NESTA EDIÇÃO
EDITORIAL
Para quase todos O País chega ao mês de novembro com respingos de uma disputa eleitoral acirrada. Enquanto corria todo o embate entre os candidatos aos cargos de presidente, governador, deputados federais e estaduais e senadores, setores como o sucroenergético continuavam a enfrentar resultados amargos em suas atividades. À Safra, fabricantes de máquinas e equipamentos para usinas de açúcar e etanol disseram, em outubro, aguardar uma definição das políticas que serão adotadas pelo governo eleito para reestabelecer estratégias para os próximos anos. Por enquanto, o que a indústria desses bens de capital vivencia é descrito por representantes delas como “um dos piores momentos de sua história”, como informa matéria de Lauro Veiga Filho. Nas lavouras, o mês anterior foi marcado pela escassez de chuva, que adiou o período de plantio da safra de verão em grandes regiões produtoras. Em Goiás já se fala em possível perda de produtividade nas plantações de soja. Eventuais prejuízos, porém, podem não ser cobertos em sua totalidade pelo seguro rural, segundo representante de produtores. As contratações desse mecanismo de proteção aumentaram nos últimos anos, mas a complexidade de sua tarifação no Brasil ainda é apontada como “um grande obstáculo”, conforme reportagem de André Passos. E ainda enquanto o País discutia as mudanças desejadas para os próximos anos, a rotina dos estudantes que moram na zona rural de Goiás permanecia a mesma. Para 85,97% dos 65 mil deles, o acesso à educação depende de transporte que os retire diariamente durante a semana de suas casas e os levem a escolas em cidades mais próximas. A situação não é a considerada ideal por especialistas ouvidos pela Safra. Em reportagem de Carla Borges eles defendem a oferta de ensino no mesmo ambiente onde as crianças e adolescentes estão inseridos. Em todo o Estado há 67 escolas no campo e mais 46 extensões de unidades escolares urbanas em propriedades rurais. É possível até encontrar modelos bem-sucedidos delas, mas não é uma regra. Também é apenas na zona urbana, muitas vezes na capital, que a maioria das famílias rurais encontra atendimento médico. Eleição encerrada, desafios não. Consolidar o tão falado Brasil de oportunidades para todos é um deles. Carla Guimarães Editora
Entrevista 4 “O Brasil tem um grau respeitável de competitividade”, diz André Mesquita, do Banco Indusval & Partners (BI&P)
Algodão 8 Acordo entre Brasil e Estados Unidos encerra conflito que durava há 12 anos. Vantagens são avaliadas
Seguro rural
12
Área segurada no Brasil aumenta, mas segundo representantes de produtores, atual modelo de cobertura não é eficiente
Pecuária 18 Formar sucessores na família é um desafio para pecuaristas
Social 20 Mais de 80% dos estudantes que moram no campo em Goiás estão matriculados em escolas urbanas. Acesso da população rural à saúde também é restrito
Bens de capital
26
Com redução de encomendas, fabricantes de máquinas e equipamentos para usinas de açúcar e etanol tentam criar estratégias para sobreviver
Frango caipira
33
Produtores apostam na ampliação do mercado consumidor para investir na criação dessas aves
Agro +
39
Orientações técnicas asseguram mudanças no manejo de lavouras de café e pimenta-do-reino no Espírito Santo e, consequentemente, dos resultados nelas alcançados Novembro/2014 Junho/2014
Safra
3
ENTREVISTA
André Mesquita
Vice-presidente de Produtos e Corporate Finance do Banco Indusval & Partners (BI&P) CARLA GUIMARÃES
No primeiro semestre de 2014, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 0,5% comparado a igual período do ano passado. Colaborou para o resultado, em especial, o desempenho da agropecuária, que no período cresceu 1,2%, seguido pelo setor de serviços, com crescimento de 1,1%. Considerando exclusivamente o segundo trimestre, ainda se observa que enquanto o PIB brasileiro caiu 0,60% em relação ao primeiro trimestre deste ano, o PIB da agropecuária, na mesma comparação, cresceu 0,20%. Não à toa, o agronegócio é apontado como uma das principais operações dos setores econômicos do Brasil, conforme fala do vice-presidente de Produtos e Corporate Finance do Banco Indusval & Partners (BI&P), André Mesquita. Ele, que é administrador e economista, acrescenta que o agronegócio é, atualmente, o maior volume da balança comercial brasileira e responsável por “um número notável de empregos”. No início de outubro a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) informou que os dez produtos do agronegócio brasileiro mais comercializados responderam por 33,1% do total exportado pelo País no acumulado do ano até setembro. As vendas externas totais no período somaram 173,64 bilhões de dólares, sendo 57,41 bilhões desse montante provenientes da exportação da soja em grão, farelo de soja, açúcar em bruto, carne de frango, carne bovina, café em grão, celulose, couros e peles, milho em grão e fumo em folhas. As commodities agrícolas, no entanto, não exercem influência apenas na balança comercial. O comportamento dos preços dessas também apresenta reflexo sobre a inflação brasileira, em especial, de acordo com Mesquita, carnes e proteínas em geral. E neste ano, por cinco meses consecutivos os preços das commodities agropecuárias registraram queda – período entre abril e agosto. Em setembro, no entanto, esse subgrupo do Índice de Commodities Brasil (IC-Br), medido pelo Banco Central mensalmente, aumentou 1,98% em relação a agosto. O grupo de commodities agropecuária que é considerado na composição do IC-Br é formado por carnes de boi e de porco, algodão, óleo de soja, trigo, açúcar, milho, café e arroz. À Safra Mesquita afirma haver hoje áreas dentro do agronegócio que estão positivas enquanto outras passam por grandes desafios, a exemplo do açúcar e do etanol que, segundo ele, “estão sofrendo bastante com preço”. Enquanto a soja, diz ele, também começa a sentir dificuldade. “Não são anos dourados, como há pouco tempo, mas não é uma catástrofe”. Quanto às expectativas para a safra 2014/2015 da oleaginosa, o vice-presidente do (BI&P) diz haver um componente que afetará o preço expressivamente para cima ou para baixo, “o comportamento do clima brasileiro”. 4
Safra
Novembro/2014
Safra - Qual a importância do agronegócio para a economia nacional? André Mesquita - O agronegócio é, atualmente, o maior volume da balança comercial brasileira, gera um número notável de empregos. Sem dúvidas, é uma das principais operações dos setores econômicos. O Brasil tem um grau respeitável de competitividade em comparação à de qualquer outro país.
Cada cultura tem uma situação diferente, que impacta de formas peculiares sobre a economia“
Safra - Quais são hoje as commodities que exercem influência sobre a inflação brasileira e como elas têm se comportado? Mesquita - As commodities agrícolas que geram efeitos são, principalmente, as carnes, as proteínas em geral. Café e açúcar também são bastante importantes. Soja e milho, porém, influenciam diretamente nas proteínas, pois são os principais componentes das carnes, ou seja, acabam impactando indiretamente no preço das commodities.
Div
ulg
açã
o
Safra – Por cinco meses seguidos o Índice de Commodities Brasil (IC-Br), registrou queda, voltando a subir em setembro. Qual o cenário esperado para esse índice nos próximos meses? De que forma isso impactará ou já impacta a economia brasileira? Mesquita - É importante compreender que não há um padrão. O índice é geral, mas cada segmento tem suas particularidades. Por exemplo, temos áreas que estão positivas e outras que passam por grandes desafios. Hoje, açúcar e etanol estão sofrendo bastante com preço. A soja está começando a sentir dificuldade também, mas é um setor que vinha de bons anos e ainda está numa situação equilibrada no que tange à rentabilidade. Não são anos dourados, como há pouco tempo, mas não é uma ca-
tástrofe. As carnes vivem excepcional momento, registrando altas históricas. E temos o setor de trigo, que vive dias de preço baixo. Então, cada cultura tem uma situação diferente, que impacta de formas peculiares sobre a economia. Safra - A produção crescente de soja no Brasil, aliada a uma expectativa de recordes na produção dessa cultura pelos EUA neste ano já tem contribuído para derrubar preços da oleaginosa. O que os produtores podem esperar para o período de colheita da safra 2014/2015? Mesquita - A safra americana pode baixar em 1 ou 2 milhões de toneladas a safra brasileira, nada que vá alterar significativamente o fluxo mundial. Mas, para o ano que vem ainda tem um componente importante que afetará o preço expressivamente, para cima ou para baixo, o comportamento do clima brasileiro. Este componente definirá o real tamanho da safra brasileira. Estamos passando por um período de seca, uma situação que afeta as principais áreas de plantio. Outro fator muito importante para falar de preço é conhecer qual a real safra americana em 2015. Caso a safra brasileira seja muito menor do que o esperado devido ao clima e a safra tiver uma intenção de plantio menor por causa da perda da rentabilidade, isso mudaria significativamente o preço dos grãos no ano que vem.
As carnes vivem excepcional momento, registrando altas históricas“ Novembro/2014
Safra
5
Safra - E para o milho, o que se pode esperar em relação ao comportamento do preço da safra de verão dessa cultura? Mesquita - O milho é afetado pela logística, pois seu peso de frete é grande. Ou seja, em alguns locais terá bom preço e em outros, mais distantes, não. São duas realidades, também afetadas pelas demandas de consumo. Já no exterior, não vejo tendência de aumento. Safra - A próxima safra de grãos foi apontada por consultores ouvidos pela Safra na edição de outubro como mais uma em que haverá aumento de produção, estando bem próxima a 200 milhões de toneladas, no entanto, oferecerá ganhos menores para os produtores. Como o senhor avalia essa expectativa? Mesquita - É um cenário ainda indefinido. Os efeitos de clima, e os outros apontamentos feitos anteriormente, precisam ser avaliados. Pode até ser um ano de preço menor, em média do que foi no último período, mas é um ano em que, se isso acontecer de verdade, se a produção diminuir, o reajuste também é imediato.
O cenário de soja se mantendo, hoje, diminuirá a contribuição para a balança comercial“ mantendo, hoje, diminuirá a contribuição para a balança comercial. Mas, com tantas incertezas, ainda não sabemos qual será o tamanho dessa diminuição. Safra - Considerando que as últimas cinco safras brasileiras foram lucrativas para o produtor de soja, as quedas hoje já verificadas no preço da oleaginosa podem comprometer a renda e possíveis investimentos do produtor nesta safra, ou nas próximas (safrinha e safra 2015/2016)? Mesquita - Depende do local. Quanto mais longe estiver do porto, maior o efeito, por causa da logística. A logística influenciará diretamente no efeito que o produtor tem na renda.
A logística influenciará diretamente no efeito que o produtor tem na renda” Safra - Nesse cenário, que prevê, em especial, incremento na produção de soja na safra 2014/2015, e menores cotações, o que esperar das exportações dessa commodity e de que forma isso poderá impactar o resultado da balança comercial brasileira em 2015? Mesquita - O cenário de soja se
6
Safra
Novembro/2014
Safra - O mercado financeiro hoje, a exemplo do banco em que o senhor atua, oferece opções para o produtor tentar minimizar possíveis impactos das oscilações de preços das commodities e da queda ou perda de lucro em uma safra? Quais seriam esses produtos? Como funcionam?
Mesquita - O BI&P trabalha com parceiros no setor de agronegócio, em operações de barter [operações de troca] e isso já é uma proteção. Ele está, pois, transformando a compra de insumos diretamente em soja, trava de preço. Temos, também, proteções via derivativos para proteger o preço da commodity em detrimento ao dólar, que é um influenciador direto de preço. Safra - Atualmente qual o perfil de produtores que recorrem a essas operações de barter? A procura por esse serviço tem aumentado? Qual a tendência? Mesquita - Qualquer produtor pode recorrer. Soja, milho e café, nas principais regiões dessas três culturas. A procura tem aumentado e depende da relação de troca, ou seja, na troca grão por insumo. Quando a relação de troca é boa, funciona muito bem, quando não é tão boa, não funciona. Depende da região e relação de troca. Safra - Em relação a proteções via derivativos, pode explicar como funciona e citar um exemplo? Mesquita - Via derivativos funciona assim: o produtor que quer fechar café para entregar em setembro, vai ao mercado e faz um NDF [contrato a termo de moeda ou de commodity]. Por exemplo, se ele fechou o café a R$ 100 e o grão cair a R$ 80, ele recebe R$ 20 no NDF. Se o grão subir a R$ 120, ele paga R$ 20 ao NDF. Safra - A proteção via derivativos seria uma opção para qual perfil de produtor/cultura? Mesquita - Normalmente para produtores de médio a grande, com o mínimo de escala. [Vale para] qualquer cultura que tenha o mercado organizado em Bolsa.
AGENDA LEILÃO EVENTOS Fotos: Divulgação
ü11 a 14 de novembro Boas Práticas Agropecuárias e Produção Integrada O evento composto por três seminários, sendo o primeiro sobre boas práticas agrícolas na região do Mercosul; e os outros dois sobre produção integrada de frutas e produção integrada agropecuária, é realizado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) em parceria
com o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) e o Serviço Nacional de Sanidade Animal de Honduras (Senasa). Local: Foz do Iguaçu, PR Informações: www.agricultura.gov.br, e-mail producao.integrada@agricultura. gov.br ou pelo telefone (61) 3218-2390
ü12 e 13 de novembro Encontro Nacional da Soja
ü19 a 21 de novembro Agroecol 2014
Segundo os organizadores, o evento tem por objetivo difundir tecnologias ligadas aos principais aspectos produtivos da cultura da soja; relatar a atual situação econômica e científica do setor; além de gerar integração entre os participantes, palestrantes, empresas e instituições. O público-alvo do encontro são produtores, profissionais da área agrícola, pesquisadores, associações e instituições públicas, estudantes, negociadores e empresas envolvidas na cadeia produtiva da oleaginosa. Local: Parque de Exposições Governador Ney Braga, Recinto Milton Alcover, Londrina, PR Informações: Grupo de Estudos Luiz de Queiroz (44) 9154-6200, e-mail soja@gelq.com.br/Fundação de Estudos Agrários Luiz de Queiroz (19) 3417-6604/3417-6601 ou pelo e-mail cdt@fealq.org.
O evento abrigará o 1º Seminário de Agroecologia da América do Sul, o 5º Seminário de Agroecologia de Mato Grosso do Sul (MS), o 4º Encontro de Produtores Agroecológicos de MS e o 1º Seminário de Sistemas Agroflorestais em Bases Agroecológicas de MS. A programação, que tem como tema central Avanços e desafios em Agroecologia: como e onde precisamos chegar, inclui palestras; discussões em grupos; mesas-redondas; minicursos e oficinas; além de apresentação de trabalhos técnico-científicos, entre outros. Local: Auditório da Universidade Federal da Grande Dourados, Dourados, MS Informações: (67) 3416-9701/34169721 ou pelo e-mail agropecuaria-oeste.eventos@embrapa.br
ü18 de novembro 2o Leilão Virtual Haras João & Maria Promovido por Marcus Vinicius Frandi Butolo, o remate ofertará 37 animais da raça quarto-de-milha. Transmissão: Canal do Boi, as 20h30 Informações: Murilo Ceccon (11) 7744-4784/Loly Assessoria & Eventos (14) 99148-5225
ü24 de novembro a 2 de dezembro 2o Curso de Produção in vitro de Embriões Bovinos O objetivo do evento é capacitar profissionais das áreas de Medicina Veterinária, Biotecnologia, Biologia e outras afins na técnica de produção in vitro de embriões bovinos, a partir de conhecimentos práticos e teóricos sobre os procedimentos de maturação ovocitária, fecundação in vitro e cultivo embrionário in vitro. São oferecidas seis vagas e o prazo para inscrições encerra dia 15 de novembro. Local: Setor de Campo Experimental Fazenda Sucupira, Estrada Taguatinga/Núcleo Bandeirante, Brasília, DF Informações: (61) 3448-4992 ou pelo e-mail cenargen.cursos@embrapa.br
Novembro/2014
Safra
7
ALGODÃO
Case Agriculture / Divulgação
Acordo encerra conflito Governo e produtores cedem para encerrar disputa que durava há 12 anos com os Estados Unidos, numa negociação que traz avanços e novas ameaças Lauro Veiga Filho
O
s ganhos reais do acordo que encerrou uma disputa de doze anos entre Brasil e Estados Unidos por conta de subsídios de bilhões de dólares concedidos irregularmente pelo governo norte-americano a produtores de algodão daquele país somente poderão ser avaliados mais à frente – e isso dependerá em grande medida do comportamento do mercado internacional da pluma. Na leitura do governo e da associação que representa o setor no País, as vantagens parecem superar as concessões que tiveram que ser feitas no curso das negociações, concluídas no primeiro dia de outubro, em Washington. Nos termos do acerto, o Instituto Brasileiro do Algodão (IBA) receberia, ainda em outubro, antes do fechamento desta edição, um total de 300 milhões de dólares, completando um total de 830 milhões de dólares que os EUA haviam sido condenados pela
8
Safra
Novembro/2014
Organização Mundial do Comércio (OMC) a pagar ao Brasil em 2009 como compensação pelos subsídios concedidos aos produtores norte-americanos. À época, o acordo para evitar retaliações comerciais previa o pagamento de 147 milhões de dólares por ano, em parcelas mensais, colocados sob a gestão do IBA, criado especialmente para este propósito. Até setembro do ano passado, quando os pagamentos foram suspensos pelos EUA, à espera da aprovação da nova lei agrícola (Farm Bill), os depósitos haviam somado em torno de 505 milhões de dólares. De acordo com o IBA, aproximadamente R$ 313,5 milhões já foram investidos em projetos diversos, mas sob restrições que foram agora abolidas, numa medida que atingiu inclusive as parcelas já depositadas, mas ainda não gastas pelo instituto (algo como 370 milhões de dólares, em valo-
res aproximados). Isso significa que o IBA terá qualquer coisa ao redor de 670 milhões de dólares ou pouco menos para investir inclusive em pesquisas agrícolas, concentrando-se no desenvolvimento de biotecnologias para combater o bicudo, e infraestrutura – duas áreas até então vetadas pelos EUA (que, obviamente, não gostariam que os produtores brasileiros conquistassem maior competividade, passando a roubar mercado do algodão norte-americano). Segundo a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), o dinheiro deverá reforçar investimentos em assistência técnica e capacitação de produtores brasileiros, assim como programas de cooperação internacional em cotonicultura envolvendo países da África Subsaariana, do Mercosul, Haiti e outros países em desenvolvimento. Ainda conforme a Abrapa, uma parte
Um acerto e mais R$ 300 milhões: setor investirá em pesquisas contra bicudo-do-algodoeiro e terminais de exportação
daqueles recursos poderá ser destinada para a construção de dois terminais exclusivos para a exportação de algodão, um deles em algum porto do Nordeste, em local ainda não definido, de forma a favorecer a exportação da pluma produzida no oeste baiano, Estado que detém o posto de segundo maior produtor do País, e um segundo provavelmente na Região Norte, atendendo especialmente Mato Grosso, responsável por quase 60% de toda a produção brasileira. Hoje, a fibra destinada ao mercado externo sai pelos portos de Santos e Paranaguá, onde a inexistência de terminais exclusivos causa danos aos fardos da pluma e perdas aos exportadores. Em nota, a Abrapa disse estar “convencida de que o entendimento alcançado entre os dois países foi a melhor solução para os produtores brasileiros de algodão e para o agronegócio”. A associação destacou como mais importante a mudança no programa de garantias de crédito à exportação oferecidas pelo governo norte-americano (o GSM-102). O prazo máximo de cobertura, que antes das negociações poderiam se estender a até 36 meses, ficou limitado a 18 meses, incluindo todos os produtos agrícolas e não apenas o algodão. Além disso, nas garantias de 12 a 18 meses, os prêmios cobrados serão mais elevados, seguindo normas internacionais.
