A Oliveira Santa

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AOliveiraSanta ISRAEL NA CARTA AOS ROMANOS

FRED R. BORNSCHEIN


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AOliveiraSanta ISRAEL NA CARTA AOS ROMANOS

FRED R. BORNSCHEIN


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Bornschein, Fred R. A Oliveira Santa : Israel na Carta aos Romanos / Fred R. Bornschein. -- Curitiba : Editora Evangélica Esperança, 2007. Bibliografia. ISBN 978-85-86249-96-9 1. Bíblia. N.T. Romanos - Comentários 2. Bíblia. N.T. Romanos - Crítica e interpretação 3. Israel (Teologia cristã) - Ensino bíblico 4. Judeus no Novo Testamento I. Título

07-2987

CDD-227.107

Índices para catálogo sistemático:

1. Carta aos Romanos : Comentários : Epístolas Paulinas 227.107 2. Romanos : Epístolas de Paulo : Comentários 227.107


SUMÁRIO Introdução.................................................................................... 09 Parte I – Exposição exegética seqüencial................................... 1. Romanos 1.16..................................................................... 2. Romanos 1.17..................................................................... 3. Romanos 2.6-11.................................................................. 4. Romanos 2.17-20................................................................ 5. Romanos 2.21-24................................................................ 6. Romanos 2.25-27................................................................ 7. Romanos 2.28-29................................................................ 8. Romanos 3.1-4.................................................................... 9. Romanos 3.9....................................................................... 10. Romanos 3.29-30................................................................ 11. Romanos 4.1-3, 9-12.......................................................... 12. Romanos 9.1-3.................................................................... 13. Romanos 9.4-5.................................................................... 14. Romanos 9.6-13.................................................................. 15. Romanos 9.20-24................................................................ 16. Romanos 9.25-33................................................................ 17. Romanos 10.1-4..................................................................

11 13 15 16 18 19 20 21 23 25 26 26 28 30 33 38 41 44


18. Romanos 10.11-13.............................................................. 19. Romanos 10.14-21.............................................................. 20. Romanos 11.1-6.................................................................. 21. Romanos 11.7-10................................................................ 22. Romanos 11.11-15.............................................................. 23. Romanos 11.16-24.............................................................. 24. Romanos 11.25-27.............................................................. 25. Romanos 11.28-29.............................................................. 26. Romanos 11.30-32.............................................................. 27. Romanos 15.8-12................................................................ 28. Romanos 15.25-27..............................................................

46 47 51 53 56 65 70 84 86 88 90

Parte II – Exposição teológico-temática..................................... 93 Introdução.................................................................................... 95 Capítulo 1 – O passado glorioso de Israel.................................. 97 1.1 – A vocação de Deus para Israel.................................. 97 1.2 – Os dons de Deus para Israel...................................... 98 1.3 – Os valores espirituais de Israel................................. 100 Capítulo 2 – A situação presente e atual de Israel..................... 103 2.1 – Israel tem prioridades, mas não privilégios.............. 103 2.2 – A dupla identidade de Israel...................................... 104 2.2.1 – Judeu exterior e judeu interior.................... 105 2.2.2 – Abraão, ancestral dos judeus e pai dos que têm fé......................................................... 105 2.2.3 – “Nem todos os de Israel são Israel”........... 106 2.2.4 – “Filhos da carne” e “Filhos da promessa”.. 108 2.2.5 – “Eleitos” e “Rejeitados”............................. 110 2.2.6 – Vasos de ira e vasos de misericórdia.......... 111 2.2.7 – O povo e o “remanescente”........................ 112 2.2.8 – Os eleitos e os endurecidos........................ 112


