MANIFESTO
O RITMO DAS CIDADES É PARA QUEM? A construção dos espaços de opressão e, mais do que isso, a forma como eles acontecem marginalizam uma parcela da população a qual as cidades, e seus construtores, insistem ignorar. Seja pela falta de debate justificada pela “hegemonia” da não-informação, ou pela clara opção de não inserir esses sujeitos no pensamento que orienta a construção das cidades, as mulheres vem sendo marginalizadas e oprimidas cotidianamente. Servimos de mão de obra e pedestal ao crescimento dos homens que aparecem nos livros que orientam a história da arquitetura. Dirigimos revistas de decoração, desenhamos mobiliário. Saímos da universidade onde há inúmeras professoras mulheres ensinando sobre os homens que mudaram a história e entramos num mercado de trabalho majoritariamente feminino, no qual há pouquíssimas mulheres que tenham ganhado o prêmio pritzker. Servimos ao magistério, às tarefas do lar, mas não nos atrevamos a reivindicar um espaço no canteiro de obras. À revelia de tantos obstáculos, algumas mulheres acabam por conquistar seu espaço. São mulheres de aço que se fazem intransigentes ao machismo que as limita todos os dias de fazer o que quer que queiram. Mulheres que irão contar, nas estatísticas, dentro da porcentagem da raridade. Mulheres heroicas, mulheres exceção. Mas onde está o reconhecimento? Onde estão estas mulheres que nunca ouvimos falar? E que nem mesmo nós mulheres conhecemos? Estão escondidas sob uma camada grossa de machismo e patriarcado que todos os dias faz questão de ser cada vez mais eficiente em oprimir. E se não há mulheres reconhecidas, será realmente só uma questão de merecimento? Ou essas mulheres estão atarefas com as varias jornadas de trabalho que incluem filhos, limpeza e ainda o sustento da casa? Existem incontáveis gerações de arquitetos e arquitetas e mesmo assim não uma só mulher trans reconhecida pelo seu trabalho. Não há uma só mulher negra reconhecida por um grupo branco de pessoas que avalia a qualidade da produção na arquitetura. Falemos de Lina Bo Bardi então. Ela sim foi reconhecida. Ela sim, vinda da Itália, onde mesmo anos depois de formada dirigia revistas de decoração que tratavam da temática do lar e que, ao chegar ao Brasil seu primeiro e mais valoroso cliente foi seu marido. Seu trabalho é de inestimável valor, é verdade, mas de novo, onde se encontram essas grandes mulheres que não tem espaço pra se formar e exercer plenamente sua profissão? Ou mesmo andar tranquilas pelas ruas sem o medo de passar por uma praça mal iluminada ou por não-lugares, onde os homens se legitimam para agredi-las?
MANIFESTO
Falemos de Lina Bo Bardi então. Ela sim foi reconhecida. Ela sim, vinda da Itália, onde mesmo anos depois de formada dirigia revistas de decoração que tratavam da temática do lar e que, ao chegar ao Brasil seu primeiro e mais valoroso cliente foi seu marido. Seu trabalho é de inestimável valor, é verdade, mas de novo, onde se encontram essas grandes mulheres que não tem espaço pra se formar e exercer plenamente sua profissão? Ou mesmo andar tranquilas pelas ruas sem o medo de passar por uma praça mal iluminada ou por não-lugares, onde os homens se legitimam para agredi-las? “Coincidentemente” esse é o caminho que a maioria das mulheres traça. Estudam, formam-se, continuam na academia, pra ensinar sobre os grandes homens da história. pouquíssimas mulheres e mesmo assim, nenhuma mulher trans ou negra na história da arquitetura é porque algo nos impediu de ocupar um espaço que sempre foi nosso. Está na hora de recupera-lo. Que as mulheres da FeNEA possam se empoderar do debate de gênero e das cidades e passar a ocupar lugares dos quais foram historicamente marginalizadas. É preciso pensar sobre que ritmo e que espaços as cidades constroem, a quem e a quais pensamentoseles servem. Do crescimento das cidades ao que nos é ensinado em sala de aula, o espaço construído materializa uma hegemonia de pensamento que coloca as cidades a serviço de um discurso que nunca nos coube, nem nos é suficiente. É preciso desnaturalizar a sentença máxima da inexistência da opressão para passar a construir cidades verdadeiramente igualitárias das quais seja possível olhar para as diferenças com a empatia que é necessária a vida em coletivo. -