CONT R A-CORRENTE A análise da conjuntura econômica na visão e linguagem do sindicalismo classista e dos movimentos sociais Boletim mensal de conjuntura econômica do ILAESE
Ano 06, N° 69 - Agosto de 2016
De Collor à Temer: um país à venda por Eric Gil Dantas
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governo interino tem como objetivo urgente retirar a crise das costas dos patrões e do próprio governo. Quem paga a conta? Já sabemos. Um dos principais meios para isto é a privatização. Temer aposta em privatizar tudo o que puder, como ele mesmo
afirmou em entrevista recente. Mas será que isto é privilégio de Michel Temer? Neste Boletim Contra-Corrente nos ocupamos em analisar um histórico das privatizações no Brasil a partir do governo Collor, quando teve início este processo, passando pelas presidências de Ita-
mar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff, terminando com as pretensões e urgências do governo Temer. Todos eles privatizaram (e muito!), com características diferentes, obviamente. Alguns venderam muitas empresas, já outros rifaram tudo que foram estradas e aeroportos.
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Os anos neoliberais: Collor, Itamar e FHC Fernando Collor foi quem iniciou as primeiras grandes privatizações da história do país
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s grandes privatizações no Brasil tiveram início no governo de Fernando Collor, em um contexto de aplicação de uma política neoliberal para os países “subdesenvolvidos”, acordada pelas grandes potências no chamado Consenso de Washington1. Com a mesma desculpa dada até hoje por nossos governantes, de que empresas estatais dão prejuízo e são ineficientes, Collor – com seu Programa Nacional de Desestatização (PND) – vendeu 15 empresas (ABREU; WERNEK, 2014)2 em seus 655 dias na presidência (com média de uma empresa e meia vendida por mês), destaque principal para o setor siderúrgico. Este teve início com o desmonte da holding Siderurgia Brasileira S.A. – SIDERBRÁS, criada em 1973, que englobava, dentre outras, a Usiminas, vendida em 1991, até hoje uma das principais empresas do país. Já Itamar Franco, que assumiu a presidência após o
impeachment de Collor, em dezembro de 1992, vendeu 18 empresas estatais (uma média de 1,35 vendida por mês) em seus 733 dias na presidência, dando continuidade à política de Collor. As duas principais empresas privatizadas por Itamar foram a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) – o qual sua usina em Volta Redonda foi o primeiro grande investimento estatal do país –, em 1993, e a Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – Embraer, em 1994, privatizada por R$ 265 milhões em leilão vencido pelo grupo Bozano, Simonsen – de propriedade do ex-ministro da Fazenda, Planejamento e presidente do Banco Central na Ditadura Civil-militar brasileira, Mário Henrique Simonsen. Neste governo houve a primeira concessão federal desta onda, a da Ponte Rio-Niterói, modelo que será amplamente implementado nos governos petistas. Fernando Henrique Cardoso, entusiasta das privatizações e ministro da
Fazenda de Itamar, assumiu a presidência da República em 1995 e quebrou diversos monopólios estatais (Petrobrás, telecomunicações e gás) para dar ainda mais espaço às privatizações no país. FHC vendeu em seus oito anos de mandato 10 empresas, dentre elas gigantes como a Vale do Rio Doce, Telebrás e Banespa (maior banco estadual do país) e fez 5 concessões rodoviárias e 7 ferroviárias. Com a quebra de monopólio do petróleo, FHC leiloou 484 blocos de regiões de extração petrolífera, retirando o que seriam receitas para a Petrobrás. Um outro golpe mortal na estatal foi uma privatização parcial, através das vendas de ações. Para se ter uma ideia, em junho de 1997, o governo detinha 60,9% das ações da estatal, já em março de 2002, este número caiu para 40,6%. Além disto retirar empresas que eram importantes patrimônios estatais, piorar a vida dos trabalhadores, com diminuição salariais e de-
fonte: Politize!
missões em massa, as privatizações deste período foram cercadas de grandes escândalos de corrupção e favorecimentos, além de grande parte delas terem sido financiadas pelo próprio Estado, dando a faca e o queijo para o capital privado se apropriar das riquezas do povo.
