Revista APOTHEKE nº 3 Artista Professor Pesquisador

Page 1

REVISTA

APOTHEKE

1

VOLUME 3 ISSN: 2447-1267

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

REVISTA APOTHEKE Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016. ISSN: 2447-1267

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

2


REVISTA

APOTHEKE

Apotheke e-periódico [recurso eletrônico] / Universidade do Estado de Santa Catarina. Centro de Artes. Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais. v. 3, n. 2 (2016) – . – Dados eletrônicos. – Florianópolis : UDESC/CEART/PPGAV, 2015 Quadrimestral Sistema requerido: Adobe Acrobat Reader. Modo de acesso: World Wide Web: <http://revistas.udesc.br/index.php/APOTHEKE/index>. Apotheke e-periódico (acesso em 01 agosto 2016). ISSN: 2447-1267 1. Artes Visuais. 2. Arte - Educação. I. Universidade do Estado de Santa Catarina. Centro de Artes. Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais. CDD: 707 - 20. ed.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca UDESC

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

3


REVISTA

APOTHEKE

SUMÁRIO SUMÁRIO e EXPEDIENTE

EDITORIAL

ARTIGOS

p. 7

p. 8

ENTREVISTAS

TRADUÇÃO

ENSAIOS

p. 118

p. 157

p. 193

NOTAS SOBRE EXPERIÊNCIA

ENSAIO VISUAL

QUEM SOMOS

p. 274

p. 283

p. 4

00

p. 250

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

4


REVISTA

APOTHEKE

Universidade Do Estado de Santa Catarina Reitor: Antonio Heronaldo de Sousa Centro de Artes – UDESC/CEART Chefe de Departamento Profa. Dra. Rosana Tagliari Bortolin Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais Coordenadora Profa. Dra. Jociele Lampert _________________________________________________________ 5

Revista Apotheke EXPEDIENTE A Revista APOTHEKE é uma publicação eletrônica de caráter acadêmico-científico, editada pelo Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke, relacionado ao Grupo de Pesquisa [Entre] Paisagens, vinculado ao Programa de PósGraduação em Artes Visuais da Universidade do Estado de Santa Catarina (PPGAV/UDESC). Com periodicidade semestral, tem como propósito divulgar a produção de pesquisadores brasileiros e estrangeiros que enfocam as relações entre Artes Visuais, Educação e Pintura, em diálogo com diferentes aportes teóricos, visando enriquecer a discussão interdisciplinar do conhecimento nas áreas de Artes Visuais e Educação. Publica artigos, ensaios, narrativas visuais, resultados de investigações baseadas nas Artes, resenhas, entrevistas e traduções. A revista tem como objetivo servir de veículo não apenas para o conhecimento e as pesquisas já consolidadas, mas também para perspectivas inovadoras, tanto no que se refere à argumentação quanto à metodologia, e que se apresentam como alternativas aos modelos estabelecidos.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Editora-Chefe Jociele Lampert, UDESC, Brasil Editores Associados Fábio Wosniak, UDESC, Brasil Marta Cabral, Teacher College, USA Editores Assistentes Adriane Kirst, UDESC, Brasil Juliano Siqueira, UDESC, Brasil Organizadores do volume 3, número 2, ano 2, Julho 2016. Jociele Lampert Fábio Wosniak Adriane Kirst Juliano Siqueira Conselho Científico Nacional Luciana Gruppelli Loponte, UFRGS Lúcia Gouvêa Pimentel, UFMG Fernanda Pereira da Cunha, UFG Cristian Poletti Mossi, UERGS Elaine Schimidlin, UDESC Fábio Rodrigues, URCA Marilda Oliveira, UFSM Rita Bredarioli, UNESP Ronaldo Alexandre de Oliveira, UEL Belidson Dias Bezerra Júnior, UNB Maria das Vitórias Negreiro do Amaral, UFPE Christina Rizzi, USP Rejane Galvão Coutinho, UNESP Talita Esquivel, EMBAP Maria Helena Wagner Rossi, UCS Ana Cláudia Assunção, URCA Marcos Villela Pereira, PUC/RS

Lucimar Bello Pereira Frange, PUC/SP Olga Maria Botelho Egas, UFJF Fernando Augusto, UFES Conselho Científico Internacional Rita L. Irwin, British Columbia, Canadá José Carlos de Paiva e Silva, Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto Teresa Torres De Eça, Universidade do Porto, Portugal Marta Cabral, Teacher College, USA Bosistas Ana Carolina Ferreira, UDESC Fabiana Burnato do UDESC Kátia Speck, UDESC

Martins Amaral,

Diagramação Carolina Ramos Nunes Revisão Luciana Finco Mendonça Assessoria de comunicação Tharciana Goulart Contato Av. Madre Benvenuta, 1907 Itacorubi, Florianópolis / SC - (48) 3321-8300 Centro de Artes Site Grupo: http://www.apothekeestudiodep intura.com E-mail: apothekestudio@gmail.com

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

6


REVISTA

APOTHEKE

EDITORIAL A palavra APOTHEKE tem origem grega. O substantivo apotheke, designava

armazéns

do

Porto

de

Atenas

na

Grécia

Clássica;

também de origem germânica, indica a origem da palavra botica, boticário ou farmácia. A escolha por esta nomenclatura, ao Grupo

de

Estudos

Estúdio

de

Pintura

Apotheke,

decorre

da

percepção da botica como um lugar de laboratório, de um labor experimental, o que se aproxima da proposta de um Ateliê. A pintura

apresenta-se

artístico

deste

como

Grupo

eixo

de

norteador

Estudos,

para

o

processo

considerando

o

campo

ampliado e possíveis desdobramentos para o pensamento plástico pictórico.

7

Trata-se Universidade coordenado também,

de do

Grupo

Estado

pela

com

um

Profa.

o

Grupo

de

de

Santa

Dra. de

Estudos

vinculado

Catarina

Jociele

Pesquisa

-

UDESC

-

UDESC/Brasil,

Lampert, [Entre]

à

articulado

Paisagens

-

CNPq/UDESC, que acolhe artistas, professores e pesquisadores. A

REVISTA

APOTHEKE,

em

seu

terceiro

volume,

apresenta

derivações sobre as ações desenvolvidas durante o ano de 2015 e 2016, bem como, apresenta artigos de artistas, professores e pesquisadores

na

área

de

Artes

Visuais,

parceiros

que

compartilham o espaço do Estúdio de Pintura Apotheke. Professora Dra. Jociele Lampert (Editora-Chefe) Professor Doutorando Fábio Wosniak (Editor-Associado) Site: http://www.apothekeestudiodepintura.com/ Facebook:https://www.facebook.com/pages/ https://www.facebook.com/Estúdio-de-pintura-Apotheke690107797707990

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

8

ARTIGOS ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Escolinha de Arte de São Paulo1: instantes de uma prática Sidiney Peterson (UNESP) RESUMO Neste artigo busco apontar, entre os diferentes ‘instantes’ 2 observados do processo de ensino/aprendizagem/formação na Escolinha de Arte de São Paulo (EASP), algumas experiências pedagógicas com a finalidade de tecer (ou desfiar) algumas ideias sobre os posicionamentos metodológicos assumidos para o ensino e aprendizagem de arte na Escolinha de Arte de São Paulo. Para escrita, considero como fonte primária, o relatório de atividades da Escolinha3, documentos imagéticos da EASP4 e os depoimentos, contemporâneos, de Ana Mae Barbosa e Madalena Freire, arte/educadoras na EASP, Regina Stella B. Machado, Célia Cymbalista e Regina Gomes, então estagiárias na Escolinha e Betty Leirner, estudante matriculada na EASP. Palavras-chave: Escolinha Arte/Educação; História.

de

Arte

de

São

Paulo;

Prática

pedagógica;

RESUMEN En este artículo se señalan, entre los diferentes 'momentos' observados la enseñanza / aprendizaje / formación en la Escolinha de Arte de São Paulo (EASP), algunas experiencias en la enseñanza con el fin de tejer (o enmarañar) algunas ideas sobre las posiciones metodológicas asumidas para la enseñanza y el aprendizaje en el arte en la Escolinha de Arte de São Paulo. Para escribir, considero como la fuente primaria, el informe de actividad da Escolinha, documentos imagéticos y testimonios, contemporáneos, de Ana Mae Barbosa y Madalena Freire, maestros en la EASP, Regina Stella B. Machado, Celia Cymbalista y Regina Gomes participantes internas en Escolinha y Betty Leimer, estudiante en la EASP. Palabras clave: Escolinha de Arte de São Paulo; la práctica docente; Arte/ Educación; Historia.

Tenho um pouco de medo: Medo ainda de me entregar, pois, o próximo instante é o desconhecido.O próximo instante é feito por mim? Ou se faz sozinho? Fazemo-lo juntos com a respiração. Clarice Lispector, Água Viva5.

No artigo Escolinha de Arte de São Paulo: fundamento e andamento, de autoria da professora Ana Mae Barbosa, publicado na revista Educação para o Desenvolvimento, edição de agosto de 1968, é possível verificar que uma das primeiras ações realizadas pelas arte/educadoras da Escolinha de Arte de São ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

9


REVISTA

APOTHEKE Paulo (EASP), diz respeito à construção de um programa para o ensino de artes na instituição. Na proposta, apresentada no referido artigo, consta um ensino baseado na necessidade de que todas as crianças e adolescentes, matriculadas na EASP, trabalhassem

em

teatro,

(BARBOSA,

1969,

p.

condutor,

neste

artigo,

ideias

sobre

algumas

dança,

09).

música

Tendo a

o

citado

finalidade

os

e

é

artes

plásticas

programa tecer

como

(ou

posicionamentos

fio

desfiar)

metodológicos

assumidos para o ensino e aprendizagem de arte na Escolinha de Arte

de

São

Paulo.

Para

escrita,

considero

como

fonte

primária, o relatório de atividades da Escolinha6, documentos imagéticos da EASP7 e os depoimentos, contemporâneos, de Ana Mae Barbosa e Madalena Freire, arte/educadoras na EASP, Regina Stella

B.

Machado,

estagiárias

na

Célia

Cymbalista

Escolinha

e

e

Regina

Betty

Gomes,

Leirner,

então

estudante

matriculada na EASP.

10 Os posicionamentos metodológicos experiências como caminho...

assumidos

na

EASP:

ou

das

Na Escolinha de Arte de São Paulo, um dos principais interesses entre as arte/educadoras responsáveis pelo campo das artes plásticas8, estava relacionado ao trabalho voltado para

o

desenvolvimento

matriculadas Escolinha, criança9.

na

nós Uma

da

produção

Instituição. nos

Segundo

preocupávamos

preocupação

gráfica

também

Ana

muito

das

Mae com

Barbosa,

na

desenho

da

o

identificada,

crianças,

na

fala

de

Madalena Freire, quando pontuou que, era minucioso o estudo do desenvolvimento fundamentado,

de

tinha

expressão

de

pastas

cada

de

cada um,

aluno, buscando

um

estudo

focar

nos

processos de cada um10. É

importante

observar

que,

este

interesse

das

arte/educadoras com relação ao desenho e à expressão gráfica da criança na EASP, é resultado da própria história do ensino ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE de artes no Brasil, marcada por momentos significativos de introdução das teorias sobre o desenho das crianças. O campo de estudo sobre o desenho infantil teve seu marco a partir da última década do século XIX e o campo teórico se estabelece

nas

três

primeiras

décadas

do

século

XX.

Essas

pesquisas, de acordo com Rejane Galvão Coutinho, resultaram em sistematizações teóricas publicadas nos principais centros da Europa

e

Estados

influenciaram,

a

Unidos partir

(COUTINHO, de

2002,

diferentes

p.

40)

que

entendimentos,

os

trabalhos desenvolvidos em outros países. No contexto do ensino formal brasileiro, Ana Mae Barbosa aponta que, o período de 1870 e 1901 foi marcado pela: Intensa propaganda a respeito da importância do ensino do desenho na educação popular, feita pelos liberais, que colocavam o desenho como a matéria mais importante do currículo da escola primária e secundária, baseados, principalmente, na influência de Walter Smith. A intenção era copiar os modelos americanos, ingleses ou belgas sem qualquer preocupação com a cultura nativa (BARBOSA, 2011, p. 41).

Neste modelo de ensino, o que se buscava era melhorar a mão

de

obra

ciência,

para

motivo

a

indústria

pelo

qual

os

e,

consequentemente,

conteúdos

ensinados

para eram

a os

desenhos geométricos, os desenhos de observação e as técnicas (luz, sombra, perspectiva, etc.). Este conjunto de saberes vai caracterizar o ensino de artes no ensino formal até meados do século XX. Em

paralelo,

americana

e

a

partir

europeia,

a

de

1914,

pedagogia

através

da

experimental

influência introduz

no

contexto educacional brasileiro as novas concepções sobre o grafismo infantil. Essas informações propiciam

as primeiras

investigações sobre as características da expressão da criança através

do

desenho

(BARBOSA,

2011,

p.

42),

feitas

por

pesquisadores brasileiros. Nesses

estudos,

o

desenho

era

utilizado

como

meio

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

de

11


REVISTA

APOTHEKE investigação das atividades cerebrais, postas em jogo quando uma criança se expressava graficamente, e ainda como forma de compreensão do processo criativo e de relação com a realidade da

criança.

Nesse

período,

surgiram

algumas

pesquisas

que

11

relacionavam o desenho à psicologia , foi um momento em que se valorizava

o

grafismo

infantil

como

um

produto

interno

refletindo a organização mental da criança, a estruturação de seus diversos aspectos e seu desenvolvimento (BARBOSA, 2010, p. 111-112). Outro relevante momento para a difusão do conhecimento sobre o grafismo e, consequentemente, para o ensino de arte no Brasil, se deu com os modernistas Mário de Andrade12 e Anita Malfatti13, responsáveis por desempenhar um importante papel na introdução das ideias da livre expressão no ensino de arte para as crianças, através da implementação de novos métodos baseados na valorização da expressão e da espontaneidade da criança em seu desenho. Métodos que até aquele momento, de acordo com a pesquisa realizada por Rejane Galvão Coutinho, não era ainda uma prática comum na época. Pelo contrário, os métodos

de

ensino

de

desenho

trabalhavam

o

desenho

de

observação e as cópias (COUTINHO, 2002, p. 88), na educação formal. É importante destacar a visão de Anita Malfatti em relação ao grafismo infantil. Ela deu às produções infantis o mesmo status

dado

aos

artistas,

ao

expô-las

como

suas

obras.

É

possível perceber neste fato uma mudança em relação ao ideário sobre o desenho das crianças, essa produção que até então se caracterizava como ‘objeto’ de compreensão de aspectos mentais das

crianças,

passava

a

ser

valorizado

como

uma

produção

artística, com valores estéticos. Um valor também conferido por Mário de Andrade que citou exemplos de arte infantil no curso de História da Arte em que foi professor na Universidade do Distrito Federal em 1936, quando usou desenhos oriundos de ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

12


REVISTA

APOTHEKE sua

coleção

composta

de

cerca

de

2.160

desenhos

de

procedências diversas (COUTINHO, 2002, p. 03). A partir da década de 1940, tem-se notícia de uma série de atividades extracurriculares oferecidas às crianças tendo como orientação

o

desenvolvimento

realizadas

principalmente

da

em

expressão.

ateliês,

Eram

entre

atividades

estes,

vale

destacar os dirigidos por Guido Viaro em Curitiba-PR, Lula Cardoso Ayres em Recife- PE e Suzana Rodrigues em São Paulo-SP (BREDARIOLLI, 2004), além da Escolinha de Arte do Brasil (EAB) de onde se desdobrou o Movimento Escolinhas de Arte (AZEVEDO, 2000) do qual a Escolinha de Arte de São Paulo fez parte. Essas experiências deram continuidade à ideia de valorização da

expressão,

através

da

livre

expressão,

tendo

os

conhecimentos sobre o grafismo infantil como base. Ao

seguir

infantil, Paulo,

as

o

percurso

desse

arte/educadoras

investiram

na

prática

interesse

da

Escolinha

de

observação

pelo

de

grafismo

Arte

como

de

uma

São

opção

metodológica para o acompanhamento desses/as estudantes e suas produções

e,

no

encaminhamento

de

ações

que

pudessem

contribuir para as necessidades gráficas apresentadas por cada criança. Como base dessa proposta, segundo Regina Machado, Tinha a leitura do livro do Viktor Lowenfeld, que era a bíblia naquele momento, e nós tínhamos a observação dos desenhos das crianças, entendeu? Na Escolinha, observávamos e discutíamos os desenhos das crianças da própria Escolinha, amparadas pela fundamentação de Lowenfeld14.

A obra de Viktor Lowenfeld à qual se refere Regina Machado trata-se de Desenvolvimento da Capacidade Criadora, escrita em parceria com W. Lambert Brittain e publicada em 1947. Entre os estudos

divulgados

neste

livro,

os

autores

destacam

os

diferentes estágios de desenvolvimento gráfico da criança, um estudo que norteou a prática de ensino de arte no Brasil, na segunda metade do século XX, através do Movimento Escolinhas ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

13


REVISTA

APOTHEKE de Arte, destacando-se também como influência para os fazeres na Escolinha de Arte de São Paulo. Durante as análises das fichas de matrículas de estudantes da Escolinha DE Arte de São Paulo15, localizei, no verso de algumas delas, frases como: está na fase do realismo; está na garatuja e, ainda, estava na fase pré-esquemática, passou para esquemática. Esses critérios de identificação são os mesmos utilizados por Lowenfeld e Brittain para discutir os estágios de desenvolvimento do desenho infantil na referida obra. Como exemplo de ações planejadas a partir das observações das necessidades expressivas das crianças, trago para o plano da reflexão a experiência realizada no Jóquei Clube de São Paulo/SP.

Essas

aulas

foram

delineadas

coletivamente

pelas

arte/educadoras e partiram de dados apresentados por Ana Mae Barbosa sobre a produção gráfica de alguns estudantes de sua turma. Segundo a arte/educadora, durante o acompanhamento nas aulas foi observado que todo mundo estava fazendo desenho sem movimento, ela então se perguntava: é normal nessa fase? É. Mas é regra? Não é. (...), então vamos flexibilizar o traço16. Ao buscar delinear propostas que contemplassem a questão central da atividade, o movimento, que poderia resultar na flexibilização do traço no desenho, o grupo de arte/educadoras passou a discutir sobre como e onde realizar essa experiência. Ana Mae Barbosa esclarece que: Ficamos discutindo sobre o seguinte: vamos usar movimentos de animais, ou centrar em um animal só? Vamos ao zoológico? Não, pois assim chamaríamos atenção para a diversidade de animais. O que queríamos era a diversidade de movimentos de um só animal. Decidimos pelo Jóquei Clube, para observar movimentos do cavalo (...). Não propusemos na EASP o desenho do cavalo. Levamos as crianças para o Jóquei Clube, para observar e desenhar cavalos, o que queríamos era centrar no animal em diferentes atividades, em movimentação no caso os cavalos que estavam no Jóquei com o objetivo de se movimentar, de aprender a se movimentar bem para ganhar corridas17.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

14


REVISTA

APOTHEKE Não propusemos na EASP o desenho do cavalo. Retomo essa parte da citação acima, tentando realçar que a ‘não proposição do desenho’ seria um indicativo de que na Escolinha de Arte de São

Paulo

não

desenhados, temática partir

bem

não

das

eram

oferecidos

como

foi

é

possível

utilizada

análises

‘modelos’

como

engendradas

dizer

para que

proposta para

o

então a

serem

proposição

metodológica.

presente

estudo,

A é

possível afirmar que, de fato, na experiência EASP não foram encontrados prática

indícios

pedagógica.

de Uma

utilização questão

que

dessa durante

metodologia seu

na

depoimento

para o presente estudo, Ana Mae Barbosa, colocou-se de maneira categórica ao afirmar que: Queríamos levar as crianças para observar esses movimentos, com a finalidade de trazer movimentação ao seu desenho. Ter a experiência desses movimentos e aí desenhar. Era isso que nós desejávamos, mas jamais dando tema. Nunca foi dado um tema na Escolinha, isso é fundamental, nunca foi dado tema, nós provocávamos a experimentação18.

Abaixo, duas produções dos estudantes da EASP, que indicam a observação dos movimentos percebidos nos animais (figuras I e II).

Figura I: Desenho realizado a partir da observação de cavalos no Jóquei Clube de São Paulo. Fonte: Acervo pessoal de Ana Mae Barbosa.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

15


REVISTA

APOTHEKE

Figura II: Desenho realizado a partir da observação de cavalos no Jóquei Clube de São Paulo. Fonte: Acervo pessoal de Ana Mae Barbosa.

Após o momento da observação e da produção, as crianças eram

levadas

a

conhecer

os

demais

espaços

e

pessoas

que

trabalhavam no local. Em contato com os/as trabalhadores/as, algumas questões

eram levantadas pelos/as estudantes. Essas

perguntas, presentes em um questionário, produzido previamente em sala de aula durante encontros que antecederam a visita, em uma

parceria

entre

as

arte/educadoras

e

as

crianças,

eram

direcionadas aos profissionais do jóquei e buscavam conhecer o universo do local visitado, seus/suas trabalhadores/as e os serviços oferecidos. Entre

as

perguntas,

questionava-se

sobre

o

valor

do

salário do adestrador; a dieta de cada animal; os valores para manter um animal naquele local. Estas questões abriam espaço para

diálogos

entre

os/as

profissionais do jóquei.

visitantes

ali

presentes

e

os

Dessa forma, os objetivos traçados

para a experiência no Jóquei Clube iam além dos conhecimentos específicos do campo da arte, ao adentrar os estudos sociais a partir

da

observação

da

realidade

do

local

visitado

e

avaliar

a

daqueles/as que trabalhavam ali. De

volta

à

Escolinha,

era

o

momento

de

atividade, a forma como esta foi realizada e pensar sobre como agir a partir de então. Madalena Freire esclarece que após essa visita ao jóquei:

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

16


REVISTA

APOTHEKE Ao mesmo tempo em que estávamos em êxtase, tínhamos mil perguntas, entre elas: como a gente vai continuar? Que pontos devem ser elencados a partir da observação? Cada visita tinha um rol de questionamentos para as próximas que já começavam a ser observadas em classe19

Na citação acima é possível perceber que as aulas fora da Escolinha,

por

experiência

um

lado

vivida,

satisfazia por

às

arte/educadoras,

outro,

provocava

pela

muitos

questionamentos e uma necessidade de focar as observações no sentido de identificar necessidades, de propor novas ações a partir

do

que

se

mostrava

no

coletivo,

mas

também

individualmente, na sala de aula, na conversa com as crianças. Foi

a

partir

dos

questionamentos

suscitados

que

foi

incorporada à prática um momento nomeado como a hora da roda (figura aconteceu

III). a

Madalena

partir

do

Freire momento

esclarece em

que

ela

que,

a

prática

direcionou

sua

atenção para o acompanhamento das crianças no processo das artes plásticas, no processo gráfico e em ter um momento de interação e discussão com as crianças20.

Figura III: Madalena Freire com estudantes da EASP, na Hora da Roda. Fonte: Revista Intervalo (1968), 27 de março, s/p. Acervo pessoal de Ana Mae Barbosa.

Quantos significados pode ter a imagem acima? Um deles ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

17


REVISTA

APOTHEKE pode ser: olhos nos olhos, uma atenção especial para quem fala, neste caso, a criança ao lado da professora Madalena Freire, inclusive a própria professora se coloca com atenção à fala da criança e, pela imagem, parece dialogar com esta. Um círculo, onde todos/as se veem, todos se escutam e, acredito, conversam. O chão da escola é a base para esta conversa, que me parece bem envolvente, já que todos/as voltam sua atenção para

as

pessoas

interação,

que

diálogo,

formam

um

o

instante

círculo. para

É

um

conhecer

momento mais

um

de ao

outro. Partindo do entendimento de que educar é colaborar para que arte/educadores/as e estudantes transformem suas vidas em um processo constante de aprendizagem, a hora da roda pode ser pensada

como

instantes

em

que

a

conversa,

a

escuta,

a

observação, o pensamento, estavam presentes, mobilizados, ou seja, pode ser compreendida como um espaço de construção de saberes

para

todos

os/as

envolvidos/as,

e

também,

como

um

espaço de pesquisa para a professora. Por

exemplo,

dos

diálogos

com

os/as

estudantes,

dessa

atenção à fala da criança, destaca-se um dos processos de trabalho na Escolinha, a pesquisa com histórias em quadrinhos. Relembrando o momento em que passaram a planejar as ações para trabalhar com as histórias em quadrinho, Madalena Freire conta que: Uma das crianças trouxe a discussão referente à diagramação, da expressão, dos detalhes fisionômicos de cada situação do quadrinho, então, a criança trouxe essa discussão e estava muito interessada. Naquele tempo era muito forte a coisa de negar a história em quadrinhos por causa do pensamento expressivo, porque se acreditava que desfocava a criança. Era proibido. Tinham famílias que proibiam a leitura das histórias em quadrinhos porque não era literatura, coisas do gênero. Nós tínhamos um pensamento contrário a tudo isso, nós partíamos do seguinte, se era significativo para uma criança é porque tem coisa ali e nós íamos buscar essa coisa21.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

18


REVISTA

APOTHEKE Entre as perguntas respondidas pelas famílias nas fichas de matrícula, já citadas, uma das questões era referente à leitura

preferida

das

crianças.

A

maioria

das

respostas

indicava que a criança não sabia ler. Entre aquelas que já realizavam

leituras,

as

respostas

mais

recorrentes

foram

leituras dos livros de Monteiro Lobato. Apenas em duas fichas foi verificada a preferência por revistas em quadrinhos. É importante

lembrar

que

as

informações

das

fichas

foram

fornecidas pelos pais. Será que havia algum preconceito? Em Como usar as histórias em quadrinhos na sala de aula (2004), contexto

Angela de

Rama

um

e

Waldomiro

pensamento

Vergueiro

preconceituoso,

a

apontam

como

respeito

das

histórias em quadrinho, O período de pós-guerra e início da chamada Guerra Fria que foi especialmente propício para a criação do ambiente de desconfiança em relação aos quadrinhos. Fredric Werthman, psiquiatra alemão radicado nos Estados Unidos, encontrou espaço privilegiado para uma campanha de alerta contra os pretensos malefícios que a leitura de histórias em quadrinhos poderia trazer aos estudantes norte-americanos. Baseado nos atendimentos que fazia de jovens problemáticos, o dr. Werthman passou a publicar artigos em jornais e revistas especializadas, ministrar palestras em escolas, participa de programas de rádio e tevê, nos quais sempre salientava os aspectos negativos dos quadrinhos e sua leitura. Generalizando suas conclusões a partir de um segmento de revistas de histórias em quadrinhos- principalmente as histórias de suspense e terror-, e dos casos patológicos de jovens e adolescentes que tratou em seu consultório, ele investiu violentamente contra o meio, denunciando-o como uma grande ameaça à juventude (RAMA, VERGUEIRO, 2004, p. 11).

No livro Histórias em quadrinhos e Educação: formação e prática docente (2011), Marta Regina Paulo da Silva nos dá pistas sobre o pensamento em relação às produções de HQ no contexto realizado

brasileiro. pelo

Segundo

Instituto

a

autora,

Nacional

de

em

1944,

Educação

um e

estudo

Pesquisa

(INEP), órgão ligado ao MEC, afirmava que as HQ provocavam ‘lerdeza mental’ (SILVA, 2011, p. 58). ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

19


REVISTA

APOTHEKE Contrárias a todo este contexto de negação e enxergando potencialidades

no

trabalho

com

histórias

em

quadrinhos,

a

partir da observação do interesse das crianças, a ação inicial das arte/educadoras da Escolinha de Arte de São Paulo foi proporcionar visitas dos estudantes a dois espaços: a fábrica de papel Klabin22 e a Editora Abril23. Pretendendo levar as crianças a compreender os processos de transformação ocorridos entre a produção do papel e a elaboração de uma revista em quadrinhos, as atividades também traziam, de acordo com Célia Cymbalista, implicitamente, o desejo da criança passar a dar sentido para o que ela olhava, observava, (...) o foco era esse, nós estávamos trabalhando observação para desenvolver a capacidade crítica, esse era o foco24. Para Ana Mae Barbosa, organizadora das ações, as visitas aos locais mencionados tinham como propósito observar, como as coisas se transformam, observando fábrica de papel (KLABIN), editoras (ABRIL) buscando abordar as narrativas, por meio das histórias em quadrinhos com o objetivo de compreender que os desenhos se movimentam de um quadrinho para outro, provocando um olhar para a ação25. Na fábrica de papel Klabin, as crianças acompanharam a fabricação de papéis, visitaram espaços da fábrica onde havia empilhadeiras carregando grandes rolos de papéis. Durante a aula/visita os/as estudantes puderam observar os movimentos dessas

máquinas,

os

movimentos

humanos

para

transportar

o

material. Puderam também entender, por meio de explicação de funcionários da empresa, como se dava a transformação entre a extração da celulose da madeira, o cozimento para retirada das substâncias tóxicas e, finalmente, a pasta em forma de rolo, que após secar é a forma que conhecemos do papel. A figura abaixo é uma produção da estudante da EASP, identificada como Vera, e mostra o momento observado por ela durante a visita.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

20


REVISTA

APOTHEKE

Figura IV: Desenho realizado a partir da observação na fábrica de papel Klabin, pela estudante Vera. Fonte: Acervo pessoal de Ana Mae Barbosa.

A

experiência

visitas

na

realizadas

puderam,

conforme

discutir,

em

Nestes

à

fábrica Editora

de

Abril,

planejado

contexto

encontros,

foi

onde

estendida

os/as

anteriormente,

diferente,

segundo

papéis

Ana

a Mae

estudantes

observar

utilização

de

Barbosa,

às

as

e

papéis. crianças

observaram desde o desenho das estórias em quadrinhos até o processo de sua impressão gráfica (BARBOSA, 1975, p. 78). Para as visitas à fábrica de Papel Klabin e à Editora Abril, assim como na experiência realizada no Jóquei Clube, as crianças, auxiliadas

pelas

procuravam

discutir

daquelas

empresas.

arte/educadoras, aspectos No

caso

da da

pergunta26

elaboraram realidade

Editora

dos

Abril,

que

funcionários as

conversas

foram realizadas com produtores, desenhistas e com a editora Ruth Machado Lousada Rocha. Nesta experiência com a história em quadrinhos, contrário àquilo que, cultural, educacional e socialmente acreditava-se prejudicial para as crianças e os jovens, havia, entre as arte/educadoras, um desejo de experimentar determinadas ações para

ver

se

dava

certo

ou

não.

Nesse

sentido,

é

possível

afirmar que na Escolinha havia muita experimentação na prática desenvolvida. Além

das

histórias

em

quadrinhos,

as

arte/educadoras

também trabalharam com outras mídias como jornais e revistas. Madalena Freire, sobre a inclusão desses meios nas atividades com os/as estudantes, afirma que esse trabalho veio junto com ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

21


REVISTA

APOTHEKE a história em quadrinhos, ou seja, articulada à pesquisa e prática com a história em quadrinhos. Partindo do universo significante

da

criança.

Foi

daí

que

nasceu.

Tudo

estava

27

articulado . Sobre a questão, Ana Mae Barbosa pontua que, a leitura de jornais e revistas com crianças era maravilhosa. Já não mais como na Escolinha [refere-se à Escolinha de Arte do Recife]

onde

usávamos

as

revistas

para

aproveitar

não

a

imagem, mas somente o colorido do papel em colagens28. O trabalho com jornais na EASP ocorria durante as aulas de artes plásticas com estudantes com idade entre treze e catorze anos. Durante esses encontros, Ana Mae esclarece que: Não havia uma leitura descompromissada, mas crítica, pois perguntávamos: O que diz sobre o mundo esse jornal? Que notícia te chama mais atenção no jornal de hoje? Vamos ler jornais, comprávamos muitos jornais. O mesmo era feito com a revista. O que te chama atenção na revista? Qual reportagem? Por quê?

A leitura fazia parte do cotidiano na Escolinha e, aqui cabe ressaltar os vários tipos de leituras realizadas durante as aulas na instituição e fora dela: leitura da palavra, da publicidade, do mundo e, conforme percebemos na citação acima, ocorria

também

uma

experimentação,

na

colocavam

como

leitura

de

Escolinha, temas

de

imagens. imagens estudos

Como

espaço

de

toda

ordem

se

voltados

para

o

de

um

desenvolvimento do pensamento crítico. Foi a partir da leitura dessas imagens, presentes nos jornais e nas revistas, que surgiu a proposta dos estudantes construírem,

como

representasse

uma

afirma crítica

Ana dos

Mae,

estudantes

um ao

trabalho

que

mundo,

que

ao

29

leram e ao que viram . Com essas atividades, ainda segundo a arte/educadora, propúnhamos o uso de imagens prontas em outro contexto que era transformado pelas crianças, que recortavam imagens da revista e do jornal e criavam com elas as suas próprias narrativas30. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

22


REVISTA

APOTHEKE História em quadrinhos, leituras e análises de jornais e revistas,

construção

de

narrativas

a

partir

de

diferentes

contextos são experiências desenvolvidas na Escolinha de Arte de São Paulo, que podem ser verificadas como um prenúncio à educação

para

a

contemporânea, abordagem

cultura

Rejane

para

o

visual,

Galvão

ensino

de

que,

Coutinho artes

em

uma

descreve

que

tem

análise como

como

uma

um

dos

pressupostos, buscar, através de uma interpretação crítica, desvelar mecanismos e táticas do mercado cultural produtor de visualidades (COUTINHO, 2009, p. 62). Ana Mae Barbosa que prefere hoje utilizar o termo culturas visuais,

para

falar

de

ensino

de

arte,

explica

que

essa

pluralização se dá por que: Tanto em educação como em arte, pluralizar é preciso, se pensamos dialeticamente e operamos multiculturalmente. Não estou sozinha. Muitas universidades já usam o plural para designar os cursos nessa área, como o Goldsmith College, que possui uma disciplina nomeada História das Culturas Visuais (BARBOSA, 2011, p. 293).

Após essas colocações, pergunto: Não seria o projeto que envolve as histórias em quadrinhos um meio de ativar esses olhares

críticos?

