Treinando obreiros

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TREINANDO OBREIROS


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Copyright ©2004, Editora Evangélica Esperança Publicado no Brasil com a devida autorização e com todos os direitos reservados pela:

Editora Evangélica Esperança Rua Aviador Vicente Wolski, 353 82510-420 Curitiba-PR E-mail: eee@esperanca-editora.com.br Internet: www.esperanca-editora.com.br Editora filiada à ABEC e a CBL

Título do original em alemão: Das Trainingsprogramm für Mitarbeiter – biblische Grundsätze, didaktische Hinweise, praktische Modelle © 1996 Brunnen Verlag Giessen, Alemanha Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial sem permissão escrita dos editores. Tradução: Tusnelda Eltermann Braga As citações bíblicas foram extraídas da Edição Revista e Atualizada 2ª edição (1993) da tradução João Ferreira de Almeida da Sociedade Bíblica do Brasil, salvo quando outra fonte for indicada.


TREINANDO OBREIROS Princípios Bíblicos Conselhos Didáticos Modelos Práticos

CRAIG OTT Tradução Tusnelda Eltermann Braga


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Ott, Craig, 1952Treinando Obreiros: princípios bíblicos, conselhos didáticos, modelos práticos / Craig Ott; tradução Tusnelda Eltermann Braga. - Curitiba, PR: Editora Evangélica Esperança, 2004. Título original: Das Trainingsprogramm für Mitarbeiter Bibliografia. ISBN 85-86249-78-5 1. Obreiros - Educação 2. Obreiros - Igreja - Ensino bíblico 3. Obreiros - Treinamento I. Título. 04-5403

CDD-268.3

Índice para catálogo sistemático: 1. Obreiros: Treinamento: Formação bíblica: Educação religiosa: Cristianismo 268.3


Sumário Prefácio 1. Treinamento de obreiros: uma tarefa esquecida................................ 9 Treinamento de obreiros: o departamento mais negligenciado na estruturação da igreja....................................................11 O que é “Treinamento de Obreiros”?..................................................................13 O maior impedimento para o treinamento de obreiros: pressuposições falsas.............................................................................................14 Qual é o papel do pastor da igreja no treinamento de obreiros?....................17 Por que fazer treinamento de obreiros na igreja local?.................................... 21 Treinamento de obreiros para servos da igreja, não para líderes da igreja......................................................................................23 A igreja necessita de novos modelos de treinamento.......................................25 Bibliografia complementar................................................................................... 26

2. Treinamento de obreiros à luz da Bíblia: examinar exemplos e traçar objetivos....................................................................27 Ensino e aprendizagem no tempo de Jesus ........................................................28 Jesus e os doze ........................................................................................................31 Os objetivos do treinamento de Jesus................................................................. 31 O apóstolo Paulo e seus discípulos..................................................................... 47 Cinco conceitos fundamentais para o treinamento de obreiros em nossos dias ....................................................................................................... 54 Bibliografia complementar................................................................................... 59

3. Em que condições temos maior facilidade de aprendizagem? Visão pedagógica........................................................ 61 Aprendizagem diferente do método escolar..................................................... 62 Adultos aprendem de forma diferente de crianças...........................................67


Novas tendências para um treinamento eficaz............................................... 71 Bibliografia complementar................................................................................. 93

4. Com que métodos temos maior facilidade de aprendizagem? Visão didática.............................................................95 Métodos orientados para a experiência............................................................95 Métodos próximos da realidade........................................................................99 Métodos voltados para o participante.............................................................. 100 Métodos variados.................................................................................................104 Métodos reflexivos...............................................................................................105 A escolha dos métodos........................................................................................107 A utilização de estudos de casos....................................................................... 109 Bibliografia complementar................................................................................. 116

5. Preparo para o treinamento de obreiros.............................................117 O preparo do pastor............................................................................................ 117 O preparo da igreja..............................................................................................120 O preparo de um conceito global de treinamento.......................................... 122 O preparo dos participantes...............................................................................134 Bibliografia complementar................................................................................. 138