2.2.9 – Os ramos quebrados e os ramos reenxertados............................................... 112 2.2.10 – Inimigos, mas amados.............................. 113 2.3 – Israel rejeitado e endurecido..................................... 114 2.3.1 – Israel está rejeitado por Deus..................... 114 2.3.2 – Israel está endurecido por Deus................. 117 2.3.3 – Outras expressões que descrevem a exclusão de Israel....................................... 117 2.3.4 – A responsabilidade de Israel por sua rejeição....................................................... 118 2.3.5 – A rejeição de Israel e o benefício para os gentios........................................................ 121 2.4 – Israel eleito.................................................................122 2.4.1 – Os judeus, individualmente, podem ser salvos...........................................................123 2.4.2 – A salvação dos judeus como conseqüência do ciúme provocado pelos gentios...............125 2.4.3 – A identidade dos judeus salvos....................126 2.4.3.1 – Eles são a prova de que Deus não rejeitou seu povo.......................126 2.4.3.2 – Eles são o “remanescente eleito”..127 2.4.3.3 – Eles fazem parte do povo de Deus.................................................128 2.4.4 – A salvação para os judeus – hoje.................129 2.4.4.1 – O exemplo de judeus salvos no tempo presente.................................129 2.4.4.2 – O reenxerto dos ramos quebrados.........................................129 2.4.4.3 – Misericórdia agora........................130 Capítulo 3 – O futuro de Israel....................................................133 3.1 – A hipótese da rejeição temporária de Israel................133


3.1.1 – A visão escatológica de um futuro para Israel..........................................................133 3.1.2 – A visão escatológica de um futuro para Israel em Romanos 11...............................137 3.1.2.1 – Deus não rejeitou seu povo.........137 3.1.2.2 – “Plenitude” e “restabelecimento” como evento futuro........................138 3.1.2.3 – O enxerto escatológico dos ramos naturais................................139 3.1.2.4 – “Todo o Israel será salvo” descreve um evento futuro.................139 3.2 – A hipótese da rejeição definitiva de Israel......................................................................140 3.2.1 – Paradoxo acerca da rejeição de Israel..........................................................140 3.2.2 – O enfoque soteriológico de Paulo é presente e não futuro.................................142 3.2.3 – “Plenitude” e “restabelecimento” como consumação de um processo.....................144 3.2.4 – A alegoria da oliveira.................................146 3.2.4.1 – A oliveira é Israel........................146 3.2.4.2 – A enxertia postergada?................148 3.2.5 – Salvação para todo o Israel........................149 3.2.5.1 – O mistério revelado....................149 3.2.5.2 – Endurecimento parcial................149 3.2.5.3 – “E assim...”.................................151 3.2.5.4 – “Todo o Israel”............................152 3.2.5.5 – Virá de Sião o Libertador............153 Conclusão.....................................................................................155 Bibliografia...................................................................................157


INTRODUÇÃO

H

avendo lecionado muitas vezes sobre a epístola do apóstolo Paulo aos cristãos Romanos, percebi a relevância que Israel e os judeus ocupam nos sentimentos e nos pensamentos de Paulo. Nos capítulos 1, 2, 3, 9 - 11 e ainda no capítulo 15 dessa carta, o apóstolo, constantemente, volta sua reflexão para Israel. A literatura sobre Israel em português é escassa. Raros são os livros que tratam sobre esse assunto. Mesmo nos livros de teologia sistemática, teologia do Novo Testamento, ou ainda nos livros sobre escatologia, as menções sobre Israel e os judeus nos planos e propósitos de Deus são reduzidas. É no documento teológico principal do Novo Testamento, a epístola aos Romanos, que encontramos a maioria das referências sobre Israel. Contudo, não é de meu conhecimento nenhuma obra que trate, especificamente, da visão de Paulo sobre Israel na carta aos Romanos. Este livro pretende ser uma contribuição para preencher essa lacuna. O foco central deste livro é analisar o ensino de Paulo sobre Israel e os judeus em Romanos. Isto delimita claramente o trabalho. Não pretendo fazer um estudo abrangente sobre Israel na Bíblia toda, nem mesmo em todo o Novo Testamento, apenas na carta aos Romanos, com pequenos excursos para outros textos. Esta reflexão torna-se significativa pela relevância que Israel recebe


