Edição de Lançamento! Ano I Nº 1 Julho 2013 Revista Digital Trimestral de Literatura e Arte
CRIANÇAS E LIVROS Como despertar nas crianças o gosto pela leitura
ENTREVISTA Aline Negosseki Teixeira
Viajando nas páginas de um livro: Por Falar em Disputa... nos leva até Cafeara
Tudo sobre a fundação do Círculo de Escritores de São José dos Pinhais e os projetos que serão desenvolvidos
O Ăšltimo Baile do ImpĂŠrio De Amor e Destino Por falar em Disputa... Serenata
Amando ao Inimigo O Caminho de Volta Os Encantos do Rio Encontro com o Passado
Com carinho para... Talvez eu ainda estivesse em casa, dividindo apenas com os internautas minha vocação e dom, talvez eu ainda estivesse em casa, sem conhecer a fabulosa possibilidade de compartilhar. E de fazer acreditar... que com perseverança os ternos, relevantes trabalhos são realizáveis. Ah, porém, sempre há um momento para a voz do destino chamar aquele ao qual um dom concedeu. Eu agradeço e dedico com meu coração e intelecto minha contribuição ao Círculo dos Escritores de São José dos Pinhais e à Revista LetrArte à bibliotecária Luciméri Nogueira, que desde que a conheci na adorável e estimulante Biblioteca Pública Municipal Schaffenberg de Quadros tenho visto conjuntar os escritores e fomentar a atividade literária da melhor maneira possível. O trabalho com amor, já não é mais trabalho, se expande além da obrigação, e é uma vocação. Aline Negosseki Teixeira, 14.07.2013 22h34min
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Editorial
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Colaboraram nesta edição: Aline Negosseki Teixeira www.alineteixeira.com facebook.com/alinenegossekiteixeira Almir Almeida facebook.com/almir.almeida.735
LETRARTE ENTREVISTA
Aline Negosseki Teixeira fala de sua vida, sua obra e seus projetos
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AMBIENTAÇÃO
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LEITURA
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LEITURA
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LEITURA
O Brasil como palco de grandes histórias
Abismo de Rosas
Agora e Sempre
Amoras
Nossos endereços: www.facebook.com/pages/Círculo‐de‐Escritores‐de‐SJP http://escritoressjp.blogspot.com.br/ escritoressjp@gmail.com issuu.com/escritoressjp
Cristina Pereyra www.cristinapereyra.com facebook.com/cristina.pereyra.1485 Dalton Luiz Gandin facebook.com/daltonluiz.gandin
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Entre em contato e dê a sua opinião, ela é muito importante para nós.
NESTA EDIÇÃO
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VIAJANDO NAS PÁGINAS DE UM LIVRO
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LEITURA
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AGENDA
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CONHEÇA SÃO JOSÉ DOS PINHAIS
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ESPECIAL
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LEITURA
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BAÚ DE POESIAS
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LEITURA
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NOTÍCIAS
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INTERNET
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LEITURA
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LEITURA
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CRIANÇAS E LIVROS
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POEMA ESCOLHIDO
Círculo de Escritores de São José dos Pinhais, da origem à fundação Geologia Poética
Grito Calado
Vamos conhecer Cafeara A vida nos versos de Dalton Luiz Gandin e Aline Negosseki Teixeira O que de mais importante aconteceu na vida cultural de São José dos Pinhais
Marcas de Amor
Programe-se
Imagens da cidade
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A revolução no modo de publicar e no relacionamento com o leitor Andando pela Praia
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As polentas da discórdia
O que fazer para que as crianças gostem de ler
Quando a voz da liberdade encantou a uma adolescente
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LOCAL DE INSCRIÇÃO
Secretaria Municipal de Cultura
Biblioteca Pública Municipal Scharffemberg de Quadros Praça 8 de Janeiro, 1 20 83005-11 0 - São José dos Pinhais - PR Tel: (41 ) 3381 -5845 E-mail biblioteca@sjp.pr.gov.br
CATEGORIAS Conto Crônica Poesia Redação
INSCRIÇÕES: 1 3 de maio até 1 3 de setembro de 201 3 Trabalhos enviados pelo correio serão aceitos com data de postagem até 1 3 de setembro.
Entrevista
Um dedo de prosa com
Aline Negosseki Teixeira
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O livro é um camafeu, não é só a palavra que nele cabe, mas, um mundo de sentimentos. Ele guarda a relíquia de uma face a um universo contemplar. Livro e Camafeu in Serenta. 2013 Aline Negosseki Teixeira
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Cheiro de relva. Úmido orvalho no campo sulista.
Haicai Para Crianças
Um pouco mais de Aline
Gosta de tudo que é poético, dotado de sensibilidade e verdade. Verdade limpa, fresca e lapidada. E também a verdade lírica.
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Começou a escrever na infância e não parou mais. Passou a considerar-se "escritora" quando de sua primeira publicação, em dezembro de 2009: O Último Baile do Império. Desde então além de escrever, distribuir e vender suas obras, ministra oficinas culturais de poesia e haicai em eventos culturais e principalmente em escolas de Ensino Fundamental. Dentre todas as atividades é essa sua preferida.
Em conjunto com outras escritoras fundou o Letrissima, que é um selo sem fins lucrativos que une profissionais de todo o país - escritores, revisores, tradutores, divulgadores, artistas e outros colaboradores. Escritores preferidos: Eleanor Porter, Erico Verissimo, José de Alencar, Cora Coralina, Florbela Espanca, C. Flammarion, Rubem Alves, Elizabeth Thornton e Gayle Wilson, os poetas do tempo da inconfidência e o dos tempos românticos do século XIX.
Sua principal meta é fomentar a atividade cultural, principalmente em área de literatura, incentivar não só o ato de ler como o de escrever.
Em conjunto com a escritora Cristina Pereyra fundou o Círculo dos Escritores de São José dos Pinhais que teve como ação inicial a instauração de um encontro oficial mensal de escritores de São José dos Pinhais, que sempre ocorre na Biblioteca Municipal Schaffenberg de Quadros.
Livros favoritos: A Moreninha, Poliana e Poliana Moça, Poemas dos becos de Goiás e Histórias Mais, Vintém de Cobre, O Tempo e o vento, Olhai os Lírios do Campo, Solo de Clarineta I e II, Clarissa, Música ao Longe, Um Lugar ao Sol e Saga. Israel em Abril, Stella (Camille Flammarion).
Mantém um blog onde expõe sua obra, suas iniciativas e seu trabalho: www.alineteixeira.com
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Oficinas de Criação Literária
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Romance e a Ambientação no Cenário Nacional
Os grandes autores nacionais em suas maiores obras retrataram o Brasil e o brasileiro.
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texto literário é se não o mais, um dos mais pertinentes meios de expressão e preservação da cultura, memória e história de uma comunidade, povo ou nação. Seja em prosa ou verso as gerações futuras podem “ler” as imagens dos usos, costumes e formas de relacionar de seus antepassados. Há o jargão popular “Uma imagem vale mais que mil palavras.” De fato, uma bela imagem, seja uma pintura ou fotografia enche a vista e emociona. Porém, quantas perguntas ela não deixa em nosso interior? Um texto bem escrito, por outro lado, revela tantas coisas! Exemplo disso é lembrarse que foi somente
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ao encontrar as famosas tabuinhas de argila na região da antiquíssima mesopotâmia que fatos outrora tidos como mito, vieram a ser aceitos pela civilização presente. O ambiente se modifica ao longo dos milênios e catástrofes incompreensíveis levaram para sempre civilizações remotas que apenas o registro escrito pode trazer até nós o relato do cotidiano daqueles tempos imemoriais. Tínhamos imagens. Tínhamos esculturas e um monte de deduções. Foram as tabuinhas, rolos, pergaminhos, fosse argila, pele de animais, papiro ou as paredes das cavernas, o incompreensível se revelou no decifrar dos caracteres. Dos mais rudimentares aos mais sofisticados.
Um texto, marcas e sinais gráficos abstratos sobre uma base, revelam exatamente o que o registrador (ou escriba, escritor, relator) tinha por intenção deixar registrado. Ou não. O motivo? As sociedades têm ao longo do tempo lançado mão de um de seus mais abrangentes atributos da inteligência: a interpretação. Seja em verso ou prosa especulações sobre especulações em volta de figuras que o passar das décadas, séculos, mitificou, proliferam a cada geração. Além do valor histórico de uma representação artística em forma de literatura, temos, por tanto, um objeto imaterial de reflexão. A literatura, seja em qual forma ela se apresente, é um vasto meio de fomento não apenas da situações concretas e reais da existência, como um ato de lirismo da crueza dos dias – ou registro dos fragmentos de fato poéticos da vida. Nesse raciocínio, é interessante a questão: qual a importância do ambiente numa narrativa? Determinante! O romance de desenovela, se desenlaça, e revela, em minúcia desconcertante não apenas atos, fatos e desencadeamento de ações, como sonda questionamentos mesmo filosóficos dos costumes. Que variam conforme o lugar em que aconteceu! É um veículo sem precedentes de cultura. Desde um campo branco, solitário, inóspito, infinito de um inverno eterno de uma obra de Tolstoi, às matas calorosas e perfumadas dos românticos autores indianistas, percebese claramente que o ambiente em que o romance se dá, determina o que podemos esperar da história como um todo. Tais romances, altamente descritivos em relação ao ambiente, contém detalhes de suma importância para a compreensão de como viveram as gentes antes de nós, do que nos importa deixar registrado, do que resgatar para levar o leitor a uma reflexão das transformações que tempos e grandes
acontecimentos trouxeram, como a reflexão de como agir, do que plantar para a colheita futura. Conforme o interesse e gosto do leitor, ele passeia talvez os olhos pela livraria, ou pelas páginas nas “bookstores” virtuais e quando bate o olho num período ou lugar que lhe fascina, seu coração pulsa de modo diferente. O ambiente, creio, é o primeiro ponto a ser bem pensando pelo autor. Porque ambientar meu romance nesse lugar e época? Aconteceu algo importante aí? O ambiente que ele escolhe para sua obra é uma verdadeira viagem para o leitor. E toda jornada é melhor se acontece de modo empolgante e inesquecível. Qualquer coisa em qualquer lugar poderá ser importante, desde que seja observado o modo que os acontecimentos naquele lugar escolhido serão contados. Despertará a curiosidade? Tocará os sentimentos do leitor? Paixão, medo, ternura, raiva, canseira... O romance é capaz disso tudo. O autor quando decidese por determinado ambiente terá duas opções para oferecêlo ao leitor em forma que a grafia, de fato, se torne em imagens, cheiros, sons na fabulosa transmutação que a leitura faz. Primeiro, narrar uma história ocorrida em um lugar que ele conhece, de fato. Se ele esteve lá, certamente sabe por própria experiência sobre como o clima ali se regula, quais sensações um ser humano sente exposto a tal clima. Se ele tiver talento poético, saberá fazer as metáforas certas para descrever ambientes naturais ou erguidos pelo ser humano. Se ele for minucioso, também é certo que tenha observado os costumes dos habitantes daquele lugar. Como os habitantes se relacionam com o ambiente que vivem? Modo de falar, como e do que se alimentam, o que fazem para ganhar a vida, se divertir, suas expectativas e valores. Por ter experimentado aquilo tudo talvez possa com maior propriedade registrar. Ou o autor poderá ser um apaixonado, aficionado por determinado lugar em que nunca esteve, mas, por tamanho amor e
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curiosidade, leu, pesquisou, averiguou tudo quanto soube ter disponível. Fará, então, um casamento de suas próprias experiências com as experiências de outras pessoas. Podese, então, obter um texto rico. Li, certa vez, um romance ambientado na revolução espanhola contra o ditador Franco. O autor não esteve lá. Tinha, por referência, o diário de alguém que, de fato, esteve lá, lutando e experimentando tudo que a situação oferecia. A partir disso, escreveu uma obra impressionante, magnífica. Não deixei de notar, porém, que no interior da personagem principal viviam os questionamentos e pontos de vistas de um ‘estrangeiro’. Não é a minha intenção fazer uma crítica, ou registrar uma opinião formada sobre a questão do autor que ambienta obras em lugares que nunca esteve. Pois, meu pensamento conforme escrevo vai se modificando, e em trechos de livros meus, mesmo, personagens estiveram em lugares que nunca fui. Esse é um dos encantos da
literatura para mim. Tornar possíveis alegorias de maneira que as fronteiras físicas quase sempre tornam intransponíveis. A minha intenção é deixar um questionamento a respeito de nossa própria literatura, e nosso próprio país. Enquanto nos países desenvolvidos os artistas superestimam suas próprias culturas, que também não deixam de ser uma miscelânea deliciosa proveniente das imigrações em massa, no nosso em via contrária, deixamos de lado o que é nosso, o que apreendemos e temos conhecimento de campo e conhecimento vasto para contribuir com não só a perpetuação, como o crescimento do volume de registro da sociedade externa. O mundo, se pensarmos no contexto da arte, não tem fronteiras. Quando crio personagens frutos da terra de minha região, sei que eles têm pernas e poderão correr mundo. Se aventurar, experimentar, como assim o foi com os personagens da História real.
