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Percepção

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10. O educador

10. O educador

O fundamento científico de sua ação

Montessori foi uma das primeiras a tentar fundar uma verdadeira ciência da educação. Sua abordagem consistiu em instaurar a “ciência da observação” (Montessori, 1976, p. 125). Exigia dos educadores e de todos os participantes do processo educativo que recebessem uma formação nesses métodos, e que o próprio processo educativo se desenvolvesse em um quadro permitindo controle e verificação científica.

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A possibilidade de observar como fenômenos naturais e como reações experimentais o desenvolvimento da vida psíquica na criança transforma a própria escola em ação, em uma espécie de gabinete científico para o estudo de psicogenética do homem. (Montessori, 1976, p. 126) A arte fundamental da observação precisa, que Rousseau já considerava como a competência mais importante requerida para ensinar, recorre à precisão da percepção e da observação. Montessori imaginou um “novo tipo de educador”: “No lugar da palavra [ele deve] aprender o silêncio; no lugar de ensinar, ele deve observar; no lugar de se revestir de uma dignidade orgulhosa que quer parecer infalível, se revestir de humildade” (Montessori, 1976, p. 123). Esse tipo de observação atenciosa à distância não é uma aptidão natural:

é necessário aprender e saber observar é a verdadeira marcha rumo à ciência. Porque se não vemos os fenômenos, é como se eles não existissem. Ao contrário, a alma do sábio é feita de interesse apaixonado pelo que ele vê. Aquele que é iniciado a ver começa a se interessar, e esse interesse é a força motriz que cria o espírito do sábio. (Montessori, 1976, p. 125)

Montessori concebeu um método que qualificaríamos hoje de hermenêutico-empírico. No entanto, ela não conseguiu colocar uma única dessas ideias integralmente em prática em seu próprio trabalho. Suas experiências careciam de um quadro teórico sólido e elas não eram conduzidas nem avaliadas de forma a permitir uma confirmação objetiva. Suas descrições não eram isentas de subjetividade e suas conclusões eram frequentemente parciais ou mesmo expressas de maneira dogmática.

Apesar disso, ela se distinguia na criação de situações educativas, mesmo que frequentemente estas fossem manifestamente mais a expressão de sua personalidade radiante que o fruto de uma reflexão e de uma preparação rigorosas.

Suas observações eram feitas com cuidado, segundo métodos científicos que garantiam a objetividade, mas o essencial do seu trabalho dependia de um talento muito pessoal, único, para manejar e interpretar os processos educativos. Sua descrição dos fenômenos educativos e as conclusões que tirava deles devem ser considerados sob esta ótica. Ela descreve, por exemplo, uma menininha que tenta quarenta e quatro vezes seguidas encontrar a cavidade que corresponde a um pino em madeira antes de direcionar, com alegria, sua atenção para outro lugar. Mas em nenhum lugar é mencionado o seu meio intelectual, social, nem seus progressos posteriores.

Montessori trata da mesma forma todo tipo de fenômenos, de despertares e “explosões”. Se adotarmos os seus próprios critérios – ainda que estes sejam formulados de maneira vaga e geral – para julgar o trabalho científico e teórico que ela realizou no campo da educação, não é certo que esse julgamento seja positivo. O sucesso de sua ação dependia de outros fatores: sua humildade, sua paciência, e (frequentemente evocado) seu poder de encantamento diante da vida. Esta capacidade de imaginação, que transcende a observação precisa, é na verdade um modo de vida filosófica. A despeito de todas as críticas que formulou contra a filosofia e o ensino de filosofia, ela mesma adotou a atitude filosófica.

Em uma passagem na qual se debruça sobre a necessidade de dar ao professores uma experiência prática da pedagogia, escreve a respeito dos estudantes de biologia e medicina, e do papel do microscópio: “Eles sentiram, observando no microscópio, nascer essa emoção feita de espanto que desperta a consciência e o entusiasmo apaixonado pelo mistério da vida”. (Montessori, 1976, p. 133) É importante levar em consideração ao mesmo tempo a abertura da sensibilidade de Montessori aos “mistérios da vida” e sua abordagem essencialmente científica, sob pena de se emaranhar nas contradições e alimentar a controvérsia sempre animada quanto ao valor e o significado de sua obra; é necessário, no entanto,

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