6. Modelos para o treinamento de obreiros........................................... 139 O ciclo de treinamento e o treinamento em grupos........................................141 Treinamento de obreiros segundo o modelo mentor-aprendiz....................149 Bibliografia complementar................................................................................. 163

7. Aconselhamento espiritual e encorajamento de obreiros...............165 Obreiros como um alvo importante no aconselhamento espiritual.............166 Tipos de aconselhamento espiritual..................................................................169 Perigos especiais na vida dos obreiros............................................................. 172 O acompanhamento pessoal de obreiros..........................................................178 Conflitos interpessoais........................................................................................ 181 Encorajamento......................................................................................................183 Bibliografia complementar................................................................................. 191

Referências bibliográficas.........................................................................193


PREFÁCIO

EM NOSSOS DIAS sentimos grande falta de obreiros qualificados e engajados dentro de nossas igrejas e comunidades. Muitas vezes, exigimos que os membros da igreja sejam ajudados a descobrir e colocar em prática os seus dons. Mas afinal, onde é oferecida uma ajuda prática e eficaz, no âmbito da igreja local, para ajudá-los a descobrir e a desenvolver os seus dons? Até os nossos dias, isso tem dependido essencialmente da iniciativa individual. No melhor dos casos, os obreiros são enviados ocasionalmente para treinamentos em algum outro local. Via de regra, porém, não se encontram obreiros qualificados com muita facilidade. Um estudo pessoal e autodidata será suficiente somente em bem poucos casos. Obreiros devem, sem dúvida, ser treinados e acompanhados. Esta é uma das atividades mais importantes do pastor e da liderança da igreja. Enquanto existe uma enorme quantidade de literatura sobre a teoria e a prática da instrução de adultos no âmbito das escolas públicas, e sobre os trabalhos de formação profissional dentro das empresas, existe muito pouco sobre a área de instrução e de treinamento dentro das igrejas cristãs e nas organizações filantrópicas voluntárias. A presente obra é uma tentativa de preencher essa


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lacuna. Ela está fundamentada na convicção não só de que é possível, mas também, de que é urgentemente necessário oferecer um programa de treinamento aos líderes das igrejas, que não sobrecarregue os obreiros nem exceda aos meios disponíveis na igreja local. Trata-se principalmente da necessidade de despertar uma profunda consciência para um programa de treinamento dessa natureza e intermediar o conhecimento prático necessário. Este livro surgiu como resultado da experiência de mais de quinze anos no ministério pastoral, e de vários anos de pesquisa para uma dissertação sobre o assunto. O presente trabalho é essencialmente direcionado às necessidades e perguntas diárias do ministério da igreja. Por este meio, deverá ser oferecido ao pastor muito atarefado ou ao dirigente da igreja, um manual prático e de fácil acesso, que o ajudará no exercício de seu ministério. Quero expressar meu especial agradecimento a dois professores da Trinity Evangelical Divinity School (Deerfield/Chicago): meu orientador de doutorado, Prof. Dr. Ted Ward, que acompanhou esta pesquisa ajudando com os seus conselhos e encorajamento, e o Prof. Grant Osborne pelas suas ricas sugestões e correções no capítulo dois. Também, quero agradecer à Igreja Evangélica Livre dos Estados Unidos, que possibilitou o trabalho de pesquisa, e aos muitos obreiros e pastores da Convenção da Igreja Evangélica Livre na Alemanha, que forneceram informações preciosas para o término do trabalho. Também agradeço à Sra. R. Laik e à Sra. M. Laik Schwab a correção dos manuscritos e ao Sr. H. Jablonski, da editora Brunnen, a revisão do manuscrito. Em especial agradeço à minha esposa que me apoiou com amor e paciência.