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nas páginas da Bíblia e no mundo geopolítico daquela época e de agora. A nação de Israel foi plantada por Deus em uma terra que é a confluência dos caminhos do mundo. O ponto de conexão entre os continentes africano, asiático e europeu passa pela estreita faixa de terra entre o Mediterrâneo e o deserto da Arábia. “Por ser um estreito de terra ligando os continentes da África, Europa e Ásia, esse lugar, e nenhum outro, estava perfeitamente situado para estender a bênção da aliança de Deus ao mundo inteiro. Foi por esse motivo que o profeta Ezequiel, mais tarde, declarou que o povo de Deus estava situado ‘na parte central da terra’, e que Jerusalém estava instalada ‘no meio dos povos (Ez 38.12; 5.5)”1. Ainda hoje Israel continua no centro das atenções do mundo. Ela é “o olho do furacão” político da humanidade e foco de atração permanente para os cristãos pela sua proeminência na Bíblia e nos planos de Deus. Uma visão clara sobre Israel é muito importante, porque o conceito teológico que uma pessoa tem sobre Israel influenciará suas posições políticas e éticas em relação a esse país e ao conflito judeu-palestino. Na medida em que cristãos ocupam lugar de relevância no cenário político, essas posições poderão ter implicações muito profundas. Robertson2 menciona um discurso feito pelo Presidente dos EUA, Bill Clinton, em 27 de outubro de 1994 diante do Knesset israelense: “Se você abandonar Israel, Deus nunca o perdoará [...], é a vontade de Deus que Israel, o lar bíblico do povo israelita, perdure para sempre”. Ele terminou sua fala afirmando: “Sua jornada é nossa jornada, e os Estados Unidos ficarão a seu lado e para sempre”. Percebemos um renovado e crescente interesse por Israel entre os evangélicos de todo o mundo. Notamos, também, uma “judaização” da liturgia em muitos círculos cristãos. Por estas razões é importante que os cristãos adquiram uma visão bíblico-teológica equilibrada sobre Israel, uma visão que também contribua para a comunhão fraterna entre cristãos judeus e gentios. Um dos objetivos deste livro é também dar uma contribuição para esse fim. Fred R. Bornschein

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ROBERTSON, 21 ROBERTSON, 11


PARTE I EXPOSIÇÃO EXEGÉTICA SEQÜENCIAL



A exposição exegética nesta parte do livro deve ser complementada com o estudo temático-teológico contido na PARTE II. A parte exegética e a parte temática se complementam.

N

este trabalho de exegese me proponho a examinar, de forma seqüencial, os textos da carta de Paulo aos Romanos que falam acerca de Israel e dos judeus. Das passagens bíblicas abordadas farei apenas a análise das partes que são pertinentes ao tema deste trabalho. No capítulo II, na Exposição Teológico-Temática, muitos dos argumentos usados na Análise Exegética serão repetidos, pela necessidade de uma explanação mais clara. A tradução usada como base textual é ALMEIDA, Bíblia Revista e Atualizada. Barueri/SP: Sociedade Bíblica do Brasil. Ed. Eletrônica, Bíblia Online 3.0, Módulo Básico Expandido. 1. Romanos 1.163 1.16 Não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego. Paulo se refere aos membros do povo de Israel chamando-os de “judeus” (jIouda/iw – Ioudaio). Esta era uma maneira comum e usual de se 3

Cf. “Israel tem prioridade, mas não privilégios”, item 2.1, pg. 103.


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referir ao povo de Israel e ele a usa onze vezes4 na carta aos Romanos5. “O nome ‘judeu’ foi utilizado pela primeira vez no Antigo Testamento em 2 Reis 16.6. Nos tempos exílicos e pós-exílicos, foi usado com freqüência. O uso que Paulo faz desse nome indica que, na mente dos judeus, ele estava vinculado a tudo aquilo de que se ufanavam”6. Para distinguir os judeus dos demais povos da terra, Paulo se refere aos gentios usando a expressão “grego” (}Ellhni - Elleni)7. A locução “judeus e gregos” engloba toda a humanidade. Esta divisão desigual da humanidade em dois grupos, de um lado o pequeno povo de Israel e do outro todo o restante do gênero humano, se deve unicamente à revelação de Deus a Israel. Deus escolheu, chamou, salvou o povo de Israel. Com ele Deus fez o pacto do Sinai e lhe deu a sua palavra e as suas leis. Deus o vocacionou para ser uma bênção para o mundo. Deus enviou Seu Filho aos judeus (Rm 9.5) e Jesus viu sua missão prioritária dirigida ao povo de Israel (Mt 15.24). Devido a isto Paulo usa o advérbio de prioridade: “primeiro” (prw=ton - prôton) referindo-se aos judeus. A Bíblia de Jerusalém8 afirma que “os judeus são os primeiros na economia histórica da salvação”. Israel tem prioridade nos planos redentores de Deus, mas não tem privilégios. Os “judeus” e os “gregos” podem ser salvos e o modo de salvação é idêntico para ambos: a fé (“todo aquele que crê”). Não há um caminho de salvação diverso ou prioritário para os judeus. Murray9 expõe: “A analogia das Escrituras parece indicar que essa relevância acerca dos judeus se fundamenta no fato de que eles haviam sido escolhidos por Deus para serem os beneficiários da promessa do evangelho, tendo-lhes sido entregues os oráculos de Deus. A salvação pertencia aos judeus (Jo 4.22; cf. At 2.39; Rm 3.1,2; 9.4,5). As diretrizes preparatórias para uma 4