Sistema pode causar ainda mais distorções Aprovada em fevereiro deste ano, a nova Farm Bill aposentou os pagamentos diretos e aqueles de caráter anticíclico (ou seja, destinados a compensar os produtores em fase de queda de preços de produtos agrícolas, preservando sua renda) e adotou um intricado sistema de seguro que, numa avaliação inicial, poderá causar ainda mais distorções no mercado do que a lei anterior. Mas esses impactos dependerão do comportamento dos preços do algodão no mercado internacional. Entre os novos mecanismos previstos na Farm Bill renovada, o lado brasileiro na negociação havia considerado como mais danoso o subsídio de até 90%, como no caso do algodão, assegurado pelo governo dos EUA na contratação de apólices de seguro de preço pelos produtores daquele país. Mesmo que os preços entrem em baixa, esses produtores poderão continuar ampliando seus
plantios e oferecendo sua produção ao mercado, a preços garantidos pelo seguro, o que tenderia a empurrar as cotações ainda mais para baixo. Esse efeito apenas não ocorreria nos ciclos de alta dos preços, mas o sistema, como visto, poderá influenciar na dinâmica do mercado e na alternância desses ciclos, prejudicando concorrentes como o Brasil, terceiro maior exportador mundial da pluma. Além disso, o País e o setor de cotonicultura assumiram o compromisso de não levar os EUA novamente à OMC para discutir a nova lei agrícola e contestar eventuais distorções causadas no mercado pelos mecanismos em vigor desde o começo deste ano. O impedimento, na versão oficial, vale apenas para o caso do algodão, o que significa dizer que outros produtores e suas associações ainda poderão abrir procedimentos na OMC contra a Farm Bill em vigor. Divulgação
Novas vantagens: subsídios do governo dos EUA ao seguro de preço, no caso do algodão, pode chegar a 90% do custo da apólice
Novembro/2014
Safra
9
PANORAMA
Recurso para construção de armazéns O Conselho Monetário Nacional (CMN) aprovou resolução que prevê a construção de armazéns para trigo in natura no País. A medida, segundo o Ministério da Agricultura, introduz ajuste à norma que estabelece as condições necessárias à concessão de financiamento passível de subvenção econômica pela União no Programa de Sustentação do Investimento (PSI). A alteração consiste na inclusão das indústrias de moagem de trigo que exerçam atividades de armazenagem de grãos do cereal in natura no subprograma Cerealistas. Outra alteração trata da também inclusão de armazéns destinados à estocagem de açúcar no Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA) para produtores rurais e cooperativas, com recurso do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) e do Banco do Brasil (BB).
10
Safra
Novembro/2014
quando foram realizados roubos de defensivos, totalizando prejuízo superior a R$ 15 milhões, segundo a Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba). A ação, nomeada como Operação Safra será estendida até abril de 2015.
Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba)
A agricultura familiar brasileira será beneficiada com acordo firmado entre o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que visa permitir maior integração entre agentes de instituições de pesquisa agropecuária, ensino, assistência técnica e extensão rural (Ater) e organizações de agricultores familiares. Além da integração, a parceria visa aumentar os processos produtivos e gerenciais desses agricultores e qualificação de agentes de extensão rural. Inicialmente, o termo de cooperação pretende capacitar aproximadamente 4 mil técnicos e beneficiar diretamente mais 400 mil produtores rurais por meio do compartilhamento de informações, conhecimento e assistência técnica.
Ocupando espaço de 2,25 milhões de hectares e mais de mil propriedades rurais, a safra 2014/2015 do oeste baiano iniciou esta temporada com reforço da polícia militar. A medida foi tomada após invasões registradas na safra anterior (2013/2014),
Hugo Goldfeld presidirá a SGPA A chapa SGPA Sem Fronteiras, encabeçada pelo produtor rural Hugo Cunha Goldfeld (foto), venceu as eleições da nova diretoria da Sociedade Goiana de Pecuária e Agricultura (SGPA), com mandato para os próximos dois anos. A chapa recebeu 517 votos contra 400 da opositora, SGPA para Sócios, que tinha Fernando Antônio Honorato Silva e Souza como postulante à vaga de presidente. O plano básico da chapa vitoriosa é buscar novas alternativas de renda para a sociedade, explorando melhor o Parque Agropecuário de Goiânia. Entre as metas da nova presidência também está a reativação da SGPA Mulher, fortalecimento dos núcleos, dinamização do Projeto Escola, do Museu Agropecuário e da Alameda Agrocultural. O resultado foi anunciado no dia 20 de outubro.
Luiz Carlos Rodrigues
Acordo entre MDA e Embrapa
Operação Safra
Arquivo
Valores do açúcar em baixa Segundo estimativa do presidente da Datagro, Plinio Nastari, o Brasil deve manter suas exportações de açúcar na próxima safra, não registrando alta. Isso porque os valores da commodity estão em baixa no mercado mundial e os produtores brasileiros devem privilegiar na safra 2014/2015 a produção de etanol nas suas moagens de cana. Conforme análise de Nastari, a opção pelo combus-
Valor Bruto da Produção cresce 1% no ano
tível deve ser justamente uma forma de ajudar a fazer o mercado corrigir para cima os preços do açúcar. As cotações do produto mantiveram-se em queda na safra 2013/2014, mas há perspectivas de melhoria nos próximos anos, considerando que o déficit entre consumo e produção mundial ficará em 3,2 milhões de toneladas na próxima safra, conforme estimativa da Datagro.
Zona livre de peste suína clássica O Ministério da Agricultura encaminhou à Organização Mundial de Saúde Animal (OIE, sigla em inglês) relatório que solicita o reconhecimento internacional do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina como zonas livres da peste suína clássica (PSC). Estes Estados, de acordo com o ministério, cumprem todos os critérios exigidos pela organização. Além do reconhecimento internacional
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) apresentou no fim de outubro nova previsão para o Valor Bruto de Produção (VPB) de 2014. Com base nos dados de setembro, o incremento é de 1% perante o resultado do ano anterior. O VPB atual, segundo informações do ministério, atingiu o montante de R$ 438 bilhões, sendo que as lavouras alcançaram o valor de R$ 282 bilhões e a pecuária de R$ 155 bilhões. Centro-Oeste e Sudeste tiveram o melhor desempenho na produção de grãos e carnes no período.
destas federações, o Mapa pretende traçar estratégias para que os Estados que já detêm o reconhecimento nacional de zona livre (Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Goiás, Tocantins, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Rondônia, Acre e Distrito Federal), também possam preencher os requisitos de reconhecimento na organização.
Arquivo
Arquivo
Vacinação antiaftosa O prazo para aplicação da segunda dose de vacina contra febre aftosa em Goiás vai de 1º a 30 de novembro. Nessa etapa deverão ser imunizados no Estado bovinos e bubalinos com idade até 24 meses. A Agência Goiana de Defesa Agropecuária (Agrodefesa) ainda fixou o mesmo período como calendário oficial para vacinação contra raiva de bovinos, bubalinos, equídeos, caprinos e ovinos com idade até 12 meses em um total de 119 municípios. A agência informa ser obrigatório comprovar a realização das vaci-
nações fixadas para este mês. O formulário de Declaração de Vacinação – etapa novembro, segundo o órgão, está disponível no site www.agrodefesa.go.gov.br.
Novembro/2014
Safra
11
Seguro rural
Vandréia de Paula
Proteção incompleta Área produtiva segurada no Brasil saiu de cerca de mil hectares em 2005 para 9,6 milhões de hectares em 2013. O modelo de cobertura, no entanto, não é eficiente, segundo representantes de produtores André Passos
O
seguro rural no Brasil passou por mudanças nos últimos anos, ganhou mais espaço, crédito, maior número de carteiras e saiu de um estágio praticamente embrionário se comparado com outros países. Pesaram, favoravelmente, evoluções tecnológicas na agricultura e na mentalidade do próprio agricultor, que se despertou para a necessidade e vantagens de segurar a produção, seja na agricultura ou na pecuária. Apesar da falta de uniformidade nas contratações em diferentes regiões do País, o seguro vem crescendo anualmente. Ainda assim, há demora na liberação dos contratos de proteção, o que prejudica a aprovação de recursos destinados ao custeio agrícola. As principais novidades no sistema de seguro rural brasileiro só
12
Safra
Novembro/2014
surgiram a partir de 2005, com a criação do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR). O número de produtores atendidos aumentou consideravelmente. Partiu de 849 naquele ano, atingindo o pico de 65,5 mil no fechamento de 2013, segundo dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). O valor da subvenção, desconto bancado pelo governo, também aumentou, saltando dos R$ 2,3 milhões para R$ 557,8 milhões nesses nove anos (2005 -2013). Da mesma forma, ocorreu evolução no total da área segurada que não alcançava mil hectares e atingiu 9,6 milhões de hectares no ano passado. Já na safra de inverno deste ano o programa sofreu alterações. Passaram a vigorar novos percentuais
de subvenção ao prêmio do seguro, contemplando 60% de subvenção federal para as culturas de milho segunda safra, aveia, canola, cevada, centeio, girassol, sorgo e triticale; e de 70% para a cultura de trigo. Nas demais modalidades, o seguro permaneceu o mesmo (40% de subvenção). Neste ano, o número de apólices contratadas, embora cresça rapidamente nesses últimos meses do ano, só atingiu cerca da metade (51.404) das 101,8 mil unidades de 2013 registradas no início do mês de outubro. Mesmo assim, o diretor do Departamento de Gestão e Risco Rural do Mapa (Deger/Mapa), Ricardo Gomes dos Santos, acredita que as contratações que estão sendo realizadas neste ano devem pelo menos atingir o mesmo número de 2013.
Evolução do pagamento de prêmios e sinistros de 2003 até setembro de 2014 60% Premios Diretos (R$) Sinistralidade
2.000.000.000
40% 30%
1.000.000.000
20% 500.000.000
Santos, do Mapa: ”Com a suplementação esperada iremos atender as demandas da safra de verão”
bro”, informa Bernardes. Na safra passada, o volume de recursos liberados na LOA também somou R$400 milhões e recebeu adendo de R$ 300 milhões, totalizando R$ 700 milhões. Ao final, por demora do governo, apenas R$ 557,8 milhões foram utilizados, valor R$ 142,2 milhões abaixo do liberado. Nesta safra 2014/2015, a área segurada até meados de outubro é de 4,5 milhões de hectares, número que deve aumentar à medida que forem aumentando as contratações para a safra de inverno. Apenas por base comparativa, no ano passado 9,6 milhões de hectares foram segurados. Para o diretor do Deger, apesar do sistema controlar o volume de produtores atendidos, esta informação só será concluída no fechamento do ano fiscal.
14
13
20
11
12
20
20
10
20
09
20
08
pa
Ma
jo/
aú Ar
O valor total de subvenção para o PSR aprovado pelo governo e anunciado no fim do primeiro semestre para a safra 2014/2015, deve ser mantido neste ano em R$ 700 milhões. Assim, ainda restam R$ 300 milhões para serem utilizados, mas que dependem da aprovação de recursos suplementares junto ao Congresso Nacional. Conforme Santos, ainda dá tempo de contratar o seguro. “Novos contratos poderão ser enviados para obtenção de subvenção após a aprovação e liberação da suplementação orçamentária já solicitada de R$ 300 milhões.” A demora na liberação dos contratos prejudica a aprovação de recursos para a contratação de custeios, defende o assessor técnico da Confederação Nacional da Pecuária e Agricultura do Brasil (CNA), Alexandre Câmara Bernardes. “Entre os pontos de atenção, estão o milho (primeira e segunda safra) e a soja, que já iniciaram o cultivo em algumas regiões do País, sorgo e demais culturas.” Segundo ele, na safra passada os produtores interessados na contratação do seguro rural enfrentaram dificuldades em razão da demora na liberação dos recursos de subvenção financeira. “A segunda parcela, por exemplo, só foi autorizada em dezem-
20
07
20
05
06
20
20
04
20
20
20
03
10%
io
Recursos
50%
1.500.000.000
ton An
“Acreditamos que será possível até mesmo superar a quantidade de apólices emitidas em 2013, pois boa parte do orçamento de 2014 (R$ 260 milhões) foi destinado a garantir a safra de inverno, que por apresentar maior risco, tem maior custo individual. Com a suplementação esperada iremos atender as demandas da safra de verão que possui menor custo médio. Os números ainda não são fechados”, completa ele. Segundo dados do Deger/Mapa, até o dia 2 de outubro o número de contratos somava 48.252 unidades. Seis dias depois o número saltou para 51.404 apólices, o que ainda representa apenas 50,4% do volume de apólices contratadas em 2013. Esse total, de acordo com Santos, já comprometia R$ 391 milhões dos R$ 400 milhões de subvenção aprovados pela Lei Orçamentária Anual (LOA).
Fonte: Susep
Da mesma forma, o valor médio do seguro é um indicativo que somente pode ser utilizado de forma confiável após o fechamento do ano fiscal. Diante das necessidades do setor produtivo, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) encaminhou ofícios ao Mapa e à Casa Civil solicitando a liberação do valor complementar de R$ 300 milhões, conforme previsto no Plano Agrícola e Pecuário 2014/2015 (PAP 2014/2015). Em resposta à CNA, porém, o Mapa diz não ter medido esforços para disponibilizá-la, mas ressalta que tal medida não depende apenas dele, sendo necessária a interlocução com a área econômica do governo federal. Desta forma, a CNA aguarda o Poder Executivo para a viabilização deste importante instrumento de política agrícola e mitigação de riscos na atividade, dando sustentabilidade à agropecuária brasileira e garantindo segurança aos produtores do País. Atualmente existem oito modalidades de seguro: agrícola, pecuário, aquícola, de benfeitorias e produtos agropecuários, de penhor rural, florestas, vida do produtor rural e de cédula do produto rural. Outra importante ferramenta para a gestão de risco na agricultura brasileira, o Fundo Catástrofe, ainda está aguardando regulamentação, diz Santos. O mecanismo de seguro rural foi criado em 2010 com anúncio da lei complementar 137, mas ainda não existe na prática. Novembro/2014
Safra
13
Distribuição desigual entre regiões brasileiras Apesar de todas as evoluções do seguro agrícola brasileiro, sua distribuição no País não é uniforme. Dados do Ministério da Agricultura demonstram que a Região Sul respondeu por 60% do total de apólices comercializadas no País no ano passado. Esta participação se manteve este ano, no acumulado até setembro. Paraná (30%) e Rio Grande do Sul (23%) são os Estados que mais utilizam o recurso. Entre os Estados da Região Centro-Oeste, a participação fechou em 12%, com maior destaque para Goiás e Mato Grosso do Sul, ambos com 5% cada, também mantendo o mesmo nível de 2013. Dentre as apólices contratadas no País este ano, 41% são para cobertura em lavouras de soja, 9% de uva, 8% de trigo, 8% para milho e segunda safra, 7% para milho primeira safra, 2% para maçã e 25% para demais culturas. Em 2014, a grande novidade é o aumento na destinação da subvenção à cultura do trigo. O número de apólices chegou a 18,2 milhões o que resultou em um total de R$ 136 milhões em subvenção para esta cultura. Em 2012 o total de apólices ao cereal não alcançava cinco mil, com menos de R$ 29 milhões de subvenção. Em 2013, somou 8,3 mil apólices com R$ 59 milhões de subvenção.
Prêmios
De acordo com dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep), órgão responsável pelo controle e fiscalização dos mercados de seguro, previdência privada aberta, capitalização e resseguro, do Ministério da Fazenda, dos prêmios de seguro concedidos no País, até o mês de setembro, São Paulo aparece à frente do ranking nacional com 22,6% do total. Na sequência vem Paraná (18,7%), Rio Grande do Sul (17%) e Minas Gerais (8,6%). Goiás aparece na quinta posição desse ranking da Susep que reúne os benefícios pagos pelas seguradoras nacionais, com 7,4% dos prêmios. Mato Grosso do Sul e Mato Grosso vêm logo em seguida, com 6,2% e 6% respectivamente.