Também

as

publicidades,

interpretadas

e

analisadas na Escolinha presentes em jornais e revistas e, a criação de narrativas a partir desses exercícios, não poderiam se inscrever no contexto do que hoje se nomeia como estudos da cultura visual? Ao retomar as experiências, percebo que as atividades na Escolinha

não

buscavam

simplesmente

a

produção

através

de

desenhos de uma história em quadrinhos, ou ver imagens nos jornais e revistas, mas o que se buscava era conhecer, no caso da primeira experiência, o processo de produção e elaboração de

revistas

em

quadrinhos,

diretamente

em

uma

editora

e

reconhecer a realidade daqueles que ali trabalhavam por meio de pesquisa, de perguntas (pensadas previamente). ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

23


REVISTA

APOTHEKE Os objetivos, assim como na experiência do Jóquei Clube, ultrapassavam a ideia inicial de ampliar as possibilidades do desenho. Havia um interesse em levar os estudantes a perceber aqueles

ambientes,

sua

funcionalidade,

as

pessoas

que

trabalhavam naqueles locais, seus trabalhos, seus cotidianos e, os processos de transformação de materiais e elaboração da HQ, uma produção que, segundo Moacy Cirne (1970), tem uma relevância

histórica,

formalização

da

antes

proposta

da

mesmo cultura

de

fazer

visual

parte

como

da

campo

de

estudos no ensino de artes. Para o autor, essa importância destinada às historias em quadrinhos

são

legítimas

por

seu

uso

como

reforçadora

ideológica, da qual nasceram impregnadas, mas principalmente por ter, em contradição dialética, colocado em xeque toda a ossatura da arte ocidental (CIRNE, 1970, p. 19), considerando que

nesta

linguagem

informação

é

possível

literária,

metalinguísticas,

quanto

suas

observar

tanto

consideráveis

possibilidades

uma

alta

explorações

transcendem

o

preconceito construído pelas elites culturais. De acordo com a análise de Cirne (1970), as histórias em quadrinhos, como forma de arte, são repletas de importância e possibilidades visuais. Uma relevância também visualizada pelo sociólogo

Umberto

Eco

(1979).

Para

ele,

somente

quando

o

estudo das histórias em quadrinhos tivesse superado o estágio esotérico

e

o

público

culto

resolvesse

dar-lhes

a

mesma

atenção que oferece à ópera e outras manifestações culturais elevadas, é que seria possível entender sua importância (ECO, 1979, s/p, grifos do autor). Para a pesquisadora e arte/educadora norte-americana Kerry Freedman, a importância em trabalhar com cultura visual e, especificamente,

com

histórias

em

quadrinhos,

não

está

em

copiar imagens e/ou personagens dessas produções, mas sim na visualização,

a

partir

da

narrativa

dessas

produções,

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

de

24


REVISTA

APOTHEKE aspectos

latentes

sobre

elas

e

como

são

ressignificadas

(FREEDMAN, 2002, p. 59). É por esta perspectiva que aqui é entendido o trabalho realizado com os estudantes da EASP. Entre a prática realizada na EASP e o que se coloca como ‘cultura visual’ ou ‘culturas visuais’ na atualidade percebo o trabalho

na

mencionadas,

Instituição, como

uma

a

partir

experimentação

com

das

experiências

outras

linguagens

artísticas, com a arte como campo expandido. Uma forma de trazer

outras

linguagens

para

o

programa

de

ensino

da

Escolinha de Arte de São Paulo. Trabalhar com esses meios era possivelmente uma maneira de introduzir no programa de ensino e aprendizagem de artes algo mais que tintas, pincéis e lápis. Através

das

ações

planejadas,

tendo

como

eixos

diferentes

mídias, tendo como objetivo o desenvolvimento do pensamento crítico. Notas

25

1

A Escolinha de Arte de São Paulo foi a 53ª Escolinha ligada ao Movimento Escolinhas de Arte. A experiência ocorreu entre os anos de 1968 e 1967. Para maiores detalhes acerca dessa experiência e sobre o Movimento Escolinhas de Arte, conferir: LIMA, Sidiney P. Escolinha de Arte de São Paulo: instantes de uma história (dissertação, IA-UNESP, 2014); LIMA, Sidiney P. Escolinha de Arte do Brasil: movimentos e desdobramentos (2012 ANPAP). 2 Este artigo é um recorte da dissertação Escolinha de Arte de São Paulo: instantes de uma história, orientada pela professora Dra. Rejane Galvão Coutinho e defendida pelo autor no PPG em Artes do IA-UNESP, em agosto de 2014. 3 Documento registrado por Madalena Freire, não publicado até a presente data. FONTE: Acervo pessoa de Ana Mae Barbosa. 4 Todas as imagens referentes à EASP, utilizadas neste trabalho, pertencem ao acervo pessoal de Ana Mae Barbosa. 5 LISPETOR, Clarice (1998) 6 Documento registrado por Madalena Freire, não publicado até a presente data. FONTE: Acervo pessoa de Ana Mae Barbosa. 7 Todas as imagens referentes à EASP, utilizadas neste trabalho, pertencem ao acervo pessoal de Ana Mae Barbosa. 8 Neste trabalho, discuto a experiência EASP tendo como recorte as ações voltadas para o campo de artes visuais, pois durante a pesquisa de mestrado (que resultou na escrita da dissertação Escolinha de Arte de São Paulo: instantes de uma história, defendida em 2014, pelo PPG em Artes do IA-UNESP) tive maior contato com as arte/educadoras responsáveis pela área, que concederam entrevistas. Outro motivo, diz respeito ao fato de ter localizado documentos que podem apoiar as análises das ações, das metodologias e dos objetivos traçados para essa linguagem na EASP. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE 9

BARBOSA, Ana Mae. Entrevista concedida a Sidiney Peterson. São Paulo, 11 jan. 2012. 10 FREIRE, Madalena. Entrevista concedida a Sidiney Peterson. São Paulo, 16 set. 2013. 11 Cf. COUTINHO, Rejane Galvão. Sylvio Rabello e o desenho infantil (1997. 12 Conf. COUTINHO, Rejane Galvão. A coleção de desenhos infantis do acervo Mário de Andrade (2002). 13 Conf. CARVALHO, Cibele Regina de. Um estudo sobre a docência na vida e na obra de Anita Malfatti (2007). 14 MACHADO, Regina. Entrevista concedida a Sidiney Peterson. São Paulo, 21 jan. 2013. 15 Durante a pesquisa de mestrado, realizada entre os anos de 2012 e 2014, encontrei 255 fichas de matrículas dos estudantes da EASP preenchidas, no acervo pessoal de Ana Mae Barbosa. 16 BARBOSA, Ana Mae. Entrevista concedida a Sidiney Peterson. São Paulo, 22 nov. 2012. 17 BARBOSA, Ana Mae. Entrevista concedida a Sidiney Peterson. 22 nov. 2012. 18 Idem. 19 FREIRE, Entrevista concedida a Sidiney Peterson. São Paulo, 16 set. 2013. 20 Idem. 21 Idem. 22 A M. F. Klabin e irmão, criada em 1899, na cidade de São Paulo, por Mauricio Freeman Klabin, executava, também serviços de tipografia. A Fundação da Klabin Irmãos e Cia.(KIC), por Maurício Klabin, seus irmãos Salomão Klabin e Hessel Klabin e o primo Miguel Lafer, em 1899 era responsável por importar produtos de papelaria e produzir artigos para escritório, comércio, repartições públicas e bancos. FONTE: <http://ri.klabin.com.br/static/ptb/historico.asp?idioma=ptb>. Acesso em 22 de agosto de 2013. 23 Criada por Victor Civita (1907- 1990), como Editora Abril, o grupo Abril expandiu-se sendo atualmente um dos grupos mais influentes no campo de comunicação da América Latina. A editora que começou seus trabalhos com o lançamento da publicação O Pato Donald, na década de 1950, expandiu suas publicações na década seguinte com o crescimento da ‘família Disney’.A Editora Abril publica atualmente 53 títulos que atende aos mais diferentes públicos. (FONTE: <www.grupoabril.com.br>. Acesso em 21 de agosto de 2013. 24 CYMBALISTA, Célia. Entrevista concedida a Sidiney Peterson. São Paulo, 02 dez. 2012. 25 BARBOSA, Ana Mae. Entrevista concedida a Sidiney Peterson. São Paulo, 30 nov. 2012. 26 Há uma cópia deste documento em anexo. FONTE: Acervo pessoal de Ana Mae Barbosa. 27 FREIRE, Madalena. Entrevista concedida a Sidiney Peterson. São Paulo, 16 set. 2013. 28 BARBOSA, Ana Mae. Entrevista concedida a Sidiney Peterson. São Paulo, 30 nov. 2012. 29 Idem. 30

Idem.

REFERÊNCIAS BARBOSA, Ana Mae. Escolinha de Arte de São Paulo: fundamento, andamento. Revista Educação para o Desenvolvimento. São Paulo, nº 14, p. 09-18, 1969. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

26


REVISTA

APOTHEKE ________. A cultura Visual antes da cultura visual. Porto Alegre: Revista educação. V. 34, nº 03, set/dez 2011, p. 293- 301. BARBOSA, Ana Mae; CUNHA, Fernanda Pereira da (org.). Abordagem triangular no ensino das artes e culturas visuais. São Paulo: Cortez, 2010. BREDARIOLLI, Rita Luciana B. Das lembranças de Suzana Rodrigues: tópicos modernos de arte e educação. Dissertação de mestrado. São Paulo: ECA-USP, 2004. CARVALHO, Cibele Regina de. Um estudo sobre a docência na vida e na obra de Anita Malfatti. Dissertação, Instituto Presbiteriano Mackenzie. 2007. CIRNE, Moacy. A explosão criativa dos quadrinhos. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1970. COUTINHO, Rejane G. A Coleção de Desenhos Infantis do Acervo Mário de Andrade. Tese de Doutorado, São Paulo: ECA- USP, 2002. ________. Sylvio Rabello e o desenho infantil. Dissertação, ECA/USP,1997. ___________. O que fazer com a Cultura Visual da Escola? VIS- Revista do Programa de Pós-Graduação em Arte. Brasília, v. 8, nº 1, jan/jun 2009, p. 60-67. ________. Considerações sobre a construção do ideário da Arte Infantil In:OLIVEIRA, Marilda O. de (org.). Arte, Educação e Cultura. Santa Maria: UFSM, 2007. ECO, Umberto. Apocalípticos e Integrados. São Paulo: Perspectiva, 1979. ___________. Obra Aberta. 2ª ed. São Paulo: Perspectiva, 1985. FREEDMAN, Kerry. Cultura visual e identidad. Cuadernos de Pedagogía. Barcelona,n.312, p.59-61, 2002. LIMA, Sidiney Peterson F. de. Escolinha de Arte de São Paulo: instantes de uma história. Dissertação. IA-UNESP, São Paulo, 2014. ___________. Escolinha de Arte no Brasil: movimentos e desdobramentos In ANPAP, 2012. LIMA, Sidiney Peterson F. de; COUTINHO, Rejane Galvão. Abordagem Triangular:ziguezagueando entre um ideário e uma ação reconstrutora para o ensino de artes In:Arte/Educação: Corpos em trânsito, XXII CONFAEB, São Paulo: UNESP, 2012. LISPECTOR, Clarice. Água Viva. Rio de Janeiro: Rocco, 1998. LOWENFELD, Viktor; BRITTAIN, W. L. Desenvolvimento da Capacidade Criadora. São Paulo: Mestre Jou. 1977. RAMA, Angela; VERGUEIRO, Waldomiro (Orgs.). Como usar as histórias em quadrinhos na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2004. SILVA, Marta Regina Paulo da. Histórias em quadrinhos e leitura de mundo: a linguagem quadrinhística na formação de professores e professoras. In: NETO, Elydio dos Santos; SILVA, Marta Regina Paulo da. (Orgs). Histórias em Quadrinhos e Educação: formação e prática docente. São Bernardo do Campo: UMESP, 2011.

Sidiney Peterson http://lattes.cnpq.br/7897838185394600 Doutorando do Instituto de Artes da UNESP - Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita - na Área de Concentração de Arte e Educação; Linha de Pesquisa de Processos Artísticos, Experiências Educacionais e Mediação Cultural; Mestre em Artes pelo Instituto de Artes da UNESP - na Linha de Ensino de Aprendizagem da Arte (2014); Graduado em Pedagogia pela Unidade Acadêmica de Garanhuns (UAG)/ Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) em 2010.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

27


REVISTA

APOTHEKE O professor-artista como vírus Joaquim Jesus (I2ADS)

RESUMO Este texto assume-se como um exercício de reflexão e análise crítica ao conceito, histórica e socialmente construído, de professor-artista. Assim, mais do que esgrimir argumentos contra ou a favor este conceito, procura-se num movimento múltiplo perceber nas tensões como se gera um professorartista, com que intuito e com que efeitos. No limite consideraremos que a figura dupla criada pelo sujeito na sua relação com a arte e a educação, ao provocar uma infeção no seu sistema de representações, potenciará uma transformação do sujeito. PALAVRAS-CHAVE: professor-artista; artes visuais; prático reflexivo; produção de subjetividades. Abstract This text assumes itself as an exercise of reflection and critical analysis of the concept, historically and socially constructed, of the artistteacher. Therefore, more than brandish arguments in favor or against this concept, we will seek to understand in their tensions, the way it generates an artist-teacher, for what purpose and with what effects. In the limit, we will consider the double figure created by the subject in relation to art and education that, causing an infection into his code of representations, will enhance a transformation of the subject. Keywords: artist-teacher; visual arts; practical reflexive; production of subjectivities.

Origem e classificação do vírus [O que é? O que leva alguém a dizer-se professor-artista?] A palavra ‘artista-professor’ é fascinante, pois a mescla híbrida

que

propõe

é

sedutora.

Contudo,

não

nos

podemos

esquecer que ela mesma é uma nomeação. Uma catalogação saída do

campo

visuais.

da

literatura

Logo,

como

que

se

dedica

qualquer

ao

ensino

classificação,

das

artes

cumpre

um

propósito de organização conforme um conjunto de critérios, que

se

assumem

essenciais

para

corrigir

uma

determinada

desordem ou tensão existe. Daí que nos devamos perguntar, por um lado, que tipo de desordem se pretende combater e, por outro, a que critérios esse enervamento se deve sujeitar. Não menos

importante

também

é

saber

quem

estabelece

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

esses

28


REVISTA

APOTHEKE critérios nominativos e com que intuito. Mas pensar estas questões exige saber o que se entende por professor-artista, para depois perceber as razões pelas quais alguém se torna num. Assim sendo, e no intuito de situar estas questões

pela

reflexão

sobre

a

minha

própria

condição

de

professor e artista, tive a oportunidade de ler um artigo de Alan

Thornton

(2005)

-

The

Artist

documento,

o

autor

Teacher

as

Reflective

Practitioner. Neste identidade

do

afirma

professor-artista

que

a

construção

interrelaciona-se

com

de

três

mundos distintos: o da arte, o da educação e o da educação artística, práticas,

sendo

que

história,

cada

um

cultura

destes

e

detém

literatura

um

que

conjunto têm

que

de ser

assimiladas pelo professor-artista através de um exercício de autorreflexão (2005,p.167). É então que Thornton (2005), num contexto de tensões, nos apresenta o professor-artista como: i) uma pessoa que está envolvida com a prática artística e com o

ensino;

ii)

artistas

que

baseando

a

possui

características

historicamente sua

relação

se

próximas

dedicaram

pedagógica

de

outros

também

ao

ensino,

numa

imagem

de

mestre/aprendiz; iii) as suas motivações e convicções estão baseadas na sua prática artística e no seu comprometimento com o mundo da arte; iv) pode apresentar características paternais ou maternais que incitam os alunos a resolver os problemas por si próprios e a acreditar, tal como um progenitor, no valor da autoeducação;

v)

sente

a

tensão

entre

a

função

social

da

educação e a autonomia do artista; vi) encara o ensino como uma

espécie

artística;

de

mecenato

vii)

representações

em

está

para

a

sujeito

torno

da

promoção

aos

mitos

profissão

da que

artista

sua

prática

povoam e

da

as sua

personalidade, mais concretamente na ideia que para se ser artista se deve ter um comprometimento assumido e puro para com

o

seu

métier

(Idem.p.167-168).

Ser

professor-artista

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

é

29


REVISTA

APOTHEKE assim

uma

maneira

profissional.

de

Este

estar

encara

na

a

vida,

sua

tal

prática

como

uma

artística

prática como

um

aspeto importante para a sua prática docente e vice-versa, mas onde “os problemas e dificuldades em manter uma prática dual são bem reais” (Thornton,2005,p.171). Deste modo, parece que Thornton (2005) inicia o gesto a partir das teorias de Schön (1983), dizendo que a reflexão em ação - antes, após e durante -, é uma das formas de resolver as tensões e os conflitos de identidade

que

advêm

da

prática

dual

do

professor-artista.

Resta-nos questionar essas práticas e seus efeitos? Ora

as

práticas

dirigidas

a

fomentar

esta

reflexão

baseiam-se em “instruções para que o professor se observe a si mesmo no

seu

trabalho,

registo dessas

assim

como

em

questionários

auto-observações”, às quais eu

para

o

acrescentaria

também o uso do diário de bordo/gráfico, das entrevistas, dos registos

fotográficos

e

vídeos

complementados

ou

não

pelos

princípios da artografia (Larossa,1994,p.64). O aqui está em jogo não é transformar “o que o professor faz ou o que sabe, mas fundamentalmente a sua própria maneira de ser em relação ao seu trabalho (Idem,p.49-50). Por isso a autorreflexão, a autoavaliação e o autocontrole são “práticas pedagógicas” que se

podem

assumir

como

“espaços

institucionalizados”

de

mediação, nos quais os sujeitos encontram ferramentas para o desenvolvimento

pleno

da

sua

“autoconsciência

e

autodeterminação, ou para a restauração de uma relação consigo mesmo” (Idem,p.44-45). Todavia, estas “práticas pedagógicas” mais do que oportunidades favoráveis para o desenvolvimento da autoconsciência, vistas

como

autonomia

“mecanismos

de

e

autodeterminação,

produção

de

devem

experiência

de

ser si”

(Idem,p.44). Uma combinação que promove um desdobramento entre a própria pessoa e uma imagem exterior especular, formando um duplo que se faz visível por uma vontade de autoconhecimento do próprio – o professor-artista. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

30


REVISTA

APOTHEKE Será diante desta imagem que muitos professores munidos com

os

seus

sistemas

de

representação

reagirão

a

esta

nomeação, pois a escolha de uma identidade profissional é uma etapa importante na “afirmação do eu”, e onde contornar essa escolha

pode

levar

a

uma

“dispersão

do

sentimento

de

identidade pessoal” (Huberman,1995,p.40). Assim, o sujeito que se diz professor-artista ao aprender a nomear-se, “a fabricar um duplo discurso mais ou menos estável”, está a reduzir a sua própria “indeterminação” e tensão, já que ao dizer-se a pessoa tranquiliza-se” (Larossa,1994,p.81). Formação

e

desenvolvimento

do

vírus

[Como

se

gera

um

professor-artista?] O discurso daqueles que habitam a cidade escolar tem sido responsável, em parte, por cultivar estereótipos em torno do professor de artes visuais, produzindo um determinado tipo de habitante

que,

quando

dito

e

redito

ano

após

ano

num

determinado contexto, se torna promotor de inseguranças entre os artistas que ao longo dos anos apostaram a sua carreira no campo da educação. António Nóvoa (1999) refere que se é certo que a “acção educativa”

sempre

significativas

de

se

pautou

por

complexidades

imprevisibilidade”,

“estas

e

“margens

características

são ainda mais marcadas nos dias de hoje”, onde todo o género de instituições vê colocado em risco os seus arquétipos de ação, outrora bem definidos e delimitados, face a uma complexa mutação

interdisciplinar

de

áreas

e

saberes

num

espaço

altamente complexo. Então, face a este cenário, o mesmo autor diz-nos

que

o

“reforço

de

práticas

pedagógicas

inovadoras,

construídas pelos professores a partir de uma reflexão sobre a experiência”, parece ser a única saída possível (1999,p.18). É deste modo que é pedido aos professores para refletirem sobre

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

31


REVISTA

APOTHEKE a sua experiência, de forma a produzirem conhecimento que os ajude a lidar com essa mesmas mudanças. Trilhando o caminho por entre as teorias de Schön (1983), o professor que se debruça sobre um determinado saber-fazer pode experimentar a dúvida, o espanto ou confusão de estar perante uma situação inconstante e singular. Para isso deve entregar-se

a

uma

reflexão

prévia,

durante

e

após

o

seu

processo de trabalho, na procura constante dum refinamento das suas práticas que o possam levar a alterar caminhos. Daí que quando alguém reflete em ação “torna-se um investigador em contexto

prático”,

estando

habilitado

para

construir

novos

caminhos e outras possibilidades. A sua investigação não se limita a uma deliberação sobre os meios, que depende de um acordo prévio sobre os fins, pois ele não mantém os meios e os fins

separados,

desenvolve

antes

ou

os

define

constrói

interactivamente

uma

situação

enquanto

problemática

(Schön,1983,p.68). Ora

este

32 processo

de

reflexão

ganha

contornos

interessantes se pensarmos na condição de professor e artista, no sentido em que “prática reflexiva pode ser uma maneira de realizar

a

identidade

do

professor-artista”

(Thornton,

2005,p.173). Vejamos como. Quem

não

(re)conhece,

na

sua

comunidade

escolar,

o

professor de artes visuais como aquele professor que todos os alunos gostam. Aquele que, aparentemente mais do que qualquer outro professor, monta um espetáculo, tem graça e tem carisma (Perissé,

s/d).

improviso

para

Aquele qualquer

que

tem

situação

sempre

uma

inesperada,

resposta

de

combinando

e

recombinando um conjunto de processos. Aquele que relativiza normas

e

verdades.

Espanta

o

medo

porque

não

tem

medo

da

punição: “sofre, mas não desiste de ridicularizar a idiotice humana, o sadismo humano que consiste em reprimir o humano que há em nós e nos outros” (Perissé, s/d). Por isso olha o mundo ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE com uma visão crítica, lúcida e lúdica; não teme o ridículo, critica tudo e todos, partindo de si próprio. Como não cede da irreverência

que

possui,

do

político

que

habita

em

si,

questiona as práticas pedagógicas institucionalizadas, a vida burocrática e as rotinas. Ora

tudo

profissionais

isto

são

tributárias

“ingredientes

do

das

voluntarismo

narrativas

inspirado”

e

que

contribuem para a construção de um palco, onde a atividade do professor podendo,

se ao

aplicados

desenrola contrário

a

como

do

uma

que

qualquer

espécie

lemos

outro

nesta

de

espetáculo,

descrição,

professor

serem

(Correia

&

Matos,2001,p.17). Contudo, quando as comunidades escolares se tendem a se fixar neste tipo de descrição, associando a ideia de voluntarismo inspirado ao professor de artes visuais, ao mesmo tempo que se aproximam duma concepção social de artista, também

se

afastam

duma

ideia

social

de

professor

criando

dispersão e conflitos no espaço identitário dos sujeitos. Daí que

perante

reativo

do

necessidade,

desta que

ideia

de

pensativo,

como

um

sujeito

muitos

professores

de

de

voluntarista,

nós

artes

nos

mais

vejamos

visuais,

de

na nos

pensarmos a nós e às nossas práticas pela reflexão, tornandonos em práticos reflexivos. É então que enquanto professor com uma formação artística sou levado a questionar-me se o que se pretende quando me penso, me digo, me regulo e me avalio, é dizer-me prático reflexivo, como se de alguma forma esta nomeação concedida pela reflexão criasse uma bolha no meu espaço identitário, uma personagem que me permitisse circular de cabeça erguida pela comunidade escolar, porque de alguma forma a minha condição ‘artista’ ao narrar-se como pura e reativa não poderia ser reflexiva. Então coloco duas questões. Se enquanto artista reflito constantemente sobre a minha atuação,

antes,

durante

e

após

a

minha

atividade,

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

não

33


REVISTA

APOTHEKE estarei a ser endogenamente reflexivo? Ou, pelo contrário, se tenho uma atividade como artista que se centra num determinado saber-fazer só poderei ser entendido como um prático? Quero dizer,

se

o

professor-artista,

entendido

como

um

prático

reflexivo, poderia criar cenários que lhe permitissem operar deslocamentos no seu posicionamento de modo a pensar as suas práticas num processo de transformação permanente, permitindolhe um afinamento progressivo das mesmas e a construção de uma identidade estruturada (Thornton,2005), isto não é o mesmo que falar do meu modus operandi como artista? Leonardo

da

Vinci

afirmava

que

a

pintura

era

cosa

mentale e Francisco de Holanda dizia declaração de pensamento. Por

isso,

parece-me

que

implicar

um

artista

que

tem

uma

prática continuada num campo da reflexividade, é algo que, pela sua natureza, se torna redundante. Deste modo, poder-nosíamos questionar sobre os olhares e os discursos que pretendem marcar um determinado contorno fixo para o campo artístico e, neste caso concreto, para o professor-artista e para o ensino das

artes

visuais.

O

que

se

pretende

com

esta

dupla

reflexividade? Desconhecimento ou intenção deliberada? Numa posição

inversa,

também

nos

poderíamos

interrogar

também sobre o porquê de um professor de artes visuais ser adjetivado de artista. Será que o professor de artes visuais tem sempre que ser um artista? Não pode ser apenas professor de desenho ou de educação visual, tal como um professor de matemática ou português, por exemplo. Será um ramo específico da

profissão

como

existe

o

engenheiro

civil,

o

engenheiro

informático, o engenheiro eletroténico, o engenheiro mecânico, etc.. É que quando colocado desta forma o artista mais parece uma caracterização de modos de ser e de estar na profissão professor. Descrito assim, o artista parece ser um adjetivo possuidor de saberes globais e globalizantes, experienciais e secundarizantes da habilidade docente (Terrasêca,1996). LigaISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

34


REVISTA

APOTHEKE se a um nível da formação que pode ser do tipo experiencial, longa/contínua, emanada

do

formal/informal,

mestre,

da

assumir

autoformação

ou

uma da

orientação

apropriação

de

técnicas. Torna-se sinónimo de muita autonomia, ausência de supervisão e de regras, onde a sua atividade se caracteriza por relacionar concepção e execução, fazendo uso de processos originais

e

divergente artista

técnicas

específicas

(Terrasêca,1996).

aproxima-se

da

Deste

de

modo,

imprevisibilidade

reforçando a ideia de ‘voluntarista’ livre

‘inspirado’,

forma

mais

do

que

criativa

a das

e

atividade suas

do

tarefas,

espontâneo e espírito

reflexivo.

Eu

entendo

a

reflexão como a liberdade para criar conhecimento a partir de um quadro teórico existente, que nos permite questionar o que sabemos

e

por

assumir

uma

que

processos

atitude

chegamos

autoscópica

e

a

conhecer.

autocrítica,

Isto

é

perante

a

maneira como nos relacionamos e entendemos o mundo. E aqui a prática

reflexiva

e

a

reflexividade

assumem-se

como

coisas

diferentes (Campbell,2005). A

prática

reflexiva

pode

ser

definida

como

o

uso

sistemático da reflexão, com o intuito de atingir uma maior autocompreensão

através

objetivos, motivações

e

do

relacionamento

intenções

em

ação.

de

experiências,

Ao passo

que

a

reflexividade leva em conta a presença da pessoa que está a refletir, e o efeito dessa pessoa sobre o que está a ser refletido (Ellis & Bochner,2000). Parece então que o que é necessário na prática reflexiva é uma explicitação do plano discursivo ou do mapa cognitivo em que se alicerça; o seu campo de ação e o seu posicionamento político. Só assim pode existir um continuum ao longo do qual nos podemos mover do pensamento reflexivo, como comportamento desejado, à prática reflexiva como reconhecimento do lugar identitário do sujeito no diálogo relacional consigo mesmo e com os alunos.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

35


REVISTA

APOTHEKE Deste modo, estabelecer pontes entre o artista e a prática reflexiva torna-se algo que não é casual para Thornton (2005), já que quando “geralmente os profissionais se referem a uma ‘arte’

de

artista

ensino

para

se

ou

de

referir

gestão”, aos

estes

utilizam

profissionais

“o

termo

excecionalmente

hábeis em lidar com situações de incerteza, singularidade e conflito”

(Jennings

&

Kennedy,1996,p.15

cit.

Thornton

2005,p.172). Assim o artístico liga-se menos à ação crítica, em torno de um determinado saber-fazer, e mais aquilo que por obra de uma alquimia interessa à escola dentro do campo do artístico. Posto isto, vejamos então como o objectivo da educação deveria ser entendido como a preparação de artistas. E pelo termo artista [...] não queremos dizer necessariamente pintores, dançarinos, poetas ou atores dramáticos. Nós queremos dizer indivíduos que desenvolvem ideias, sensações, habilidades e imaginação para criar um trabalho […]. O maior elogio que podemos dar a alguém é dizer que ele ou ela é um artista, seja como carpinteiro, cirurgião, cozinheiro, engenheiro, físico ou professor. As belas artes não têm o monopólio do artístico (Eisner,2008, p.9).

Ao contrário dos que afirmam, tal como Eisner, que a arte não

pertence

ao

domínio

exclusivo

das

belas

artes,

o

que

acredito quererem dizer é que a reflexividade não pertence ao domínio

exclusivo

da

arte.

Logo,

não

é

necessário

que

um

professor reflexivo tenha que ser forçosamente um professor de artes visuais, assim como um professor de artes visuais não tem necessariamente que ter uma produção artística. Daí que esta adjetivação – artista – da profissão professor, deva ser lida

como

algo

que

transporta

em

si

inventividade,

criatividade, reflexividade, pensamento divergente, etc., mas sem a isso estar ligada qualquer prática artística, qualquer saber-fazer no campo da arte. Por isso, inversamente àquilo que se retratava há pouco, um

professor

da

área

artística

pode

muito

bem

ser

um:

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

i)

36


REVISTA

APOTHEKE “professor-instrutor”, aprendizagem, assimiladas; tarefas,

com ii)

exige

aquele

respostas o

difunde

prontas

desempenhos,

profere

que

repetitivo

torna

e

ortopedicamente

e

eficazes

“professor-capataz”,

“professor-treinador”, assimilável,

que

aquele

os

o

seus iii)

que

serem reparte

protestos;

saber

exequível;

a

a

o

compreensível, ou

aqueloutro

“professor-sábio” distante, especialista, conhecedor imenso da sua disciplina e “cujo único objetivo é saber se alguém quer aprender

ou

não”?

(Perissé,

s/d).

E

por

fim,

por

que

não

poderíamos ter também um lugar para o “artista-etc”, aquele que reúne e funde outras atividades à sua raiz de artista: artista-curador, artista-ativista, artista-produtor, artistaagenciador,

artista-teórico,

artista-terapeuta,

artista-

professor, artista-químico… (Basbaum,2004). Para além dos pressupostos desta divisão bipolar, esta situação levanta a meu ver uma questão aparentemente natural, relativamente à forma como a escola na sua trama entrega o papel de prático ao artista. Se por um lado temos toda uma carga depreciativa construída em torno do campo da prática, encarada sob este ponto de vista de uma forma positivista, instrumental

e

dirigida

à

solução

de

problemas

mediante

a

aplicação de regras que o conhecimento teórico produziu; por outro, apercebemo-nos que teoria e prática são assumidas como duas

entidades

com

hierarquizados,

estatutos

concebidas

como

diferentes, diferentes

distintos

e

perspetivas

da

realidade, tendendo-se para uma subordinação dos níveis mais práticos abstratos

e

concretos,

que

fornecem

relativamente os

meios

aos

para

o

mais exame

teóricos

e

crítico

e

reflexivo das práticas (Correia:1999). Em suma, estes estereótipos são lugares que ao mesmo tempo que estão a circunscrever um saber, estão também a apontar um caminho

através

do

qual

podemos

realizar

uma

narrativa

profissional, o que me leva a pensar “porque estabelecemos uma ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

37


REVISTA

APOTHEKE fronteira entre a arte como forma de ‘cultivo’ individual e a arte

como

pensar

a

profissão?” quem

(Martins,2011,p.15).

importa

se

sou

professor

Autorizo-me ou

a

artista?

Ou

professor-artista? Onde se situa este tipo de pensamento que cria para nós a necessidade de nos inscrevermos num grande grupo

de

coisas,

segundo

categorias

e

características

específicas, criando redes que nos confortam no sentimento de pertença mas nos impedem de pensar e agir? Possibilidades de resistência [O professor-artista como infeção do sujeito ou vírus] Uma das questões mais debatidas em torno do professorartista

está

relacionada

com

a

questão

da

identidade;

ou

melhor, com a convivência de duas figuras (o professor e o artista)

com

melhor

compromissos

palavra,

que

de

vida

quando

diferentes,

interiorizadas

à

falta

no

de

espaço

identitário de um sujeito lhe provoca dispersão e conflito interior. Se

por

consideram

um

lado

encontramos

professores,

alguns

alimentando

uma

artistas

atividade

que da

se

outra

como algo essencial e inevitável. Por outro, temos artistas que desejam manter alguma distinção entre o seu lado artístico e

o

ensino,

termos

oferecendo

‘educação’

experiência

ou

escolar

contraditórias

algum

entrave

‘ensino’,

com

algumas

como

e

consequência

práticas

(Adams,2007,p.268).

distanciamento de

aos uma

traumatizantes

Concomitantemente,

e

também

os artistas que trabalham em regime de residência artística em museus, espaços culturais ou parcerias com escolas, vivem na incerteza de que papéis estão a representar quando trabalham com os alunos, mostrando-nos, por vezes, a própria tendência em que estes programas estão inseridos (Upitis,2005). Sabendo

sempre

que

é

de

um

constructo

social

de

que

partimos, podemos dizer que as delineações que vagueiam em torno do

artista

o

descrevem

como

um

sujeito com

atitudes

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

38


REVISTA

APOTHEKE despreocupadas, atividades espontâneas, condições atípicas de trabalho, objetivos de produção tendo em vista uma exposição, exposições em galerias ou museus, etc.; enquanto o professor, por comparação, pois parece ser assim que as coisas funcionam, é visto como alguém que trabalha dentro de um sistema estável e estruturado, cujos objetivos são o sucesso dos seus alunos e não tanto os seus êxitos individuais. Neste sentido, a união destas duas entidades pode parecer confusa e frustrante para quem deseja assumir a representação de ambos os papéis, já que entra

num

dilema

baseado

nas

diferenças

de

objetivos

e

características entre ambas. Mas mais do que uma questão de convivência entre o professor e o artista, é a própria noção de

convivência,

categorização

ao

e

trazer

consigo

normalização

da

uma

certa

tensão,

que

ideia deve

de ser

questionada. Num artigo publicado na década de 50 pela Art Education, Lanier (1959) desaprovava a utilização da palavra, já que na sua opinião o professor-artista não teria lugar no campo da educação artística, pois ser artista era bastante diferente de ser professor confusões

e

professores artistas

de ter

arte.

aplicação

implicações

levam

vivem

A

vidas

num

do

negativas,

profissionais

mundo

termo já

que

muito

relativamente

poderia

gerar

artistas

diferentes.

aberto,

e Os

combinando

objetivos pessoais e profissionais, nomeadamente exposições, com a

produção de

autossustento

económico.