ALMEIDA usa “judeus” em Rm 3.2, mas esta palavra não é usada no original grego. Menos comum é Paulo se referir ao povo eleito chamando-os de ‘israelitas’. Esta expressão é usada três vezes por Paulo em Romanos (9.4; 9.6; 11.1). Outra expressão usada por Paulo cinco vezes (2.26; 3.30; 4.9; 4.12; 15.8) é a metonímia “circuncisão”, “circunciso” nas formas substantiva e adjetiva. Contudo a forma mais freqüente de Paulo se referir ao povo eleito é chamando-os pelo coletivo “Israel”. Ele usa esta expressão dez vezes em Romanos. 6 MURRAY, 110 7 Quando em 1.14 Paulo fala de seu ministério entre os gentios ele faz uma distinção entre os “gregos” e os “bárbaros”. CHAMPLIN (573) explica que “essa é uma divisão convencional, feita pelos gregos, em relação à humanidade – uma diferenciação feita entre gregos e não-gregos”. 8 Bíblia de Jerusalém, 1966. 9 MURRAY, 57,58 5


Exposição exegética seqüencial -

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revelação mais completa do evangelho foram lançadas em Israel, e, por esse motivo, o evangelho, de maneira preeminente, visa aos judeus”.

2. Romanos 1.1710 1.17 Visto que a justiça de Deus se revela no evangelho, de fé em fé, como está escrito: O justo viverá por fé. Ao falar da “justiça de Deus” (dikaiosu/nh Qeou= - diacaiosúnê Theoû) já no início de sua carta, Paulo aborda o que terá importância fundamental em toda sua argumentação em relação à salvação e a Israel. A “justiça de Deus” é conceito teológico chave na primeira parte da carta de Paulo aos romanos. O evangelho, de acordo com Paulo, é a “revelação da justiça de Deus”. Esta expressão pode ser entendida, de acordo com Rienecker11, como: “A posição justa dada por Deus”; “o caráter justo que pertence a Deus”; “a atividade justa que procede de Deus”. Ela pode também ter um duplo significado: a justiça pessoal de Deus, e a justificação que ele concede aos pecadores, declarando-os e aceitando-os como justos. Stott12 explica:

Parece legítimo afirmar, portanto, que a ‘justiça de Deus’ é a iniciativa justa tomada por Deus ao justificar pecadores consigo mesmo, concedendolhes uma justiça que não lhes pertence, mas que vem do próprio Deus. ‘A justiça de Deus’ é a justificação justa do injusto, sua maneira justa de declarar justo o injusto, através da qual ele demonstra sua justiça e, ao mesmo tempo, nos confere justiça. Ele o fez através de Cristo, o justo, que morreu pelos injustos, como Paulo explica mais adiante. E ele o fez pela fé quando confiamos nele, clamando a ele por misericórdia.