14
Safra
Novembro/2014
4RR 0,065%
4AM 0,103%
4AC 0,075%
Participação por Estado dos prêmios de seguro rural*
4AP 0,004%
4PA 0,478%
4MA 0,786%
4CE 0,290%
4PI 0,605% 4RO 0,493%
Região Sul respondeu por 60% do total de apólices comercializadas * Concedidos no País até o mês de setembro
4TO 0,966%
4MT 5,993%
4MS 6,219%
4BA 2,958%
4DF 4GO 7,371% 0,365% 4MG 8,608% 4SP 22,661%
4PR 18,796%
4RS 17,076%
4RN 0,079% 4PB 0,066% 4PE 0,176% 4AL 0,138% 4SE 0,128%
4ES 0,952% 4RJ 1,069%
4SC 3,481%
Fonte: Susep
Tarifação complexa A complexidade da tarifação do seguro agrícola no Brasil ainda é um grande obstáculo. Segundo o assessor técnico da Confederação Nacional da Pecuária e Agricultura do Brasil (CNA), Alexandre Câmara Bernardes, isso ocorre em função da ausência de dados estatísticos e estudos climáticos, causando assim grande variabilidade no custo de contratação. Tal fato levou à necessidade de criação de uma subvenção econômica conhecida como Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR). A ferramenta é auxílio financeiro concedido pelo governo federal, que reduz os custos de contratação, tornando esse instrumento condizente com a capacidade de pagamento de nossos produtores. Além da subvenção concedida, destaca Bernardes, existem quatro modalidades distintas para a contratação do seguro rural. Uma delas é o seguro de custos: o objeto segurado é a indenização da despesa de custeio da safra, ou seja, do preparo à colheita. Essa modalidade permite que o agricultor tenha recursos para o replantio (se a indenização ocorrer em tempo hábil) ou ao menos possa
se manter na atividade. Outra é o seguro produção. Esta modalidade se caracteriza pela indenização da perda de parte da produção do agricultor, sendo esta a diferença entre a produção em quantidade estimada no ato da contratação da apólice e a produção na colheita. Ainda há o seguro rendimento, em que a indenização é calculada pela perda de receita do agricultor por hectare cultivado, obtida pela ocasião da venda. E o seguro índice: modalidade de contratação pela qual o objeto segurado é calculado a partir da perda de produtividade, associada a um indicador regional, ou seja, o confrontamento entre produtividade estimada e efetiva. “Vale ressaltar que todas essas modalidades de contratação do seguro rural são vinculadas ao zoneamento agrícola e ao Plano Agrícola e Pecuário (PAP), definido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), cujo objeto de observação destina-se ao desenvolvimento de estudos de regionalização dos sinistros climáticos, visando minimizar as perdas da produção”, explica Bernardes.
Arquivo pessoal
Canavial: incêndio levou a perda total de 30 hectares prontos para serem colhidos em Quirinópolis (GO)
“Seguro é ferramenta de gestão”, diz produtor A mentalidade de que o seguro é uma ferramenta importante para a gestão do negócio avança no País, ainda que devagar. No município de Quirinópolis, sudoeste goiano, localizado há 293 quilômetros da capital, Joaquim Sardinha planta cana-de-açúcar há sete anos, em 1,5 mil hectares. A produção, toda segurada, é fornecida para uma usina local. Por duas vezes ele precisou recorrer ao seguro, a primeira há cerca de três anos. Em 2014, há menos de três meses, um incêndio, que ele suspeita que tenha sido criminoso, consumiu mais de 250 hectares prontos para serem colhidos. Desse total, 30 hectares foram completamente perdidos. O prejuízo foi grande, mas seria ainda maior se a lavoura não estivesse segurada. A área queimada possui 800 hectares e o seguro contratado custou em torno de R$ 7 mil. Calculando grosseiramente, o produtor pagou menos de R$ 9 por hectare segurado, já descontada a subvenção do PSR. Como a lavoura já
estava no terceiro corte, quando a produtividade é menor, o valor pago pelo seguro foi de R$ 2,8 mil por hectare, totalizando algo próximo de R$ 84 mil. “É mais ou menos o que receberia se fosse entregar [a produção] à usina. Tem perda, mas é pequena”, conta o produtor.
Compensação
Atualmente a indenização das lavouras de cana-de-açúcar acontece de forma gradativa. Se a lavoura é nova (primeiro corte), o produtor recebe R$ 4 mil por hectare totalmente perdido, se é de segundo corte o valor cai para R$ 3 mil e assim gradativamente até chegar ao valor de R$ 1,8 mil no quinto corte. Joaquim Sardinha diz que o valor do seguro é atrativo graças à subvenção do governo federal, liberada uma vez por ano, mas defende a remodelação do serviço. “O seguro é uma importante ferramenta de gestão. Está bom, mas vai ficar melhor quando conseguirmos obter uma remuneração por produção
[a exemplo do que já existe para grãos], obviamente, adotando todas as precauções e tendo a cautela necessária”, avalia. Segundo ele, só no município de Quirinópolis, são 30 mil hectares segurados. O diretor comercial da Leauto, que administra o Programa Faeg Seguros, da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), Leopoldo Marques, garante que a modalidade de remuneração da cana por produção já está em fase de estudos adiantada e é possível que no segundo trimestre de 2015 já seja possível contratar o seguro neste modelo. “É um trabalho muito mais complexo, porque é necessário analisar cada região e avaliar a capacidade de produção de cada propriedade. É preciso que seja desenvolvido com números porque além das diferenças de solo regionais, há diferenças dentro da propriedade”, explica. Segundo Marques, uma lavoura de primeira corte produz muito mais que uma brotada. “Há locais em que a produtividade por hectare chega a 120 toneladas e outros em que não é possível colher 80 toneladas por hectare. Essa avaliação minuciosa é necessária para que nem seguradora nem cliente saiam perdendo”, explica.
Desempenho
Hoje, 60 mil hectares de lavouras de cana são segurados pelo programa da Faeg em Goiás, o que, conforme Marques, representa 95% da área cultivável de cana de fornecedores. O programa foi criado há quatro anos. Desde então o volume de seguros cresceu entre 15% e 25%. Para 2014 é esperada uma alta de 18% no montante segurado até meados de dezembro. “No seguro de cana, há quatro anos, conseguíamos ofertar de R$ 1,2 mil a R$ 1,5 mil por hectare. Hoje já cobrimos R$ 4 mil por hectare e já pedimos uma cobertura de R$ 5 mil a R$ 5,2 mil para o próximo ano. Isto é um avanço muito grande da Faeg. No primeiro momento, o programa foi criado para atender sindicatos rurais de fornecedores de cana-de-açúcar, mas tomou corpo e foi estendido a produtores e a cooperativas. Com o desenvolver dos números, o seguro começou a ser procurado por outros Estados como São Novembro/2014
Safra
15
Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso e mais recentemente Mato Grosso do Sul. Também, segundo ele, há um trabalho inicial sendo desenvolvido no Paraná. “A procura cresce de acordo com o trabalho que vem sendo desenvolvido. Ainda é um pouco distante do que gostaríamos, mas tudo depende do histórico. Estamos construindo este histórico que tem sido percebido pelo produtor”, diz Marques. O programa, inicialmente criado para atender aos fornecedores de canade-açúcar, passa por evoluções e já começa a segurar máquinas e equipamentos, além de outras culturas como soja e milho. Atualmente o programa possui uma carteira de 1,5 mil clientes.
Ineficiência
O presidente da Associação dos Produtores de Soja de Goiás (Aprosoja/ Goiás), Bartolomeu Braz, destaca ainda o modelo do seguro, no entanto, não é eficiente e contempla apenas parte da produção. “Tira parte das perdas, mas não tira o produtor de uma situação de endividamento”, diz. O seguro, de acordo com ele, deve contemplar a previsão de colheita e não o valor que a seguradora acredita ser correto. “Outro erro em Goiás é que aqui temos uma subvenção em que o produtor paga 50% e o governo federal entra com os outros 50%. Temos Estados como o Paraná, onde o Estado entra com 25%, restando 25% apenas para o produtor.” O presidente da Aprosoja Paraná e vice-presidente da Aprosoja Brasil, José Eduardo Sismeiro, também destaca a ineficiência no modelo de seguro rural existente no Brasil. Segundo ele, em artigo publicado no site da entidade, a modalidade não atende às necessidades dos produtores rurais. “Se por um lado a cobertura é inadequada para os Estados com tradição no uso da subvenção, por outro, desperta pouco ou nenhum interesse nos produtores da Região Centro -Oeste, onde o risco não está nas lavouras, mas fora delas, na variação dos preços em Chicago, no frete, no dólar e etc.” A falta de competitividade no mercado de seguros é outro problema pontuado por Sismeiro. “Sabemos que o
16
Safra
Novembro/2014
Clima ameaça produtividade de soja em Goiás, diz Aprosoja Além das perdas causadas por incêndios nas lavouras de cana, em Goiás, os produtores de soja também deverão recorrer mais ao seguro nesta safra. O presidente da Associação dos Produtores de Soja de Goiás (Aprosoja/Goiás), Bartolomeu Braz, informa que os produtores do grão tiveram um ano com grandes dificuldades. O veranico no fim do segundo semestre e a demora para o início do período chuvoso, agora nos meses de setembro e outubro, deverão causar estragos nas lavouras goianas, com mais prejuízos na cultura da soja. Segundo Braz, deve haver perdas nas regiões sudoeste, sul, noroeste e leste
Vandréia de Paula
do Estado. Em parte do norte os prejuízos devem ser ainda maiores. Em todo o Estado, o presidente da associação estima perda de produtividade na ordem de 1 milhão de toneladas na safra 2014/2015 devido à falta de chuvas no período de enchimento de grãos. “A produção não deve cair porque aumentamos a área plantada entre 12% e 15%, mas ficará estagnada”, explica ele. Também houve perdas na segunda safra do milho. Apesar das dificuldades, o seguro rural no País vem crescendo consideravelmente ano a ano e é possível que se torne o maior em volume da América Latina em pouco tempo, conforme Braz. Jana Tomazelli/Faeg
mercado de seguros está longe de ser competitivo. Uma única seguradora tem 70% do mercado de seguro rural. Mesmo que nós da Aprosoja Brasil reconheçamos seu papel estratégico como parceira e prestadora de um serviço de alta relevância para os produtores, a regra do mercado é fria e clara: quanto maior a competição, melhor a qualidade do serviço e melhor o preço ao consumidor.” A tendência é que caia o valor por apólice, tendo impacto positivo para a cadeia e principalmente para o produtor rural. De acordo com dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep), do Ministério da Fazenda, do total de prêmios diretos pagos pelo produtor até setembro, mais de 60% são da Companhia de Seguros Aliança do Brasil, formada por acionistas do Banco do Brasil e da Companhia de Participações Aliança da Bahia. A Mapfre Seguros Gerais S/A detém 13,72% dessa carteira, seguida pela Swiss Re Corporate Solutions (5,35%). As demais, em torno de 25, dividem os 20% restantes.
Sardinha: seguro ficará melhor “quando conseguirmos obter uma remuneração por produção”
Grandes empresas desenvolvem a economia de um país e podem contar com um parceiro que vai na mesma direção. Banco do Brasil Corporate Banking. Soluções sob medida para grandes negócios.
Novembro/2014
Safra
17
pecuária
Sucessão é um desafio Fotos: Vandréia de Paula
Passar a administração de uma propriedade de pai para filho não é mais regra. Presidente da AGCZ alerta que a atividade pode deixar de ser administrada por pessoas para ser controlada por empresas
Pereira Júnior e a única, dos três filhos, que herdou o interesse pela pecuária, Carolina. Atualmente ela se divide entre a função de advogada e a fazenda da família, em Crixás (GO)
Carla Borges
A
média de idade entre os pecuaristas dos Estados Unidos gira entre 65 e 70 anos. No Brasil, embora não haja um estudo sobre a situação, a questão da sucessão no campo alimenta uma preocupação cada vez maior entre produtores. Até poucas décadas ela ocorria naturalmente, com as propriedades e as atividades passando de pai para filho. Hoje, não é mais assim. “Se não houver medidas inteligentes e eficazes logo, daqui a alguns dias teremos só CNPJ na pecuária e não mais CPF”, alerta o presidente da Associação Goiana dos Criadores de Zebu (AGCZ), Clarismino Luiz Pereira Júnior. Filho, neto, bisneto e tataraneto de pecuaristas, como faz questão de enfatizar, ele conta que o que era uma percepção empírica assumiu a dimensão de preocupação institucional. “Temos de fazer uma discussão mercadológica para perpetrar essa atividade, que é familiar, ancestral”, diz. Dos três filhos de Pereira Júnior, ape-
18
Safra
Novembro/2014
nas um, a advogada Carolina Alves Luiz Pereira Rodrigues, de 28 anos, herdou o interesse pela pecuária. Hoje ela se divide entre o dia a dia de petições e audiências da profissão que escolheu – na qual também segue os passos do pai que, além de criador de gado de elite, é advogado – e a Fazenda Candeias, em Crixás (GO), propriedade da família. À Safra, Carolina contou que assumiu a administração da fazenda sozinha aos 16 anos, quando o pai tornou-se presidente do órgão ambiental estadual, a então Fundação Estadual do Meio Ambiente (Femago), atividade que lhe consumia todo o tempo. “Ele chegou a ficar oito meses sem ir à fazenda e eu assumi toda a responsabilidade”, lembra Carolina. Foi nesse período que Carolina fez curso em Uberaba (MG) de julgamento da raça zebuína, de escrituração zootécnica (para fazer a documentação do gado) e de inseminação artificial, este último, na época do vestibular, quando o pai
a deixou livre para escolher a profissão, com o cuidado de não tentar direcionar sua escolha. Mesmo durante a faculdade, ela cuidava da fazenda, administrando a distância e pessoalmente, tomando decisões. Em 2011, Carolina foi aprovada em um estágio em Paris. “Era uma oportunidade boa, da qual eu não podia abrir mão”, conta. Ela voltou da França já com escritório de advocacia estruturado e não pôde mais continuar à frente da propriedade, que produz tourinhos de alta qualidade para o melhoramento genético de rebanhos comerciais. Mas não perdeu o contato com a fazenda. Mesmo a distância, Carolina organiza dias de campo, dos quais participa, e fica à frente do catálogo e manejo dos bois. Casada há pouco mais de um mês com o administrador de empresas e construtor João Murilo Ferreira Rodrigues, ela relata que ambos querem passar essa tradição para os filhos. “Eles serão criados nessa lida de fazenda”, diz. Baiano e filho de pecuarista,
Rodrigues gosta da atividade. É ele quem compra insumos para a Fazenda Candeias, pesquisa preços e fica de olho nas novidades no setor de produtos. Mas na família, ele foi o único. O pai dele acabou vendendo a propriedade rural na Bahia para fazer um loteamento, relata Carolina. “Vejo muitos pais que não conseguiram passar para os filhos essa paixão pelo agronegócio. Eles veem a atividade como ‘a roça do pai’ e não percebem que podem fazer daquilo uma grande empresa”, afirma Carolina, lembrando que o agronegócio é responsável por 28% do Produto Interno Bruto (PIB) do Estado de Goiás.
Estratégias
A preocupação dos pecuaristas com a sucessão em suas atividades ocorre em um momento de expansão do mercado internacional, em que a demanda por carne de qualidade só tende a aumentar, especialmente na China. “Somos o maior exportador de carne do mundo, mas não o que mais fatura. Precisamos melhorar a qualidade de nossa carne e acabar com o tabu e o preconceito que existem lá fora”, propõe Pereira Júnior. Esse preconceito é forte também em relação à carne do gado do gênero zebuíno, como nelore, gir, brama e tabapuã. “O mercado chinês está abrindo as portas para o Brasil e temos de aproveitar a oportunidade nos fortalecendo, melhorando nosso produto.” Para conseguir novos aliados e disseminar a ideia da necessidade de formar sucessores na pecuária, a diretoria da AGCZ aposta no fortalecimento do viés acadêmico, chamando estudantes de cursos como Medicina Veterinária, Zootecnia e Agronomia a participarem das atividades. A estratégia ainda é recente, mas já está produzindo resultados mensuráveis. Realizada no início de setembro, em Goiânia, a Goiás Genética é um termômetro do acerto da proposta: a feira contou com a participação significativa de estudantes. O auditório da Sociedade Goiana de Pecuária e Agricultura (SGPA), onde foram realizadas as palestras, ficou pequeno e muitos assistiram e participaram sentados no chão. O presidente da AGCZ observa que as empresas de máquinas e insumos já estão olhando para o potencial desse
Novos arranjos para fazer sucessores As últimas cinco décadas foram marcadas pela diversificação dos ramos de atuação profissional. Com o deslocamento de grande parte das famílias para as cidades, houve um crescente abandono das atividades do setor primário. E isso não aconteceu apenas no Brasil, mas também na Europa e nos Estados Unidos, o que faz com que a questão da sucessão na atividade produtiva fique cada vez mais comprometida. “A sucessão na atividade produtiva tornou-se uma grande preocupação no setor primário”, atesta o médico e produtor rural Wagner Miranda. Diretor de Marketing da Associação Brasileira do Gado Tabanel, vice-presidente da Associação dos Criadores de Tabapuã em Goiás e conselheiro da SGPA, entre outras instituições, ele acredita em novos arranjos como alternativa para fazer sucessores. Tem dado certo em sua família. Casado com a médica Ana Maria Miranda – também pecuarista –, Miranda relata que os dois filhos estão fixando suas raízes profissionais nas duas atividades, medicina e pecuária. O mais velho, Pedro Ernesto, já se formou e o mais jovem, João Cláudio, está no quarto ano do curso de Medicina. “Somos uma família com atividades profissionais na área de saúde, mas também na de floresta e pecuária”, diz. Eles são proprietários do Hospital Amparo, da UTI Aérea Goiânia, da UTI Goiânia e do Grupo Parque, que abrange as empresas Parque Florestal, Parque das Vacas e a Expo Parque, um centro de relacionamen-
mercado futuro, o que também ficou evidente durante a Goiás Genética, quando os expositores perceberam a participação desse público jovem e lhe direcionaram algumas ações. “O retorno virá”, aposta. Ele aponta muitas sucessões fortes, como a do pecuarista Fausto Rodrigues
Miranda: “somos uma família com atividades profissionais na área de saúde, mas também na de floresta e pecuária”
to e mostra tanto da pecuária como de floresta, que será inaugurado no quilômetro 44 da GO-070. Miranda conta à Safra que os filhos cresceram nesse meio, observando que tanto o pai quanto a mãe conciliaram as duas atividades, investindo na expansão da atividade médica como da agropecuária. “Hoje eles estão no desabrochar da atuação na medicina e já fazendo parte dessa sociedade empresarial no setor do agronegócio”, pontua Miranda. “Isso nos dá uma tranquilidade, por saber que nossos passos estão sendo seguidos”, acrescenta. Outro aspecto é que, estando no mesmo ramo, há um ganho também no relacionamento familiar, já que os filhos ficam mais próximos dos pais. “Somos felizes porque podemos nos beneficiar dessa estrutura e estamos dando sequência, com tranquilidade, a essas duas atividades na família”, conclui.
da Cunha, um dos mais tradicionais do Estado, cujos filhos Fausto, Fernando e Fábio, dedicam-se à pecuária. Outro criador, Walter Rodrigues da Cunha, também tem filhos e filhas envolvidos com a atividade. “Temos de mostrar o valor desse negócio para atrair essa moçada”, diz Pereira Júnior. Novembro/2014
Safra
19
Social
Em Goiás há 67 escolas no campo, sendo duas delas indígenas e cinco calungas. Ainda há 46 extensões de escolas urbanas em propriedades rurais
Fome de aprendizado
Vandréia de Paula
Deixar a zona rural é a rotina necessária para que mais de 50 mil estudantes em Goiás alcancem uma sala de aula. No campo, até há escolas-modelos, mas não atendem a todos. Também é fora de suas terras que a maioria de agricultores e suas famílias têm acesso a outro direito básico, a saúde Carla Borges
M
esmo com a existência de propostas interessantes e iniciativas que realmente deram certo, ainda há muito a ser buscado e conquistado para que os mais de 580 mil goianos que vivem no campo – 9,71% da população do Estado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – tenham efetivamente assegurados seus direitos à educação e à saúde. Os ônibus e vans do transporte escolar e as ambulâncias são as principais “políticas públicas” da maioria dos municípios goianos nessas duas áreas. Isso não apenas dificulta a vida de quem vive na zona rural como também reforça no inconsciente coletivo o discurso de que a vida no campo é marcada pelo sofrimento e de que a cidade é um ambiente melhor para viver. Especialistas ouvidos pela Safra são
20
Safra
Novembro/2014
unânimes em afirmar que o ideal seria que o ensino fosse oferecido no ambiente em que as crianças e os adolescentes estão, usando a riqueza do campo como base para uma boa educação, mas não é isso o que acontece. Dados da Secretaria de Estado da Educação (Seduc), com base no Censo Escolar de 2013, mostram que dos 65 mil estudantes goianos que moram no campo, 55,8 mil, ou 85,97%, são transportados diariamente para escolas nas cidades próximas das propriedades em que vivem, o restante, também utiliza ônibus escolar, mas para chegar a escolas na zona rural. Desse total, a grande maioria – 60.512, ou 93% dos estudantes – está no ensino fundamental: são crianças que, em destino à cidade, passam horas preciosas de seus dias dentro de veículos, o que acaba interferindo negativamente no desempenho escolar. Apenas 4,5 mil estão no ensino médio.
