MILENA FLECK - ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA ESCOLA PARA AS CRIANÇAS!

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS – UNISINOS UNIDADE ACADÊMICA DE FORMAÇÃO CONTINUADA CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM EDUCAÇÃO INFANTIL MILENA FLECK

ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA ESCOLA PARA AS CRIANÇAS!

SÃO LEOPOLDO 2010


Milena Fleck

ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA ESCOLA PARA AS CRIANÇAS! Trabalho de Conclusão de Curso de Especialização apresentado como requisito parcial para a obtenção de título de Especialista em Educação Infantil, pelo Curso de Especialização em Educação Infantil da Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Orientador Prof. Dr. Euclides Redin

SÃO LEOPOLDO 2010


Mais uma vez, e sempre, dedico este trabalho aos meus pais, Marcia e JoĂŁo Carlos Fleck, pelo amor incondicional, verdadeiro e eterno, por terem dedicado suas vidas a mim e tambĂŠm por serem meus melhores professores na escola de todos os dias... amo vocĂŞs.


AGRADECIMENTOS Aos professores do Curso de Especialização em Educação Infantil da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS. Ao professor Luciano, pelo grande exemplo como profissional dispensado à nossa turma. Em

especial,

aos

professores

Euclides

e

Marita

Redin,

que

me

acompanharam na elaboração deste trabalho, obrigada pela paciência, carinho e sabedoria. Ao grupo de amigos e colegas da pós-graduação, pela troca de idéias, experiências e alegrias. Em especial à minha grande amiga Luciane, pelas conversas no meio da aula, pelo carinho e companhia. À minha família, agradeço o carinho e a compreensão em todos os momentos. E, principalmente, ao meu “companheiro” de vida e de luta, Daniel, meu amor, obrigada pela dedicação, pelo auxílio e pela paciência durante a realização deste trabalho.


“Toda criança quer Toda criança quer crescer Toda criança quer ser um adulto E todo adulto quer E todo adulto quer crescer Pra vencer e ter acesso ao mundo E todo mundo quer E todo mundo quer saber De onde vem Pra onde vai Como é que entra Como é que sai Por que é que sobe Por que é que cai Pois todo mundo quer...” (Palavra Cantada/ Péricles Cavalcanti)


RESUMO DE LÍNGUA PORTUGUESA Este trabalho questiona a escola de educação infantil, a partir de suas características e princípios no atendimento à criança, visando analisar se ela é respeitada e reconhecida como sujeito social e histórico, integrante ativo e participativo do meio onde vive. Busca também analisar como deve ser uma escola de qualidade, tendo como base as referências e parâmetros utilizados pelo Governo Federal, construindo, assim uma relação comparativa entre a escola de educação infantil que temos e a que respeita os direitos das crianças.

Palavras-chave: Escola. Educação Infantil. Qualidade. Criança.


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO..........................................................................................................7 2 QUEM É ESSA CRIANÇA?.....................................................................................9 2.1 CRIANÇA COMO SUJEITO DE DIREITOS.........................................................10 2.2 O DIREITO À EDUCAÇÃO..................................................................................11 3 COMO DEVE SER A ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL DE QUALIDADE ?..14 4 A ESCOLA QUE TEMOS.......................................................................................19 4.1 ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL: DEMANDA x QUALIDADE......................23 5 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 27 REFERÊNCIAS......................................................................................................... 29 ANEXO

1

CONVENÇÃO

SOBRE

OS

DIREITOS

DAS

CRIANÇAS......................31 ANEXO 2 – CRITÉRIOS PARA ADMISSÃO DE ALUNOS NAS ESCOLAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE IVOTI..................35


1 INTRODUÇÃO A análise que se pretende realizar surge a partir de um questionamento, de uma pergunta que pode ser feita de inumeras maneiras, mas que, basicamente, pode ser expressa assim: como deve ser a escola de educação infantil que garanta os direitos das crianças que ali se encontram, reconhecendo-as como cidadãs de direitos? Essa pergunta surgiu no cotidiano da minha profissão de professora de educação infantil, na busca pessoal de desenvolver meu trabalho da melhor forma possível, bem como do anseio por uma escola que respeite essa criança e que a reconheça como cidadã, integrada a uma comunidade que também a reconheça assim e que desenvolva políticas públicas que garantam esses direitos. Desenvolvo esse trabalho baseando-me no papel da escola como participante ativa no processo que assegura os direitos da criança, direitos esses já reconhecidos e garantidos através de leis e diretrizes nacionais, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB – Lei 9.394/96) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e também me apoiando no questionamento do conceito de escola, que temos hoje, como modelo hegemônico no espaço urbano. Inquirindo esse modelo de escola de educação infantil, moldada para atender as necessidades dos pais, sendo estruturada a partir das obrigações a que os pais estão vinculados em seu cotidiano e de seus afazeres “de adultos”, propõe-se aqui a discussão de como, neste espaço realizado a partir da perspectiva do mundo adulto, pode-se montar estratégias que venham garantir os direitos das crianças e, gradativamente, moldar essas estruturas através das necessidades daqueles que, de fato, são seu público-alvo. No primeiro capítulo do trabalho, caracterizo a criança de hoje, presente em nossa sociedade, significando seu papel dentro da família e da comunidade, como pessoa em desenvolvimento e cidadã de direitos. No segundo capítulo, relato as características e as competências que a escola de educação infantil deve assegurar para as crianças, como deve ser organizado e pensado esse ambiente tão importante e necessário, tanto para os adultos como para elas próprias.


No terceiro e último capítulo, busco, através das imagens de Frato (Francesco Tonucci), relacionar a realidade das escolas infantis com os direitos das crianças, analisando onde estão os principais pontos de desencontro e em que momentos a lei não é cumprida.