Para entendermos o conceito paulino de “justiça de Deus” em Romanos, é importante considerarmos a vinculação dessa justiça com o evangelho. A “justiça de Deus” só pode ser compreendida à luz do evangelho. O evangelho nos mostra como o homem pode ser salvo, como pode receber de Deus a justificação, como um Deus justo pode justificar o pecador. Por meio do evangelho Deus pode “ser justo e o justificador daquele que tem fé em 10

Cf. “A responsabilidade de Israel por sua rejeição”, item 2.3.4 (b), pg. 118. Rienecker, 256 12 STOTT, 68 11


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Jesus” (3.26). A Bíblia de Genebra13 (1318) oferece a seguinte explicação: Essa frase-chave da epístola aos Romanos (3.21; 5.19; 10.3) é regularmente explicada na epístola como “justiça... através da fé” (3.22; 9.30; 10.6). A justiça de Deus é demonstrada na retidão de Cristo que é imputada ou considerada por Deus como pertencente aos crentes. Essa imputação da retidão aos pecadores que crêem é plenamente coerente com a retidão pessoal de Deus. Na qualidade de juiz justo e reto (2.5-16), Deus justifica ou declara reto, por meio da morte de seu Filho, aqueles pecadores que confiam em Cristo com verdadeira fé (3.21-26; 5.10).

Portanto, a “justiça de Deus” é a obra graciosa de Deus em atribuir “justiça” a quem não a merece nem é digno dela. A “justiça de Deus” é Deus justificar, declarar como justa a pessoa que crê em Jesus Cristo (“de fé em fé”; “o justo viverá por fé”). O conceito da “justiça de Deus” é tão importante em relação a Israel porque ele foi o divisor de águas no que diz respeito à aceitação ou rejeição dos judeus. Paulo, em 10.3, afirma que os judeus “desconhecendo a justiça de Deus e procurando estabelecer a sua própria, não se sujeitaram à que vem de Deus”. A “justiça de Deus” é a que vem da fé, “a sua própria justiça” é a tentativa de ser justo diante de Deus pelas suas obras. Paulo afirma que os judeus não alcançaram “a lei de justiça” apesar de a buscarem (9.31) “porque não decorreu da fé, e sim como que das obras. Tropeçaram na pedra de tropeço” (9.32). 3. Romanos 2.6-1114 2.6 [Justo juízo de Deus] que retribuirá a cada um segundo o seu procedimento: 2.7 a vida eterna aos que, perseverando em fazer o bem, procuram glória, honra e incorruptibilidade; 2.8 mas ira e indignação aos facciosos, que desobedecem à verdade e obedecem à injustiça. 2.9 Tribulação e angústia virão sobre a alma de qualquer homem que faz o mal, ao judeu primeiro e também ao grego; 2.10 glória, porém, e honra, e paz a todo aquele que pratica o bem, ao judeu primeiro e também ao grego. 13 14

A Bíblia de Genebra, 1318 Cf. “Israel tem prioridade, mas não privilégios”, item 2.1, pg. 103.


Exposição exegética seqüencial -

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2.11 Porque para com Deus não há acepção de pessoas. Neste texto Paulo, aparentemente, contradiz seu ensino acerca da salvação pela fé e não pelas obras. Essa impressão é apenas aparente por duas razões: a) O foco desta perícope está, não no meio da salvação, mas na imparcialidade de Deus em seu juízo e julgamento. Diante do tribunal de Deus não haverá favoritos e favorecidos. As pessoas serão julgadas, não pela pertença a qualquer raça, povo ou grupo religioso, mas por razões inerentes a cada indivíduo. No julgamento os judeus não serão preferidos, nem os “gregos” preteridos. Os judeus, mesmo sendo o povo escolhido de Deus, não terão um tratamento diferenciado da parte dele, pois “para com Deus não há acepção de pessoas” (2.11). b) Em segundo lugar, este texto não contradiz o ensino de Paulo acerca da salvação unicamente pela fé. Teoricamente, se uma pessoa sempre “praticasse o bem” (7,10) e “evitasse o mal” (9), seria salva. Se ela sempre “perseverasse em fazer o bem, procurando glória, honra e incorruptibilidade” (7), sem jamais “desobedecer à verdade” (8) e jamais “obedecendo à injustiça” (8) seria salva. Entretanto o fato é que ninguém consegue viver dessa maneira “pois todos pecaram e carecem da glória de Deus” (3.23). Todos necessitam, portanto, ser “justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus” (3.24) Mais uma vez, nos versículos 9-11, Paulo destaca que os judeus são os “primeiros”. Esta expressão não indica uma posição de prediletos e preferidos, mas de prioridade. Paulo já mencionou que eles são os “primeiros” como destinatários do evangelho (1.16), agora afirma que são os “primeiros” na sua responsabilidade diante de Deus. Os judeus são os “primeiros” (prw=ton - prôton) no castigo (2.9) e os primeiros (prw=ton prôton) na recompensa (2.10).