Em Goiás há 67 escolas no campo e mais 46 extensões de escolas urbanas situadas em propriedades rurais. Entre as 67 escolas do campo, duas são indígenas e cinco são escolas calungas, com 11 extensões que atendem as comunidades quilombolas do Estado nas regiões de Campos Belos, Cavalcante, Monte Alegre e Teresina de Goiás. Ainda há escolas multisseriadas, em que são atendidos estudantes de várias faixas etárias, geralmente em situações precárias, mas a tendência é de que elas sejam gradativamente fechadas e as crianças e adolescentes matriculados, transferidos para as cidades. Em relação ao atendimento em saúde, nos municípios que valorizam e investem no Programa Saúde da Família (PSF), há avanços significativos, inclusive em prevenção de doenças. Os casos mais graves têm de ser tratados nas cidades próximas ou em centros maiores.
Vandréia de Paula
Contramão
A educação no campo, no Brasil, está na contramão do ideal. A avaliação é da coordenadora do Programa Campo Saúde, do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) em Goiás, Maria Luiza Bretas. “O certo é ter boas escolas no meio rural para não tirar as crianças do convívio familiar, mas o que se repete, há várias décadas, é a prática de tirá-las de casa de madrugada e levá-las para escolas urbanas, onde convivem com pessoas da cidade, o que muitas vezes traz uma sensação de inferioridade devido a fatores culturais”, avalia Maria Luiza. “Acho que o Brasil está completamente equivocado na educação no campo. Em vez de tirar a criança de casa, com sono, cansada, e levá-la para a cidade, não seria mais prático levar um professor para cuidar delas onde elas estão?”, questiona, acrescentando que a maioria das escolas na zona rural está abandonada, em função da debandada para a cidade. Para o coordenador do Programa Educação e Cidadania da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Goiás, Adilson Alves da Silva, a educação no campo foi historicamente negligenciada e desrespeitada porque ainda permanecem ranços da visão elitizada do acesso ao conhecimento. “A educação como um todo tem problemas, mas a do campo é mais estigmatizada. Antes, acreditava-se que ‘gente da roça’ não precisava estudar, mas até os dias de hoje isso é recorrente”, afirma. Silva
ulg
Div o/
aça g Fae
Maria Luiza: “O certo é ter boas escolas no meio rural para não tirar as crianças do convívio familiar”
Adilson da Silva: “Antes, acreditava-se que ‘gente da roça’ não precisava estudar, mas até os dias de hoje isso é recorrente”
fala com conhecimento. Sua trajetória está intimamente ligada à educação no campo. Ele nasceu em uma fazenda em Piranhas (GO), mas ainda pequeno se mudou com os pais para uma fazenda em Mato Grosso, na década de 1970. Até os 15 anos estudou em escola de ensino fundamental multisseriada, na zona rural. “Era muito difícil, uma só professora para 30, 40 alunos. Ela dividia a sala e o quadro”, relata. Da 5ª à 8ª série, ele estou na Escola de Agricultura Alternativa, um projeto financiado pela Igreja Católica. Frequentou escola técnica em Cáceres (MT), cursou Letras na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), e desde 1997 é professor. Em Goiás, Silva integra o Comitê de Educação no Campo do Estado de Goiás e é agente de base voluntário da Comissão Pastoral da Terra (CPT). O tema de sua dissertação de mestrado na PUC foi “A educação no campo em Goiás: contribuições da Comissão Pastoral da Terra”. O professor conhece experiências bem-sucedidas, capitaneadas pelos movimentos sociais em alguns assentamentos, como em Formosa, na Escola Holanda, na cidade de Goiás –
onde a antiga sede da fazenda virou a escola do assentamento. “Onde não há mobilização da comunidade, ainda há escolas multisseriadas. Nos demais, em mais de 80% dos municípios, o foco da educação no campo é o transporte escolar, ele é visto como a solução”, atesta. Para a coordenadora do Programa Campo Saúde, do Senar, há dados subjetivos que agravam a situação. “Existe ainda aquele sentimento de que a cidade é melhor, tem mais atrativos, mas sabemos que esses atrativos muitas vezes são negativos e acabam resultando no desinteresse pelos estudos, em amizades não muito adequadas e vícios, causando um problema social na cidade e também no campo”, acrescenta Maria Luiza. Para ela, o papel dos produtores e trabalhadores rurais deveria ser repensado nesse contexto. “Os produtores poderiam, por exemplo, se juntar, construir escolas em suas regiões, e contar com a contrapartida do Estado e dos municípios, por exemplo, com a contratação de professores e merendeiras. Seria uma saída”, sugere. “A sociedade precisa se responsabilizar mais pela educação.” Novembro/2014
Safra
21
Fotos: Vandréia de Paula
Contrapartida
Uma das iniciativas bem-sucedidas dentro da cota de responsabilidade social dos produtores rurais é o Agrinho, realizado em conjunto pela Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg) e o Senar Goiás. Com foco na educação ambiental, ele tem como objetivo complementar a metodologia do ensino formal na educação infanto-juvenil. “Esse programa tem o poder de mudar a realidade das escolas e das comunidades em que está inserido”, conta Maria Luiza. A primeira etapa é a escolha do tema que será trabalhado ao longo do ano. O de 2014 é “Esporte, lazer, cidadania e meio ambiente”; no próximo será “Saúde, qualidade de vida e meio ambiente”. O programa oferece a formação de professores. São convidados três de cada município. Neste ano, foram 32 horas-aula de formação, carga horária que será aumentada para 40 horas em 2015. O Senar contrata especialistas na área para oferecer a capacitação, voltada para elaboração de projetos de lazer, música, ginástica, interação, tudo com cunho pedagógico. Esses professores, depois, fazem a multiplicação, repassando o conteúdo para os colegas em seus municípios de origem e vizinhos, recebendo uma ajuda de custo para isso. Em 2014, chegou a 12 mil o número de docentes contemplados. Os projetos desenvolvidos nas escolas pelos professores depois concorrem ao Concurso Agrinho. A expectativa é de receber, em 2014, as inscrições de 12 mil trabalhos, número quase 30% maior que as 9,5 mil do ano passado. Concorrem os alunos e as escolas. A melhor experiência pedagógica recebe um carro zero-quilômetro. Um dos projetos resultou no livro Pequenas ações, grandes conselhos, prefaciado pelo escritor Augusto Cury. Em outro, a comunidade de Piranhas trabalhou com a revitalização de uma praça. “O ensino deveria estar sendo pautado em projetos e é isso o que propomos”, diz Maria Luiza. “Assim, estimulamos a escola a pesquisar, a ir atrás de respostas.” 22
Safra
Novembro/2014
Leidiane (à direita): “O conhecimento que adquiro aqui posso aplicar lá [na propriedade da família]
Verdadeiros laboratórios a céu aberto Outra iniciativa de sucesso em Goiás são as Escolas Famílias Agrícolas, que funcionam em quatro municípios: Goiás, Orizona, Padre Bernardo e Uirapuru. Elas se fundamentam na Pedagogia da Alternância, que consiste em alternar o tempo dos estudantes entre a escola e a casa, e oferecem curso técnico em agropecuária de nível médio para filhas e filhos de produtores da agricultura familiar. Em ambos os locais, eles têm acesso a verdadeiros laboratórios a céu aberto, onde podem conjugar as partes teórica e prática. Os alunos passam uma semana na escola, como internos, em tempo integral, e outra em casa, com as famílias. A Safra esteve na Escola Família Agrícola de Orizona (Efaori, como os professores e alunos fazem questão de chamá-la) e encontrou estudantes e professores motivados. Os jovens, pensando no vestibular; os professores, satisfeitos com a interação e o nível de comprometimento de seus orientandos.
Vinicius Pinheiro (ao centro) quer cursar Veterinária: ele acredita já ter uma boa base para o vestibular
O professor Rafael Costa Canedo dá aulas de Física, Química e Biologia há dois anos na Efaori. À noite, ele ministra aula em povoados na zona rural de Orizona, onde funcionam os núcleos estaduais de educação no campo, para estudantes do ensino médio. Canedo percebe e relata a diferença entre os públicos. “Aqui [na Efaori] eles têm mais perspectiva, são mais interessados e o rendimento é bem maior”, compara. Nos núcleos, a maioria dos alunos trabalha na roça durante o dia e querem apenas concluir o ensino médio. “Aqui, eles têm o intuito de prestar vestibular”, diz. Um deles é Vinicius de Oliveira Pinheiro, que quer se tornar acadêmico de Veterinária. Os pais dele moram na cidade, mas a família possui uma propriedade rural distante 15 quilômetros, onde trabalham com bovinocultura de leite, avicultura e suinocultura, todas atividades com as quais os alunos trabalham na Escola Família Agrícola. Monitor na parte de suinocultura, Pinheiro já trabalha com assistência técnica e acredita que já tem uma boa base para o vestibular. Estudante do terceiro ano do ensino médio na Efaori, Leidiane Pinheiro dos Santos destaca que, graças à iniciativa, pode ficar mais próxima da família, que tem uma propriedade em Orizona, onde trabalha com bovinocultura leiteira e agricultura familiar. “Os professores são muito dedicados e o conhecimento que adquiro aqui posso aplicar lá”, compara. Na escola, os estudantes cuidam da horta e também das criações de aves, suínos e bovinos. Eles aprendem todas as técnicas e até a ração para os animais é preparada em uma minifábrica no local, com uso de milho, farelo de soja, sorgo e mistura apropriada. No local, nada é desperdiçado. Até mesmo a água da limpeza do espaço da suinocultura é utilizada para preparar adubo. “Aqui é como se fosse a extensão da casa de cada um deles. Tudo faz parte da formação, tanto teórica como prática”, resume a diretora da Efaori, Aparecida Maria Fonseca. Para ela, o diferencial das Escolas Famílias Agrícolas
Rafael Canedo (à direita): “Aqui [na Efaori] eles têm mais perspectiva, são mais interessados e o rendimento é bem maior”
está no fato de elas serem do campo, no campo e para o campo. “O currículo, as atividades e o calendário são preparados dentro da realidade do campo”, explica, ressaltando a complexidade da Pedagogia da Alternância, pela utilização de um método próprio, com a utilização de instrumentos específicos, inter-relacionando todas as atividades de convivência no internato à formação. Em aproximadamente 15 anos de funcionamento, a escola formou 258 técnicos e realiza o Projeto Profissional do Jovem, com atividades ligadas à produção agrícola e à assistência técnica. A diretora destaca ainda a participação e aprovação em vestibular de seus egressos e a maior participação das mulheres
Aparecida Maria: “Currículo, atividades e calendário são preparados dentro da realidade do campo”
na formação técnica em agropecuária. A superintendente de Ensino Fundamental da Secretaria de Estado da Educação, Viviane Pereira da Silva Melo, diz que desde o início desta gestão a Seduc tem procurado melhorar essas condições, por meio de um transporte escolar de qualidade, da criação de extensões e escolas para atendimento da população do campo, reduzindo, assim, a distância percorrida pelos estudantes. “Em alguns casos, até abrindo mão do transporte ou, se necessária a utilização, que o tempo de viagem seja o menor possível”, informou Viviane à Safra. Uma das ações foi a aquisição pela Seduc, em parceria com o governo federal, de veículos com dinheiro do Programa Caminho da Escola, por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), do Ministério da Educação. Entre o fim de 2013 e o início deste ano, foram entregues aos municípios goianos 52 veículos destinados à melhoria do transporte escolar das crianças e jovens. “A liberação dos ônibus foi um passo importante para garantir maior segurança aos estudantes e isso contribui também para a melhoria da qualidade da educação pública”, avalia Viviane. Outra ação, acrescenta, é a manutenção dos regimes de colaboração entre as redes estadual e municipais na oferta do atendimento ao ensino fundamental e ao ensino médio no campo. Novembro/2014
Safra
23
ção al/S
ori Set e
aúd
Novembro/2014
ica
Safra
un
24
Itapirapoan das Chagas, de Varjão: “Os casos mais graves têm de vir para Goiânia”
m Co
Na área de saúde, o atendimento à população que vive no campo limita-se à atuação dos agentes de saúde da família. Ainda assim, nos municípios que investem no Programa Saúde da Família (PSF). Eles realizam visitas mensais às propriedades, onde orientam os moradores sobre saúde, ações de prevenção e vacinação, entre outros, mas sua atuação é limitada. “Antes, eles aferiam pressão arterial. Agora, nem isso podem mais fazer. Ajuda um pouco”, diz Itapirapoan das Chagas, de 69 anos, que vive com a família em um sítio na zona rural de Varjão (GO). Ele revela que existe um posto de saúde na cidade, mas também com limitações. “Só tem consulta com clínico geral. Os casos mais graves têm de vir para Goiânia”, relata. Foi assim com ele, quando teve de fazer cirurgia para retirada da próstata. Desde então, ele faz acompanhamento com cardiologista e nefrologista no Hospital Geral de Goiânia, onde foi submetido à cirurgia e para onde volta a cada quatro meses para repetir exames. “Agora, está tudo normalizado”, comemora Chagas, que, em seu sítio, cria porcos, galinhas e planta milho, mandioca e feijão. “Só para subsistência.” O secretário estadual da Saúde, Halin Antonio Girade, reconhece que os moradores de pequenas cidades do interior e da zona rural merecem atenção maior na área de saúde. Ele explica que esses atendimentos de menor complexidade são de responsabilidade dos municípios, mas adianta ações que a Secretaria de Estado da Saúde (SES) está realizando para melhorar essas ações. “Quem deve oferecer o serviço é o município, mas temos a obrigação de ajudar, com financiamento e definição de políticas para a saúde”, afirma o secretário. A primeira abordagem da
Vandréia de Paula
Restrições no atendimento médico
Girade: “É pelo PSF que são feitos os primeiros atendimentos de médicos, enfermeiros e agentes de saúde”
população, esclarece, deve ser à Estratégia de Saúde da Família. “A zona rural tem de ter o programa. É pelo PSF que são feitos os primeiros atendimentos de médicos, enfermeiros e agentes de saúde, que estão próximos desses moradores e fazem o atendimento mais adequado”, avalia.
Além disso, há duas estratégias que Girade considera interessantes: a construção dos ambulatórios médicos de especialidades, os AMEs, em regiões estratégicas geograficamente, e a criação de consórcios intermunicipais. Serão criados seis ambulatórios. Os das cidades de Formosa, Goianésia, Quirinópolis e São Luiz já estão em obras, levantando paredes. Os de Goiás e Posse foram licitados. O secretário informa que cada AME funcionará das 7 às 19 horas, com capacidade para realizar de 5 mil a 7 mil exames por mês, atendimento médico com 20 especialidades e abrangência de 250 mil a 400 mil moradores por área. “Nosso principal objetivo é humanizar o atendimento, com qualidade”, destaca. Sobre os consórcios, a SES está incentivando e dando apoio para que municípios se organizem e atuem de forma conjunta. Já há iniciativas adiantadas nesse sentido.