1 O Consenso de Washington é como ficou conhecida uma reunião ocorrida em 1989, na capital dos EUA, para recomendar medidas neoliberais à outros países, inclusive para o Brasil. 2 ABREU, M. DE P.; WERNEK, R. L. F. Estabilização, abertura e privatização, 1990 - 1994. In: ABREU, M. DE P. (Ed.). . A Ordem do Progresso: Dois Séculos de Política Econômica no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014
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A privataria petista Nos governos petistas, as concessões viraram o modus operandi para privatizar
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pesar do discurso petista em governos anteriores ter sido anti-privatista, Lula ao chegar à presidência em 2003, já tinha sinalizado que continuaria uma política de cunho neoliberal – assinado na “Carta ao Povo Brasileiro”, à qual poderia muito bem ter no título “Carta ao Capital Internacional” – continuando, principalmente em seu primeiro mandato, a política de FHC. Lula vendeu a primeira empresa estatal em fevereiro de 2004, o Ban-
co do Estado do Maranhão S.A., seguido no ano posterior, pela venda do Banco do Estado do Ceará. Além destas empresas, foram feitas oito concessões rodoviárias, que totalizou 2.600 quilômetros privatizados, somando-se aos pedágios tucanos em estados do sul e sudeste brasileiro. Já no setor petrolífero, Lula conseguiu ultrapassar FHC e leiloou a concessão de 706 blocos para extração petrolífera, quase 50% a mais do que o tucano. As concessões vira-
ram o jeitinho petista de privatizar. Isto, obviamente, se soma à várias outras políticas liberalizantes e de precarização do trabalho em seu governo, sendo, a principal, a Reforma da Previdência, alguns meses depois de assumir o cargo, com incentivos à criação de fundos de pensão que hoje dão prejuízos bilionários aos trabalhadores e ajudaram a viabilizar diversas vendas de estatais. Dilma estendeu as concessões de rodovias e ferrovias para os aeroportos. Em agosto de 2011 o primeiro aeroporto foi leiloado, o de São Gonçalo do Amarante (RN), com a concessão iniciada em janeiro de 2012. A seguir, no segundo lote de “concessões” (privatizações), foram os aeroportos Internacional de Brasília Presidente Juscelino Kubitschek, Internacional de Guarulhos André Franco Montoro e o Internacional de Viracopos, em Campinas. E uma terceira rodada de concessões vendeu os aeroportos Internacional do Rio de Janeiro, Galeão
Antonio Carlos Jobim e o Internacional Tancredo Neves Confins, em Minas Gerais. Isto tudo além de rodovias como a BR-101/ES e a BR-050 (MG-GO). Para se garantir no poder depois do primeiro avanço do impeachment, em 2015, Dilma Rousseff apresentou, em fevereiro de 2016, o que seria a maior onda de privatizações desde 1998, auge da política neoliberal de FHC, com a segunda etapa do PIL (Programa de Investimento em Logística). Neste programa seriam arrematadas concessões em ferrovias, com R$ 86 bilhões, seguidos por rodovias, com R$ 66 bilhões previstos; portos, na ordem de R$ 37 bilhões; e aeroportos, com R$ 9 bilhões. Além disto, iriam haver vendas de partes de estatais. Ou seja, Dilma já radicalizava a “privataria petista” para assim salvar-se de ser expurgada da cadeira da presidência, o que parece não ter sido o suficiente. Foram-se os dedos e os anéis.
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Temer promete mais privatizações Temer já disse: vai privatizar tudo o que puder
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interino Michel Temer aguarda o julgamento final do Senado Federal para decidir se tomará de forma permanente o comando da presidência da República, julgamento este que ocorrerá até o final deste mês. Mas não perde tempo. A prioridade do governo tem sido transferir o custo da crise dos empresários para os trabalhadores. Para isto o interino corre com a Reforma da Previdência e tenta passar de qualquer forma os projetos que impõe tetos de gastos para o Governo Federal e estaduais, via renegociação das dívidas, como já foi tratado no boletim de junho. Mas além disto, Temer também tem como prioridade vender todas as empresas públicas que puder. Em entrevista dada no dia 12 deste mês de agosto, ao Valor Econômico, perguntado das priEXPEDIENTE
vatizações, Temer respondeu o seguinte: “No dia 25 [Temer adiou o anúncio deste pacote para depois da votação do impeachment] vamos anunciar as empresas que serão desestatizadas. No setor elétrico, tem quatro empresas estaduais, inclusive a de Goiás e a do Amazonas. A Eletrobras não será. Eu pretendo desestatizar muita coisa, porque o Estado brasileiro não pode suportar tudo isso, já não cumpre bem seu papel na
saúde, na educação.” Já para a Folha de São Paulo, dois dias antes, Temer disse que: “É possível que venhamos a privatizar, vai ser analisado, [os aeroportos de] Congonhas e Santos Dumont, o que deve dar uma boa soma”. Além de tudo isto, disse ser emergencial que a Câmara aprove a retirada do monopólio da Petrobrás diante do pré-sal. Está dada a largada, do início da década de 1990 até hoje já foram
dezenas de empresas vendidas à nível federal (sem contar as vendidas em parte, como cada vez mais é o exemplo do Banco do Brasil, Petrobrás, Caixa e um longo etc.) e dezenas de concessões – o jeito petista de privatizar. Mas agora teremos mais uma forte onda de privatizações, a qual os trabalhadores – estes sim os principais interessados em barrá-las – terão que resistir, pois depois disto não vai sobrar muita coisa.
Contra-corrente é uma publicação mensal elaborada pelo ILAESE para os sindicatos, oposições sindicais e movimentos sociais. Coordenação Nacional do ILAESE: Antonio Fernandes Neto, Arthur Gibson, Bernardo Lima, Daniel Kraucher, Daniel Romero, Eric Gil Dantas, Érika Andreassy, Fred Bruno Tomaz, Guilherme Fonseca, José Pereira Sobrinho, Juary Chagas, Nando Poeta e Nazareno Godeiro. Contato: Praça Padre Manuel da Nóbrega, 16 - 4º andar. Sé - São Paulo–SP. CEP: 01015-000 - (44) 9866-4719 - (11) 7552-0659 - ilaese@ ilaese.org.br - www.ilaese.org.br. CNPJ 05.844.658/0001-01. Diagramação: Phill Natal. Editor responsável: Eric Gil Dantas.