ABISMO DE ROSAS As rosas e versos servem para expressar o amor dos amantes, uma rosa, um verso podem dar vida a uma grande paixão. Paixão é um sentimento gostoso que põe na boca dos amantes as mais lindas palavras de amor e loucuras que só possuem valor para quem ama. Foram as rosas, os versos que fizeram com que nos aproximássemos. Amor,é a você quem envio flores e para você que dedico os versos que componho, foi pra você que entreguei-me, e só você quem tanto amo. Mas você não obteve amor por mim e deixou-me só entre as rosas do jardim, hoje volto ao mesmo jardim para relembrar você vendo as rosas e me proponho a citar frases de amor como se você ainda estivesse junto a mim, ouvindo minhas palavras de amor. Ainda hoje colho rosas para oferecer-lhe como antes, nas noites em que nos amávamos. Mas com sua falta, encontro-me neste abismo, junto com a rosas que a você dediquei. Agora nada nos resta senão pétalas atiradas ao chão e parte dos versos que falavam do amor que a você dediquei. Você lançou ao vento todas as coisas que eu possuía para oferecer-lhe, as rosas, os versos e todo meu amor. Hoje vejo-me como as pétalas das rosas que para você não possuem nenhum valor, como parte dos versos que a você escrevi e você destruiu junto das rosas e também a mim. Hoje neste abismo vejo tantas rosas, tantos versos e corações desesperados e lançados na escuridão. Aqui o sol não aquece, as estrelas não brilham e a lua não aparece. Almir Almeida.
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Não é empolgante, no entanto, explorar um mundo vasto, rico, cheio de possibilidade que, vejam só, meus olhos alcançam e se esparrama além das montanhas mais próximas e do vale presente? Acontece, ainda, entre os prédios em que posso chegar com a força de minhas pernas, com o valor de um sanduíche? Depende da forma que eu o relatar, que eu fizer lírico, poderá encantar uns olhos “sedentos” por um lugar adverso, uns olhos estrangeiros que habite o outro lado do globo, o lado que tanto me fascina, me põe curioso e, somente dessa forma o intercambio será possível. Pois se ele e eu contarmos a mesma história, no mesmo ambiente, que será de todo o resto? A supervalorização e propaganda de um grupo determinado de cultura e sociedade não pode continuar em plena era da interligação
mundial em tempo real! Do compartilhamento cultural por toda a gente e gente comum que relata espontaneamente a vida – não de forma premeditada e ensaiada. Desertos e grandes rios, praias sem fim, campos verdes de capim, trejeitos diversos, sonhos antigos, realizações heroicas, notas tristes e grandes horrores, dores profundas e paixões arrebatadoras, cadeias montanhosas, planaltos lendários, desfiladeiros, cachoeiras, povoados e metrópoles. Mistérios inexplorados, sofrimentos insondados, sorrisos eternizados num parágrafo. Quando o brasileiro perceberá que possui no regionalismo um tesouro inestimável, fonte infinita de gozo e riqueza não apenas cultural como econômica? O Brasil é um universo literário acontecendo o tempo todo.
EVENTOS, NOTÍCIAS, PROMOÇÕES E MUITO MAIS
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Agora e sempre Sua vida teria sido diferente se ela não tivesse ido à igreja naquele domingo. Se não tivesse olhado para a praça na saída da missa. Se não o tivesse visto sentado no banco. Se não tivesse fitado aqueles olhos de cachorro sem dono. Se ele não tivesse lhe sorrido. Se o seu coração não tivesse disparado com esse sorriso. Se não o tivesse visto em outros domingos. E depois também nas quartas e sábados. Depois, todos os dias. E agora, nunca mais. Isso tudo ela pensava diante da sepultura daquele que fora seu companheiro por mais de cinquenta anos. Pensava sem lágrimas, pois fora feliz por tempo demais para se lamentar agora. Breve o seguiria e voltariam a estar juntos. Pela eternidade.
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LEITURA
Amoras Aline Negosseki Teixeira
Quem teve infância gostava de amoras. Ou frutinha que valha. Mesmo que fosse aquelas coisinhas vermelhinhas e proibidas que se penduravam nos galhos que pendiam no portão ou muro de algum vizinho ranzinza.
Felicidade é pensar poeminhas sobre amoras. Aline Negosseki Teixeira. Haicai Para Crianças Sentidografias, 2010
E quem teve uma infância feliz com amoras, pitangas e ameixas amarelas sempre que vê um pé carregadinho se lembra dos sorrisos e horas distraídas na doce obstinação de comer amoras. Porque quando se começa, tornase um obstinado em comer e comer. Sempre que vem setembro, outubro com a safra de alegria me torno outra vez na criança que fui e nisso há muito encanto. Porque encanto é algo próprio das crianças. Elas acreditam e sorriem verdadeiramente felizes com encanto, ou arregalam seus olhinhos, verdadeiramente empolgadas, com uma história, causo, conto de encantadora imaginação... E qual é o encanto de gostar de amoras? É que em adorar gastar umas horas empanturrandose até entupir delas reside a felicidade. Sim. Disse Jesus que se quiséssemos entrar no reino do Pai, que fossemos como as criancinhas. As crianças têm o coração e mente limpos o suficiente para acreditar que subir num pé de amoras é a maior das felicidades possível. Felicidade se resume em ter satisfação com as coisas saudáveis, puras, simples e fáceis de se ter. Uma satisfação não momentânea, mas, sim, uma satisfação que perdura. A felicidade de comer amoras perdura porque depois de entrar para dentro de casa satisfeito, você sabe, amanhã o pé estará carregadinho outra vez, as que hoje são verdes, amanhã serão maduras e você poderá fazer tudo, tudo outra vez. Quando eu era criança em nossa casa havia duas amoreiras no quintal que não é lá muito grande, mas que, para mim, tinha o tamanho de um universo inteiro. Quantas alegrias não tive eu ali entre as poças de lama e os castelos de encantamento que construí, sozinha ou acompanhada? As amoreiras estavam junto do muro do fundo e tinham muitos galhos frondosos e outro esguios que, sem poda, tinham a aparência, para a menina, de uma floresta. Passei muitas horas de minha vida com o traseiro assentado no muro cinza comendo e comendo amoras. Apertando essas coisinhas tenras, de minúsculos gominhos e caldo que roxeia nossa boca e mãos, eu não via as horas passarem e, às vezes, também, ficava em pé para alcançar minhas adoradas “pretonas”. Às vezes, fazia subir lá minha
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irmãzinha de quatro anos e, apesar de minha mãe confiar bastante na minha responsabilidade de “mocinha de nove anos”, não gostava muito. Mas é claro, ela não estava vendo, coitada, muito ocupada na máquina de costura. Nós duas ouvíamos os passarinhos nas laranjeiras que não estavam longe de nós e conversávamos nossas histórias de fadas e, mais doce que nossas “pretonas”, eram as enganações inocentes que eu pregava na Manu. Se eu fazia haver a fada brilhantina que morava dentro da madeira da porta do banheiro para conversar com ela, nos troncos de cada árvore do nosso quintal vivia também um ou outro ser mágico. Quando pegávamos amoras éramos somente crianças. Duas irmãs que brigavam e se amavam muito e dividiam quase tudo. Sem pensar no futuro, nem em problemas, nem em banho, nem em escola, ou em lágrimas de nossa mãe. Apenas ríamos ou, empolgadas, dividíamos nosso “tesouro” com alguma criança vizinha. O tempo passou, eu me tornei adolescente e ainda pegava amoras. Mas, um dia, nos mudamos daquela casa que, conquanto continuasse nossa, outra pessoa foi ali morar. Nós morávamos já então numa casa maior e um tanto melhor. Mas uma casa que ocupava praticamente todo o terreno e não tinha uma árvore sequer. Tinha, sim, roseiras que embelezam a vista. Só que ninguém pode subir nelas e gastar algumas horas empanturrandose de coisinhas doces e saudáveis e, melhor que isso, se empanturrar de sonhos ingênuos. Muitos anos se passaram, eu me casei e fui morar na mesma casa que experimentei minhas primeiras amoras. Mas que tristeza não foi saber já uns anos antes que o morador as cortara todas, cada uma das árvores. Desde o pé de açucarados romãs que tanto me curou as aftas, à goiabeira que meu avô plantara! Mudei para ali com a alegria de recémcasada. E era triste ver “deserto” do quintal de minha infância. Quase adulta, ele me pareceu tão menor, tão sem vida, como se uma bruxa malvada houvesse passado um borracha na linda ilustração do terreiro de minha infância. E, ainda disse: “Aquelas árvores enchiam o quintal de formiga!” Não me lembro de que as formigas disputassem comigo as amoras. Eu me lembraria decerto, visto que me lembro de que certa vez um formigueiro de saúvas se revoltou contra meu pé que pisoteou seu reino esmeradamente erguido. E o que me lembro delas, das formigas, é que eu deitava no chão, muitas vezes, só para observálas carregar aqueles pedacinhos disformes de folha, de fazer “testes” interrompendo o real caminho com um graveto. Para, então, vêlas apesar de minha vilania de curiosa, contornar o obstáculo que lhes impusera. As formigas podem derrubar uma casa, mas também podem muito nos ensinar. Do terreiro deserto, o Matheus e eu, fizemos um lindo jardim. Grama verdinha, arbustos de flores coloridas, rosas (em especial um pé de
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rosa da cor laranja) e, no centro de tudo, um lindo manacá da serra que penso ter custado quinze reais e, em cinco anos estava espantosamente alto, frondoso, e nos presenteava em sua época de floração com um tapete veludoso de flores brancas e lilases. Se possível fosse, teríamos pagado até cem reais para trazêlo para cá. E se pudéssemos, até mais. O lindo jardim foi um pouco diminuído por nossa ovelhinha Sabrina que comia tudo que via pela frente. Mas, quando ela passou a fazer mais cocô que podíamos limpar e mandamola para a roça, tudo voltou a florir. Até que mudamos. Sim, mudei daquela casa que criamos um lindo jardim de gérberas furtadas por passantes e palmeiras que refrescavam a fachada de tijolos vermelhos de nosso primeiro ninho familiar. Viemos para cá, para além de ganhar muitas roseiras de variadas cores que conhecia desde pequena — xodó de minha tiaavó —, um pé de jabuticaba selvagem e, que alegria!, uma frondosa amoreira que vale pelas duas de minha infância. Fico muito feliz por Deus ter me restituído a amoreira e que minha filha possa viver tudo que vivi, e até mais!