Prevenção
ivo
u Arq g Fae
Um programa criado em 2008 pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), o Campo Saúde, acumula experiências bem-sucedidas. A coordenadora do projeto em Goiás, Pollyana Ferreira da Silva, observa que se trata de uma ação de promoção social e complementar, que nasceu da constatação da dificuldade de encontrar especialidades médicas no interior do Estado, onde há, basicamente, clínicos gerais. Na zona rural, então, a situação é mais difícil. “Quem mora no campo tem dificuldade de sair de casa, devido às várias atividades, principalmente os pequenos produtores, agricultores familiares, que são a grande maioria”, observa. Essa dificuldade fica mais patente com o sistema de agendamento de consultas. Para contornar essas especificidades e chegar à população da zona rural, o Campo Saúde organiza caravanas de atendimento com profissionais das áreas de dermatologia – importantíssima para diagnosticar possíveis problemas em decorrência de anos de exposição ao sol sem proteção, até câncer de pele –, oftalmologia, pediatria e ginecologia. “Essas são as básicas, mas os tipos de especialidades são modificados quando há necessidade, de acordo com a especificidade do município”, informa Pollyana. Geralmente, o atendimento é solicitado pelas prefeituras do interior, sindicatos rurais e cooperativas. “Atendemos parte da demanda das cidades e nosso público-alvo é o meio rural”, diz a coordenadora. O PSF é um importante aliado no campo. Dentro do programa do Senar, uma das ações de sucesso foi o Programa Saúde do Homem, que ofereceu exames de PSA, para diagnosticar alterações na próstata. Para chegar aos homens e convencê-los da importância da ação, as mulheres, atendidas pelo programa de prevenção ao câncer de colo de útero, foram grandes aliadas, assim como os agentes de saúde. Na data agendada, são realizados os atendimentos de toda a demanda e os casos mais urgentes são encaminhados às secretarias de saúde
Pollyana da Silva: Campo Saúde organiza caravanas de atendimento com médicos especialistas em diferentes áreas
do Estado e dos municípios. Outra dificuldade é que nos municípios, muitas vezes os gestores não são da área de saúde e não têm informações sobre, por exemplo, como fazer a regulação de vagas para pacientes pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o que é bastante complexo. O Campo Saúde oferece também esse
tipo de capacitação. “Há muitos casos de empresas criadas especificamente para assessorar as secretarias”, revela Pollyana. No próximo ano, haverá mudanças no programa e seu objetivo será voltado mais para ações preventivas e educativas na área de saúde. A intenção é dar ênfase à capacitação, inclusive dos agentes de saúde. Com o Agrinho, por exemplo, serão feitas ações para a saúde bucal. Pollyana conta que outra preocupação é com a situação de pessoas idosas que vivem no meio rural. Sem assistência especializada, muitas vezes, feridas e machucados simples tornam-se graves. “Vamos continuar com essas ações, mas ampliando a prevenção”, adianta. A ideia é que os sindicatos rurais atuem mais, cobrando ações dos municípios. Há locais com pequenos postos de saúde, que recebem a visita de um profissional de enfermagem uma vez por semana e distritos afastados dos municípios. O desafio é capilarizar esse atendimento.
A SOLUÇÃO COMPLETA EM MANUTENÇÃO
Motores Elétricos Chaves de Partida Bombas Centrífugas Transformadores Geradores de Energia
MATRIZ - GOIÂNIA
62 3295-3188
FILIAL - RIO VERDE
64 3622-1020
WWW.AJELSERVICE.COM.BR
FILIAL - BRASÍLIA
61 3345-0292 Novembro/2014
Safra
25
ENERGIA PARA CRESCER.
Bens de capital
Uma situação
delicada
Fabricantes de máquinas e equipamentos para usinas de açúcar e etanol tentam criar estratégias para sobreviver e enfrentar a queda de encomendas e a ociosidade elevada Lauro Veiga Filho
A
ga
nza
Novembro/2014
Go
Safra
rto
26
processo de redução gradual da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), como forma de evitar o aumento da gasolina nas bombas, até sua eliminação integral em junho de 2012, desorganizou o setor, afastou investidores e acertou em cheio o setor representado pelo CeiseBr. “O represamento do preço da gasolina para segurar a inflação provoca a prática de preços irreais para o álcool, não remunerando satisfatoriamente o produtor. A não realização de leilões específicos para energia gerada por biomassa também não tem atraído investidores. A falta de um marco regulatório para a energia gerada no setor é mais um agravante”, ressalta Tonielo Filho. Para complicar, as lavouras de cana sofrem, há três safras, com variações climáticas desfavoráveis, incluindo estiagens prolongadas, geadas e chuvas excessivas nos momentos menos adequados. Essa combinação de fatores, retoma o presidente do CeiseBr, “provocou a redução de demanda de máquinas, equipamentos e serviços, o que consequentemente, coloca a indústria de bens capital do setor numa situação muito delicada, com ociosidade da capacidade instalada, sendo
e Alb
indústria de bens de capital fabricante de máquinas e equipamentos para usinas de cana, açúcar e etanol, construída a duras penas pelo País a partir do lançamento do Proálcool, ainda nos anos 1970, hoje “atravessa um dos piores momentos de sua história”, afirma Antonio Eduardo Tonielo Filho, presidente do Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustíveis (CeiseBr). “Podemos apontar a crise econômica mundial, que a partir de 2009 reduziu drasticamente os investimentos no setor, como um dos fatores”, analisa Tonielo Filho. “As consequências (da crise) são desastrosas, culminando com demissões e até fechamento de pequenas e médias indústrias. Se em 2015 não tivermos, com a rapidez necessária, um plano de desenvolvimento para o setor de açúcar e etanol, poderemos presenciar um sucateamento generalizado e irreversível da indústria”, sustenta Celso Cassiano, vice-presidente da sede regional da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) de Ribeirão Preto. A série de intervenções malsucedidas do governo no setor, contada a partir de 2008, quando foi iniciado o
Antonio Eduardo Tonielo Filho: indústria de bens de capital “atravessa um dos piores momentos de sua história”
obrigada a fazer redução de custos, forçando-a a demissões de funcionários e a recorrer ao sistema bancário para arcar com seus compromissos”. O setor passou a adotar uma estratégia defensiva para fazer frente à
Niels Andreas/Unica
Carteira de pedidos em baixa: usinas reduzem investimentos em máquinas e equipamentos
retração das encomendas, adotando medidas para reduzir custos e incrementar a inovação para preservar sua competitividade, aponta Tonielo Filho. “As empresas representadas pelo CeiseBr também têm procurado outros mercados, outros segmentos, embora a economia de um modo geral esteja num ritmo desacelerado, o que dificulta ainda mais a atuação de nossas empresas”, acrescenta ele. Para uma indústria altamente capacitada e que sempre investiu em tecnologia de última geração, observa Cassiano, da Abimaq, promover alterações repentinas em seu portfólio de produtos corresponde a um desafio nada trivial, “pois são necessários investimentos em novos projetos, capacitação de mão de obra, desenvolvimento de tecnologias e principalmente tempo para que esse novo produto seja aprovado pelo mercado”.
O processo de adequação da indústria torna-se assim “muito complicado, deixando o setor numa situação crítica e muitas vezes com poucas alternativas para a sobrevivência”, acrescenta Cassiano. Como alternativa, essas empresas passaram a desenvolver a área de serviços, que exige proporcionalmente investimentos mais baixos e oferece retorno mais rápido. Mas, ressalva ele, a opção não é uma solução definitiva, dada a dimensão dos problemas que o setor enfrenta, já que o volume de reformas tem igualmente minguado diante da retração da atividade em toda a cadeia. “Outras empresas estão buscando atuar em diferentes mercados, como o de papel e celulose e mineração, no entanto, as especificidades de alguns produtos dificultam a mudança com a rapidez que a necessidade exige.
Além disso, estes ‘novos mercados’ também não vivem um bom momento, devido à atual conjuntura mundial”, completa Cassiano. Com a aproximação do fim do ano e a conclusão da safra de cana, Tonielo Filho considera 2014 como perdido e acredita que mudanças significativas, se vierem, ocorrerão apenas no próximo ano. “Para 2015, no entanto, acredito que algumas medidas começarão a ser tomadas no intuito de reverter esse quadro desfavorável que acomete o setor sucroenergético”, diz ele. Entre as providências aguardadas, Tonielo Filho afirma que o setor espera medidas que tornem o crédito mais acessível, com maior flexibilidade, facilidade de contratação e recursos em volume necessário para “promover possibilidades de novos investimentos” e que, como consequência, “criem condições para a retomada do crescimento de toda a cadeia produtiva da cana de açúcar”. Novembro/2014
Safra
27
Usinas ainda não abandonaram a lavoura ç lga
u Div ão
Especializada na fabricação de equipamentos para plantios mecanizados de cana e para o trato das soqueiras, a DMB Máquinas e Implementos, de Sertãozinho, interior de São Paulo, também tem sentido os efeitos da crise no setor sucroalcooleiro nas últimas safras, ainda que a indústria de açúcar e etanol não tenha “abandonado a lavoura”, observa Auro Pereira Pardinho, gerente de Marketing da empresa. Canaviais maltratados significam perdas ainda mais severas para o setor, levando-se em conta que a “cana demora três anos para recuperar a produção que tinha”, lembra Pardinho. De forma geral, diz ele, usinas ainda investem em tratos culturais, recuperação de lavouras e mesmo em “algumas compras” de equipamentos, “mas não como antes”. Pardinho refere-se ao “ciclo dourado” do setor, que durou até a crise de 2008. Os investimentos em expansão e novas plantas foram definitivamente sacrificados pela indústria da cana, mas grupos de maior porte continuam a investir em plantio e reforma de canaviais.
Auro Pardinho: “Se conseguirmos fechar 2014 com resultados semelhantes aos do ano passado já não terá sido assim tão ruim”
“Se formos considerar a necessidade de replantio e reforma de 1,5 milhão de hectares de lavoura por safra, a um custo médio de R$ 6,5 mil por hectare, estaremos falando de investimentos em torno de quase R$ 10 bilhões por ano”, estima o diretor técnico da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Antonio de Pádua Rodrigues. O ano passado já não havia sido bom para o mercado atendido pela DMB e, neste ano, Pardinho afirma que houve algum recuo dos negócios nos primeiros meses. “Se conseguirmos fechar 2014 com resultados semelhantes aos do ano passado já
não terá sido assim tão ruim, mas não acredito em crescimento de receita. Se houver, será bem pequeno”, projeta sem citar números. Plantadoras e sulcadoras respondem por 65% dos negócios da empresa e representam, ainda, um segmento de mercado com espaço para crescimento. “Nossas vendas têm se mantido em níveis suficientes para dar sustentação ao negócio”, aponta Pardinho. A DMB mantém uma participação de 50% no mercado em áreas de plantio mecanizado. Um dos efeitos da crise foi a interrupção de turnos extras e a concentração da produção em um turno único. “A empresa não chegou a demitir e continua com algo em torno de 300 funcionários em sua planta”, diz ele. A planta de Sertãozinho atende a todo o País e preserva uma fatia de sua produção para exportações, concentradas nos mercados das Américas do Sul e Central e da África, com destaque para Sudão, África do Sul e Nigéria. Mesmo no front externo, o crescimento não tem se dado conforme o esperado. As exportações, principalmente de plantadoras e outros implementos para o cultivo de cana, já representaram 15% a 18% das vendas totais, mas atualmente ocupam uma fatia entre 8% e 10%, de acordo com Pardinho. Divulgação
Planta da DMB em Sertãozinho: participação de 50% no mercado de plantio mecanizado de cana
28
Safra
Novembro/2014
Desaceleração mais severa neste ano
Atualmente com 500 funcionários, em números aproximados, a Caldema ocupa uma área de 120 mil metros quadrados, incluindo escritórios, galpões, prédios de apoio e os setores de engenharia e controle de qualidade. Além de projetar e fabricar caldeiras, seu produto principal, a empresa pro-
duz hidrolisadores de bagaço, vasos de pressão, fins de curso rotativo, freios eletrohidráulicos, como outros equipamentos com projetos de terceiros, com pessoal especializado nas áreas de engenharia, garantia da qualidade, caldeiraria e usinagem, tubulação, jato de areia e pintura, e assistência técnica. Divulgação/Caldema
o
açã
ulg
Div
Depois de uma fase de procura vigorosa para a instalação de novos projetos, até o estouro da crise financeira global, em agosto de 2008, os fabricantes de maquinários e equipamentos para as usinas de açúcar e etanol passaram a enfrentar uma “sequência decrescente”, agravada ainda mais nos últimos três anos, de acordo com Alexandre Roberto Martinelli, coordenador das áreas Comercial e de Marketing da Caldema, tradicional indústria do setor, instalada desde 1972 em Sertãozinho (SP). Neste processo, 2014 tem sido especialmente negativo, com “uma desaceleração maior no processo de aquisição de equipamentos” para o setor sucroalcooleiro. A participação do segmento na carteira de encomendas da Caldema sofreu baixa de quase 8% e a empresa está às voltas, atualmente, com uma ociosidade em torno de 40%. “O índice só não é maior porque o mercado externo continua atrativo”, acrescenta Martinelli. A estratégia montada para fazer frente ao recuo vertical das usinas de cana incluiu, entre outras medidas, a diversificação de mercados, a busca de novos setores e investimentos em parcerias e novas tecnologias, como forma de assegurar a sustentação do negócio. A carteira de pedidos passou a incluir os setores de mineração, papel e celulose, siderúrgico, químico e petroquímico, numa tentativa de recompor as encomendas e manter a operação. A Caldema foi atrás ainda de parceiros com expertise nas tecnologias exigidas para a fabricação de equipamentos destinados aos novos clientes conquistados. Entre os principais parceiros, Martinelli destaca a norte-americana Foster Weeler (FW), “empresa de maior tradição no mundo em combustão de leito fluidizado, para fornecimento de caldeiras de leito fluidizado borbulhante”.
Caldeiras fabricadas sob encomenda
Alexandre Martinelli: participação do setor sucroalcooleiro na carteira da empresa sofreu baixa de 8%
Essa tecnologia garante a queima de bagaço de cana com alta eficiência, superior a 99,5%, com menores índices de emissão de monóxido de carbono, óxidos de nitrogênio e material particulado, o que reduz impactos ambientais. Além da FW, a Caldema tornou-se parceira da holandesa NEM, especializada em tecnologias para caldeiras especiais, incluindo queima de vinhaça, e também da sul-africana John Thompson, que produz grelhas rotati-
vas. “A esperança para o setor e para o País é que a nossa política energética e de combustíveis favoreça a cogeração através da biomassa, bem como o álcool, com uma remuneração mais justa para o mesmo, pois além de serem fontes de energia renováveis, não poluem em grande escala e são econômica e ecologicamente mais viáveis que outras fontes de combustíveis”, declara Martinelli. A Caldema aguarda uma definição sobre as políticas que deverão ser adotadas pelo governo eleito, assim como dos futuros leilões de energia, para estabelecer suas próprias estratégias para os próximos anos. Como fator positivo, lembra Martinelli, o tempo curto entre a instalação e o início de operação de uma planta de cogeração de energia a partir de biomassa, em torno de dois anos, poderá favorecer uma retomada igualmente rápida, condicionada a uma mudança radical no ambiente econômico, a uma regulação mais eficiente do setor sucroalcooleiro e de geração de energia renovável e a melhoria nas condições de operação das usinas de açúcar e etanol. Novembro/2014
Safra
29
Desde 2008, um total de 67 usinas foram forçadas a recorrer à proteção assegurada pela Lei 11.101 (nova lei de falências), de 9 de fevereiro 2005, entrando em processo de recuperação judicial, o que representa em torno de um sexto do total de usinas em operação, de acordo com levantamento recente da MBF Agribusiness, empresa de consultoria com atuação nas regiões de Sertãozinho e Piracicaba, no interior de São Paulo, e com participação em praticamente 80% dos processos de recuperação judicial atualmente em curso, seja pelo lado credor, seja pelo lado dos devedores. Outro levantamento, realizado pela consultoria Ricardo Pinto Associados (RPA), de Ribeirão Preto (SP), mostra que outras 30 usinas, das quais sete já paralisaram operação, deixaram há meses de fazer pagamentos a fornecedores, pararam de pagar pelos insumos comprados e a outros credores. A expectativa é de que recorram à recuperação judicial nos próximos meses por incapacidade de retomar esses pagamentos. A capacidade total de moagem dessas usinas aproxima-se de 60 milhões de toneladas de cana por ciclo, na estimativa da consultoria. Na avaliação de Marcos Françóia, da MBF, o setor como um todo, que responde por 12% do Produto Interno Bruto (PIB) e emprega 4,5 milhões de pessoas, acumula dívida ao redor de R$ 60 bilhões, correspondente a R$ 100 por tonelada de cana processada, o equivalente a praticamente uma safra inteira, levando-se em conta a cotação atual da saca de açúcar. “Uma tonelada de cana produz em média 2,5 sacas de açúcar e cada saca atinge, hoje, em torno de R$ 45 (o que resulta em uma receita de R$ 112,50 por tonelada de cana moída)”, exemplifica Françóia. Entre as 67 usinas identificadas pela MBF, 40 unidades, ou quase 60% daquele total, estão inativas, pouco mais
30
Safra
Novembro/2014
Arquivo
Usinas à beira da bancarrota
Retrato atual: além de 67 usinas em recuperação judicial, outras três dezenas poderão seguir o mesmo caminho
de 49% tomaram o caminho da recuperação judicial entre 2008 e 2009 e outras sete unidades, de três grupos empresariais, buscaram a proteção da lei de falências e recuperação neste ano. A análise do perfil das usinas, prossegue Françóia, mostra que foram mais atingidas as plantas que processam ou processavam até 1,3 milhão de toneladas por safra, representando 76% do total, enquanto 52% são unidades mistas, com capacidade para produzir açúcar e álcool, e 12% geravam apenas açúcar, o que sugere problemas maiores para as que trabalham com etanol. Para o consultor, as usinas com esse perfil de moagem demonstram maior vulnerabilidade a oscilações de mercado e a variações do clima acima das médias históricas. “É importante destacar que parte das unidades que compõem essa faixa de moagem (até 1,3 milhão de toneladas) teve seus investimentos para expansão realizados justamente no período entre 2005 e 2007, aumentando o endividamento sem a resposta desejada”, afirma Françóia. Na média das usinas analisadas,
52% do endividamento estava concentrado em operações com instituições financeiras, prossegue o consultor, envolvendo credores sujeitos a planos de recuperação judicial, ou seja, com garantias reais, e não sujeitos. “Se o plano não for bem planejado e fundamentado em relação à necessidade do pedido de recuperação e à forma de pagamento, lastreada na geração futura de resultados, a negociação pode ser muito dificultada”, adianta ele. Os primeiros planos, apresentados em 2008, contemplavam prazos de cinco a oito anos para a solução das dívidas. Nos anos seguintes, diante do agravamento da crise e do aumento no volume de processos, os prazos foram ampliados, chegando até a 25 anos em alguns casos, embutindo maior redução de juros e do saldo devedor. “As chances de recuperação aumentam quando há uma gestão séria. Essa renegociação de planos está acontecendo e se intensificará, pois as empresas estão com dificuldades em cumprir os compromissos assumidos anos atrás”, prevê Françóia.