O

artista

é

um

espírito livre e sem restrições, enquanto o professor vive num mundo de prestação de contas (Daichendt,2010:64; Lanier,1959). É diante desta realidade que se pensarmos a palavra tensão com mais cuidado, veremos que ela pode significar: i) ao nível fisiológico um estado de rigidez dos corpos; ii) ao nível da eletricidade a diferença de potencial entre as extremidades de um condutor = voltagem; iii) ao nível da física a força de expansão dos fluidos elásticos. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

39


REVISTA

APOTHEKE Isto

quer

dizer

professor-artista

que

podem

as

tensões

assumir

que

várias

rodeiam

formas,

o

pelo

termo que

a

pessoa que a ele se associa não terá necessariamente que se colocar

numa

expansão,

posição

algo

em

rígida,

podendo

movimento.

Neste

assumir caso,

uma

força

Anderson

de

(1981)

constatou que “entre os papéis do artista e professor de arte, deve-se ter em mente que o papel de cada um não é uma entidade separada,

mas

que

uma

grande

quantidade

de

fusão

interdisciplinar” (1981,p.45). Se

por

um

experimentação, problemas.

lado

o

conceito

de

‘artista’

produção

e

uma

outro,

o

‘professor’

Por

forma

de

valoriza

pensar mais

a

sobre

os

que

um

do

especialista é também um agente manipulador e criativo que se adapta, reage e cria ambientes onde incita os alunos a pensar por meio de conceitos e questões visuais. Por isso, da mesma forma que um ‘artista’ utiliza vários médiuns para exprimir as suas ideias, o ‘professor’ manipula objetos táteis, sons, voz e conceitos para mobilizar um ambiente de aprendizagem. Deste modo, o professor-artista torna-se numa adaptação constante de dois

campos

onde

o

engenho

artístico

se

presta

ao

ensino

(Daichendt,2010,p.65). Todavia, viver na junção de dois campos que

interagem

não

é

viver

numa

zona

de

contacto,

como

também é estar continuamente numa zona inflamada. E como bem sabemos, as inflamações são reações do organismo às infeções produzidas por um corpo estranho – o antigénio. Tomando esta metáfora como exemplo, o professor-artista ao se assumir como um corpo estranho que está a invadir o sujeito e o está a infetar, consequentemente o seu sistema imunitário irá ativar-se e produzir anticorpos. Poderíamos admitir que perante

esta

situação

se

impusesse

ao

sujeito

artista

desenvolver antigénios, corpos estranhos ao organismo escolar, de

forma

a

infetá-lo

e

observar

nessa

reação

movimentações dos seus anticorpos (Groys,2009).

o

tipo

de

Uma posição

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

40


REVISTA

APOTHEKE que significa nos aceitarmos como bancada de experimentação, um pouco à semelhança do estranho caso de Dr. Jekyll e Mr. Hyde, onde como indivíduos infetados nos pudéssemos pensar a nós próprios e criarmos campos de resistência. Só desta forma poderíamos equacionar colocarmo-nos numa posição contrária à do

médico

ou

do

técnico,

que

procura

corrigir

o

mau

funcionamento ou deficiência de uma peça ou de um corpo. Deste modo,

os

artistas

e

o

ensino

da

arte

deveriam

seguir

a

alegoria da evolução biológica, no sentido em que os “artistas precisam de alterar o sistema imunológico da sua arte, de modo a incorporarem novos bacilos estéticos para sobreviver a elas, e encontrar um novo equilíbrio interior, uma nova definição de saúde”

(Malevitch

função

do

‘desativar’

cit.

artista a

Groys,2009,

na

imunidade

escola do

p.28).

passaria

estudante,

Sendo

assim,

precisamente

permitindo-lhe

a

por estar

constantemente infetado e doente. Relativamente aos professores, se por um lado são estes que tendencialmente se deixam ‘isolar’ mais, permitindo mais facilmente à escola identificá-los, analisá-los e imunizá-los; por outro, é precisamente neste isolamento que se potenciam também as melhores condições para o desenvolvimento da infeção (Groys,2009). Um espaço de transformação e desprendimento de si, onde o político, o animal e o artístico que habitam em nós não encontrassem equilíbrio entre o ensino e o fazer arte, mas antes uma tensão que inflamasse estas articulações ao ponto de gerar

uma

infeção,

identitário do

cujos

antigénios

deixassem

o

organismo

sujeito professor-artista em dificuldades de

imunidade, ao ponto dele próprio se tornar numa espécie de vírus, um ser vivo sem qualquer classificação biológica, que não se enquadra em nenhuma categorização. Em

suma,

contraditórios

ainda com

os

que

os

objetivos

objetivos

do

do

artista

professor,

pareçam

acredito

que

entender a educação do ponto de vista do artista oferece um ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

41


REVISTA

APOTHEKE grau zero de escrita para que outras possibilidades e desvios aconteçam, ainda que num lugar de compreensão aparentemente ilógica ou intraduzível. Assim, como o pensamento artístico está

em

constante

devir,

qualquer

forma

de

ensino

que

se

baseie nela terá forçosamente que a acompanhar, ou será tão eficaz como tentar ensinar a uma planta o alfabeto, ou um quadro a uma lebre morta. Contudo, mesmo que a racionalidade técnica desta relação possa ser superada a favor da interação e se possam encontrar, metaforicamente, semelhanças entre o professor e o artista, a verdade é que ela não deixa de ser precisamente o que é: uma metáfora. REFERÊNCIAS ADAMS, J. (2007) Artists Becoming Teachers: Expressions of Identity Transformation in a Virtual Forum. International Journal of Art & Design Education, 26 (3), pp.264-273. ANDERSON, C. H. (1981). The identity crisis of the art educator: Artist? Teacher? Both?. Art Education, 34(4), pp.45-46. BASBAUM, R. (2004). I Love Etc.-Artist. In Jens Hoffmann (eds). The next Document should be curated by an artist. Frankfurt: Revolver Archiv für aktuelle Kunst. CAMPBELL, H.L. (2005). Spiritual Reflective Practice in Preservice Art Education. Studies in Art Education: A Journal of Issues and Research Studies in Art Education, 47(1), pp.51-69 CORREIA, J. (1999). Os lugares-comuns na formação de professores. Porto: Edições ASA. CORREIA, J. & MATOS, M. (2001). Solidões e solidariedades nos quotidianos dos professores. Porto: Edições Asa. EISNER, E. (2008). “O que a educação pode aprender das artes”. Currículo sem Fronteiras,8(2), pp.5-17. ELLIS, C, & BOCHNER, A. (2000). Autoethnograpby, personal narrative, and reflexivity: Researcher as subject. In N. Denzin & Y. Lincoln (Eds.), The handbook of qualitative research (2nd ed.), (pp.733-768). Thousand Oaks, CA: Sage Publications. DAICHENDT, J. (2010). Artist-Teacher: a philosophy for creating and teaching. Chicago: The University Chicago Press. GROYS, B. (2009). Education by infaction. In S. Madoff (Eds.), Art School: (Propositions for the 21st Century) (pp.15-32). Massachusetts: MIT press books. HUBERMAN, M. (1995). O Ciclo de vida profissional dos professores. In A. Nóvoa (Org), Vidas de professores (pp.31-61). Porto: Porto Editora. JENNINGS, C. & KENNEDY, E. (1996). The reflective professional in education. Londres: Jessica Kingsley LANIER, V. (1959). Affectation and Art Education”. Art Education, 12(7), pp.10-21. LARROSA, J. (1994). Tecnologias do eu e educação. In Tomaz T. da Silva, O sujeito da educação (p.35-86). Petrópolis: Vozes. MARTINS, C. (2011). As narrativas do génio e da salvação: a invenção do olhar e a fabricação da mão na Educação e no Ensino das Artes Visuais em ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

42


REVISTA

APOTHEKE Portugal (de finais de XVIII até à primeira metade do século XX). Tese de Doutoramento em Educação. Lisboa: Instituto da Educação da Universidade de Lisboa. NÓVOA, A. (1999). Os professores na virada do milénio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas. In Educação & Pesquisa, 25(1), pp.11-20. PERISSÉ, G. (s/d) Professor-artista...ou palhaço? [On-line]. Acedido em outubro de 2012, em http://www.hottopos.com/videtur27/gabriel.htm SCHÖN, D. (1983). The Reflective Practicioner. Aldershot: Ashgate. TERRASÊCA, M. (1996). Referenciais subjacentes à estruturação das práticas docentes: análise dos discursos dos/as professores/as. Dissertação de Mestrado. Porto: Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto THORNTON, A. (2005). The Artist Teacher as Reflective Practitioner. [Versão eletrónica em PDF]. International Journal of Art & Design Education, 24(2),166-174. Acedido em fevereiro de 2008, em http://www.nsead.org//publications/ijade.aspx UPITIS, R. (2009). Challenges for artist and teacher working in partnership. In P. Burnard. & S. Hennessy (eds.), Reflective Practice in Arts Education (pp.3-12). Springer Science+Business Media B.V.

Joaquim Jesus info@joaquimjesus.com Doutor em Educação Artística e Membro Integrado do Núcleo de Educação Artística (nEA), do Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade (I2ADS), Faculdade de Belas Artes, Universidade do Porto.

43

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE [entre]margens poéticas e pedagógicas Elaine Schmidlin(UDESC) RESUMO O texto apresenta as relações (in)tensas entre o poético e o pedagógico, as quais foram experimentadas durante o processo de um curso de licenciatura, bem como pretende contribuir com a produção de uma diferença de sentido para a formação docente. A escrita, em forma de ensaio, propõe entrelaçamentos com a filosofia e a literatura e deriva de encontros ocorridos em disciplinas de estágios curriculares, em que estudantes foram provocados a pensar um trabalho poético a partir de projetos de ensino e relatórios que consistem de trabalhos pedagógicos obrigatórios para atuação em escolas. Com a finalidade de provocar uma diferença em modos de viver a vida e a docência, essas proposições, em formato de publicações artísticas, tinham o propósito de agir como dispositivos para esburacar a representação docente padrão, usualmente construída no processo de formação. Palavras-chave: Pedagógico; Poético; Formação docente; Diferença. ABSTRACT This paper presents the (in)tense relations between the poetic and the pedagogical, which were experienced during the process of a teaching undergraduate course, and also aims at contributing to the production of a difference of meaning in the teacher training. In the form of an essay, it proposes the intertwining with philosophy and literature, and resulted from meetings held during the curricular structured teacher training, when students were challenged to think a poetic work inspired in pedagogical projects and in reports about educational works which are required for the professional performance in schools. In order to cause a difference in the ways of living life and teaching, these propositions, shaped as artistic publications, were meant to act as devices to make holes in the standard teaching representation, which is usually built in the training process. Keywords: Pedagogical; Poetic; Teacher training; Difference.

[entre]Margens [...] numa canoinha de nada, nessa água que não para, de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro – o rio. João Guimarães Rosa

Rio abaixo, rio acima, numa canoinha de nada, permaneço “naqueles espaços do rio, de meio a meio, sempre dentro da canoa,

para

dela

não

saltar,

nunca

mais.”

(ROSA,

2005,

p.78). Nesse meio, entre margens, surge a escrita em torno da arte como manifestação poética e o ensino de arte como proposição

pedagógica,

ambos

envolvidos

em

uma

formação

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

44


REVISTA

APOTHEKE inicial de licenciatura. Essa relação poética e pedagógica pode contribuir para produzir uma diferença em modos de ser docentes? Certamente, importância da

muitas arte

publicações

para

a

educação.

evidenciaram

Entre

elas,

a

Elliot

Eisner, com o artigo “o que pode a educação aprender das artes sobre a prática da educação?”, Herbert Read, com “a educação

através

experiência”

da

são

arte”

e

fontes

John

Dewey,

referenciais

com

“arte

como

importantes

para

artigos e textos que ressaltam a importância do pensamento artístico para a educação. Entretanto, na graduação em artes visuais (bacharelado e

licenciatura)

aparece

uma

relação

dicotômica

entre

o

poético e o pedagógico, entre o artista e o professor, ou seja, entre arte e ensino de arte. Essa dicotomia colabora com

um

pensamento

criação

na

representação

representacional

docência. volta-se

Esse para

incapaz

pensamento a

busca

de em

de

afirmar torno

uma

a da

identidade

docente que em nada contribui para o percurso da formação, especialmente no período dos estágios curriculares, em que muitos estudantes se deparam com perguntas. Entre elas, a questão de como se torna professor(a). Como salienta Pereira, “[...]chamo professor o sujeito que se produz em uma prática de ensinar, de trabalhar na formação de (PEREIRA,

outros

2013,

sujeitos,

p.13).

em

Essa

uma

prática

produção

ou

de

educar.”

configuração

docente, sem dúvida, deve se constituir na prática em um estado de desequilíbrio permanente, para que formas e modos de ser docente se reconfigurem continuamente. Entretanto, nas escolas em geral, essa prática docente se mostra referenciada em um modelo representativo que busca um

perfil

pedagógicos

de

uma

identidade

preconcebidos.

A

estabelecida partir

dessa

em

modos questão

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

45


REVISTA

APOTHEKE problemática, como pode a experiência com a arte afetar a formação do licenciando de modo a produzir a criação da diferença em seu exercício docente nos estágios curriculares supervisionados? [uma] Margem Na formação inicial se encontram as disciplinas dos estágios

curriculares

supervisionados,

em

que

estudantes

realizam observações sobre as práticas do professor de arte no

campo

de

atuação,

para

posteriores

reflexões

e

elaborações de projetos de ensino e planejamento de aulas. Essas

observações,

em

sua

maioria,

evidenciam

um

ensino

artístico muito voltado para um conteúdo histórico sobre arte, oferecendo pouca experiência com a materialidade da arte na escola. Esse fato tem provocado reflexões por parte dos

estudantes/estagiários

licenciatura, artísticas

pois,

O

tem

desenvolvidas

consonância com estágio.

se

quanto

a

licenciando

a

que

âmbito

docente

tem

formação

verificado

nesse

prática

à

inicial as

práticas

não

observada

oportunidade

em

estão no

de

em

campo

de

vivenciar,

durante a sua formação, diversas experiências artísticas em ateliê, porém, na escola, o tempo é limitado e nem sempre se dispõe

de

garantir

espaço

essa

físico

experiência

adequado. com

a

Afinal,

arte

em

não um

espaço

como com

carteiras e cadeiras que (quase) impossibilitam o trabalho artístico. Isso também afeta a prática docente. A partir disso, como provocar então a criação de outros modos pedagógicos fora dos modelos e representações docentes conhecidos em um contexto tão tradicional como a educação escolar? Parece que o ensinar com arte ainda é algo que deixa o professor com receio de voltar a um ensino, próximo ao que era na década de 80, quando a arte na escola era ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

46


REVISTA

APOTHEKE reduzida a uma atividade, algo que, infelizmente, ainda se observa em muitas escolas. Nas práticas de alguns docentes ainda

se

configura

um

ensino

de

arte

que,

ora

está

preocupado com um conteúdo sobre arte, ora com a expressão artística. Essas questões são importantes para o contexto do ensino,

pois

uma

não

deve

excluir

a

outra.

Entretanto,

parece que o ensino sobre arte se sobrepõe ao ensino com arte tornando o conhecimento, nessa área, apenas informação e a expressão artística, um resultado do processo da leitura de uma imagem de arte. A criação de uma poética que envolve o pensamento visual

deixa

de

ser

considerada

na

prática

docente do licenciando que, no entanto, a vivencia em sua formação nas disciplinas práticas de linguagens artísticas oferecidas pelo curso.

Poderia esse exercício poético de

experimentação artística esburacar modelos de representação docente na graduação em licenciatura? Para estágio

tanto,

em

curricular,

provocados

a

pensar

um

dos

os

encontros

na

disciplina

estudantes/estagiários

poeticamente

a

questão

de

foram

pedagógica,

aproximando o fazer arte do ensinar arte. Algo que, muitas vezes, por

inúmeras

razões,

se

apresenta

como

uma

linha

divisória entre bacharelado e licenciatura. Parece que, ao professor cabe o pedagógico e, ao artista o poético. No entanto, o poético está na vida de cada um, em suas escolhas estéticas

pessoais,

constituintes

de

qualquer

sujeito

em

formação. O exercício poético foi realizado a partir do projeto de ensino e do relatório, ambos obrigatórios para atuação nos

campos

de

estágio.

Manteve-se,

ainda

assim,

nesse

trabalho, o cuidado com a sistematização da construção do projeto de ensino e, também, com a reflexão sobre a atuação nos estágios, os quais não foram excluídos da construção poética, mas incorporados a ela. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

47


REVISTA

APOTHEKE Ao

final

apresentaram

dos

suas

encontros,

os

publicações

e,

estudantes/estagiários por

atravessamentos

e

afecções, passaram, também, a questionar a formação docente e, de certo modo, a produzir diferença em suas próprias concepções do tornar-se professor e artista.

Publicação Artística – Autor: Leonardo Irineu José de Souza (2015) Projeto e Relatório – Vídeo Experimental

48 Alguns

experimentaram,

eles

mesmos,

suas

proposições

pedagógicas e artísticas oferecidas aos estudantes, e as colocaram

em

palavras e

suas

imagens

publicações; produzindo

outros, textos

interferiram

visuais,

como

com o

de

Leonardo, que trabalhou no estágio o olhar do estudante para a

escola,

o

que

resultou

na

produção

de

vídeos

experimentais. De certo modo, todos tiveram a preocupação de realizar

suas

reflexões

acerca

da

experiência

docente,

valorizando o que Pereira denomina de professoralidade: Estou entendendo que a professoralidade não é uma identidade que um sujeito constrói ou assume ou incorpora, mas, de outro modo, é uma diferença que o sujeito produz em si. Vir a ser professor é vir a ser algo que não se vinha sendo, é diferir de si mesmo. E, no caso de ser uma diferença, não é a recorrência a um mesmo, a um modelo ou padrão. (PEREIRA, 2013, p.35)

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Essa

importante

experimental

questão

poético,

pois

foi

foi

ativada

pelo

necessário

exercício

desconstruir

a

docência como representação de uma identidade, no intuito de apontar para a possibilidade de uma educação como produção de uma

diferença.

Ainda

hoje,

as

representações

docentes

são

formas estáticas que nos levam a figurar uma docência padrão, estereotipada, que amarra a vitalidade da criação e contribui para um ensino sobre arte, que inclui a escrita de projetos e relatórios. Apesar de serem importantes para a atuação nos estágios,

os

mesmos

são

vistos,

geralmente,

como

algo

que

prioriza os aspectos pedagógicos. Entretanto, o exercício da poética

pode,

de

algum

modo,

vitalizar

e

ampliar

contatos

estéticos, propondo vivências com a materialidade da arte que abrem

interstícios

e

fendas

para

o

acontecimento,

o

inesperado. Porém, O acontecimento não é o que acontece (acidente), ele é no que acontece o puro expresso que nos dá sinal e nos espera. [...] ele é o que deve ser compreendido, o que deve ser querido, o que deve ser representado no que acontece. (DELEUZE, 2003, p.152

Penso poético

que

atuam

os como

acontecimentos forças

que

decorridos

do

desequilibram

exercício a

suposta

estabilidade do sistema pedagógico, projetando-o no movimento, em um bloco de sensações que realiza uma torção no sentido representativo da forma docente, pensando arte como perceptos e afectos, como diria Deleuze.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

49


REVISTA

APOTHEKE

Publicação Artística – Autora: Maria Eduarda Müller(2015) Projeto e Relatório – As cidades invisíveis

É uma força que nos move a múltiplas conexões. Como aquela que move o trabalho de Maria Eduarda (Duda), que abre um olhar para a cidade tornando visível suas (in)visibilidades. Talvez, algo a impulsione e faça querer outros caminhos que, muitas vezes, não foram aqueles que a moveram inicialmente, mas que, de alguma forma, estavam latentes e a moveram em atos de criar outros modos de ser docente, sendo também poética. As experiências poéticas no exercício docente poderiam, então,

ser

arrastam

compreendidas

alguns

clichês

como em

um

movimento

projetos

de

forças

pedagógicos

que para

potencializar a própria formação docente em artes visuais, ser compreendidas, como encontro que articula no acontecimento um sentido, pois “a experiência é em primeiro lugar um encontro ou uma relação com algo que se experimenta, que se prova”. (LARROSA, 2015, p.26)

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

50


REVISTA

APOTHEKE

Publicação Artística – Autora: Graziela Martins(2015) Projeto e Relatório – Uma Versão dos HQs

Encontros como os registrados no caderno de desenho de Graziela, povoado de recortes de autores, imagens de histórias em quadrinhos, fantasias, desejos e potências expressos quase como em um diário, carregado de experiências que se provam à medida

que

se

realizam.

estudantes/estagiários, longe de

Outras

publicações

dos

se abrigarem no conhecido,

desalojaram-se de seus lugares para experimentar outros modos de realizar seus trabalhos e exercícios pedagógicos.

Publicação Artística – Autora: Fabiana Vargas Quevedo(2015) Projeto e Relatório – História em Quadrinhos (HQ): processo de criação como forma de aprendizado

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

51


REVISTA

APOTHEKE Fabiana histórias

criou

sobre

narrativas

a

em

construção

de

seu

caderno,

uma

HQ

contando

em

invenção

metodológica, em que participaram, também, os estudantes do campo do estágio. Cabe

salientar

que

os

estágios

curriculares

relatados

ocorreram em uma instituição pública localizada no centro de Florianópolis (SC). A mesma possui em sua estrutura bastante ampla

uma

sala

de

artes

que

professores. Entretanto, muitos

é

pouco

utilizada

pelos

estágios ocorreram em aulas

faixas, o que possibilitou a ida a sala de artes equipada com mesas

maiores,

pincéis

e

banquetas,

tintas

para

aparelhos

pintura,

de

entre

vídeo outros

e

televisão,

materiais.

A

escola segue os Parâmetros Curriculares de Santa Catarina em suas ações educativas, norteadas pela visão sócio histórica de aprendizagem em Vygotsky. Outras

publicações

foram

produzidas,

mas

não

estão

mencionadas neste texto. Porém, cabe salientar que todos os trabalhos

produzidos

relevantes

para

o

pelos

exercício

estudantes/estagiários reflexivo

da

prática

foram docente

desenvolvida no campo de estágio, e também salientaram a tênue margem entre a poética e a pedagogia. Cabe a pergunta: o que se pode ver na/da outra margem? [outra] Margem Por

outro

lado,

percebe-se

na

escrita

dos

Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCNs)- Arte a preocupação de abarcar todas

as

manifestações

artísticas,

estendendo-as

para

a

visualidade cultural e cotidiana, articulando-as com a própria vida.

Além

das

diretrizes

educacionais

de

licenciatura

referenciam-se

nacionais

professores

em (ou

e

estaduais,

escolas poderiam

e

as

ações

estudantes

de

referenciar-se)

em

inúmeros autores que contribuem com a educação e com propostas ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

52


REVISTA

APOTHEKE metodológicas, que compreendem a arte na escola como mediadora de ações culturais. Embora essas questões estejam salientadas nas

publicações

e

configurações

docentes

observadas

distância

entre

prática elas,

as

docente.

a

falta

secretarias

nos

de

estágios

diretrizes

Isso

curriculares,

acontece

compreensão

educacionais,

que

dos

muitas

evidenciam documentos

por sobre

diversas a

área

insistem

uma

enorme

oficiais razões, de

no

ações

arte

e

a

entre pelas

exercício

da

polivalência; por outro lado, também existe a problemática da formação do professor e da falta de uma educação continuada nesse campo de conhecimento. Diante disso, como nos deslocar para a formação docente sem levar em conta que a educação ainda prescreve (ou até oferece) modelos

referenciais?

Como nos reinventar enquanto

professores de arte em formação quando as escolas restringem espaço e tempo para o exercício artístico? Como nos descolar de imagens representativas do que seriam modos docentes em arte?

Quais

discursos

e

narrativas

produzimos

ao

nos

deslocarmos para as experiências com a arte? Muitas perguntas para poucas respostas, ou talvez resposta alguma; somente um pensamento à deriva como aquele que dirige “a canoinha de nada pelo rio, nessa água que não para”. Assim, no movimento entre o poético e o pedagógico é possível acionar outros sentidos

para

outros

e novos

modos

de ser

docente.

Afinal, quando não se tem um modelo prescritivo de ensino, a incerteza instaura-se de modo instigador. “O que é, afinal, sentir-se uma “esponja” que absorve ideias, interrogações de outros que passam a fazer parte da nossa própria experiência? Soma, fusão, mixagem” (LOPONTE, 2007, p.238) de identidades variáveis que se configuram a partir de capturas e encontros¹ com a própria história social e cultural, sobre e com o ensino de arte. [Margens] ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

53


REVISTA

APOTHEKE [...] Ele não tinha ido a nenhuma parte. Só executava a invenção de se permanecer naqueles espaços do rio, de meio a meio, sempre dentro da canoa, para dela não saltar, nunca mais. [...] aquilo que não havia, acontecia. João Guimarães Rosa Esse de meio a meio, sempre entre, em devir, pode ser o caminho para transitar por uma formação em licenciatura que, longe de buscar um modelo, mova-se entre encontros para compor variáveis infinitas em composições de modos docentes, como os encontros que ocorrem na experiência. Como afirma Larrosa: [...] A experiência é algo que (nos)acontece e que às vezes treme, ou vibra, algo que nos faz pensar, algo que nos faz sofrer ou gozar, algo que luta pela expressão, e que às vezes, algumas vezes, quando cai em mãos de alguém capaz de dar forma a esse tremor, então, somente então, se converte em canto. E esse canto atravessa o tempo e o espaço. E ressoa em outras experiências e em outros tremores e em outros cantos. Em algumas ocasiões, esses cantos de experiência são cantos de protesto, de rebeldia, cantos de guerra ou de luta contra as formas dominantes da linguagem, de pensamento e de subjetividade. (LARROSA, 2015, p.10)

Larrosa, com a noção de experiência, aproxima-se da concepção de acontecimento em Deleuze. Algo (nos) acontece, dizem

os

dois,

expressão. Deleuze, diferença

o

que

nos

interpela,

que

luta

por

uma

Em Larrosa, porém, o canto tem forma e, em canto ou

a

é um

representação.

Em

experiências,

algo

sempre sentido Larrosa, que

se

informe,

oferecendo-se

diferencial, o

canto

oferece

a

longe

ressoa outros

em

a

uma

de

uma

outras

cantos

de

experiência como cantos ou campos de luta, como esse embate entre a poética e a pedagogia. Quanto a poética... [...] olho muito tempo o corpo de um poema até perder de vista o que não seja corpo e sentir separado dentre os dentes um filete de sangue nas gengivas ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

54


REVISTA

APOTHEKE Ana Cristina Cesar

Na poética se apresenta o corpo do poema, em um sentir separado da pedagogia, esse corpo-palavra enrijecido pelos modelos

representacionais

que

insistem

em

modelar

a

educação. Porém, juntas, pedagogia e poética afirmam uma diferença potencial, entre núpcias, em devir, como diria Deleuze, nunca uma forma acabada mas sempre por vir, algo [entre]

margens.

Separadas,

porém,

em

campos

representativos, como arte (poética) e educação (pedagogia), formação

docente,

formação

artista,

entre

outras

representações, entristecem e aprisionam vidas. Os trabalhos apresentados apontam para a possibilidade de pensar uma formação docente a partir da trama de forças que a constitui, que é tanto poética quanto pedagógica. Essa trama,

complexa,

é

capaz

de

produzir

acontecimentos,

causando um desequilíbrio que retira certezas em torno de concepções históricas, culturais e sociais de um docente ideal presente em nós mesmos, e relevante em uma formação que leva em conta a subjetividade, ou seja, a atualização de forças-fluxo, como afirma Pereira: A busca não está dirigida para responder à questão “quem sou eu” ou “o que é ser professor”, mas, de outro modo, “como me tornei o que estou sendo” e “como é ser professor”. Ao contrário de trabalhar na direção de uma representação sobre mim mesmo, constituível a partir do indagar-se “o que sou” ou “como sou o que sou”, o movimento vai no caminho de descobrir algumas tramas constitutivas dos diferentes estados de ser que se sucedem, isto é, deriva de indagações sobre “como e por que tenho sido o que tenho sido”. [...] Trata-se de colocar o dinamismo dos modos de ser já na questão sobre esses modos ser. (PEREIRA, 2013, p.37)

Esses modos de ser, plurais e heterogêneos, encontramse na existência singular, situada em um campo coletivo de ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

55


REVISTA

APOTHEKE formação, lugar de forças capazes de produzir diferenças em uma constante “iminência de deixar de ser o que vem sendo para tornar-se diferente de si mesmo.” (Idem, p.38). Talvez, pensar na constituição do professor (como me tornei o que estou sendo), em um contínuo modo de se refazer, sem assumir uma identidade estável, sem modelos representativos de um professor ideal, mas apenas ideias que possam compor, com outros planos, proposições e modos de ser na vida e na docência em artes visuais. Notas 1

Encontrar é achar, é capturar, é roubar, mas não há método para achar, só uma longa preparação. Roubar é o contrário de plagiar, copiar, imitar ou fazer como. A captura é sempre uma duplacaptura, o roubo, um duplo roubo, e é isto o que faz não algo mútuo, mas um bloco assimétrico, uma evolução a-paralela, núpcias, sempre “fora” e “entre”. (DELEUZE e PARNET, Dialogue) REFERÊNCIAS CESAR, Ana Cristina. Poética. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. DELEUZE, Gilles. Lógica do sentido. São Paulo: Editora Perspectiva S.A., 2000. ______________; PARNET, Claire. Diálogos. Lisboa: Relógio D’Água Editores, 2004. _______________; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? Rio de Janeiro: Editora 34, 1992. LARROSA, Jorge. Tremores: escritos sobre experiência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2015. LOPONTE, Luciana Gruppelli. Arte da docência em arte: desafios contemporâneos. In OLIVEIRA, Marilda Oliveira de (Org.). Arte, educação e cultura. Santa Maria: Ed. Da UFSM, 2007. PEREIRA, Marcos Villela. Estética da professoralidade: um estudo crítico sobre a formação do professor. Santa Maria: Ed. Da UFSM, 2013. ROSA, João Guimarães. A terceira margem do rio In Primeiras estórias. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.

Elaine Schmidlin http://lattes.cnpq.br/9781556928615419 Professora no Programa de Pós-graduação em Artes Visuais (PPGAV) e no curso de Licenciatura em Artes Visuais do Centro de Artes (CEART) da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Doutora em Educação, linha de pesquisa Ensino e Formação de Educadores, pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), 2013; Membro do Grupo de Pesquisa Entre Paisagens UDESC/CNPq.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

56


REVISTA

APOTHEKE PELES PEDAGÓGICAS Mirian Celeste Martins (Mackenzie/SP) Resumo Ao apresentar o livro sensorial Peles Pedagógicas (2010) composto como um mostruário de tecidos este artigo se torna um modo de pensar sobre processos de criação e desvelar a vida de artista, de pesquisadora e de professora que nele se visibiliza. As “peles-metáforas” foram produzidas com matérias, texturas, cores, formas, palavras e porcentagens que, como tecido-metáfora, provocam outras leituras. Palavras-chaves: Arte; Docência; pesquisa; metáfora. Abstract Presenting the sensory book Pedagogic Skins (2010) compound as a tissue showcase this article becomes a way to think about creative processes and reveal the life of one artist, researcher and teacher present in it. The "skin-metaphors" were produced with materials, textures, colors, shapes, words and percentages, such as tissue-metaphor provoke further lecture. Keywords: Art; teaching; research; metaphor.

Resumo visual:

57

Pele-corpo. Fantasia, máscara ou o recheio de mim virado do avesso? Peles pedagógicas. No mostruário escolho, seleciono, misturo, transformo, transpiro compartilhando tecidos-metáfora. Fazer-se professor, pensar-se professor. Memórias e sonhos. Esperanças. No toque, sentidos se ampliam E remexem na intimidade da pele. Minha. Tua. De quem foi/está professor ou aluno. Provocações para seguir pensando com as sensações entre os dedos. Mirian Celeste Martins (outubro, 2010)

Tudo começou com um convite do professor, artista, pesquisador e curador Marcos Rizolli: participar de uma exposição – Biblioteca ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE sensorial, sob sua curadoria. Concordando com Cauê Alves (2010, p. 46)

que

o

curador

é

“[...]

um

profissional

cuja

ação

pode

ser

instituinte no sentido em que abre um acontecimento que está por vir e

assim

possibilita

uma

série

de

outras

experiências

que

podem

formar uma história”, a proposição de Marcos Rizolli provocou em mim uma ebulição criativa. Desafiada por esse acontecimento que estaria por vir e, reconhecendo que minha criação pessoal tem andado mais focada

nas

artísticos, poderia

palavras aceitei

conectar

a

e

ações

o

pedagógicas

convite

atitude

sem

de

do

nenhuma

artista

com

que

em

trabalhos

resistência. a

pesquisa

Assim, que

tem

alimentado também minha vida de professora, especialmente em relação à mediação cultural e formação de educadores. Ao meu ver uma proposição de biblioteca sensorial traduz um desejo de promover encontros entre os visitantes e seus corpos com algo

criado

para

ser

“lido”,

um

acontecimento

a

impulsionar

experiências outras. Neste artigo, neste dossiê dedicado ao artista, educador e pesquisador, utilizo-me desta experiência vivida para rever

processos

de

criação

e

desvelar

a

vida

de

artista,

de

pesquisadora e de professora que no livro de artista se visibiliza. (des)caminhos da criação Nós somos como tartarugas, carregamos a casa. Essa casa são as lembranças. Nós não poderíamos testemunhar o hoje se não tivéssemos por dentro o ontem porque seríamos uns tolos a olhar as coisas como recém-nascidos, como sacos vazios. Nós só podemos ver as coisas com clareza e nitidez porque temos um passado. E o passado se coloca para ajudar a ver e compreender o momento que estamos vivendo. (CAMARGO, 1998, p.34).

Nas palavras do artista Iberê Camargo (1998) em seu livro Gavetas dos guardados, se desvela a estreita relação entre passado e presente. Carregamos nossas experiências de vida, as lembranças, o passado e são trazidas à tona no momento da criação como nas Peles pedagógicas. armazenado,

O

momento

revive

ao

presente

encontrar-se

é

regado frente

a

pelo uma

passado nova

que,

situação.