Chove e chove. Mas, no dourado estio, pretas amoras.
Aline Negosseki Teixeira. Haicai Para Crianças Sentidografias, 2010
Não resisto ir lá fora e encontrála carregadinha e esperando por mim. Todo aquele verde salpicado de pontos pretos e vermelhos me tentam e se pego da primeira quem diz que consigo parar? Volto a ser a mesma menina de oito, nove anos e só saio de lá quando ou elas me estão saindo pelas orelhas ou não alcanço mais as “pretonas” que ainda restam galhos acima, e ainda assim, trago a cumbuca cheia para geleia, suco... E como, apesar de esvaziar a mente nesses momentos, minha imaginação não para, fiquei pensando no sentido da felicidade ser se entregar às amoras. Mas, como muitas vezes também existem “crianças felizes” longe de um espaço para se comportar uma amoreira, também vale — eu atesto — colorir desenhos com lápis de cor, brincar de jóquempô, palavra secreta, comer rosquinhas de coco molhando no leite quentinho, olhar as estrelas no céu e dar a elas o nome de cada um dos filhos que não vamos ter, mas gostaríamos, se o mundo fosse diferente, ou apenas se entregar, deixandose encantar por um clássico infantil na tevê. Tudo isso é ter outra infância, mesmo que não possa ter a terapia das amoras.
Sobre a autora: Aline Negosseki Teixeira conta com seis livros publicados e é membrofundadora do Círculo de Escritores de São José dos Pinhais. Você pode saber mais sobre ela na Entrevista desta edição e no blog: www.alineteixeira.com
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POR EL BI EN DE L A HUMANI DAD Bar ak Obama l i ber ar a l os ci nco cubanos si t e gust a Dal t on L ui z Gandi n
www. f acebook. com/ dal t onl ui z. gandi n
ESPECIAL Fundação do Círculo de Escritores de São José dos Pinhais
Escritores Dalton Luiz Gandin, Almir Almeida, Cristina Pereyra e Aline Negosseki Teixeira após assinatura da Ata de fundação do Círculo de Escritores de São José dos Pinhais No dia 19 de junho de 2013 alguns escritores da cidade reuniram-se e fundaram o Círculo de Escritores de São José dos Pinhais. TEXTO: CRISTINA PEREYRA E ALINE NEGOSSEKI TEIXEIRA
Na noite do dia 19 de junho de 2013, alguns escritores da cidade reuniram-se para realizar o V Encontro de Escritores de São José dos Pinhais. Além da troca de experiências pessoais na área de literatura e uma descontraída conversa sobre atualidades, estiveram em pauta as ações para o próximo bimestre. Esse encontro marcou um novo momento na cena literária da cidade, pois desde então o grupo de amigos escritores passa a ser uma Associação formal: o Círculo de Escritores de São José dos Pinhais. A fundação desta Associação aconteceu no transcurso do V encontro e encontra-se registrada em ata. O Estatuto foi aprovado por unanimidade pelos membros fundadores. Entre os objetivos do Círculo de Escritores de São José dos Pinhais estão: a) auxiliar seus sócios no desenvolvimento de suas atividades literárias; 20 ETR RTE Jul ho 201 3
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b) promover a participação de seus sócios em manifestações literárias na cidade sede e, extraordinariamente, fora dela; c) fomentar a atividade literária na cidade; d) promover a integração de seus sócios com outras manifestações artísticas da cidade sede e, extraordinariamente, fora dela; e) organizar manifestações de caráter literário-cultural. A criação do Círculo é uma resposta às inquietações dos escritores, que muitas vezes se sentem sozinhos em seu labor em prol da literatura na cidade. O Círculo pretende ser mais que um elo de união entre os escritores, deseja ser uma ponte entre o leitor e o autor, e também uma via de comunicação com o Poder Público, que é o maior responsável pela organização das atividades culturais na cidade. Esta revista é uma das primeiras ações do Círculo para fomentar a cultura na cidade.
A história do Círculo Toda história tem um começo, não é mesmo? Pois a nossa também tem. Tudo começa com a coragem para fazer os sonhos acontecerem. Ou teria começado com o sonho? Talvez.
O sonho
Ele nasceu numa bela tarde de sol de um dia de inverno. Era sábado. Cada um de nós chegou trazendo nas mãos os calos de escrever e na mente as ideias. Vivíamos sós e isolados. Naquela tarde nos conhecemos, juntos tecemos sonhos que foram registrados no papel com dedos trêmulos de emoção. O eu de cada um dava espaço ao nós. Em julho de 2012, com o objetivo de subsidiar a construção do Plano Municipal de Cultura, foi realizado o Fórum Setorial de Cultura - Livro, Leitura e Literatura na Sede da Secretaria Municipal de Cultura, aberto a toda comunidade. Foi nesse evento que alguns dos escritores da cidade se conheceram, outros se reencontraram e todos compartilharam ideias e sonhos. Foram apresentadas propostas ao Poder Público, discutiu-se muitas possibilidades de incentivar a literatura, mas sempre com o olhar voltado para a participação do Município. Naquele momento, talvez pela circunstância em que se realizava, não conseguimos ter outro olhar. Emails trocados, contatos estabelecidos, cada um retomou o rumo de sua vida. Mas já não éramos os mesmos.
Do sonho ao projeto
As ideias daquele sábado foram muitas, grandes e pequenas, fáceis e difíceis, todas com o objetivo de levar a leitura ao povo de nossa cidade... muitas com o desejo de dar voz a nossas palavras. Então, era chegada a hora de peneirar as ideias, de unir esforços e dar vida a elas. Entre um e outro dia de desalento, prosseguimos. Algumas conversas por email, longas horas de reflexão... mais ideias no papel. Havia chegado o momento definitivo: a hora de realizar. Começou com uma pequena ação. No futuro, temos certeza, será um momento lembrado com carinho. O que plantamos, as próximas gerações irão colher. Estamos depositando a semente em solo fértil. Estaremos regando, e talvez até consigamos colher alguns frutos. Mas, certamente, os verdadeiros frutos, chegarão depois. Com a abertura de um blog demos início à existência dos ESCRITORES DE SÃO JOSÉ DOS PINHAIS como um conjunto de pessoas que desejam promover as letras em nossa cidade.
I Encontro de Escritores de SJP
No dia 9 de agosto, foi realizado o I Encontro de Escritores de São José dos Pinhais. O palco desse momento tão especial para a literatura da cidade foi a Biblioteca Pública Municipal Scharffenberg de Quadros. A sugestão de realizar encontros periódicos entre os escritores da cidade surgiu no Fórum Setorial de Cultura - Livro, Leitura e Literatura realizado em 21 de julho pela
Secretaria Municipal de Cultura. Depois disso alguns autores mantiveram contato entre si por email e decidiram organizar esse primeiro encontro. A proposta dos Encontros é articular ações conjuntas dos escritores da cidade, trocar experiências e confratenizar-se. Deste primeiro momento nasceu a ideia do blog e algumas outras que aos poucos foram sendo realizadas.
Aline Negosseki Teixeira e Cristina Pereyra Os encontros continuaram acontecendo, ainda que não com a frequência desejada. A vida cotidiana cobra seu preço, as dificuldades deste começo de jornada se fizeram sentir. Em 2012 houve apenas mais um encontro oficial, dia 13 de setembro.
Mostra Literária - Leitura no Parque
No dia 9 de dezembro, com a chancela da Secretaria Municipal de Educação, aconteceu o evento "Mostra Literária: Leitura no Parque." & Comemoração do Centenário de Nascimento de Helena Kolody. O dia estava nublado, o que parece ter desanimado um pouco as pessoas a comparecerem por talvez receio da chuva que caíra no dia anterior. No entanto, quem não foi perdeu... contos, causos, música, apresentações artísticas, e adaptações dramáticas com direito a Emília, Narizinho, Pedrinho e etc., sem falar na mostra literária de diferentes escolas da cidade, separadas por tendas e o lançamento do livro Recriando Histórias de São José dos Pinhais, produzido a partir de pesquisas, entrevistas, obras artísticas realizadas pelos alunos da rede pública municipal que, num material muito atraente, vivo, cheio de imagens e belos textos, conta não só a história da cidade, como fala dos sentimentos, expectativas e nostalgias de seus moradores. (O livro tem aquele cheirinho que só quem ama os livros compreende o efeito que provoca na gente!) "Havia uma tenda especial. Especial porque quem conta sou eu. A tenda dos autores de São José... Lá conheci pessoas muito legais, fãs como eu do mundo das letras, troquei figurinhas literárias com o Dalton, colega de versos, dediquei livros para pessoas que foram ao evento prestigiar as letras, e até mesmo passeadores do Parque São José que nem imaginavam que o evento estaria acontecendo e foram lá conferir. Jul ho 201 3
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Cada pedacinho de conversa, um pedacinho inestimável do tesouro que guardo na memória, no coração, tesouro esse que abunda mais a cada dia. As crianças que participaram de outras atrações ficaram muito entusiasmadas por conhecerem uma "autora de verdade". Eu me surpreendi em como eu sempre me surpreendo em ser considerada uma "autora de verdade". Até hoje ainda parece um sonho para "um dia, quando eu for escritora...", aquele tempo em que não sabia que todo mundo já nasce um escritor", conta Aline.
O primeiro encontro de 2013 aconteceu em fevereiro e nele começaram a ser desenhadas as ações que levaram à criação do Círculo. Em viagem de pesquisa para seus livros, a escritora Cristina Pereyra entrou em contato com escritores de San Fernando (Argentina) e conheceu um pouco do trabalho desenvolvido por eles em prol da literatura local. Algumas ações são semelhantes às que os escritores de São José dos Pinhais já faziam e a troca de experiências permitiu o intercâmbio cultural tão necessário para o desenvolvimento e aperfeiçoamento. Outras ações do grupo de San Fernando foram trazidas para discussão neste III Encontro e depois de adequadas e adaptadas à realidade local, começaram a ser postas em prática.
