum nos grandes centros de moda do mundo. De acordo com os sócios, Sandro Soares e Ivo Barbosa, a loja trabalha com o conceito de corner, onde cada grife tem seu espaço definido. “Sentimos que havia uma brecha no mercado de luxo masculino. A ideia era vender estilo, moda, conceito. Por isso optamos por uma loja de rua”. Nasprateleiras,peçaselooksdegrifes,comoDiesel,LaMartina, Hugo Boss, Penguin, Polo, Ralph Lauren e Armani Jeans. Esta última, apesar de pertencer ao grupo Giorgio Armani, diferencia-se totalmente da Armani Exchange. Além de mais exclusiva, tem preços bem mais salgados. Uma t-shirt, por exemplo, custa a partir de R$ 462. Já os jeans da mesma marca giram em torno de R$ 1.200, mas podem chegar a R$ 1.800, caso de uma peça numerada – apenas 80 unidades no mundo inteiro. Sandro diz que a Bilbao é a única maison exclusivamente masculina no País. No ano passado, a empresa decidiu apostar na modacasualparaatenderaosshoppingse,nopróximosemestre,programa a abertura de mais uma loja do gênero em um outro shoppingcenterdacidade.Apesardaapostanonovomodelo,éamatriz que enche os olhos da dupla e, claro, da seleta clientela para quem uma série de mimos são dedicados. “Temos um serviço de atendimento exclusivo para os nossos


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«Quando conheci o produto, vi que tinha a ver com a Bahia, topei na hora. Estou satisfeita porque o baiano se identificou» Ângela Freitas, Calvin Klein

outras marcas nacionais que possui, ou seja, classes A e B. O preço, segundo pesquisa feita pela reportagem, também anda alinhado com o das nacionais de maior prestígio. Na CKJ, há peças a partir de R$ 79. Na CK Underwear, as cuecas custam a partir de R$39.Astrêslojasdaempresáriatêmcerca de 100 funcionários. Só na franquia da marcaamericana,hámaisdesetemilclientes cadastrados. Muitos moram no interior da Bahia e no Estado vizinho, Sergipe.

MARCA DO CORAÇÃO Com Tony Tawil, 56, a escolha por uma marca estrangeira foi motivada por questões afetivas. Nascido na França, o empresário, que vive na Bahia há 27 anos, deixou a carreira de bancário há 17. Desde a adolescência, identificava-se com a francesa Lacoste. “Procurei os representantes no Brasil, convidei para ir até a minha casa e mostrei meu guarda-roupa, repleto de peças da Lacoste”, conta aos risos. Abriu a primeira há 16 anos no Shopping Barra. Depois vieram as outras três.

No ano passado, Tony, que hoje é o presidente do Clube dos Diretores Lojistas (CDL), decidiu ampliar o negócio e, mais uma vez, optou por uma marca estrangeira. Desta vez, a americana Tommy Hilfiger. Tornou-se concorrente dele mesmo, visto que o carro-chefe das duas marcas é a camisa polo, cujo preço é a partir de R$ 190. “Não gosto de concorrentes”, brinca. A escolha por marcas estrangeiras é porque existia uma brecha no mercado. “Há bons criadores de moda no País, mas havia umalacunaparaamodauniversal”.Porcoleção, ele chega a vender mais de 25 mil peças nas quatro lojas. Para a consultora de moda e estilo Cristina Franco, a entrada das grifes estrangei-

rasnoBrasiltornouotradelocalaindamais profissional e competitivo. “Abriu-se um mercado novo no País, tem muito mais gente consumindo, e as marcas estrangeiras perceberam isso. Com a globalização, ficou tudo muito igual, a moda deixou de ter fronteiras”, explica a especialista, que afirma que a tendência é que esse negócio cresça cada vez mais. Foi essa lacuna que também motivou o Grupo Armani a entrar no Nordeste. Desde novembro do ano passado, uma das marcas da holding italiana, a Armani Exchange, ostenta sua sofisticada logomarca num dos pisos do Salvador Shopping. Para a CEO do grupo no Brasil, Patrícia Gaia, 44, quando a matriz orientou a ex-

«Sentimos que havia uma brecha no mercado de luxo masculino. A ideia era vender estilo, moda e conceito» Sandro Soares, da Bilbao

pansão do grupo no País, Salvador foi escolhida para ser a porta de entrada nas regiões Norte e Nordeste. “Fizemos um trabalho de pesquisa e percebemos que o nosso produto tinha a cara do baiano. Era exatamente o que buscávamos para colocar o pé nessas duas regiões”. Menos de seis meses depois, os resultados superaram as expectativas do empresário. No final deste mês, a grife lança a segunda coleção na Bahia. “Ao longo desses cinco meses, conhecemos, na prática, o gosto do público baiano, por isso, essa nova coleção, certamente, agradará ainda mais aos nossos clientes”. Na Armani Exchange, o preço das peças variaentreR$99eR$1.790.Aexecutivado grupo diz que havia uma demanda reprimida na cidade por produtos mais exclusivos.Tantoque,emboranãoqueiraadiantar muito os planos, a empresa deve expandir a marca para outros Estados das duas regiões. A entrada das marcas estrangeiras, na verdade, se deu bem antes das lojas pró-

Sandro Soares, da Bilbao: sete grifes. Ângela Freitas, da Calvin Klein

prias. Multimarcas, como a Bilbao e a Martha Paiva, foram pioneirasnacomercializaçãoderoupasdegrife.Aprimeira,abertaem 2003, inaugurou o conceito de maison, comum nos grandes centros de moda do mundo. De acordo com os sócios, Sandro Soares e Ivo Barbosa, a loja trabalha com o conceito de corner, onde cada grife tem seu espaço definido. “Sentimos que havia uma brecha no mercado de luxo masculino. A ideia era vender estilo, moda, conceito. Por isso optamos por uma loja de rua”. Nasprateleiras,peçaselooksdegrifes,comoDiesel,LaMartina, Hugo Boss, Penguin, Polo, Ralph Lauren e Armani Jeans. Esta última, apesar de pertencer ao grupo Giorgio Armani, diferencia-se totalmente da Armani Exchange. Além de mais exclusiva, tem preços bem mais salgados. Uma t-shirt, por exemplo, custa a partir de R$ 462. Já os jeans da mesma marca giram em torno de R$ 1.200, mas podem chegar a R$ 1.800, caso de uma peça numerada – apenas 80 unidades no mundo inteiro. Sandro diz que a Bilbao é a única maison exclusivamente masculina no País. No ano passado, a empresa decidiu apostar na modacasualparaatenderaosshoppingse,nopróximosemestre,programa a abertura de mais uma loja do gênero em um outro shoppingcenterdacidade.Apesardaapostanonovomodelo,éamatriz que enche os olhos da dupla e, claro, da seleta clientela para quem uma série de mimos são dedicados. “Temos um serviço de atendimento exclusivo para os nossos


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Noiva NÉCESSAIRE

MARGARIDA NEIDE / AG. A TARDE

clientes. Aquele que não tem tempo de visitar a loja não vai deixar de comprar. Mandamos os produtos até ele. Em casa ou no escritório”. Os produtos só, não. Junto, segue um consultor de moda, que faz a triagem das peças. O profissional atua também como personal stylist. De acordo com o empresário, este serviço exclusivo é solicitado mensalmente por cerca de 70 clientes. “Eles solicitam a consultoria para montar o guarda-roupa da semana. Nosso consultor arruma o closet baseado na agenda do cliente, com três opções de looks para cada ocasião. É só escolher”.

MODA MASCULINA É curioso observar que a maioria das marcas estrangeiras atendem quase que exclusivamente o público masculino. Com exceção da Calvin Klein e da Armani Exchange, que têm um mix equilibrado entre os dois gêneros, as demais dedicam pouco espaço às mulheres. “A Tommy e a Lacoste criam peças femininas, mas numa proporção bem menor. Apenas 15% do mix da Tommy é de peças femininas”, diz Tony Tawil. Mas será que os homens gostam mais de grifes do que as mulheres?Comaexperiênciade19anostrabalhandoexclusivamente com este público, a empresária Sabrina Machado Furtado, 40, proprietária da Martha Paiva, afirma que esta não é a questão. “A mulher baiana de classe A se preocupa mais com os acessórios de

Para a consultora Cristina Franco, tendência é que negócios cresçam ainda mais

marca estrangeira. A roupa, ela prefere aquela que foi pensada para ela. A moda internacional não cabe no corpo da mulher brasileira. As marcas italianas até conseguem chegar próximo, as demais, não”. A empresária já chegou a trabalhar com algumas marcas estrangeiras, como a Stella McCartney e a Dolce & Gabana, hoje vende apenas os jeans da americana 7 (seven). No seu mix, estão produtos made in Brazil de primeira linha, como os vestidos dos estilistas André Lima, Fause Haten e Danilo Uitch. Algumas peças chegam a custar até R$ 10 mil. “Minhas clientes não olham a etiqueta nem o preço, mas a qualidade do produto”. Para Cristina Franco, essa coisa de gêneros não se aplica mais à moda. “Ninguém impede que uma mulher use uma t-shirt masculina, até porque, a depender do acessório, vai ficar feminina e chiquérrima. Há até um termo muito usado pelos americanos, que é boyfriend jacket, a jaqueta do namorado. A apropriação do guarda-roupa masculino pela mulher é totalmente legítima”. Masculina, feminina ou unissex – termo que a consultora detesta –, certo é que, mesmo devagar, as marcas estrangeiras já são uma realidade pelas bandas de cá. Mas não pense que ser estrangeira é o bastanteparaseduzirosbaianos.“Temqueter a pegada, o jeito despojado do baiano, do contrário, não vai comprar”, assegura Ângela Freitas, que administra outras marcas jovens brasileiras, como a Osklen. Para Cristina Franco, as grandes marcas internacionais já aprenderam que é precisoconheceropúblicoquequeremconquistar para se adaptar a ele. É o que vem fazendo a Armani Exchange. “Testamos o público baiano na primeira coleção. Agora já sabemos o que ele quer”, diz a executiva Patrícia Gaia. «