2 QUE CRIANÇA É ESSA?

A palavra criança é definida pelo dicionário como “ser humano de pouca idade, menino ou menina” (FERREIRA, 1993, p. 153). Mas, além de pouca idade, que outras características tem esse ser humano? Como é sua relação na sociedade com outros de pouca idade e com os de muita idade, nós, adultos? Para responder esses questionamentos, é preciso refletir sobre os conceitos de criança históricos e atuais, buscando essa criança produzida e vinculada à imagem desses “seres humanos de pouca idade”, considerando também que a construção desse conceito estará ligada à ótica do adulto que dela fala, dos interesses sociais, econômicos, culturais, políticos ou outros de uma determinada sociedade ou grupo social, de tempo e lugares específicos. Inevitavelmente, os relatos sobre crianças e, conseqüentemente, sobre infância serão os feitos pelos adultos, sempre observadores e críticos da/sobre a vida dos pequenos. Frente à história de nossas crianças, através dos tempos, é possível encontrar muitos fatos, muitos relatos, muitas afirmações, mas nunca o olhar da criança sobre sua própria vida. A criança que hoje divide os espaços/tempos com os adultos é consideravelmente diferente daquela que encontramos nos livros e registros históricos, em que ela é definida, muitas vezes, como um ser incapaz e incompleto diante da complexidade do “homem feito”, do adulto retentor da verdade e do conhecimento. Aquela criança que, normalmente era colocada “à parte da história”, apenas como um ser em construção, vivendo em um mundo que não era o seu e que para estar integrada a ele deveria cumprir etapas (como a escola) e que, com a chegada da idade adulta, poderia ser considerado “sujeito” homem/mulher, é com certeza parte de uma história que hoje não existe mais (ZABALZA, 1998). Atualmente, a criança é um sujeito social e histórico, que faz parte da sociedade, com a qual compartilha uma determinada cultura, sendo profundamente marcada pelo meio social e contribuindo com ele também (BRASIL, 2008, v.1). Ela tem uma voz ativa e está presente em decisões importantes de sua família, mesmo que ainda seja necessário passar por etapas e cumpri-las dentro de parâmetros préestabelecidos pela sociedade. Nas classes sociais mais favorecidas e com mais


recursos, são elas, muitas vezes, as responsáveis pelas escolhas desde roupas, acessórios, até destinos turísticos, escolas e cursos extracurriculares. Mesmo em famílias com menos recursos financeiros, as crianças têm um papel importante de fala e escuta, mesmo que, indiretamente, com manhas e compensações, demonstrando uma relação de dependência entre pais/criança.

2.1 CRIANÇA COMO SUJEITO DE DIREITOS

Afirmar que hoje a criança é reconhecida como um sujeito de direitos e participativa na sociedade não significa que ela é aceita como tal, que lhe é reservada a devida atenção ou que a sociedade a considere como um pequeno cidadão. No entanto, é afirmar que, atualmente, há uma grande preocupação e um discurso intenso e expressivo sobre as crianças e (importantíssimo) com as crianças, dando-lhes a palavra e ouvindo-as. Muitos falam de seus direitos como seres humanos, não apenas como responsáveis pelo futuro da sociedade, mas também e principalmente como pessoas, sujeitos de direitos, não considerada menor ou pequena em relação ao adulto, mas diferente. A Convenção Internacional dos Direitos das Crianças, criada e aprovada pelas Nações Unidas em 1989, foi um importante marco no reconhecimento dos direitos humanos e na construção de novas políticas públicas voltadas à proteção da infância e aprovada por grande parte dos países integrantes da ONU, ratificada no Brasil em setembro de 1990. Francesco Tonucci, no livro “Quando as crianças dizem agora chega!”(2008), traz uma versão simplificada e reduzida da Convenção, reescrita com a ajuda das crianças, a fim de favorecer sua máxima difusão e compreensão, sendo autorizada sua utilização livremente, sem vínculos editoriais. O Art. 2 da Convenção diz que “todos os Estados devem respeitar os direitos da criança, sem distinção de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política da criança ou da família”, diz ainda, no Art. 3, que “os interesses da criança devem ser considerados em primeiro lugar e como sendo os mais importantes em todas as decisões que lhe dizem respeito.” Sendo assim, é possível afirmar que essa Convenção reconhece a criança como sujeito de direitos, ressaltando que sua


opinião, é importante e que deve ser considerada, e que ela, a criança, tem o direito de expressar-se livremente, com os meios que preferir (Art.13). A Constituição Brasileira, em seu Art. 227, diz que

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Garantindo à criança direitos e proteção, reconhecendo-a e respeitando-a como pessoa em desenvolvimento, conferindo-lhe absoluta prioridade com relação a esses direitos, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) vem regulamentar este artigo da constituição, tendo como base a proteção integral da criança, em que a Convenção Internacional dos Direitos das Crianças é uma referência e considerado um instrumento de apoio. O ECA estabelece direitos a serem garantidos para todas as crianças e adolescentes: direitos relativos à sobrevivência, direito à vida e à saúde; ao desenvolvimento pessoal e social, ao convívio com a família e a comunidade; à integridade física, psicológica e moral, garantindo o direito à educação, ao acesso a cultura, ao esporte e ao lazer. É através do Estatuto que também surgem e que são normatizados os instrumentos que podem garantir o cumprimento desses direitos, tais como o Conselho Tutelar.

2.2 O DIREITO À EDUCAÇÃO

Consta no Artigo 53 do Estatuto da Criança e do Adolescente que

A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;


II – direito de ser respeitado por seus educadores; III – direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores; IV – direito de organização e participação em entidades estudantis; V – acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência. Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais.

