3 minute read
3. A descoberta da infância
tinham nada de específico para a instrução de crianças excepcionais, mas continham princípios de uma educação mais racional do que aqueles que até então vinham sendo usados, pois que uma mentalidade inferior era suscetível de desenvolvimento. Esta intuição tornou-se minha convicção depois que deixei a escola dos deficientes; pouco a pouco adquiri a certeza de que métodos semelhantes, aplicados às crianças normais, desenvolveriam suas personalidades de maneira surpreendente.
Foi então que me dediquei a um estudo realmente profundo desta pedagogia “reparadora”; empreendi o estudo da pedagogia normal e dos princípios em que se funda, e inscrevi-me como estudante de filosofia na universidade. Uma grande fé me animava, embora não soubesse se conseguiria algum dia fazer triunfar minha ideia. Abandonei, pois, todas as demais ocupações como se fosse preparar-me para uma missão desconhecida (pp. 28-29). 2.5 Os trabalhos pedagógicos de Itard são descrições minuciosas, muito interessantes, das tentativas e experiências levadas a efeito nesse terreno, e deve-se admitir que representam os primeiros passos no caminho da pedagogia experimental.
Advertisement
Da observação científica, Itard deduziu uma série de exercícios capazes de modificar a personalidade, corrigindo defeitos que mantinham determinados indivíduos em estado de inferioridade. Efetivamente, Itard conseguiu fazer falar e ouvir a crianças semissurdas, as quais, sem este auxílio, estariam fadadas a permanecer para sempre anormais. Itard pode ser considerado o fundador da pedagogia científica, e não Wundt e Binet que são, na realidade, os fundadores de uma psicologia fisiológica, que pode ser, também, facilmente aplicada nas escolas.
Porém, o mérito de ter completado um verdadeiro sistema educativo para crianças deficientes pertence a Édouard Séguin, que foi professor e só mais tarde médico. Partindo das experiências de Itard, Séguin aplicou-as, modificando-as e completando o método, em dez anos de experiências realizadas com crianças retiradas do manicômio e reunidas numa pequena escola, à Rue Pigalle, em Paris (p. 29). 2.6 [...] notei o desejo de todos os professores, tanto em Paris como em Londres, de conhecer novas experiências, de estudar novos rumos, pois o fato enunciado por Séguin, isto é, que, realmente, era possível
educar os deficientes aplicando os seus métodos, permanecia praticamente no terreno das quimeras.
Compreende-se facilmente a causa disso, pois persistia a convicção de que as crianças deficientes, por serem inferiores, deveriam ser educadas com métodos empregados para as crianças normais. A ideia de que uma “nova educação” surgia no mundo pedagógico ainda não havia conseguido impor-se, nem tampouco se admitia que uma nova educação pudesse elevar as crianças deficientes a um nível superior. Muito menos se compreendia que um método educativo capaz de elevar o nível mental dos deficientes pudesse, também, ser utilizado para as crianças normais (p. 31). 2.7 Procedi [...] por minha conta, a novas experiências. Como não é possível abordá-las todas nesta obra, citarei apenas uma: a experiência que realizei empregando um método realmente original para ensinar a ler e a escrever. Este era um ponto falho tanto na obra de Itard como na de Séguin. Usando esse método consegui que alguns deficientes do manicômio aprendessem a ler e a escrever corretamente; mais tarde, apresentando-se ao exame nas escolas públicas, juntamente com os escolares normais, obtiveram aprovação.
Tais resultados eram tidos como miraculosos pelos observadores. Eu, porém, sabia que se esses deficientes haviam alcançado os escolares normais nos exames públicos era, unicamente, por haverem sido conduzidos por uma via diferente: tinham sido auxiliados no seu desenvolvimento psíquico, enquanto as crianças normais haviam sido, pelo contrário, sufocadas e deprimidas. Eu acreditava que, se algum dia, esta educação especial, que tão extraordinariamente desenvolvera os deficientes, pudesse aplicar-se ao desenvolvimento das crianças normais, o milagre espalhar-se-ia por todo o mundo e o abismo entre a mentaldade dos deficientes e a dos normais desapareceria totalmente.
Enquanto todos admiravam o progresso dos meus deficientes, eu meditava sobre as razões que faziam permanecer em tão baixo nível os escolares sãos e felizes, a ponto de poderem ser alcançados pelos meus infelizes alunos nas provas de inteligência (p. 33). 2.8 Estando já em dia com os problemas científicos da época voltava-me agora para novos estudos relacionados com a psicoterapia. Tinha