IV Encontro de Escritores de SJP
A pequena Raquel (filha da Aline) na tenda dos autores de São José dos Pinhais.
Mais tarde houve uma bela explanação da escritora Adélia Maria Woellner, que conviveu e esteve bem junto da tão sensível poetiza Helena Kolody, que muito frutificou entre os pinheirais desse planalto, homenageada do ano, na tenda esmerada e temática organizada pelo pessoal da Educação.
A doce Sarah, que se divertiu muito no evento, orgulhosa dos livros da mamãe Aline.
No dia 13 de maio, aconteceu mais um encontro dos escritores da cidade. A organização do encontro esteve outra vez a cargo das escritoras Aline Negosseki Teixeira e Cristina Pereyra. Novamente a Biblioteca Pública Municipal Scharffenberg de Quadros acolheu o encontro. Foi um fim de tarde produtivo, pois o encontro traçou as metas do grupo para o segundo semestre e algumas ações que estarão movimentando a cena literária da cidade em breve. "Esse encontro de escritores é muito importante para fomentar a produção literária da cidade, pois compartilhar experiências boas e ruins nos torna mais fortes e nos motiva a seguir em frente, pois não estamos sozinhos", disse Cristina Pereyra. "É importante a união dos autores para que todos cresçam. Eu estou tendo uma experiência maravilhosa com a publicação do romance 'Graciosa' no meu blog. O retorno dos leitores é muitas vezes emocionante e o alcance algumas vezes me surpreende, a cada dia mais leitores se somam e me fazem ter mais vontade de continuar contando a história", declarou Aline Negosseki Teixeira, que também adiantou que essa história formará uma trilogia. Neste encontro foi delineada a criação do Círculo de Escritores, ideia que vinha sendo gestada desde fevereiro. Com a definição de que havia chegado o momento de dar esse passo, as escritoras Aline Negosseki Teixeira e Cristina Pereyra aceitaram o desafio de conduzir os trâmites burocráticos e organizar o que seria necessário para efetivação da fundação do Círculo. Elas também ficaram incumbidas de visitar algumas livrarias para discutir a distribuição das obras dos autores de SJP. Estas visitas foram realizadas no final do mês de maio e resultaram em parceria imediata com as Livrarias Danúbio e Letra & Arte, em Curitiba, que já dispõem de exemplares dos nossos autores. No ano passado, a autora Cristina Pereyra já tinha firmado contrato de distribuição com as Livrarias Curitiba, e breve outros de nossos autores deverão somar-se a estas prateleiras.
O ano de 2012 terminou com algumas decepções, planos não cumpridos e expectativas frustradas. Mas também com novos sonhos, esperanças e determinação de fazer muito mais em 2013. Mesmo com poucas Conferência Municipal de Cultura - Reconvocação No dia 08 de junho de 2013 os escritores de São ações concretas, o ano de 2012 marcou o início do José dos Pinhais compareceram à Câmara dos movimento dos Escritores de São José dos Pinhais.
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Vereadores para assistir à Reconvocação da Conferência Municipal de Cultura de São José dos Pinhais: "Uma Política de Estado para a Cultura: Desafios do Sistema Nacional de Cultura." Estiveram presentes na Conferência o Sr. Prefeito, o Sr. Sec. de Cultura, vereadores e outra autoridades interessadas em dialogar democraticamente sobre os desafios e possíveis ações para o Sistema de Cultura em âmbito municipal, estadual e nacional. Após ao Fórum Setorial de Cultura, ocorrido em 2012, que resultou em várias ações como a exposição das carências e ideias na área de Leitura, Livro e Literatura, a criação dos Encontros dos Escritores de São José dos Pinhais, representando Literatura de São José dos Pinhais, foi eleita Delegada para a posterior etapa Estadual, que antecederá a 3ª Conferência Nacional de Cultura, a escritora Aline Negosseki Teixeira.
V Encontro de Escritores de SJP
Quase um ano depois de iniciar o movimento de unir os escritores da cidade, surge o seu primeiro fruto concreto: o Círculo de Escritores de São José dos Pinhais. O principal assunto da pauta deste encontro era a criação do Círculo, efetivada no decorrer do Encontro e registrada na Ata de Fundação. Para a gestão temporária e condução da primeira eleição da Mesa Diretiva foram eleitas Aline Negosseki Teixeira para o cargo de Presidente e Cristina Pereyra para o cargo de Secretária. Outro tema da pauta deste Encontro é esse que está diante dos seus olhos: a edição de uma Revista Digital de literatura e arte, que será editada trimestralmente pelo próprio Círculo. Esta é a nossa história, recente mas com muitos sonhos, projetos e lutas para conquistar um espaço entre os leitores.
Conselho Municipal de Cultura
Delegados eleitos na Conferência Municipal de Cultura Reconvocação para representar São José dos Pinhais Várias propostas na área de literatura têm sido estudadas, discutidas e redigidas nos Encontros dos Escritores de São José dos Pinhais, que acontecem na Biblioteca Pública Municipal Schaffenberg de Quadros, em frente à Matriz.
Espera-se que a partir deste mês de julho, o Círculo esteja oficialmente representado no CMC na pessoa de sua diretora, Aline Negosseki Teixeira. Na próxima reunião ela deverá ser eleita como suplente, tendo já protocolado essa intenção junto à Prefeitura Muncipal, que representa a do grupo. Aline esteve presente na reunião do mês de junho e apresentou aos membros do Conselho e ao Secretário Municipal de Cultura, Amarildo Rosa, além da trajetória e ações dos autores até o momento, os próximos eixos norteadores do trabalho do Círculo: fomentar a atividade literária na cidade e promover a integração dos seus membros nas manifestações artísticas da cidade. Todo o conjunto do discurso dos autores e, principalmente, a ideia de implantar oficinas de criação literária sensibilizou os presentes, que se mostraram tão entusiasmados com a proposta quanto o Círculo. Além disso, aguardamos as próximas reuniões dos escritores para que novas propostas sejam apresentadas e dar seguimento a estas, sempre buscando a promoção da literatura.
GEOLOGIA POÉTICA para Leopoldo Scherner
o poeta se deslocou e lá no firmamento mapeia os mais belos poemas Dalton Luiz Gandin
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Grito Calado Sonhava ser a brisa da noite para orvalhar seus cabelos, o vento para assanhá-los, as estrelas para serem admiradas pelo brilho do seu olhar. Sonhava ser o luar para com meu brilho tocar e sentir você, ser o sol para acordar-lhe todas as manhãs penetrando através do seu vitrô e aquecê-la. A chuva que desliza sobre seu corpo, ser como suas vestes que junto a você encontramse a todos os momentos, e como as flores com seus aromas e cores variadas eu amavalhe mesmo sem que você soubesse. Em uma noite calma sem estrelas, sem luar, junto a uma multidão você surgiu e meus sonhos, meus ideais, ficaram pra trás, junto de seus astros, vi tudo o que sonhei todas as esperanças como se fossem pétalas de rosas sopradas pelo vento no outono. Você de braços dados caminhava junto de seu amor perdido, junto à multidão, vagava junto a dor. Almir Almeida
e-book gratuito durante o mês de julho www.smashwords.com 24
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A Revolução Tecnológica e a Revolução Editorial
A forma como as pessoas se relacionam mudou. Não apenas na vida real, mas também no ambiente virtual proporcionado pela presença da Internet no cotidiano das pessoas. Assim, as relações entre o autor e o seu leitor também estão mudando. E as Editoras estão no meio do caminho entre ambos. Então, qual o papel delas nos dias de hoje?
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á 20 anos, quem controlava a produção literária eram as editoras. Estava nas mãos delas a publicação ou não de um livro. Ou seja, as editoras também controlavam o que a maior parte da população lia. Não havia outro caminho para chegar a um grande número de leitores que pelas mãos de uma editora.
Por muitos anos o sonho de todo escritor foi o de ter seu nome vinculado a uma editora. A ideia era de que só assim teria sucesso. E de certa forma era verdadeiro. Até a chegada da internet. A produção literária foi um dos campos alterados pela presença da internet nos lares de todo o mundo. E muito alterado. As relações entre autor e editora vem se transformando vertiginosamente nos últimos anos e em grande parte pelo poder de comunicação que a presença online proporciona aos autores, consagrados ou iniciantes.
A autopublicação foi a primeira forma de publicar um livro.
A autopublicação é mais antiga que o mercado editorial. As primeiras publicações foram realizadas pelos próprios autores, até que empresários viram nisso um mercado. Surgiram as editoras e todo o mercado ao redor delas. Autopublicação passou a ser considerado sinônimo de fracasso e má qualidade. O que nunca foi totalmente certo. Pois bons autores não conseguiram espaço nas editoras um clube fechado e voltado para o lucro de curto prazo e autopublicaram suas obras.
Na publicação tradicional via editora e impresso todo o risco da operação ficava por conta da editora. O autor investia seu tempo escrevendo. A editora investia dinheiro em um livro antes de vendêlo: correção, pré
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produção gráfica, impressão, distribuição e recolhimento, caso não fosse vendido. Nesta lógica, é natural que não ousassem, que buscassem materiais com venda quase certa e poucas vezes inovassem. Os caprichos volúveis do mercado são difíceis de prever. A autopublicação envolvia exatamente os mesmos custos da publicação editorial. E como era feita em escala menor, os custos unitários eram muito mais altos. O trabalho do autor empacava no póspublicação: dificuldade em chegar aos pontos de venda pelo preconceito , falta de recursos para o marketing e distribuição de pequeno alcance. Era comum vermos autores autopublicados com estoques encalhados de livros em sua casa. Afinal, havia a 'tiragem mínima', que de mínima não tinha muita coisa ao menos na perspectiva do empreendedor individual. Essa é a palavra que define o autor autopublicado na atualidade: empreendedor individual. A nova visão de mercado, consequência da falência de mercados tradicionais e necessidade de novos modelos, trouxe para o centro das discussões essa figura individual em vários setores da economia. Inclusive o da literatura.
Hoje, o autor está muito mais próximo de seu leitor.
Hoje o autor não precisa de para publicar. Portanto ele editora. O desenvolvimento globalização de mercados Internet possibilitou isso.
capital de risco não precisa da tecnológico e a facilitada pela
As ferramentas do façavocêmesmo na área da literatura estão disponíveis gratuitamente na Internet. O autor tem a liberdade de escolher quantos exemplares deseja imprimir e paga apenas por eles. Mesmo que seja um só. O caminho para ser um autor publicado está aberto. Porém isso não significa ser um autor lido. Aqui entra o segundo passo do faça vocêmesmo: a póspublicação. O marketing e a distribuição. E ambos são amplamente facilitados pela Internet. A presença de autores na rede (facebook, twitter, tumblr, blogs, sites, entre outros) aumenta dia a dia. E não apenas para fazer propaganda de seus livros, mas também para conversar com os leitores. Esse é o grande diferencial do modelo antigo de publicação. E nesse campo ainda vemos uma grande diferença entre os autores 'de editoras' e os 'autopublicados'. Entre os autores que publicam com editoras, é mais comum que tenham sites para apresentar seu trabalho e pouco participem nas mídias sociais. Já nos autores autopublicados, a situação é inversa. Possuem blogs onde publicam textos de sua autoria para leitura online, apresentam trabalhos de outros autores que leram e gostaram e artigos de interesse geral, além de contarem um pouco do seu diaadia.