A criança tem direito à educação, à escola pública, perto de sua casa e do seu bairro e acima de tudo, uma escola de qualidade, com recursos e profissionais qualificados e competentes que garantam sua educação, desenvolvendo suas habilidades e que lhe ensine a paz, a amizade, a igualdade e o respeito pelo ambiente natural (Convenção, Art. 29). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 9.394, de dezembro de 1996, tem como base os princípios presentes na Constituição Brasileira, definindo e normatizando o sistema de educação nacional. O Art. 3 da LDB relaciona a base dos princípios educacionais que o ensino deve seguir como a igualdade de condições de acesso e permanência na escola; gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; garantia de padrão de qualidade; vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais, entre outros. A LDB também define como dever do Estado garantir escolas públicas para todas as crianças, priorizando o ensino fundamental, inclusive para aqueles que não tiveram acesso na idade adequada. Outro aspecto relevante, que consta na LDB, refere-se à Educação Infantil, definindo-a como primeira etapa da educação básica, sendo que o município tem o dever de oferecê-la para todas as crianças (respeitando a prioridade acima mencionada). Ao incluir a educação infantil como parte integrante da educação básica, como sua primeira etapa, a LDB está reconhecendo que a educação começa nos primeiros anos de vida e que é essencial para o cumprimento de seu objetivo, como consta no Art. 22 da Lei, “a educação básica tem por finalidade desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhes meios para progredir no trabalho e nos estudos posteriores”. Nos artigos 29 a 31 da LDB, são determinados pontos importantes da educação infantil, tendo como finalidade o desenvolvimento integral da criança até


os seis anos de idade, complementando a ação da família e da comunidade; definindo que a mesma será oferecida em creches (para crianças até 3 anos de idade) e pré-escolas (para crianças de 4 a 6 anos); e que a avaliação acontecerá mediante acompanhamento e registro de desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mas sim, garantindo o acesso ao ensino fundamental. Outro documento importante, publicado pelo Ministério da Educação (MEC) no ano de 1998 é o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI), tendo como principal objetivo orientar e auxiliar os profissionais da área da educação. Ele é apresentado em três volumes: Volume I – Introdução; Volume II – Formação Pessoal e Social (que favorece o conhecimento da autonomia da criança); e Volume III – Conhecimento de Mundo (orienta para o desenvolvimento das diferentes linguagens: movimento, música, artes visuais, linguagem oral e escrita, natureza e sociedade e matemática). O direito à educação das crianças pequenas é marcado, acima de tudo, por um longo caminho de lutas e mobilizações sociais. Analisando as leis mencionadas anteriormente, é possível afirmar que todas são muito recentes, e que apesar de significarem uma grande conquista e de representarem magníficos avanços, ainda estão distantes da realidade da criança no seu cotidiano. A transição da escola assistencialista, que é uma das características mais marcantes da história das creches, para uma escola que tem o objetivo educacional como prioridade, ainda é um processo pelo qual a escola de educação infantil está passando e que, com certeza, trará benefícios para todos.


3 COMO DEVE SER A ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL DE QUALIDADE?

A escola de educação infantil de qualidade necessita, acima de tudo, respeitar e garantir os direitos das crianças. No Brasil, o Governo Federal disponibiliza através do Ministério da Educação (MEC) uma série de documentos, como parâmetros e referenciais, elaborados através de pesquisas e de encontros nacionais com profissionais da educação, que devem ser considerados referência para atingir esse objetivo. Entre eles, podemos citar “Critérios para um atendimento em creches que respeite os direitos fundamentais das crianças”, elaborado por Maria Malta Campos e Fúlvia Rosemberg. Dividido em duas partes, a primeira contém critérios referentes à organização e ao funcionamento das escolas, sobretudo relacionados às práticas adotadas no trabalho direto com as crianças. A segunda parte menciona os critérios relativos às diretrizes e normas políticas, programas e sistemas de financiamento, tanto governamentais como não governamentais (CAMPOS; ROSEMBERG, 2009). O documento em questão possui um perfil totalmente redigido no sentido positivo, afirmando compromissos com o atendimento na escola de educação infantil de qualidade, voltados para as necessidades fundamentais da criança. Seu texto é simples e direto, buscando assim atingir todos os profissionais que “lutam por um atendimento que garanta o bem-estar e o desenvolvimento das crianças” (CAMPOS; ROSEMBERG, 2009, p.7) Na primeira parte, intitulada “Esta creche respeita a criança: critérios para a unidade creche”, a autora Maria Malta Campos defende os direitos das crianças, detalhando-os e exemplificando-os para um total entendimento e compreensão. Ao todo são doze direitos mencionados, que serão citados abaixo na mesma ordem que aparecem no documento: •

nossas crianças têm direito à brincadeira;

nossas crianças têm direito à atenção individual;

nossas crianças têm direito a um ambiente aconchegante, seguro e estimulante;

nossas crianças têm direito ao contato com a natureza;


nossas crianças têm direito à higiene e à saúde;

nossas crianças têm direito a uma alimentação sadia;

nossas crianças têm direito a desenvolver sua curiosidade, imaginação e capacidade de expressão;

nossas crianças têm direito ao movimento em espaços amplos;

nossas crianças têm direito à proteção, ao afeto e à amizade;

nossas crianças têm direito a expressar seus sentimentos;

nossas crianças têm direito a uma especial atenção durante seu período de adaptação à creche;

nossas crianças têm direito a desenvolver sua identidade cultural, racial e religiosa.

Da mesma maneira, a segunda parte, que tem como título “A política de creche respeita criança: critérios para políticas e programas de creche”, de Fúlvia Rosemberg, estabelece a posição política que a escola de educação infantil deve tomar frente às crianças, citando e exemplificando um a um. São oito pontos relevantes, mencionados em seguida, na ordem em que aparecem no documento: •

a política de creche respeita os direitos fundamentais da criança;

a política de creche está comprometida com o bem-estar e o desenvolvimento da criança;

a política de creche reconhece que as crianças têm direito a um ambiente aconchegante, seguro e estimulante;

a política de creche reconhece que as crianças têm direito à higiene e à saúde;

a política de creche reconhece que as crianças têm direito a uma alimentação saudável;

a política de creche reconhece que as crianças têm direito à brincadeira;

a política de creche reconhece que as crianças têm direito a ampliar seus conhecimentos;

a política de creche reconhece que as crianças têm direito ao contato com a natureza.