“[...] todo indivíduo traz consigo, ao exercer sua individualidade, um modo de ver e sentir que, em sua interação com o material antigo, cria algo novo, algo que não existe na experiência” (DEWEY, 2010, p. 219). Para ele, o velho e o novo soltam chispas e quando se ajustam ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

58


REVISTA

APOTHEKE nasce a intuição que cria harmonias inesperadas, rearranjos do que sabíamos,

nascidos

incubação.

repentinamente

Rever-se,

ou

revolver-se,

marcados

por

períodos

intuir/rearranjar

as

de

camadas

sobrepostas / justapostas da artista, professora, pesquisadora... No diário de bordo que acompanha este projeto para a Biblioteca sensorial,

pode-se

perceber

momentos

de

clareza

e

inquietação

durante o processo. Vê-se que das referências passadas surge a ideia de fazer um livro com luvas de silicone coloridas com surpresas táteis.

Uma

possível

recriação

a

partir

de

objetos

relacionais

criados por Lygia Clark como as Luvas sensoriais (1968), que me levaram

a

nomear

de

objetos

propositores

dispositivos

para

a

mediação cultural (MARTINS,2005,2012). Relembro também a experiência tátil

de

minha

orientanda

Maria

Cecília

Santiago

(2005)

que

pesquisou a experiência estética em portadores de baixa visão. Mas, me perguntava: por que o sentido da sensorialidade ficaria preso às mãos? De

volta

ao

meu

percurso

formativo/pessoal/artístico,

a

inquietude da pergunta, escrita no diário de bordo, me leva hoje à minha

tese

de

doutorado

(MARTINS,

1998)

onde

trabalhei

com

a

metáfora da cigarra e a da formiga, acreditando que os projetos nos fazem cigarras, nos fazem voar e cantarolar frente a planos, sejam de

uma

proposição

artística

ou

planos

de

aula.

Nesta

tese,

o

depoimento da artista, professora e pesquisadora Regina Silveira conta o projeto para Gone Wild, instalação no Museu de San Diego/USA e revela que os dados que tem para criar, como a planta do hall onde ficaria

a

instalação

provocativos,

e

tempo

oferecem-se

restrito,

como

não

parâmetros.

são

limitantes,

Assim

também

mas são

parâmetros a criação de algo que permita “leituras”, já que é para uma

biblioteca

sensorial.

Entre

os

momentos

de

caos,

de

aproveitamento do que emergia, de tolerância com o que ainda não estava definido, uma lembrança abriu uma fenda. Não sei bem qual a origem, mas já fazia parte de minhas palavras-conceitos a ideia de peles pedagógicas. Talvez possa reencontrá-la nos textos reflexivos que escrevíamos no Espaço Pedagógico onde atuei com Madalena Freire, Juliana Davini e Fátima Camargo na formação de educadores. Uma ideia potente. Não temos uma pele, mas muitas, que se transformam e se ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

59


REVISTA

APOTHEKE metamorfoseiam

frente

a

cada

situação,

a

cada

encontro

com

os

estudantes que conosco convivem. Pele dedicada, machucada, ferida, ressecada, desesperançada, otimista,

infantilizada,

pele

tatuada,

pele

surrada,

suturada,

remoída pela memória que aquece e que entristece, pele marcada por rígidas

estruturas

singulares,

nasceu

como a

espinhos...

ideia

de

Com

fotografias

peles de

distintas

e

tecidos-metáforas

compondo um álbum como os de gravura. Inicialmente, esse álbum viria acompanhado de um kit sobrevivência: colírio para ver pelos olhos de outros; creme para feridas, gaze para palavras silenciadas; algodão para limpar as misturas de si mesmo com as marcas dos outros que impedem

a

ressecadas;

percepção filtro

do

que

protetor

é

de

para

cada

raios

um; de

pomada

comando

para sem

peles

sentido;

comprimidos de vitaminas múltiplas para renovar energias... No processo, abandonei o kit de sobrevivência, pois os tecidos pensados para essas peles teimaram em convidar sensorialmente para um outro caminho, para o toque e daí nasceu com mais clareza o mostruário de tecidos, como aqueles que se escolhe tecidos para

60

forração de sofás ou para cortinas. Em uma conceituada loja especializada em tecidos, fui buscar a forma da pasta mostruário. Minha intenção era obter uma já gasta pelo tempo, mas não foi possível. Mas obedeci ao mesmo tamanho e cor e assinei na capa como se fosse um designer: Mostruário – Peles Pedagógicas, by mcmartins. Na Figura 1 os tecidos que se vê ao fundo do

mostruário

escrivaninha.

na Para

loja

são

substituídos

complementar,

encomendei

por o

livros título

em em

minha braile,

assim como as tabelas que acompanham cada tecido.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

Figura 1. Mirian Celeste Martins (2016). Do modelo na loja de tecidos para a criação fotografada na mesa de trabalho. Fotoensaio composto por quatro fotografias digitais da autora.

Onze

tecidos-metáforas

compõem

o

mostruário,

que

é

complementado com uma espécie de ficha que apresenta a epígrafe que abre este artigo, pequenas fotos dos tecidos e a sua porcentagem (há muito o que refletir nelas). Também faz parte um pequeno caderno de bordo que registrava o processo e a busca pela materialidade. Busca constante que me fez percorrer lojas de produtos diversos, assim como bisbilhotar armários e gavetas, além de recorrer aos velhos tecidos de roupas usadas que tenho, ou tinha, o hábito de guardar. Lembro-me de registrar fotograficamente o processo, mas não fui capaz

de

encontrar

estas

fotos,

provavelmente

arquivadas

entre

tantas outras imagens digitais. Parece que éramos mais cuidadosos com os álbuns de 24 ou 36 fotos analógicas que buscávamos ansiosos no laboratório fotográfico. Na época da escrita final da minha tese, Regina Machado (1998) também escrevia seu livro A formiga Aurélia e outros jeitos de ver o mundo.

Estudiosa

Gilbert

Durand

da que

imaginação, formula

a

Regina

apresenta

necessidade

de

uma

o

trabalho

de

pedagogia

do

imaginário: O trabalho de Durand busca mostrar que tanto a cigarra quanto a formiga não são duas instâncias que exemplificam dois tipos de atividade, uma mais importante - o conhecimento científico - e outra menos importante - a imaginação, mas advoga para a imaginação uma pertinência essencial na constituição de qualquer forma de atividade humana, seja ela estética, científica ou prática (MACHADO, 1989, p.308). ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

61


REVISTA

APOTHEKE O

mostruário

nasce

como

mais

uma

metáfora

conectada

com

a

proposta da metamorfose da cigarra/formiga. Cada tecido composto com colagem,

recortes

e

costuras,

mostra

a

porcentagem

de

sua

composição, repetindo o que vemos no mostruário real. Ao re-ver o processo de criação para Peles Pedagógicas, o estético, o científico e o cotidiano parecem presentes em sua proposição. O que nos dirão os tecidos neste mostruário, apresentado a seguir?

62

Tecido #1 Figura 2: Mirian Celeste Martins (2010) Tecido #1. (véus de missa, flores e plumas de buquê de noiva e leve tecido com pequeno brilho de um vestido de festa). Fotografia independente. Fotografia digital da autora

Composição do tecido #1: 63,3%_ memórias de afetos aquecidos 13,8%_ amorosidade condensada 11,8%_ lembranças de abraços, de ritos de despedida no final de cada ano 11,1%_ coleta sensorial: delicadeza/transparência

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

63 Tecido #2 Figura 3: Mirian Celeste Martins (2010) Tecido #2 (pele tatuada com nomes). Fotografia independente. Fotografia digital da autora.

Composição do tecido 2: 33,33%_ misturas de si 33,33%_ intercessores que contaminam 33,33%_ ressonâncias-ações que impulsionam procuras

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

Tecido #3 Figura 4: Mirian Celeste Martins (2010) Tecido #3 (patchwork). Fotografia independente. Fotografia digital da autora.

Composição do tecido #3: 55,5%_ 33,3%_ 16,1%_ 10,4%_

patrimônios do vivido fragmentos viventes coleta sensorial nos guardados doces saudades

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

64


REVISTA

APOTHEKE

Tecido #4 Figura 5: Mirian Celeste Martins (2010) Tecido #4 (camadas). Fotografia independente.

Composição do tecido #4: 80,9%_ 15,5%_ 08,8%_ 03,5%_

marcas do tempo, cicatrizes sem dor camadas sentidas dando sentido rugas da pele vozes silenciadas, conversas internas

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

65


REVISTA

APOTHEKE

Tecido #5 Figura 6: Mirian Celeste Martins (2010) Tecido #5 (da natureza). Fotografia independente. Fotografia digital da autora.

Composição do tecido #5: 27%_ 27%_ 27%_ 19%_

pele orgânica tramas, trança, entrelaçamentos nervuras secas vigília criativa

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

66


REVISTA

APOTHEKE

Tecido #6 Figura 7: Mirian Celeste Martins (2010) Tecido #6 (jeans surrado). Fotografia independente. Fotografia digital da autora

Composição do tecido #6: 33,3%_ 33,3%_ 33,3%_ 0,01%_

pele azul desbotada cotidiano surrado alguém como recheio maciez do já conhecido

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

67


REVISTA

APOTHEKE

Tecido #7 Figura 8: Mirian Celeste Martins (2010) Tecido #7 (chita). Fotografia independente. Fotografia digital da autora

Composição do tecido #7: 30,6%_ 44,4%_ 13,1%_ nhém 11,9%_

pele de infância persistente cores da brasilidade bonitinho, lindinho, mimosinho, nhém nhém meninice prolongada em fios

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

68


REVISTA

APOTHEKE

69

Tecido #8 Figura 9: Mirian Celeste Martins (2010) Tecido #8 (pele armadura). Fotografia independente. Fotografia digital da autora

Composição do tecido #8: 71,5%_ 13,8%_ 10,8%_ 03,9%_

fria armadura metálica ferida que sangra recoberta brilho falso em grito sufocado filtro camuflado

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

70 Tecido #9 Figura 10: Mirian Celeste Martins (2010) Tecido #9 (estruturas sobre espinhos). Fotografia independente. Fotografia digital da autora

Composição do tecido #9: 55,4%_ 22,6%_ outro 13,2%_ 08,8%_

espinhos-pele que alinham estruturas obediência incorporada que fere a si e ao linhas de fuga, rupturas, fendas “Cumpra-se”

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

Tecido #10 Figura 11: Mirian Celeste Martins (2010) Tecido #10 (vermelho) (este é o nome da obra ou a descrição do material? ). Fotografia independente. Fotografia digital da autora

Composição do tecido #10: 49,9%_ 49,9%_ 01,8%_ 01,8%_

não-pele ferida à flor da pele casca, crosta ranhuras da dor

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

71


REVISTA

APOTHEKE

Tecido #11 Figura 12: Mirian Celeste Martins (2010) Tecido #11 (liso). Fotografia independente. Fotografia digital da autora.

Composição do tecido #11: 48,5%_ 48,5%_ 01,5%_ 01,5%_

maciez sem marcas espaço liso deleuziano idealização, ingenuidade visão de Polyana

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

72


REVISTA

APOTHEKE Peles pedagógicas Não somos espelhos que refletem a realidade, mas conversadores que a entrevistam. (MARINA, 1995, p. 124). Muitos aspectos poderiam ser aprofundados no livro de artista e seus

tecidos

de

resistências se”.

peles

frente

pedagógicas,

aos

entre

limites

delicadezas,

sufocantes

e

ao

durezas, “cumpra-

Pequenas flores e plumas se escondem na leveza e transparência

da pele delicada. Após décadas de trabalho com arte, e formação de artistas

e

encontros,

de de

educadores,

ritos

de

tantas

despedida

lembranças

de

final

de

de

abraços,

ano.

de

Memórias

do

passado terno e frágil ou que deixaram rugas, feridas, cicatrizes em armaduras

e

peles

machucadas,

com

marcas

do

tempo.

Texturas

múltiplas, macias ou espinhosas, duras e moles. Tecidos e ideias, ideias tecidas. Diferentes composições dos tecidos que compõe as peles, entre materiais orgânicos e sintéticos, no sentido literal e metafórico.

Para

quem

não

conhece

o

ofício

e

não

olha

mais

profundamente, a ilusão do material brilhante e da falsa resistência da pele-armadura que esconde a dor.

A décima primeira traz a pele

lisa, fugindo de espaços estriados que nos levam a trilhar caminhos já trilhados. Lembrando o conceito de Deleuze e Guatarri (1997), autores também presentes no segundo tecido e instaura a trama entre as páginas deste livro, e dele com a vida. Tudo

isso

experiência,

à

flor

tecidos

possam

sensibilizar

vierem

a

tocar

o

da

pele,

transbordam algo

livro

nos

camadas pelas e

memória

gavetas...

intercessores

sensorial

de

que

de

minha

e

espero

que

(DELEUZE,

....).

que

vierem

a

folhear

este

artigo. Aqui, Peles pedagógicas são provocações para seguir no ofício da vida de artista, professora e pesquisadora que tantos de nós operam, junto com tantas outras facetas de quem vive intensamente. Continuemos “com as sensações entre os dedos”...

REFERÊNCIAS

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

73


REVISTA

APOTHEKE ALVES, Cauê. A curadoria como historicidade viva. In: RAMOS, Alexandre. D. (org.). Sobre o ofício do curador. Porto Alegre: Zouk, 2010, p. 43-57. CAMARGO, Iberê. Gaveta dos guardados. São Paulo: EDUSP, 1998. DELEUZE, Gilles. Conversações. Tradução: Peter Pál Pelbart. São Paulo: Ed. 34, 1992. _____ e GUATTARI, Félix. O liso e o estriado. Tradução: Peter Pál Pelbart. In: Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia, vol. 5.São Paulo: Ed. 34, 1997, p. 179-214. DEWEY, John. A arte como experiência. Tradução: Vera Ribeiro. São Paulo: Martins Fontes, 2010. MACHADO, Regina. Arte-Educação e o conto de Tradição Oral: Elementos para uma Pedagogia do Imaginário. São Paulo, Tese (doutoramento), ECA/USP, 1989. ____ A formiga Aurélia e outros jeitos de ver o mundo. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 1998. MARTINS, Mirian Celeste. Arte - o seu encantamento e o seu trabalho na educação de educadores. A celebração de metamorfoses da cigarra e da formiga. São Paulo, Tese (doutoramento), Faculdade de Educação/USP, 1999. _____ (org.) Objetos propositores: a mediação provocada. In: MARTINS, Mirian Celeste (org.). Mediação: provocações estéticas, São Paulo, Instituto de Artes/UNESP, vol 1, n. 1, p.94-123, novembro de 2005. _____ (org.) Objetos propositores: a mediação provocada. In: MARTINS, Mirian Celeste e PICOSQUE, Gisa (orgs.) Mediação cultural para professores andarilhos na cultura. São Paulo: Intermeios, 2012. SANTIAGO, Maria Cecília do Amaral C.B. Uma experiência estética com portadores baixa visão: uma aproximação com a vida. 2005. 86 p. Dissertação (Mestrado em Artes). Programa de Pós-graduação em Artes, Instituto de artes, Universidade Estadual Paulista, São Paulo, 2005.

74 Mirian Celeste Martins http://lattes.cnpq.br/7167254305943668 Professora do Curso de Pós-graduação em Educação, Arte e História da Cultura e do Curso de Pedagogia da Universidade Presbiteriana Mackenzie onde coordena os Grupos de Pesquisa: Arte na Pedagogia e Mediação Cultural: provocações e mediações estéticas. Professora aposentada do Instituto de Artes/UNESP.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Imagens Narradas: educação e vida em duas (e mais) ficções

1

Rita Luciana Berti Bredariolli (IA-UNESP) RESUMO Esse texto aborda os vínculos entre educação e vida, através de uma situação de ensino e aprendizagem de arte criada na intersecção de duas ficções: “Tendo uma experiência” de John Dewey e “Onde fica a casa de meu amigo” de Abbas Kiarostami. PALAVRAS-CHAVE: arte, educação, vida, imagens, ficções ABSTRACT This paper addresses the connection between education and life, through one situation of the teaching and learning of art created in the interwoven of the two fictions: “Having an experience” by John Dewey and “Where is the friend's home?” by Abbas Kiarostami. KEY-WORDS: art, education, life, images, fictions

Pour savoir il faut s’imaginer Georges Didi-Huberman O narrador retira da experiência o que ele conta: sua própria experiência ou a relatada pelos outros. E incorpora as coisas narradas à experiência dos seus ouvintes. Walter Benjamin O

que

é

“experiência”

uma se

experiência?

diferencia

de

Para uma

Guimarães

“aventura”.

Rosa, No

uma

texto

O

Espelho, o autor expõe sua experiência como aquilo que lhe “tomou,

tempo,

“natureza”, Resultado

desânimos,

preza, de

mas,

“séries

esforços”, absolutamente,

de

raciocínios

algo não e

que, se

por

essa

vangloria.

intuições”

sua

“experiência” transforma-se em algo passível de ser narrado: Se quer seguir-me narro-lhe; não uma aventura, mas experiência, a que me induziram, alternadamente, séries de raciocínios e intuições. Tomou-me tempo, desânimos, esforços. Dela me prezo sem vangloriarme. Surpreendo-me, porém, um tanto à-parte de todos, penetrando conhecimentos que os outros ainda ignoram. O senhor, por exemplo, que sabe, e estuda, suponho nem tenha idéia do que seja na verdade – um espelho? Demais, decerto, das noções ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

75


REVISTA

APOTHEKE de física, com que se familiarizou, as leis da óptica. Reporto-me ao transcendente. Tudo, aliás, é a ponta de um mistério. Inclusive, os fatos. Ou a ausência deles. Duvida? Quando nada acontece, há um milagre que não estamos vendo2.

Clássico trecho de Guimarães, usado muitas vezes, para epígrafe de trabalhos dedicados a investigar conhecimentos. Especialmente aqueles compreendidos em forma ampliada, para além dos limites da formalidade, da sistematização, do “rigor na ciência”3. Embora sem renunciá-los. A “aventura”, somente se tornou

“experiência”

porque

induzida

por

“séries

de

raciocínios e intuições”, em alternâncias. Mas, as “noções de física

[...]

suficientes verdade

não

as

leis

da

óptica”,

para

desvelar

a

é

desnudamento

familiares,

“verdade” que

de

um

aniquila

o

não

são

espelho. segredo,

“A mas

revelações que lhe faz justiça”4, tudo seria a “ponta de um mistério”, incluindo os fatos, ou sua ausência, pois mesmo quando “nada acontece, há um milagre que não estamos vendo”. Nesse

texto

também

será

narrada

uma,

considerada,

experiência de ensino e aprendizagem sobre o ofício de ensinar arte,

consumada

imagens

em

narradas

entendo-a

uma

sobre

aqui,

e

sala a

de

aula

relação

naquela

aula,

pela

confluência

entre

educação

como

“uma”

e

de

vida,

experiência

“singular” no sentido exposto por John Dewey. Tais narrações foram geradas pela leitura de imagens narradas em outras duas ficções: Ter uma experiência, texto integrante de Arte como Experiência do já citado Dewey e Onde fica a casa de meu amigo, um filme de Abbas Kiarostami. Antes de começar essa narração, esclareço o que se toma aqui

por

elaborada apresentada

ficção. pelo em

Para

prof.

isso, Ulpiano

oposição

ao

faço de

que

uso

de

Toledo comumente

uma

Bezerra

definição Meneses,

entendemos

pelo

termo. Por ela, a ficção é recuperada em sua potencialidade de promover conhecimentos sobre o mundo. Conhecimentos associados

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

76


REVISTA

APOTHEKE à imaginação, “uma das matrizes da ficção”5.

A ficção nos

permite “fabricar” formas – formas verbais, conceituais, visuais, sonoras, performáticas, etc. - para dar sentido ao mundo, às coisas, a nós mesmos. A linguagem direta, denotativa, não dá conta da realidade; a poesia dá: por ela a linguagem humana é capaz de dizer o indizível [...] é capaz de tornar visível o invisível e, mais que isso, tornar visível o próprio visível que nos escapa6.

A palavra ficção teria como seu lugar de origem um “verbo interessante”

do

latim:

“fingo

(seu

particípio

passado

é

fictus, donde vem o substantivo fictio, ficção). Fingo, de início, indicava a ação do oleiro, que modelava potes, telhas e outros artefatos cerâmicos, mas que passou também a modelar imagens, placas com relevos”7. Etimologicamente,

portanto,

ficção

“não

se

opõe

a

verdade”, mas “designa as figuras (palavra da mesma família de fingo)

que

vastidão

modelamos,

infinitas

distancia

de

do

uma

para

dar

mundo”8.

oposição

ao

conta

Nesse

da

complexidade

sentido,

conhecimento,

a

ficção

tornando,

e se

pelo 9

contrário, “um instrumento seu extraordinariamente eficaz” . Esse sentido de ficção foi apresentado pelo prof. Ulpiano ao dimensionar o museu como “um instrumento excepcional de conhecimento”, sendo, “pela mesma razão”, tomado como “espaço de

ficção.

Mas

um

científico

pode

mutuamente

e

espaço

ser

de

ficção

acoplado

potenciado

pela

ao

em

que

o

conhecimento

poético,

afetividade

fecundando-se da

apreensão

sensorial10”. Vertemos, nesse texto, tal compreensão para o espaço, aparentemente, árido da sala de aula, assumindo-a como “espaço de ficção”, de produção de sentidos pelo encontro de outras ficções. Próximo ao sentido de ficção, presente nesse texto, está o

de

imagem.

potencialidades

Imagens de

também

conhecimentos

são que

tomadas se

aqui

estendem

além

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

como dos

77


REVISTA

APOTHEKE limites da denotação. Representações modeladas “para dar conta da complexidade e vastidão infinitas do mundo”. Para conhecer é afirmação,

preciso imaginar. Ao

Georges

Didi-Huberman,

nos

estabelecer essa reporta 11

redimensionamento da relação entre imagem e saber .

a

esse

Diante de

uma imagem, estaríamos diante de uma porta aberta. Nada nos seria ocultado, mas, ao mesmo tempo, a luz que dessa abertura emerge e nos atrai, também “quase nos cega, nos controla”. Essa

“mesma

abertura

nos

detém”.

Contemplar

uma

imagem

“é

desejá-la, é esperar, é estar diante do tempo”. Diante de uma imagem, estaríamos diante do tempo. “Mas que tipo de tempo? De quais plasticidades e de quais fraturas, de quais ritmos e de quais

golpes

de

tempo

podemos

tratar

nessa

abertura

da

12

imagem?” . Diante de uma imagem, o presente não deixa nunca de ser reconfigurado. Uma imagem é sempre uma atualização; assim como também é incessante a reconfiguração do passado, diante de uma imagem. Uma imagem só se transforma em algo pensável em uma construção de nossa memória13. Imagens são construções de tempos heterogêneos. Passado e presente

se

entrelaçam

e

se

reconfiguram

em

produções

de

sentido, em ficções, criadas pelo rearranjo de um repertório sedimentado,

mas,

no

entanto,

mobilizado

outras referências em aquisição.

pelo

choque

com

Imagens não são criações

alheias ao seu espectador, antes, necessitam de seu olhar para que aconteçam. E esse acontecimento se dá, continuamente, no encontro

entre

as

“coisas”

do

mundo

e

nosso

repertório

imagético já sedimentado por outros encontros do mesmo tipo. As imagens abrem e se fecham a nós ao movimento de nossas sensações e intelecções, ao movimento de nossas atualizações e reminiscências. Mantém-se em abertura, esquivando-se de uma explicação

que

possa

interromper

seu

fluxo

de

sentidos

múltiplos, por vezes, assumindo feições a cada novo lance de ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

78


REVISTA

APOTHEKE olhar, lance de propósitos, definidos, por vezes em desvios. Esse movimento incessante de criação e recriação mantido pela trama de tempos, do visível e invisível, estabelecida na relação daquele que olha com aquilo que é olhado14, nulifica o uso da imagem como ilustração. Uso apontado como uma limitação que relega a imagem a um lugar subordinado e subsidiário do “conhecimento verdadeiramente valioso”, que parece estar fora e mais além da imagem. No uso da imagem como ilustração, ou quando a imagem se converte em um objeto que deve ser fragmentado pela análise ou crítica ideológica ou política, não é alcançada a reorganização escolar que supostamente se busca promover15.

Nossos interesse e intenção convergiram para a produção de

sentido

gerada

no

encontro

entre

as

várias

imagens

componentes das ficções definidas como pontos de partida, como núcleos e potencialidades de conhecimento sobre um conceito – o de “experiência”, como definido por John Dewey - que pôde ser

também

experimentado,

elaborado

em

sua

relação

com

os

acontecimentos cotidianos, com a vida de cada um daqueles que participavam

dessa

ação

de

ensino

e

aprendizagem

sobre

o

ofício da educação. O que é uma experiência? Para John Dewey – em definição quase a mesma daquela de Guimarães Rosa - uma “experiência ocorre continuamente, porque a interação com o ser vivo com as condições ambientais está envolvida no próprio viver”16.

Porém,

nem

toda

experiência

pode

ser

processo de considerada

“uma” experiência, ou uma “experiência singular”17. Nem tudo que experimentamos cotidianamente, segundo Dewey, consuma-se um “uma” experiência. Nem sempre aquilo que “observamos e o que pensamos, o que desejamos e o que obtemos”, concordam entre

si.

Muitas

vezes

nossas

experiências

se

perdem

em

“distração e dispersão”18. Em

contrapartida

“uma”

experiência

acontece

quando

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

o

79


REVISTA

APOTHEKE “material vivenciado” descreve seu curso até a sua conclusão. “Então, e só então, ela é integrada e demarcada no fluxo geral da experiência proveniente de outras experiências”. Assim como em uma obra de arte, em “uma” experiência, os diferentes atos, episódios ou ocorrências se desmancham e se fundem na unidade, mas não desaparecem nem perdem seu caráter próprio ao fazê-lo – tal como, em uma conversa amistosa, há um intercâmbio e uma mescla contínuos, mas cada interlocutor não apenas preserva seu caráter pessoal, como também o manifesta com mais clareza do que é seu costume19.

Por

essa

unidade

que

a

caracteriza,

a

“experiência

singular” não pode encontrar seu término em uma cessação; seu desfecho é a consumação determinada pela integração das partes em um todo único. “A existência dessa unidade é constituída por uma qualidade ímpar que perpassa a experiência inteira, a despeito da variação das partes que a compõem”. Não podemos, segundo Dewey,

distinguir tal

unidade que caracteriza essa

experiência única como “afetiva, prática nem intelectual, pois esses termos nomeiam distinções”. Tampouco podemos afirmar, ainda

em

consonância

às

ideias

desse

autor,

que

“uma”

experiência é o resultado da soma desses três “adjetivos de interpretação”.

Mesmo

predominância de prática “uma”

uma propriedade

usando-a

experiência

final”,

como

chegando

como

vivida,

à –

designação

constatação

por

certa

intelectiva, afetiva ou posterior

nomeando-a,

intelectual,

de

“em

para

sua

exemplo,

definir

significação não

podemos

desconsiderar que, “em sua ocorrência efetiva, também foram emocionais; tiveram um propósito e foram volitivas”. Esses “traços

distintivos”-

intelectual,

afetivo

e

prático

se

perdem na constituição de “uma” experiência, por isso não é a sua

soma

que

determinará

a

“qualidade

ímpar”

dessa

“experiência singular”, e sim a sua presença íntegra e única. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

80


REVISTA

APOTHEKE Dewey

abordará

a

predominância

desses

“traços

distintivos” como designação de experiências, problematizando sua validade, pela elucidação e comprovação da integralidade dessas três instâncias como qualificação da experiência, como “uma”

experiência

“singular”.

Inicialmente

dimensiona

uma

“experiência de pensamento”, afirmando que nenhum “pensador pode

exercer

sua

ocupação,

a

menos

que

seja

atraído

e

recompensado por experiências integrais, totais que valham a pena intrinsecamente”. Desprovido de tais experiências, esse pensador ficaria “completamente incapacitado de distinguir o pensamento real do artigo espúrio”. O pensamento para Dewey, “se dá em um fluxo de ideias”; mas a formação desse fluxo somente é possível porque as ideias são “fases, afetiva e praticamente

distintas

[...]

são

variações

móveis,

não

separadas e independentes [...] e sim matizes sutis de uma tonalidade penetrante e em desenvolvimento”20. O término de uma experiência de pensamento é reconhecido como

“tirar

formulação

uma

teórica

conclusão”. desse

Porém,

processo

é

muitas

feita

em

vezes, termos

“a que

escondem por completo a semelhança da ‘conclusão’ com a fase que consuma cada experiência integral em evolução”. Assim como a

experiência

diminuir

de

ver

uma

gradativamente”,

“tempestade a

atingir

experiência

de

seu

auge

e

pensamento

é

integrada por um movimento contínuo dos temas. Assim como no oceano durante a borrasca, há uma série de ondas, sugestões que se estendem e se quebram com estrondo, ou que são levadas adiante por uma onda cooperativa. Quando se chega a uma conclusão, ela é a de um movimento de antecipação e acumulação, um movimento que finalmente se conclui. A ‘conclusão’ não é uma coisa distinta e independente; é a consumação de um movimento. Portanto, uma experiência de pensar tem sua própria qualidade estética.

Uma

experiência,

para

Dewey,

somente

poderá

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

ser

81


REVISTA

APOTHEKE considerada “uma” experiência se dotada de qualidade estética, se possuir “integração interna e um desfecho atingido por meio de um movimento ordeiro e organizado”. Como em uma “estrutura artística”, tal qual a ação de um moleiro, transformando o barro em um “pote útil para guardar cereais”; ele o faz de modo regulado pela série de percepções que resumem os atos seqüenciais [...] há em cada etapa uma antecipação do que virá. Essa antecipação é o elo que liga o fazer seguinte a seu efeito para os sentidos. O que é feito e o que é vivenciado, portanto, são instrumentais um para o outro, de maneira recíproca, cumulativa e contínua21.

A imagem do oleiro, junto a da tempestade ou do oceano durante a “borrasca”, são imagens criadas e usadas por Dewey para corroborar sua ficção. Além dessas outras duas imagens são usadas por Dewey em seu texto como metáforas referentes a “uma” experiência. Uma, a imagem de uma pedra rolando morro abaixo. Em apelo à nossa imaginação, Dewey nos propõe a partilhar o interesse dessa pedra pelas “coisas que encontra no caminho, pelas condições que aceleram ou retardam seu avanço, com respeito à influência delas no final”. Ao final desse percurso descrito em atenção e interação com os obstáculos e auxílios, a pedra atingiria seu repouso como “culminação de um movimento contínuo”22. Em

contraposição

à

essa

metáfora,

Dewey

define

as

experiências desprovidas de qualidade estética, a maioria de nossas experiências, segundo o autor. Essas são caracterizadas pela

ausência

acontecimentos,

de ou

interesse pelo

pelo

controle

vínculo

sobre

sua

entre rejeição

os ou

seleção, inclusão ou exclusão que comporiam “uma” experiência. Essas

experiências

inestéticas

são

feitas

de

“começos

e

cessações, mas não inícios e conclusões autênticos. Uma coisa substitui outra, mas não a absorve nem a leva adiante”. São ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

82


REVISTA

APOTHEKE experiências frouxas e discursivas23. Para Dewey, os “inimigos do

estético

não

são

o

prático

nem

o

intelectual.

São

monotonia, a desatenção para com as pendências, a submissão às convenções na prática e no procedimento intelectual”24. “Vivenciar a experiência, como respirar, é um ritmo de absorções

e

expulsões”.

transformada

em

um

Sua

ritmo

sequencia

pela

“é

existência

pontuada

de

e

intervalos,

períodos em que uma fase é cessada e uma outra é inicial e preparatória”25. pássaros,

Como

ritmados

a

alternância

em

dos

vínculos,

vôos

sem

e

pousos

qualquer

dos

movimento

aleatório, outra imagem usada por Dewey, dessa vez, em citação a Wiliam James. “Cada lugar de repouso, na experiência, é um vivenciar

em

que

são

absorvidas

e

incorporadas

as

consequências dos atos anteriores”, cada um deles trazendo um “significado que foi extraído e conservado”. Mesmo entre

esse

considerando texto

e

as

diferenças

conceitos

de

criados

tempos

por

Dewey

e

espaços

nos

anos

iniciais da década de 1930 e os nossos, atualizamos, por essa leitura nossas próprias experiências ou nossas interações com as condições ambientais com as quais estamos envolvidos. Para que

nesse

ato

de

reconhecimento,

pudéssemos

avaliar

a

interferência da qualidade de nossas experiências. “Escrito há quase

80

anos,

o

livro

levanta

apontamentos

extremamente

pertinentes ao nosso tempo: analisa e pontua o que ocorre na complexa relação entre o mundo e o corpo, através dos sentidos. Dewey descreve com o termo experiência, não uma simples e corriqueira descrição de momento vivenciado, mas uma experiência singular, onde o corpo, a mente e objetos envolvidos estão em completa interação. Vivenciar uma experiência é viver uma intensificada, concentrada, ‘exponenciada’ e consciente relação do que se passa com o mundo e com nós mesmos. Essa experiência descrita apor Dewey é algo que ocorre quando há uma completa fusão entre o sujeito e o objeto vivenciado, é um processo envolvido em ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

83


REVISTA

APOTHEKE consciência corpórea e sentimental26 (C. X.).

Essa atualização, tal como esta citada acima não se fez somente por esse encontro com a ficção de John Dewey, mas pelo relacionamento dessa com as muitas imagens da ficção de Abbas Kiarostami. “Onde

Fica

a

casa

kodjast?, uma ficção

de

meu

amigo?”

ou

Khane-ye

lançada em 1987, criada por

doust

imagens que

ocupam espaços de tempo propícios à contemplação. Imagens que se abrem ao espectador em concisão, precisas em sua função como partes de uma narrativa cujo início é determinado pelo movimento de uma porta entreaberta, definida em planos de uma espécie de azul desgastado pelo tempo. Não fecha tampouco se mantém ou é mantida aberta, apenas bate em pulso determinado pela

força

dos

pequenos

impulsos

provocados

pelos

choques

intermitentes. Dessa abertura instável, escapam sons das vozes de crianças. Permanece assim, uma porta batente, até a chegada

84

de alguém, quando é aberta em firme propósito. E então nos é tornado visível aquilo que se mantinha atrás da porta que teimava não cerrar. Nos é dado a ver uma sala

de

aula

estabelecidas.

com

seus

Alunos

alunos

sentados

e

as

em

relações

dupla.