Novembro/2014
Safra
31 
Espaço Sebrae
Luiz Barretto
Palavra do presidente A olericultura – área da horticultura que abrange a exploração de hortaliças e que engloba raízes, bulbos, tubérculos, frutos diversos e partes comestíveis de plantas – cresceu 31% entre 2000 e 2011 no Brasil. Segundo dados do Anuário Brasileiro de Hortaliças, apenas em 2011 a atividade movimentou R$ 25 bilhões e gerou 7,3 milhões de empregos. Com apoio e investimento do Sebrae, o setor tem conseguido atender à crescente demanda e exigência por produtos de melhor qualidade. Em todo o País, o Sebrae executa 19 projetos com foco no desenvolvimento da horticultura, que abrange também a olericultura. Responsável por significativa parcela da sustentabilidade, da segurança alimentar e econômica do Brasil, esta atividade gera emprego e renda, especialmente para o segmento familiar. É indispensável capacitar o produtor para que ele possa a cada dia produzir mais e melhorar a rentabilidade no campo. Mas, para isso, é fundamental conhecer as necessidades desses empreendedores. O ponto de partida está em pesquisa sobre o perfil do olericultor paulista, realizada pelo Sebrae em São Paulo.
32
Safra
Novembro/2014
Perguntas e respostas É lucrativo investir em olericultura?
Como o Sebrae tem incentivado as boas práticas no setor?
Sim, desde que o produtor escolha a cultura correta e faça um planejamento prévio de todos os valores necessários de investimento e do custo de produção. Além disso, é preciso um estudo de mercado para saber a melhor hora para a implementação do cultivo que dependerá da análise da sazonalidade de preço e de outros fatores, como a situação climática.
Além de buscar alternativas de produção inovadoras, sustentáveis e economicamente viáveis, o Sebrae tem apoiado projetos que incentivam as boas práticas de produção e o manejo da cultura, com ações de inovação e tecnologia, acesso a mercados e estímulo ao associativismo. Em parceria com outras instituições o Sebrae tem, ainda, executado ações de certificação da produção o que favorece a inserção dos pequenos negócios em mercados diferenciados.
A olericultura em São Paulo O Sebrae em São Paulo e o Instituto Brasileiro de Horticultura (Ibrahort) finalizaram uma pesquisa pioneira do perfil do olericultor paulista. Com base em 600 entrevistas feitas em 45 municípios, a pesquisa mostra que a propriedade média paulista é de 10 hectares e a maior parte delas encontra-se ao largo das grandes rodovias. Os donos da propriedade são 64% dos olericultores e 80,7% deles ganham até R$ 60 mil por ano. Somente 2,5% ganham mais de R$ 360 mil/ano. Sobre os produtos cultivados, 72,2% deles atuam com tomate, cebola e batata, e 2 a cada 10 entrevistados encerrarão suas atividades por não terem sucessores. A cada 10 olericultores, 8 trabalham no setor por decisão pessoal e 73% tem formação apenas no primário. A respeito dos aspectos de gestão, 76% fazem a própria contabilidade, 17% não utilizam cálculo de custos e só 8% dizem conhecer as leis do setor. Outro dado positivo é que, mesmo com baixa escolaridade, 92% fazem o
Arquivo
descarte correto das embalagens de insumos químicos. “A pesquisa veio validar uma percepção que os técnicos já tinham, mas que agora pode ajudar a validar diagnósticos e direcionar melhor os atendimentos nos nossos projetos”, avalia o consultor de agronegócios do Sebrae em São Paulo, Fernando Gonçalves. O projeto é o piloto de uma pesquisa nacional para desenhar o perfil socioeconômico da olericultura no Brasil.
SEBRAE.COM.BR A pesquisa completa pode ser conferida no portal do Sebrae em São Paulo: (http://goo.gl/s96s2T).
Frango caipira
Mercado em ascensão Produção e venda dessas espécies cresceram 15% ao ano desde 2009 e têm atraído investimentos de produtores Carla Borges
O
mercado brasileiro de pintinhos se aproxima da marca de 500 milhões de unidades por mês, porém apenas 1% deste total, ou cerca de 5 milhões, é caipira. Mas, com público certo, que aposta na melhor qualidade do produto, impulsionado pelo aumento da renda, a produção e a venda de galinhas caipiras cresceram 15% ao ano, nos últimos cinco anos, aponta a Avicultura Francesa (Avifran), responsável por 60% desse mercado no País. A tendência de crescimento continua. O principal indicador é o fato de que a produção nacional não tem conseguido acompanhar essa expansão. “Tudo o que é produzido é vendido rapidamente”, afirma à Safra o diretor executivo da Avifran, Luciano Maia.
Apesar da expansão, apenas 1% do total de pintinhos comercializados por mês no País é caipira
la
e ad
éi dr
n Va
u Pa
Esse potencial chamou a atenção de Cléucio Bento, de 33 anos, morador de Jataí (GO). Formado em Ciências Contábeis e Matemática, ele se juntou ao irmão, o farmacêutico Cláudio Bento, para criar frangos caipiras na propriedade da família, o Sítio São José. Assim, eles deram continuidade a uma atividade que os pais já tinham, mas de forma mais profissional. “Esse é um ni-
cho de mercado em que hoje há uma demanda significativa no Brasil”, atesta Cléucio. Os consumidores são pessoas que vivem nas capitais, grandes centros e cidades maiores, mas que têm algum vínculo com a vida rural. “Por mais que essas pessoas estejam no ambiente urbano, guardam essa herança da ligação com a fazenda”, diz. Hoje eles abatem 4 mil frangos por mês, que são vendidos em municípios da região sudoeste do Estado (Jataí, Mineiros e Rio Verde) e em Goiânia. “É pouco. Vamos ampliar a produção”, anuncia Cléucio. O segredo do sucesso, explica Cléucio, é investir na qualidade durante todo o processo. Tudo começa na compra dos pintinhos. “Passamos por vários fornecedores. Temos critérios para definir de quem comprar, fizemos análises antes de definir. Hoje recebemos um pintinho de boa qualidade”, relata. Quando cada remessa de filhotes chega, o veterinário vai ao aviário para certificar a sanidade e a qualidade dos exemplares. O fornecedor do Sítio São José entrega os pintinhos no aviário. “Depois que nós os recebemos, é conosco. Buscamos fazer um trabalho diferenciado com eles”, relata. A principal diferença é que muitos produtores querem criar as aves em ambiente fechado, em um tipo de confinamento, a exemplo do que ocorre com os frangos de granja. “Ele pode ter uma genética perfeita, mas, agindo assim, o produtor põe tudo a perder”, alerta o criador. Novembro/2014
Safra
33
34
Safra
Novembro/2014
Arquivo pessoal
Cléucio e o irmão criaram uma estrutura formada por galpões planejados, com aberturas laterais, pelas quais os frangos saem e são recolhidos. Todos os dias, eles são soltos de manhã para andar e pastar. No fim do dia, são novamente fechados nos galpões. “Como é difícil fazer isso, muitos criadores os mantêm fechados o tempo todo, o que é um grande erro. Assim, o investimento gira mais rapidamente, mas o frango perde a qualidade. Aqui só abatemos com três a quatro meses. Não fazemos antes, mesmo aumentando o valor do custo de produção”, conta Cléucio. Na propriedade há um abatedouro, onde os frangos também são abatidos de forma artesanal, para não perderem a característica, já que o público consumidor é formado por pessoas que não se importam de pagar mais caro pelo produto. Para fazer o abate e a distribuição dos frangos caipiras, Cléucio e o irmão adquiriram inicialmente o registro no Serviço de Inspeção Municipal (SIM) e depois no Estadual (SIE). Como eles não pretendem limitar a atuação apenas ao âmbito estadual, já pretendem conquistar o registro no Serviço de Inspeção Federal (SIF), que dará a possibilidade de distribuir os frangos para outros Estados, com uma logística planejada. “Nossos pais iniciaram o negócio. Sempre estivemos envolvidos com eles e percebemos a oportunidade, que hoje está se confirmando. Estamos apenas no início”, afirma. Em outra região de Goiás, Orizona, o potencial do mercado de frangos caipiras também chamou a atenção da criadora Norma Mendes de Oliveira Dias Batista. Ela começou na atividade há dois anos e agora pretende se dedicar mais para ter o retorno esperado. Norma colocou à venda a papelaria que tem no centro da cidade para ficar por conta dos frangos caipiras que ela cria em sua fazenda, distante em torno de 25 quilômetros. Ela recebe os pintinhos de um fornecedor de Goiânia e conta que prefere os da raça label rouge, de pescoço pelado. “Essa variedade é muito boa de mercado”, assegura. A criadora distribui sua produção, que ela também
Cléucio Bento e a família profissionalizaram a atividade e hoje abatem 4 mil frangos por mês em sítio no município de Jataí (GO)
abate de modo artesanal na propriedade, para açougues e supermercados da região. A cidade não possui o SIM. Norma conta que chegou a abater 70 frangos por semana. Com a reestruturação da criação e dedicando seu tempo exclusivamente a ela, diz que a meta agora é chegar a 100. “Sempre gostei de criar frangos”, revela. Ela participou de um curso, oferecido pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), em que aprendeu técnicas de manejo, e começou a criação de forma simples. Norma aproveitou casinhas antigas na fazenda para colocar os animais. Ela também quer melhorar outras atividades na propriedade, aumentando o volume de leite tirado. Com o plano de ter todo o tempo disponível para a criação, ela já pensa em outro nicho: o de frangos orgânicos.
Diferencial
Além do sabor mais acentuado e da consistência firme da carne de frango, outro mote tem sido explorado pelos criadores com sucesso: o dos aspectos nutricionais. “A carne de frango caipira é mais saudável do que a de frangos criados de forma industrial”, assegura o diretor executivo da Avifran, Luciano Maia. Ele se baseia em estudos de laboratório realizados pela Universidade de Brasília (UnB), que mostram que a carne do frango caipira tem qualidade
superior. “Trata-se de uma carne mais rica”, diz. O estudo comparou as carnes dos frangos produzidos pela avicultura industrial e pela avicultura alternativa, que cria espécies consideradas exóticas, na qual o frango caipira se enquadra. A carne do frango caipira possui 22% de proteínas, contra 16% do de granja; o teor de gordura é de 13%, mais baixo que o de granja (17%); o frango caipira tem 76% de matéria seca, diante de apenas 34% do de granja; o teor de água é de 24%, bem menor do que os 66% do frango industrializado. Como não dorme, não cisca e não anda e vive confinado, o frango industrializado é abatido com 42 dias; o caipira, ente 85 e 90 dias, mas há produtores que estendem esse prazo. “O caipira é criado solto. Ele anda, cisca, come bichinhos, dorme e acorda na hora certa. Esse abate quando a ave adquire maturidade faz com que ela não seja inchada. A população vem se conscientizando da importância da qualidade e da sanidade dos produtos que usa em sua alimentação”, pondera. A Avifran detém cerca de 60% do mercado nacional de frangos caipiras. Nos últimos dois anos, sua produção de pintinhos dobrou, alcançando 3 milhões por mês. Nesta época, começa a faltar o produto, porque os produtores, tanto os grandes como os menores, começam a alojar frangos de olho nas fes-
Vandréia de Paula
tas de fim de ano, quando o consumo é aumentado em 30% a 40%. “Esse é o período em que falta o pintinho. O único jeito de evitar isso é aumentando o número de galinhas, mas essa é uma conta difícil, porque depois das festas há uma estabilização”, pondera Maia. Ele credita o crescimento do mercado a dois fatores básicos: a conscientização alimentar por parte dos consumidores, que entendem que a carne de frango caipira é mais saudável, e o aumento da renda da população brasileira nos últimos dez anos. “Muitos dos consumidores que só compravam o frango de granja, por ser mais barato, voltaram a comprar galinha caipira, uma, duas vezes por mês”. Apesar do crescimento rápido e contínuo, Maia avalia que a tendência é de certa acomodação do mercado, com um crescimento menos acentuado. “Não se trata de um modismo passageiro, mas de uma mudança de comportamento. No geral, estou muito bem impressionado com o crescimento do setor”, afirma. A Avifran produz seus mais de 3 milhões de pintinhos por mês em quatro fazendas, todas localizadas no Distrito Federal, onde também investe em biotecnologia e controle de qualidade. De lá, eles são entregues para todo o País por meio de uma rede de 80 distribuidores. Ela também está investindo, atualmente, na implantação de uma empresa de genética voltada para a avicultura, como parte de seu plano estratégico de crescimento, que prevê duplicar vendas e produção até julho de 2015. De know-how francês, suas matrizes são importadas da França, país referência na avicultura de alta qualidade e que puxou a retomada da criação de galinha caipira na Europa. Os produtores são, em grande maioria, pequenos avicultores rurais, agricultores familiares e avicultores orgânicos. O método, considerado artesanal, gera galinhas com uma carne mais consistente, saborosa e perfumada, resultado da alimentação natural e do respeito ao ciclo de crescimento. Os ovos, de cor mais avermelhada, também seguem o mesmo padrão de saudabilidade, segundo a empresa.
Norma Batista, de Orizona (GO), aposta na raça label rouge, de pescoço pelado: “Essa variedade é muito boa de mercado”
Mais de 99% da produção é para consumo interno Dados da União Brasileira de Avicultura (Ubabef) mostram que o Brasil está entre os três principais produtores de frango do mundo, ao lado dos Estados Unidos e da China. Em 2013, produziu 12,3 milhões de toneladas, das quais 30% foram vendidas no mercado externo, volume que torna o País o maior exportador mundial. Já em relação ao mercado
de galinha caipira, mais de 99% da produção brasileira é para consumo interno. A Agência das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) e a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) preveem que o consumo mundial de carne de frango tende a crescer mais do que o da carne suína se houver produção suficiente.
Novembro/2014
Safra
35
Prontas para transformar a produção Agroindústria estimula parceria para desenvolver cultivo de alimentos em associação de mulheres de assentamento em Goiás inauguração de uma agroindústria na Associação das Mulheres do Rio Vermelho (Amurv) deve consolidar trabalho e cooperação entre famílias assentadas rurais do Incra no município de Niquelândia (280 quilômetros de Goiânia), Norte de Goiás. Segundo Elza Gonçalves de Oliveira Santos, de 65 anos, presidente da associação, a unidade processadora de alimentos vai estimular aumento da produção, agregar valor aos produtos e gerar mais renda. “Podemos triplicar plantios e rendimentos, inicialmente”, avalia. Para isso, Elza e mais 22 mulheres associadas da Amurv arrendaram 2,5 hectares de terra bem próximo à sede da entidade, que fica a 45 quilômetrosde Niquelândia, no Assentamento Rio Vermelho. Elas pagam 5% da produção total para utilizar a área, “boa de água e mais produtiva”, considera a presidente. Por sinal, a associação já entrega aproximadamente 1,2 mil quilos de alimentos (in natura) por semana, em contrato com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), por meio do PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), do governo federal, e para supermercado de Niquelândia. “Produzimos cerca de 20 variedades de hortaliças”, destaca Elza. Parceira da Amurv na comercialização dos produtos, a empreendedora Durcilene Ribeiro de Araújo Godoi, 44, acredita na capacidade das associadas 36
Safra
Novembro/2014
e deve aumentar compra da Amurv. “Atualmente, recebemos 230 quilos de alimentos da associação toda semana, e, creio, podemos chegar a mil quilos semanais”, estima. Segundo Durcilene, as portas do seu supermercado estão abertas para a produção da Amurv, que ainda tem um diferencial, com o sistema agroecológico, sem adição de defensivos químicos. “Estamos dispostos a comprar não somente as hortaliças, mas pimentas, mandioca, doces, geleias e polpas de frutas produzidos pelas mulheres da associação”, projeta. Neste caso, Elza deve firmar outra parceria, com o Sebrae Goiás. “Precisamos qualificar nossa produção, investir nas boas práticas, melhorar nossas embalagens, rótulo e promover acesso ao mercado”, explica. Gerente da Regional Norte do Sebrae no Estado (sede Porangatu), Augusto Netto ressalta que a Amurv pode receber as soluções empresariais de que necessita. “O Sebrae tem disponíveis cursos e consultorias para apoiar desenvolvimento da associação”, conta. Para Augusto, a Amurv deve investir no BPF (Boas Práticas de Fabricação), um curso realizado em parceria com o Senar Goiás, para garantir comercialização de produtos derivados do leite e carne, por exemplo. “A associação esteve impedida de vender doces, geleias e polpas de frutas por falta de adequação
Presidente Elza Gonçalves vai firmar nova parceria com o Sebrae para qualificar produção na Amurv
exigida pela Vigilância Sanitária e Serviço de Inspeção Municipal (SIM), mas, agora, pode iniciar uma nova etapa no mercado”, observa. Inclusive Augusto aponta a confecção de um plano de negócios como uma das propostas do Sebrae para ajudar no sucesso da agroindústria. Para ele, a Amurv conquista status de empresa, então deve trabalhar com planejamento voltado para consumidores, “que são os empreendimentos compradores e seus clientes”. Edmar Wellington
A
Associadas produzem alimentos fornecidos para a Conab e supermercado de Niquelândia
Por outro lado, a presidente Elza quer investir também na assessoria técnica para melhorar a produtividade na Amurv, o que já feito durante o convênio Incra/Sebrae em Goiás, beneficiando a agricultura familiar em assentamentos em todo o Estado. “Na época (2010/2012), a regional Noroeste do Sebrae goiano (sede Goianésia) é quem atendia o Assentamento Rio Vermelho”, lembra o gerente Renato Gonzaga Jayme – antigo gestor do projeto. O reforço na produção deve aumentar a média de rendimento financeiro para as associadas, que recebem segundo suas horas trabalhadas. Homônima da presidente, a produtora Elza Araújo dos Santos, 59, trabalha na horta comunitária da associação de segunda-feira a sextafeira e ganha cerca de R$ 600 por mês.“As capacitações e assessoria podem pelo menos dobrar nossa renda”, espera. Outra meta da Amurv é atrair mais associados, pois somente no Assentamento Rio Vermelho moram 59 famílias. “Isso já está acontecendo, visto que alguns produtores plantam para comercializar seus produtos com a associação”, ressalta a presidente. Segundo Wanderson Portugal,
Edmar Wellington
Agroindústria vai processar alimentos e agregar valor aos produtos
Mais renda, menos desperdício
A instalação de agroindústrias em associações e cooperativas de agricultores familiares tem bons exemplos em Goiás. Em Cristalina (284 quilômetros de Goiânia), a Cooperativa dos Agricultores Familiares Ecológicos do Cerrado (Rede Terra) é um deles. Lá, os cooperados também investiram na capacitação e produção conforme regras da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o que qualificou o processamento de alimentos, por meio de consultoria do Programa Sebraetec. Com isso, “os produtores recebem três vezes mais pelo produto e diminuíram perdas”, explica Alberoni Leal, consultor contratado pelo Sebrae Goiás. O procedimento inclui a lavagem do produto, desinfecção, corte em cubos, embalagem a vácuo e armazenamento resfriado. O consultor destaca ganhos tanto para o produtor quanto para as escolas com a redução do desperdício de produtos. Alberoni observa que o processamento de uma caixa de cenouras de 20 quilos na agroindústria tem perda de apenas 10%, enquanto o preparo feito direto por merendeiras pode representar 30% menos nas cozinhas escolares. Edmar Wellington
Edmar Wellington
Produtividade assistida
diretor técnico do Sebrae Goiás, embora o convênio Incra/Sebrae tenha terminado suas ações, os agricultores familiares goianos continuam recebendo apoio da entidade especialmente para melhorar produtividade. “O Programa Sebraetec, por exemplo, dispõe de várias soluções tecnológicas e de inovação que podem ajudar a própria Amurv”, divulga. Para Wanderson, a associação deve investir também em capacitações como ‘Vender para o governo no campo’ e ‘Gestão da qualidade rural’. “Os cursos integram agenda do Programa No Campo, do Sebrae, que tem mais 11 soluções focadas na produção rural”, explica. Olho nas oportunidades A agroindústria da Amurv tem 200 metros quadrados de área, com todos os equipamentos necessários para processar os alimentos. O Programa Redes destinou quase meio milhão de reais em recursos para sua construção. O gerente Renato conta que uma agente de desenvolvimento rural do Sebrae Goiás (Lívia Pelá Corrêa) foi quem fez a inscrição da Amurv no programa e acompanhou o processo classificatório. “Paralelamente, o convênio Incra/ Sebrae iniciou processo para capacitação, conhecimento e acesso ao mercado para a Amurv, inclusive financeiro, acerca de financiamentos, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e o Crédito Apoio Mulher”, recorda Renato. O aproveitamento de tudo o que a terra dá é um dos pilares para a Amurv. Segundo o gerente Augusto, a agroindústria vai incentivar a produção rural também nos assentamentos vizinhos Salto para o Futuro, José Marti, Aranha e Julião Ribeiro, “Acreditamos que as 110 famílias agricultoras na região terão referencial para que seus produtos tenham o processamento adequado, embalagem certificada e ganhem o mercado”, avalia. Para a presidente Elza, o momento é de promover também cidadania e qualidade de vida às famílias, além da inserção ao trabalho e renda. “Devemos implantar um projeto ambiental para recuperação de áreas degradadas no Assentamento Rio Vermelho”, revela.