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Também são mais ativos nas mídias sociais, tornou a maior ferramenta do autor para conversando constantemente com seus empreender sozinho e alçar voos na direção leitores. que desejar. Os ebooks são o carrochefe dos autores As consequências destes autopublicados e, muitas modelos distintos de vezes, o maior elo entre presença no ciberespaço só autor e leitor. A forte o tempo irá mostrar, mas é presença online destes certo que os autores autores aliada à vida autopublicados estão muito online de seus leitores os mais próximos do público. aproxima e une. O novo E no centro do furacão de modelo de relações sociais todas estas mudanças está o maior vilão anti está sendo transposto também para as editoras: o ebook. Por suas características de relações comerciais, mas com uma nova produção e distribuição de baixo custo, ele se roupagem, que as torna mais pessoais.
Os ebooks modificaram o mercado editorial e o continuarão fazendo por algum tempo.
ANDANDO PELA PRAIA Um poema de estrela do mar. Poema de areia esperando as palavras brotarem dos nossos pés. Um poema de fogos no céu do novo milênio. Poema de homem, mulher e criança. Um poema de pedra, alga e peixe. Poema de osso, carne e sangue. Um poema vitimado pelas marés da morte. Poema de versos vazios para enchê-los com a vida.
Dalton Luiz Gandin
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LEITURA
Ele nem ergueu os olhos para ela. Não precisava ver seu rosto para saber que ela estava furiosa. Muito furiosa. A intensidade da fúria de sua esposa podia ser medida pelo som do salto de seus sapatos batendo no chão. Sofia olhava fixamente para frente, os olhos verdes, ocultos pelas lentes escuras dos óculos de sol, soltavam faíscas. O corpo rígido mantinha distância do seu acompanhante. — Em que tipo de confusão você está nos metendo? — ela perguntou, belicosa. — Ora, querida, um bom restaurante sempre é movimentado. Ela varreu o grande estacionamento com o olhar. De cada carro, desciam três, quatro, cinco mulheres. Um ônibus estacionou e desceram... mulheres! Definitivamente, isso não era normal. — Beretta, o que isso significa? O que você está aprontando? Ele sentiu o olhar de Sofia sobre si, mas continuava sem coragem de fitá-la. Assim como ela, Beretta se dera conta de que havia algo acontecendo ali, mas não tinha a mínima ideia do que seria. — Eu não estou aprontando nada, apenas trouxe você ao mais famoso restaurante italiano da cidade — defendeu-se Beretta, com o olhar fixo nos quadris ondulantes dentro de um jeans apertado que via à sua frente. Vendo a expressão de seu marido, Sofia acompanhou-lhe o olhar. Imediatamente, ele se curvou por causa de uma forte dor nas costelas. — Você podia ser mais delicada — queixou-se Beretta. — Delicadeza é um adjetivo que sempre esteve longe, muito longe, de mim — replicou Sofia, sem tirar da mulher um olhar mortal. — E você sabia muito bem disso antes de casar. — Pensei que o amor fosse te suavizar — disse ele. — Tolas ilusões sobre o amor — retrucou ela. — Também tive as minhas. Pensei que você fosse se tornar um homem menos sem-vergonha. Ele ficou quieto. Se tentasse continuar aquela discussão, ouviria coisas que não queria lembrar. Continuaram atravessando o estacionamento em silêncio, acompanhando o fluxo de pessoas. Quando se aproximavam de uma escada que conduzia ao prédio, ela parou. — Duvido que isso aqui seja um restaurante — declarou Sofia. — Viemos ao lugar errado. — Claro que é um restaurante, aonde todas estas pessoas estariam indo na hora do almoço se não fosse um restaurante? — ele começava a se irritar com ela. Sofia tinha que concordar com o argumento dele, mas ainda não estava totalmente convencida e sentiu necessidade de rebatê-lo. — É grande demais para ser um restaurante. — Você está pensando assim porque está acostumada com a Europa, onde tudo é apertado. Estamos no Brasil, Sofia, lembre-se que Silva sempre disse que aqui os lugares eram espaçosos — justificou Beretta — Tudo no Brasil é grande. — Tudo? — perguntou ela, com um sorriso travesso nos lábios. — Sim. Veja o tamanho do Silva — disse ele com inocência. 28
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— Pois era exatamente nos homens que eu estava pensando — disse ela — Imaginando se tudo é grande. — Sofia! — ele a fitou, furioso. — Não permito que tenha esse tipo de pensamento, e muito menos, ao meu lado! Ela gargalhou. — Está com medo? — perguntou Sofia com um sorriso provocante. — Esqueça essa conversa — rosnou ele, tomando-a pelo braço para levá-la à entrada. — Continuo com a opinião de que esse lugar não é um restaurante — insistiu Sofia. — Porque tanto movimento num sábado? — Isso daí, não sei — Beretta deu de ombros. — Talvez o costume local seja comer fora no sábado, e não no domingo. — É grande demais até para o Brasil. Nem em São Paulo tem um restaurante tão grande. Isso daqui não é um restaurante — teimou ela. — Esse é o maior restaurante da América, meu amor. Sofia arregalou os olhos, surpresa. Porém, não se deu por vencida. — Diz isso só para tentar me convencer — falou ela. — Acabou de inventar essa lorota! — Claro que não! — ofendeu-se Beretta. — Está no Guiness Book, pode ler para comprovar. Ou pergunte lá dentro para um garçom. A discussão era sussurrada, mas as pessoas ao redor sentiam o clima tenso e percebiam a nada gentil troca de olhares e sorrisos do casal. Sofia e Beretta acompanhavam a fila escada acima. Já estavam na metade dela quando ele se deu conta de que todas as pessoas tinham um convite em mãos e o entregavam para uma mulher que estava na metade do segundo lance de escadas. Logo depois dela, já no patamar de entrada para o salão, haviam dois casais que cumprimentavam todos. Ele gelou, se precisavam de convite para entrar, e não tinham, seria formada uma confusão. Sofia não o perdoaria se isso acontecesse hoje. Precisava pensar em uma saída. E rápido. — Parece nervoso, meu amor — desta vez, Sofia falou em voz alta, com uma entonação suave, carregada de cinismo. Pelo menos para os ouvidos dele, que conheciam muito bem todas as inflexões da voz daquela mulher. Ele nem tentou respondê-la, sua voz o delataria. A mulher acabara de pegar os convites das duas mulheres que estavam à frente deles, eram os próximos da fila e ele ainda não encontrara a solução. A mulher se virou para falar com a mulher no patamar de entrada e o acompanhante daquela, após cumprimentar a última mulher que entregara o convite, olhou, sorrindo, na direção deles. Era tudo que Beretta precisava. Com um puxão, trouxe Sofia consigo e antes que a mulher dos convites se virasse de volta para a fila, eles já estavam diante do primeiro casal a ser cumprimentado. Ele usou todo o cavalheirismo que tinha aprendido com o capo e dedicou um sedutor sorriso à dama antes de beijar sua mão. A mulher ficou surpresa, mas ele ignorou a reação e ocupou-se de cumprimentar o homem, provavelmente marido dela. Sofia sorriu sem-graça para a mulher ao cumprimentá-la. Beretta cumprimentou o casal seguinte da mesma maneira, porém tanto o homem quanto a mulher eram mais descontraídos, e ela pareceu lisonjeada com o cavalheirismo antiquado dele. — Você nos meteu em uma confusão, e nem tente negar — sibilou Sofia. — Não tem confusão nenhuma — retrucou ele — estamos no Brasil e aqui as coisas são diferentes da Europa. — É a terceira cidade do Brasil que visitamos, e não vi nada parecido nas outras. — Lembre-se que Silva sempre diz que o Sul parece outro país. — Ah! Na hora de tentar me convencer de que esse monstro que mais parece um centro de convenções é um restaurante, era Brasil; agora que precisa disfarçar sua trapalhada, já é outro país. Eu não sou boba, Beretta, e não admito que me tomem por tal — advertiu Sofia. — Não estou lhe fazendo de boba — replicou ele, ofendido. Quando ele começava a se impacientar com aquela demora na entrada do salão do restaurante, a fila voltou a andar. Beretta viu duas mulheres ali no hall e seu coração falhou uma batida. Uma delas sorriu amistosamente para o casal. Jul ho 201 3
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— Sejam bem vindos, guardem esse número para o sorteio. Sofia pegou os dois bilhetinhos que a mulher estendia e continuou caminhando com o marido para dentro do salão. Ambos olharam surpresos para o imenso lugar apinhado de mesas e pessoas, entre as quais garçons circulavam com bandejas repletas de bebidas. Agora não havia como Sofia discutir, não restava mais dúvida de que era um restaurante. Quatro telões estavam instalados no enorme salão, havia no centro uma grande mesa com plaquinhas de "reservado". Grandes, todas as mesas eram. Nada daquela tradicionais mesas para quatro ou seis pessoas, somente mesas enormes, vinte a trinta pessoas, calculou Sofia. — Sorte sua que não havia me prometido um almoço romântico — ironizou Sofia. Ele a fitou aborrecido, mas não retrucou. Levando-a pelo braço, procurou uma mesa vazia e sentaram-se os dois, frente a frente numa ponta. Logo o garçom depositou duas garrafas de coca-cola diante deles e se foi. — Por que não aproveitou e pediu a comida? — provocou Sofia. — Estou com fome, querido. — Achei mais conveniente ver como a coisa funciona por aqui — respondeu ele sem perceber, ou fingindo não perceber, a provocação dela. — Ninguém está comendo ainda, talvez seja melhor esperar. Ela soltou o ar dos pulmões com força, mostrando sua impaciência. Com gestos galantes, ele serviu o refrigerante no copo dela e depois no seu. Pousou a garrafa na mesa com uma suavidade que não fazia parte de sua personalidade e ergueu o copo no ar. — Vamos brindar? — convidou ele com a voz macia, que fez Sofia arrepiar-se de cima a baixo. — Com refrigerante? — ela escarneceu. — Você está descendo ao último nível do ridículo hoje! Ela cruzou os braços sobre o peito e lançou-lhe um olhar desafiante. Beretta não se intimidou, conhecia aquela mulher, descobrira seus mais profundos segredos e entregara os seus a ela. Pertenciam-se, conheciam-se. Ele manteve o olhar sedutor e a voz aveludada. — Estamos em lua-de-mel, nada é ridículo — ele falou, inclinando o copo para ela, numa repetição do convite que fizera verbalmente antes. — Essa é a primeira coisa ridícula. Estamos casados há um ano, a lua-de-mel já se foi. Aconteceu lá na Sicília, e antes do casamento — ela estreitou os olhos de forma perigosa. — Ou já se esqueceu?