Pensando em casar? Veja algumas peças que podem tornar a festa mais alegre

1

ENFEITE EM MADEIRA R$ 116

No topo do bolo, o casal e o cachorro

Agarre o seu amor pela cintura CINTO Preço sob consulta

3

2

Bem tradicional, mas sem caretice PAR DE ALIANÇAS EM OURO E PRATA R$ 1.598

4

Para se sentir numa festa em Veneza MÁSCARA FÁBIO SANDE Preço sob consulta

Produção REVISTA MUITO revistamuito@grupoatarde.com.br ONDE ENCONTRAR 1 e 2. Etsy (http://www.etsy.com/shop/nakedpeggies). 3. Cinto Marco Apollônio para Vitorino Campos (www.vitorinocampos.com.br, 71 3234-4196). 4. Fábio Sande (71 8878-5334).


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MARGARIDA NEIDE / AG. A TARDE

clientes. Aquele que não tem tempo de visitar a loja não vai deixar de comprar. Mandamos os produtos até ele. Em casa ou no escritório”. Os produtos só, não. Junto, segue um consultor de moda, que faz a triagem das peças. O profissional atua também como personal stylist. De acordo com o empresário, este serviço exclusivo é solicitado mensalmente por cerca de 70 clientes. “Eles solicitam a consultoria para montar o guarda-roupa da semana. Nosso consultor arruma o closet baseado na agenda do cliente, com três opções de looks para cada ocasião. É só escolher”.

MODA MASCULINA É curioso observar que a maioria das marcas estrangeiras atendem quase que exclusivamente o público masculino. Com exceção da Calvin Klein e da Armani Exchange, que têm um mix equilibrado entre os dois gêneros, as demais dedicam pouco espaço às mulheres. “A Tommy e a Lacoste criam peças femininas, mas numa proporção bem menor. Apenas 15% do mix da Tommy é de peças femininas”, diz Tony Tawil. Mas será que os homens gostam mais de grifes do que as mulheres?Comaexperiênciade19anostrabalhandoexclusivamente com este público, a empresária Sabrina Machado Furtado, 40, proprietária da Martha Paiva, afirma que esta não é a questão. “A mulher baiana de classe A se preocupa mais com os acessórios de

Para a consultora Cristina Franco, tendência é que negócios cresçam ainda mais

marca estrangeira. A roupa, ela prefere aquela que foi pensada para ela. A moda internacional não cabe no corpo da mulher brasileira. As marcas italianas até conseguem chegar próximo, as demais, não”. A empresária já chegou a trabalhar com algumas marcas estrangeiras, como a Stella McCartney e a Dolce & Gabana, hoje vende apenas os jeans da americana 7 (seven). No seu mix, estão produtos made in Brazil de primeira linha, como os vestidos dos estilistas André Lima, Fause Haten e Danilo Uitch. Algumas peças chegam a custar até R$ 10 mil. “Minhas clientes não olham a etiqueta nem o preço, mas a qualidade do produto”. Para Cristina Franco, essa coisa de gêneros não se aplica mais à moda. “Ninguém impede que uma mulher use uma t-shirt masculina, até porque, a depender do acessório, vai ficar feminina e chiquérrima. Há até um termo muito usado pelos americanos, que é boyfriend jacket, a jaqueta do namorado. A apropriação do guarda-roupa masculino pela mulher é totalmente legítima”. Masculina, feminina ou unissex – termo que a consultora detesta –, certo é que, mesmo devagar, as marcas estrangeiras já são uma realidade pelas bandas de cá. Mas não pense que ser estrangeira é o bastanteparaseduzirosbaianos.“Temqueter a pegada, o jeito despojado do baiano, do contrário, não vai comprar”, assegura Ângela Freitas, que administra outras marcas jovens brasileiras, como a Osklen. Para Cristina Franco, as grandes marcas internacionais já aprenderam que é precisoconheceropúblicoquequeremconquistar para se adaptar a ele. É o que vem fazendo a Armani Exchange. “Testamos o público baiano na primeira coleção. Agora já sabemos o que ele quer”, diz a executiva Patrícia Gaia. «

Pensando em casar? Veja algumas peças que podem tornar a festa mais alegre

1

ENFEITE EM MADEIRA R$ 116

No topo do bolo, o casal e o cachorro

Agarre o seu amor pela cintura CINTO Preço sob consulta

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Bem tradicional, mas sem caretice PAR DE ALIANÇAS EM OURO E PRATA R$ 1.598

4

Para se sentir numa festa em Veneza MÁSCARA FÁBIO SANDE Preço sob consulta

Produção REVISTA MUITO revistamuito@grupoatarde.com.br ONDE ENCONTRAR 1 e 2. Etsy (http://www.etsy.com/shop/nakedpeggies). 3. Cinto Marco Apollônio para Vitorino Campos (www.vitorinocampos.com.br, 71 3234-4196). 4. Fábio Sande (71 8878-5334).


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Do tempo da costura Na Rua do Cabeça, no Dois de Julho, um armarinho resiste há mais de meio século, desafiando os shoppings

Texto TATIANA MENDONÇA tmendonca@grupoatarde.com.br Fotos THIAGO TEIXEIRA thiagoteixeira@grupoatarde.com.br

A

trás do caixa, a mulher de longas unhas rubras e sombra lilás nos olhos não sabe muito bem como lidar com cartões de crédito. É de um outro tempo. Domina apenas a tecnologia do pagamento em dinheiro, do troco em moedas. Colado ao vidro que parcialmente a encobre, um bilhete laranja avisa: “Estamos aqui desde 1958, mais de 50 anos”. A quem tem amor à precisão, o São Luiz ArmarinhoModasLtda.completaráexatos 52 anos no próximo sábado, avisa D. Liete Sampaio, 80, que no dia 22 de maio de 1958 fundou a lojinha com o marido, Luiz da França, há mais de 20 anos falecido. Ela ainda vai à loja todos os dias, religio-

samente, ignorando os apelos dos dois filhos para ficar em casa descansando. “Como é que eu vou ficar lá, se o meu pensamento está aqui? Enquanto Deus permitir, venho”. É ela quem abre o armarinho, às 8h30, e quem o fecha, às 18h. Teve de ir se acostumando às mudanças, é o preço que pagam os sobreviventes. “Mudou para pior. O comércio era totalmente diferente, aí vieram os shoppings... Hoje a pessoa compra uma blusa de R$ 20, e ainda pode dividir. Antes, tudo se costurava. Se a mulher estava de nenê, tinha de fazer todo o enxoval, à mão”. A Rua do Cabeça, no Dois de Julho, onde a loja por todo esse tempo funciona, também ganhou novas formas. Os vizinhos, antes restaurantes, açougues, até a famo-

sa boate Anjo Azul, foram se mimetizando em outros armarinhos, também cheios de coloridas miudezas. “Veio tudo atrás de mim”, diz Liete, com cara de pouco caso. “Não tenho muito dinheiro, mas também não tenho dívidas”.

VIDA NO BALCÃO Mesmo andando há tantos anos entre linhas, fivelas, plumas, paetês e tudo mais que se preste a aviamentos e bordados, ela nunca pregou um botão. “Minha vida semprefoinobalcão”.Osempresecontadesde seus 15 anos, quando mocinha foi trabalharnaBaixadosSapateiros,naCasaCairu. Foi lá que conheceu seu Luiz, o amor e tudo mais. Quando se casaram, foram viver em São Paulo, onde também abriram um ar-

marinho. Deu saudade e, na volta, nasceu o São Luiz. Sentadanumacadeirademadeiranofundodaloja,umolhonas minhasanotações,outronocaixa,aelegantesenhoravaipuxando suas memórias. “Sábado de Carnaval era uma loucura. Todo mundo queria comprar alguma coisa para a fantasia de ir ao Baile dos Fantoches. Hoje, é tudo abadá, não tem mais nada disso”. A filha de Liete, Maria de Fátima, 57, a ajuda no caixa. “Desde que meu pai morreu, há 24 anos, estou aqui direto. Eu pego mais os cartões, oriento as meninas, fico aqui na retaguarda”. A conversa é interrompida por Maria Freitas, 78, que elogia a elegância de D. Liete, e ralha do desleixo da filha. “Você está precisando dar um jeito nesse cabelo, porque sua mãe é sempre assim bonita, arrumada”, brinca sério.