Craig Ott


1 TREINAMENTO DE OBREIROS: UMA TAREFA ESQUECIDA

KARIN ESTAVA ATIVA na igreja havia quatro anos. Sempre de novo pessoas chegavam até ela para conversarem abertamente sobre os seus problemas pessoais. Alguns a encorajaram, dizendo que deveria ajudar na equipe de aconselhamento da igreja. Parecia óbvio que ela possuía o dom para isso. Mesmo não tendo nenhuma experiência no ministério de aconselhamento e não sabendo exatamente o que viria sobre ela, ela decidiu colaborar. No encontro ministerial da equipe de aconselhamento, discutiram-se primordialmente assuntos organizacionais e ela acabou não recebendo nenhuma instrução para o ministério de aconselhamento. Na primavera, foi oferecido um seminário de final de semana em uma cidade a 100 km de distância, mas ela não pôde ir por causa dos filhos pequenos. Após dois meses de trabalho como colaboradora, ela percebeu o quanto estava sobrecarregada. Ela não soube como lidar com os problemas e com as perguntas das pessoas, das quais ela cuidava. De repente ela chegou à conclusão de que não tinha realmente o dom e acabou abandonando o ministério. Frank é líder de um grupo familiar há um ano. Ele está muito feliz com essa tarefa e também procura se engajar ao máximo. No entan-


to, sente muita dificuldade em preparar um bom estudo bíblico. Os participantes quase não se envolvem na discussão, e ele não tem muito sucesso em explanar o significado de um texto bíblico. Uma vez ele participou de um treinamento para líderes de estudos bíblicos. Mesmo tendo achado tudo muito teórico, voltou para casa com novo entusiasmo. Porém, não conseguiu colocar em prática com facilidade os estímulos que recebera. Os bons propósitos de se preparar ainda melhor acabaram se transformando em frustração. Ele decidiu, então, não sacrificar ainda mais um sábado para participar de um treinamento dessa natureza. Acabou se resignando ao estado insatisfatório de sua capacidade, e espera que a participação, muitas vezes sem vontade, dos visitantes do grupo familiar não reflita o estado de sua vida espiritual. Pastor Schmidt está constantemente na estrada em virtude de algum ministério. A igreja tem uma expectativa muito grande a seu respeito. Ele se sente na obrigação de satisfazer essa expectativa, em última instância até mesmo porque possui a formação acadêmica necessária e, além disso, está sendo pago para isso. No início de seu ministério a igreja era menor, ele tinha muito mais energia e fazia praticamente tudo, com alegria e entusiasmo; a igreja crescia e todos estavam satisfeitos. Mas, agora a igreja não cresce mais e o pastor Schmidt está entrando em um estado de estresse cada vez mais profundo. Ao invés de elogios, recebe crítica. Não são poucos os membros nostálgicos que sentem saudades do passado, quando todos se conheciam e o pastor Schmidt sempre estava disponível. Entrementes, ele não se sente mais como um pastor de ovelhas, mas como alguém a todo vapor o tempo todo. A ocupação com assuntos organizacionais lhe rouba o tempo de que precisaria para os ministérios, que considera muito mais importantes. Há muito que fazer, mas há poucos membros que se dispõem e que estejam habilitados a ajudar. Por quanto tempo a situação poderá continuar assim? O pastor Schmidt reflete sobre o assunto e pergunta se não está na hora de uma troca de ministério. Quem é ativo no trabalho da igreja sabe muito bem que estes casos não refletem uma exceção. São muitos os obreiros que vivenciam essa frustração. O treinamento oferecido muitas vezes não é suficiente ou, então, é teórico demais e há pouca visão prática. Alguns obreiros saem


do ministério, outros nem sequer se habilitam a entrar, há ainda aqueles que por fidelidade permanecem em suas tarefas, mas estão insatisfeitos com as suas aptidões e questionam se de fato possuem a vocação ou o dom para realizá-las. A grande maioria dos obreiros, porém, se dá conta de que precisa de mais preparo e ajuda prática, mesmo que esteja decepcionada com as experiências de treinamentos anteriores.

