Armadilha do poder - tiranos na igreja

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1ª edição Tradução: Doris Korber

Curitiba 2014


Martina e Volker Kessler

Armadilha do poder: tiranos na igreja Coordenação editorial: Walter Feckinghaus

Tradução: Doris Korber Revisão: Josiane Zanon Moreschi Edição: Sandro Bier Capa: Sandro Bier Ilustrações: Brunnen Verlag Gießen Editoração eletrônica: Josiane Zanon Moreschi Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Kessler, Volker Armadilha do poder : tiranos na igreja / Martina e Volker Kessler ; tradução Doris Korber. - - 1. ed. - - Curitiba : Editora Esperança, 2014. Título original: Die Machtfalle: Machtmenschen in der Gemeinde Bibliografia ISBN 978-85-7839-105-8 1. Cristianismo 2. Igreja Católica 3. Teologia I. Kessler, Martina. II. Título 14-09431

CDD-230

Índices para catálogo sistemático: 1. Teologia : Cristianismo 230 Salvo indicação diferente, os textos bíblicos citados foram extraídos da tradução Almeida Revista e Atualizada, Sociedade Bíblica do Brasil, 1988, 1993. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total e parcial sem permissão escrita dos editores. Editora Evangélica Esperança

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Sumário

Apresentação à 1ª edição...................................................7 Prefácio à 4ª edição............................................................9 I. Tiranos na igreja do Novo Testamento...................19 1. Profecias sobre tiranos..........................................19 2. Diótrefes – um tirano típico...................................21 3. Tiranos e a liderança servidora............................28 4. Abuso de poder no Antigo Testamento...............33 5. O apóstolo João – um tirano convertido?...........36 6. Falsos mestres e tiranos.......................................37 II. Características pessoais dos tiranos........................41 1. Tirano ou dominador?...........................................41 2. Táticas de tiranos...................................................45 3. Como alguém pode se transformar em tirano?...................................56 4. Poder como alvo ou como método?..................62


5. Há esperança para tiranos?................................63 6. Testemunho: “Eu era uma tirana”......................65 7. Questionário: Sou um tirano ou um líder-servo?................................................71 III. O sistema do poder: colaboradores e vítimas.....................................................................73 1. A responsabilidade dos “colaboradores”........73 2. Oito motivos pelos quais os tiranos têm vida fácil nas igrejas...................................75 3. Colaboradores e vítimas típicos.........................80 IV. Orientações para lidar com tiranos......................99 1. Como abordar problemas relacionados ao poder?........................................99 2. Questionário: Luta por poder ou tirania?............................................................103 3. Dicas práticas......................................................110 V. Tiranos no campo missionário (Klaus W. Müller).....................................................117 1. Perigos específicos para missionários............117 2. Soluções possíveis...............................................129 Referências bibliográficas..............................................135


Apresentação à 1a edição

“O poder é uma bebida forte e exige um estômago forte”, diz o escritor britânico Peter Howard em sua peça de teatro “A escada”. Ser corrompido pelo exercício do poder provavelmente era e é a tentação por excelência para a humanidade; não foi somente Lúcifer que caiu por causa dele. Em última análise, somente o Espírito de Jesus Cristo pode nos proteger contra esse perigo capital que tantas vezes se insinua de forma sorrateira e despercebida. Jesus venceu essa tentação diabólica logo no início de sua atuação pública. Desde a organização da Academia de Líderes Cristãos (AcF, na sigla em alemão) em 1997, o ponto central da nossa missão é qualificar líderes cristãos com competências bíblicas, seguindo o exemplo deixado por Jesus. Queremos aprender com o humilde Filho do Homem, cujo poder e dinâmica vinham da sua completa submissão à vontade do Pai e de sua postura como líder servo. Seu exemplo é o modelo da filosofia de liderança da AcF.