Dona Liete comanda o armarinho há 52 anos

Pode-se acreditar no testemunho, já que é cliente antiga, vai ali “desde sempre”. Antes, para comprar aviamentos para costura, agora, material para os seus artesanatos. “Faço fuxico no Instituto Mauá. Depois de velha, virei fuxiqueira”, ri. Ela passa por lá de duas a três vezes por semana. “É uma loja antiga, igual a mim. Só compro em outro lugar se não encontro aqui”. Figurinistas de teatro e cinema, como Miguel Carvalho e Maurício Martins, também batem ponto por lá, Fátima informa.


28 SALVADOR DOMINGO

16/5/2010

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 29

Do tempo da costura Na Rua do Cabeça, no Dois de Julho, um armarinho resiste há mais de meio século, desafiando os shoppings

Texto TATIANA MENDONÇA tmendonca@grupoatarde.com.br Fotos THIAGO TEIXEIRA thiagoteixeira@grupoatarde.com.br

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trás do caixa, a mulher de longas unhas rubras e sombra lilás nos olhos não sabe muito bem como lidar com cartões de crédito. É de um outro tempo. Domina apenas a tecnologia do pagamento em dinheiro, do troco em moedas. Colado ao vidro que parcialmente a encobre, um bilhete laranja avisa: “Estamos aqui desde 1958, mais de 50 anos”. A quem tem amor à precisão, o São Luiz ArmarinhoModasLtda.completaráexatos 52 anos no próximo sábado, avisa D. Liete Sampaio, 80, que no dia 22 de maio de 1958 fundou a lojinha com o marido, Luiz da França, há mais de 20 anos falecido. Ela ainda vai à loja todos os dias, religio-

samente, ignorando os apelos dos dois filhos para ficar em casa descansando. “Como é que eu vou ficar lá, se o meu pensamento está aqui? Enquanto Deus permitir, venho”. É ela quem abre o armarinho, às 8h30, e quem o fecha, às 18h. Teve de ir se acostumando às mudanças, é o preço que pagam os sobreviventes. “Mudou para pior. O comércio era totalmente diferente, aí vieram os shoppings... Hoje a pessoa compra uma blusa de R$ 20, e ainda pode dividir. Antes, tudo se costurava. Se a mulher estava de nenê, tinha de fazer todo o enxoval, à mão”. A Rua do Cabeça, no Dois de Julho, onde a loja por todo esse tempo funciona, também ganhou novas formas. Os vizinhos, antes restaurantes, açougues, até a famo-

sa boate Anjo Azul, foram se mimetizando em outros armarinhos, também cheios de coloridas miudezas. “Veio tudo atrás de mim”, diz Liete, com cara de pouco caso. “Não tenho muito dinheiro, mas também não tenho dívidas”.

VIDA NO BALCÃO Mesmo andando há tantos anos entre linhas, fivelas, plumas, paetês e tudo mais que se preste a aviamentos e bordados, ela nunca pregou um botão. “Minha vida semprefoinobalcão”.Osempresecontadesde seus 15 anos, quando mocinha foi trabalharnaBaixadosSapateiros,naCasaCairu. Foi lá que conheceu seu Luiz, o amor e tudo mais. Quando se casaram, foram viver em São Paulo, onde também abriram um ar-

marinho. Deu saudade e, na volta, nasceu o São Luiz. Sentadanumacadeirademadeiranofundodaloja,umolhonas minhasanotações,outronocaixa,aelegantesenhoravaipuxando suas memórias. “Sábado de Carnaval era uma loucura. Todo mundo queria comprar alguma coisa para a fantasia de ir ao Baile dos Fantoches. Hoje, é tudo abadá, não tem mais nada disso”. A filha de Liete, Maria de Fátima, 57, a ajuda no caixa. “Desde que meu pai morreu, há 24 anos, estou aqui direto. Eu pego mais os cartões, oriento as meninas, fico aqui na retaguarda”. A conversa é interrompida por Maria Freitas, 78, que elogia a elegância de D. Liete, e ralha do desleixo da filha. “Você está precisando dar um jeito nesse cabelo, porque sua mãe é sempre assim bonita, arrumada”, brinca sério.

Dona Liete comanda o armarinho há 52 anos

Pode-se acreditar no testemunho, já que é cliente antiga, vai ali “desde sempre”. Antes, para comprar aviamentos para costura, agora, material para os seus artesanatos. “Faço fuxico no Instituto Mauá. Depois de velha, virei fuxiqueira”, ri. Ela passa por lá de duas a três vezes por semana. “É uma loja antiga, igual a mim. Só compro em outro lugar se não encontro aqui”. Figurinistas de teatro e cinema, como Miguel Carvalho e Maurício Martins, também batem ponto por lá, Fátima informa.


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SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 31

Ela até guardou o jornal no qual os clientes famosos aparecem. Nos tempos áureos, a loja chegou a ter 21 funcionários, hoje são sete, todos com carteira assinada. “Não tem condições de ter mais gente porque os encargos são muito pesados”, explica Luiz, 59, também filho de Liete, para quem a mãe é a “Hebe Camargo da Bahia”. Luiz é professor universitário e, quando tem um tempo livre, vai à loja. É ele quem se lembra de mostrar uma pequena relíquia, o livro em que o pai, que só estudou até a 5ª série, registrou, com letra bordada de professor, as primeiras vendas. Ao lado da soma em Cruzeiro Velho, apontava quanto devia pagar de imposto.

O armarinho reúne um mix de miudezas coloridas

SÃO LUIZ ARMARINHO Rua do Cabeça, 112, Largo Dois de Julho. (71) 3321-4420

Também foi o pai, de quem herdou o nome, que inventou “o melhorcomputadorquepodiaexistir”.Peloseusistema,épossível encontrar com facilidade qualquer mercadoria. “Veja só, os mostruários são giratórios e indicam o número da caixa em que cada uma está. Na caixa, tem uma ficha com o ano em que foi comprada e quanto ainda há no estoque”, explica. Na caixa 25, um bico bordado comprado em 1978, ainda em ótimo estado. “Aqui, ó. Ele comprou 80 metros, e ainda tem três peças no estoque”. As funcionárias, como as clientes, costumam passar muitos anosporlá.MarlenedaCruzOliveira,idadenãorevelada,jáé“parte” do São Luiz. Quando ela sai de férias, as compradoras ficam logosaudosas.“ElastrazemumpedacinhodelinhaeMarlenelogo consegue achar. Conhece tudo aqui”, entrega Fátima. Marlene gosta tanto da loja que já se aposentou, mas preferiu voltar ao balcão. “Trabalho aqui desde o dia 1º de abril de 1973. Eu não sabia fazer nada, nada. Foi seu Luiz quem me ensinou a trabalhar, a fazer conta... Aqui é como se fosse minha casa”. «

Texto e fotos HELDER FLORENTINO ojale.08@gmail.com

Um tesouro exótico guardado em jardim real Em 1890, foi construído o Orquidário do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, ampliado e reformado sucessivamente nos anos 1930 e 1950. Trata-se de um espetáculo à parte naquela área, uma das mais verdes e preservadas da cidade. Assim como todo o restante do antigo jardim – que abriga uma grande diversidade de plantas brasileiras e estrangeiras –, o orquidário guarda cerca de 600 espécies diferentes de orquídea, compondo uma majestosa coleção. Em seu salão principal, num formato octogonal – que lembra as antigas salas de dança por sua estrutura quase real –, pode-se apreciar a beleza suave, delicada e, ainda assim, tropical e selva-

gem das orquídeas. Em sua grande maioria, são brasileiras, mas há também espécies exóticas e híbridas. Anexo ao salão principal das flores, há uma bela fonte de água – “jogue sua moeda e faça um pedido”–eumpequenolaboratórioparaapesquisa e o estudo de espécies, que é ocupado pelos botânicos que trabalham no orquidário. A diversidade de tamanhos e cores permite mais do que elogios. Também vale levar uma câmera e registrar tudo em fotos para guardar como lembrança do passeio pela coleção histórica de orquídeas. Iniciada no fim do século 18, até hoje ela encanta os visitantes. «

DICA Não deixe de visitar o bromeliário, com mais de 1.700 bromélias de diversas formações, e os lagos e fontes do período da família real no Brasil

Helder Florentino é publicitário, professor e leitor de Muito

» MANDE SUA DICA DE UM LUGAR NO MUNDO PARA REVISTAMUITO@GRUPOATARDE.COM.BR

SATÉLITE ORQUIDÁRIO DO JARDIM BOTÂNICO RIO DE JANEIRO


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Ela até guardou o jornal no qual os clientes famosos aparecem. Nos tempos áureos, a loja chegou a ter 21 funcionários, hoje são sete, todos com carteira assinada. “Não tem condições de ter mais gente porque os encargos são muito pesados”, explica Luiz, 59, também filho de Liete, para quem a mãe é a “Hebe Camargo da Bahia”. Luiz é professor universitário e, quando tem um tempo livre, vai à loja. É ele quem se lembra de mostrar uma pequena relíquia, o livro em que o pai, que só estudou até a 5ª série, registrou, com letra bordada de professor, as primeiras vendas. Ao lado da soma em Cruzeiro Velho, apontava quanto devia pagar de imposto.