Também é possível citar os Parâmetros Nacionais para a Educação Infantil Volumes 1 e 2, igualmente disponibilizados pelo MEC, que especificam as referências de qualidade a serem utilizadas pelas escolas, com o objetivo de promoverem a igualdade de oportunidades educacionais, considerando as características culturais e sociais específicas das comunidades onde estão inseridas. No ano de 2009, foram concluídos pelo MEC os Indicadores da Qualidade na Educação Infantil, importante documento que se caracteriza como um instrumento de auto-avaliação, através de um processo participativo e aberto, com os professores e com a comunidade. Tem como principal objetivo ser uma ferramenta de fácil aplicação, que auxilie as equipes e as famílias a encontrarem seu “próprio caminho na direção de práticas educativas”(BRASIL, 2009, p.12), com adesão voluntária, em que os resultados não poderão ser utilizados para comparação entre instituições. Os indicadores, mencionados no documento, são as características de determinada realidade escolar, e suas variações fornecem detalhes que possibilitam constatar quais mudanças devem ser feitas, auxiliando a tomada de decisões na busca de melhores resultados. As dimensões dos indicadores referem-se a importantes elementos das escolas de educação infantil, sendo elas: 1.

DIMENSÃO PLANEJAMENTO INSTITUCIONAL: toda escola de educação infantil deve ter uma proposta pedagógica em forma de documento, elaborada por todos da equipe e com a participação das famílias, sendo um importante instrumento de trabalho diário, revisto e reescrito periodicamente.

2.

DIMENSÃO

MULTIPLICIDADE

DE

EXPERIÊNCIAS

E

LINGUAGENS: a escola de educação infantil deve respeitar e incentivar

a

autonomia

da

criança,

dispondo

de

espaços

e

desenvolvendo atividades que possibilitem que elas façam suas próprias escolhas. 3.

DIMENSÃO INTERAÇÕES: dentro do ambiente escolar, as interações que ocorrem (entre crianças, entre crianças e adultos e entre adultos), devem ser baseadas nos valores que constituem a


proposta pedagógica da instituição, sendo que interações humanas positivas e enriquecedores devem ser uma das suas principais metas. 4.

DIMENSÃO PROMOÇÃO DA SAÚDE: a escola deve assegurar práticas cotidianas na prevenção de acidentes e manter cuidados com a higiene e alimentação saudável das crianças.

5.

DIMENSÃO ESPAÇOS. MATERIAIS E MOBILIÁRIOS: o ambiente físico, o mobiliário e os materiais da instituição de educação infantil devem refletir uma concepção de escola que respeita a criança, desenvolvendo educação e cuidado em todos os seus aspectos: físico, afetivo, cognitivo, criativo.

6.

DIMENSÃO FORMAÇÃO E CONDISÕES DE TRABALHO DAS PROFESSORAS E DEMAIS PROFISSIONAIS: na escola de educação infantil, os profissionais que atuam devem ser qualificados e valorizados pela comunidade e pela instituição, assim como devem estar cientes da importância social do trabalho que realizam. Essa dimensão é um dos fatores que mais influenciam a qualidade do ensino em uma escola.

7.

DIMENSÃO COOPERAÇÃO E TROCA COM AS FAMÍLIAS E PARTICIPAÇÃO NA REDE DE PROTEÇÃO SOCIAL: a escola de educação infantil deve estar articulada com os demais serviços públicos e com a família para respeitar e garantir que as crianças sejam, de fato, sujeitos de direitos, conforme estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Ainda no final de 2009, a Câmara de Educação Básica, do Conselho Nacional de Educação, fixou as “Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil” (Resolução Nº5, de 17 de dezembro de 2009), que devem ser observadas para a organização de propostas pedagógicas das escolas, no sentido de elaboração, planejamento, execução e avaliação. Mais uma vez, esse documento afirma a importância das instituições de educação infantil para o desenvolvimento da criança como sujeito pleno, cujos direitos devem ser respeitados e garantidos pelo Estado. Muitos autores também analisam as principais características de uma escola de educação infantil de qualidade, como Miguel A. Zabalza, no livro “Qualidade em Educação Infantil”. Nele, o autor relaciona uma série de “aspectos-chave” que a


escola deve almejar para alcançar bons resultados, buscando não uma visão definitiva para o tema, mas sim, fomentar uma profunda reflexão coletiva sobre o que é importante na educação infantil. Entre os aspectos citados, estão a organização dos espaços, pensados para as crianças; o equilíbrio entre a iniciativa infantil e o trabalho dirigido pelos adultos, buscando valorizar a autonomia das crianças e o desenvolvimento das competências específicas do currículo; rotinas estáveis, para assegurar aos pequenos um ambiente seguro e novamente estimular sua autonomia; o trabalho com os pais, as mães e com o meio ambiente, tendo como um dos objetivos o enriquecimento do trabalho educativo desenvolvido na escola; entre outros. Conforme Zabalza (1998, p. 32):

[...] a qualidade, pelo menos no que se refere às escolas, não é tanto um repertório de traços que se possuem, mas sim algo que vai sendo alcançado. A qualidade é algo dinâmico (por isso faz-se mais alusão às condições culturais das escolas do que aos seus aspectos estruturais), algo que se constrói dia-a-dia e de maneira permanente. (grifos do autor)

Dessa maneira, é possível afirmar que a qualidade das escolas de educação infantil está estritamente ligada às condições culturais da comunidade que forma essa escola, trazendo para dentro dela os aspectos mais relevantes que as pessoas buscam em uma instituição de ensino. O tema qualidade é e sempre será marcado por um constante processo, um verdadeiro desafio para os profissionais da área da educação, pois abrange um conceito muito relativo, socialmente construído, baseado em valores e defini-la envolve, principalmente, uma posição pessoal, inclusive entre os indicadores de qualidade e o respeito frente às diferenças culturais, étnicas e de gênero.