Dois

que

ali

meninos.

eram Uma

tarefa não cumprida. A repreensão. Choro e um olhar atento. Um caderno esquecido e a necessidade de um encontro. O menino precisa

encontrar

o

colega

para

devolver-lhe

o

caderno

esquecido. Porém ele não sabe aonde mora o amigo. Parte, então, em uma busca ‘às cegas’, seguindo caminhos em ziguezague e vai-e-vem, de uma cidade a outra, se inserindo no cotidiano de pessoas desconhecidas, absorvendo o modo de vida destas pessoas [...] A trajetória do menino em busca de seu amigo para devolver-lhe o caderno se assemelha ao vôo do pássaro [...] e as paradas nas casas e os empecilhos durante a travessia são como os pousos (R. Z.). Cada passo dado é sentido, muitas vezes sofrido e transformado em novas ações num sinal de ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE persistência e integridade [...] Todos os pequenos fatos significam algo no interior desse menino que quando se percebe com o caderno de seu amigo por engano, sente-se intensamente na obrigação de devolvê-lo, mantém uma meta firme e segue adiante, seja o que acontecer [...] O filme se desenrola de uma maneira sutil, é tanto um esforço e ao mesmo tempo dá uma sensação de calma, faz-nos vivenciar um pouco dessa relação atenta com o tempo, uma lentidão não muito comum nos filmes mais próximos, americanos e até europeus. Tanto que sua relação segue na mesma dinâmica, uma coisa só pode acontecer depois da outra e em conseqüência delas, como o vôo dos pássaros, onde está tudo ligado, cada cadência significativa para um novo pousar ou voar [...] (Y. M.).

Antes,

porém,

dessa

partida,

o

garoto

tenta,

em

vão,

obter a permissão da mãe, porém não é ouvido. Este é apenas um dos obstáculos que ele vive nesta narrativa, que por meio de sua construção como obra de arte estabelece uma relação com as ideias de John Dewey a respeito de experiência estética, percebidas não apenas através da história do garoto como também da estrutura narrativa do filme [...] O diretor Abbas Kiarostami utiliza das relações entre as pessoas do vilarejo e o menino, para de forma poética, demonstrar diferentes entendimentos a respeito do saber e do aprendizado, levando o personagem a um percurso de conhecimento e experiências singulares [...] a experiência da história está em seu todo carregado de suas partes que vão constituindo-se como obra, os enredos de cada situação vivida pelo garoto têm um ritmo e movimento particulares, esse ritmo é observado também na relação de Ahmed como o senhor construtor de janelas de madeira, cada qual com seu tempo de fazer as cosias [...] Essa troca de portas é uma bela analogia a respeito do passado e do futuro que o diretor retoma quando Ahmed retorna a vila de seu amigo, e encontra um velho marceneiro que resolve ajudá-lo a encontrar a pessoa que procura. Durante o trajeto, este senhor narra estreita relação com o vilarejo adquirida na feitura das portas de madeira da cidade. Todas elas teriam sido feitas por ele, o que o liga diretamente com aquela comunidade e seus moradores, Suas experiências estão relacionadas com o que viveu ali [...] (V.R.). Nas relações feitas durante o filme percebemos que as experiências vividas por Ahmed, o aprendizado ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

85


REVISTA

APOTHEKE tanto a ele quanto para quem assiste ao filme não se dá por meio das instâncias legitimadoras da educação [...] sua experiência se dá pelas relações vividas em seu percurso cheio de dificuldades [...] O espectador também faz esse percurso recriando o sentido dado pelo diretor. Experimentamos a obra enquanto fazemos as relações entre os acontecimentos, as metáforas e as pausas visuais criadas por Kiarostami e nossas próprias experiências, fazendo com que a obra dependa também, da apreciação para ser completada (V.R.). Além das experiências de Ahmed o filme nos oferece outra experiência, a de assistir a ele. Porém não é assistir passivo, ao longo do filme, relações são traçadas, experiências que já tivemos em época de escola são revisitadas. No desenrolar das cenas, envolvemo-nos com a saga do garoto, criamos hipóteses, tentamos pensar como o personagem, afligimo-nos e ao final ingerimos, digerimos e porque não regurgitamos o material visto. Assim temos uma experiência singular, vivida de forma estética: afetivamente, intelectualmente e de forma prática (F. Z.). Sob uma visão ocidental – e porque não ignorante? – parece um tema banal. Porém as idas e vindas do garoto mostram muito mais do que um gesto gentil. Nos mostram um acontecimento na vida desta criança, algo que se torna marcante por ser uma experiência verdadeira e única. Neste ato de procura, o garoto implica toda sua vontade, razão e emoção [...] A experiência singular é um movimento do ser, ou seja, sua modificação, o que o filme mostra de forma literal, física e espacial: o garoto desloca-se por labirintos de construções, sobe e desce morros e escadas [...] Estamos acostumados a ver filmes de grandes histórias, extraordinárias, com diversas ações e suspenses, que não encontramos em ‘Onde fica a casa de meu amigo?’. Há algo que poderia ser considerado por nós como monotonia, que causa estranhamento. ‘O acúmulo de tantas impressões quanto possível é tido como vida’27. No entanto, estamos nos deparando a um encadeamento de situações que seguem um fluxo único e coerente, é esse fluxo que nos faz interpretar as cenas como arte - como intenção do diretor para alcançar suas pretensões e objetivos [...] é surpreendente! É surpreendente como podemos nos surpreender com algo tão simples. A arte não está no espetáculo, pode até fazer parte dele. Arte está onde há envolvimento humano, onde há humanidade, onde há humanidade em sua completude (M. S. N.).

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

86


REVISTA

APOTHEKE Estrada em ziguezague. Ruas em labirinto. Encontros entre tempos. [...] O filme todo retrata um outro tempo, um tempo que nosso mundo deixou de prezar, um tempo cheio de tempo. Existe uma calma que se perdeu, uma seriedade e integridade que se desvinculou com o que realizamos atualmente [...] O filme me fez prezar e rever a tranquilidade e integridade que perdemos, e que pouquíssimas vezes vivenciei na vida (C.X.).

Narrações. Madeira e ferro. Portas e janelas. Recortes de luzes coloridas projetadas na parede, o vento. O filme me atentou também para enxergar essa rede que formamos o tempo inteiro, essa relação entre pessoas e experiências [...] O menino também entra nesse papel de obstáculo, no momento em que não tem paciência para ouvir o velho que constrói portas, achei bonita essa inversão e a simbologia da porta como algo manufaturado, experienciada em contrapartida ao técnico, massivo conjunto de portas de ferro (Y. M.). No filme pude ver na figura de um senhor, que ajudou o protagonista a encontrar a casa do amigo [...] um narrador, e para mim a figura do narrador é repleto de experiências, vividas ou ‘inventadas’ nas suas narrações [...] Para o protagonista o encontro com o narrador não pareceu proveitoso durante o momento que aconteceu, pois a sua preocupação em entregar o caderno de tarefas de seu amigo, e voltar cedo para casa, era mais importante, o que me mostrou o quanto desperdiçamos dentro de uma experiência, onde podemos por ora focar tanto em algo e deixar coisas muito importantes de lado, mas que pode ser retomado no final dessa experiência, se ela for completa, como já disse, onde podemos ver o processo de uma forma linear e inteira, ou não tão linear, mas ver tudo o que passamos [...] a atenção ao decorrer do processo da experiência, e ao final com a reflexão sobre o que houve, é essencial, a meu ver, dessa experiência singular e estética, diferente de uma reprodução automática [...] Depois dessa experiência que tive com a leitura, discussão e releitura do texto, comecei a me preocupar com o tipo de cada experiência, tornando-me também uma espectadora de meus atos, ainda não descobri se isso é algo bom, mas estou gostando dessa análise crítica, porém sutil, dos acontecimentos em minha vida (J.M.). ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

87


REVISTA

APOTHEKE Kiarostami cria assim uma expectativa no espectador, o que faz do filme, aparentemente monótono pela falta de grandes conflitos e pela simplicidade das ações de um garoto e de moradores de uma vila, vire grandes ensinamentos a respeito do mundo e da educação [...] acaba voltando à sua casa onde ainda triste por não concluir sua missão, recusa a comida da mãe, mas faz sua lição enquanto observa sua mãe pela janela, lutando contra a força do vento para pegar as roupas do varal [...] (V.R.).

ßO

caderno,

uma

flor,

imagens

narradas

em

motes

para

“uma” experiência, narrada em outras imagens. Ter uma experiência é algo completo, onde juntamos os momentos de planejamento do fazer no momento, a sensação do que está acontecendo, as lembranças que nos trazem sentimentos e nos fazem criar esse mundo único, que pode acontecer em segundos, ou então em um longo período, mas que, para mim, pode ser distinguido o decorrer de tudo, com início, meio e fim [...] (J.M.). O importante nessa história não são os ‘grandes eventos’, não há nada disso, o que interessa é o caminho que é feito para solucionar o problema, tudo o que o menino tem que ir superando (F. C. P.). [...] a trajetória feita tornou-se parte de Ahmed, a flor que deixou no caderno de Nematzadeh era uma representação disso, de todo o signficado de sua experiência (F. C. P.).

Tais foram algumas das imagens narradas em abertura nas duas ficções de Dewey e Kiarostami. Dos

tempos

presente

das de

imagens suas

que

Imagens feitas de tempos.

compunham

atualizações,

do

as

duas

ficções,

passado

que

do as

reconfiguravam. Das experiências vividas e reconduzidas pela memória.

Da

experimentação

de

“uma”

experiência

a

ser

compreendida. Dessas imagens outras ficções se modelam, dando formas à “complexidade e vastidão infinitas do mundo”. Notas 1

Este texto foi apresentado no 21º. Encontro Nacional da ANPAP, e publicado nos anais desse evento. Disponível em <http://anpap.org.br/anais/2012/pdf/simposio3/rita_bredariolli.pdf>. A ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

88


REVISTA

APOTHEKE decisão por torná-lo público novamente após 4 anos de sua primeira publicação, se deu pela intenção de sua revivescência e atualização. O que é relatado nesse texto, se mantém vivo e presente em variações pela diversidade dos sujeitos que fazem ou fizeram parte dessa história em continuidade. Sua existência, realização e continuidade resultam do entendimento da docência como poiesis, como atos de criação fundados e movidos pela ação simultânea e indissociável do sensível e inteligível, o que a aproxima de “uma experiência”, da experiência singular, tal qual a definida por John Dewey. Essa epistemo-metodologia foi confirmada e densificada no contato com as concepções e práticas integrantes do Program in Art and Art Education do Teachers College, Columbia University, durante meu estágio de pós-doutoramento realizado naquela instituição no segundo semestre de 2015, como bolsista do Programa de Pesquisa Pós-Doutoral no Exterior da CAPES. 2 ROSA, G. O espelho In ROSA, G. Primeiras Histórias. 49ª. imp. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, pp. 119-128. 3 Jorge Luis Borges narra em seu Do rigor na ciência, deixado em abertura, como as tradicionais narrativas, as edificações de um rigor desmesurado, expondo também o seu contrário. A suspensão definida pelo final em aberto, encaminhado pela ambivalência de um rigor extremado e sua ausência, deixa espaço para aquele que participa com sua leitura, da compreensão dessa narrativa: “...Naquele Império, a Arte da Cartografia alcançou tal Perfeição que o mapa de uma única Província ocupava toda uma Cidade, e o mapa do império, toda uma Província. Com o tempo, esses Mapas Desmesurados não foram satisfatórios e os Colégios de Cartógrafos levantaram um Mapa do Império que tinha o tamanho do Império e coincidia pontualmente com ele. Menos Afeitas ao Estudo da Cartografia, as Gerações Seguintes entenderam que esse dilatado Mapa era Inútil e não sem Impiedade o entregaram às Inclemências do Sol e dos Invernos. Nos desertos do Oeste perduram despedaçadas Ruínas do Mapa, habitadas por Animais e por Mendigos; em todo o País não há outra relíquia das Disciplinas Geográficas”. BORGES, J. L. Do rigor na ciência In BORGES, J. L. O Museu. Obras completas de Jorge Luis Borges. São Paulo: Globo, 1999. 1 v., p. 247. 4 BENJAMIN, W. apud MATOS, O. C. F. O iluminismo visionário: Benjamin, leitor de Descartes. 1ª. reimp. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1999, p. 73. 5 MENESES, U. T. B. Entrevista concedida ao jornal Cores Primárias <www.coresprimarias.com.br/ed_10/ulpiano_p.hp> acesso em 01/04/2012. 6 Idem. 7 MENESES, U. T. B. Da Arqueologia Clássica ao Patrimônio Cultural: os sentidos da cultura material e seus desdobramentos <http://comunicacao.fflch.usp.br/sites/comunicacao.fflch.usp.br/files/outor ga_ulpiano.pdf> acesso em 01/04/2012. 8 Idem. 9 Idem, ibidem. 10 Idem, ibidem. 11 O potencial da imagem como lugar de elaboração de conhecimentos, vem sendo redimensionado também no campo educacional, como por exemplo, pelos estudos em torno da pedagogia do imaginário ou a pedagogia de la imagen. Cf. TEIXEIRA, M. C. S. Pedagogia do Imaginário e função imaginante: redefinindo o sentido da educação. < www.revistas2.uepg.br> acesso em 01/04/2012 e DUSSEL, I; ABRAMOWSKI, A.; IGARZÁBAL, B.; LAGUZZI, G. Aportes de la Imagen en la Formación Docente: Abordajes conceptuales y pedagógicos. < http://cedoc.infd.edu.ar/upload/24_2010_Documento_Pedagogias_de_la_Imagen__ Ines_Dussel_y_otros_version_preliminar.pdf> acesso em 01/04/2012. 12 DIDI-HUBERMAN, G. Ante el Tiempo: historia del arte y anacronismo de las imágenes. Buenos Aires: Adriana Hidalgo editora, 2008, p. 31. 13 Idem, p. 32. 14 DIDI-HUBERMAN, G. O que vemos, o que nos olha. 1ª. reimp. Trad. Paulo Neves. São Paulo: Editora 34, 2005. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

89


REVISTA

APOTHEKE 15

DUSSEL, I. [et.al.]. Op.cit. DEWEY, J. Ter uma experiência In Arte como experiência. Trad. Vera Ribeiro. São Paulo: Martins Fontes, 2010, p.109. 17 Em uma edição norte-americana de 2005 do texto “Ter uma experiência”, nos é apresentada a expressão an experience, para designar o conceito de experiência elaborado por John Dewey. Na edição brasileira de 2010, publicada pela Martins Fontes, encontramos a designação “experiência singular”. Cf. DEWEY, J. Art as experience. New York: Penguin Group, 2005. 18 DEWEY, J. Op.cit. 19 Idem, pp. 111-112. 20 Idem, pp. 112-113. 21 Idem, p. 131. 22 Idem, pp. 115-116. 23 Idem, p. 116. 24 Idem, p.117. 25 Idem, p139. 26 Assim como nessa citação, também nas outras, que serão apresentadas nesse texto como exemplos dos resultados obtidos na ação de ensino e aprendizagem aqui descrita, serão resguardadas as identidades de seus autores, todos alunos da disciplina Didática Geral dos cursos de licenciatura em Música, Artes Cênicas e Artes Visuais, durante o ano de 2011. 27 DEWEY, J. Op.cit., p. 124. 16

REFERÊNCIAS BENJAMIM, W. Obras escolhidas: Magia e Técnica, Arte e Política. Trad. Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Editora Brasiliense, 1996. ___. Origem do Drama Trágico Alemão. Trad. João Barrento. Lisboa: Assírio & Alvim, 2004. BORGES, J. L. Obras Completas de Jorge Luis Borges. Vol.1. São Paulo: Globo, 1999. DEWEY, J. Art as experience. New York: Penguin Group, 2005. ___. Arte como experiência. Trad. Vera Ribeiro. São Paulo: Martins Fontes, 2010. DIDI-HUBERMAN, G. Ante el Tiempo: historia del arte y anacronismo de las imágenes. Buenos Aires: Adriana Hidalgo editora, 2008. ___. O que vemos, o que nos olha. 1ª. reimp. Trad. Paulo Neves. São Paulo: Editora 34, 2005. DUSSEL, I; ABRAMOWSKI, A.; IGARZÁBAL, B.; LAGUZZI, G. Aportes de la Imagen en la Formación Docente: Abordajes conceptuales y pedagógicos. Disponível em < http://cedoc.infd.edu.ar/upload/24_2010_Documento_Pedagogias_de_la_Imagen__ Ines_Dussel_y_otros_version_preliminar.pdf> Acesso em 01 abr. 2012. MATOS, O. C. F. O iluminismo visionário: Benjamin, leitor de Descartes. 1ª. reimp. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1999. MENESES, U. T. B. Da Arqueologia Clássica ao Patrimônio Cultural: os sentidos da cultura material e seus desdobramentos. Disponível em <http://comunicacao.fflch.usp.br/sites/comunicacao.fflch.usp.br/files/outor ga_ulpiano.pdf> Acesso em 01 abr. 2012. ___. Entrevista concedida ao jornal Cores Primárias. Disponível em <www.coresprimarias.com.br/ed_10/ulpiano_p.hp> Acesso em 01 abr. 2012. RICOUER, P. A memória, a história, o esquecimento. 1ª. reimp. Campinas: Editora Unicamp, 2008. ROSA, G. Primeiras Histórias. 49ª. imp. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

90


REVISTA

APOTHEKE TEIXEIRA, M. C. S. Pedagogia do Imaginário e função imaginante: redefinindo o sentido da educação. Disponível em < www.revistas2.uepg.br> Acesso em 01 abr. 2012.

Rita Luciana Berti Bredariolli http://lattes.cnpq.br/0970761217541525 Doutora em Artes, linha de pesquisa Teoria, Ensino e Aprendizagem pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, ECA-USP e mestre pela mesma instituição. Possui Licenciatura e Bacharelado em Educação Artística com habilitação em Artes Plásticas pela Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP. Atualmente é professora Assistente Doutora do Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho", IA - UNESP e coordenadora do GPIHMAE (Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Imagem, História e Memória, Mediação, Arte e Educação)

91

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE O professor e o mágico são o artista (The teacher and the magician are the artist) Michel Zózimo da Rocha (UFRGS)

RESUMO Este artigo busca traçar relações poéticas entre figuras pertencentes aos campos das artes visuais, da educação e da pesquisa científica, estabelecendo diálogos abertos entre tais elementos através do texto “O artista, o cientista e o mágico”, de Luiz Camnitzer. PALAVRAS-CHAVE Artista; professor; mágico; truque. ABSTRACT This article endevors to delineate relationships between poetic figures belonging to the fields of visual arts, education and scientific research by establishing an open dialogue between these elements through the text "The artist, scientist and magician" by Luiz Camnitzer. KEYWORDS Artist; teacher; magician; trick.

92 O que há de comum entre o campo das artes visuais, o mundo da mágica e a esfera científica? Não necessitaremos de muito tempo para responder tal interrogação, afirmando que um dos pontos de contato pode ser aquilo que chamamos de truque. Esta linha de pensamento parece ter sido seguida pelo artista e professor nascido na Alemanha Luiz Camnitzer na elaboração do artigo intitulado: “O artista, o cientista e o mágico”. Ao eleger este ponto de contato, Camnitzer problematizará o papel da

explicação

para

os

três

campos

mencionados,

quando

os

mesmos se conectam com a ideia de truque. Incidem sobre a noção de truque, ao tentarmos definí-la, questões que sugerem sempre o inexplicável, o desconhecido, aquilo que é ardiloso, que engana, que é derivado do jogo e da armadilha. Ao mesmo tempo, podemos subverter tal conceito pensando-o a partir dos seus pontos invisíveis – aquilo que se explica subjetivamente, o que será conhecido através da imaginação, o simples exposto ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE pela dúvida, as regras inventadas, os seus pontos de fuga e tudo aquilo que tange a poesia. Antes de continuarmos esta discussão, gostaria de trazer mais uma figura, além do artista, do mágico e do cientista, já mencionados por Camnitzer, pensando ainda nas noções de truque e explicação. Trata-se do professor. Como uma representação básica

que

remete

aos

modelos

clássicos

e

desgastados,

a

definição de tal profissão ou ocupação tem estreita relação com a função que exerceu ao longo dos tempos. Antes mesmo da escrita

e

antecedendo

as

primeiras

instituições

de

ensino,

essa figura já estava presente nas mais diversas sociedades praticando

informalmente

modos

de

socializar

conhecimentos.

Evidentemente, o papel ocupado por este personagem alterou-se acompanhando

sempre,

de

um

modo

complexo,

as

formas

e

estruturas sociais. Semelhante a um profeta, aquele que gera profecias,

professor

também

foi

sinônimo

das

artes

dos

oráculos, representando aqueles poucos que sabem e que podem responder

todas

as

cultura oral –

dúvidas

que

temos.

De

detentor

de

uma

aquele que poderia explicar os detalhes do

mundo, que ensinaria todos cuidados que o corpo necessita, que conservaria a escrita – a figura do professor, a partir da idade média, passou a prestar seus serviços às instituições de ensino. Esse marcas

dado

histórico

ideológicas

conhecimento mitos.

ainda

Conforme

“Explicar

que

humano

insistentemente, alguma

nos

interessa

acompanharam

ao

longo

permanecem

assinala

Jacques

coisa

alguém

a

as

dos como

para

modelos antes

as

abordagens

séculos

Rancière é,

pensarmos e

que,

latentes

(2013, de

do ou

p.23):

mais

nada,

demonstrar-lhe que não pode compreendê-la por si só”. Segundo este mesmo autor (2013, p. 23-24): “Antes de ser o ato do pedagogo, a explicação é o mito da pedagogia, a parábola de um mundo

dividido

em

espíritos

sábios

e

espíritos

ignorantes,

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

93


REVISTA

APOTHEKE [...]”.

Se

atentarmos

para

os

implícitos

à

qualquer

ação

explicação

como

principal

a

que

significados configura

uma

ferramenta

que

estão

operação

prática

de

de um

professor que segue o “mito da pedagogia” – encontraremos os sinônimos

de

instrução,

esclarecimento,

compreensão,

elucidação, resolução, entre outros. Geralmente, os mistérios, as dúvidas, as incertezas e os problemas do mundo são mortos pelas explicações. E os truques, igualmente, não escapam desse triste destino. Mas afinal, o que é um truque? Para

o

ilusionismo,

por

exemplo,

a

expressão

'truque'

está ligada ao mistério que envolve toda exibição de um número de mágica. A forma habilidosa de elaboração de um truque é aquilo que o torna mágico. E quanto mais nos esforçarmos para entendê-lo, maior será o nosso espanto. Ligado à visualidade, o truque é o artifício que nos dá a impressão de que algo impossível

aconteceu

bem

diante

de

nossos

olhos,

como

nos

aponta Bioy Casares, através da fala de um de seus personagens (2008, p.85-86): “Lembrem-se de que na, nossa incapacidade de ver, os movimentos do prestidigitador se convertem em magia”. Contrariando, aparentemente, as leis da física, um truque lida com a ilusão, onde a ação do mágico é mais rápida que nossos olhos, representando ser mais complexa que nossa inteligência. Ao mesmo tempo, é valido lembrar que os truques de mágica funcionam como espécies de contratos de fé, através dos quais o público aparenta ter plena consciência de que a encenação de todo

mágico

integra

sempre

uma

perspectiva,

podemos

interrogar:

trapaça. somente

A os

partir

dessa

mágicos

podem

tirar coelhos de uma cartola, serrar pessoas ao meio e mudar a cor

de

um

lenço

com

apenas

um

toque?

Pensando

nessa

interrogação, podemos cogitar que certos artistas manipulam espécies de truques, onde um tipo de contrato de fé também é firmado. ligado

De

certo

apenas

à

modo,

talvez,

visualidade

de

esse um

contrato

trabalho

de

não

esteja

arte,

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

mas

94


REVISTA

APOTHEKE igualmente à linguagem que define o seu modo de existência. Sobrevoando certos trabalhos que podem suscitar algumas dessas relações, podemos lembrar do 'museu chapéu' de Robert Filliou, chamado Galerie Légitime, onde o artista francês, ao tirar

o

chapéu

da

sua

cabeça

(modelo

de

chapéu-coco,

indumentária típica de um cavalheiro elegante, como aqueles das

pinturas

interessar,

de

Magritte),

exposições

apresentava,

miniaturizadas

para em

quem

seu

pudesse

interior.

Imagino, aqui, a imagem de Filliou, andando pelas ruas de Paris,

em

1961,

utilizando

o

gesto

de

um

mágico,

onde

a

representação de uma cartola era, agora, substituída por um chapéu que poderia abrigar, não somente coelhos, mas também trabalhos italiano

de

arte.

Piero

Escultura

Igualmente,

Manzoni

Viva,

de

e

1961.

de Tal

podemos seu

lembrar

trabalho

trabalho,

do

Base

artista

Mágica

constituído

por

– um

sólido de madeira, convertia o status de todos os indivíduos que o pisassem, transformando-os, como em um passe de mágica, em

verdadeiras

referendar

obras

Boîte

de

Mystère,

arte. de

Do

Ben

mesmo

Vautier,

modo, série

podemos

de

caixas

lacradas, onde se pode ler a seguinte instrução em uma de suas faces: “Não abra. Esta caixa perderá todo o seu valor estético se você abri-la”. É necessário ressaltar que os trabalhos dos três artistas mencionados, Robert Filliou, Piero Manzoni e Ben Vautier, aqui funcionam mais como um conjunto subjetivo de ilustrações do que como referências diretas ao presente artigo. No entanto, os mesmos tornam-se necessários, talvez, pela beleza de seus gestos simples, lembrando os movimentos ou as transformações enigmáticas de um truque de mágica. Nesse caso, o movimento de extrair

algo

converter

que

alguém

é em

inesperado obra

de

de

um

arte,

sem

chapéu, mudar

a

nada

ação de

de suas

características e o discurso que confere valor à um objeto artístico

funcionam

como

certos

mistérios

que

são

criados

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

95


REVISTA

APOTHEKE pelos artistas e que podem estar presentes em alguns truques de

mágica.

Exemplificando,

podemos

imaginar

que

o

coelho

transformado em lenço por um mágico teria a sua estrutura física transmutada em uma matéria inanimada, já, no truque de Manzoni,

a

função

social

é

alterada

sem

mudanças

físicas.

Trata-se de uma ação mágica que opera através dos códigos da linguagem, onde apenas o conceito do objeto é alterado. Nos trabalhos

mencionados,

poderíamos

observar

que

uma

explicação plausível que justifique como os mesmos funcionam, além

da

mágica

ou

do

mistério?

Ou

bastaria

o

discurso

invisível da arte para legitimá-los como construções irônicas que não necessitam de credibilidade factual? Nesse sentido, gostaria de trazer para essa reflexão a contribuição de Luiz Camnitzer sobre o papel que a explicação exerce para os três campos mencionados aqui: a arte, a ciência e

a

mágica.

Publicado,

originalmente,

em

2011,

na

revista

digital Humboldt do Instituto Goethe, o texto de Camnitzer pontua algumas questões pertinentes para pensarmos essas três figuras: o artista, o cientista e o mágico. Desse modo, são trazidos alguns trechos que foram extraídos do referido texto:

[...] Geralmente, falamos da atividade artística como se fosse algo totalmente diferente da atividade científica. Do cientista exigimos que seja responsável e que sirva ao bem comum, que seja rigoroso em seus processos de especulação, de pesquisa e experimentação, e que seja capaz de prestar contas sobre o que faz, quando isso lhe for pedido. Quanto ao artista, por sua parte, tolera-se que assuma algum grau de onipotência. Uma vez que declarada arte, a obra se torna praticamente indestrutível. [...] Para entender melhor esta relação que existe entre o artista e o cientista com respeito à responsabilidade social, convém introduzir uma terceira personagem: o mágico. É o mágico, não o artista, quem está no extremo oposto ao cientista. Isto é assim, porque a essência do ato mágico está na habilidade de esconder o processo e de mantê-lo secreto. [...] A mulher que o mágico apresenta somente aparenta ser cortada ao meio, mas não o é realmente. O cientista analisa o que aconteceria se a mulher fosse cortada ao ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

96


REVISTA

APOTHEKE meio, uma análise que permite decidir que normalmente é melhor não cortá-la. [...] O cientista trata aqui de explicar o incrível. O mágico trata de simular o incrível. O artista trata de apresentar o incrível para expandir o mundo do crível. É aqui onde entra a função da explicação para cada uma destas personagens. [...] Para o cientista, a explicação é sua missão primária. Quer explicar o que até então não foi explicado e confirmar que a explicação que encontra está correta. Pode-se dizer que tudo o que o cientista faz é uma explicação, mesmo que não utilize palavras. Para o mágico, a explicação é anátema. Toda explicação destruiria a ilusão que ele tenta criar e, por isso, sabotaria o seu espetáculo. Daí o juramento da confraria de mágicos de nunca revelar os seus truques.

Vale observar que Camnitzer, através dessas três personas, elabora um pensamento crítico sobre a figura do artista como um ser que também deve ter responsabilidades sociais e que, como sujeito ético, não deveria assumir o papel cômodo de isentar-se das mesmas. Entre as tarefas de um artista estaria implícita,

igualmente,

a

atividade

intelectual

que,

não

apenas, propõe visualidades, como também explicita, através de suas ações e de seus pensamentos: posicionamentos políticos e outros interesses sociais. Dessa forma, o senso comum de que o campo da arte estaria em oposição extrema ao campo da ciência, por exemplo, é problematizado. Todavia, não devemos ignorar as diferenças entre essas áreas, as quais encontram, nos seus fins, processos com modos de existência muito distintos. Podem surgir

daí

impressões

equivocadas

de

que

caberia

à

arte

somente ações subjetivas, as quais a isentariam de reflexões necessárias para o campo do real. De um modo semelhante à reflexão de Camnitzer, na década de 1930, Walter Benjamin já́ havia atentado para essas três figuras através de uma tríade de personas similares: o pintor, o cirurgião e o mago. Nas palavras do autor (1992, p. 99):

O cirurgião representa o polo de uma ordem cujo outro ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

97


REVISTA

APOTHEKE extremo é ocupado pelo mago. A atitude do mago que cura o doente colocando-lhe a mão em cima, é diferente da do cirurgião que realiza uma intervenção no doente. O mago mantém a distância natural que existe entre si próprio e o paciente; melhor dizendo: ele diminui-a pouco – por força da mão que coloca no doente – e aumenta-a muito – por força de sua autoridade. O cirurgião procede ao contrário: diminui muito a distância relativamente ao paciente – na medida que intervém em seu interior – e, aumenta-a apenas ligeiramente – através do cuidado com que sua mão se move nos órgãos do paciente. Isto é, contrariamente ao mago (que ainda está presente no médico), o cirurgião prescinde, no momento decisivo, de se defrontar, enquanto homem, com seu paciente, intervindo nele de forma operante. O mago e o cirurgião comportam-se como o pintor e como o operador da câmera.

A

análise

comparativa

que

Benjamin

desenvolve

está

relacionada com as linguagens e com as técnicas que essas três figuras operam em seus campos, onde o mago está próximo do pintor, assim como a função do cirurgião dialoga sensivelmente com a do operador da câmera, fotográfica ou cinematográfica, justamente por essas duas últimas figuras, na visão do autor (1992,

p.100),

“intervirem

profundamente

na

textura

da

realidade”. Podemos observar que, apesar das diferentes perspectivas, as análises construídas por Luis Camnitzer e Walter Benjamim possuem

pontos

de

contato

que

as

aproximam

como

ideias

correlatas, nas quais a magia e a técnica são problematizadas. O mago, na perspectiva de Benjamin, não é apenas o curandeiro, mas

também

aquele

que

desafia

os

mistérios

do

mundo,

manipulando com os seus truques a realidade que nos circunda. Propositadamente, o cinema será analisado por Benjamin, nesse mesmo texto do qual o trecho acima fora extraído, como um meio técnico que mudará a forma do homem moderno de se relacionar com a reprodução de imagens. Sob essa perspectiva, podemos pensar

que

artistas,

cientistas

e

mágicos

operam,

certas

vezes, truques visuais que, apesar de explicações, permanecem enigmáticos. Refiro-me, aqui, quando o mistério de um dado

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

98


REVISTA

APOTHEKE objeto,

fato

ou

acontecimento

não

consegue

ser

domesticado

pela função da explicação. A arte parece ser um lugar ainda não domesticado. Ou pelo menos deveria ser o campo onde a explicação nunca suplanta o truque. Do mesmo modo, a esfera da educação, há um bom tempo, já

não

é

mais

o

espaço

ideal

para

as

explicações

que

transformam as dúvidas em ruínas. Contrariando essa lógica, ao professor

parece

caber

mais

o

papel

de

mágico

do

que

de

cientista. Entretanto, o truque criado pelo professor estará mais próximo daquilo que os artistas fazem quando inventam uma coisa que chamamos de arte. Enquanto o mágico ocuparia o polo oposto ao do cientista, na linha de pensamento criada por Camnitzer, podemos pensar que o professor de arte estaria na margem

de

tal

polarização.

Ele

transita

entre

o

processo

investigativo do cientista, com suas pesquisas e resultados, mas

nunca

revela

totalmente

o

funcionamento

dos

truques

operados por ele e pelos outros artistas. Apesar disto, uma aula de arte pode ser equiparada a um número de mágica, onde o suspense, o inesperado e a surpresa do visível acontecerá sem que tenhamos a necessidade de entendê-lo por completo. Chegando a este ponto, gostaria de expor o que penso sobre as aproximações entre artista e professor, a partir de minha prática artística e docente. Em primeira instância, não vejo diferenças entre um trabalho de arte e um plano de aula, principalmente em relação ao momento de suas concepções. A invenção e o processo que dá forma à uma ideia constituem, ao meu ver, a principal unidade que aproxima essas duas áreas de atuação. Escolher um assunto, elaborar um discurso, inventar um método, projetar um plano, aceitar o imprevisível e tornar pública toda essa elaboração são ações intuitivas que estão no mesmo campo de experimentação. Apropriando-nos das palavras de Italo Calvino (1993, p. 108), podemos pensar que: “[...] se trata de uma pedagogia que só podemos aplicar a nós mesmos, ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

99


REVISTA

APOTHEKE seguindo métodos a serem inventados a cada instante e com resultados imprevisíveis”. Pensar uma aula de arte como um trabalho de arte não significa afirmar que as peculiaridades relacionadas aos seus fins não serão levadas em consideração. O processo de gestação destas

duas

produções

é

aquilo

que

as

aproxima,

mas

vale

repetir que os seus fins não são os mesmos. Não obstante, podemos

pensar

que

um

trabalho

de

arte

não

funciona

sem

público, assim como uma aula não acontece sem alunos. Mas da mesma forma que o mágico não deve subestimar o seu público, a todo

professor

ou

artista

imagina-se

que

caiba

o

mesmo

exercício com aqueles que de seus processos participam. Assim, criando uma ponte entre aula e truque, podemos abolir a ideia de explicação como ferramenta de elucidação que mataria os mistérios da dúvida que divide o mundo, segundo o senso comum, entre aqueles que conhecem e aqueles que desconhecem. Para fins de esclarecimento, ainda sobre a explicação, cabe lembrar como afirma Rancière (2013, p.23) que: “É o explicador que tem a

necessidade

do

incapaz,

e

não

o

contrário,

é

ele

constitui o incapaz como tal”.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

que

100


REVISTA

APOTHEKE

101

Ben Vautier, Boîte Mystère, 1960.