O armarinho reúne um mix de miudezas coloridas

SÃO LUIZ ARMARINHO Rua do Cabeça, 112, Largo Dois de Julho. (71) 3321-4420

Também foi o pai, de quem herdou o nome, que inventou “o melhorcomputadorquepodiaexistir”.Peloseusistema,épossível encontrar com facilidade qualquer mercadoria. “Veja só, os mostruários são giratórios e indicam o número da caixa em que cada uma está. Na caixa, tem uma ficha com o ano em que foi comprada e quanto ainda há no estoque”, explica. Na caixa 25, um bico bordado comprado em 1978, ainda em ótimo estado. “Aqui, ó. Ele comprou 80 metros, e ainda tem três peças no estoque”. As funcionárias, como as clientes, costumam passar muitos anosporlá.MarlenedaCruzOliveira,idadenãorevelada,jáé“parte” do São Luiz. Quando ela sai de férias, as compradoras ficam logosaudosas.“ElastrazemumpedacinhodelinhaeMarlenelogo consegue achar. Conhece tudo aqui”, entrega Fátima. Marlene gosta tanto da loja que já se aposentou, mas preferiu voltar ao balcão. “Trabalho aqui desde o dia 1º de abril de 1973. Eu não sabia fazer nada, nada. Foi seu Luiz quem me ensinou a trabalhar, a fazer conta... Aqui é como se fosse minha casa”. «

Texto e fotos HELDER FLORENTINO ojale.08@gmail.com

Um tesouro exótico guardado em jardim real Em 1890, foi construído o Orquidário do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, ampliado e reformado sucessivamente nos anos 1930 e 1950. Trata-se de um espetáculo à parte naquela área, uma das mais verdes e preservadas da cidade. Assim como todo o restante do antigo jardim – que abriga uma grande diversidade de plantas brasileiras e estrangeiras –, o orquidário guarda cerca de 600 espécies diferentes de orquídea, compondo uma majestosa coleção. Em seu salão principal, num formato octogonal – que lembra as antigas salas de dança por sua estrutura quase real –, pode-se apreciar a beleza suave, delicada e, ainda assim, tropical e selva-

gem das orquídeas. Em sua grande maioria, são brasileiras, mas há também espécies exóticas e híbridas. Anexo ao salão principal das flores, há uma bela fonte de água – “jogue sua moeda e faça um pedido”–eumpequenolaboratórioparaapesquisa e o estudo de espécies, que é ocupado pelos botânicos que trabalham no orquidário. A diversidade de tamanhos e cores permite mais do que elogios. Também vale levar uma câmera e registrar tudo em fotos para guardar como lembrança do passeio pela coleção histórica de orquídeas. Iniciada no fim do século 18, até hoje ela encanta os visitantes. «

DICA Não deixe de visitar o bromeliário, com mais de 1.700 bromélias de diversas formações, e os lagos e fontes do período da família real no Brasil

Helder Florentino é publicitário, professor e leitor de Muito

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SATÉLITE ORQUIDÁRIO DO JARDIM BOTÂNICO RIO DE JANEIRO


32 SALVADOR DOMINGO

Bel Borba no gradil que criou para o Terreiro da Casa Branca

16/5/2010

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 33

Cavalheiro DAS RUAS Texto MARCOS DIAS mdias@grupoatarde.com.br Fotos MARCO AURÉLIO MARTINS mmartins@grupoatarde.com.br

Mosaicos e obras de arte espalhados pela cidade dão pistas da criatividade, ousadia e talento de Bel Borba

L

á está você, passando pelo Rio Vermelho, e se depara com um morcegão sob um túnel. Mais adiante, vê um capoeirista dando vida àquela parede que não era nada. Segue no sentido a Itapuã e se depara, em Piatã, com uma sala de estar de ferro. Perto da pista, diante do coqueiral, uma sala de estar! Vai até as proximidades da Rua K e vê, na beira da praia, um painel com ambulantes que frequentam o local, o vendedor de queijo, a baiana que vende acarajé, o hippie. O autor dessas cenas, que acabaram se plasmando ao cotidiano da cidade, é o artista visual Bel Borba, 53, que, quando

criança, costumava brincar, isto é, estragar os pincéis, tintas e canetas de nanquim do irmão mais velho. Num quadro que o mano havia feito, a propósito, Bel também achou por bem fazer uma colagem, sua primeira ensemblage, que acabou indo parar na primeira exposição que fez, na Galeria Cañizares,naEscoladeBelasArtesdaUfba, em 1975. Mas, antes das galerias e dos projetos a quesededicaequeespalhapelacidade,foi observando frases como “abaixo a ditadura” ou “abaixo o imperialismo”, escritas nos muros do bairro do Garcia por militantes indignados com o golpe militar de 64, que o artista passou a entender que as ruas

poderiam ser suportes para outras expressões. Não sabia que, anos depois, seu nome estaria radicalmente associado à arte feita nos espaços públicos de Salvador.

VAIDADE ROMÂNTICA A habilidade com desenho e pintura, que se expressou desde cedo, é uma marca deBel,mesmoquandosededicaaprojetos contemporâneos, designados como instalação, intervenção e site specific. “Por questão de vaidade romântica, quer dizer, modernista, não me conformaria se não soubesse desenhar”, admite ele, já que atualmente desenho e pintura não são pré-requisitos para fazer de alguém um artista.


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Bel Borba no gradil que criou para o Terreiro da Casa Branca

16/5/2010

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 33

Cavalheiro DAS RUAS Texto MARCOS DIAS mdias@grupoatarde.com.br Fotos MARCO AURÉLIO MARTINS mmartins@grupoatarde.com.br

Mosaicos e obras de arte espalhados pela cidade dão pistas da criatividade, ousadia e talento de Bel Borba

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á está você, passando pelo Rio Vermelho, e se depara com um morcegão sob um túnel. Mais adiante, vê um capoeirista dando vida àquela parede que não era nada. Segue no sentido a Itapuã e se depara, em Piatã, com uma sala de estar de ferro. Perto da pista, diante do coqueiral, uma sala de estar! Vai até as proximidades da Rua K e vê, na beira da praia, um painel com ambulantes que frequentam o local, o vendedor de queijo, a baiana que vende acarajé, o hippie. O autor dessas cenas, que acabaram se plasmando ao cotidiano da cidade, é o artista visual Bel Borba, 53, que, quando

criança, costumava brincar, isto é, estragar os pincéis, tintas e canetas de nanquim do irmão mais velho. Num quadro que o mano havia feito, a propósito, Bel também achou por bem fazer uma colagem, sua primeira ensemblage, que acabou indo parar na primeira exposição que fez, na Galeria Cañizares,naEscoladeBelasArtesdaUfba, em 1975. Mas, antes das galerias e dos projetos a quesededicaequeespalhapelacidade,foi observando frases como “abaixo a ditadura” ou “abaixo o imperialismo”, escritas nos muros do bairro do Garcia por militantes indignados com o golpe militar de 64, que o artista passou a entender que as ruas

poderiam ser suportes para outras expressões. Não sabia que, anos depois, seu nome estaria radicalmente associado à arte feita nos espaços públicos de Salvador.

VAIDADE ROMÂNTICA A habilidade com desenho e pintura, que se expressou desde cedo, é uma marca deBel,mesmoquandosededicaaprojetos contemporâneos, designados como instalação, intervenção e site specific. “Por questão de vaidade romântica, quer dizer, modernista, não me conformaria se não soubesse desenhar”, admite ele, já que atualmente desenho e pintura não são pré-requisitos para fazer de alguém um artista.


16/5/2010

Mas nem pensa em se afastar da pintura. Sabe que isso “de artista e de sucesso” foi relativizado nesses tempos. “Para mim, só é artista quem avança e transgride, aí se está fazendo arte. Porque apenas fazer muito bem uma coisa pode torná-lo um virtuoso, mas não faz de você um artista. Se todo mundo que faz bem uma coisa é artista, imagine um artista que faz uma coisa bem?”, questiona, com o curso do pensamento acelerado, como se quisesse se expressar de forma instantânea, coisa que a linguagem não dá conta. É que a criatividade, como defende, não deveria ser uma prerrogativa apenas de artistas. “É um recurso espetacular para viver,parasesalvar,paralutar,parafugir,para crescer”, teoriza Bel, que compara essa habilidade humana – ligada particularmente às artes –, à exuberância da natureza. Basta ter uma dificuldade, ou observar que alguém próximo atravessa alguma, que ele busca a solução. “Fico pensando e logo me vem como resolver, tenho essa natureza”. Tanto quanto pintar ou usar sua criatividade, o artista tem “muito gosto” mesmo é de ser um cavalheiro. Hoje até se sente mais compreensivo e melhor no tratamento com as mulheres do que quando era mais jovem. E garante que, pelo seu modo de tratar as pessoas, já viu muitos amigos abandonarem “o jeito estrela de ser”: sabe que ninguém é melhor que ninguém e se orienta por uma necessidade de fazer o outro se sentir cada vez melhor. Incentiva trabalho voluntário, por exemplo, certo de que o mundo é grande e não basta ser bom e generoso com familiares. Por isso mesmo, talvez, diga com convicção: “Eu jamais, em nenhum momento, mesmo estando apaixonado ou inebriado por algum drink, em nenhum momento da minha vida quis ser pai”.

