BCC 58 - Crise econômica: quem paga a conta? (ago 2015)

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CONT R A-CORRENTE A análise da conjuntura econômica na visão e linguagem do sindicalismo classista e dos movimentos sociais Boletim mensal de conjuntura econômica do ILAESE

Ano 05, N° 58 - Agosto de 2015

Crise econômica: quem paga a conta? O governo já escolheu quem pagará pela crise, os trabalhadores por Eric Gil

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i v e m o s em meio a uma crise econômica mundial a qual atingiu, em cheio, o Brasil. Assistimos então uma queda no emprego, nos salários, aumento da inflação, cortes nos serviços públicos e nos direitos trabalhistas, além de um longo etc.

Mas o que é uma crise econômica? Ela é inevitável? O que é a atual política econômica do governo Dilma para a crise? Ela serve aos interesses dos trabalhadores ou dos patrões? Quais serão os seus efeitos? O Boletim ContraCorrente deste mês de agosto discute estas

questões com o objetivo de deixar mais claro o que é e para quem serve tais políticas econômicas. Em meio um caos tão grande por qual o nosso país passa, tanto do ponto de vista econômica, quanto político, é importante entender o que afinal anda acontecendo na economia.


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Crises cíclicas no capitalismo As crises econômicas no capitalismo são cíclicas, no entanto, os governos podem escolher para quem mandará a sua conta

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pesar dos defensores do capitalismo propagandearem que as crises econômicas são apenas acidentes de percurso no maravilhoso desenvolvimento da economia, fruto de decisões erradas de certos governantes, estes são na verdade fenômenos inerentes à este sistema. Independentemente do que for feito, no capitalismo, teremos crises em praticamente todas as décadas. No Brasil, por exemplo, para os dados disponibilizados pelo IBGE, de 1962 a 2014 temos uma taxa média de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), ou seja, o crescimento da economia, de 4,35%. No entanto, a regra é a instabilidade. Temos taxas

de crescimento do PIB que vão de 13,97% a -4,35%, como podem ser vistas no gráfico. Só para deixarmos mais claro, foram seis anos, dentre os 53 anos aqui analisados, que houve um decréscimo da economia. Para os jornais em geral, o critério utilizado para definir recessão é o de dois trimestres seguidos de crescimento negativo do PIB. É interessante também notar que há uma sincronia na economia capitalista internacional, ou seja, os ciclos econômicos não são apenas em um país específico, as crises econômicas são um fenômeno internacional, e quando as maiores economias do mundo caem, como foi o caso dos EUA em 2008, todas vão juntas nesta mesma montanha russa. Um

exemplo foi justamente esta crise, onde primeiramente os EUA entraram em recessão, levou a Europa junto e depois atingiu outros países, especialmente o Brasil. A crise econômica brasileira em números O primeiro dado a ser visto deve ser justamente o crescimento da economia. Segundo o IBGE, o crescimento do PIB para o primeiro trimestre (enquanto este boletim foi escrito ainda não havia o resultado para o segundo trimestre) deste ano foi negativo, -0,2%, e a expectativa para 2015, segundo o Banco Central, é de uma queda de 2,06%. O segundo aspecto a ser considerado é a taxa de desemprego. Também segundo o IBGE, tivemos no segundo trimestre deste ano

Taxa de crescimento real do PIB brasileiro (1962 – 2014)

fonte: IBGE

uma taxa de desemprego de 8,3%, o maior nível desde a criação desta série, em janeiro de 2012. Em um ano, esta taxa de desemprego subiu de 6,8% para 8,3%. Um terceiro dado é a renda real (quando descontada a inflação) do brasileiro, que teve queda neste mês de julho, segundo o IBGE, de 2,4% na comparação com o mesmo mês do ano passado. Isto se deu pela alta da inflação e estagnação dos salários, o que corroeu o poder de compra dos trabalhadores. É importante lembrar que para este ano temos uma expectativa de inflação, segundo o Banco Central, de 9,32%, então todo o reajuste salarial abaixo disto é diminuição real do salário e contribuirá para a diminuição da renda do trabalhador brasileiro. Podemos concluir que temos mais uma crise cíclica da economia capitalista, com efeitos graves no Brasil, no entanto, apesar disto ser inerente ao capitalismo, o governo tem a opção de mandar a conta para quem ele achar melhor, neste caso a conta foi enviada para os trabalhadores, como veremos nas páginas seguintes.


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Agenda Brasil: o golpe da direita? O golpe da direita veio do próprio governo e seus aliados

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pós muito se falar de um suposto golpe da direita, parece que ele veio do próprio governo, com a proposta da Agenda Brasil, feita por Renan Calheiros e o ministro da Fazenda, Joaquim Levy. A tal Agenda possui 28 pontos que versam sobre diversos temas, mas todos com foco na liberalização econômica, com diminuição do Estado e flexibilização de leis ambientais e trabalhistas. Vejamos algumas propostas que o ministro da Dilma e o presidente do Senado puseram para a suposta superarão da crise econômica e política em que vivemos. Uma delas é avançar no PL 4330, a lei aprovada pela Câmara dos Deputados que expande as terceirizações no país, agora nomeada no Senado de PLC 30/2015. Em boletim anterior nós já tratamos

do tema, se aprovado no Senado os trabalhadores trabalharão mais horas, receberão salários menores e passarão menos tempo empregados. Parece que esta superação da crise é apenas para os patrões. Outro ponto é possibilitar a cobrança pelos serviços do SUS, a princípio considerando faixas de renda. Ou seja, iniciar a cobrança pela saúde pública. Junto a este ataque ao SUS, a Agenda Brasil também prevê a desvinculações das receitas do governo, podendo diminuir ou extinguir gastos obrigatórios com Educação e Saúde, por exemplo. Se os municípios já quase não cumprem o mínimo do gasto com a Educação, imaginem se isto for eliminado como lei? Além do mais, para agradar ruralistas e mineradoras, este repertório do retrocesso brasileiro também