Para finalizar, retomo o trabalho Caixa Misteriosa de Ben Vautier,

realizado

em

1960,

para

destacar

a

potência

de

significado que esta obra possui quando o enunciado que está inscrito em uma de suas faces é lido além do contexto da arte. O aviso de Vautier serve igualmente para pensarmos sobre os mistérios de um truque de mágica e como a fragilidade das certezas nos levaria a perder todos os outros elementos que não estão calcados no conhecimento. Imaginar o que tem dentro da

caixa

de

Vautier

seria

muito

mais

interessante

do

que

descobrir, como já é intuído, que em seu interior nada existe. O conteúdo de tal caixa não possui peso, volume ou densidade e ao mesmo tempo ele é infinito e mágico tal como os conteúdos de uma aula de arte.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Referências CAMNITZER, Luiz. O artista, o cientista e o mágico. Acesso em: 28/03/2014. Disponível em: http://www.goethe.de/wis/bib/prj/hmb/the/156/pt8622845.htm CALVINO, Italo. Seis Propostas para o Próximo Milênio. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. CASARES, Adolfo Bioy. A Invenção de Morel. Cozac Naify: São Paulo, 2008. RANCIÈRE, Jacques. O Mestre Ignorante. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2013. Michel Zózimo da Rocha http://lattes.cnpq.br/3436614841970303 Possui Doutorado e Mestrado em Artes Visuais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2014 e 2008 respectivamente), Especialização em Arte e Visualidade pela Universidade Federal de Santa Maria (2006), Graduação em Desenho e Plástica/ Bacharelado pela Universidade Federal de Santa Maria (2004), Graduação em Desenho e Plástica / Licenciatura pela Universidade Federal de Santa Maria (2007). Tem experiência na área de Artes, com ênfase em Artes, atuando principalmente nos seguintes temas: arte contemporânea, exposição coletiva, livro de artista, objeto e ensino da arte.

102

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Modos de ser professor-artista Marcelo Forte (UC) RESUMO O presente artigo pretende apontar posicionamentos acerca da docênciaartística a partir do conceito de desterritorialização, tomando algumas experiências no campo da docência em Artes Visuais, de atividades acadêmicas e de investigação como aportes para a discussão em torno do tema. Há relatos do investigador que partem de sua licenciatura em Artes Visuais, passando pelas experiências docentes até chegar no momento atual em que realiza seu doutoramento, com o foco neste tema tratado. Vê-se neste texto, a docência e a arte enquanto territorialidades em um processo de abertura para desterritorializarem-se e reterritorializarem-se juntas em um novo espaço. Esse novo espaço é tomado como uma multiterritorialidade, pois além de abarcar docência e arte, encontra-se aberto para outras contaminações, para se deixar afetar pelas outras territorialidades que encontram-se conectadas em rede. PALAVRAS-CHAVE: multiterritorialidade

docência-artística;

desterritorialização;

ABSTRACT This article aims to point the positions about teaching-artistic from the concept of deterritorialization, considering some experiences in the field of visual art teaching, in academic activities and the research as contributions to discuss about this theme. There are researcher reports from the author degree in Visual Arts, passing through the teaching experiences to arrive at the current moment that He develops on his Ph.D., with the focus on this topic discussed. In this text one can see that teaching and art as territorialities in a process of openness to deterritorialization and reterritorialization together in a new space. This new space is taken as a multiterritoriality, as well as encompasses teaching and art, it is open to other contaminations, to let it be affected by other territorialities that are interconnected. KEYWORDS: teaching-artistic; deterritorialization; multiterritoriality.

Este texto trouxe para mim a possibilidade de revirar o baú

que

venho

enchendo

desde

que

iniciei

minha

trajetória

acadêmica e desde quando comecei a pensar sobre a profissão que venho desenhando ao longo de minha formação. Essas

retomadas

são

quase

sempre

exercícios

muito

produtivos e que nos ensinam algo. Rever e repensar certas práticas faz-nos ponderar se aquilo que fomos ainda é válido para ser no presente, se o que nos afetou um dia continua a afetar agora e como as mudanças constituem nossos modos de ser e de pensar. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

103


REVISTA

APOTHEKE Posso

dizer

que

venho

desde

a

licenciatura

em

Artes

Visuais pensando a respeito da formação docente, mas ao longo desse caminho diversos atravessamentos colaboraram para que eu reafirmasse

ou

mudasse

minhas

opiniões

e

muitos

foram

os

rearranjos e as remodelações para contemplar meus anseios de pesquisa. Esta escrita gira em torno de minhas próprias práticas acadêmicas e docentes e dos atravessamentos que aconteceram nesse caminho de formação. Servem como base para tratar de uma ideia que venho há muito tempo discutindo, de uma constituição de docência-artística. É um modo de ser que pode estar permeado pelas atividades acadêmicas da formação inicial, mas que não se limita a isso, busca tecer relações com os diversos campos que atravessa no decorrer da vida. Investigo neste momento a docência-artística como um campo multiterritorial¹. E para este texto lanço algumas pontuações que

venho

produzindo

a

esse

respeito.

Tenho

buscado

compreender a docência e a arte como territorialidades que são desterritorializadas para reterritorializarem-se juntas em um novo campo, o da docência-artística. Por

estarmos

territorialidades práticas

sempre

e

nos

pertencentes

territorialidade

que

conectados

contaminarmos a

outros surge

com

delas,

campos, é

outras

de

outras

essa

entendida

nova como

multiterritorialidade. Sinta-se

convidado(a)

a

entrar

nesses

espaços

docente-

artísticos pelas ideias que aqui pontuo e fazer reverberar em suas vozes e escritas outras ideias acerca da docência e da docência-artística.

Constituição de uma docência-artística ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

104


REVISTA

APOTHEKE Considero-me professor-artista. Desde minha licenciatura em

Artes

Visuais

venho

pensando

a

respeito

não

das

nomenclaturas, mas também das profissões de professor e de artista, e de como elas entrecruzadas podem produzir algo em mim e no campo profissional em que atuo. Minha Federal

formação

de

Santa

inicial Maria

foi

e

realizada

durante

o

na

Universidade

curso

passei

por

disciplinas ligadas à produção artística e outras ligadas à docência. Mas foi no momento de preparar um projeto para a realização do estágio supervisionado que vi minhas produções de arte e docência se entrecruzando. Todos os estudantes a partir do terceiro semestre tinham de

escolher

artísticas

um

e

multimeios.

eu

Foi

ateliê

para

decidi

ir

nesse

desenvolver para

período

que

o

suas

ateliê

comecei

de a

pesquisas objeto

produção

e de

objetos de tecido com palavras bordadas em suas superfícies. Essas palavras vinham de um contexto exterior ao ateliê ou mesmo à faculdade, eram expressões muito particulares vividas somente entre meus amigos e eu. Elas

começaram

a

aparecer

em

meus

objetos

quase

que

instintivamente, pois havia um humor sarcástico nos formatos dos trabalhos que as palavras sabiam reconhecê-lo. Ou seja, palavra

e

objeto

tinham

uma

relação

de

cumplicidade

significar a produção, um precisava do outro.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

para

105


REVISTA

APOTHEKE

Imagem 1: Maldita_cuidado que ela morde, 2008 Arquivo do pesquisador

Essa produção com duplo sentido, com sarcasmos e sutilezas penetrou meu pensamento no momento de produzir o projeto de estágio para a docência. Não diretamente, mas principalmente a partir da ideia do jogo - de interpretação, de manipulação fui estabelecendo relações com a arte contemporânea e a sala de aula, buscando tramar discussões e vivências em torno das produções artísticas táteis, olfativas, sonoras, do paladar e visuais. Com o desenvolver das atividades na escola fui lançando novas propostas a cada semestre que se iniciava. Foram três semestres de estágio no total. Na altura do segundo semestre em

sala

de

artístico

aula,

alguns

dadaísta

como

aspectos

relativos

dispositivo

à

arte

ao

movimento

contemporânea

estavam rondando minha cabeça. A receita de poema dadaísta de Tristán Tzara, teve forte influência para o planejamento das aulas.

Assim,

trabalhamos

com

a

palavra

e

com

as

desconstruções, tanto imagéticas quanto de sentido sobre as coisas. Essas experiências trouxeram para minha formação inicial uma

visão

sobre

a

profissão

que

estava

se

delineando,

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

106


REVISTA

APOTHEKE contaminada

por

diferentes

aspectos

vividos

e

que

não

se

caracterizava apenas como artista ou como professor. Produzi como uma necessidade um modo de ser professor-artista e sigo a produzir-me de tal forma, nessa formação continuada que se dá academicamente, mas também nos contatos e atravessamentos com outros espaços. Nesse processo parece-me vital Deixar-se capturar pelos intervalos, devanear e permitir-se mergulhos de alice nos passeios por si, ou no completamente fora de si; percorrer-se sem medo de abrir portas, de beber elixires ou de enfrentar jaguadartes [...] (ROMAGUERA, 2111, p. 135)

Em

minha

experiência

docente

universitária,

tive

a

possibilidade de trabalhar com estudantes do Design Gráfico, Design de Interiores e das Artes Visuais em uma disciplina de Introdução ao desenho na Universidade Federal de Goiás. Para além das questões técnicas, dos grafismos e dos materiais, busquei

trabalhar

permitissem

junto

desconstruir

aos

estudantes

algumas

ideias

com que

questões cada

um

que vinha

trazendo acerca do desenho. Os estereótipos, os desenhos de gênios, a figuração, entre outros aspectos do não saber desenhar, foram na prática sendo discutidos e repensados. Não posso afirmar que todos tenham compreendido que o desenho é democrático e permite que cada um, independentemente da idade ou da formação, desenvolva sua própria grafia e suas maneiras de desenhar. Mas, todos tiveram a chance de

experimentar

através

de

exercícios em

sala

de

aula, formas de desenhar diversificadas. Nesse período minha produção artística estava dedicada ao desenho

e

à

colagem.

Tive

de

interromper

a

realização

de

objetos por questões de espaço físico para armazenamento. No campo do bidimensional segui com uma produção que apesar de não haver mais a possibilidade de manipulação tátil, como era com os objetos, tinha as relações e os relacionamentos como fio condutor. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

107


REVISTA

APOTHEKE Meus

objetos

tinham

um

relacionamento

direto

com

o

público, deixavam-se tocar e produziam nas pessoas diferentes sensações

com

suas

texturas

e

movimentos.

os

desenhos

relacionavam-se entre eles. Mesmo quando a representação era de apenas um indivíduo no papel, esse estava em contato com algo que não aparecia ali, mas que poderia estar fora, em outro desenho ou naquele que olhava para o papel.

108 Imagem 2: O beijo, 2012 Arquivo do pesquisador

O

sarcasmo

produção,

mas,

e

o

humor

continuavam

foi

a

partir

de

uma

atravessando

atividade

minha

desenvolvida

junto aos estudantes que uma nova série de trabalhos começou a aparecer e ganhar força para resistir e existir até os dias de hoje. Levei para sala de aula uma proposta de realização de desenhos

a

partir

de

manchas

em

papeis,

que

poderiam

ser

feitas com diferentes materiais escolhidos pelos estudantes. Como trabalhei essa contaminado

por

atividade com

resultados

muito

quatro

turmas,

diversificados

vi e

e

fui

senti-me

bastante entusiasmado para fazer meus próprios desenhos. Assim surgiu a Série Abraço, produzida a partir de manchas de café sobre papel. A temática veio ao encontro daquilo que ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE eu

vinha

produzindo,

das

relações

entre

os

seres,

dos

afetos, das trocas e mesmo das ausências. Em cada desenho da série é necessário pelo menos um abraço entre eles. Chamo de seres,

por

não

ser

possível

trata-los

por

humanos

ou

por

qualquer outro tipo de animal. São híbridos, misturam formas de humanos, aves, quadrúpedes, insetos, etc.

109

Imagem 3: Série abraço, 2016 Arquivo do pesquisador

Propus também com os estudantes, atividades de desenho a partir de poemas de Manoel de Barros e do Livro de perguntas de Pablo Neruda. Esses escritores estavam presentes em minhas leituras

naquela

altura

e

participavam

de

minhas

reflexões

artísticas e docentes. Portanto, a entrada deles nas aulas de desenho foram atravessamentos que mais uma vez aconteciam em minhas práticas. Atualmente desenvolvo

estou

afastado

doutoramento

em

das

Estudos

salas

de

aula,

Contemporâneos

pois pela

Universidade de Coimbra, em Portugal. Mas venho planejando e já desenvolvendo atividades como oficinas e mini-práticas para ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE dar

continuidade

continuar

a

às

pensar

experiências nas

relações

docentes

e,

sobretudo,

docente-artísticas

e

nos

atravessamentos que os diferentes espaços habitados produzem em mim. Nesses planejamentos tanto as relações com as palavras que estiveram

presentes

durante

minha

graduação,

quanto

as

atividades mais atuais que venho vivenciando, participam de alguma maneira, sobrepondo-se umas às outras e tornando minhas práticas docentes sempre diferentes a cada experiência. É assim que se estabelece um estado docente-artístico em mim,

movimentado

diferentes

por

campos,

situações

com

passadas

diferentes

e

contatos,

presentes,

de

e

se

que

tem

estabelecido neste momento a partir de viagens, conversas com amigos,

seminários

e

oficinas

de

arte,

visitas

a

museus,

assistindo filmes e séries, lendo livros, produzindo desenhos, colagens e bordados, entre diversas outras situações. Meu

posicionamento

acerca

da

docência-artística

não

se

limita aquilo que pertence ao âmbito da docência e da arte, mas, a partir deles, busco tramar relações com diversas outras situações que permeiam nossos cotidianos. Pode-se pensar, por exemplo, em como determinados lugares influenciaram a pintura de Paul Cézanne, tais como a montanha de

Santa

frequentes

Vitória em

e

suas

as

paisagens

obras.

Não

de

Aix-en-Provence,

foram

somente

muito

atividades

realizadas em ateliê que determinaram sua produção, mas aquilo que esteve presente em outras instâncias de sua vida. De mesmo modo, as casas noturnas de Paris, lugares onde o artista Toulouse-Lautrec circulou durante grande parte de sua vida,

influenciaram

sua

obra

com

diversas

cenas

de

festas

promovidas nesses ambientes. Se trocássemos os cenários desses dois artistas, certamente teríamos produções diferentes, pois os modos de ver aquelas cenas tinham para os dois motivações próprias de cada um. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

110


REVISTA

APOTHEKE Busquei

por

dois

exemplos

das

artes

visuais

não

por

coincidência, mas porque artistas como eles, que trabalharam com o visual e com a representação, nos deixaram registros de suas vivências, de suas visualidades e isso me faz crer que estiveram imersos e foram atravessados por esses ambientes. Em cada área de conhecimento, em cada profissão, aquilo que nos rodeia, em maior ou menor nível, envolve-se com aquilo que produzimos. É o que costumo chamar de contaminação, às vezes pode ser boa, às vezes pode ser ruim, mas em todos os casos deixam marcas que transformam nossas produções e nossos modos

de

nos

relacionarmos

com

a

vida

e

com

as

situações

vividas. Ampliando as vistas Ser artísticas

professor-artista e

subjetivas

é

com

o

tramar

relações

que

experiencia

se

poéticas, para

a

constituição de si e de sua docência. Por isso, devo pontuar que as práticas artísticas não precisam estar necessariamente institucionalizadas, pertencentes ao ateliê ou à galeria de arte, mas incorporadas aos seus modos de ser. Um(a) professor(a) que se constitui artisticamente é um(a) profissional que antes de escolher técnicas artísticas para elaborar seus planos de aula, pensa artisticamente em como afetar seus estudantes com o conteúdo a ser proposto, em como se aproximar deles, de suas vidas e de suas comunidades. Corazza lança um olhar sobre a docência que é permeada pela

arte

fazendo-nos

pensar

sobre

professores

em

devir-

simulacro. Tal devir-simulacro é composto por processos transversais de artistagem, que permeiam as diferentes subjetividades dos educadores, instauram-se através de cada um deles e dos grupos sociais, realizando uma crítica radical a essas formas determinadas e funções legitimadas. (CORAZZA, 2012, p. 7) ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

111


REVISTA

APOTHEKE São devires múltiplos que se desdobram entre as diferentes atividades pertencentes a(o) educador(a), inclusive as de sala de aula. A autora afirma que essa postura faz com que cada aula seja diferente da aula-modelo ou da aula-tradicional. Em

entrevista

para

Oliveira

(2013,

p.5),

Corazza

ainda

questiona: Se imitar, copiar, fazer decalque, chafurdar nos clichês, repetir o mesmo não funciona mais, por termos explodido os cercados e as segmentações territoriais do currículo, só nos resta artistar, não é mesmo? Se não, você para, como educador, se burocratiza, torna-se cansado, triste, pesado, grave, senta, chora, culpa os outros... A lei da vida docente vivida, e que vale a pena ser vivida, poderia ser: artistar, de vez em quando, ao menos, para continuar vivo.

Viver para além de existir, ser parte de ações que mudem o estado das coisas, que transformem os modos de ver e de se posicionar no mundo.

112 Campos desterritorializados Desde o mestrado em Arte e Cultura Visual realizado na Universidade

Federal

de

Goiás

venho

pensando

nos

atravessamentos entre docência e arte a partir do conceito de desterritorialização de Deleuze e Guattari (1996). Para isso foi necessário imaginar a docência e a arte enquanto territorialidades. Haesbaert (2005, p. 20) amplia o conceito de território de um nível físico e biológico para um nível

mais

imaterial

e

simbólico.

Nesse

sentido,

consigo

compreender a docência e a arte enquanto campos territoriais. Com

a

proposta

de

docência-artística

a

partir

da

desterritorialização, os campos de produção docente e produção artística

são

abertos

para

desterritorializarem-se

e

reterritorializarem-se em outro campo. Tudo isso parte de um esforço individual ou coletivo na tentativa de inventar uma ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE nova

territorialidade

territorialidades

que

não

anteriores,

se

mas

que

assemelha se

produz

às pelos

atravessamentos e se mantém aberta para continuar afetando e sendo afetada. [...] não se deve confundir a reterritorialização com o retorno a uma territorialidade primitiva ou mais antiga: ela implica necessariamente um conjunto de artifícios pelos quais um elemento, ele mesmo desterritorializado, serve de territorialidade nova ao outro que também perdeu a sua. Daí todo um sistema de reterritorializações horizontais e complementares[...] (DELEUZE; GUATTARI, 1996, p. 41)

A

desterritorialização

é

um

movimento

que

acontece

a

partir do desejo de um indivíduo ou de um grupo de tramar um novo lugar de pertencimento. Desterritorializar a docência e a arte

surge

a

partir

territorialidade

que

dessa

seja

vontade

permeada

e

de

inventar

atravessada

por

uma esses

dois campos. Portanto,

se

o

desejo

de

inventar

uma

docência-

artística, a desterritorialização é a ação que movimentará a arte

e

a

docência

de

seus

lugares-comuns

para

reterritorializá-las nesse novo espaço. Ainda que seja de modo provisório e instável, uma reterritorialização implica novas aprendizagens em outras partes, em outras relações. Sair de um território, deixar o que antes era seguro e familiar, romper com uma estrutura de vida até então estabelecida, tudo isto nos coloca em perspectiva, fazendo-nos questionar o que temos como certezas e investimento de nossos desejos. (NUNES, 2014, p. 387)

Buscar pela desterritorialização e pelos atravessamentos entre

docência

experimentar

e

arte

modos

provisoriamente, caracteristicas transbordamentos

de outro

que que

é

abrir-se

ser

e

de

tipo fogem

movimentem

para se de

do sua

a

possibilidade

tornar,

mesmo

professor(a), modelo

padrão,

docência

em

de que com com

direção

docência-artística. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

à

113


REVISTA

APOTHEKE Como todo esse processo depende do desejo e do esforço que parte de alguém ou de grupos específicos, não há um modelo que sirva de referência para todas as docências-artísticas. Cada um

determinará

a

partir

de

seus

repertórios

como

essa

reterritorialização acontecerá. Ou

seja,

todo

esse

professor(a)-artista atravessar

por

processo

carregando

experiências

implica

em

constituir-se

junto

de

si

longo

do

caminho,

ao

e

deixando-se desde

a

formação inicial, com as disciplinas, com os professores e com os colegas até uma formação continuada que pode acontecer em espaços formais ou informais, através das aprendizagens com os outros e com os espaços. Isso significa que não são apenas duas territorialidades que

se

encontram

para

uma

nova

territorialidade,

mas

múltiplos espaços que se cruzam e se conectam e fazem parte de nossas vivências e experiências, dos lugares que habitamos ou visitamos, etc.

114

A partir da reterritorialização para a docência-artística, carregamos

também

territorialidades

situações

vividas

profissionais,

pessoais,

em

outras

afetivas,

de

viagens, de conversas com amigos, de visitas à exposições em museus, de filmes assistidos e de uma série de acontecimentos que perpassam nossas vidas. De

meu

ponto

de

vista,

a

docência-artística

pretende

abraçar todas essas possibilidades, entendendo-as como modos de contaminações para uma formação artisticamente ampliada e poeticamente desenvolvida para os professores e professoras. Haesbaert(2005, p. 19) pontua que há uma grande quantidade de

territórios-rede

que

se

conectam

uns

aos

outros

e

que

possibilitam o trânsito entre um território e outro. Por isso, para

a

docência-artística,

ser

uma

territorialidade

pertencente a uma rede de outras territorialidades faz com que

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE sua

posição

no

mundo

seja

ampla,

fluida

e

aberta

para

os

atravessamentos. Essas

redes

integrações.

são

Não

entendidas

estão

enquanto

teorizadas

propostas

apenas

para

de

suprir

necessidades da pós-modernidade, mas atuam como atravessadoras e fazem com que os espaços se encontrem. Existem os espaços entre espaços e espaços dentre os espaços dos espaços. Existem múltiplas fronteiras difundidas de novo e de novo. E ainda assim, nós não descartamos os territórios que criaram e borraram o perímetro das fronteiras. (IRWIN, 2004, p. 32)

Nada está isolado no mundo. Todas nossas práticas estao imbricadas a outras situações e outros meios. Todos os campos de

conhecimento

informações, maneiras

recebem

produções

atuam

em

e

em

menor

ou

acontecimentos

seu

corpo

maior que

quantidade

de

territorial

diferentes e

promovem

115

movimentações e modificações. Por

isso,

pensar

reterritorializado,

é

a

docência-artística

compreende-lo

também

como como

um um

campo espaço

multiterritorial, que se alimenta e se atravessa em outros campos, que conecta-se em redes e passa constantemente por remodelações e adaptações. Para seguir desterritorializando Pode ser que tão breve os apontamentos que aqui escrevi sejam contaminados por outras falas, por novas percepções e ideias

advindas

de

outros

investigadores,

de

outros

professores-artistas e de diversos espaços que participam de minhas vivências. E

é

isso

que

espero,

que

as

desterritorializações

continuem acontecendo e promovendo novos modos de ser e de pensar

a

docência-artística.

E

que

essas

reflexões

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

sejam


REVISTA

APOTHEKE também

disparadoras

para

outras

pesquisas,

para

outras

ponderações sobre o assunto e, se possível, para professores e professoras repensarem suas práticas de sala de aula e de suas constituições docentes. Que este texto seja também uma provocação aos desejos de professores(as)de

sair

de

seus

estados

comuns,

de

suas

posições endurecidas para compreender a docência de maneira fluida, maleável e, principalmente, em constante devir. Encerro

esta

questionamentos

escrita

que

tive

ao

com

a

começá-la:

mesma em

que

sensação

e

posição

me

encontro nesse momento? O que cabe vir ao texto? Posso dizer que

mesmo

depois

de

ter

escrito

centenas

e

milhares

de

palavras, ainda não sei dar uma resposta direta, mas sei que este texto é parte de mim, do que sou e do que busco ser e a posição

da

qual

eu

falo

é

a

de

um

professor-artista

e

pesquisador.

116 Notas: ¹ Pesquisa em desenvolvimento no curso de Estudos Contemporâneos pela Universidade de Coimbra, sob orientação de José António Marques Moreira e Jociele Lampert. Referências: CORAZZA, Sandra M. Contribuições de Deleuze e Guattari para as pesquisas em educação. In: Revista Digital do LAV. Nº 8, 2012. DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Vol. 3. Rio de Janeiro: Ed. 34. 1996 HAESBAERT, Rogério. Desterritorialização, multiterritorialidade e regionalização. In: Anais da Oficina sobre a Política Nacional de Ordenamento Territorial. Brasília, Ed. MI, 2005. IRWIN, Rita L. (2004). A/r/tography: A Metonymic métissage. In: IRWIN, R.L.; DE COSSON, A. (Orgs.). A/r/thography: rendering self through artsbased living inquiry. Vancouver, BC. Ed. Pacific Educationa Press, 2004. p. 27-38 NUNES, Aline. Apontamentos sobre deslocamentos territoriais e suas ressonâncias na formação de professores. In: Anais do 23º encontro da ANPAP – “Ecossistemas artísticos”. 2014. Disponível em: http://www.anpap.org.br/anais/2014/ANAIS/Comit%C3%AAs/2%20EAV/Aline%20Nunes %20da%20Rosa.pdf Acessado em: 13/01/2015 OLIVEIRA, Thiago. Artistagens, escrileitura e pós-currículo: bate-papo com Sandra Corazza. In: Artifícios. V. 3, n.5. 2013. Disponível em http://www.artificios.ufpa.br/Artigos/Entrevista%20Corazza.pdf Acessado em: 10/02/2015 ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE ROMAGUERA, Alda. .e? e escrita e(m) educação. In: AMORIM, A.C.; MARQUES, D.; DIAS, S.O. (Orgs.) Conexões: Deleuze e vida e fabulação e... Petrópolis: De Petrus; Brasília: CNPq; Campinas: ALB, 2011.

Marcelo Forte http://lattes.cnpq.br/1214662166228179 Doutorando em Estudos Contemporâneos pelo Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX da Universidade de Coimbra. Mestre em Arte e Cultura Visual pelo Programa de Pós-graduação em Arte e Cultura Visual da Universidade Federal de Goiás. Possui licenciatura plena no curso de Artes Visuais - Desenho e Plástica pela Universidade Federal de Santa Maria.

117

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

118

ENTREVISTAS ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE ENTREVISTA COM LUCIMAR BELLO (LB) Organização e realização: Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke Coordenado e idealizado pela Profª. Drª. Jociele Lampert Entrevistadores: Fábio Wosniak (FW) Luciana Finco Mendonça (LFM)

L.F.M.: Lucimar, olhando para nossas escolas, parece que a Educação está mais inclinada a um processo escolarização, de formação para o trabalho, de “formatação” do estudante, do que propriamente

um

processo

de

emancipação

do

sujeito.

Diante

disso, fica a impressão que a Arte não cabe mais nessa escola, nesse tipo de Educação formatada. Minha pergunta seria se a Arte, no espaço escolar, é uma resistência a esse modelo de Educação escolarizante, mas levando em conta que você trabalha muito

com

a

reinvenção

das

palavras,

resignificando-as,

e

pensando a entrevista que fizemos há pouco com Lilian Amaral¹, com quem você tem parcerias em projetos e sabendo que escrevem juntas, minha pergunta mudou, foi atualizada! Seria a Arte uma ação, um modo de reexistência no espaço escolar? Reexistência da Educação, da escola, dos professores e, consequentemente, para uma formação emancipatória dos estudantes? L.B.: Então, isso me provoca muita coisa! Mas vamos lá, neste exercício mesmo de ficar em estado de pesquisa. Costumo dizer que não somos pesquisadores, mas temos que viver em estado-depesquisa. Um estado interrogante o tempo inteiro. O tempo-todo pensando. Creio que nós temos trabalhado a existência muito na dimensão constatatória. “Penso, logo existo.”, vem de Descartes. Mas nós poderíamos acrescentar outras situações. Se pensarmos na artista americana, Bárbara Kruger que tem um trabalho “Compro, logo

existo.”.

Descartes

fala

em

“Penso,

logo

existo.”

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

e

119


REVISTA

APOTHEKE Bárbara

Kruger,

contemporânea,

vem

com

uma

outra

frase

“Compro, logo existo.”. Temos trabalhado a existência neste sentido:

“Eu

existo.”,

nasci,

“Eu

logo

tenho

69

existo.”, anos,

“Eu

logo

sou

pessoa,

existo.”,

“Eu

logo sou

professora, logo existo.”, e essas coisas são do nível da afirmação e da constatação, apenas. Eu constato que “Tenho tanto, logo...”. Isso tem uma lógica e essa lógica é super importante, mas ela comporta um certo percentual, talvez uns 50%, de ilógico. Eu não só penso e logo existo. Eu penso, duvido e não sei se eu existo! Veja, eu já colocaria outras coisas aqui e aqui. O que é existir? Não basta dizer que nasceu, existe.

Não basta dizer: “Sou professora e existo.”.

Tenho dúvidas se sou professora, se sou artista, se estou existindo do jeito que gostaria de existir, de coisas que eu consigo fazer, de coisas que eu não consigo fazer. Então, estou

o

tempo

inteiro

em

uma

engenhoca.

A

vida

é

uma

engenhoca!

120

Os budistas afirmam que a vida é sofrimento. Até concordo com eles,

mas

acho

que

não

é

isso,

discordo

um

pouco

dos

budistas. Por que falo isso? Porque, volta e meia, vou para os sentidos budistas, pois eles me sustentam. Ficar uma semana olhando para a parede, me obriga a colocar um monte de fichas no lugar. Quando estou muito mal, vou lá olhar para a parede e eu consigo, depois de muito desespero, colocar duas ou três fichas no lugar. Então, fico melhor por um tempo. Minha

inquietude

é

muito

grande,

pensando

como

artista-

pesquisadora. Senão, seria profissional de outras áreas, como ficar

apertando

parafusos

e,

assim,

ficar

feliz.

Nós,

artistas-pesquisadores, não apenas apertamos parafusos, porque nós os espanamos muito rápido, ou ele está curto, ou ainda, está muito comprido. Nós temos outras formas de fazer essas engenhocas.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Quando Lilian e eu estávamos trabalhando na Barra Funda, em São

Paulo,

escrevemos

“resistência”,

mas

questionamos

em

seguida: “O que é resistir?”, é o oposto de uma outra palavra. Resistência. Eu vou resistir a uma outra coisa. Mas não é só resistir, tenho que inventar o ato de resistir. Durante muito tempo eu pensei assim, uma pessoa falava uma coisa e eu já discordava - “Não, não é isso!” - é a resistência nesse mesmo lugar (uma oposição imediata). Tem uma coisa ali e eu sou contra aquela coisa, então resisto contra aquela coisa. Porém, acho

que

discordo,

hoje

não

tem

umas

é

mais

assim,

coisinhas

aquela

nela

com

coisa as

da

quais

qual

eu

concordo.

Então, não é um tom de concordo, sim ou não, é sim em alguns aspectos e não em outros aspectos. Não posso falar: “Não, eu discordo de você”, mas você falou umas coisas que concordo, outras que eu tenho que pensar um pouco mais e outras que discordo. Veja que são três instâncias, umas que eu concordo, umas que eu duvido e outras que eu não concordo. E não mais aquele

sim

começamos

a

ou

não.

usar

Trata-se

de

“reexistência”,

“e... porque

e...

e...”.

teríamos

que

Bem, fazer

esse exercício, todos nós, de ficarmos concordando com umas coisas, mas deixando uns buracos, umas frestas com as dúvidas que temos e outras coisas com as quais realmente não fazemos concessão. Por exemplo, se chegar uma pessoa que fale para mim: “Não sei desenhar”, “Você sabe que eu também, volta e meia, não sei”, meu jeito de chegar já é esse. Antes eu falava assim: “Ah, claro que você sabe! É que você desenha de outro jeito!". Hoje eu já chego de outro modo. “Não sei desenhar.”, “Eu também, volta e meia, não sei.”. Apanho ‘pra burro’ para desenhar, porque

antes

me

ensinaram

que

desenho

era

um

jeito

de

desenhar, fui convivendo com outras pessoas e sentindo a mesma sensação de “quase um desenho único, em seu modo de ser”. Atualmente, começo a conversar com a pessoa e ela vai ser ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

121


REVISTA

APOTHEKE acolhida pelo jeito dela, em seu não-saber-desenhar, até que ela pense que tem um outro jeito de desenhar, que ainda não tinha pensado e que talvez interesse à ela. E esse jeito, que eu também não sei como que é, ela é quem vai descobrir. E o que é isso? Talvez seja a opção e o percurso de querer ficar na Educação e na Pesquisa o tempo inteiro que nos dê essa possibilidade do diálogo, não do enfrentamento, mas da reexistência,

de

não

ser

do

contra,

mas

de

ficar

em

“compartilha”, pensando com a pessoa aquilo que ela disse que não sabia fazer e criando juntos, outros modos de saber(es). Então, quando você perguntou sobre a escola hoje, da questão da Arte como disciplina e que isso parece não combinar... Tem uma porção de coisas que não combinam! Aula de Arte com hora marcada. Das sete às oito da manhã, você dá aula de desenho. Tem dia que não dá para desenhar das sete às oito da manhã! Das sete às oito da manhã dispara alguma coisa que só vai acontecer no dia seguinte, então é preciso ter um tempo de acolhida para essa coisa acontecer no dia seguinte. Com isso, fica parecendo que naquele dia você não produziu nada, que você ficou apenas pensando. E aí, cadê o desenho?! O desenho está aqui (apontando para a cabeça), ainda não houve o tempo de brotar para cá (para um papel), porque tem essa engenhoca de cada pessoa, cada aluno tem um tempo. Nós viemos de uma escola que todo mundo tinha que dar uma resposta igual. Havia uma pergunta e todo mundo tinha que dar a mesma resposta. Eu sei na pele e sofri muito, porque eu sempre dava uma resposta diferente. Durante muitos anos, achei que

era

burra.

adolescência,

Na

durante

minha

primeira

muitos

anos,

infância achei

que

e

na tinha

minha uma

coisinha a menos do que as outras pessoas, assim para o lado da burrice, sabe?! Até o dia em que entendi, e algumas pessoas me ajudaram a entender isso, aquilo que durante a minha vida inteira me sustentou, que eu tinha um certo jeito de pensar ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

122


REVISTA

APOTHEKE que

era

diferente.

Por

exemplo,

na

hora

do

recreio,

eu

desenhava no caderno de todo mundo. Todo mundo ia correr, pular, jogar bola e eu ficava desenhando no caderno de todos. Este era um jeito de ser diferente da meninada (que era o jeito

de

correr,

de

pular).