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 35

«Bel está presente na cidade e consegue fazer o que todo artista sonha, que é ser consumido» César Romero, crítico de arte

Peça da exposição Saveiro entre eles Saveiro, de 2008

SANDRA TRAVASSOS / DIVULGAÇÃO

34 SALVADOR DOMINGO

Filho de advogados, Bel acredita que se aproxima mais do temperamento da mãe, hoje com 86 anos, com quem passa dois dias da semana. Mais que mãe, dona Norma é alguém que nunca estranhou qualquer coisa que ele dissesse. E além dos dias que passa com ela, na Pituba, Bel se divide entre a casa da atual namorada, no Lucaia, onde montou um escritório, e um estúdio no Santo Antônio Além do Carmo, mas também tem um apartamento no Rio Vermelho e um ateliê na Ilha de Itaparica. Seu maior sonho hoje é reunir todas essas instâncias com que se espalha na cidade, aliás, como as suas obras, principalmente pelo estresse que significa hoje ir de qualquer lugar a outro em Salvador. Uma hipertensão recém-diagnosticada também pede que ele desacelere. Bel não tem medo de morrer, mas quer apenas entregarascoisasqueprometeu.“Aindaquero realizar coisas na cidade e creio que contribuí para que as pessoas se deparem na rua com obras de arte e que também isso aumenta o repertório da cidade”. Com uma capacidade de produção intensa, Bel acredita que o melhor que pode fazer hoje por sua carreira é tentar se organizar um pouco, “senão vai virar um caos”. É que ele não tem mais o que chama de sangue-frio. “Eu arriscava. Hoje, preciso acabar um trabalho com antecedência, para poder corrigir se eu não gostar”. Tem sido assim, por exemplo, nas três últimas exposições que fez, participando da Associação Viva Saveiros, que objetiva restaurar essas embarcações e mantê-las em suas rotas originais. Ao se associar, acabou também se aproximando do universo da Baía de Todos-os-Santos e, por extensão, da Feira de São Joaquim e da Rampa do Mercado. “É uma causa bem-sucedida”, comemora, por não deixar morrerem os ofícios dos que lidam com os barcos.

BURT SUN / DIVULGAÇÃO

A PONTE E se dona Norma nunca se espantou com nada que o filho dissesse, o que será que ela acha da construção da ponte para a ilha? Bel diz que não é, absolutamente, por causa do seu ateliê na localidade (“seria mesquinho”), mas é a favor, sim, da construção. Embora reconheça que haverá impacto ambiental, afirma que o que faz mal à ilha está chegando, mesmo sem ponte. Através do crack, por exemplo. Sem contar que “Itaparica não tem estrutura para nada e aquele ferryboat é um inferno”. Uma boa solução, a seu ver, é poder morar em Gandu, em Ipiaú, em Valença e poder trabalhar em Salvador. “Não é se aproximar só da ilha, não, mas se aproximar do sul da Bahia, da Baía de Camamu. Mas também acho uma pena dar as costas para a Baía de Aratu e para a Suburbana. Salvador não é a Linha Verde. Salvador é o coração da Baía de Todos-os-Santos”. Enquanto a tal da ponte ainda vai dar muito o que falar, com estranhamento ou não, Bel vai se dedicando a novas técnicas. Agora, é a vez do bronze, e ele, que se orgulha de que sempre aprendeu novas técnicas fazendo, já está nas primeiras fundições. Ao longo da carreira, também apren-

Um dos aviões pintados para a exposição Aeroplanos Híbridos, no hangar do aeroporto, em 2010 deu com a publicidade e o teatro. O artista visual e crítico César Romero, que esteve na primeira exposição de Bel, destaca que ele é um artista múltiplo e profundamente inquieto e de ímpeto. Não está,aseuver,preocupadocomcoerênciaestilística, mas em produzir – a coerência estaria no seu pensamento. “Bel está presente na cidade e consegue fazer o que todo artistasonha,queéserconsumidopelapopulação. Costumo dizer: ‘Bel é pop, meu rei’”. Sem contar, como enfatiza Romero, que é uma pessoa ética e de “fino trato”. Além disso, tem um temperamento que, quando quer fazer algo, vai lá e faz, com ou sem apoio. Mas uma das construções que mais se orgulha, se não a que mais se orgulha, precisou da aprovação – dos búzios – para que acontecesse: é dele também o gradil do Terreiro da Casa Branca, espetáculo permanente que, graças aos orixás, num terreno tombado como patrimônio histórico do Brasil, vai durar, como a própria tradição. Bel lamenta, nesses quase 40 anos de carreira, não ter participado nos anos 1970

de uma Bienal de São Paulo, em que houve umapré-seleçãonaBahia,masdepoissoube que era aberta a quem quisesse participar. As coisas poderiam ter tomado outros rumos, imagina, porém não guarda ressentimentos. E nem participa de editais públicos. Aquele cão enorme que ele fez em fibra no Largo de Santana, próximo ao Acarajé da Dinha, vigia tudo e toma conta de um cantinho da cidade, em especial, em que tem mostrado seus trabalhos. Agora, planeja fazer uma coleção de esculturas, não uma nem duas peças, uma coleção, para incorporar à cidade até a Copa do Brasil. Tem quatro anos. Não acha que o Estado deve ser responsabilizado pela conservação das obras que coloca, espontaneamente, no espaço público. Acha que o público é que tem que zelar. E não para de produzi-las. “Vou sendo empurrado por minhas solicitações. Sabe quando você está numa multidão e quase já nem pisa no chão e vai indo? Eu vou indo”. «


16/5/2010

Mas nem pensa em se afastar da pintura. Sabe que isso “de artista e de sucesso” foi relativizado nesses tempos. “Para mim, só é artista quem avança e transgride, aí se está fazendo arte. Porque apenas fazer muito bem uma coisa pode torná-lo um virtuoso, mas não faz de você um artista. Se todo mundo que faz bem uma coisa é artista, imagine um artista que faz uma coisa bem?”, questiona, com o curso do pensamento acelerado, como se quisesse se expressar de forma instantânea, coisa que a linguagem não dá conta. É que a criatividade, como defende, não deveria ser uma prerrogativa apenas de artistas. “É um recurso espetacular para viver,parasesalvar,paralutar,parafugir,para crescer”, teoriza Bel, que compara essa habilidade humana – ligada particularmente às artes –, à exuberância da natureza. Basta ter uma dificuldade, ou observar que alguém próximo atravessa alguma, que ele busca a solução. “Fico pensando e logo me vem como resolver, tenho essa natureza”. Tanto quanto pintar ou usar sua criatividade, o artista tem “muito gosto” mesmo é de ser um cavalheiro. Hoje até se sente mais compreensivo e melhor no tratamento com as mulheres do que quando era mais jovem. E garante que, pelo seu modo de tratar as pessoas, já viu muitos amigos abandonarem “o jeito estrela de ser”: sabe que ninguém é melhor que ninguém e se orienta por uma necessidade de fazer o outro se sentir cada vez melhor. Incentiva trabalho voluntário, por exemplo, certo de que o mundo é grande e não basta ser bom e generoso com familiares. Por isso mesmo, talvez, diga com convicção: “Eu jamais, em nenhum momento, mesmo estando apaixonado ou inebriado por algum drink, em nenhum momento da minha vida quis ser pai”.

SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 35

«Bel está presente na cidade e consegue fazer o que todo artista sonha, que é ser consumido» César Romero, crítico de arte

Peça da exposição Saveiro entre eles Saveiro, de 2008

SANDRA TRAVASSOS / DIVULGAÇÃO

34 SALVADOR DOMINGO

Filho de advogados, Bel acredita que se aproxima mais do temperamento da mãe, hoje com 86 anos, com quem passa dois dias da semana. Mais que mãe, dona Norma é alguém que nunca estranhou qualquer coisa que ele dissesse. E além dos dias que passa com ela, na Pituba, Bel se divide entre a casa da atual namorada, no Lucaia, onde montou um escritório, e um estúdio no Santo Antônio Além do Carmo, mas também tem um apartamento no Rio Vermelho e um ateliê na Ilha de Itaparica. Seu maior sonho hoje é reunir todas essas instâncias com que se espalha na cidade, aliás, como as suas obras, principalmente pelo estresse que significa hoje ir de qualquer lugar a outro em Salvador. Uma hipertensão recém-diagnosticada também pede que ele desacelere. Bel não tem medo de morrer, mas quer apenas entregarascoisasqueprometeu.“Aindaquero realizar coisas na cidade e creio que contribuí para que as pessoas se deparem na rua com obras de arte e que também isso aumenta o repertório da cidade”. Com uma capacidade de produção intensa, Bel acredita que o melhor que pode fazer hoje por sua carreira é tentar se organizar um pouco, “senão vai virar um caos”. É que ele não tem mais o que chama de sangue-frio. “Eu arriscava. Hoje, preciso acabar um trabalho com antecedência, para poder corrigir se eu não gostar”. Tem sido assim, por exemplo, nas três últimas exposições que fez, participando da Associação Viva Saveiros, que objetiva restaurar essas embarcações e mantê-las em suas rotas originais. Ao se associar, acabou também se aproximando do universo da Baía de Todos-os-Santos e, por extensão, da Feira de São Joaquim e da Rampa do Mercado. “É uma causa bem-sucedida”, comemora, por não deixar morrerem os ofícios dos que lidam com os barcos.