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Por isso fiquei empolgado com a proposta de usar o tema “tiranos”. Uma das nossas principais tarefas é sensibilizar principalmente os líderes cristãos contra o perigo do exercício abusivo do poder. Know how not (saber como não fazer) é tão importante quanto o know how (saber como fazer). Faz parte da melhor tradição bíblica apresentar ao ser humano suas oportunidades e riscos, o caminho da bênção e da maldição. Somente quem é sensível aos perigos do exercício do poder cristão pode se proteger contra eles ou “prevenir-se” em tempo. A conscientização sobre os danos decorrentes do abuso do poder precisa gerar a determinação de exercitar, viver e disseminar de forma consequente o modelo de liderança ensinado por Jesus: Quem quiser tornar-se grande (influente, famoso, importante) entre vós, será esse o que vos sirva (Mt 20.26). Desejo que este livro, que nasceu da experiência prática nas igrejas e dá dicas preciosas, se torne amplamente conhecido, para abençoar e edificar a Igreja de Jesus Cristo. Karl Schock Presidente do conselho diretor da AcF


Prefácio à 4a edição

Quando escrevemos este livro no ano 2000, muitas pessoas reagiram com espanto: “Tiranos – e isso existe na igreja?” As reações ao nosso livro confirmaram de forma drástica: “Sim, isso existe. Infelizmente!” Naquela época, a primeira edição esgotou-se em meio ano. Grande parte do retorno que recebemos então levou a uma terceira edição bastante ampliada em 2004. Neste meio tempo, também esta edição foi esgotada. Aparentemente o problema continua existindo. Nós nos sentimos divididos em relação ao sucesso deste livro. Como autores, ficamos felizes quando as pessoas perguntam por nossa obra. Mas essa alta demanda, ao mesmo tempo, nos deixa muito tristes. As boas vendas refletem o sofrimento e as lágrimas por trás de tudo isso. Muitos cristãos contam que se sentiam (ou sentem) presos em uma rede de abuso de poder. Apesar da variedade de experiências, há entre elas paralelos supreendentes.


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A força destes paralelos fica comprovada pelo retorno recebido em palestras, artigos e edições anteriores deste livro: uma pessoa entrou em contato com o redator chefe de uma revista perguntando de onde conhecíamos sua igreja. Ele tinha certeza de que as descrições se referiam à igreja dele. Na verdade não conhecíamos aquela igreja específica. Alguém de outra igreja ligou para um consultor de igrejas e questionou-o: “Você passou as informações da nossa igreja, que lhe demos em conversas confidenciais, aos autores do livro?” Também neste caso não conhecíamos a igreja nem tínhamos recebido qualquer informação sobre ela. O abuso do poder segue determinados padrões. Este livro mostra padrões dessas armadilhas do poder e aponta soluções possíveis.

Tiranos = viciados em poder Ao usar o termo “tirano” referimo-nos a pessoas “viciadas em poder”. A maioria das pessoas sente necessidade de ter certa medida de poder. Quem cede continuamente a esses pensamentos e anseios pode tornar-se viciado em poder. Há uma diferença entre passar dos seus limites ou abusar do poder de forma eventual e fazê-lo de forma constante, assim como há uma diferença entre embriagar-se uma vez e ser alcoólatra. Não estamos querendo, com isso, enfeitar o abuso eventual do poder. Mas é importante conhecer a diferença. Muitos líderes à frente de algum grupo acabam ultrapassando seus limites no calor da batalha. Eu (Volker) já tomei


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decisões em relações às quais percebi mais tarde que deveria ter consultado outras pessoas a respeito. Ao ser confrontado com isso, me arrependi e mudei minha atitude na ocasião seguinte. Personalidade é a forma como normalmente vemos as coisas e comumente encaramos e lidamos com as pessoas. Manipular alguém ou uma situação de maneira indevida ocasionalmente ainda não define uma personalidade como manipuladora. A continuidade de determinado pecado, no entanto, faz a pessoa adoecer, como ensina Jeremias 13.23: Pode, acaso, o etíope mudar a sua pele ou o leopardo, as suas manchas? Então, poderíeis fazer o bem, estando acostumados a fazer o mal.