TREINAMENTO DE OBREIROS: O DEPARTAMENTO MAIS NEGLIGENCIADO NA ESTRUTURAÇÃO DA IGREJA

Jesus disse: “assim como o Pai me enviou, eu também vos envio” (Jo 20.21b). Ele veio ao mundo “não para ser servido, mas para servir…” (Mc 10.45). Faz parte de nosso chamado, que cada cristão sirva no corpo de Cristo com o seu dom. Para isso, Deus deu a cada um dons e talentos que servem para a edificação da igreja e para testemunho perante o mundo (1Pe 4.10,11; 1Co 12). Toda igreja que leva estas palavras a sério, deverá planejar, orar e se engajar a não levar simplesmente as pessoas à conversão e a uma consolidação na fé, mas também deverá ajudá-las a descobrir, desenvolver e aplicar os seus dons. Por isso, Paulo escreveu: “E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo” (Ef 4.11,12). Se apenas um elo desta corrente “evangelismo – consolidação na fé – treinamento” estiver fraco, toda a corrente será fragilizada, e ao longo do tempo a igreja não poderá crescer – nem quantitativamente nem espiritualmente. Muitas vezes, esquece-se de que o impulso missionário de uma igreja não depende exclusivamente de atividades evangelísticas. Para realizar eficazmente os multifacetados ministérios e atividades de uma igreja missionária, e para propiciar o fortalecimento interno da igreja são imprescindíveis obreiros qualificados. Justamente igrejas recémfundadas e igrejas com um grande crescimento de novos convertidos não podem, em hipótese alguma, negligenciar o preparo de novos


obreiros. Caso contrário, os obreiros ativos ficarão sobrecarregados e em pouco tempo estarão exaustos, e conseqüentemente as estruturas da igreja não suportarão o crescimento nessa proporção. Portanto, o crescimento da igreja está estreitamente ligado ao número e à capacidade de seus obreiros. Com o crescimento de uma igreja vem também, o crescimento de suas tarefas: haverá sempre mais membros a serem visitados e acompanhados, cada vez mais grupos de interesses divididos por faixas etárias, cada vez mais círculos e eventos, mais possibilidades para a realização de ministérios e cada vez mais trabalhos administrativos. Sem um crescimento do número de obreiros qualificados, as crescentes necessidades permanecem descobertas e as novas possibilidades para testemunhos e ministérios não podem se concretizar. Peter Wagner (1991, p. 198) escreve o seguinte a esse respeito: A maioria das igrejas possui poucos obreiros para experimentar de fato um crescimento. Eles estão simplesmente com uma sub-ocupação no que se refere a obreiros. Para conservar e manter a igreja há um número suficiente de pessoas, mas não quando a igreja quer crescer. Se você deseja que a sua igreja cresça continuadamente, deverá dar grande valor para a ampliação e a ocupação correta do seu quadro de obreiros.

O treinamento de obreiros mobiliza toda a igreja para o ministério, dons são aplicados e ministérios podem ser realizados com maior eficácia. O corpo de Cristo poderá funcionar perfeitamente somente quando os pés e as mãos não estiverem simplesmente ativos, mas também adestrados. Sem um plano concreto para o preparo dos membros, o corpo de Cristo irá sofrer. Hoje, apenas bem poucas igrejas possuem diretrizes para o preparo de seus membros para o ministério. Existem, por exemplo, testes que ajudam os cristãos a descobrir os seus dons. Mas, onde é possível encontrar ajuda para desenvolver esses dons? Pastores e dirigentes das igrejas muitas vezes se queixam da falta de líderes e obreiros capacitados. O motivo não repousa tanto na falta de disposição para o trabalho, porém muito mais na falta de oferta de programas adequados para a formação dos membros da igreja e de ajuda prática para o desenvolvimento de seus dons.


Uma igreja é eficiente e efetiva em seus ministérios para dentro e para fora na mesma proporção em que seus membros estão capacitados para realizar esses ministérios. Por isso, quando pensamos no desenvolvimento da liderança e no desenvolvimento de uma igreja a longo prazo, necessitamos de um programa bem elaborado para a formação e o preparo de obreiros. O futuro da igreja não repousa unicamente em um crescente número de membros, mas, acima de tudo, na formação de novos obreiros e no aperfeiçoamento dos obreiros já ativos. Essa tarefa não pode ser entregue ao acaso.

O QUE É “TREINAMENTO DE OBREIROS”?