4 A ESCOLA QUE TEMOS

A escola de educação infantil que, atualmente, atende as crianças da nossa sociedade cumpre com diversos papéis e funções, mas nem sempre tem como principal objetivo respeitar e garantir os direitos das crianças. Podemos observar esse fato ao relembrar sua história: a escola de educação infantil tem uma estreita relação com a história da infância, das famílias e da comunidade. Junto com o movimento de emancipação das mulheres, ligado à expansão da economia capitalista e à crescente procura dessa mão-de-obra para trabalharem em outras atividades além das domésticas, surge a necessidade de se criar um local que acolha os filhos e filhas dessas trabalhadoras, garantindo-lhes minimamente os cuidados básicos enquanto a progenitora está laborando. As primeiras

experiências

nesse

sentido

foram

de

cunho

essencialmente

assistencialista, estando essas creches, muitas vezes, vinculadas a grandes indústrias. (KULMANN JR, 2001). Infelizmente esta é uma característica ainda presente nas escolas de educação infantil. Como anteriormente já foi mencionado, apenas com a criação e aprovação da LDB, em 1996, é que a educação infantil foi incluída como parte integrante da educação básica. E apesar dessa lei ser clara, quanto a seus objetivos principais e a seus princípios, as escolas de educação infantil ainda apresentam características que as vinculam diretamente com os objetivos primários de sua criação, principalmente quanto à questão assistencialista. Conforme Tonucci (2005, p. 27):

(...) existem serviços para a infância, pensados para responder mais as necessidades dos pais, especialmente das mães trabalhadoras, do que das crianças: em grandes espaços há crianças em número excessivo, por períodos de tempo muito longos. Muito barulho, impossibilidade de fugirem, de se esconderem, de ficarem sozinhas ou “entre dois ou três”.

Para os profissionais da educação, pais e adultos que conhecem a realidade de uma escola de educação infantil de uma grande cidade, por exemplo, é possível visualizar essa situação com facilidade. Com muita frequência, podemos encontrar


salas de aula com um número elevado de crianças. E mesmo que essa escola respeite as diretrizes nacionais, que normatizam o número de crianças por metro quadrado e o número de crianças por adulto, esse é, por vezes, superior ao que seria necessário para respeitar essa criança com sujeito de direito, impossibilitandoa de pequenos, mas importantes momentos, como ficar um pouco sozinha, ou de brincar apenas com um colega, o que não é possível dentro de uma sala com mais 18 crianças de 3 anos de idade.

A imagem acima, assinada por Frato (TONUCCI, 2008, p.59), retrata a realidade da escola de educação infantil que além de não respeitar os direitos das crianças, não as reconhecem como tais, mas sim como números, ou mesmo como “roupas”, que devem ser mantidas limpas, bem cuidadas para, no final do dia, retornarem a suas casas. Ao fazer uma crítica sobre essa imagem, é necessário


ressaltar que, além da proposta pedagógica da escola, devemos observar a proposta política da sociedade em que a escola está inserida, pois assim como a escola que respeita os direitos das crianças está vinculada a uma sociedade que também tem esse posicionamento, a que não o faz tem suas raízes em uma sociedade que também considera a creche um cabideiro, não as reconhecendo como cidadãs e deixando de promover políticas públicas que garantam seus direitos.

A escola, quando pensada por adultos para resolver seus próprios problemas, ignora a realidade da criança. “A criança tem um corpo e uma história”, afirma Frato (TONUCCI, 1997, p. 78), novamente com seus traços fortes e uma frase curta e direta. Ao ignorar o corpo e a história pessoal da criança, a escola deixa de respeitar a criança como um ser humano, negando sua existência fora do ambiente escolar.


Ela, a criança, assim como o adulto, possui um corpo que sente e que precisa ser reconhecido e respeitado dentro de suas peculiaridades e também uma história, que é presente, é recente e que está em constantes modificações. É extremamente necessário respeitar sua história e reconhecer que ela é um sujeito pertencente a uma família e integrante de uma comunidade, pois isso também implica reconhecer que esse indivíduo possui uma identidade pessoal, que é formada através das primeiras interações que o ser humano tem com outras pessoas, estabelecendo, desde muito cedo, os fundamentos de suas futuras relações e de seu desenvolvimento emocional. Segundo Browne, p.92:

A identidade das crianças desenvolve-se à medida que elas interagem com outras pessoas durante o curso de suas vidas. Isso não quer dizer que os bebês sejam “coisas”, mas sim que nossas experiências de vida ajudam a moldar a visão que temos de nós mesmos e que nossas identidades mudam e são reconstituídas ao longo do tempo.

Assim, a escola de educação infantil precisa reconhecer a criança como cidadã, respeitando suas experiências de vida como membro ativo da comunidade, auxiliando a família a desenvolver sua identidade de uma maneira positiva, com sua autoestima elevada, como um ser competente. Nesse sentido, a Convenção sobre os direitos das crianças, Art. 12, traz uma perspectiva muito interessante, enfatizando a necessidade de ouvir verdadeiramente as crianças e responder ao que elas nos dizem, para que assim saibamos mais e melhor quais suas necessidades e, consequentemente, poder atendê-las da melhor maneira possível. A escola de educação infantil é um ambiente influenciador da comunidade, um local que, assim com as demais escolas, tem a capacidade de gerar uma cultura, de “criar” e estabelecer verdades, através dos conceitos e atitudes que assume durante sua prática. Até mesmo quando é omissa diante de uma situação, traduz uma característica de sua comunidade: a de não estar presente (mesmo quando me calo, estou dizendo algo). A escola, como instituição, reflete as posições e os conceitos políticos que a sociedade e, principalmente, a administração pública, tem como prioridade para as crianças. Podemos partir de um exemplo simples, presente em uma cidade do interior do Rio Grande do Sul: a rede pública de educação infantil, incentivada pelas