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Algumas pessoas começaram a ocupar as cadeiras vazias a partir do outro extremo da mesa, mas eles ignoraram sua presença. — Jamais esquecerei os momentos ao seu lado — retrucou Beretta, adocicando ainda mais a voz. — Já faz um ano que nos casamos? — quanto mais tempo a mantivesse ocupada discutindo, menos seria importunado pela demora da comida. — Mais ou menos isso. Nem lembro direito que dia foi. Só tenho certeza que foi no meio daquela confusão com os franceses e que o capo nem deixou a gente sair do reduto para comemorar. Eles estavam completamente alheios ao que acontecia ao seu redor, imersos na discussão boba que travavam, foram pegos de surpresa pela salva de palmas. Ele acompanhou a multidão, ela manteve os braços cruzados e lançou um olhar vitorioso sobre ele. — Ainda vai argumentar que isso é um restaurante? Desde quando as pessoas irrompem em palmas nos restaurantes? Ele suspendeu a respiração enquanto seu cérebro trabalhava forjando uma boa explicação. — Talvez seja um costume local, ao invés de fazer uma oração as pessoas aplaudem como forma de agradecimento pelo alimento. Sofia voltou a exibir um sorriso vitorioso no rosto e virou-se para a mulher que sentara ao seu lado, tocando-lhe o braço levemente. — Por que estavam aplaudindo? — perguntou amavelmente. Beretta pensou que ela era um doce de pessoa quando o queria e isso o fez sorrir largamente. A mulher se virou para Sofia com um ar constrangido. — Concordo que o discurso do Prefeito foi ruim e não temos muito o porque aplaudi-lo, mas seria mal-educado não fazê-lo — desculpou-se a mulher. Sofia e Beretta se entreolharam assustados, as mesmas ideias passando por ambas as mentes: discurso de prefeito... aquilo era um comício? Reunião de partido? Encontro subversivo? Outro homem começou a falar e Sofia já sentia ganas de derrubar o copo só para ver a coca-cola cair no colo de Beretta. — Restaurante?! Olha bem no que nos meteu, homem! Apesar de não ser mais que um murmúrio, a mensagem de Sofia estava carregada de raiva palpável. — Restaurante, sim — teimou ele. — Olhe lá a comida! Ela virou a cabeça na direção em que ele fizera um gesto aparentemente displicente e viu garçons com travessas de comidas. — Finalmente! Meu estômago já ia fazer um protesto alto — Sofia sorria para o garçom que se aproximava. — Não precisa sorrir desse jeito para um estranho — repreendeu-a Beretta. — Não estou sorrindo para o garçom, e sim para a comida. — Mas o rapaz vai pensar que é para ele. Ela deu de ombros. O garçom se aproximou e depositou à frente deles uma travessa de radicchio com bacon. O olhar guloso de Sofia se desfez. — Isso aqui é um restaurante vegetariano?! — Shhhh! Não fale tão alto, querida. Alguém pode lhe ouvir. — Há barulho demais aqui, ninguém vai nos ouvir. É vegetariano? — Não, eu já lhe disse que é um restaurante italiano. Ela não lhe respondeu nada, pois de um lado veio uma travessa de polenta frita e de outro, uma de risoto. Sofia ainda estava ocupada com o primeiro pedaço de polenta quando chegaram os fígados fritos, o frango à passarinho e a escarola. Por alguns momentos ela ignorou o marido, ocupada em servir-se de todos aqueles pratos apetitosos, mas logo sua rabugice voltou. — Espero que essa comida valha o incômodo que está me fazendo passar — ela resmungou. Ele apenas sorriu. Logo os garçons começaram a oferecer lasanha, nhoque, frango prensado, espagueti e caneloni, o que fez Sofia esquecer por completo seu marido. Vieram as Jul ho 201 3
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jarras de vinho, e isso pôs fim a qualquer possibilidade de discussão entre eles. Comeram em silêncio. Voltaram a falar nos microfones, mas nenhum dos dois prestou atenção. O vinho amansara a fera que habitava nela, e agora trocavam olhares apaixonados. — Eu lhe prometi que esse era um excelente restaurante — falou ele, acariciando a mão dela. Sofia retesou um pouco o corpo, o efeito do vinho não era total. — Já comi coisas melhores — retrucou. — É tudo muito simples. — Sim, um restaurante italiano, sem frescura na comida. Bem feita e gostosa. Quase como comer na casa de nossas avós. A mulher ao lado de Sofia tocou seu braço para obter sua atenção. — É o número de vocês — falou, apontando um daqueles papéis que haviam recebido na entrada. — Como? — perguntou Sofia, confusa. Ficou sem resposta, a mulher gritava histericamente e agitava os braços freneticamente. Então voltou sua atenção para eles outra vez. — Vocês ganharam o prêmio, vai lá receber — explicou e incentivou a desconhecida. Sofia fuzilou o marido com o olhar. — Você nos meteu nessa confusão, vai lá. Vai buscar o prêmio. A voz dela tinha um tom de desafio que ele não ignorou. Furioso, pegou o bilhetinho numerado e dirigiu-se para o homem do microfone, ao lado do qual um outro estava parado, com um enorme buquê de rosas vermelhas. Beretta se aproximou e os dois o fitaram desconcertados. O homem do microfone logo se recompôs. — Sua esposa ou namorada ficará muito feliz em receber estas flores. Beretta sorriu, Sofia não costumava ficar feliz com flores. Preferia uma arma leve e precisa. Pegou o buquê e atravessou o salão, de volta ao seu lugar, segurando-o como um troféu. Parou ao lado da cadeira de Sofia, colocou o joelho esquerdo no chão e ofereceu-lhe as flores. — Pra que isso? — ela perguntou, furiosa. — Hoje é nosso aniversário de casamento, Sofia. Faz um ano que eu me tornei o homem mais feliz do mundo. — Largue mão de ser ridículo! Esse comportamento não combina com você! Ela se pôs de pé, pegou o buquê bruscamente e saiu, puxando o marido pela mão. Beretta, temendo um escândalo, só se atreveu a falar com ela quando estavam no estacionamento, sozinhos. — Por que agiu assim? Eu queria comemorar esse dia, e você estragou tudo. Ela parou bruscamente e se virou para ele. — Você sabe que eu não gosto de ficar emocionada na frente dos outros — ela falou ainda furiosa. — Odeio essas coisas malucas que você faz para me expor. — Ninguém estava prestando atenção em nós — defendeu-se ele. — Estavam sim, várias pessoas. Eu não gosto disso. — Hmpf! As mulheres vivem reclamando que os homens não lembram das datas importantes do relacionamento, quando existe um que lembra, é humilhado desse jeito! Ela riu da raiva infantil dele. — O problema, é que eu tinha em mente uma comemoração mais íntima — ela falou, ficando na ponta No coração do Outback dos pés e beijando-o no canto da boca. — Mas você australiano... uma ainda está em tempo de não me decepcionar. O sorriso dele foi tão malicioso quanto o dela. promessa, um segredo e um grande amor. Beretta a segurou contra o próprio corpo de forma possessiva. 32
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— Tenho horas o suficiente para fazê-la arrepender-se desta provocação — disse ele, arrebatando-lhe os lábios em um beijo selvagem. Logo depois deixavam o estacionamento. Na saída, ela o fez parar. — Espere um pouco, quero ver o nome deste lugar — disse ela, olhando atentamente para a placa do restaurante. — Novo Madalosso... o que aconteceu com o velho? — Está ali em frente, meu amor — explicou Beretta, apontando a placa do outro lado da rua onde se lia Velho Madalosso. — Ah! Pensei que algum capo ensandecido o tivesse posto abaixo procurando inimigos — falou ela, acomodando-se no banco do acompanhante. Seguiram para o hotel, onde fizeram uma comemoração mais íntima do primeiro ano de casados. Nunca se sabe se no ano seguinte ainda haverá o que comemorar...
Sobre a autora: Cristina Pereyra já publicou mais de dez livros, possui edições em português e também em espanhol. Ela é membro-fundadora do Círculo de Escritores de São José dos Pinhais e da Unión Latinoamericana de Escritoras del Romance. Trabalha como professora em escolas públicas há mais de 20 anos.
Que tal preencher estas prateleiras com as obras dos autores de São José dos Pinhais?
Visite o blog e conheça os autores e suas obras: http://escritoressjp.blogspot.com.br
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CRIANÇAS E LIVROS
Crianças que não gostam de ler, de quem é a culpa? Que muitas crianças não gostam de ler, todo mundo sabe, mas por quê?
O que não fazer com um futuro leitor?
Claro que não há uma única resposta, afinal cada Ler é um direito, não um dever. E assim deve pessoa é única em seus gostos e preferências, ser apresentado às crianças. O adulto deve mas certamente há alguns motivos mostrar para elas que ao ler se comuns a estas crianças. Questionar a criança alcança satisfação. A leitura deve ser uma imposição. Frequentemente a televisão, o sobre a leitura quebra jamais Isso nos leva a outro ponto: para vídeo-game e o computador são que ler traz satisfação é considerados os vilões desta o encanto, a magia. mostrar preciso senti-la. Não será um situação. Sem dúvidas há uma promotor de leitura quem não grande parte de 'culpa' nesses veículos pela falta gosta de ler, quem não sente o 'vírus' da leitura de leitura em nossas crianças. Para muitos dos dentro de si. pequenos, os livros são menos atrativos que o trio acima, e obviamente que eles buscam o que Ler -com prazer- para uma criança é uma lhes dá mais satisfação. Atitude saudável. Ser maneira efetiva de despertar sua vocação para a feliz sempre é bom, fazer o que se gosta, leitura. Para a criança, muitas vezes a leitura também. demanda um grande esforço e por isso lhe é mais prazeroso escutar um adulto ler para ela. Descoberta a satisfação da leitura, ela buscará aprimorar sua habilidade de leitura com o objetivo de poder encontrar a satisfação mesmo quando o adulto não tenha tempo para ler para ela.
Leitura deve ser desejo. Sempre.
Por que os livros não encantam as crianças? Isso é uma responsabilidade dos adultos.
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Achou uma afirmação pesada demais? Mas é a pura verdade. É papel dos adultos apresentar o mundo às crianças, e depende da visão que eles transmitem o olhar que a criança terá sobre algo. O mesmo se dá na questão ler. Pais e professores, no afã de querer ver as crianças lendo, cometem erros. E o tiro sai pela culatra.
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Leitura com prazer não é necessariamente silenciosa. A prática de ler para a criança mostra para ela o encanto sonoro, a harmonia das palavras, tão presente na poesia. Leitura breve - se comparada a narrativas - e encantadora, a poesia pode ser a porta de entrada para o mundo da literatura. E o prazer de ouvir o ritmo da poesia deve ser permitido à criança, ou seja: ela pode ler em voz alta. Difícil de aceitar para uma geração que foi educada para a leitura silenciosa, mas é a pura verdade. Desobrigar de ter que contar o que leu. Quer saber o que está escrito no livro? Leia! Questionar a criança sobre a leitura quebra o encanto, a magia. Se ela quiser contar, escute. Se quiser guardar silêncio, respeite-a. Não a faça sentir-se em uma prova oral. Você gostava delas?