“Treinamento de obreiros” significa: edificar, preparar e equipar os membros, no âmbito da igreja local, para fazer deles obreiros e ajudálos a desenvolver os seus dons para que o corpo de Cristo seja edificado. Não se trata, em primeira instância, de firmar pessoas novas na fé, embora o crescimento espiritual dos participantes deverá fazer parte fundamental do treinamento; trata-se muito mais de treinar cristãos já razoavelmente firmados no evangelho, que se dispõem a empregar os seus dons no ministério da igreja. A palavra “instrução” é aqui evitada propositadamente; o motivo será elucidado mais adiante. De antemão deverá ficar bem claro que o preparo de obreiros engloba muito mais do que a simples transmissão do conhecimento. Os objetivos de aprendizagem no treinamento de obreiros deverão ser muito mais abrangentes daqueles alcançados usualmente por meio dos métodos escolares, pois no preparo para o ministério dentro da igreja, a pessoa é vista e incluída como um todo. Com a expressão “treinamento” alcançamos uma abrangência mais específica para o nosso objetivo do que com a expressão “instrução”. Quando nos referimos a um treinamento, entendemos que se trata de um preparo sistemático para uma disputa ou uma tarefa especial. O treinamento para uma partida de futebol, por exemplo, não acontece em uma sala de aula, e sim, em um campo de jogo com uma bola apropriada. O treinador permanece junto ao jogo e passa as orientações. O


treinamento está ligado a exercícios práticos e ao desenvolvimento de determinadas habilidades. Objetiva-se um jogador que não domine apenas as regras teóricas, mas que esteja apto, como participante de uma equipe, a desenvolver sua tarefa com habilidade, para que no final sejam marcados os gols desejados. Durante a competição, muitas vezes, são detectadas falhas que no jogo seguinte terão de ser evitadas. Assim também deve ser o preparo de obreiros para o ministério na igreja. Trata-se do desenvolvimento de pessoas para atuarem no campo do cristianismo vivido na prática. Elas deverão, tal qual jogadores de uma equipe, se tornar aptas a desenvolver as suas tarefas especiais com maior eficácia para que o Reino de Deus seja edificado.

O MAIOR IMPEDIMENTO PARA O TREINAMENTO DE OBREIROS: PRESSUPOSIÇÕES FALSAS

Muitos pastores e obreiros vão logo pensar: “Como gostaríamos de ter um programa de treinamento desses em nossa igreja. Mas, quem poderia ministrá-lo? Quem está qualificado? O pastor está sobrecarregado e os obreiros mal dispõem de tempo suficiente para as responsabilidades já acumuladas, que dirá, então, para um programa de treinamento.” Tais conjecturas apenas revelam que o verdadeiro impedimento para um programa de treinamento eficaz são pressuposições falsas a seu respeito. Pois, todas essas objeções praticamente não se aplicam aos modelos de treinamento aqui sugeridos. Existem pressuposições falsas acerca de cinco aspectos, que devem ser superadas: Pressuposições falsas acerca do objetivo do treinamento de obreiros Um programa de treinamento eficaz não tem como objetivo principal transformar obreiros em teólogos. Ele também não tenta formar obreiros perfeitos, que tenham uma resposta adequada para todas as perguntas possíveis ou para todos os problemas de aconselha-