secretarias municipais de educação e de saúde, vacina as crianças durante o período de aula, na semana que antecede o dia da Campanha Nacional de Vacinação contra Poliomielite, com a justificativa de que os pais não levam as crianças para vacinar no sábado e que, assim, busca o melhor para a criança, garantindo que ela seja vacinada. Com essa atitude, a escola está afirmando, de maneira subjetiva, que a família não tem condições de cuidar de seus filhos e que não é competente para levar uma criança para “tomar gotinhas”. Está, desde muito cedo, afirmando que esse pai e essa mãe precisam da escola e do sistema público para auxiliá-los na criação e na educação de seus filhos, de forma dependente e assistencialista. A escola é um ambiente gerador de cultura positiva ou não. E é, por meio de suas atitudes, de sua prática, que essa cultura se legitima, se torna parte da comunidade. Projetos políticos pedagógicos, elaborados pelo corpo docente, muitas vezes distantes da realidade, geram cultura às avessas, de maneira negativa, pois não garantem a prática, construindo uma cultura de omissão. A escola de educação infantil de qualidade precisa utilizar este importante instrumento de “gerar” verdades, para incentivar uma cultura crítica e participativa, incentivando os pais e/ou responsáveis a serem presentes na vida de seus filhos. Se for fato que, um grande número de pais deixa de cumprir com a obrigação de levar seu filho para tomar a vacina, a escola deveria trabalhar com a conscientização familiar, desenvolvendo projetos em parceria com a comunidade, utilizando as ferramentas que possuir, e por que não, as próprias crianças, para “cobrar” desses pais a sua responsabilidade. Dentro de um conceito de participação, em que a escola é vista como estimuladora e geradora de cultura, reconhecendo não só o papel importantíssimo da família, mas também a criança como cidadã de direitos, é seu dever incentivar o papel da família orientando e garantindo argumentos, meios e condições para que a ela, a família, seja a responsável pela educação e pelo cuidado da criança, sendo o local de referência e orientação para os responsáveis.

4.1 ESCOLAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL: DEMANDA x QUALIDADE


A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei Federal número 9.394, afirma que a vaga na escola de educação infantil é um direito da criança e da família, sendo o Estado obrigado a atender a demanda, mas sem a obrigatoriedade de matricula para todas as crianças, ou seja, é opção da família matricular a criança pequena na escola, mas é um dever do Estado garantir essa vaga para aqueles que a procuram. Atualmente, essa procura por vagas nas escolas de educação infantil não é suprida pelo estado, pelo fato de ser muito recente e de não haver disponibilidades de recursos financeiros suficientes para construção e sistematização de mais escolas. Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva, em entrevista à Revista Criança, comenta que é preciso aumentar expressivamente o atendimento em escolas públicas às crianças de 0 a 3 anos, que é de apenas 15% em todo território nacional. Conforme Silva (2008, p. 6)

existem duas grandes demandas: quantidade e qualidade. Ainda não há prédios suficientes para atender todas as crianças, que é uma demanda primária. Depois há necessidade de definir e aprofundar melhor o nosso projeto pedagógico para a infância e pensar em como realizar esse atendimento, fazer com que ele seja coerente com as necessidades das famílias, com os orçamentos municipais e que inove ao reconhecer esse sujeito, que é a criança de 0 a 5 anos de idade.

A realidade, dentro das cidades de todo país, de poucas escolas de educação infantil e do grande número de procura por vagas, pressiona o município e o obriga, muitas vezes, a escolher um caminho a seguir: abrir mão da qualidade e aceitar um grande número de crianças, fazendo da “quantidade excessiva” uma característica da escola, ou então da elaboração de critérios para a distribuição dessas poucas vagas que disponibiliza. Está claro que nenhuma das duas opções aqui citadas respeita os direitos das crianças, mas elas são realidades em muitas cidades. Novamente, podemos citar o município do interior do Rio Grande do Sul, já mencionado anteriormente. Procurado por muitas famílias, que defendiam vagas para seus filhos pequenos, e já possuindo um número muito maior de “fila de espera” do que vagas para as crianças (atendendo cerca de 300 crianças em sua rede, com um número superior a 450 na “fila de espera”) esta cidade, junto com o


Conselho Municipal de Educação e o Ministério Público, elaborou um conjunto de critérios em que algumas crianças têm prioridades no atendimento, como: os pais ou responsáveis precisam estar trabalhando para que a criança tenha sua vaga garantida; ou ainda a criança que possui alguma vulnerabilidade física ou risco social também tem prioridade, sendo encaminhada através do Conselho Tutelar. Os traços de Frato (TONUCCI, 2008, p.63) trazem a posição da família e, no detalhe, da criança diante desses critérios: “Mas eu só queria ir à creche porque me sinto sozinha...”.

O direito de frequentar a escola é da criança e, ao negar esse direito, a escola e o sistema educacional estão negando e reproduzindo vários conceitos, inclusive discriminatórios. Primeiramente, não reconhece o direito do cidadão de ter igualdade de condições para o acesso e permanência na escola (LDB, Art.3), independentemente de raça, gênero, etnia, credo e condições socioeconômicas. Ao estabelecer critérios, a escola de educação infantil torna sua acessibilidade apenas


um recurso para os filhos de pais e mães trabalhadoras e para aqueles que necessitam de auxílio. Ela tem, mais uma vez, seu foco voltado para a resolução de um problema dos adultos e não para garantir um direito dos cidadãos. A criança tem o direito de frequentar uma escola de educação infantil, sendo esse lugar caracterizado por um ambiente estimulante, onde ela possa se sentir segura e, ao mesmo tempo desafiada. Um local onde ela sinta o prazer de pertencer àquele ambiente e que se identifique com ele, relacionando-se, de forma sadia, com seus pares e com os adultos que ali se encontram. Portanto a criança tem o direito de crescer e viver em uma sociedade que lhe ofereça condições de frequentar uma escola onde o conhecimento não seja um privilégio dos poucos que “conseguirem” uma vaga.