Três perigos deste livro O tema “abuso de poder” esconde três perigos. O primeiro é não querer reconhecer a existência do fenômeno “tiranos na igreja”. Isso banaliza situações doentias. É importante dar nome aos bois, como o apóstolo João fez ao dizer claramente que Diótrefes gostava de ser o mais importante na igreja (3Jo 9). Em certa ocasião conversamos com um pastor sobre alguns problemas em sua igreja. Um ano depois, ele nos contou que aquela conversa o ajudara a esclarecer sua posição na igreja. Quando quisemos saber detalhes, ele respondeu: “Acredito que o simples uso da palavra ‘tirano’ já me ajudou a entender de forma correta aquilo que eu estava passando”.


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O segundo perigo é que surja – talvez inspirada por livros como este – uma caça às bruxas. Algumas pessoas começam a analisar os membros de sua igreja em busca de tiranos e passam a rotular outras pessoas dessa forma. Este tipo de comportamento também já causou divisões em igrejas. Esta não é a nossa intenção. Descrever alguém como tirano também pode configurar abuso de poder! O terceiro perigo é que, devido a trauma com o abuso de poder, a pessoa passe a ter medo de qualquer exercício de poder que seja. Há dois extremos no uso errado do poder: o primeiro é o abuso. É dele que trata este livro. O segundo extremo é abrir mão completamente do poder. Quando os líderes de uma organização – e isso também vale para as igrejas cristãs – não usam o poder que lhes foi confiado, surge um vácuo. Este vácuo será preenchido por outras pessoas, que assumirão o controle de forma informal. Um vácuo no poder é um convite para que os tiranos se aproveitem da situação. Dessa forma, também o segundo extremo acaba levando de volta ao primeiro, justamente àquele que se queria evitar: o abuso do poder. Por isso, este livro também não se dirige contra o uso do poder em si, mas contra o abuso por parte dos tiranos.

Tiranos em outras áreas da vida Os tiranos não agem somente nas igrejas. Ao longo dos anos também ouvimos muitos testemunhos de experiências com tiranos em outras áreas da vida. Nesses


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momentos o autor sempre se pergunta se não seria o caso de escrever um livro específico para aquele determinado contexto. Até agora não consideramos necessário dar esse passo. Apesar das diferenças de contexto, os sistemas de tirania são espantosamente parecidos. Uma mulher, cuja mãe provavelmente tinha tendências claras à tirania, nos disse: “Vocês estão descrevendo minha mãe?” Não era o que tínhamos feito, mas ainda assim essa mulher tinha reconhecido sua mãe com clareza na descrição dada. Portanto as características dos tiranos que descrevemos aqui podem ser úteis em diferentes áreas da vida. Ao mesmo tempo, diferentes sistemas de tirania precisam de diferentes medidas para obter transformação ou libertação. Este seria um ponto a favor de livros específicos para cada contexto. No entanto, há dois problemas: em primeiro lugar, as situações têm níveis diferentes de sutileza e, em segundo, é difícil dar respostas genéricas – as únicas que um livro pode dar – a sistemas de tirania, porque se trata de sistemas orientados por processos e que envolvem pessoas dos mais diferentes tipos. Para obter transformação real, é preciso enfrentar um processo individual de análise e reflexão orientado para soluções com acompanhamento competente. Se ao ler este livro você perceber que está preso em um sistema de tirania, o melhor a fazer é buscar esse tipo de ajuda.


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Estrutura deste livro O principal objetivo deste livro é fortalecer os fracos e levantar a “cana quebrada” (Is 42.3). Isso inclui reconhecer e definir perigos, e então mostrar formas de lidar bem com eles. O primeiro capítulo investiga referências bíblicas sobre tiranos na igreja. No segundo, avaliaremos experiências com tiranos. É impressionante o testemunho de uma jovem, cujo nome não citamos aqui, mas que conhecemos pessoalmente, que se reconheceu como tirana. Ela nos autorizou a incluir esse relato. O terceiro capítulo descreve o sistema de tirania composto por atores, coadjuvantes e vítimas. Um tirano só consegue obter sucesso quando há um sistema que o apoia. Por isso é importante entender o sistema da tirania para conseguir escapar de suas armadilhas. O quarto capítulo oferece outras ajudas para situações em que há suspeita de abuso de poder. Em um artigo especial, o prof. dr. Klaus W. Müller, missiólogo na Faculdade Livre de Teologia em Gießen, descreve os aspectos específicos do abuso do poder no trabalho missionário. As experiências relatadas neste livro são todas verdadeiras. Elas nos foram relatadas pelos próprios envolvidos. Em alguns casos, alteramos alguns detalhes para proteger a privacidade deles.