prevê a flexibilização das licenças ambientais com mudanças na legislação de licenciamento de investimentos na zona costeira, unidades de conservação, áreas protegidas e cidades históricas, e também mudanças nas leis de extração mineral, flexibilizando-as ainda mais. Mais um capítulo do Novo Código Florestal. A Agenda Brasil se junta ao já conhecido arsenal do Governo para jogar o custo da crise econômica nas costas dos trabalhadores. Pois

que trabalhador acharia que virar terceirizado, ter que pagar pelo SUS, ter menos investimento em Educação e Saúde seria resolver a crise econômica para ele e sua família? Depois de cortar seguro desemprego, abono salarial, benefícios da Previdência etc., este conjunto de propostas vem para garantir que a burguesia brasileira não sofra com a crise, sugando, como sempre, o máximo possível do Estado e diminuindo seus custos (leia-se salários).


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Os preços sobem por decisão do Governo A política de subida de juros só afeta ainda mais o bolso do trabalhador, possibilitando lucros bilionários para os banqueiros

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pesar das pessoas terem agora menos dinheiro para comprar mercadorias e serviços, assistimos os preços destes aumentarem absurdamente, e com isto a inflação corrói o pouco de dinheiro que nos resta. Em tese isto seria contra intuitivo, já que com desaceleração da economia a demanda cairia e levaria junto os preços das coisas. Mas o que estaria acontecendo? Grande parte do aumento da inflação se deve a preços administrados e aumentos de impostos. Desde o começo do ano a energia elétrica já subiu, nas 13 regiões pesquisadas pelo IBGE, 47,95%, com especial destaque para Curitiba e São Paulo, onde

os custos gerais da energia elétrica residencial subiram, respectivamente, 70,54% e 66,43%, de janeiro a julho. O aumento do ICMS por diversos estados também foi um agravante para o aumento dos preços neste ano. Novamente o Paraná foi o maior exemplo no Brasil, onde mais do que dobrou o seu imposto sobre circulação de mercadorias e serviços, passando de 12% para 25% a alíquota cobrada. Como este imposto impacta em praticamente todas as mercadorias e serviços, no Paraná 95 mil itens tiveram aumento de preço por conta disto. Isto se junta a outros grandes aumentos, como o preço da passagem de ônibus, saneamento,

água etc. A coincidência entre todos eles é que são os chamados preços administrados, que são preços decididos pelos próprios governos. Então grande parte do aumento da inflação se deve ao próprio governo. Aumentar juros diminui a inflação? A ferramenta de excelência do governo para combater a inflação é o aumento dos juros, ou como é conhecido, o aumento da taxa básica de juros, a Selic. Mas como o aumento de juros irá diminuir a inflação aqui, se são os preços decididos pelo próprio governo que aumentam? A subida dos juros nada mais é do que uma

política para agradar os banqueiros, que assim ganharão mais dinheiro com a dívida pública, pois o governo pagará juros mais altos, como está explicado no Box, sustentando os altos lucros destes. Por isto não é nada estranho uma “declaração de apoio” como foi a do presidente do ItaúUnibanco, Roberto Setúbal, à Dilma, pois os bancos nunca lucraram tanto na história deste país. Bem, com Agenda Brasil e a política econômica que apenas ataca os trabalhadores e beneficiam os empresários, a organização dos trabalhadores é essencial para impedir que todo o custo da crise seja pago por esta classe.

TAXA BÁSICA DE JUROS A taxa básica de juros da economia brasileira, definida pelo Banco Central do Brasil e chamada de Selic (Sistema Especial de Liquidação e Custódia), é a taxa de juros utilizada em operações de empréstimos entre os próprios bancos, e isto influencia em todas as outras taxas de juros da economia do país. Ela serve basicamente, em tese, para controlar a inflação, pois a corrente de pensamento econômico predominante, os neoclássicos (vulgarmente chamados de neoliberais), acreditam que o mecanismo de excelência para combater a inflação é a taxa de juros, por ter a avaliação que esta é sempre uma inflação de demanda, ou seja, quando a inflação está alta basta aumentar os juros que a demanda da população irá cair e consequentemente derrubará os preços. No entanto, esta taxa também é referência para uma boa parte da remuneração dos títulos da dívida pública brasileira, então quanto maior a Selic, maior a massa de juros que o Tesouro Nacional terá que pagar aos donos da dívida pública. EXPEDIENTE

Contra-corrente é uma publicação mensal elaborada pelo ILAESE para os sindicatos, oposições sindicais e movimentos sociais. Coordenação Nacional do ILAESE: Antonio Fernandes Neto, Arthur Gibson, Bernardo Lima, Daniel Kraucher, Daniel Romero, Eric Gil Dantas, Érika Andreassy, Fred Bruno Tomaz, Guilherme Fonseca, José Pereira Sobrinho, Juary Chagas, Nando Poeta e Nazareno Godeiro. Contato: Praça Padre Manuel da Nóbrega, 16 - 4º andar. Sé - São Paulo–SP. CEP: 01015-000 - (44) 9866-4719 - (11) 7552-0659 - ilaese@ ilaese.org.br - www.ilaese.org.br. CNPJ 05.844.658/0001-01. Diagramação: Phill Natal. Editor responsável: Eric Gil Dantas.


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