Produtora Elza Araújo tem rendimento médio de R$ 500 trabalhando na associação Novembro/2014
Safra
37
MÁQUINAS
Fotos: Divulgação
Adaptador para caminhões Um adaptador desenvolvido em Ribeirão Preto (SP) promete transformar o caminhão convencional em um equipamento agrícola, permitindo ao eixo do veículo expandir e retrair. A função do equipamento, denominado CG P300, é basicamente preservar o plantio, fazendo com que as rodas dos caminhões passem pelo arruamento das lavouras sem afetar os brotos que resultam em novas safras. Com o prolongador de bitolas, a distância de centro a centro das rodas pode chegar a 3 metros. O equipamento está disponível na empresa Carcaças Guimarães, localizada no interior de São Paulo.
Vale Gestão Eficiente A ValeCard apresentou em Goiânia, durante o Salão Internacional do Transporte Rodoviário de Carga – Centro-Oeste (Fenatran CO), de 14 a 17 de outubro, o Vale Gestão Eficiente. O produto reúne os módulos Abastecimento (que centraliza os custos numa conta única, com informações sobre valores, datas, volume, tipo de combustível e postos) e Manutenção (que oferece ampla rede credenciada de oficinas onde se realiza o processo de orçamento, negociação e controle de manutenções corretivas e preventivas dos veículos). O módulo Abastecimento da ValeCard atende hoje em torno de 250 mil veículos de pequeno e grande portes em todo o País. Já o módulo Manutenção atende cerca de 30 mil veículos somente em Minas Gerais.
Fábrica da BMW no Brasil A primeira fábrica da montadora de automóveis BMW no Brasil foi inaugurada no dia 9 de outubro, em Araquari (SC). A unidade construída em uma área de 500 mil metros quadrados recebeu investimentos de cerca de R$ 600 milhões e deverá empregar 1.300 pessoas. De acordo com o ministro do Trabalho e Emprego, Manoel Dias, “o alto grau de exigência e padrão internacional da BMW agregarão valor ao setor automotivo brasileiro e em especial ao norte de Santa Catarina, região conhecida por
38
Safra
Novembro/2014
abrigar grandes e inovadoras indústrias como a Weg e a Tigre Tubos e Conexões”. A fábrica catarinense possui capacidade para produzir 32 mil veículos por ano e nela serão gerados os modelos Série 1, Série 3, X1, X3 (foto) e MINI Countryman.
Retroescavadeira Case 580N Produzida na fábrica de Contagem (MG), a Case 580N, lançada em meados de 2012, agora possui os opcionais de transmissão Powershift S-Type e do controle do implemento traseiro Pilot Control. Segundo a empresa, a nova transmissão é mais indicada para trabalhos com deslocamento e uso do implemento frontal, enquanto o Pilot Control é mais requisitado em aplicações com maior utilização do implemento traseiro, de escavação. “No mercado brasileiro, a 580N é a única que traz essas duas tecnologias conjuntamente ou separadas, de acordo com a necessidade”, diz Roque Reis, diretor-geral da Case.
Vendas de máquinas agrícolas Em setembro foram comercializadas 6,6 mil máquinas agrícolas, montante 2,2% superior ao registrado em agosto (6,5 mil unidades), mas 10,4% inferior ao verificado em igual mês de 2013 (7,4 mil unidades). Considerando o período de janeiro a setembro, as vendas internas somaram 52,4 mil unidades, volume 18% menor que o negociado em igual período do ano passado. Já na exportação, o segmento registrou alta de 1,8% no nono mês deste ano, quando as vendas externas somaram 1,4 mil unidades contra 1,3 mil de agosto. Mas no comparativo com setembro de 2013, quando foram exportadas 1,6 mil máquinas, o resultado foi 16,1% inferior. Nos nove meses de 2014 a diminuição das exportações chega a 8,1% ante as contabilizadas no mesmo período do ano passado. As informações são da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e foram divulgadas no início de outubro.
Agro+
Em busca de sustentabilidade Produtores de café e pimenta-do-reino no Espírito Santo colocam em prática ensinamentos de programa da Ufes em parceria com a Andefedu. Há quem já afirme ter custo de produção menor e acréscimo nos lucros Vandréia de Paula
réia de a
l Pau
(Andefedu), que financia o programa, e tem como proposta profissionalizar os produtores a partir dos preceitos da sustentabilidade. O Agro+, conforme explica seu idealizador, o professor e fitopatologista da Ufes, Marcelo Barreto da Silva, nasceu de uma dificuldade em identificar as maiores deficiências dos agricultores da região norte do Estado – polo nacional de produção de café conillon e pimenta-do-reino -, seja em relação ao manejo até a gestão da propriedade. “Para podermos ajudar os produtores precisaríamos saber quais eram as dificuldades e dúvidas mais recorrentes.” Para isso foi elabo-
and s: V
ermo tão mencionado atualmente, a sustentabilidade tem se apresentado enquanto saída e ferramenta de incremento produtivo para alguns agricultores capixabas. Por meio do Programa Agro+: por uma agricultura sustentável, produtores no norte do Espírito Santo têm conquistado maior proveito de suas terras, aplicando técnicas e aprendizados fornecidos em palestras e encontros realizados pelo projeto. O programa trata-se de uma parceria entre a Universidade Federal do Espírito (Ufes), campus de São Mateus, e a Área de Educação da Associação Nacional de Defesa Vegetal
o Fot
T
Silva: programa nasceu de uma dificuldade em identificar as maiores deficiências dos agricultores da região norte do ES
Novembro/2014
Safra
39
Fotos: Vandréia de Paula
Kagi, da Andef: “Queremos que o modelo seja replicado”
rada uma avaliação com 51 questões, que foram respondidas por produtores da região. As respostas possibilitaram a constituição de parâmetros para cinco pilares que compõem a sustentabilidade disseminada no programa: economia, meio ambiente, desenvolvimento social, fitossanidade e procedimentos fitotécnicos. “Esses cinco se encaixam a realidade da agricultura da região.” Em dois anos, o programa chegou a 365 propriedades, alcançando até 1.354 pessoas. Inicialmente ele teve a participação do professor Silva e de alguns alunos da Ufes, enquanto agentes atuantes, mas agora começa a incorporar uma nova forma de propagação. Desde o seu início, segundo relata o gerente de Educação da Andef, Fabio Kagi, o Agro+ teve como objetivo chegar a um número maior de pessoas possível, para tanto, a expansão deveria funcionar de diversas formas. “Queremos que o modelo seja replicado, por meio da iniciativa pública, privada e por instituições de ensino”, diz Kagi. Exemplo do modelo de replicação, mencionada pelo gerente da Andefedu, pode ser constatado por duas
40
Safra
Novembro/2014
revendedoras da região: Defagro e Defesa Agrícola. As empresas, assim como ocorreu no trabalho inicial do Agro+, têm levado até as propriedades as questões formuladas pelo professor da Ufes. “Alguns produtores ainda têm resistência em respostar as questões, pois, infelizmente, quando veem que somos de uma revendedora acreditam que haja um fator comercial por trás. Mas isso tem sido mudado, porque esclarecemos que é um programa da universidade”, relata Victor de Mello Marques, gerente de Vendas da Defesa Agrícola. Marques diz que a intenção da empresa onde trabalha em participar do Agro+ é contribuir com a valorização do serviço prestado ao produtor, além de contribuir com a sustentabilidade produtiva da região. Além das questões levados aos agricultores, as revendedoras também promovem dias de campo. O Agro+ incentiva o investimento de tecnologia no campo, sendo mencionada aos participantes a relevância de seu uso. Quanto maior o investimento, maior o nível de sustentabilidade. Também é sempre reforçada a necessidade de obedecer às leis ambientais e trabalhistas.
Custos de produção, entre 10% e 20% menor Agricultor há 30 anos, José Bonomo, proprietário do Sítio Bamburral, localizado em São Mateus (ES), é engenheiro mecânico por formação. Com três décadas de dedicação a terra, cultivando café (conillon) e pimenta-do-reino, Bonomo relata que aprendeu muito nos últimos dois anos sobre agricultura sustentável. “Meus custos de produção, após fazer parte do Agro+ caíram entre 10% e 20%, isso porque comecei a fazer análise de solo e das folhas, que possibilitou ajustar o manejo da lavoura e, consequentemente, o investimento aplicado”, diz Bonomo. O agricultor cultiva 48 hectares de café conillon e 6 hectares de pimenta-do-reino. Na cultura de café o produtor é reconhecido pela alta produtividade que apresenta a sua lavoura, 150 sacas por hectare, colheita bem superior à média estadual que é de 30 sacas por hectare. “Quando comecei queria que desse certo o negócio, contratei consultoria e então resolvemos inovar, implantando uma lavoura clonal adensada e totalmente irrigada. Assim, saí de uma safra com produtividade de 60 sacas colhidas por hectare, para 80 sacas e depois 150 sacas, sendo que a média atual de toda
Bonono: “Resolvemos inovar, implantando uma lavoura clonal adensada e totalmente irrigada”
plantação é de 100 sacas de café por hectare, considerando que algumas áreas apresentam maior produtividade que outra”, lembra Bonomo. O alto rendimento médio que o cafezal do produtor possuiu deve-se a uma variedade mais produtiva descoberta na sua lavoura. “Tenho viveiro próprio e partir de uma planta que apresentava maior ganho por galho foi possível fazer outros clones e aumentar meu volume final”, diz o produtor. O grande entrave de Bonomo, assim como dos demais cafeicultores de conillon em geral, deve-se ao alto custo com mão de obra, que pode chegar a 80% do ganho por hectare. “Não possuímos ainda um sistema de colheita totalmente mecanizada disponível ao tipo de café que cultivamos, o que dispomos no momento é uma adaptação de um equipamento desenvolvido ao café arábica.” Segundo ele, esta falta de tecnologia implica num custo elevado com empregados. “Em período de colheita uma pessoa chega a ganhar entre R$ 3,5 mil e R$ 4 mil por mês”, relata. Em relação à pimenta-do-reino, o produtor não tem o que reclamar. “O cultivo atualmente tem sido lucrativo, pois tenho um custo de R$ 2 por hectare enquanto vendo o quilo por R$ 20. O maior problema é com nematoide, que, quando não monitorado, pode acabar com a plantação”, diz Bonomo.
Nicoli Filho: “Com conhecimento fica mais fácil acertar”
Produtor aposta na diversificação de produtos Jarbas Alexandre Nicoli Filho é proprietário do sítio que carrega seu sobrenome, Nicoli, localizado em Jaguaré (ES). A profissão é herança, terceira geração de agricultores, desde que o avô chegou à região, na década de 1950. Nicoli Filho desempenha diversas atividades, mas o carro-chefe da família é o café conillon. São 450 hectares do grão, 25 a 30 hectares de pimenta-do-reino, 5 hectares de maracujá (para renovação da terra, antes ocupada pelo café), 15 hectares de cacau e 88 hectares de mamão. Para completar as atividades do produtor, 1,4 cabeças de gado para engorda e recria. “Temos outras possibilidades quando o grão não está com preço bom, caso do ano passado, por isso esta miscigenação, que estão distribuídas entre outras 13 fazendas, além do sítio, que têm 55 hectares”, explica Nicoli Filho. A produtividade do produtor é de 60 sacas de café por hectare, com custo de aproximadamente 45 sacas por hectare. O produtor ingressou no Agro+ no ano passado. “Ainda não possuo números precisos de quanto já recuou em custo de produção, mas a
minha expectativa é de que seja pelo menos de 20%”, acredita Nicoli Filho. O agricultor diz ter aplicado na propriedade uma gestão mais organizada, com capacitação de funcionários, além de se atentar mais às questões ambientais, com práticas simples, como manejo correto e aplicação de defensivos adequados. “Desde que participo no Agro+ tenho evitado erros, com conhecimento fica mais fácil acertar”, ressalta. Nicoli Filho ainda informa ter passado a fazer o controle de nematoide e manejo do solo, com análises. A doença nematoide, segundo o professor da Ufes, Marcelo Barreto da Silva, por muito tempo era considerada inexistente na região, só depois de algumas análises foi possível comprovar a existência dela e alertar o produtor quanto ao manejo e ao cuidado. “Quando se desenvolve na lavoura um manejo correto, o investimento diminui, pois há recuo na incidência de doenças e também impossibilita o desperdício, no caso da aplicação de defensivos”, afirma Nicoli Filho. As lavouras do produtor, assim como a maioria na região, é 100% irrigada. Novembro/2014
Safra
41
Fotos: Vandréia de Paula
Campana: “Percebi que somente com a ajuda de um técnico poderia ter um cafezal com alta produtividade”
Colheita chega a 175 sacas de café por hectare Após passar dez anos criando bovinos em Rondônia, o capixaba Paulo Campana voltou ao seu Estado decidido a cultivar café, atividade que desempenhou desde menino. Mesmo que o trabalho não fosse novidade, ele procurou aperfeiçoar suas habilidades. Contratou um especialista para fazer análises de solo e orientá-lo sobre quanto e quando deveriam ser aplicados os nutrientes necessários. “Mesmo que eu tivesse experiência nas lavouras de café, percebi que somente com a ajuda de um técnico poderia ter um cafezal com alta produtividade”, revela Campana. Não demorou muito e os resultados apareceram. Tão notórios a ponto de gerar murmurinhos entre os vizinhos. “As pessoas falavam que a minha lavoura era bonita porque passava muito veneno, que alguns trabalhadores tinham até morrido no período da colheita, intoxicados com tanto veneno. Inicialmente isso me incomodava muito.” Segundo ele, as pessoas foram percebendo que “as estórias não passavam de boatos maldosos”. “O cafezal está bonito porque tenho feito o manejo adequado, aplicado a quantidade de defensivo recomendada. Ao contrário do que diziam, não é por excesso, mas pela quantidade necessária”, ressalta. A propriedade de Campana está localizada no município de Nova Venécia (ES). Com o nome de Nossa
42
Safra
Novembro/2014
Senhora das Graças, o sítio do produtor detém pouco mais de 4,3 mil pés de café, ocupando um espaço de 11 hectares das terras e totalmente irrigado. O cafezal ainda é jovem, apenas quatro anos, mas já rendeu retorno satisfatório. “Na primeira colheita consegui obter 134 sacas por hectare, na segunda, devido à chuva fora da época ideal, foram 64 sacas. Mas neste ano colhemos 175 sacas de café por hectare”, diz o produtor. Campana foi um dos agricultores que respondeu à primeira avaliação do Agro+, e relata que desde o primeiro encontro tem aplicado as técnicas apresentadas. “Sempre participei de palestras, pois é quando aprendemos como melhorar a lavoura.” Um dos aprendizados, de acordo com ele, foi utilizar o equipamento de proteção individual (EPI) corretamente durante a aplicação de veneno no cafezal. Atento às possibilidades do mercado da pimenta-do-reino, que nos últimos dois anos tem surpreendido positivamente aqueles que a cultivam, Campana logo se interessou pela cultura. Já plantou 2,5 hectares no sítio e pretende ampliar a área. “O preço da pimenta-do-reino está muito bom, escutei que tem produtores vendendo a R$ 24 o quilo. Neste ano comecei a plantar aqui na propriedade também, pois pode ser outra fonte de renda e uma segunda opção quando o preço do café não estiver bom”, diz o produtor.
