CONT R A-CORRENTE A análise da conjuntura econômica na visão e linguagem do sindicalismo classista e dos movimentos sociais Boletim mensal de conjuntura econômica do ILAESE
Ano 05, N° 62 - Dezembro de 2015
Paraísos Fiscais (ou o paraíso da sonegação e corrupção) O BCC deste mês trata sobre a relação entre paraísos fiscais, sonegação de impostos e corrupção. Por Eric Gil Dantas
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hegamos ao fim do ano de 2015 com uma mescla de crise econômica e política no Brasil. Já estamos quase no Natal e não param de aparecer escândalos de corrupção e favorecimentos a grandes empresários e banqueiros. Neste Boletim Contra-Corrente de dezembro queremos discutir uma dimensão da
corrupção pouco lembrada mas que está presente em muitos casos de roubo aos cofres públicos ao redor do mundo, os paraísos fiscais. Eduardo Cunha, atual presidente da Câmara dos Deputados, foi flagrado com cinco milhões de dólares em uma conta na Suíça – principal paraíso fiscal do mundo – fruto de propina relacionada à Petrobras. Há suspeitas de que há mais dezenas
de milhões de reais recebidos por ele e que devem estar também em paraísos fiscais. Então por que se contesta tão pouco a existência destes lugares? Ou ainda, por que se silencia sobre um dos países mais ricos do mundo manter práticas tão suspeitas, ajudando políticos, empresários e entidades corruptas a manterem seu dinheiro a salvo?
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Qual o tamanho dos paraísos fiscais? 8% da riqueza mundial está em paraísos fiscais, fugindo da cobrança de impostos e da fiscalização da origem deste dinheiro, acobertando corruptos e sonegadores
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ma região é considerada um paraíso fiscal quando possui leis que facilitam a ida de capitais estrangeiros e oferecem cobranças de impostos sobre eles muito baixas, ou praticamente nulas. No entanto, na prática, os paraísos fiscais
são os locais (seja um país, seja uma região autônoma) que não possui praticamente nenhuma fiscalização sobre as contas abertas lá, o que permite a ida de dinheiro originário de todos os tipos de atividades ilícitas, de corrupção ao tráfico. Na lista dos
principais paraísos fiscais temos tanto países ricos, como a Suíça e Luxemburgo, quanto regiões pouco conhecidas, como a Ilha da Madeira e as Ilhas Turcas e Caicos. Estes países se concentram principalmente na Europa e América Central.
Nesta parte do boletim trataremos dos custos financeiros dos paraísos fiscais para os cofres públicos. Em estimativa do economista francês Gabriel Zucman publicada em recente livro, intitulado de A Riqueza Oculta das Nações (um jogo
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de palavras com o clássico do economista escocês Adam Smith), os paraísos fiscais possuem um volume de dinheiro na ordem de 7,6 trilhões de dólares, quando tratamos de todos os continentes à exceção da Oceania (as regiões pesquisadas pelo autor são as que estão na tabela). Isto equivale a algo em torno de 8% da riqueza mundial. Mas além dos problemas referentes ao acobertamento da corrupção (como veremos na próxima página), temos a evasão fiscal. Quando os ricos jogam seu dinheiro em paraísos fiscais, fazem isto em grande parte para não pagarem impostos. Na América
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Latina a estimativa é que, por ano, se perca 21 bilhões de dólares (ou na cotação atual, 82,05 bilhões de reais) em arrecadação para os governos nacionais. Além dos ricos pagarem proporcionalmente menos impostos do que os pobres (o que já é de uma imensa injustiça) eles ainda têm mecanismos para jogarem seu dinheiro para locais que não pagam impostos e ninguém sabe. Este é o dinheiro que eles pagam (como Eduardo Cunha) a educação dos filhos nas melhores universidades do exterior, lazer nas mais caras quadras de tênis dos EUA e um longo etc. impossível de se imaginar para nós.