Eu

ficava

quieta,

assim,

por

horas. Daí passava alguém lá do outro lado: “Que tá pensando aí menina? Tá pensando besteira?”, “Não, eu estava olhando as pessoas!”. Eu ficava assim: “Passou uma de cabelo loiro pra lá e de óculos. Agora não passou ninguém. Ah! Passou um carro vermelho!”. Sabe, o tempo inteiro eu ficava super antenada. Até

que

algumas

gostava

da

professoras

palavra,

que

começaram

era

a

perceber

observadora,

que

que

eu

gostava

de

desenhar, então, eu comecei a ser acolhida. Mas porque eu estou dando este meu exemplo? Na verdade, é para dizer que a escola,

ainda

hoje,

quer

que

todo

mundo

responda

a

mesma

pergunta do mesmo jeito. Hoje, sei que existe o pensamento metafórico, mas quando era pequena

não

sabia.

Sempre

fui

pelo

pensamento

metafórico,

mesmo sem saber. Hoje, me sinto muito confortável e não é à toa que virei Artista e Professora de Arte, e não Professora de outro

conteúdo. Nada contra os outros conteúdos, mas a

opção

escolha

de

foi

por

aí.

Aposentei,

mas

continuo

na

pesquisa, continuo na FAEB, continuo na ANPAP, não saio das duas, porque é esse o modo de ficar mais inquieta e, de certa forma,

feliz

no

mundo.

E

continuar

inquieta

dentro

desse

recorte. Essa escola muito programada com notas, com respostas iguais e com temas iguais, expulsa, em muitos momentos, a potência da criação. Desse modo, o grande desafio para ficarmos dentro da escola é criar modos de cumprir as exigências da escola, se tem

nota,

se

tem

que

fazer

diário,

se

tem

que

registrar

conteúdos, se tem que passar de ano, essas coisas todas que a escola

exige,

mas

que

são

importantes.

É

importante

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

que

123


REVISTA

APOTHEKE tenhamos esses limites, mas que possamos achar uns buracos para

essas

outras

reexistência,

de

coisas

contemplar

que

eu

essas

estrutura muito rígida da fôrma²

estava

questões

dizendo dentro

da

dessa

Porque também não dá para

dizer: "Acabe com a escola!", “Tem que fazer Arte fora da escola!”. Não! É dentro da escola, mesmo com esses limites realmente duros e com certa maleabilidade na qual eu construa, não

um

diálogo,

estruturas.

mas

e

sobretudo,

um

questionamento

dessas

Por isso é que nós estamos usando essa palavra

reexistência. Durante

muito

tempo,

fiquei

brava

com

a

palavra

"ré",

o

prefixo "re", porque para nós, em Língua Portuguesa, é “marcha ré”, é dar uma volta para trás; refazer, fazer de novo. Mas não é só fazer de novo, é fazer de novo e de um outro jeito. Então, hoje, não tenho mais essa resistência com a palavra "re", porque não a entendo mais como “marcha ré” ou fazer de novo. É fazer novamente de um outro jeito, ou melhor, nem é fazer de novo, mas fazer sempre de um outro jeito, porque o novo

é

aquilo

que

ainda

não

está

instaurado.

Nós

não

precisamos ter resistência perante o novo. Novo é aquilo que ainda não aconteceu. Então, é um estado de aderir, se falarmos pela filosofia, pensando em Deleuze e em Guattari, e essa corrente

francesa

e

seus

descendentes,

por

exemplo,

Suely

Rolnik e outras pessoas com as quais tenho convivido. Podemos pensar resistência no sentido mais da imanência do que da

transcendência,

porque

a

Educação

se

no

sentido

da

transcendência e muito pouco da imanência, daquilo que ainda não está no mundo. O que é a criação? É aquilo que ainda não existe. fazendo

você

um

semelhante!”,

um

trabalho mas

não

trabalho e

outra

é

igual.

e

pensa:

pessoa É

um

“Nossa, está

fluxo

de

eu

estou

fazendo energia,

tão de

potência, meio próximo, mas não é igual o seu jeito de fazer.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

124


REVISTA

APOTHEKE Fernando Augusto3 tem um trabalho que, volta e meia, nós damos muita

risada,

porque

ele

está

fazendo

o

dele

e

eu

estou

fazendo o meu, e quando vemos, estamos fazendo coisas muito próximas. Ele e o Eriel Araújo4, da UFBA, também trabalham neste fluxo de mínimos do cotidiano. Eles vão trabalhando uma porção de dias, uma porção de dias, uma porção de dias e quando você vê, o trabalho está pronto. Nós temos essa pegada, embora o meu trabalho seja de um jeito, o do Fernando seja de outro e do Eriel seja, ainda, de outro jeito. O Eriel fez fotografias da Baía de Todos os Santos, todo dia da mesma janela fazendo fotografias (não sei por quanto tempo). Ele é químico e colocou essas fotografias dentro de umas caixinhas de vidro. Colocou água do mar e as fotos iam se desfazendo durante

a

exposição.

Era

super

bonito!

Veja,

eu

estava

fotografando um edifício em construção em São Paulo, todo dia da minha janela, e ele lá na Bahia. Aí nós nos encontramos: "Nossa, eu também ficava fotografando!". Agora, o que eu fiz com as fotografias? Uns postais, uma trilogia de vídeo, uns cartemas, ou seja, fiz outro percurso, mas nós dois estávamos fotografando, observando da janela, ele da casa dele, eu da minha casa. Era a mesma atitude, mas o trabalho é outra coisa. A atitude de processo de trabalho é muito próxima. Fernando, escrevendo lá em Vitória, cartas para as pessoas... Todo dia uma frase (não lembro como era direito), mas eu sei, porque tenho uma carta que ele escreveu. Não sei se era uma carta por dia ou cada dia uma carta para um amigo. Mas não era carta-depalavra, era carta-de-linha desenhada! Então, são atitudes de processualidades parecidas, mas os trabalhos, quando vão para o mundo, vão muito diferentes. E tudo isso está aí, dentro do que estamos chamando de reexistência. A Escola precisa abrir lugares para isso, ou seja, propor uma processualidade de trabalho para todos, mas cada um vai achar seu começo e seus percursos. O começo é fotografar todo dia de ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

125


REVISTA

APOTHEKE uma

janela,

mas

cada

um

vai

achar

modos

de

agrupar

suas

fotografias (lá na frente e de jeitos diferentes). Agora, com 50 alunos em uma sala de aula, 800 alunos por semana, eu não sei como isso é possível. Aí, fico desesperada, porque temos uma porção de professores com 800 alunos por semana. Como é que você dá atenção para cada um desses 800 - 1/800, 2/800, 3/800 - por semana? Você multiplica por mês, quantos encontros isso

dá?

Não

sei

como

isso

é

possível.

Então,

algumas

coisas no sistema de ensino que são extremamente malucas e não sei como um professor pode dar conta de 40 ou 50 alunos em sua aula

de

Português,

em

sua

aula

de

Matemática.

Acho

nosso

sistema de ensino perverso! Diante disso, penso que a nossa responsabilidade na Arte acaba sendo

quilométrica,

buraquinhos

para

consigamos alunos,

fazer

mas

que

porque

essa ao

tão

marcas desse seu aluno

5

precisamos

reexistência,

menos

seja

nela

um

exercício

forte

que

achar

fragmentos por

deixe

ano

uns

em com

marcas,

que esses

como

as

que vai lá decalcar as marcas de sal,

decalcar marcas de ferrugem, como eu estava aqui decalcando as marcas da colherzinha de café. Que seja apenas um exercício, mas que seja agudo e firme e fundo, que marque para a vida inteira, já é um ato mínimo de reexistência. Então, não é apenas existir, mas ficar inventando essa existência, compondo essa reexistência, e é no corpo, não é projetar para quando eu tiver tantos anos, quando eu sair, quando eu formar. É aqui e agora! A gente não sabe se tem amanhã. F.W.:

Eu

tenho

duas

perguntas

e

eu

vou

caminhar

pela

Pedagogia. Como criar espaço para as Artes Visuais na formação do pedagogo? E como criar através desse projeto de formação, desse

espaço,

um

estado

de

pertencimento

acerca

conhecimentos das Artes Visuais?

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

dos

126


REVISTA

APOTHEKE L.B.: Há uma coisa bem legal na sua pergunta, com a qual briguei muito tempo, o "como". Brigo muito com as palavras. Briguei, durante uma época muito grande, com o "como", "para quê", "quando", "por quê" e "quê". Todas as perguntas que começavam com estas palavras, brigava com elas. Eu falava: "Como? Assim, assim, assim.",

"Por quê? Por isso, por isso,

por isso.", "O quê? Isso, isso, isso.", "Para quê? Para fulano e para fulana.", "Por quê? Por isso.". Respondi! (as respostas poderiam ser curtas e sem pensamento adiante). Hoje, estou brigando um pouco menos e aquela com a qual menos brigo é com o "como". Então, quando você me pergunta "como", eu já fico mais

à

vontade

(risos).

Talvez,

dessas

palavras

todas,

o

"como" não nos dê a possibilidade direta de responder. "Por quê? Por isso.", com duas palavras eu respondo. "O quê? É isso.".

“O

quê?”

pressupõe

a

resposta

“É”.

Então,

na

Educação, elas são super perigosas, ainda brigo com elas. Mas o "como" instaura a possibilidade de mais conversas.

127

Você me pergunta desse espaço de pertencimento. Eu dei aula na Pedagogia durante um tempo, porque os nossos professores na UFU, em Uberlândia, que davam aula na Licenciatura, eram todos do Departamento de Artes Visuais e não da Pedagogia. Assim, volta e meia, eles nos convidavam. Em uma das vezes em que fui dar aula lá, dei a prova no primeiro dia de aula. Falei assim: “Vocês têm que fazer a prova no último dia, mas eu vou dar o tema da prova hoje.”. Fotocopiei “As Meninas”, de Velázquez, em preto e branco, dei uma cópia para cada aluna: “Vocês vão achar essa imagem colorida, pois ela não é preta e branca. Imprimi pequenininha por questões econômicas, mas ela não é desse tamanho. Vocês vão achar quem fez, quais são as cores, a data, o tamanho, vão achar coisas que não tem nessa fotocópia. A prova vai ser isso! Nós vamos trabalhar o semestre inteiro com “As Meninas”, de Velázquez, que é o nosso alicerce. No dia final,

vocês

vão

fazer

a

prova

sobre

“As

Meninas”,

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

de


REVISTA

APOTHEKE Velázquez. Eu vou fazer algumas perguntas, que agora, é claro, eu não vou fazer, mas nós estudaremos o semestre todo e, ao final, faremos a prova.”. As alunas foram para a coordenação, disseram que eu era uma carrasca, que imagina o Professor de Artes, no primeiro dia, dar prova. Então, eu disse: “Não, eu não dei a prova, eu só dei o motivo da prova. Só dei o motivo da prova que é uma imagem, eu não dei a prova.”. "Ah, mas a gente não vai conseguir!", “Claro que vão conseguir fazer! Vocês têm a prova no primeiro dia, daqui doze aulas vai ser tranquilo, tem tempo físico para fazer isso.”. Até que as pessoas

entenderam

que

aquilo

era

apenas

uma

provocação!

Então, quando você pergunta do espaço... Por que eu dei este exemplo?

Talvez

primeiro

momento,

deslocamentos

e

nós

tivéssemos

pensar

não

como

que

ou

tenhamos

sempre

em

espaço

como

lugar

de

confinamento

que,

no

lugar

de

e

de

ou

confirmação. Em muitos momentos, a Escola é lugar de confinamento e não de deslocamento. Então, esse espaço tem que ter fresta, é espaço com buraco, é espaço inabitado, é espaço que tem que ter desa-locamento, des-a-colocamento, que é colocar de um jeito que não fique-certo, mas que caibam os buracos. E, penso o espaço a ser preenchido. Se eu tenho um círculo, e aí vem das brigas com os desenhos mimeografados, sendo que agora nós temos os desenhos do computador, para preencher com amarelo, vermelho, que eu fico "p" da vida, vejo os meus netos lá, volte e meia, com os programinhas desses e penso: “Ainda existe isso? Pelo amor de Deus! Só mudaram as mídias, mas a mentalidade é a mesma!”.

Aí eu vou lá e balanço a mão deles para sair do

lugar: "Não Vovó...", "É para sair mesmo! Sua Professora tem que aprender que tem que sair do lugar!", pois se todo mundo for aprender que espaço é só habitar aqui dentro, nós estamos perdidos. Tem um monte de coisas que são assim, mas a potência da criação não é só isso, é também isso que vaza para fora, ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

128


REVISTA

APOTHEKE porque, para começar, pense isso aqui (apontando um círculo desenhado no diário), isso aqui já é para lá, não para cá. Se eu chamar isso aqui "dentro", aqui é "fora". Mas eu posso chamar

aqui

"dentro"

e

posso

chamar

aqui

"fora",

posso

inverter isso. Isso aqui é limite, então, o espaço é sempre limite, que tem para cá e para lá, para dentro e para fora. E é

sempre

esse

dentro

e

fora,

em

relação.

Com

isso,

fico

pensando no espaço como a “ferida” trabalhada por Deleuze. Ele fala que a ferida é a camadinha, e o que tem daqui para dentro é o machucado, daqui para fora é o que não está machucado. Então, interessa para ele essa linha de limite da ferida, pois ela comporta o machucado que está aqui e o não machucado que está lá. É uma linhazinha tênue. O espaço, para mim, é essa linhazinha tênue. Quando você pergunta sobre o espaço das Artes Visuais dentro da

Pedagogia.

Como

é

isso?

Instaurar

aquela

conversa

que

estávamos tendo no começo, essa linha tênue, do sabido e do não sabido, entre... Vamos pensar em termos bem concretos em Artes Visuais... Vermelho dentro e fora branco. Tem uma linha que daqui para cá é vermelha, daqui para cá é não-vermelha. Daqui para cá é branco, daqui para cá é vermelho. Daqui para cá é uma cor, daqui para cá vou chamar de todas as cores, ou ausência de cor, e se eu pegar pigmentos, se eu for para cor luz, etc, posso fazer "n" exercícios, certo?! Mas é relevante sempre

pensarmos

essa

borda

que

comporta

uma

coisa

e

não

comporta outra, estando fora dela, mas que a constitui. Não há modos de pensarmos o espaço apenas com o espaço ocupado, que só existe, porque o que está para fora dele não está ocupado. É

uma

relação

de

interfaces.

Não

é

interface

igual,

é

interface física, para cá é vermelho, para fora é branco. Mas eu só sei que aqui dentro é vermelho, porque tem essa borda entre

vermelho

e

branco,

tem

esse

limite,

essa

linhazinha

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

129


REVISTA

APOTHEKE tênue, tem um espaço ocupado e um espaço não ocupado que são coexistentes, que são cúmplices. Tinha uma conversa há uns anos atrás, quando eu participava da ANPED, depois acabei me desligando, não pude participar mais de “n” coisas, mas tinha essa conversa, talvez há uns 30 ou 20 anos, de que a Pedagogia estava sem conteúdo, sem objeto; que a Pedagogia precisava ter o conteúdo, porque os professores da Pedagogia acolhiam alunos de todos os cursos e não tinham objeto. Eu ficava escutando aquilo e ficava assim: “Gente, não acho que é assim!”, sempre achava que não era assim. “Como é que você pode ser um pedagogo e não ter objeto? Que construção mais

esquisita

é

essa?”,

“Ah,

porque

eu

fico

prestando

serviço para as outras áreas!”. Com isso, eu ficava pensando: "Prestando serviço? Também não é assim". Até que um dia, fui começando a achar que eu é que estava fora do lugar. E falei: "Vou sair, porque não dá mais.". Qual é o recorte de um pedagogo? Muito “cretinamente” vou colocá-lo dentro, como um cúmplice, da Educação, um cúmplice de ativador de distâncias educativas, vamos chamar assim. Isso é falar que não tem conteúdo? Lá você está enfiado de corpo, alma, pé, de tudo o que quiser, tudo envolto, tudo junto, está enfiado dentro do processo da Educação. O que fazia as pessoas acharem

que

a

Pedagogia

achavam

que

Matemática

não

tinha

tinha

um

conteúdo?

conteúdo,

Talvez

porque

Português

é

um

conteúdo, disciplinarizavam formas em uma porção de pedacinhos e esqueciam que tem uma pessoa junto nessa história. O “como”, que você está perguntando sobre o espaço das Artes Visuais na Pedagogia,

tem

a

ver

com

essas

relações

de

trabalhar

a

cumplicidade com as pessoas, e não só com o espaço de Artes Visuais.

São

instaurando

os

espaços

questões

nas

das pessoas

Artes que,

Visuais por

sua

que

estão

vez,

estão

ativando suas reexistências. Parece que estou enrolando, mas estou tentando dar nó em uma rede que tem muitos nós, porque ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

130


REVISTA

APOTHEKE também não dá para ficar respondendo, sem fazer conexões com as coisas que vão passando na cabeça, certo?! Não podemos falar

em

espaços

apenas (mais

ocupar

do

espaços,

que

mas

ocupá-los).

de

Ou,

como

transgredir

também,

instaurar

possibilidades de potencializar espaços, mais do que constatar espaços. Nós estamos constatando muito o espaço, estamos muito na

fôrma.

colocam

A

muito

sociedade na

cultural,

fôrma.

as

Precisamos

questões

sociais,

nos

pensar,

des-instalar

voo

havia

e

habitar as “fórmas”. Outro

dia,

estava

lendo

durante

um

que

não

sei

quantas pessoas na fila para comprar um iPhone 6. Puxa, todo mundo tem que ter um iPhone 6?! Eu não quero ter, mas também não tenho idade para ter. Por que, de repente, tem um apelo para

que

as

pessoas

tenham

aquela

tecnologia

nova?

Porque

daqui a pouquinho já vai sair o 7! Tem que ter o 6, mas já vai sair o 7, porque o 3 já não serve mais, porque já está tão atrasado com esse mundo virtual. É isso o que nos vendem. Eu conheço um monte de gente que não tem nenhum iPhone e que consegue assistir o mundo. Conheço um monte de gente que nem telefone tem! Estava em uma aula ontem, com uma colega, e todo mundo disse: "Ah, vamos criar um grupo pelo WhatsApp?", daí ela falou: "Eu não tenho.". Ela pegou o celularzinho, assim, daqueles bem antigos: “Mas o meu tem lanterna!”, e botou a lanterna na cara de todo mundo (risos). Ela é novinha, tem uns trinta e poucos anos, é professora, e foi ótima, porque ela deu uma lanternada na cara de todo mundo e disse: "WhatsApp eu não tenho. Se quiser a gente monta o grupo, mas eu não vou ter o celular, nem vou comprar para poder baixar esse negócio, porque isso não me interessa.”. E achei o máximo, porque não precisa todo mundo ter. Isso é uma fôrma de consumo que querem nos enfiar. Há pessoas que não querem ter e têm direito de não ter, e podem sustentar o seu não-querer. E elas não serão menos gente porque não têm. Mas a fôrma do consumo, a fôrma do ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

131


REVISTA

APOTHEKE social,

a

fôrma

da

moda,

são

"n"

fôrmas.

Você

precisa

da

beleza, agora não pode ter ruga, tem que esticar tudo, bota o botox e bota não sei o quê, não sei “os quês”. Não pode ficar doente.

Hoje,

nós

vemos

esportistas

fazendo

propaganda

de

remédio, dizendo que você não pode ter uma dor de cabeça, seu organismo não pode dizer que você tem uma alergia, toma o remédio antes para não ter a alergia. Você tem "n" situações que nos enfiam em "n" fôrmas e, com isso, nós perdemos a “fórma”. Algumas fôrmas são necessárias, por exemplo, se eu quiser fazer bolo, se não cozinhar em uma fôrma antes de botar no forno, vai estragar o fogão, não vai virar bolo, aí eu preciso da fôrma. Eu preciso de limite, porque se eu não tiver limite, posso chegar aqui e passar em cima de você. Preciso da fôrma, mas eu preciso da “fórma”. E nós estamos ficando muito carentes de “fórma” e excessivamente enformados. Outra coisa que quero dizer, o acento diferencial caiu, não é?!. Então, quando estou escrevendo e para fazer com que as pessoas

entendam

que

estou

dizendo

forma,

com

acento

circunflexo, e forma, com acento agudo, preciso escrever uma notinha de rodapé e explicar: “Eu sei que caiu, mas eu preciso do acento, porque eu não quero que a pessoa leia do jeito que ela quiser, conforme a norma. Aqui, estou falando de fôrma, com acento circunflexo, e aqui eu estou falando de ‘fórma’, com

acento

posso

me

agudo.”.

dar

o

Ando

direito

falando: de

usar

“Como os

sou

muito

acentos.”

antiga,

(risos).

As

pessoas me corrigiam, iam lá e tiravam os acentos, mas eu preciso deles, porque estou falando de outro jeito e a pessoa pode ler forma (ô) ou forma (ó) se eu não usar o circunflexo. E, para mim, é diferente fôrma de “fórma”. Bem, mas você estava falando de pertencimento. Espaço tem a ver com pertencimento, tanto no sentido de que eu tenho que pertencer à alguma coisa, como ter que escapar dessa alguma coisa. E nós vivemos em fluxo. Hoje, eu estou aqui com vocês, ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

132


REVISTA

APOTHEKE nós estamos em uma rede de produção de trabalho. Daqui duas horas, nós estaremos em uma outra rede, noutro grupo que se conecta. E falo que nós vivemos em comunidades, certo?! Tem uma

hora

que

é

a

comunidade

familiar:

“Não

li

seu

e-mail

ontem, porque meu marido estava em casa e não pude responder, porque

precisei

dormir

para

acordar

cedo.”.

Essa

é

a

comunidade família. Agora mesmo, comunidade de pesquisa. Daqui a pouquinho, comunidade dos “comentes”, porque vamos almoçar. Daqui a pouquinho, comunidade saúde, eu vou para o hospital e fico lá internada. Nós vivemos em fluxos! Como é que podemos falar de um pertencimento único? Não tem jeito, porque cada hora você está agregado de outro jeito. Se nós estamos falando de Pedagogia, estamos falando de Educação o tempo inteiro. É o curso que escolhe como temática central o que eu penso ou não, mas eu também posso ter dúvidas. Educar-se! Não é só educar o outro, é educar-se coletivamente, permanentemente, todo mundo. Como professores, pensamos que vamos dar aula, nós receberemos muito mais do que “vamos dar”. Se você prepara um conteúdo, chega

o

conteúdo

amplia,

multiplica.

Você

pensa

assim:

“Hoje vou por este caminho.”, chega lá as pessoas te olham de um outro jeito, daí você fala: “Não! Não vou mais por esse caminho.”, elas estão dando outras trajetórias, que você vai acolhendo e quando vê, já fazemos outros fluxos. O pertencimento, o pertencer, carrega uma necessidade, mas ao mesmo

tempo

justamente,

deixa porque

escapar

coisas

escaparam.

que

Passam

a

passam

a

pertencer,

pertencer,

porque

o

coletivo criou esses escapes. Então, espaço e pertencimento tem a ver com “fórma” e com fôrma, e estamos falando de Artes Visuais.

Antes,

ampliado,

desse

marcas,

de

nós

falamos

trabalho

coisas

que

mínimas.

de está

Coletar

desenho, no

nesse

mundo,

neblina,

de

sentido decalcar

coletar

água,

fazer fotografia e revelar maravilhosamente bem, para depois botar água do mar, deixar isso lá e a água do mar ir corroendo ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

133


REVISTA

APOTHEKE essa fotografia. Me lembro que eram umas caixinhas, com fotos de 10x15cm. Cada uma tinha um tanto de água, umas tinham mais, outras tinham menos. Assim, a que tinha menos água corroía durante um tempo, a que tinha mais água corroía durante mais tempo, porque a água é salgada e ele é químico - estamos falando novamente do trabalho do Eriel. Ele sabia o que estava fazendo. Ele não estava fazendo um trabalho ligeiro, mas um trabalho que tem a ver com poluição, tem a ver com a Baía de Todos os Santos que não é poluída, tem a ver com a janela da casa dele, tem a ver com o passante, tem a ver com o turista, tem a ver com a química, tem a ver com as Artes Visuais, tem a ver

com

fazendo

ficar uma

durante fotografia

365

dias

para

(eu depois

acho),

todos

colocar

na

os

dias,

água

e

desmanchar. O que é isso? Ficar um ano inteiro fazendo uma coleção de instantes, depois coloca-los na água para que ela desmanche esses instantes? Que raciocínio é esse? Do frágil, do que não dura, do efêmero, mas também do programinha de um ano,

desse

desmontado,

limite esse

formal,

informal,

estruturalista, esse

diluente,

para esse

depois

ser

frágil,

que

vira “uma outra coisa”. Não sei o que virou este trabalho, hoje. Não sei onde estão as caixinhas, mas fiquei curiosa agora que voltei a pensar no trabalho. F.W.: Lucimar, você diz o seguinte “A Arte é manifestação de um sujeito que se faz ver e nos mostra, por sua produção, uma sujeitidade, uma pessoalidade e uma coletividade”, isso está no “Inquietações e Mudanças no Ensino da Arte”, de Ana Mae Barbosa. A partir disso, como articular propostas ou projetos educativos em Artes Visuais na escola atual, que permita ou possibilite aos sujeitos a compreensão de si no mundo? E que “caminhos”

você

instalaria

como

relevantes

para

que

esse

processo tenha iniciativa nas escolas de Educação Básica? Eu

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

134


REVISTA

APOTHEKE tenho me debatido sobre essa compreensão de si, sobre essa compreensão do mundo. L.B.: Só Educação Básica você está pensando? F.W.: Sim, porque estou focando sobre o Pedagogo. L.B.: Certo! Eu perguntei isso, porque essas nomenclaturas e definições

sobre

Educação

Básica

podem

ser

extremamente

amplas. Para mim, vai além da Básica, porque diz respeito a um tempo físico muito grande. Você considera desde os 5 ou 6 anos... é muito tempo físico. É muita diferença, não apenas em idades cronológicas, mas em idades mentais, criadoras, para colocarmos em um bloco só. Então, eu estava tentando, para pensar

a

resposta,

fazer

esse

exercício

de

criar

alguns

campos.

135 F.W.: Neste caso, podemos pensar apenas na Educação Infantil. L.B.:

Melhor!

Porque

a

Educação

Básica

é

muito

longa.

O

universo de interesse, o universo de um adolescente, de um pré-adolescente, é muito diferente de uma criança de 5 anos. É a mesma pessoa, mas em distâncias quilométricas entre modos de ser, entre modos de existir, modos de pensar, mesmo de preparo físico.

Um

adolescente

está

em

um

fluxo

completamente

diferente de uma criança de 3 ou 4 anos. Então, vamos pensar a Educação

Infantil

para

essa

sua

pergunta.

Façamos

este

“recortezinho”, até mesmo para fazermos esse exercício. Quando você estava aí lendo coisas que eu escrevi... volta apenas aquelas três palavrinhas... F.W.: Sujeitidade, pessoalidade e coletividade. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE L.B.: Isso! Então, quando você fala da compreensão de si e do mundo, isso me remete à Virgínia Kastrup. Ela é uma pessoa que me

deu

um

alicerce

muito

grande

para

pensar

a

atenção.

Virgínia (não sei se ela fez o doutorado) no Núcleo de Estudos da Subjetividade, volta e meia está por lá, e a Suely Rolnik tem convidado a Virgínia para muitas falas. Acabei ficando amiga da Virgínia e foi ela que me deu esse parâmetro de que não existe desatenção. Eu nunca tinha pensado nisso. Primeiro, ela pensa invenção como cognição. Acho isso legal. A invenção é

cognição,

isso

também

foi

a

Virgínia

que

me

ensinou.

Invenção e cognição estão juntos, pregados. Não é um depender do outro, não. É pregado! Não estou falando de um inventar metafórico. Estou falando de invenção e conhecimento pregados. Cognição junto com invenção. A invenção de si no mundo, e ela diz que não existe desatento, quando eu estou aqui mexendo o meu suco e parece que eu não estou vendo você, estou aqui mexendo o meu suco, mas pensando sobre um texto que eu quero escrever de como fazer um suco de hortelã com abacaxi que seja no ponto, nem muito abacaxi, nem pouca hortelã, nem muito gelo, nem muito açúcar. Quatro coisas. Como eu misturo essas quatro

coisas

goste?

Estou

para aqui

dar

um

pensando

suco

que

isso,

a

vocês

maioria estão

das aí

pessoas falando.

Parece que eu não estou escutando vocês, e não estou mesmo, porque minha atenção não está na pergunta que você me fez, mas no suco e no que eu quero escrever, em como juntar essas quatro coisas e como fazer um suco que a maioria das pessoas goste. Estou desatenta aqui. Eu despluguei de “um lá”, para plugar “num aqui, agora, já”. Em muitos momentos, na sala de aula e com os grupos coletivos, parece que uma pessoa está desatenta, porque ela está com sua atenção voltada para outro foco de interesse. Então, na sala de

aula,

considerando

que

estamos

falando

do

público

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

da

136


REVISTA

APOTHEKE Educação Infantil, passa muito por aí. As crianças dessa faixa etária estão muito mais ligadas às descobertas do mundo, muito mais à “fórma” do que à fôrma. Ultimamente, nós estamos muito mais enformatados do que a relação da “fórma” que as crianças estão

descobrindo

no

mundo.

Primeiro,

sai

daquele

plano

bidimensional e começa a engatinhar. Está na cama, está no colo da mãe, está deitada aqui e começa a descobrir as coisas. Quando começa a engatinhar, começa a pegar nas pernas das cadeiras, começa a andar, começa a descobrir que o mundo é vertical. Aí começa a descobrir que o mundo é redondo. E que ver daqui até ali... anda... e o ali já sumiu, porque tem um outro ali para frente. Vai descobrir a linha do horizonte. Vai descobrindo que tem uma porção de coisas... que o cheiro da mãe não é o mesmo no mesmo dia, que o comportamento do colega não é o mesmo do dia anterior. Vai descobrindo o mundo, vai descobrindo,

vai

descobrindo,

até

entender

que

tem

uma

complexidade e não apenas uma linha reta e uma linha vertical. Então, essa descoberta leva um tempo. As crianças vêm dessas descobertas quando chegam na e da escola. Começam a descobrir a sexualidade. Alguém dizia, não me lembro agora quem é o teórico que falava isso, que as crianças de 3 e 4 anos são os pequenos masturbadores do mundo. A primeira vez que eu vi isso, disse assim: “Cruz-credo!”, mas é mesmo. É quando as crianças começam a descobrir que mexer no sexo dá um tesão e isso traz uma possibilidade desconhecida até então. “Mas como? Já?”, “Já, não! A criança já nasceu, já existe!”. É preciso dar a existência para ela, não tem que esperar ela querer-reexistir. Nós, em nossas “adultidades”, é que estamos pensando em não se tratar de um ser humano, pensando uma criança como uma miniatura. Trata-se de uma pessoa-pequena que existe, já nasceu,

a

sexualidade

está

ali,

nasceu

com

ela,

a

sexualidade nela existe. Não precisa esperar 10 anos ou 11 anos para alguém mexer no seu sexo para lembrar que existe. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

137


REVISTA

APOTHEKE Opa! Isso seria muito tacanha e muito canalha para consigo e para

com

o

emocionais,

outro.

também,

em

todos

ancorando

separados,

Então, os

a

muito

essas

campos,

criação.

pelo

relações idades

Corpo

contrário,

e

e

são

todas,

físicas,

momentos

criação

estão,

não

constituintes

estão de

Uma

Pessoa. Quando Virgínia fala sobre invenção de si no mundo, ela não está falando somente de um comportamento e de uma atitude. Ela está

falando

da

permanentemente,

consigo

compartilhadas. invenção

vai

pessoa

É

e

que

se

os

outros.

com

corpo-inteiro.

daqui

para

cá.”.

A

Não

inventa-inteira,

São

inteirezas

para

invenção

sou

dizer: eu

com

“A essa

confusão inteira, o tempo todo. É uma grande proliferação e é permanente. nessas

Pensar

crianças

na

da

escola,

Educação

pensar

nesse

Infantil

sujeito,

(nesse

pensar

recorte

que

fizemos) - se chamarmos ao invés de sujeitos, mas nominarmos como sujeitos-numa-criança - e colocá-los neste universo de descoberta do mundo e de mundos, temos que possibilitar para eles, o tempo todo, descobertas de mundos na Arte e na Vida. Eu

não

sou

professora

dessa

faixa

etária,

nunca

fui,

mas

adoraria ser hoje. Não serei, porque também adoro viajar e acharia

um

viajar

a

assume

se

desrespeito

toda

hora;

você

vai

assumir

que

você

escapar,

um iria

mas

grupo

sabendo

escapar. eu

que

Então,

adoraria!

iria

não

Sempre

se fui

professora, desde 1966. Naquela época, de quarta séria para cima

até

o

mestrado,

no

qual

fui

orientadora.

Depois,

aposentei e estou fora do processo oficial da Educação. Essa faixa

que

nós

estamos

considerando

da

Escola

Básica,

reportando às séries iniciais, percebo que a potência está muito viva, que o atrevimento está muito possível. As crianças são muito levadas, são muito espertas, são muito falantes, elas atravessam o tempo inteiro e nós ficamos querendo enfiálas em outros lugares. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

138


REVISTA

APOTHEKE Outro

dia,

vi

uma

aula

de

informática

para

um

grupo

de

crianças entre 4 e 5 anos. E qual era a aula de informática? Um

telão

passando

uma

imagem

daqueles

porquinhos

cor-de-

rosa... Pepa, e que agora em todos os lugares tem Pepa. Não aguento

mais

ver

Pepa.

Em

tudo

quanto

é

lugar

que

vou...

pequeno, grande, de plástico, fofo, mole, duro... não precisa, não é?! Não precisa. Nessa aula de informática, as crianças estavam todas sentadas no chão e todos olhando a Pepa Pig. Isso é aula de informática? Ah, faz favor! Deu uma vontade, mas não posso falar, porque não estou na escola. Eu só passei por lá e não tenho direito de falar nada, mas me deu uma vontade de falar assim: “Gente, não faz isso não. Não chama isso de aula de informática. Isso não é aula de informática.”. Lá no plano da escola estava escrito... E a professora que nos guiava

dizia:

“Agora

a

gente

vai

passar

na

aula

de

informática!”. Eu ficava arrepiada, queria ir embora da escola correndo, porque isso é uma mentira para as crianças, isso é uma mentira para os pais das crianças, isso é uma fôrma muito cômoda de puxar para o que poderíamos chamar de des-educação. “Agora, nós vamos ver um vídeo.”, pelo menos sejam honestos. “Vamos ver a Pepa Pig.”, dá nome para a coisa e pronto e acabou! Que, aliás, nem precisa passar na escola, porque as crianças

veem

demais,

em

todos

os

lugares.