O lado positivo do poder Este livro descreve o lado escuro do poder. Mas também há um lado positivo (que hoje vemos com mais clareza do que na época do lançamento da primeira edição


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do livro). O lado positivo é desenvolvido em detalhes em um novo livro, “Vier Führungsprinzipien der Bibel. Dienst, Macht, Verantwortung und Vergebung” [Quatro princípios de liderança na Bíblia. Serviço, poder, responsabilidade e perdão].1 Ao criar o ser humano, Deus lhe deu a capacidade de exercer o poder: Também disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; tenha ele domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre todos répteis que rastejam pela terra (Gn 1.26). Este texto liga a tarefa de dominar diretamente com o fato de o ser humano ter sido criado à imagem e semelhança de Deus. Ser semelhante a Deus significa ser seu representante.2 Como representante de Deus o ser humano tem a tarefa e a habilidade de exercer poder. O ser humano tem poder porque Deus o criou assim. Por isso o teólogo católico, Romano Guardini, enfatiza: “Por si só o poder não é bom nem mau, mas recebe seu significado somente a partir das decisões daquele que o usa. Dessa forma, o poder representa tanto oportunidade para o bem e para a edificação quanto perigo para o mal e para a destruição”.3 1 2

3

Veja capítulo 3 em Kessler, Volker. Vier Führungsprinzipien der Bibel. (Gießen: Brunnen, 2012.) Mais sobre a imagem e semelhança do ser humano em relação a Deus em: Volker Kessler, Ein Dialog zwischen Managementlehre und alttestamentlicher Theologie: McGregors Theorien X und Y zur Führung im Lichte alttestamentlicher Anthropologie. Dissertação de doutorado em Teologia Prática na Universidade da África do Sul (Unisa), 2004, p. 197-238. Romano Guardini, Das Ende der Neuzeit. Die Macht (4ª ed. da obra reunida). (Mainz: Matthias-Grünewald; Paderborn: Ferdinand Schöningh, 2001), p. 105.


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O poder não é intrinsecamente negativo, ainda que a palavra tenha adquirido, para muitas pessoas, uma conotação ruim. Muitos veem a cultura da liderança cristã em oposição à condução com poder. Mas essa constatação só é correta quando o significado de “poder” for restrito a “poder formal” ou “poder com violência”. Quando entendemos corretamente a natureza do poder, uma coisa fica clara: não há como liderar sem poder. Quem estuda o abuso de poder e, ao mesmo tempo, ocupa posições de liderança, precisa se perguntar: “Como posso liderar sem abusar do poder? Como líder, qual é a forma correta de lidar com resistências?” É raro que todas as pessoas em um grupo tenham a mesma opinião. Como um líder pode obter sucesso em alcançar seus objetivos e, ao mesmo tempo, conservar toda a sua equipe, inclusive moralmente? Esse assunto merece uma exposição detalhada que ultrapassa o escopo deste livro. Afinal, como já dissemos, o presente livro trata do lado escuro do poder. Para aprender sobre o uso positivo do poder, queremos indicar literatura e cursos sobre o tema “liderança servidora”. Queremos encorajá-lo a assumir responsabilidades no Reino de Deus e a liderar como um servo.

Palavras de gratidão Muitas das respostas que recebemos às nossas palestras e às primeiras edições deste livro contribuíram para esta edição. Uma lista completa de pessoas ficaria


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longa demais. Alguns nomes teriam que ficar de fora para proteger a privacidade destas pessoas. Por isso, queremos nos limitar a um agradecimento geral – de coração – aos que nos honraram com sua confiança e expectativas nas conversas pessoais. Aprendemos muito com vocês. Martina e Volker Kessler*

* Comentários e observações podem ser enviados por e-mail para Martina.Kessler@acf.de ou Volker.Kessler@acf.de




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