BURT SUN / DIVULGAÇÃO

A PONTE E se dona Norma nunca se espantou com nada que o filho dissesse, o que será que ela acha da construção da ponte para a ilha? Bel diz que não é, absolutamente, por causa do seu ateliê na localidade (“seria mesquinho”), mas é a favor, sim, da construção. Embora reconheça que haverá impacto ambiental, afirma que o que faz mal à ilha está chegando, mesmo sem ponte. Através do crack, por exemplo. Sem contar que “Itaparica não tem estrutura para nada e aquele ferryboat é um inferno”. Uma boa solução, a seu ver, é poder morar em Gandu, em Ipiaú, em Valença e poder trabalhar em Salvador. “Não é se aproximar só da ilha, não, mas se aproximar do sul da Bahia, da Baía de Camamu. Mas também acho uma pena dar as costas para a Baía de Aratu e para a Suburbana. Salvador não é a Linha Verde. Salvador é o coração da Baía de Todos-os-Santos”. Enquanto a tal da ponte ainda vai dar muito o que falar, com estranhamento ou não, Bel vai se dedicando a novas técnicas. Agora, é a vez do bronze, e ele, que se orgulha de que sempre aprendeu novas técnicas fazendo, já está nas primeiras fundições. Ao longo da carreira, também apren-

Um dos aviões pintados para a exposição Aeroplanos Híbridos, no hangar do aeroporto, em 2010 deu com a publicidade e o teatro. O artista visual e crítico César Romero, que esteve na primeira exposição de Bel, destaca que ele é um artista múltiplo e profundamente inquieto e de ímpeto. Não está,aseuver,preocupadocomcoerênciaestilística, mas em produzir – a coerência estaria no seu pensamento. “Bel está presente na cidade e consegue fazer o que todo artistasonha,queéserconsumidopelapopulação. Costumo dizer: ‘Bel é pop, meu rei’”. Sem contar, como enfatiza Romero, que é uma pessoa ética e de “fino trato”. Além disso, tem um temperamento que, quando quer fazer algo, vai lá e faz, com ou sem apoio. Mas uma das construções que mais se orgulha, se não a que mais se orgulha, precisou da aprovação – dos búzios – para que acontecesse: é dele também o gradil do Terreiro da Casa Branca, espetáculo permanente que, graças aos orixás, num terreno tombado como patrimônio histórico do Brasil, vai durar, como a própria tradição. Bel lamenta, nesses quase 40 anos de carreira, não ter participado nos anos 1970

de uma Bienal de São Paulo, em que houve umapré-seleçãonaBahia,masdepoissoube que era aberta a quem quisesse participar. As coisas poderiam ter tomado outros rumos, imagina, porém não guarda ressentimentos. E nem participa de editais públicos. Aquele cão enorme que ele fez em fibra no Largo de Santana, próximo ao Acarajé da Dinha, vigia tudo e toma conta de um cantinho da cidade, em especial, em que tem mostrado seus trabalhos. Agora, planeja fazer uma coleção de esculturas, não uma nem duas peças, uma coleção, para incorporar à cidade até a Copa do Brasil. Tem quatro anos. Não acha que o Estado deve ser responsabilizado pela conservação das obras que coloca, espontaneamente, no espaço público. Acha que o público é que tem que zelar. E não para de produzi-las. “Vou sendo empurrado por minhas solicitações. Sabe quando você está numa multidão e quase já nem pisa no chão e vai indo? Eu vou indo”. «


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GASTRÔ COUVERT

Para abrir o apetite

Pães quentinhos, azeites aromatizados e acepipes são tradicionais em qualquer entrada, mas restaurantes inovam com o pastel asiático guioza e pão preto de mel e centeio

Texto DANIELA CASTRO dcastro@grupoatarde.com.br Fotos MARCO AURÉLIO MARTINS mmartins@grupoatarde.com.br

Q

ual a melhor coisa a se fazer naqueles minutos que nos separam do prato que pedimos num restaurante? Além de conversar fiado e bebericar, uma das respostas mais frequentes costuma ser... comer. Mesmo quando se está disposto a fazer uma refeição completa, com direito a entrada, prato principal, sobremesa e até cafezinho, parece que sempre há lugar para aquele belisquete preliminar. Pães de diversos tipos, patês, manteigas, azeitonas e legumes variados costumam figurar no mix do que se convencionou chamar de couvert. O que nem todo mundo sabe é que a origem do termo poucotemavercomseusignificadoatual.Couvert era originalmente aplicado ao tecido de linho branco que cobria a comida servida nos tempos medievais. A palavra que até então designava apenas um hábito de higiene passou a ser usada para se referir ao conjunto de utensílios usados para servir. No século 17, couvert era a taxa cobrada pela reposição de talheres e copos que, por serem raros naquela época,faziamcrescerosolhosdosfrequentadores das chamadas “casas de restauração” (os atuais restaurantes). Na atualidade, couvert é sinônimo de antepasto.

QUARTETO FANTÁSTICO

Salada de pepino, macarrão de arroz e polvo cozido, do Soho. Receita na página 38

Minitartare, sardella e camponata, do Couvert

Em Salvador, onde o Baby Beef aparece na lista de pioneiros – circulam por aí histórias de clientes que apareciam lá somente para degustar a pré-refeição –, restaurantes de diversas linhas adotam a opção. Diante da dificuldade de percorrer cada mesa, Muito passeou por quatro delas. A diferença, basicamente, está no DNA da cozinha–sãorepresentantesdoJapão,Itália e Austrália, além da França.


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GASTRÔ COUVERT

Para abrir o apetite

Pães quentinhos, azeites aromatizados e acepipes são tradicionais em qualquer entrada, mas restaurantes inovam com o pastel asiático guioza e pão preto de mel e centeio

Texto DANIELA CASTRO dcastro@grupoatarde.com.br Fotos MARCO AURÉLIO MARTINS mmartins@grupoatarde.com.br

Q

ual a melhor coisa a se fazer naqueles minutos que nos separam do prato que pedimos num restaurante? Além de conversar fiado e bebericar, uma das respostas mais frequentes costuma ser... comer. Mesmo quando se está disposto a fazer uma refeição completa, com direito a entrada, prato principal, sobremesa e até cafezinho, parece que sempre há lugar para aquele belisquete preliminar. Pães de diversos tipos, patês, manteigas, azeitonas e legumes variados costumam figurar no mix do que se convencionou chamar de couvert. O que nem todo mundo sabe é que a origem do termo poucotemavercomseusignificadoatual.Couvert era originalmente aplicado ao tecido de linho branco que cobria a comida servida nos tempos medievais. A palavra que até então designava apenas um hábito de higiene passou a ser usada para se referir ao conjunto de utensílios usados para servir. No século 17, couvert era a taxa cobrada pela reposição de talheres e copos que, por serem raros naquela época,faziamcrescerosolhosdosfrequentadores das chamadas “casas de restauração” (os atuais restaurantes). Na atualidade, couvert é sinônimo de antepasto.

QUARTETO FANTÁSTICO

Salada de pepino, macarrão de arroz e polvo cozido, do Soho. Receita na página 38

Minitartare, sardella e camponata, do Couvert

Em Salvador, onde o Baby Beef aparece na lista de pioneiros – circulam por aí histórias de clientes que apareciam lá somente para degustar a pré-refeição –, restaurantes de diversas linhas adotam a opção. Diante da dificuldade de percorrer cada mesa, Muito passeou por quatro delas. A diferença, basicamente, está no DNA da cozinha–sãorepresentantesdoJapão,Itália e Austrália, além da França.


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THIAGO TEIXEIRA / AG. A TARDE

TSUKIDASHI 5 g de alga marinha 30 g de polvo 50 ml de vinagre japonês 90 g de pepino-japonês 1 g de sal refinado 1 g de hondashi (tempero oriental) 35 g de açúcar cristal 20 ml de sake 5 g de macarrão de arroz 2 g de gengibre 35 ml de água PREPARO Lamine em fatias finas o pepinojaponês e reserve. Em uma panela, cozinhe o macarrão de arroz em fogo médio, até ficar transparente. Cozinhe os tentáculos do polvo, corte em rodelas e reserve. Adicione os demais ingredientes em uma tigela e acrescente o macarrão já cozido e o pepino. Para a montagem, coloque a porção da salada de pepino em um aro. Para decorar, acrescente o polvo já cortado.

especiais, um à base de ricota de búfala com ervas e outro de azeitonas pretas, que também são feitos no local. Tem ainda a tradicional e democrática manteiga. No Outback, o pão preto de mel e centeio chega espetado em uma faca e só é servido como couvert no Brasil

No restaurante italiano Di Liana, os pães artesanais e patês são o forte da entrada

Há,numentanto,umpontopacífico.Todos fazem o cliente reconhecer que é impossível resistir ao apelo de pães quentinhos, azeites aromatizados e acepipes suculentos. No time dos franceses, o escolhido não poderia ser outro a não ser o Couvert, que tem franquias nos shoppings Salvador e Paralela. Este apresenta dois pontos fortes: iguarias saborosas e preço mais que camarada. Por R$ 5,90 (por pessoa), o cliente recebe uma cestinha com torradas, crostinis e minipão francês. Masessaparteéamenossedutora,porqueoquefisgamesmosãoosacompanhamentos. Dona da franquia do Salvador

mes podem assustar a quem não é habitué, mas os ingredientes são amigáveis: salada vinagrete de pepino-japonês, macarrão de arroz e polvo cozido.

Shopping, Maria Emília nos ajuda a listar os itens que se revezam: “Tem minitartare, sardella, ricota, camponata, molo pesto, azeitona, azeite aromatizado com pimenta-de-cheiro, pimenta-dedo-de-moça e alecrim”, enumera. “E tem também o alho assado, que é o maior sucesso”, revela. Se você é dos que torcem o nariz para o pobrezinho, experimente em casa: corte uma cabeça de alho na diagonal, e leve ao forno com azeite de oliva e sal. É pra calar a boca.