mento, nem obreiros que ministrarão as mais fascinantes e comoventes pregações e estudos bíblicos, tampouco obreiros com capacidades organizacionais tão elevadas a ponto de causarem inveja ao diretor geral de uma empresa. O treinamento possui o objetivo bem mais modesto que é o de auxiliar os obreiros a progredirem em sua vida cristã pessoal e se tornarem mais eficientes em suas habilidades ministeriais. Pressuposições falsas acerca dos pré-requisitos para o treinamento Um programa eficaz não necessita, por exemplo, de especialistas para dirigir o treinamento ou de preletores importantes especialmente convidados para esse fim. Como a maioria dos pastores possui formação acadêmica em teologia, eles automaticamente pensam em experts com especialização específica, ansiosos para introduzir estudantes novos, ávidos por conhecimento, nos segredos do ministério cristão. Os modelos de estudo apresentados aqui poderão ser ministrados pelo pastor da igreja ou por um obreiro dirigente, com bem pouca ou até nenhuma ajuda externa, pois os objetivos e a didática são totalmente diferentes do que em um estudo formal. Subestima-se em muito a capacidade que as pessoas possuem para desenvolver os seus dons e para adquirir conhecimentos importantes a partir de algumas poucas diretrizes dadas por um obreiro experiente ou por um pastor. Pressuposições falsas acerca do tempo necessário para o treinamento Muitos obreiros possuem de antemão uma aversão aos programas de treinamento, pois a sua agenda já está mais do que repleta. Muitas vezes, os obreiros mais engajados são justamente aquelas pessoas que também acumulam muitas responsabilidades em sua vida profissional e, por isso, quase não possuem tempo para a sua própria família. As propostas de treinamento, via de regra, exigem muito tempo para leituras, seminários e lições de casa; muitas vezes demandam do participante todo um final de semana e, por vezes, até uma semana inteira. Aqui, em contrapartida, são apresentados modelos de treinamento que estão amplamente vinculados às tarefas e às reuniões de planejamento que ocorrem na igreja. O treinamento, portanto, não


exige muito mais tempo daquele que os obreiros gastariam normalmente para a realização de suas tarefas. Como o treinamento é contínuo e prático, ele de qualquer maneira pode se tornar mais eficaz do que longos seminários de finais de semana, que demandam um tempo muito maior. Pressuposições falsas dos participantes acerca de si mesmos Na auto-avaliação de muitos obreiros há uma grande barreira que se manifesta em dois extremos: no primeiro eles pensam que não precisam de ajuda, já no segundo pensam que de qualquer maneira não possuem o dom ou a formação acadêmica necessária, portanto qualquer ajuda seria inútil. Por isso, o questionamento acerca da motivação do obreiro para participar do treinamento ainda é um grande desafio que deverá ser abordado mais adiante. Na prática, pode ser muito difícil convencer obreiros, que já atuaram no ministério fielmente durante muitos anos, de que as suas aptidões e dons ainda necessitam de aperfeiçoamento. Mesmo que essas pessoas participem de um treinamento, o seu estilo de trabalho já está sedimentado de tal maneira que elas não estão dispostas e nem abertas para novos estímulos e aprendizados. Por um lado, não podemos deixar que os desinteressados nos desmotivem. Em toda igreja encontramos aquelas pessoas que gostariam de aperfeiçoar os seus dons ou desenvolver aptidões novas. Os pastores e líderes da igreja devem, então, dedicar-se a esses que estão desejosos e dispostos a aprender e trabalhar. Obreiros que demonstram menos interesse podem ser ganhos no final, quando perceberem o seu próprio rendimento e o quanto eles mesmos ganham com isso. Por outro lado, membros da igreja que subestimam sua capacidade podem ser motivados quando reconhecerem que Deus lhes deu dons e tarefas; também estas pessoas são indispensáveis para a igreja. Pressuposições falsas acerca do papel do pastor da igreja Aqui se encontra, talvez, o maior impedimento para o treinamento de obreiros. Enquanto predominar o pensamento de que o pastor deve fazer pessoalmente todos os ministérios importantes da igreja, a sua tarefa como “preparador” será subestimada e ocupará um lugar insig-


nificante em todo o seu plano de ministério. Mas afinal, qual é a tarefa de um pastor à luz da palavra de Deus?

QUAL É O PAPEL DO PASTOR DA IGREJA NO TREINAMENTO DE OBREIROS?