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COMO OS RICOS CONSEGUEM LEVAR O DINHEIRO PARA PARAÍSOS FISCAIS? Gabriel Zucman conta, no primeiro capítulo do seu livro, que para conseguir lançar dinheiro de forma oculta na Suíça é fácil. Ele dá um exemplo fictício que ilustra bem o procedimento padrão: Michael é CEO (diretor-executivo) da empresa norte-americana Michael & Co., uma empresa com 800 funcionários, dos quais ele é o único acionista. Para enviar, digamos, US$ 10 milhões para a Suíça, Michael prossegue em três estágios. Primeiro, ele cria a empresa de fachada, por exemplo, nas Ilhas Cayman (paraíso fiscal localizado no Caribe), onde as regulamentações relativas à divulgação de proprietários da empresa são bem limitadas. Ele então abre uma conta em Genebra (Suíça), sob o nome da empresa de fachada, que leva poucas horas. Finalmente, Michael & Co. adquire os serviços fictícios da empresa Shell Cayman (consultoria, por exemplo), e, para pagar por esses serviços, envia dinheiro para a conta suíça da empresa Shell. A transação gera uma trilha de papel que parece até legítima (tradução livre a partir da obra original, parêntesis nossos). Uma simples operação destas pode driblar um dos mais poderosos governos do mundo, o dos EUA.
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Os paraísos fiscais e a corrupção Eduardo Cunha é um dos principais exemplos de como a corrupção é amiga dos paraísos fiscais
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utra face dos paraísos fiscais é a cobertura de todo o tipo de corrupção no mundo. Não imaginem que são só pelas corridas de esqui, belos chocolates e relógios chiques que entidades como a FIFA (uma das organizações internacionais mais corruptas do mundo) escolhem ter a Suíça como país sede, e muito menos pela sua suposta “neutralidade”. A bela e desenvolvida Suíça, tida como exemplo de nação, ainda é o mais antigo e principal paraíso fiscal do mundo, concentrando 2,3 trilhões de dólares, e mais da metade das contas em paraísos fiscais de europeus, segundo Zucman. Graças a esta conivência do capital financeiro internacional EXPEDIENTE
(que ganha fortunas com isto) e destes governos, casos como o de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) são possíveis. O presidente da Câmara dos Deputados, que possui (já comprovadamente) cinco milhões de dólares em contas na Suíça, já foi acusado neste mês de dezembro de ter faturado mais R$52 milhões de propina para liberar o Fundo de Investimento do FGTS brasileiro, dinheiro este recebido em contas na Suíça e em Israel. O b v i a m e n t e Cunha não está sozinho nesta. Se puxarmos pela memória, neste conturbado ano de 2015, temos mais o caso que ficou conhecido como SwissLeaks (vazamentos suíços, em português, em referência ao famoso WikiLeaks, organização que publica, em sua página,
postagens de fontes anônimas, documentos, fotos e informações confidenciais, vazadas de governos ou empresas, sobre assuntos espinhosos). Neste caso, o banco britânico HSBC, que coincidentemente anunciou o encerramento de suas atividades no Brasil no mesmo ano, ajudou gigantescos esquemas de evasão fiscal em todo o mundo, fazendo todo o processo para que clientes ricos conseguissem jogar seu dinheiro em contas na Suíça. No Brasil, ao menos cinco políticos, dos mais diversos partidos, e duas irmãs do Paulo Maluf engordaram esta lista. P o d e r í a m o s passar páginas e páginas citando casos de corrupção na história brasileira
que ocorreram, em muito, auxiliados pelos paraísos fiscais, no entanto, resolvemos citar apenas os dois últimos, que estão imersos na atual crise política. Mas o que queremos argumentar é que paraísos fiscais são uma das formas dos mais ricos e poderosos burlarem as leis, jogando lá dinheiro roubado dos cofres públicos ou ganhos ilicitamente pelas suas empresas, além de fugirem do pagamento de impostos, pois uma mazela tão grande quanto a corrupção é a sonegação de impostos, que retira meio trilhão de reais por ano do orçamento público brasileiro, dinheiro este que deveria garantir Educação, Saúde, Previdência e tantos outros direitos.
Contra-corrente é uma publicação mensal elaborada pelo ILAESE para os sindicatos, oposições sindicais e movimentos sociais. Coordenação Nacional do ILAESE: Antonio Fernandes Neto, Arthur Gibson, Bernardo Lima, Daniel Kraucher, Daniel Romero, Eric Gil Dantas, Érika Andreassy, Fred Bruno Tomaz, Guilherme Fonseca, José Pereira Sobrinho, Juary Chagas, Nando Poeta e Nazareno Godeiro. Contato: Praça Padre Manuel da Nóbrega, 16 - 4º andar. Sé - São Paulo–SP. CEP: 01015-000 - (44) 9866-4719 - (11) 7552-0659 - ilaese@ ilaese.org.br - www.ilaese.org.br. CNPJ 05.844.658/0001-01. Diagramação: Phill Natal. Editor responsável: Eric Gil Dantas.