TSUKI O QUÊ? E quem pensa que couvert não tem lugar na cozinha oriental se engana. No res-

taurante Soho, há duas opções bacanas. O Mix Arare (R$ 8,70) é uma versão da tradicional tigelinha de salgadinhos que junta castanha e amendoim a ervilha de wasabi (raizforte)ekakinotame(umaperitivocrocante e levemente apimentado). “A diferença é que aqui não costumamos levar para a mesa logo que o cliente senta. Ele é quem pede, e ainda pode se estender pelo menu de entradas”, observa Karine Queiroz, proprietária da casa, que sugere a estes uma porção de guioza (R$ 10,50), pastel típico japonês que pode ter recheios como salmão e porco. AcasatambémofereceoTsukidAshi,espécie de miniatura do Sunomono. Os no-

DE FAMÍLIA No restaurante Di Liana, especializado em comida típica da Itália, é claro que não poderia faltar um generoso couvert. Diga-se de passagem, além de garantir instantes de prazer gastronômico, ele ainda ajuda a contar uma história. “Há 29 anos, desde que o restaurantefoiaberto,ospãesemassassãofeitosnacasa,demaneira artesanal”, enfatiza Márcia Allegro, que administra o estabelecimento ao lado da sogra, dona Liana, que cuida da cozinha. “São receitas da região do Vêneto, que foram passando de geração em geração”, acrescenta Márcia. A composição da cestinha é simples e farta, com fatias de pão com sabor de calabresa e torradas fininhas e crocantes. O reforço fica por conta de dois patês

ONDE COMER Couvert Salvador Shopping – 3º piso (71 3342-4216); Shopping Paralela – Piso L2 (71 3555-7878). Soho Bahia Marina – Av. Contorno, (71 3322-4554). Di Liana Rua Macapá, 314 – Ondina (71 3331-1266 e 3378-1088) Outback Shopping Iguatemi – 3º piso (71 3450-1280)

CORTESIA Muito também quis saber o que há de bom no couvert de um restaurante australiano, e lá fomos nós bater à porta do Outback, no Shopping Iguatemi. O pão preto que chega espetado por uma faca já é velho conhecido de quem frequenta a casa. Eumdiferencialjáservedeincentivoaos clientes. “Na rede internacional, o pão só é servido quando o cliente pede salada ou sopa. No Brasil é que nós incorporamos o couvert como cortesia, no almoço e no jantar”, explica Fernando Daltro, sócio-proprietário da franquia baiana. Seguindo a norma de não divulgar receitas dos produtos da marca, Daltro só diz que a receita inclui mel e centeio. É o suficiente para agradar ao paladar. «


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THIAGO TEIXEIRA / AG. A TARDE

TSUKIDASHI 5 g de alga marinha 30 g de polvo 50 ml de vinagre japonês 90 g de pepino-japonês 1 g de sal refinado 1 g de hondashi (tempero oriental) 35 g de açúcar cristal 20 ml de sake 5 g de macarrão de arroz 2 g de gengibre 35 ml de água PREPARO Lamine em fatias finas o pepinojaponês e reserve. Em uma panela, cozinhe o macarrão de arroz em fogo médio, até ficar transparente. Cozinhe os tentáculos do polvo, corte em rodelas e reserve. Adicione os demais ingredientes em uma tigela e acrescente o macarrão já cozido e o pepino. Para a montagem, coloque a porção da salada de pepino em um aro. Para decorar, acrescente o polvo já cortado.

especiais, um à base de ricota de búfala com ervas e outro de azeitonas pretas, que também são feitos no local. Tem ainda a tradicional e democrática manteiga. No Outback, o pão preto de mel e centeio chega espetado em uma faca e só é servido como couvert no Brasil

No restaurante italiano Di Liana, os pães artesanais e patês são o forte da entrada

Há,numentanto,umpontopacífico.Todos fazem o cliente reconhecer que é impossível resistir ao apelo de pães quentinhos, azeites aromatizados e acepipes suculentos. No time dos franceses, o escolhido não poderia ser outro a não ser o Couvert, que tem franquias nos shoppings Salvador e Paralela. Este apresenta dois pontos fortes: iguarias saborosas e preço mais que camarada. Por R$ 5,90 (por pessoa), o cliente recebe uma cestinha com torradas, crostinis e minipão francês. Masessaparteéamenossedutora,porqueoquefisgamesmosãoosacompanhamentos. Dona da franquia do Salvador

mes podem assustar a quem não é habitué, mas os ingredientes são amigáveis: salada vinagrete de pepino-japonês, macarrão de arroz e polvo cozido.

Shopping, Maria Emília nos ajuda a listar os itens que se revezam: “Tem minitartare, sardella, ricota, camponata, molo pesto, azeitona, azeite aromatizado com pimenta-de-cheiro, pimenta-dedo-de-moça e alecrim”, enumera. “E tem também o alho assado, que é o maior sucesso”, revela. Se você é dos que torcem o nariz para o pobrezinho, experimente em casa: corte uma cabeça de alho na diagonal, e leve ao forno com azeite de oliva e sal. É pra calar a boca.

TSUKI O QUÊ? E quem pensa que couvert não tem lugar na cozinha oriental se engana. No res-

taurante Soho, há duas opções bacanas. O Mix Arare (R$ 8,70) é uma versão da tradicional tigelinha de salgadinhos que junta castanha e amendoim a ervilha de wasabi (raizforte)ekakinotame(umaperitivocrocante e levemente apimentado). “A diferença é que aqui não costumamos levar para a mesa logo que o cliente senta. Ele é quem pede, e ainda pode se estender pelo menu de entradas”, observa Karine Queiroz, proprietária da casa, que sugere a estes uma porção de guioza (R$ 10,50), pastel típico japonês que pode ter recheios como salmão e porco. AcasatambémofereceoTsukidAshi,espécie de miniatura do Sunomono. Os no-

DE FAMÍLIA No restaurante Di Liana, especializado em comida típica da Itália, é claro que não poderia faltar um generoso couvert. Diga-se de passagem, além de garantir instantes de prazer gastronômico, ele ainda ajuda a contar uma história. “Há 29 anos, desde que o restaurantefoiaberto,ospãesemassassãofeitosnacasa,demaneira artesanal”, enfatiza Márcia Allegro, que administra o estabelecimento ao lado da sogra, dona Liana, que cuida da cozinha. “São receitas da região do Vêneto, que foram passando de geração em geração”, acrescenta Márcia. A composição da cestinha é simples e farta, com fatias de pão com sabor de calabresa e torradas fininhas e crocantes. O reforço fica por conta de dois patês

ONDE COMER Couvert Salvador Shopping – 3º piso (71 3342-4216); Shopping Paralela – Piso L2 (71 3555-7878). Soho Bahia Marina – Av. Contorno, (71 3322-4554). Di Liana Rua Macapá, 314 – Ondina (71 3331-1266 e 3378-1088) Outback Shopping Iguatemi – 3º piso (71 3450-1280)

CORTESIA Muito também quis saber o que há de bom no couvert de um restaurante australiano, e lá fomos nós bater à porta do Outback, no Shopping Iguatemi. O pão preto que chega espetado por uma faca já é velho conhecido de quem frequenta a casa. Eumdiferencialjáservedeincentivoaos clientes. “Na rede internacional, o pão só é servido quando o cliente pede salada ou sopa. No Brasil é que nós incorporamos o couvert como cortesia, no almoço e no jantar”, explica Fernando Daltro, sócio-proprietário da franquia baiana. Seguindo a norma de não divulgar receitas dos produtos da marca, Daltro só diz que a receita inclui mel e centeio. É o suficiente para agradar ao paladar. «


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SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 41

ACERVO PESSOAL / DIVULGAÇÃO

Prevalece a palavra Poeta, contista, tradutor e crítico literário, este mineiro de Carangola é filho de poetas – Maria Braga Horta e Anderson de Araújo Horta –, mas descobriu a vocação ao ler Castro Alves. Seu livro mais recente, Soneto Antigo, foi publicado no ano passado Texto KÁTIA BORGES kborges@grupoatarde.com.br

ALGUNS LIVROS PUBLICADOS: Altiplano e outros poemas (1971), Exercícios de homem (1978), Na cadeira de Álvares de Azevedo (1986), O pássaro no aquário (1990), Trinta e três sonetos (2001), O Sátiro e outros poemas de Victor Hugo (2002), Sob o signo da poesia: literatura em Brasília (2003), Cinco histórias de bichos (2004), Traduzir poesia (2004), Testemunho & Participação: ensaio e crítica literária (2005), Pulso instantâneo (contos, 2008), Soneto antigo (2009)

TRILHAS ANINHA FRANCO

aninha.franco@grupoatarde.com.br

A corrupção, essa demônia

A

virtude da Lei da Ficha Limpa é que ela recebeu 1,6 milhão de assinaturas e será aprovada por pressão de uma sociedade que, dizem, não está nem aí para nada. Está. Os brasileiros estão com as sacolas transbordantes de sustentar a corja que enriquece via corrupção e, quando há transbordo, a tendência é que haja esvaziamento. Os golpes de 64 e 68 foram escalados para acabar com a demônia, mas a multiplicaram geometricamente quando implantaram a censura.