O papel tradicional de um pastor é talvez melhor caracterizado no exemplo do pastor Schmidt, mencionado na parte introdutória do livro. Ele é responsável pela pregação, pelo culto, pela visita a enfermos e visita nos lares, pela direção dos mais variados estudos bíblicos e outros círculos de trabalho, pelo aconselhamento e acompanhamento dos membros da igreja, pela administração e outras particularidades. Dificilmente, porém, menciona-se no seu contrato de trabalho ou no seu termo de atividades a sua responsabilidade pelo treinamento e aperfeiçoamento de obreiros. Não é de admirar, portanto, que existam na igreja tantos pastores sobrecarregados e tão poucos membros capacitados para o ministério. Não é de admirar que tantos membros se deixem servir passivamente. Não é de admirar que tantas igrejas não consigam servir aos seus membros eficazmente, e que nossas igrejas quase não cresçam. Resumindo: nesse modelo depende-se demais das aptidões de uma única pessoa. Com uma estrutura dessa natureza, uma igreja dificilmente conseguirá crescer e ter um número maior do que cem membros ativos. Essa perspectiva que coloca o papel do pastor como empregado da igreja, que faz tudo sozinho, não somente leva a uma total ineficiência, mas também, é anti-bíblica. O cargo de pastor de igreja, sem dúvida alguma, também inclui a função de “preparador” ou “treinador”. A edificação da Igreja de Jesus Cristo até mesmo depende disso! E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo. (Ef 4.11,12)


A responsabilidade do pastor não consiste, em primeira instância, em fazer todos os ministérios sozinho, e sim, em preparar os membros da igreja para a colaboração e participação no trabalho. Se ele não faz isso, ele terá falhado como pastor, e o corpo de Cristo não será edificado. Muitas vezes, o “treinamento” é entendido no sentido da instrução bíblica, ou seja, supostamente crê-se que seria suficiente intermediar a pregação e o ensino da palavra de Deus. A pressuposição amplamente difundida, de que pregações poderosas e eficientes também levam a um ministério eficiente, é um dos maiores equívocos. Pregar acerca da necessidade de servir sem, no entanto, oferecer aos membros a possibilidade de um treinamento adequado para o ministério, leva a uma esquizofrenia espiritual; isto quer dizer que membros se tornam especialistas teóricos em um determinado assunto no qual, porém, não possuem nenhuma experiência prática (Hull 1988, p. 95-96). No capítulo 2 veremos que a tarefa do pastor como treinador deverá exceder em muito o ensino da palavra de Deus, pois o treinamento tem a finalidade de capacitar e dar autoridade espiritual aos membros da igreja para o ministério. Quando assuntos demais dependem do pastor, o princípio de edificação do corpo de Cristo será negligenciado. Somente quando toda a igreja for capacitada a aplicar os seus dons, o Corpo de Cristo poderá funcionar corretamente. Uma igreja centrada no pastor é uma igreja em que basicamente apenas um membro está ativo. Mas, enquanto a igreja pensar: “O pastor é responsável por isto, afinal ele é pago para tanto!”, poucos irão perceber que eles mesmos teriam uma tarefa importante a realizar. Uma igreja somente poderá crescer quantitativamente e conviver em harmonia com os seus membros e, ainda, permanecer sob controle, quando o atendimento e o acompanhamento dos membros for descentralizado, isto quer dizer, quando não apenas os líderes oficiais fizerem o trabalho, mas também os leigos. Quantas vezes os pastores gastam horas e horas em aconselhamentos espirituais, que obreiros oficiais experientes poderiam fazer da mesma forma ou, às vezes, até melhor. Mas, há uma pressuposição errônea muito arraigada: “Somente o pastor poderá me ajudar com os meus problemas.” Quando não


há conselheiros leigos experientes e treinados na igreja, os membros obviamente sempre só irão procurar os líderes oficiais. Quando os membros da igreja são preparados, com isso também são liberados para o ministério. Como cristãos, nós temos a incumbência de descobrir os nossos dons e de usá-los em benefício de outros. Uma atitude egoísta e passiva sempre levará à enfermidade espiritual. Quando cristãos são ajudados não apenas a descobrir os seus dons, mas também a desenvolver, fortalecer e colocá-los em prática, eles conquistam uma nova alegria na vida cristã e no ministério. Novas forças são liberadas que reavivam e fortalecem a igreja internamente e nos seus esforços de alcançar outros. Wagner (1991, p. 72), faz a seguinte observação: Até onde eu entendo, estamos diante de um desafio, com ênfase na liberação dos leigos dentro das igrejas objetivando um ministério pleno, e ao mesmo tempo redescobrindo o papel diretivo do pastor. Isso poderá acontecer, assim penso eu, a partir do momento em que atribuímos ao pastor não apenas a tarefa de líder, mas também a de treinador.