Cafezal garante permanência no campo Há dois anos Verônica Kruger Wutke de Oliveira deixou suas atividades profissionais na cidade para passar mais tempo em casa, dedicando-se à educação dos dois filhos. Residente desde sempre na zona rural, nunca enxergou as terras como uma possibilidade de sustento. Não até 2012, quando o sogro arrendou cinco hectares para a família, e Verônica percebeu que poderia tirar uma renda do sítio enquanto ficava perto dos filhos. “No início eu não sabia de nada, não tinha conhecimento nem experiência para lidar com a terra, foi quando comecei a participar de cursos, dia de campo e palestras do Agro+”, relata a produtora, que nesse intervalo de aprendizado decidiu plantar café. O cafezal, plantado no Sítio Morro da Pêra, no município Vila Pavão (ES), rendeu já na primeira safra dinheiro suficiente para comprar um trator de pequeno porte para ajudá-la na lida do campo e arrendar um pedaço de terra (1,3 hectare). “Meu marido continua trabalhando na cidade, sou eu, com a ajuda dos meus pais, que cuida de tudo. Hoje pretendo, além de ampliar as terras [mais 2 hectares] e a produção, fazer com que a propriedade se torne sustentável para os meus filhos”, diz a cafeicultora. Na primeira colheita, em 2013, a produtora alcançou 420 sacas de café, já na segunda, devido ao ataque de pragas, o volume recuou para 360 sacas. O cafezal de Verônica, cultivado em 4,8 hectares, é totalmente irrigado. “Não quero mais trabalhar fora, quero ficar aqui e continuar crescendo, eu sei que fazendo e aplicando as técnicas corretas isso acontecerá”, finaliza a cafeicultura, que já planeja também cultivar pimenta-do-reino no sítio.
Verônica: “Pretendo fazer com que a propriedade se torne sustentável para os meus filhos”
ERRATA Esta matéria foi publicada com erros na edição anterior, na página 12. Pedimos desculpas por nossa falha. O texto volta a ser disponibilizado abaixo, com as devidas correções. Em nosso portal a reportagem está disponível na íntegra e pode ser conferida ao acessar o link http://ow.ly/CKMtW
Animais transformados em “biofábricas”
Arquivo
ANDRÈ PASSOS
A
lgumas perspectivas iniciais já têm sido vislumbradas, principalmente quanto à oportunidade de se utilizar a transgenia em animais para a produção de alimentos nutracêuticos, bem como poder transformá-los em “biofábricas”, ou seja, produtores em maior escala de proteínas de elevado interesse, como medicamentos, por exemplo. O pesquisador em genética e biotecnologia animal do Centro Nacional de Recursos Genéticos (Cenargen) da Embrapa Eduardo de Oliveira Melo explica que essas proteínas, hoje essencialmente produzidas de maneira mais cara em sofisticados laboratórios, poderiam ganhar uma etapa “agrária” de maior escala produtiva, com perspectivas de redução de custos de produção e, consequentemente, com ganhos relevantes para os consumidores. “Assim, já existem no mercado cabras geneticamente modificadas que produzem o medicamento ATryn® (Antitrombina III), usado no tratamento de trombose e embolia pulmonar,
produzidas pela empresa GTC-Biotherapeutics; e coelhas GM que produzem o medicamento Ruconest® (inibidor esterase C1), utilizado no tratamento de angioderma hereditário, produzido pela empresa Pharming.” Nesses casos, completa ele, os animais GM não são vendidos ou usados diretamente por produtores, mas funcionam como “fábricas” para a produção dos medicamentos mencionados que, após serem purificados do leite do animal, são processados industrialmente e vendidos como remédio para tratamento de doenças humanas. “Assim como acontece com a insulina gerada por bactérias GM que compramos na farmácia nos dias de hoje para tratar diabetes”, diz. Devido à sua produção em larga escala de volume, o leite é o veículo preferido para expressar proteínas em animais transgênicos. “Em 20 anos podemos esperar, por exemplo, vacas que produzam leite com mais b-caseína, uma das proteínas mais importantes do leite e de grande relevância para a produção de laticínios; vacas
Leite é o veículo preferido para expressar proteínas em animais transgênicos
que produzem leite com lisostafina e por isso resistentes à mastite (ou mamite); ou que produzem leite com lizosima humana, que protege crianças contra infecções microbianas; ou suínos que produzem a enzima fitase na saliva e com isso eliminam menos fitato nas fezes, poluindo menos o meio ambiente; ou até mesmo vacas que produzem anticorpos humanos no seu sangue e podem ser usadas para fornecer anticorpos idênticos ao que produzimos para diversos tratamentos, desde produção de antídoto para veneno de cobra até anticorpos contra células cancerígenas no tratamento de alguns tipos de câncer”, explica o pesquisador da Embrapa. Novembro/2014
Safra
43
ARTIGO
ção
Gerente do Departamento Marketing – Cultivos, Especialidades e AgMusa da Basf
a ulg Div
Antonio Cesar Azenha
O salto tecnológico do cultivo canavieiro já começou N
a última década observamos o paradoxal desen- solo e ao clima do local, que utilize equipamentos especívolvimento de tecnologias inovadoras em cereais, ficos para o plantio de mudas de cana pré-brotadas, traresultando em expressivo ganho de produtividade e ren- tado com fungicidas, inseticidas e herbicidas de ponta, tabilidade nessas culturas. A comparação imediata com o georreferenciado e irrigado é capaz de prover em média nível de adoção tecnológica na cultura canavieira parece 40% mais gemas viáveis para o plantio do canavial. Viveiros não produzem cana, geram gemas viáveis. Qualdesleal nesse espaço de tempo. Felizmente as aparências enganam e a percepção de quer semelhança com o índice de fertilidade de cereais que inovações em cana-de-açúcar não são prioritárias não é mera coincidência. O plantio mecanizado requer são tão equivocadas quanto à condução das políticas cerca de 20 toneladas de cana por hectare e uma operamacroeconômicas atuais destinadas ao setor. A cultu- ção complexa que envolve frentes de trabalho extensas. ra da cana no Brasil está passando por uma revolução Com mudas sadias, o mesmo cultivo, mais produtivo e de silenciosa com a disponibilização de novas tecnologias melhor qualidade, requer em torno de duas mudas por específicas para esse cultivo. Arrisco-me a afirmar que metro. Simples assim. A matéria-prima de qualidade é somente o passo estamos à frente da maior mudança tecnológica que a inicial dessa revolução que inicia um ciclo de maior procultura já viu desde a mecanização. Foco este artigo em um tema que tem consumido dutividade nas lavouras de cana. Uma nova classe de deboa parte dos esforços das empresas e dos institutos fensivos agrícolas, capaz de prover efeitos fisiológicos popioneiros em pesquisa. Os sistemas de propagação e sitivos, cria o ambiente de produtividade elevada que vai plantio, especialmente por meio de mudas sadias pré além da proteção de cultivos. Novos fertilizantes e micro-brotadas, que são capazes de habilitar o agricultor a re- nutrientes, específicos para as demandas da cultura, vão tomar uma antiga prática há muito esquecida no setor: gradativamente construindo o cenário do canavial que a construção de bons viveiros. O viveiro saudável e com produz mais de 120 toneladas ao ano, ano após ano, com boas variedades é a base de um canavial de alta rentabi- elevados teores de Açúcar Total Recuperável (ATR). Além lidade. E sua construção não é algo trivial e não pode ser disso, a tecnologia também propiciou para que o agricultor identifique rapidamente pontos de baixa biomassa tratada como tal. A boa notícia vem dos próprios agricultores que já e de falhas de stand, sendo possível a correção que visa adotaram uma nova gama tecnológica. O custo de for- unicamente elevar a longevidade desse canavial. Que tal mação do canavial é reduzido quanto maior a adoção manter um canavial altamente produtivo por 6 ou 7 cortecnológica e maior o planejamento. Lembrando que o tes e ainda constatar que ele pode ir além disso? Não se trata de futuro, mas de tecnologias que já estão custo é uma função de decisões e não uma consequêndisponíveis e em uso pelos pioneiros do setor. A adoção cia geográfica do setor. gradativa dessas tecnologias, longe Vale um exemplo: um bom vide ser um sonho, já nos é realidade e veiro, planejado para ser construído “O viveiro saudável e com o principal fator que nos faz acreditar com alguns meses de antecedência, boas variedades é a base no futuro promissor que a cana-de formado a partir de mudas sadias de um canavial de alta -açúcar tem no Brasil. de variedades nobres, adaptadas ao
rentabilidade”
44
Safra
Novembro/2014
ARTIGO a ulg Div
Roberto Rodrigues
ção
Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, embaixador especial da FAO para as Cooperativas e presidente da Academia Nacional de Agricultura (SNA)
Tecnologia e agricultura em prol da sustentabilidade A
agricultura enfrentará diversos desafios no século 21. por hectare, com uma taxa de adoção de sementes transDe acordo com a Organização das Nações Unidas gênicas superior a 90%. Esses dados apontam para uma para Agricultura e Alimentação – FAO/ONU – a popula- significativa contribuição da biotecnologia para a produção mundial deve chegar a 9 bilhões de pessoas em 2050. tividade do milho e da soja no País. Claro que essa não é a Esse crescimento demográfico vai impor a necessidade única causa, mas seu peso é expressivo. Aliás, os transgênicos otimizaram o uso de insumos de produzir mais alimentos e fibras sem aumentar muito as fronteiras agrícolas, preservando o meio ambiente agrícolas. As características já introduzidas pela transgee em um cenário de redução da força de trabalho rural. nia, tolerância a herbicidas e resistência a insetos, perNos países em desenvolvimento, projeções apontam que mitem ao agricultor maior flexibilidade e segurança no a produção de cereais e de proteína animal, por exemplo, manejo. É claro que quanto mais tecnologias estiverem teria que quase dobrar. Para resolver essa equação em disponíveis, maior o potencial produtivo. Especialmente consonância com os preceitos da sustentabilidade, uma nas zonas tropicais, a competitividade do agronegócio das alternativas mais óbvias é aumentar a produtividade. está intimamente ligada à aplicação de ferramentas tecO uso de tecnologias inovadoras na agricultura é fun- nológicas para superação de limitações e adição de novas damental para atingir esse objetivo e, sem dúvida, a bio- funcionalidades. Vale ressaltar que a referida produção adicional de 377 tecnologia é uma ferramenta poderosa. Dados do mais recente relatório do Serviço Internacional para Aquisição milhões de toneladas foi conseguida apenas com a introde Aplicações em Agrobiotecnologia (ISAAA) mostram dução de características agronômicas. Com o desenvolvique os transgênicos, desde a sua introdução, em 1996, mento de plantas GM que visam diretamente melhorar a deram importante contribuição para alcançar essa meta. produtividade, o potencial de contribuição da biotecnoDesde aquele ano, quando começaram os plantios de va- logia para a sustentabilidade será ainda maior. Cientistas riedades transgênicas, a produção de grãos e fibras teve de todo o mundo estudam plantas com características um incremento de 377 milhões de toneladas: se não fosse complexas modificadas, cuja expressão envolve vários isso, seriam necessários 123 milhões de hectares adicio- genes, a exemplo da tolerância a estresses abióticos (seca, inundações e solo com alta salinidade). O futuro também nais para obter o mesmo desempenho. Na safra 2006/2007 aqui no Brasil, imediatamente aponta para a criação de outros transgênicos (cana-de antes da aprovação do primeiro milho transgênico pela -açúcar, eucalipto, laranja, trigo, feijão e berinjela, além Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio dos tradicionais soja, milho e algodão) que contenham (2007), a produtividade do cereal foi de 3,6 mil quilos por propriedades agronômicas, nutricionais ou que sintetihectare, de acordo com dados da Companhia Nacional zem compostos medicinais. No Brasil, instituições públicas e privadas de pesquisa de Abastecimento (Conab). Na safra 2013/2014, a previsão é que esse número seja de 5,1 mil quilos por hecta- e ensino desenvolvem novas variedades por meio da enre. Em torno de 81% das lavouras da commodity foram genharia genética. A combinação de técnicas de melhoplantadas com variedades GM no último ano. Da mesma ramento genético convencionais e biotecnológicas é uma valiosa opção para garantir a segurança maneira, a soja em 1997/1998 (antes da alimentar, preservar o meio ambiente e, primeira aprovação, em 1998) rendia 2,3 “Os transgênicos ao mesmo tempo, alimentar a todos. mil quilos por hectare; hoje, 3 mil quilos otimizaram o uso de
insumos agrícolas”
Novembro/2014
Safra
45
FONTES Agenda
Sucessão preocupa pecuaristas
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) www.agricultura.gov.br
Associação Goiana dos Criadores de Zebu (AGCZ) www.agcz.com.br
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) www.embrapa.br Grupo de Estudos Luiz de Queiroz (Gelq) www.gelq.com.br
Uma situação delicada Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustíveis (CeiseBr) www.ceisebr.com
MBA Leilões www.mbaleiloes.com.br
Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) www.abimaq.org.br
Panorama
DMB Máquinas e Implementos www.dmb.com.br
DuPont www.dupont.com Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) www.agricultura.gov.br Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba) www.aiba.org.br Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) www.cepea.esalq.usp.br Sociedade Goiana de Agricultura e Pecuária (SGPA) www.sgpa.com.br Agência de Notícias Brasil-Árabe www.anba.com.br Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) www.embrapa.br Agência Goiana de Defesa Agropecuária (Agrodefesa) www.agrodefesa.go.gov.br. Máquinas Case www.caseih.com/brazil Carcaças Guimarães www.carcacasguimaraes.com.br Vale Card www.valecard.com.br Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) www.anfavea.com.br Ministério do Trabalho e Emprego http://portal.mte.gov.br Reportagens Acordo encerra conflito Instituto Brasileiro do Algodão (IBA) Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa)
46
Safra
Novembro/2014
www.revistasafra.com.br CNPJ: 10.346.747/0001-50 A Safra – Revista do Agronegócio é uma publicação mensal da ND Editora e Publicidade Ltda, fundada em dezembro de 1999 Fundador e Diretor Administrativo: Saêta Filho saeta@revistasafra.com.br Diretor-geral: Glauco Saêta glauco@revistasafra.com.br
Caldema http://caldema.com.br
Editora: Carla Guimarães carla@revistasafra.com.br
MBF Agribusiness www.mbfagribusiness.com
Redação: Vandréia de Paula com colaborações de André Passos, Carla Borges e Lauro Veiga Filho safra@revistasafra.com.br Diagramação e arte: Eric Damasceno Kaji Revisão gráfica: Arivanda Calaça
Em busca de sustentabilidade Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) www.ufes.br Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef) www.andef.com.br Proteção incompleta Confederação Nacional da Agricultura (CNA) www.canaldoprodutor.com.br Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) www.agricultura.gov.br Superintendência de Seguros Privados (Susep) www.susep.gov.br Associação dos Produtores de Soja de Goiás (Aprosoja/Goiás) Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg) www.sistemafaeg.com.br Fome de aprendizado Comissão Pastoral da Terra www.cptnacional.org.br Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás sistemafaeg.com.br Serviço Nacional de Aprendizagem Rural Senar Goiás www.senargo.org.br Secretaria de Estado da Saúde www.saude.go.gov.br Secretaria de Estado da Educação portal.seduc.go.gov.br Mercado em ascensão Avicultura Francesa - Avifran www.avifran.com.br. Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás sistemafaeg.com.br
Gerente Comercial: Beth Ramos comercial@revistasafra.com.br Representantes: Brasília – Faster Representações SRTVS Qd. 701, Bloco 2, Sobreloja 25/26, Ed. Assis Chateaubriand Brasília - DF - CEP 70340-906 Fone: (61) 3701-1796 / (61) 9982-6731 – Wisley Damião fasterrepresentacoes@terra.com.br Rio de Janeiro – Luciléa Rosário Rua das Opalas, 205 - Rocha Miranda Rio de Janeiro - RJ - CEP 21510-080 Tels.: (21) 99639-9379 / (21) 3014-7984 lucileapr@gmail.com skype: lucilea.rosario São Paulo – Tribal Mídia Comunicação Av. Voluntários da Pátria, nº 1.816 - Sala 04 - Santana São Paulo - SP - CEP 02010-500 Fones: (11) 3715-3540 / 3804-3540 comercial@tribalmidia.com.br Minas Gerais – NS&A – Solução e Comunicação Av. Presidente Carlos Luz, nº 468, Salas 5, 6 e 7 - Caiçara Belo Horizonte (MG) - CEP 31230-010 - Fones: (31) 2535-7333/ (31)9342-2040 - vera.santo@nsamg.com.br - Vera do Espírito Santo Circulação Nacional SAP – Serviço de Assinaturas & Publicidade - (62) 3255-6262 assinaturas@revistasafra.com.br Correspondência/Sede: Rua 1.034, nº 49, Setor Pedro Ludovico CEP 74823-190 – Goiânia – Goiás Fone: (62) 3997-7200 / 3255-6262 E-mail geral: safra@revistasafra.com.br Artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores, não representando necessariamente a opinião editorial da revista.
CONHEÇA A PRIMEIRA EMPRESA EM GOIÁS, ESPECIALIZADA EM EDITORAÇÃO
A ND Editora e Publicidade é a primeira editora em Goiás, especializada em Assessoria de imprensa, edição e publicação de livros, revistas e jornais. Tudo isso com qualidade e agilidade que garantem trabalho sério e entrega no prazo combinado. Jornalistas, publicitários e designers capacitados estruturam o quadro de profissionais para sua total tranquilidade.
ND
Editora & Publicidade
Rua 1.034, 49, Setor Pedro Ludovico - Goiânia - Goiás 48
Safra
Novembro/2014