C

ensura e corrupção são irmãs xifópagas, filhas de ditaduras de esquerda ou de direita. De 1985, princípio do fim da medonha, para cá, cresceu, e é celebridade praticada pelos três poderes com uma desenvoltura de assombrar. Em 1994, quando Itamar Franco passou a faixa presidencial a FHC, entregou-lhe um relatório do CEI – Comissão Especial de Investigação – mostrando que a corrupção corroía 40% do PIB nacional. O CEI foi extinto e a corrupção estabelecida.

» ENTREVISTA NA ÍNTEGRA EM REVISTAMUITO.ATARDE.COM.BR

ORELHA ANDERSON BRAGA HORTA

Fala-se que a crítica literária está em crise. A crise existe? Existe, sim. Não é que a crítica tenha acabado. Só que os críticos remanescentes abrigam-se em jornais de menor circulação, como Fernando Py, ou se manifestam pela publicação periódica de livros, como Hildeberto Barbosa Filho. Há muito desapareceu o rodapé de crítica literária. E agora, com as mortes de Antônio Olinto e Wilson Martins, esvaziou-se esse quadro. Seus pais eram poetas. A iniciação na literatura se deu em casa? Demorei um pouco a me dar conta do real significado disso. Na verdade, estava então (1949) em casa de meus avós maternos, em Manhumirim (MG), e no velho e famoso Tesouro da Juventude descobri Castro Alves, que me entusiasmou. Para que rumos apontam a poesia feita hoje? Creio que alguns elementos já podem ser fixados, a partir do que de melhor tenho lido: prevalece a palavra, em seu inteiro valor de significante e significado; a invenção é procurada, mas os valores humanísticos estão na base; o ritmo é multifário, não raro entrecortado, o tratamento linguístico nem sempre é da melhor qualidade, mas a prospecção do ser e a projeção dos caminhos estão presentes. Muitos festejam o microconto. Como o senhor vê o formato? É, a meu ver, um subgênero perigoso. Tende a uma sumária exibição de “espírito” e é incompatível com o que verdadeiramente caracteriza as grandes obras: a trama cativante, o mergulho na psique, o vigor e a elegância estilística. Acho improvável que deixe de ser mera curiosidade para se tornar literatura. «

P

ara combater a vadia que, junto com a deseducação, abate o Brasil, a Ficha Limpa é o princípio que, como está, tiraria Paulo Maluf do poder, mas deixaria “Arruda Panetone” candidato e, vencedor, apto à função de padeiro italiano. Jader Barbalho, que está em dúvida sobre a candidatura a governador ou senador, pode ambos, porque os seis processos de estelionato, formação de quadrilha, peculato e lavagem de dinheiro que o envolvem com a nossa grana não foram julgados.

S

e seus advogados, poderosos, bem formados e caríssimos anularem os processos, porque um documento da roubalheira foi apresentado em cópia quando deveria chegar no original, o dinheiro da educação, saúde e cultura migra para sempre para a conta corrente dele. Neudo Campos, ex-governador de Roraima, coitada, tem 11 ações penais e 10 inquéritos, mas apenas uma condenação em 1ª instância, e pode se candidatar, vencer e seguir roubando. O Brasil tem leis demais. A maioria sem execução. As executadas protegem os fortes e desoprimidos. Mas a sociedade pode, como se vê, mudar isso que os políticos não têm a menor pretensão de alterar. «

«Censura e corrupção são irmãs xifópagas, filhas das ditaduras»


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ACERVO PESSOAL / DIVULGAÇÃO

Prevalece a palavra Poeta, contista, tradutor e crítico literário, este mineiro de Carangola é filho de poetas – Maria Braga Horta e Anderson de Araújo Horta –, mas descobriu a vocação ao ler Castro Alves. Seu livro mais recente, Soneto Antigo, foi publicado no ano passado Texto KÁTIA BORGES kborges@grupoatarde.com.br

ALGUNS LIVROS PUBLICADOS: Altiplano e outros poemas (1971), Exercícios de homem (1978), Na cadeira de Álvares de Azevedo (1986), O pássaro no aquário (1990), Trinta e três sonetos (2001), O Sátiro e outros poemas de Victor Hugo (2002), Sob o signo da poesia: literatura em Brasília (2003), Cinco histórias de bichos (2004), Traduzir poesia (2004), Testemunho & Participação: ensaio e crítica literária (2005), Pulso instantâneo (contos, 2008), Soneto antigo (2009)

TRILHAS ANINHA FRANCO

aninha.franco@grupoatarde.com.br

A corrupção, essa demônia

A

virtude da Lei da Ficha Limpa é que ela recebeu 1,6 milhão de assinaturas e será aprovada por pressão de uma sociedade que, dizem, não está nem aí para nada. Está. Os brasileiros estão com as sacolas transbordantes de sustentar a corja que enriquece via corrupção e, quando há transbordo, a tendência é que haja esvaziamento. Os golpes de 64 e 68 foram escalados para acabar com a demônia, mas a multiplicaram geometricamente quando implantaram a censura.

C

ensura e corrupção são irmãs xifópagas, filhas de ditaduras de esquerda ou de direita. De 1985, princípio do fim da medonha, para cá, cresceu, e é celebridade praticada pelos três poderes com uma desenvoltura de assombrar. Em 1994, quando Itamar Franco passou a faixa presidencial a FHC, entregou-lhe um relatório do CEI – Comissão Especial de Investigação – mostrando que a corrupção corroía 40% do PIB nacional. O CEI foi extinto e a corrupção estabelecida.

» ENTREVISTA NA ÍNTEGRA EM REVISTAMUITO.ATARDE.COM.BR

ORELHA ANDERSON BRAGA HORTA

Fala-se que a crítica literária está em crise. A crise existe? Existe, sim. Não é que a crítica tenha acabado. Só que os críticos remanescentes abrigam-se em jornais de menor circulação, como Fernando Py, ou se manifestam pela publicação periódica de livros, como Hildeberto Barbosa Filho. Há muito desapareceu o rodapé de crítica literária. E agora, com as mortes de Antônio Olinto e Wilson Martins, esvaziou-se esse quadro. Seus pais eram poetas. A iniciação na literatura se deu em casa? Demorei um pouco a me dar conta do real significado disso. Na verdade, estava então (1949) em casa de meus avós maternos, em Manhumirim (MG), e no velho e famoso Tesouro da Juventude descobri Castro Alves, que me entusiasmou. Para que rumos apontam a poesia feita hoje? Creio que alguns elementos já podem ser fixados, a partir do que de melhor tenho lido: prevalece a palavra, em seu inteiro valor de significante e significado; a invenção é procurada, mas os valores humanísticos estão na base; o ritmo é multifário, não raro entrecortado, o tratamento linguístico nem sempre é da melhor qualidade, mas a prospecção do ser e a projeção dos caminhos estão presentes. Muitos festejam o microconto. Como o senhor vê o formato? É, a meu ver, um subgênero perigoso. Tende a uma sumária exibição de “espírito” e é incompatível com o que verdadeiramente caracteriza as grandes obras: a trama cativante, o mergulho na psique, o vigor e a elegância estilística. Acho improvável que deixe de ser mera curiosidade para se tornar literatura. «

P

ara combater a vadia que, junto com a deseducação, abate o Brasil, a Ficha Limpa é o princípio que, como está, tiraria Paulo Maluf do poder, mas deixaria “Arruda Panetone” candidato e, vencedor, apto à função de padeiro italiano. Jader Barbalho, que está em dúvida sobre a candidatura a governador ou senador, pode ambos, porque os seis processos de estelionato, formação de quadrilha, peculato e lavagem de dinheiro que o envolvem com a nossa grana não foram julgados.

S

e seus advogados, poderosos, bem formados e caríssimos anularem os processos, porque um documento da roubalheira foi apresentado em cópia quando deveria chegar no original, o dinheiro da educação, saúde e cultura migra para sempre para a conta corrente dele. Neudo Campos, ex-governador de Roraima, coitada, tem 11 ações penais e 10 inquéritos, mas apenas uma condenação em 1ª instância, e pode se candidatar, vencer e seguir roubando. O Brasil tem leis demais. A maioria sem execução. As executadas protegem os fortes e desoprimidos. Mas a sociedade pode, como se vê, mudar isso que os políticos não têm a menor pretensão de alterar. «

«Censura e corrupção são irmãs xifópagas, filhas das ditaduras»


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16/5/2010

PAREDE TIAGO LIMA

www.flickr.com/photos/tiagolima/ Na imagem Fragmentos de um só, Tiago Lima cria um sentimento de passado, de lembranças. O olhar do fotógrafo registra memórias esculpidas por tons e movimento de luz

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PAREDE TIAGO LIMA

www.flickr.com/photos/tiagolima/ Na imagem Fragmentos de um só, Tiago Lima cria um sentimento de passado, de lembranças. O olhar do fotógrafo registra memórias esculpidas por tons e movimento de luz

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Avesso ao mundo das celebridades, Wagner Moura fala de cinema, polテュtica e mテコsica

ANTI-HERテ的

DOMINGO, 16 DE MAIO DE 2010 #111 REVISTA SEMANAL DO GRUPO A TARDE

44 SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 SALVADOR DOMINGO 16/5/2010 45


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