5 CONCLUSÃO

Ao refletirmos sobre a trajetória da educação infantil dentro da sociedade, é possível compreender seu significado e como sua história esta fortemente ligada às lutas sociais e aos movimentos dos direitos humanos, não só no Brasil, mas também na maioria dos países que hoje tem a educação infantil como um direito do cidadão. Como professora, penso que é fundamental conhecer, com clareza, os direitos das crianças, pois só assim será possível garanti-los, não apenas em relação ao acesso às vagas, mas dentro da escola, respeitando e reconhecendo-a como sujeito social, que é influenciado e que contribui com o meio onde vive. O fato das escolas de educação infantil estarem presentes e serem um direito da criança já representa um valor importantíssimo para a sociedade, demonstrando um grande passo em relação aos direitos humanos conquistados. Mas o caminho para uma escola de qualidade ainda é longo e, por vezes, subjetivo, pois envolve muitos valores. Valores esses que mudam com frequência, frente a interesses políticos e sociais. Nas últimas décadas, podemos enumerar várias mudanças no sistema de ensino, nas leis que regem as escolas, nos currículos e até na formação e atuação dos professores, mas sabemos que, na prática, as grandes mudanças não acontecem. Talvez por elas serem feitas “de cima pra baixo”, com a participação de grandes especialistas e analisadas por poucos professores, trazendo a realidade de poucos como padrão nacional. Talvez, ainda, haja um grande desinteresse por parte dos professores, diante de tantas mudanças (que, de fato, não ocorreram na realidade) não acreditam mais e apenas trabalham (“do jeito que dá...”) Debates sobre a qualidade do ensino precisam ser realizados, também, dentro da escola, pelos professores, pelos pais ou responsáveis pelas crianças e principalmente com as próprias crianças. Conhecemos a capacidade das crianças de dizer e escolher o que lhes interessa, e de utilizar os meios e as “ferramentas” que possui para garanti-los: o choro, a birra, a manha. Ela é esperta e inteligente para saber com quem pode ou não utilizá-las. É preciso, com urgência, ouvir as crianças e também fazê-las entender que estão sendo ouvidas. É necessário estar presente diante da criança para entender e compreender o que dizem, disponibilizando as informações e os meios para que ela possa se expressar


livremente, da maneira que lhe for melhor. Quando a criança compreender que os adultos estão ouvindo e entendendo seus pedidos e necessidades, ela também compreenderá que vale a pena participar, e também ouvir, assim como os adultos fizeram com ela. Conforme afirma Maturana (2004, p.19),

Tampouco podemos, ao restringir de uma forma ou de outra a conduta de uma criança, forçá-la a tornar-se um adulto que viva em auto-respeito e respeito pelo outro. O respeito forçado nega a si próprio. A criança deve viver na dignidade de ser respeitada e respeitar o outro para que chegue a ser um adulto com o mesmo comportamento, vivendo como um ser com responsabilidade social, qualquer que seja o tipo de vida que lhe caiba.

Portanto,

conseguiremos

garantir

os

direitos

das

crianças,

e

consequentemente, os direitos dos adultos, modificando a cultura que hoje está presente em nossa realidade. É um processo longo, mas estritamente necessário para que haja uma mudança significativa, capaz de valorizar e reconhecer os cidadãos de todas as classes sociais e econômicas, de todas as idades, como sujeitos influentes e influenciados pelo meio onde vivem e responsáveis pelos seus atos. Para concluir, fica a imagem de Frato (TONUCCI, 2008, p.75) alegre e simples, de uma criança que tem pela frente o Mundo, se os adultos permitirem... e caminharem com ela.


REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. ______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: lei nº 9394 de 20.12. 1996. São Leopoldo: UNISINOS, 1996. ______. Ministério da Educação e do Desporto. Referencial curricular nacional para a educação infantil: volume 1 - Introdução. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília, 1998. ______. Ministério da Educação e do Desporto. Referencial curricular nacional para a educação infantil: volume 2 – Formação pessoal e social. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília, 1998. ______. Ministério da Educação e do Desporto. Referencial curricular nacional para a educação infantil: volume 3 – Conhecimento de Mundo. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília, 1998. ______. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069/90, de 13 de julho de 1990. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. ______. Ministério da Educação. Parâmetros nacionais de qualidade para a educação infantil – Volume 1. Secretaria de Educação Básica. Brasília, 2008. ______. Ministério da Educação. Parâmetros nacionais de qualidade para a educação infantil – Volume 2. Secretaria de Educação Básica. Brasília, 2008. ______. Ministério da Educação. Indicadores da Qualidade na Educação Infantil. Secretaria da Educação Básica. Brasília, 2009. ______. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Resolução nº 5, de 17 de dezembro de 2009. Diário Oficial da União. Brasília, 18 dez.2009. Seção 1, p.18. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/index.php? option=com_content&view=article&id=12992:diretrizes-para-a-educacaobasica&catid=323:orgaos-vinculados >. Acesso em: 23 out. 2010.


BROWNE, Naima. O desenvolvimento social e emocional das crianças. In: PAIGESMITH, Alice, CRAFT, Anna e col. O desenvolvimento da prática reflexiva na educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2010. CAMPOS, Maria Malta. ROSEMBERG, Fúlvia. Critérios para um atendimento em creches que respeite os direitos das crianças. 6. ed. Brasília: MEC, SEB, 2009. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993. FERREIRA, Maria Clotilde Rossetti. A educação coletiva do pequeno cidadão de 0 a 3 anos. Revista Criança: do professor de educação infantil. Brasília: MEC, nº 46, p.14-17, dez.2008. KUHLMANN Jr, Moysés. Infância e educação infantil: uma abordagem histórica. 2. ed. Porto Alegre: Mediação, 2001. MATURANA, Humberto, VERDEN-ZÖLLER, Gerda. Amar e brincar: fundamentos esquecidos do humano. São Paulo: Palas Athena, 2004. REDIN, Euclides; DIDINET, Vital. Uma cidade que acolhe as crianças: políticas públicas na perspectiva da infância. In: REDIN, Euclides; MÜLLER, Fernanda; REDIN, Marita Martins (Orgs.). Infâncias: cidades e escolas amigas das crianças. Porto Alegre, 2007. SILVA, Maria do Pilar Lacerda A.. As duas demandas da educação infantil: quantidade e qualidade. Revista Criança: do professor de educação infantil. Brasília: MEC, nº46, p. 5-9, dez.2008. TONUCCI, Francesco. Com olhos de criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. ______. Quando as crianças dizem: agora chega! Porto Alegre: Artmed, 2005. ______. 40 anos com olhos de criança. Porto Alegre: Artmed, 2008. ZABALZA, Miguel A. Qualidade em Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 1998.