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4. Romanos 2.17-20 2.17 Se, porém, tu, que tens por sobrenome judeu, e repousas na lei, e te glorias em Deus; 2.18 que conheces a sua vontade e aprovas as coisas excelentes, sendo instruído na lei; 2.19 que estás persuadido de que és guia dos cegos, luz dos que se encontram em trevas, 2.20 instrutor de ignorantes, mestre de crianças, tendo na lei a forma da sabedoria e da verdade. Nestes versículos temos uma série de onze auto-afirmações dos judeus que se julgavam justos pelos privilégios espirituais que possuíam, e, portanto, de forma nenhuma pecadores como os demais homens. Com esta atitude de autojustiça se fecharam para a mensagem do arrependimento e para a necessidade da fé em Jesus Cristo. a) Eram judeus (17) e como tal, descendentes de Abraão, membros do povo escolhido de Deus. b) Repousavam na lei (17). Eles se “apoiavam”, se “refrigeravam” na lei que era o elemento essencial de sua religião e de suas vidas. c) Gloriavam-se em Deus (17). Eles conheciam e serviam ao Deus único e verdadeiro. d) Conheciam a vontade de Deus (18). Literalmente no grego diz simplesmente que conheciam “a vontade”, pois a vontade de Deus é a “vontade por excelência”. e) Aprovavam as coisas excelentes (18). Sabiam diferenciar entre o certo e o errado e aprovavam, pelo menos em teoria, aquilo que era bom e excelente. f) Eram instruídos na lei (18). Toda a vida judaica, todas as secções da sociedade judaica eram permeadas por sua religião. Os mestres da lei eram as pessoas mais distinguidas na sociedade e eram, também, as autoridades civis. g) Consideravam-se guias dos cegos (19). Esta declaração prova-


19 velmente inclui toda espécie de gente, mas se refere, de modo particular, aos “gentios” que os judeus consideravam “cegos por excelência”. Luz dos que se encontram em trevas (19). “Os mestres judaicos da lei tinham os títulos comuns de ‘lâmpada de luz’, ‘lâmpada santa’, ‘lâmpada de Israel’. Isso nos mostra como os mestres judeus se ufanavam de serem luzes, para os gentios e para o próprio povo de Israel”15. Instrutores de ignorantes (20). “Ignorantes” eram consideradas as pessoas do próprio do povo de Israel que não eram instruídas na lei de Deus. Os fariseus disseram: “Esta plebe que nada sabe da lei é maldita” (Jo 7.49). Porém, mais “ignorantes” ainda eram os gentios e os judeus se esforçavam para ganhá-los para a sua fé16. Mestre de crianças (20). O termo “crianças” pode se referir aos neoconvertidos ao judaísmo, aos novos prosélitos, ou, literalmente às crianças. Tinham na lei de Deus a sua fonte de sabedoria e da verdade (20). Para o judeu piedoso, a “lei de Deus” era a essência da sabedoria e da verdade. Eles procuravam seguir o exemplo de Esdras que “tinha disposto o coração para buscar a Lei do Senhor, para cumpri-la e para ensinar em Israel os seus estatutos e os seus juízos” (Ed 7.10). Exposição exegética seqüencial -

h)

i)

j)

k)

5. Romanos 2.21-24

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2.21 Tu, pois, que ensinas a outrem, não te ensinas a ti mesmo? Tu, que pregas que não se deve furtar, furtas? 2.22 Dizes que não se deve cometer adultério e o cometes? Abominas os ídolos e lhes roubas os templos? 2.23 Tu, que te glorias na lei, desonras a Deus pela transgressão da lei?

CHAMPLIN, 599 Jesus disse: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque rodeais o mar e a terra para fazer um prosélito” (Mt 23.15). 16



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