Ele, então, nos dá a seguinte definição do papel do pastor como treinador: O treinador da igreja é um líder que estabelece determinados objetivos para a igreja segundo a vontade de Deus. Ele está apto a conquistar a igreja para esses objetivos e também zela para que cada membro da igreja seja motivado e capacitado para dar a sua contribuição para a concretização desses objetivos.

Com mais obreiros qualificados, a igreja também estará em condições de realizar cada vez mais ministérios e, principalmente, atender cada vez mais pessoas. O atendimento adequado aos membros representa um dos maiores desafios nas igrejas em crescimento. Muitas igrejas têm descoberto nesse meio tempo que o atendimento mais eficaz acontece em pequenos grupos. Para isso, os líderes de grupos necessitam constantemente de motivação e preparo. Para iniciar novos grupos ou até mesmo para dividir as células já existentes, cada vez


mais novos líderes deverão ser formados. Robert Logan (1991, p. 180), entende que: Para o ministério de células, pelo menos dez por cento dos membros da igreja devem ser treinados como pastores leigos, e isso não inclui os líderes necessários para os outros ministérios dentro da igreja.

Alguns pastores já sobrecarregados em seus ministérios talvez possam protestar: “Eu até reconheço a necessidade, mas onde eu acho o tempo para isso?” De fato, na prática um programa desses significa sacrifício de tempo e energia. Mas, há de se reconhecer que o investimento terá um retorno multiplicado na medida em que, ao longo do tempo, o pastor ganhar novos colaboradores. Ele não precisará mais fazer todas as visitas, conduzir todos os aconselhamentos espirituais e liderar todos os estudos bíblicos. Quanto maior se tornar a igreja, maior será o peso ministerial do pastor como preparador. Também outros obreiros líderes poderão se tornar preparadores. Dessa forma, o crescimento e o acompanhamento dos membros da igreja dependerão cada vez menos do pastor ou do líder oficial da igreja. Assim, o corpo de Cristo também será edificado e se tornará cada vez mais maduro. O pastor deve conquistar a compreensão da igreja para poder deixar de lado algumas outras tarefas, objetivando o tempo necessário para a organização do treinamento de obreiros. Quando leigos assumirem cada vez mais ministérios antes realizados pelo pastor, a igreja deverá concordar e aprová-los nisso. Por isso, é essencialmente necessário que se fale dentro da igreja sobre aquilo que a Bíblia ensina à igreja como corpo de Cristo, sobre os dons do Espírito Santo e sobre a tarefa do pastor como “multiplicador” estratégico. Pois, o Novo Testamento possui uma visão totalmente diferente acerca da estrutura e da vida da igreja daquela que nós temos visto na maioria das igrejas nos nossos dias. O Novo Testamento mostra-nos o caminho bíblico da igreja no futuro (comp. Carl George, 1994).


O desenvolvimento saudável de uma igreja depende, em grande parte, do envolvimento dos seus membros e líderes. Para que o desenvolvimento saudável da igreja aconteça é importante que cada membro descubra e aplique os seus dons e talentos. Neste trabalho, Craig Otto indica de uma maneira singular, como líderes podem ser capacitados para o seu ministério na igreja local. Através de muitas aplicações práticas e vários métodos didáticos, o autor facilita a leitura e a implantação do conteúdo para o leitor e líder na igreja. Além de ferramentas para o trabalho do líder, o livro também oferece informações e conselhos preciosos para o acompanhamento do líder no seu ministério. Dr. Craig Ott, nasceu em 1952 em Los Angeles, EUA. É professor de Missões e Estudos Interculturais na Universidade Trinity Deerfield Chicago E.U. Trabalhou por 21 anos como missionário na Alemanha na fundação de igrejas e treinamento de pastores. É casado e tem três filhos.


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