CRIANÇAS E LIVROS
Os clássicos não são uma obrigação. Os livros clássicos que encantaram outras gerações, talvez não encantem a esta. Talvez sim. Deixe que a criança decida se quer lê-los ou não. Você acha que é preciso conhecê-los para ter um bom nível cultural? Espere a criança crescer e ter maturidade para compreender esse ponto de vista e então discuta isso, argumente a favor de sua visão e seja o bastante convincente para que ele deseje ler os clássicos. Leitura deve ser desejo. Sempre.
Ler não pode ser uma obrigação. Nunca condicione terminar uma leitura para fazer outra coisa. Ler precisa ser prazer. Quando acaba o prazer, é hora de parar de ler. Pode ser na primeira página, pode ser na última. Isso depende do livro, do leitor e da interação entre os dois. Estas regras garantem a formação de um leitor? Não, mas indicam um caminho.
Era uma vez um livro que encontrou uma criança. Tão feliz ele ficou que se abriu em sorrisos, mostrando-lhe suas páginas coloridas. A criança ficou tão encantada com a sua beleza que mergulhou naquele universo de imagens e letras e nunca mais saiu.
Biblioteca Pública Municipal Scharffemberg de Quadros
Horário da biblioteca: 2ª a 6ª das 9h às 1 8h Jul ho 201 3
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Poema Escolhido por Cristina Pereyra
Tragédia no lar
Castro Alves
Na Senzala, úmida, estreita, Brilha a chama da candeia, No sapé se esgueira o vento. E a luz da fogueira ateia.
Junto ao fogo, uma africana, Sentada, o filho embalando, Vai lentamente cantando Uma tirana indolente, Repassada de aflição. E o menino ri contente... Mas treme e grita gelado, Se nas palhas do telhado Ruge o vento do sertão.
Se o canto pára um momento, Chora a criança imprudente ... Mas continua a cantiga ... E ri sem ver o tormento Daquele amargo cantar. Ai! triste, que enxugas rindo Os prantos que vão caindo Do fundo, materno olhar, E nas mãozinhas brilhantes Agitas como diamantes Os prantos do seu pensar ...
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E voz como um soluço lacerante Continua a cantar:
"Eu sou como a garça triste "Que mora à beira do rio, "As orvalhadas da noite "Me fazem tremer de frio.
"Me fazem tremer de frio "Como os juncos da lagoa; "Feliz da araponga errante "Que é livre, que livre voa.
"Que é livre, que livre voa "Para as bandas do seu ninho, "E nas braúnas à tarde "Canta longe do caminho.
"Canta longe do caminho. "Por onde o vaqueiro trilha, "Se quer descansar as asas "Tem a palmeira, a baunilha.
"Tem a palmeira, a baunilha, "Tem o brejo, a lavadeira, "Tem as campinas, as flores, "Tem a relva, a trepadeira,
"Tem a relva, a trepadeira, "Todas têm os seus amores, "Eu não tenho mãe nem filhos, "Nem irmão, nem lar, nem flores".
A cantiga cessou. . . Vinha da estrada A trote largo, linda cavalhada De estranho viajor, Na porta da fazenda eles paravam, Das mulas boleadas apeavam E batiam na porta do senhor.
Ser mãe é um crime, ter um filho roubo! Amálo uma loucura! Alma de lodo, Para ti não há luz. Tens a noite no corpo, a noite na alma, Pedra que a humanidade pisa calma, — Cristo que verga à cruz! Na hipérbole do ousado cataclisma Um dia Deus morreu... fuzila um prisma Do Calvário ao Tabor! Viuse então de Palmira os pétreos ossos, De Babel o cadáver de destroços Mais lívidos de horror. Era o relampejar da liberdade Nas nuvens do chorar da humanidade, Ou sarça do Sinai, — Relâmpagos que ferem de desmaios... Revoluções, vós deles sois os raios, Escravos, esperai! ... ..................................................................
Figuras pelo sol tisnadas, lúbricas, Sorrisos sensuais, sinistro olhar, Os bigodes retorcidos, O cigarro a fumegar, O rebenque prateado Do pulso dependurado, Largas chilenas luzidas, Que vão tinindo no chão, E as garruchas embebidas No bordado cinturão. A porta da fazenda foi aberta; Entraram no salão. Por que tremes mulher? A noite é calma, Um bulício remoto agita a palma Do vasto coqueiral. Tem pérolas o rio, a noite lumes, A mata sombras, o sertão perfumes, Murmúrio o bananal. Por que tremes, mulher? Que estranho crime, Que remorso cruel assim te oprime E te curva a cerviz? O que nas dobras do vestido ocultas? É um roubo talvez que aí sepultas? É seu filho ... Infeliz! ...
Leitor, se não tens desprezo De vir descer às senzalas, Trocar tapetes e salas Por um alcouce cruel, Que o teu vestido bordado Vem comigo, mas ... cuidado ... Não fique no chão manchado, No chão do imundo bordel.
Não venhas tu que achas triste Às vezes a própria festa. Tu, grande, que nunca ouviste Senão gemidos da orquestra Por que despertar tu'alma, Em sedas adormecida, Esta excrescência da vida Que ocultas com tanto esmero? E o coração tredo lodo, Fezes d'ânfora doirada Negra serpe, que enraivada, Morde a cauda, morde o dorso E sangra às vezes piedade, E sangra às vezes remorso?...
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Não venham esses que negam A esmola ao leproso, ao pobre. A luva branca do nobre Oh! senhores, não mancheis... Os pés lá pisam em lama, Porém as frontes são puras Mas vós nas faces impuras Tendes lodo, e pus nos pés.
Porém vós, que no lixo do oceano A pérola de luz ides buscar, Mergulhadores deste pego insano Da sociedade, deste tredo mar. Vinde ver como rasgamse as entranhas De uma raça de novos Prometeus, Ai! vamos ver guilhotinadas almas Da senzala nos vivos mausoléus.
— Escrava, dáme teu filho! Senhores, idelo ver: É forte, de uma raça bem provada, Havemos tudo fazer.
Assim dizia o fazendeiro, rindo, E agitava o chicote... A mãe que ouvia Imóvel, pasma, doida, sem razão! À Virgem Santa pedia Com prantos por oração; E os olhos no ar erguia Que a voz não podia, não.
— Dáme teu filho! repetiu fremente o senhor, de sobr'olho carregado. — Impossível!... — Que dizes, miserável?! — Perdão, senhor! perdão! meu filho dorme... Inda há pouco o embalei, pobre inocente, Que nem sequer pressente Que ides... — Sim, que o vou vender! — Vender?!. . . Vender meu filho?!
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Senhor, por piedade, não Vós sois bom antes do peito Me arranqueis o coração! Por piedade, mataime! Oh! É impossível Que me roubem da vida o único bem! Apenas sabe rir é tão pequeno! Inda não sabe me chamar? Também Senhor, vós tendes filhos... quem não tem?
Se alguém quisesse os vender Havíeis muito chorar Havíeis muito gemer, Diríeis a rir — Perdão?! Deixai meu filho... arrancaime Antes a alma e o coração!
— Calate miserável! Meus senhores, O escravo podeis ver ...
E a mãe em pranto aos pés dos mercadores Atirouse a gemer. — Senhores! basta a desgraça De não ter pátria nem lar, De ter honra e ser vendida De ter alma e nunca amar!
Deixai à noite que chora Que espere ao menos a aurora, Ao ramo seco uma flor; Deixai o pássaro ao ninho, Deixai à mãe o filhinho, Deixai à desgraça o amor.
Meu filho éme a sombra amiga Neste deserto cruel!... Flor de inocência e candura. Favo de amor e de mel!
Seu riso é minha alvorada, Sua lágrima doirada Minha estrela, minha luz! É da vida o único brilho Meu filho! é mais... é meu filho Deixaimo em nome da Cruz!...
Porém nada comove homens de pedra, Sepulcros onde é morto o coração. A criança do berço eilos arrancam Que os bracinhos estende e chora em vão!
Mudouse a cena. Já vistes Bramir na mata o jaguar, E no furor desmedido Saltar, raivando atrevido. O ramo, o tronco estalar, Morder os cães que o morderam... De vítima feita algoz, Em sangue e horror envolvido Terrível, bravo, feroz? Assim a escrava da criança ao grito Destemida saltou, E a turba dos senhores aterrada Ante ela recuou.
— Nem mais um passo, cobardes! Nem mais um passo! ladrões! Se os outros roubam as bolsas, Vós roubais os corações! ...
Entram três negros possantes, Brilham punhais traiçoeiros... Rolam por terra os primeiros Da morte nas contorções.
Um momento depois a cavalgada Levava a trote largo pela estrada A criança a chorar. Na fazenda o azorrague então se ouvia E aos golpes uma doida respondia Com frio gargalhar! ...
O poema “Tragédia no Lar” foi publicado postumamente, em 1883, em seu livro Os Escravos, uma compilação de poemas de cunho abolicionista.
Escravos sofrendo castigos domésticos. Johann Moritz Rugendas, 1830.
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Se você leu "Por Falar em Disputa..." certamente já se imaginou em Cafeara, caminhando de mãos dadas com o seu amor pela avenida principal e parando para tomar um sorvete. A pequena cidade do norte do Paraná que inspirou o romance de Aline Negosseki Teixeira é real, e também doce e encantadora como o livro sugere. Você está convidado a conhecer um pouco mais de Cafeara, siga comigo pela PR-535.
Um pouco de história Seu nome é uma homenagem ao CAFÉ, que se não foi a primeira riqueza da região, foi o que trouxe a riqueza e o progresso que criaram as condições para a instalação oficial do município em 19 de novembro de 1955, ainda que a lei que o criou seja de 26 de novembro de 1954. O povoado surgira em 1937, com o nome de Vila de Guairacá pela concessão da área pelo Estado ao Dr. Manoel Firmino de Almeida, engenheiro civil, natural da Bahia. Eram 50.000 hectares, dos quais 31.460 foram demarcados para o povoado. Para quem não está acostumado à história da colonização do Estado do Paraná, explico que essa prática era comum desde o tempo do Império, e que
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foi dessa forma que surgiram muitas cidades no norte paranaense que hoje são exemplos de prosperidade e progresso na atividade agropecuária e na agroindústria. No início da década de 40 do século XX chegaram os primeiros colonizadores oriundos de Minas Gerais, Nordeste e São Paulo. De São Paulo vieram muitos descendentes de italianos. A primeira atividade dos pioneiros foi, como em tantos outros lugares, a extração da madeira. Era preciso derrubar as matas para começar a cultivar os campos. Parece uma realidade tão distante no tempo... mas não é, o ciclo da história se repete. Consequência desta necessidade, surgiram as serrarias. Parte da madeira era aproveitada na construção de casas e o excedente
processado para ser vendido por um valor maior do que as toras brutas. No início de 1947, surge o 'Cruzeiro' diante da capela de Santa Luzia. Em outubro de 1949, o povoado passa a integrar o território do município de Lupionópolis e muda seu nome para Vila Cafeara. As serrarias fecharam. A mata deu lugar ao café. Cultura que trouxe riqueza a tantos nesse Brasil, também foi a alavanca que impulsionou o crescimento de Cafeara. Crescimento que levou o povoado a se transformar em cidade menos de vinte anos depois de seu surgimento.