ANEXO 1 – A CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DA CRIANÇA1 ART. 1 Esta Convenção ocupa-se dos direitos de todos aqueles que ainda não completaram 18 anos. ART. 2 Todos os Estados devem respeitar os direitos da criança, sem distinção de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política da criança ou da família. ART. 3 Os interesses da criança devem ser considerados em primeiro lugar e como sendo os mais importantes em todas as decisões que lhe dizem respeito. A criança tem o direito de receber a proteção e os cuidados necessários ao seu bem-estar. ART. 4 Os estados comprometem-se a executar os direitos reconhecidos por esta Convenção com todos os meios necessários. ART. 5 O dever de tomar conta da criança é de seus pais ou de quem os substitui. ART. 6 1. A criança tem direito à vida. 2. A criança tem o direito de desenvolver de forma completa sua personalidade. ART. 7 A criança tem o direito de ser registrada logo que nasce, ter um nome, uma nacionalidade e, se possível, conhecer seus pais e ser criada por eles. ART. 8 Os Estados comprometem-se a respeitar o direito da criança à sua identidade, à sua nacionalidade, ao seu nome e ao relacionamento com sua família. ART. 9 A criança tem o direito de manter contato com seus pais, mesmo que estes sejam separados ou divorciados. ART. 10 A criança tem o direito de reunir-se com seus pais ou de ficar em contato com eles, se estes vivem no interior. ART. 11 As crianças não podem ser levadas embora de seu país de forma ilegal. ART. 12 1

Convenção sobre os Direitos da Criança. In: TONUCCI, Francesco. Quando as crianças dizem: Agora Chega!. Porto Alegre:ARTMED, 2008, p.229.


A criança tem o direito de expressar sua opinião toda vez que são tomadas decisões que lhe dizem respeito, e sua opinião deve ser levada em conta na justa medida. ART. 13 A criança tem o direito de dizer o que pensa, com os meios que ela prefere. ART. 14 1. A criança tem o direito de liberdade de pensamento, de consciência, de religião. 2. Os pais têm o direito e o dever de guiar os filhos e nessa tarefa, eles devem ser deixados livres para seguir as idéias em que acreditam. ART. 15 A criança tem o direito de ficar com as outras. ART. 16 Nenhuma criança poderá ser submetida a interferências arbitrárias ou ilegais em sua vida particular, em sua família, em sua casa ou em sua correspondência. Não poderá sofrer lesões ilícitas em sua honra e em sua reputação. ART. 17 Os jornais, os programas de rádio e de televisão são importantes para as crianças; por esse motivo é importante que haja programas adequados a ela. ART. 18 Se uma criança não tiver pais, deverá haver alguém que se ocupe dela. Se os pais de uma criança trabalham, alguém deve tomar conta dela enquanto eles estão trabalhando. ART. 19 Ninguém poderá maltratar, abandonar, explorar uma criança ou contra ela exercer violência. ART. 20 Se uma criança não pode ficar com sua família, deve ir morar com alguém que cuide dela. ART. 21 A criança tem o direito de ser adotada, se sua família não pode cuidar dela. Não se pode fazer comércio com as adoções. ART. 22 1. A criança refugiada tem o direito de ser protegida. 2. A criança refugiada deve ser ajudada a reunir-se com sua família. ART. 23 1. A criança que tem problemas mentais ou físicos tem o direito de viver como as demais crianças e junto a elas. 2. A criança que tem problemas mentais ou físicos tem o direito de ser tratada.


3. A criança que tem problemas mentais ou físicos tem o direito de frequentar a escola, de se preparar para o trabalho, de se divertir. ART. 24 A criança tem o direito de alcançar o máximo nível de saúde física e mental e de ser bem tratada quando precisar. ART. 25 As crianças submetidas a tratamentos médicos físicos ou mentais têm o direito de receber controles periódicos de seu tratamento. ART. 26 Toda criança tem direito à seguridade social. ART. 27 A criança tem o direito de crescer bem física, mental, espiritual e socialmente. ART. 28 A criança tem o direito à educação. O ensino fundamental deve ser obrigatório e gratuito para todos. ART. 29 A criança tem o direito de receber uma educação que desenvolva suas habilidades e que lhe ensine a paz, a amizade, a igualdade e o respeito pelo ambiente natural. ART. 30 A criança que pertence a uma minoria tem o direito de usar sua língua e de viver de acordo com sua cultura e sua religião. ART. 31 A criança tem direito ao jogo, ao repouso, ao lazer e às atividades que mais lhe agradem. ART. 32 Nenhuma criança deve ser explorada. Nenhuma criança deve executar trabalhos perigosos ou que lhe impeçam de crescer bem e de estudar. ART. 33 A criança deve ser protegida das drogas. ART. 34 Nenhuma criança deve sofrer violência sexual ou ser explorada sexualmente. ART. 35 Nenhuma criança pode ser raptada, comprada ou vendida. ART. 36 A criança não pode ser explorada. ART. 37


Nenhuma criança pode ser torturada ou condenada à morte ou à prisão perpétua. Nenhuma criança pode ser privada de sua liberdade de modo ilegal ou arbitrário. ART. 38 Nenhuma criança abaixo dos 15 anos pode servir no exército ou combater em uma guerra. ART. 39 A criança que foi descuidada, explorada e maltratada tem o direito de ser ajudada e recuperar sua saúde e sua serenidade. ART. 40 A criança acusada de um crime deve ser considerada inocente até que não seja considerada culpada, após um processo justo. No entanto, se for considerada culpada, tem o direito de receber um tratamento adequado a sua idade e que a ajude a voltar a conviver com os outros. ART. 41 Cada Estado pode acrescentar a esses direitos outros que possam melhorar a situação da criança. ART. 42 É necessário que todos, adultos e crianças, saibam o que reza esta Convenção.


ANEXO 2 – CRITÉRIOS PARA ADMISSÃO DE ALUNOS NAS ESCOLAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE IVOTI




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