Passeando pela cidade
Cruz atual, na Praça da Bandeira
Se você quiser saber mais sobre a cidade, dê uma espiada no Museu João Rissati, lá na Rua Mathias Aparecido Fogaça. Como todo museu de cidade pequena ele tem um acervo curioso e original, que conta mais do que grandes feitos históricos: ele fala da vida de pessoas como eu e você, que lutam no dia-a-dia e assim transformam o mundo, com pequenos passos. O Cruzeiro, marco de fé dos primeiros colonizadores, hoje possui iluminação e continua diante do edifício consagrado a Santa Luzia, a capela que se tornou Igreja ainda está na Praça da Bandeira. Chegamos a Cafeara pela PR-535, vindos de Lupionópolis, e na entrada da cidade nos deparamos com o belíssimo portal em estilo greco-romano. A estrada avança para dentro da cidade, e quando se transforma em Avenida, somos recebidos pelo Cristo Acolhedor. A estátua, colocada exatamente no início da Avenida Brasil, recebe o visitante de braços abertos. Encontramos também em Cafeara, nesta mesma avenida, um monumento que representa a Bíblia. Antes de qualquer crítica pelo caráter religioso destes símbolos, vamos recordar que nosso país é oficialmente católico, ou seja, cristão. As cidades possuem padroeiros, santos da Igreja Católica, herança da colonização portuguesa e ocupação por imigrantes católicos. Nosso olhar sobre estes símbolos hoje deve ser o de respeito à tradição histórica do lugar.
Museu João Rissati
Apesar do clima quente, passear pela Avenida Brasil pode ser um programa bem agradável, talvez você até queira dar uma parada na sorveteria - taõ presente no livro - para se refrescar, mas tenho certeza de que não vai tirar os olhos das árvores. Árvores existem em todo lugar, alguém pode dizer, o que haveria de interessante Jul ho 201 3
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nelas? Se você ainda não deu uma olhada atenta nas fotos elas aparecem em várias - eu lhe digo: em Cafeara elas são podadas em forma de cubo. Isso mesmo! Esqueça o desenho que você fazia na escola daquela árvore com copa de curvinhas feito uma nuvem, agora desenhe árvores quadradas e se alguém lhe criticar, fale para o desavisado que em Cafeara as árvores são assim.
E se... Bem, e se a história tivesse sido diferente? Se não houvessem mentiras e intrigas? Não teria sido um romance. O livro não existiria. Certo, essa é a verdade sem adornos, mas quantas vezes nos pegamos imaginando outros destinos para os personagens dos livros? Então, apenas para sonhar, como a Anna Maria também sonhou no livro, vamos dar uma espiada na Igreja de Santa Luzia pronta para um casamento:
Um pouco mais de Cafeara O café, que emprestou seu nome à cidade e proporcionou o seu desenvolvimento é representado tanto no brasão como na bandeira do município. É também citado no hino, que faz alusão à história da cidade, construída pela coragem de pessoas que nunca temeram o trabalho.
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Hino da cidade Cafeara Terra amada e tão querida. O teu nome é para nós uma bandeira, E a todos pedimos com guarida Oferece o valor dessa gente hospitaleira. Sempre avante teu caminho com a vitória. Siga firme e triunfante Pelo caminho da glória. Cafeara... Por um verde e gigantesco do progresso Surgiu teu nome pleno de sucesso Cafeara... E o Paranapanema em corrente majestoso Seja igual um diadema, com teu solo venturoso Cafeara... Do pioneirismo de audazes bandeirantes Somos fortes de civismo Surge bem forte e triunfante. Cafeara... Santa Luzia com seu manto protetor Permita a Cafeara um futuro de esplendor. Cafeara... Entre um empresário e médico riquíssimo, urbano e sedutor e um agricultor rude, belo, romântico e reservado, você escolheria essa ou terceira opção? A escolha de Anna Maria, estava feita muito antes da consumação do tempo... Ou mesmo antes! Anna Maria Schöll é a mais linda jovem que a pequena cidade de Cafeara conheceu. A mais meiga, mais cativante. Anna Maria é rainha do rodeio. E sua vida gira em torno da família, dos amigos verdadeiros cultivados ao longo da vida e dos concursos de beleza dos quais participa. Nunca planejou muito o futuro, porque acredita que se deve viver intensamente o presente. Ser feliz, para ela, é apenas viver. Tem um grande sonho, que é a única coisa que almeja para si: viver um grande amor, um amor de abalar as estruturas do ser, maior que tudo que já teve, sentiu ou conheceu. Quando seu coração se divide em dois e, indecisa por natureza, tem de escolher, ela nem raciocina, pois quem manda são seus hormônios e seu coração e, finalmente encontra o amor, da forma mais surpreendente. Um amor puro, intenso, repleto de paixão e sentimento. Mais forte que sua característica indecisão, que qualquer intriga ou ardil. Tão implacável quanto o próprio tempo. Mais violento que o mais bravo dos touros. Jul ho 201 3
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Baú de Poesias
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O Último Baile do Império pode ser adquirido no site www.amazon.com.br em formato digital, ou físico com dedicatória no blog da autora www.alineteixeira.com. Lembrando que até dia 31/07 a versão para plataformas digitais se acha em promoção, apenas R$1,99.
NOTÍCIAS fonte: www.sjp.pr.gov.br
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A Prefeitura Municipal de São José dos Pinhais, através da Secretaria de Cultura realizou no dia 19 de julho, às 16h, a abertura da exposição coletiva “Flores”. A exposição ocupa o hall de entrada da Escola da Cultura, local onde acontecem diversos cursos culturais, e permanecerá aberta para visitação até 19 de agosto. Os artistas Ana Galete possui várias exposições coletivas em seu currículo. Ana retrata em suas obras flores, paisagens, araucárias e temas ligados à preservação do meio ambiente. Cecília Tavares fez aulas de pintura em tela, técnica óleo sobre tela, com as professores Roseli Fontes e Maria do Carmo Piovesan. Cecília já participou de várias exposições coletivas e as individuais na Biblioteca Pública Scharffenberg de Quadros, Câmara dos Vereadores, Fundação Mokiti Okada, OAB/PR, entre outros. Seus trabalhos exploram vários temas além dos florais, paisagens e naturezas mortas. De Lara formado pela EMBAP-PR foi aluno da professora Katia Velo que desde o início viu o potencial do artista e o incentivou a aprofundar-se nos estudos e o orientou a definir um estilo próprio. De Lara participou de exposições coletivas e uma individual na Biblioteca Pública Scharffenberg de Quadros. Erica Imamura Gondro estudante de pintura EMBAP-PR, fez aulas com a professora Marlene Dresch, participou de exposições coletivas e uma exposição individual na Galeria Municipal de São José dos Pinhais. Jucilmara Luiza Loss Vieira já participou de várias exposições realizadas na Secretaria de Cultura de SJP e após realizar alguns cursos desenvolveu técnicas próprias e vem aprimorando-se buscando um estilo realista. Luzia da Luz foi aluna da professora de pintura Rosi Chiuratto, Léo Sperandio e Ione Simens. Tem atuado de forma significativa em exposições coletivas e individuais, transita entre o acadêmico e o abstrato, com pinceladas em acrílicas e à óleo sobre tela. Possui obras em acervo em vários locais no território nacional e internacional.
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AGENDA Teatro Sesi SJP
CENTRO DE VIVÊNCIA CULTURAL JOÃO SENEGAGLIA Rua XV de Novembro, 1800, esquina com Av. Rui Barbosa – Centro – São José dos Pinhais
III Feira de Economia Solidária no Aeroporto Internacional Afonso Pena, no espaço João Roberto de Paula até 31 de julho
INGRESSO: De Quartafeira a Domingo R$10,00 (inteira) e R$5,00 (meia) Quintafeira GRATUITO Programação disponível a cada semana em: www.sjp.pr.gov.br E também em: escritoressjp.blogspot.com.br EXPOSIÇÃO COLETIVA “FLORES” A Prefeitura Municipal de São José dos Pinhais, através de sua Secretaria de Cultura realizará a partir do dia 19 de julho a exposição coletiva “FLORES”. Participam da exposição “Flores”, os artistas plásticos: Ana Galete, Cecília Tavares, De Lara, Erica Imamura Gondro, Jucilmara Luiza Loss Vieira e Luzia da Luz. Sobre a exposição, a curadora Katia Velo, descreve “As obras que participam desta exposição além do tema possuem alguns traços em comum: são acadêmicas e fazem parte do acervo dos artistas como suas obras iniciais, com exceção da Jucilmara. Outro destaque é que as exposições coletivas e individuais que os artistas participaram em sua grande maioria foram realizadas pela Secretaria de Cultura em gestões anteriores”. Exposição: “Flores” Local: Escola da Cultura End. Rua Joaquim Nabuco, 3.136 Período da exposição de 19 de junho até de 19 agosto de 2013 Visitação: De 2ª. a 6ª. das 8 às 18h Entrada Franca
INSCRIÇÕES ATÉ 1 3 DE SETEMBRO 48
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fonte: guiasjp.com
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CONHEÇA SÃO JOSÉ DOS PINHAIS Museu Municipal Atilio Rocco rua XV de Novembro, 1660 2ª a 6ª 9h às 12h e 13h às 17h Sábados 10h às 14h
CATEDRAL DE SÃO JOSÉ DOS PINHAIS
PARQUE DE SÃO JOSÉ DOS PINHAIS 50
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Série Lujanes
UMA MALDIÇÃO QUE ATRAVESSA OS SÉCULOS MARCANDO UMA FAMÍLIA Obrigados a viver perto do rio Luján porque necessitam de suas águas para completar uma estranha transformação que os mantém vivos, os membros de uma família lutam para ocultar sua identidade. Ao longo dos anos sua existência tornou-se uma lenda. Alguns foram apanhados, as histórias correram de boca em boca, e eles ficaram conhecidos como lujanes, os homens-peixe do Delta. Para sua própria proteção organizaram-se em uma sociedade secreta, com regras próprias e comandada pelo Conselheiro, um homem com o poder sobre a vida e a morte de todos eles. Porém, nem mesmo o mais poderoso dos Conselheiros tem o controle sobre o coração de um luján. Como qualquer humano, eles são capazes de despertar e de sentir emoções avassaladoras. Entretanto, às vezes são proibidos de vivê-las. Uma família movida pela paixão, regida pela lealdade e controlada pelo destino. Que mistérios ocultam as águas escuras do Luján?
Próxima Edição No Dia da Poesia vamos conversar sobre Haicai Aniversário da Biblioteca Entrevista, leituras, notícias
Viajando até o Delta do Rio Paraná
Não perca a edição de nº 2 4 de outubro