Na

escola

deveriam ver e viver outras coisas, camadas de vida-inventiva. E perceba que era uma escola dita “boa”. Não era uma escola qualquer. Era uma escola renomada, tanto que seria muito mais interessante,

penso

eu,

que

as

crianças

estivessem

lá...

“Vamos desenhar no espaço, vamos pular!”, vamos fazer alguma coisa que pelo menos os corpos estivessem em sua potência de criação, do que ficar sentado vendo algo que elas já estão cansadas

de

ver.

Ou

ficar

reproduzindo

o

alfabeto

em

inglês, que se escuta em algum desenho, porque também tem isso, um desenho que fica ensinando a mesmice. Tenho neto ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

139


REVISTA

APOTHEKE pequeno, estou convivendo com essas coisas, na escola e na família. Outro dia, minha neta de 12 anos tinha que fazer uma “crítica literária”. Ah, eu olhei aquilo e perguntei para ela o que era uma crítica literária: “Ah, vovó, é pra gente ler um texto e escrever o que a gente entendeu.”. Falei: “Ai, que dó.”, é muito peso para uma criança de 12 anos. Não mente para ela, porque ela não está fazendo uma crítica literária. Menos é mais! E a escola tem que ser menos para ser mais! Nós estamos muito cooptados por essas fôrmas e reproduzindo as fôrmas, sem pensar na potência e nas “fórmas”. Para se trabalhar com crianças, preciso saber o que são as crianças

e,

acho,

um

curso

de

Pedagogia

faz

isso,

porque

quando lá se dizia que não tinha objeto, eu ficava assustada: “Como

não

tem

objeto?

Estão

sem

conteúdos?

Os

cursos

de

Pedagogia estão sem conteúdos?”. Os conteúdos são as pessoas educáveis, daí falar que estão sem conteúdo... “Estão sem as pessoas? Eu não estou entendendo!”. Mas era desse tipo de conteúdo

que

estava

tantinho

para

cumprir,

Português

sendo

cumprir, esse

dito,

Artes

Matemática tantinho

tem para

Visuais esse

tem

esse

tantinho

para

cumprir,

e

a

pessoa

inteira? Quando você pergunta sobre a relação, nas Artes Visuais, da sujeitidade,

pessoalidade

e

coletividade,

me

lembro

de

Deleuze, de Guattari, da Suely Rolnik. Penso em um sujeito que fica

permanentemente

se

inventando.

Não

um

sujeito-dado

ou

dotado disso ou daquilo. Desse modo, a sujeitidade seria uma tentativa de não ficar no sujeito, mas voltar o sujeito para com sua idade, um contexto, uma ambiência, sua etnia, suas ancestralidades.

Hoje,

colocaria

no

plural,

um

“s”

entre

parênteses – sujeitidade(s). Isso era a tentativa de já pensar um

sujeito

permanentemente

em

estado

de

invenção.

Permanentemente, independente de ser criança, ser adulto, ser ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

140


REVISTA

APOTHEKE professor, ser aluno, ser Educação Básica, se esse recorte da Educação Infantil, independe o instante da vida. Pessoalidade, isso foi uma conversa com o Marcos Vilella, que cria

essa

palavra

para

dizer

do

estado

de

ser

pessoa,

permanentemente se inventando. Eu não sou uma pessoa que fica pronta, ninguém fica pronto! Não tem jeito de ficar pronto, nem jeito de acabar. Dizem que quando morremos, acabamos. Mas isso apenas fisicamente, porque as nossas coisas continuam a menos que queimem tudo. Mesmo assim viramos cinza. Então, não tem jeito de queimar tudo, porque algumas pessoas já levaram algumas coisas que são suas, não tem jeito de destruir, nem que queimem. Podem queimar tudo aquilo que está comigo, mas aquelas outras coisas - em nosso caso, por exemplo, nós que escrevemos, os textos andam - como é que vão pegar tudo o que você escreveu e que alguém copiou, que alguém memorizou? Não tem jeito, não acaba. Nós, pessoas, não acabamos. As pessoas não acabam. Elas estão sempre “em-se-fazendo”. Isso parece um português

esquisito,

“em-se-fazendo”,

mas

não

tem

jeito

de

falar diferente. A pessoa que vai “se-fazendo”, não é a que vai “si fazendo”. Uma pessoa que “se faz”, não é a que “si faz”. Uma pessoa “em se fazendo”, não é “em si fazendo”. É “em se”, ela pode fazer, eu posso fazer; não é fazendo “em si mesma”. E a coletividade é esse trabalho colaborativo, ninguém existe sozinho. É colaborativo, compartilhado. Lilian6 e eu, usamos “compartrilhas”. Me lembro que estava escrevendo um texto para a ANPAP, há dois anos atrás, e que escrevemos juntas. Depois, fomos para as agências de fomento, tentar conseguir passagem. Cada uma fez seu texto. Nós fizemos uma introdução conjunta, mas com um miolo completamente diferente. A introdução era bem pequenininha e igual, um miolo muito diferente (cada uma de nós com seus percursos), e uma conclusão bem pequenininha, também igual, pois construímos juntas o começo e o final (em ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

141


REVISTA

APOTHEKE muitas horas de trabalhos, conversas e inquietações). Na hora de apresentar, o fizemos também juntas. “Eu falo isso, você fala aquilo.”. Nós fizemos uma apresentação juntas, porque era “compartrilhar” o texto. Nós escrevemos juntas, pedimos para nos colocarem uma depois da outra durante a apresentação e, na hora de falar, nós somamos o tempo das duas e vivemos juntas esse estado-de pesquisa-em ato, mesma situação na ANPAP, que é uma associação de pesquisadores-em arte. Ao invés de ser uma e outra,

fomos

pessoa,

nós

as

duas-juntas.

juntamos

em

Os

quarenta

vinte e

minutos

apresentamos

para

cada

com-juntas

(separado). Por que eu estou dando este exemplo? Porque essas frestas,

seja

no

meu

plano

de

aula,

numa

prestação

de

contas, no papel “oficial” com suas exigências, eu coloco que os alunos preencheram os papéis com tinta vermelha, agora, “como”

vou

fazer

isso...

deixa

acontecer

na

aula.

Se

se

borrarem inteiros de vermelho, leva uma tinta lavável e vai tomar banho, passa pano, limpa, mas eu não vou escrever isso. Isso não vai ser legal escrever, porque vão dizer que não estou dando aula. A tinta está no corpo, porque não está no papel. Não! A tinta está no corpo, porque é no corpo, não é no papel. Isso é a nossa visão. Contudo, para o outro lá, tem que ser no papel, então nós escrevemos que só colocamos tinta no papel. Claro que não é tão simples assim, é bem mais complexo, mas é só para termos claro a que estou me referindo. O suporte, que é um cúmplice, é o corpo. Mas eu escrevo que foi o papel. As pessoas querem medidas de 30x40cm, eu coloco lá tudo o que eles querem. E aceitam! Assim, sou um ótimo professor, sou bem avaliado, eu preencho tudo! Mas, no fundo, nada nem 30cm, nem 40cm, nem tinha papel, tinha folha. Coube todo mundo, foi aquela meleca total, mas todo mundo ficou bem. E

é

nessa

relação

que

penso

a

atenção,

trabalhada

pela

Virgínia Kastrup. Não é só ela que está pensando a atenção e a invenção de si, mas a maneira como ela escreve, trouxe, para ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

142


REVISTA

APOTHEKE mim, muito aconchego de entender a invenção de si no mundo. Mas eu também colocaria a invenção de si e de mundos outros. Lembra quando eu estava falando das comunidades? Que uma hora eu sou a comunidade de família, outra hora eu sou a comunidade hospitalar. Como é que eu agito a invenção na minha comunidade hospitalar, na minha comunidade familiar, na minha comunidade mestrando, invenção?

esse Como

estado é

permanentemente

permanentemente,

nós

de

pesquisa,

agitamos

os

de

mínimos

grãozinhos no lugar onde nós estamos? Nesse

dia

em

que

passei

na

escola

e

vi

a

aula

de

informática, não tive jeito de agitar nada e isso me afeta até hoje. Qualquer dia, sou capaz de voltar lá, querer visitar a Escola novamente. Tem horas que não dá para você atuar naquele lugar, isso é extremamente angustiante, porque nós teríamos que

atuar,

ainda

mais

quando

você

que

em

um

espaço

denominado de Educação, a compartilha e a potência da criação estão esvaindo. Uma

outra

143

coisa

Infantil,

é

a

crianças

sabem

que

talvez

escuta. propor

falte

Temos e

que

as

na

escola,

escutar

crianças

as têm

na

Educação

crianças. umas

As

coisas

deliciosas, quer ver? Tenho um sobrinho, hoje já é grande, mas quando pequeninho, dizia duas coisas, aliás vou contar três: “Eu

não

gosto

de

frango

com

caroço,

nem

de

leite

com

semente.”. Frango com caroço o que é? Frango com osso. E leite com semente? É leite com nata. Mas não é lindo?! Poxa, você escuta isso de uma criança e pensa: “Ah, eu vou desenhar um frango com caroço!”. Se ele vai desenhar frango ou não frango, com caroço ou sem caroço, você tem que ver o que ele entende dessa junção de palavras e vai fazer o desenho. Escutar isso em uma aula é um prato cheio para colocá-los para desenhar. E o que vai sair? Eu não sei, eles têm 5 anos, 6 anos, eu não sei o que “vai sair”, mas ele me deu essa dica. Aí tem um outro

exemplo.

Ele

estudava

o

vencimento

das

coisas

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

e


REVISTA

APOTHEKE perguntou: “Todas as coisas vencem?”,

aprendeu na escola que

as coisas têm validade. Chegou em casa, na hora da refeição e disse: “As coisas vencem.”. “Ah, pão vence? A pasta de dentes vence?”, “Isso vence?”, “Vence.”, “Isso vence?”, “Vence.”, a água vence?”, né?!”...

A

avó

“Vence.”, tinha

“E

“Ah, então a vovó também venceu,

morrido

e

“ido

para

o

céu”.

Não

é

demais?! Então, “A vovó também venceu, não é?!”, poxa, se uma criança fala isso em uma aula, eu vou desenhar a avó que venceu, porque é muito lindo! E, então, a vó morreu e ele continua: “Cadê a porta do céu?”, “Como assim, cadê a porta do céu?”, “Ah, disseram que a vovó morreu, foi para o céu, mas céu

não

tem

desenhar

a

porta!”,

porta

então

do

céu?”.

você

desenha

Imagina

que

a

porta:

desenhos

“Vamos

lindos

a

partir da porta do céu? Há pouca escuta de um pensamento metafórico. E que, às vezes, parece

que

enquanto

você

está

trabalhando

um

determinado

conteúdo, a criança fala uma dessas e parece que isso é de fora, que ela está desatenta. Que nada! Ela está no que ela viveu e está nela acesa, está dando uma pista do cotidiano dela, de alguma coisa que ela associou, de alguma fresta que brotou e nós não acolhemos esse brotar, esse brotamento. A Virgínia

Kastrup

maravilhosa!

As

trabalha crianças

a têm

des-atenção esse

de

pensamento

uma

forma

metafórico

extremamente ativado, de uma forma potente, intensa e linda! Notas 1

Lilian do Amaral Nunes é Artista Visual, Pesquisadora, Curadora Independente e Professora, vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Arte e Cultura Visual, Faculdade de Artes Visuais, da Universidade Federal de Goiás. 2 Conforme o Novo Acordo Ortográfico, de janeiro de 2009, o acento circunflexo diferencial para o vocábulo fôrma passou a ter uso facultativo. Assim, podemos escrever fôrma ou forma (ô). Algumas pessoas defendem a continuação do uso desse acento diferencial, mas outros acreditam que é possível fazer a diferenciação pelo contexto. Desse modo, apenas no caso de gerar ambiguidade no texto é que o acento deve ser utilizado. Nesta entrevista, decidimos manter a utilização do acento para diferenciarmos os vocábulos fôrma de forma (ó), tendo em vista o próprio sentido desse modo

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

144


REVISTA

APOTHEKE de escrita para a Artista Professora Lucimar Bello. Adiante, ela mesmo explica os motivos desse uso. 3 Fernando Augusto dos Santos Neto, Artista e Professor do Departamento de Artes Visuais, da Universidade Federal do Espírito Santo. 4 Eriel de Araújo Santos, Artista e Professor do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais, da Escola de Belas Artes, da Universidade Federal da Bahia. 5 Referindo-se à prática artística de Leandro Serpa, mestrando do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais/ UDESC, durante os anos de 2013 e 2015, sob orientação da Profª Drª Jociele Lampert. 6 Lilian do Amaral Nunes.

145

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE ENTREVISTA COM ANA MAE BARBOSA (AMB)¹ Organização e realização: Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke Coordenado e idealizado pela Prof.ª Dr.ª Jociele Lampert Entrevistadora: Tharciana Goulart da Silva (TGS)

T.G.S.: Considerando a perspectiva do professor/artista, como a

senhora

avalia

a

relevância

da

prática

poética/artística

para a prática docente? A.M.B.:

Eu

acho

as

duas

coisas,

a

prática

e

a

teoria

extremante relevantes para a formação de um artista. Costumase dizer que a Universidade não forma artista, claro, família também não forma artista. O que forma um artista é o desejo do artista de ser artista. Agora, que a Universidade pode ajudar muito e atrapalhar muito, também pode. Essa coisa das modas, da Educação seguir a moda, parece coisa de moda de vestir. A moda é sazonal, passa um tempo que é Derrida, depois vai para um

outro,

sempre

filósofo

francês.

O

Brasil

é

um

país

de

mentalidade extremamente colonizada. Cada vez eu me espanto mais com o inconsciente coletivo colonizado que nós temos, que rejeita a América Latina somente para valorizar Estados Unidos e Europa. Tudo que vem da Europa é bom para esse pensamento colonizado, perdidos encontrar

no

quando mundo

dentro

realmente de

de

hoje

nossas

não quanto

é

isso. nós

experiências

Eles

estamos. comuns

estão

tão

Precisamos de

América

Latina respostas para o nosso problema, que é dirigido pelo principal problema, que é essa mentalidade colonizada. Mas, essa relação da teoria com a prática é absolutamente fundamental para que o artista tome consciência do que quer e do que fazer. Foi um artista que colocou isso em prática de uma

maneira

extraordinária,

a

pergunta:

“Quem

somos,

onde

estamos, para onde vamos?”. Essa pergunta de Gauguin, que foi um dos mais perturbados artistas da História da Arte Moderna, ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

146


REVISTA

APOTHEKE é

fundamental.

Gauguin

foi

também

um

dos

mais

maltratados

artistas, não pelo mercado, o mercado valoriza muito, mas até hoje o preconceito contra Gauguin é muito grande. A coisa mais normal

na

desfazem,

vida casar

comum outra

é

você

se

separar,

vez,

ir

para

lugares

casamentos distantes

de etc.

Gauguin foi sempre criminalizado pela sociedade porque largava a mulher e se mandava para o Taiti, enlouquecido por lá, mas uma loucura extremamente produtiva. Fui obrigada a pesquisar um pouco sobre Gauguin, porque, no último congresso em que fui presidente da INSEA, escolhemos para o tema não algo escrito, escolhemos uma obra para ser o tema, e a obra foi esse quadro do Gauguin, “Quem somos, onde estamos,

para

onde

vamos?”.

Que,

aliás,

é

um

trabalho

lindíssimo. Isso aconteceu em Montreal. Todas as escolas da cidade receberam para cada aluno uma reprodução da obra e foi pedido para os professores que se trabalhasse com os alunos essa obra. Foi fantástico! Em um jantar, as coisas usadas, inclusive não só em Arte, mas em design também, tinham alguma intervenção. Eram re-leituras, re-organizações, um re-pensar da obra do Gauguin. O jogo americano era desenhos de crianças, e nós podíamos refletir inclusive sobre a orientação que eles haviam tido, porque depende muito da orientação do professor o que a criança vai fazer. Em alguns, era óbvio que a professora tinha ressaltado o problema da natureza, Gauguin e a natureza. Outras,

que

havia

ressaltado

principalmente

o

problema

religioso, a dupla religiosidade que o quadro mostra. Outros mostravam claramente a dupla cultura do Gauguin, a do Taiti e a europeia. E assim por diante. Outros, até a própria forma de ler o quadro, como ele havia invertido a leitura da escrita ocidental para privilegiar a leitura da escrita oriental. O nascimento começava na direita e a juventude vinha mais à esquerda até a velhice que está representada no fim do quadro, na

extrema

esquerda.

Então,

havia

leituras

diversas,

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

147


REVISTA

APOTHEKE interessantíssimas. Gauguin coloca o problema da reflexão, não digo

nem

teoria,

refletir

sobre

o

que

você

faz,

absoluta

consciência do que você faz, buscar essa absoluta consciência daquilo que você faz e do que você quer. Não é claro o que você quer, para ninguém, não é claro o que a gente quer da vida,

mas

é

isso

o

que

nos

leva

a

sermos

seres

humanos

racionais, leva a crescer, é pensar sobre as nossas próprias propostas. Então, a teoria ajuda a pensar nas propostas, no caso do artista. Eu acho absolutamente fundamental isso, e o que faz um artista não é só domínio técnico. Outro erro é só prestar

atenção

ao

processo

de

criação

e

não

ao

processo

técnico. Não é bem isso, você tem que levar em consideração todos

os

elementos

que

entram

na

criação,

na

busca

de

representação ou de apresentação de uma obra de Arte, e um deles, fundamental, é a consciência daquilo que você faz. Eu acho essa palavra conscientização, que é freiriana, uma palavra

importantíssima

para

o

artista.

Mesmo

que

ele

não

tenha pensado nada daquilo no momento de fazer, mas a ele é dado pensar depois do que aconteceu. Mesmo que de repente junte a heurística, que os russos não chamam criatividade, mas a heurística tem alguns caminhos de surpresa para o próprio criador.

Ele

vai

por

um

caminho,

de

repente

algo

o

desencaminha do que ele estava propondo e este algo apresenta a ele uma solução. Mesmo assim, é preciso ter paciência com o que aconteceu. Desencaminhar também é importante. Então, a sua pergunta para mim é positiva. Gauguin dizia, por exemplo, que para esse quadro tinha subido ao pico de uma montanha, com muita febre, doente, e lá ele tinha pintado isso de uma maneira como um jato. Passou vários dias sem comer e sem

dormir,

inconsciente

pintando. dele.

Então

ele

Descobrisse

atribuía depois

muito que

isso

ao

alguns

exercícios, alguns desenhos dele de tempos que parecem que ele usou partes desse exercício em um quadro. Não o desmente, ele ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

148


REVISTA

APOTHEKE pode estar em um processo de busca e procura e ter desenhado muitas coisas nessa busca e de repente essas coisas se interrelacionaram,

um

descaminho

inter-relacionarem.

Daí

ele

qualquer passar

fez

três

essas

dias

sem

coisas

se

comer

ou

dormir, não sei quantos dias que ele afirmou, e terminar o trabalho.

Mas

não

um

pipocar.

É

resultado

de

caminhos

e

descaminhos. Então, acho que o artista às vezes por efeito de marketing,

hoje

é

efeito

de

marketing,

naquela

época

não,

naquela época havia certo romantismo sobre o ato de pintar e criar. Então, seja lá qual for a razão em um momento cultural, muitas vezes o próprio artista não reconhece o caminho que trilhou. Sobre o processo criativo, por exemplo, um dia, alguém estava buscando uma solução para um pneu. Como vamos remendar pneu? E aí caiu um pedaço de borracha em cima de uma chapa quente. Quer

dizer,

deu

uma

luz

na

cabeça.

Quem

sabe

vamos

experimentar isso. Quem falava muito dos acasos no processo de criação era Fayga Ostrover, mas não era um acaso muito acaso, é um acaso para algo que estava sendo procurado, já estava sendo empreendido. Essa consciência do processo de criar é fundamental para o artista lúcido, o artista que constrói sua história, sua carreira, etc. Mas vocês podem dizer, há mais os doentes mentais? Aí é outra história que eu não conheço, não domino. certos

um

processo

momentos,

fazer

mental

qualquer

trabalhos

que

os

leva

extraordinários

a,

que

em

eles

mesmos julgam extraordinários, que dizem que não sabem como. É muito comum dizer que foi uma inspiração de Deus, que foi algo, eles costumam dizer isso, mas são, na minha opinião, uma busca de saúde mental. Em um momento ele acerta algo porque está com uma forte mobilização interna em busca de sua saúde mental.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

149


REVISTA

APOTHEKE T.G.S.: Em uma entrevista à Carta Maior de 2006, a senhora defende a presença do Arte Educador e do artista em sala de aula. Desse modo, pergunto: como a senhora percebe a concepção da

identidade

do

professor/artista

atualmente,

considerando

este um profissional que possa atuar em ambas as áreas, da docência e do fazer artístico? A.M.B.: Muito positiva também, mas é preciso ter formação como professor. O artista, por ser artista e por ser criador, pode cometer erros extraordinários com uma criança e impedi-la de continuar

criando,

bloqueá-la,

e

com

as

melhores

das

intenções. É preciso conhecer a evolução do pensamento visual da criança, a evolução da produção, a evolução da recepção do objeto visual, da imagem na criança. Tudo isso é preciso que o artista

conheça.

Conhecer

também

alguns

elementos

de

Educação. Eu me assusto quando vejo artistas falarem de fazer uma cartilha para Ensino da Arte, pelo amor de Deus, quer dizer,

nunca

ouviram

falar

em

Paulo

Freire.

Para

mim,

o

educador brasileiro que nunca ouviu e que nunca leu nada de Paulo Freire, tem que voltar a estudar, não precisa ir para a Universidade,

mas

voltar

a

estudar.

Aluno

meu,

a

coisa

é

assim, sou eu e Harvard, porque Harvard é assim. Você só entra na

Pós-Graduação

em

Educação

em

Harvard

tendo

lido

Paulo

Freire. Tenho uma orientanda agora que está nesse caso. Ela quer fazer uma tese de doutorado sobre a gestão em design. “Como

você

pode

desenvolver

a

capacidade

empreendedora

do

indivíduo através de uma disciplina que é chamada de Gestão do Design, que existe em quase todos os cursos de design?”. Não ser apenas um gestor replicante, mas um gestor que propõe novos negócios e etc. Tudo muito bem, a primeira coisa que eu disse para ela é “leia Paulo Freire”. Eu não vou dar receita, mas vou avisando, Pedagogia do Oprimido é o mais difícil livro de Paulo Freire. Quer entrar

de cabeça? Leia Pedagogia do

Oprimido. Não quer entrar de cabeça, pois esse é filosófico e ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

150


REVISTA

APOTHEKE tudo mais, mas quer ler Paulo Freire mais para lhe iluminar, você vai para uma livraria, senta próximo à estante de Paulo Freire e comece a olhar, e compra e leva para casa o livro que você achar mais indicado para o seu caso. Não dou receita e nem título de livro. Você vai escolher, porque eu quero que você leia. Um professor brasileiro, sem ler Paulo Freire, eu acho um pecado, de qualquer área. Sou completamente contrária aquele que botou ‘chega de Paulo Freire’ na manifestação³. Eu acho que a identidade, para mim, do professor artista é aquele

que

trabalha

em

função

do

desenvolvimento

da

sua

própria construção pessoal. Estou falando do artista visual, a construção pessoal da sua visualidade, e ao mesmo tempo se interessa por Educação, por aquilo que a Arte pode influir na Educação em crianças e adolescentes, e que se prepara para as duas funções, a de ser artista e a de ser educador. Eu acho que falta, em geral, aos educadores, um trabalhar com Arte. Não é nem ser artista, é um trabalhar com Arte, porque ser artista, quem diz, quem determina, não sou eu, não é você, não é a própria pessoa, é a comunidade crítica. E esta é um imponderável. Você não entende como passa gente completamente à margem da comunidade crítica e vai de repente encontrar uma comunidade crítica fora o Brasil que o valida. Hoje em dia tem vários casos, como por exemplo, Vik Muniz. Ele só foi ser valorizado depois que foi valorizado lá fora. Ele é um artista muito consciente, muito interessante. O que ele pretende? Ele pretende ao mesmo tempo fazer valer a Arte para todos, para todas

as

classes

sociais.

Ele

está

envolvido

em

trabalhos

educacionais, ele busca o trabalho educacional. Também admiro muito aqueles que fazem do seu trabalho de Arte um trabalho educacional,

quando

o

seu

trabalho

é

um

trabalho

educacional. O Beuys é um exemplo clássico desse que fazia das suas

performances

certas

performances

um aos

trabalho seus

educacional.

alunos

que

Que

eram

o

propunha próprio

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

151


REVISTA

APOTHEKE trabalho educacional dele de artista. Dizem que ele fazia, por exemplo, o Kiefer andar a pé uma enorme distância até chegar a casa dele para eles discutirem a Arte, falarem sobre Arte. Ele dizia que aquela caminhada, era e fazia parte do processo educacional. Então, eu acho que hoje os artistas estão muito conscientes disso, de que é possível ser um artista e o seu trabalho de artista ser um trabalho educacional, considerarem assim. E também o seu trabalho de educador ser considerado Arte, vice-versa, as duas coisas. Mas eu acho bem possível isso, e também acho que é possível você ser só um educador e trabalhar

com

Arte.

Acho

importante

sempre

trabalhar

com

artes, sempre tentar fazer alguma coisa, não para mostrar. Eu tenho muitas vezes necessidade de voltar a pegar em tinta, em lápis, em coisas assim. Há uma necessidade de equilíbrio. Eu fazia, no começo da minha vida, eu desenhava e pintava. Desenhar e pintar eram minhas atividades preferidas. Mas, com o correr do tempo, com a vida corrida, eu fui largando isso e fui

trabalhando

somente

a

parte

teórica.

Mas

sinto

muita

falta, às vezes. Então, em alguns momentos, eu penso por que que não vou para um lugar fazer um processo de ritual mesmo, de ir a um ateliê de alguém. Botar um ateliê em casa eu nunca pensei, pois não tenho espaço e possibilidade. Mas, ir para um ateliê de um artista, trabalhar um pouco, pegar um material qualquer, uma base, uma madeira, uma lata, um papel, o que for, e começar a trabalhar com tinta. Eu muitas vezes sinto necessidade da tinta. Eu sou mais movida à tinta do que movida a

desenho.

Vou

adiando

fazer

isso,

mas

eu

tenho

essa

necessidade. Alguém me disse: “Por que você não fotografa? Hoje em dia é tão fácil”. Não é assim, não é a mesma coisa para mim, é outra coisa. Eu só vim a entender isso em mim depois digital

da

minha

antes

de

filha, ela

pois ter

o

minha AVC

filha e

trabalhava

ficar

com

paralisada.

o No

hospital, Sarah tentou várias vezes. Há uma excelente Arte ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

152


REVISTA

APOTHEKE Educadora no hospital, a Sarah, que tentou fazê-la não ir diretamente para o digital, pois ela dizia: “Não, eu tenho necessidade da materialidade da tinta”, e até hoje ela faria melhor se não usasse o computador. Ela usa com os alunos dela o computador, mas ela trabalha e precisa sentir o pincel, a tinta

correr

professor

no

papel.

exercitar

a

São

Arte

necessidades

e

para

o

intrínsecas

artista

do

conhecer

a

Educação, conhecer a criança. Eu defendia os dois juntos em uma sala, quando havia uma grande reação temível dos artistas a

trabalharem

com

qualquer

área

da

Educação.

Educação

no

Brasil é uma coisa que sofre um preconceito violento. T.G.S.: Como a senhora percebe a Abordagem Triangular em vista dos

conceitos

e

percepções

presentes

no

termo

professor/artista? A.M.B.: Eu vejo a Abordagem Triangular como uma bússola. Essa imagem, na verdade, não é minha, é de Regina Machado. Por onde começar? Problema da relação professor-aluno,é o professor em relação com o aluno. O professor em uma turma pode começar pelo

fazer,

em

outra

turma

pela

leitura,

em

outra

pela

contextualização. A Abordagem Triangular é isso, ela não sai dando receita. E o artista, o que faz? Eu parti um pouco dessa pergunta e do que estava no ar no pós-modernismo. E o que estava no ar era a importância da imagem. Portanto, negar a imagem na sala de aula era um absurdo total, como se fazia. O aluno poderia desenhar,

pintar,

fotografias

de

fazer seus

uma

instalação,

colegas,

mas

não

fotografar, poderia

ver ver

as as

fotografias de um Sebastião Salgado, de um Cartier Bresson. Por quê? Porque havia o medo, o terror da cópia, mas, podemos argumentar com alguns teóricos que não há uma cópia absoluta, não é possível uma cópia idêntica. Portanto, mesmo que você

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

153


REVISTA

APOTHEKE queira copiar, até mesmo sendo um falsário, dá para descobrir que é falsa. O livro Abordagem Triangular no ensino das Artes Visuais, que eu fiz com a Fernanda, foi um livro meio movido a desespero. Eu estava muito desesperada com a tradução que fizeram da Abordagem Triangular, de releitura. Eu não falava no texto do livro A Imagem no Ensino da Arte nenhuma vez em releitura. Caí na

bobagem

de

colocar

na

legenda

“releitura

de

Maria

Martins...”. Como não liam o livro e liam só as legendas, começaram a fazer releitura, cópia mesmo. Eu estou me sentindo um monstro, porque estou fazendo a Arte Educação voltar atrás cinquenta anos, realmente me desesperou. Mas em um congresso em Medellín, na Colômbia, eu vi um professor espanhol dizer isso: “Se a Abordagem Triangular não tivesse sido lançada por uma

professora

mundo”.

Falei

Latino-Americana, com

Fernanda,

ela

vamos

estaria

procurar!

ganhando

Então,

o

muito

animada, comecei a pedir artigos. O livro só tem um artigo que foi escrito especialmente para ele. O resto é tudo artigo que já existia, já estavam escritos. Eu tive um problema sério no computador nessa ocasião e perdi muitos textos, e deixei de lado muitos textos bons. Não sei como recuperar esses textos. Me lembro de uma moça do Rio Grande do Sul que perguntou: “Eu lhe mandei um texto...”. Me lembrei, meu Deus, o texto dela era excelente. Só que eu perdi, nunca mais recuperei o texto dessa

moça.

Era

Paula

Zoran

o

nome

dela,

da

Universidade

Federal do Rio Grande do Sul. Então

foi

dado

o

problema.

Eu

própria

digo

que

teve

influências. Por exemplo, tinha muita crítica ao DBAE e ao Critical Studies no sentido de que eles estavam transformando o Ensino da Arte em pura crítica e dando muito pouca atenção ao fazer. Eu já tinha conhecimento dessas duas linhas quando sistematizei,

pois

não

digo

que

criei,

sistematizei,

pois

estava no ar essa necessidade da imagem na sala de aula. Era ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

154


REVISTA

APOTHEKE um absurdo. Na literatura não só estimulavam para escrever, mas também a ler bons textos na sala de aula. A criança desde pequena tem livro na sala de aula. Por que na Arte você não tem imagem? Você é obrigada a só ver os trabalhos uns dos outros. Essa lógica não funcionava. Então, acho que para o professor artista também, pois o que se pede para o professor artista é que ele se contextualize. O que é que se pede ao artista? Que ele se contextualize. Felizmente as Universidades hoje aceitam as teses de Mestrado e Doutorado na linguagem da pessoa, do artista. Então, se é pintura, vai fazer pintura; se é vídeo, faz vídeo. Aceita mas exige também, porque ele vai ser

professor,

então

se

exige

também

o

que

se

chama

um

memorial. Não é para você explicar a sua imagem, é para você se colocar, você mostrar que se entende como artista e como se entende como artista. Então, eu acho muito equilibrado até essas provas hoje para artista em Universidade. É isso que você quer, quer que você se contextualize. Quais são os seus, de

onde

vem

você,

qual

a

sua

herança

visual?

Como

a

sua

proposta está dialogando no mundo de hoje? Então essas são perguntas

fundamentais

para

um

artista.

Portanto,

a

contextualização, eu acho que na Abordagem Triangular é uma coisa absolutamente imprescindível. Para viver no mundo, para estar

no

mundo,

você

tem

que

se

contextualizar

e

contextualizar aquilo que você vive, aquilo que você conhece, enfim. Então, a gente vive dependendo dos contextos para tomar posição, e educação é contexto. Descobri

uma

coisa

pouco

tempo

lendo

uma

revista

na

internet, não me recordo qual revista era, mas dizia que o colégio Porto Seguro, que é caríssimo para todos, criou em uma favela

aqui

em

São

Paulo

um

colégio

que

tem

os

mesmos

professores, o mesmo currículo. No Porto Seguro da cidade, você tem 92% de vitória no vestibular dessas crianças, e lá na favela 20% apenas passam no vestibular. É o mesmo currículo, ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

155


REVISTA

APOTHEKE os mesmos professores, o que falta? contexto

cultural,

nesse

caso.

O contexto era outro, o

Eles

agora

chegaram

a

essa

conclusão, que é preciso ver como fazer, e vai ser mais caro para eles fazerem essas crianças chegarem a uma vida cultural ativa, museus, galerias, teatros, cinemas etc. Porque falta a eles

contextualizar

as

coisas,

e

se

falta

isso

falta

contextualizar as perguntas do vestibular. Quer dizer, é um problema de não entender sequer a pergunta que está sendo feita.

Então,

acho

a

contextualização

absolutamente

básica

para qualquer tipo de aprendizagem, especialmente a da imagem, que você não traduz facilmente por palavras, nem a função do Ensino da Arte é fazer traduzir em palavras as imagens. Mas é importante também que você construa verbalmente um equivalente de interpretação pela imagem. Nota: ¹ Possui graduação em Direito - Universidade Federal de Pernambuco (1960), mestrado em Art Education - Southern Connecticut State College (1974) e doutorado em Humanistic Education - Boston University (1978). Atualmente é professora titular aposentada da Universidade de São Paulo e professora da Universidade Anhembi Morumbi. Tem experiência na área de Artes, com ênfase em Arte/Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: Ensino da Arte e contextos metodológicos, História do Ensino da Arte e do Desenho, Ensino do Design, Administração de Arte, Multiculturalidade, Estudos de Museus de Arte e Estudos Visuais.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

156


REVISTA

APOTHEKE

157

TRADUÇÃO ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Artista Professor¹ A evolução do ensino das Artes Por que nós ensinamos? Para que fim ensinamos Arte? Diante das perspectivas do século XXI, isto pode ser óbvio em certas situações, porém ambíguas

em

outras.

Educação

Básica

Por

propõe

exemplo,

o

objetivos

Professor

diferentes

de do

Arte

da

Professor

Universitário? O Professor da Escola Básica espera desafiar, afirmar, ampliar horizontes, inspirar, partilhar e questionar a compreensão do estudante de si e do mundo. Em contraste, o Professor

Universitário,

aconselhar,

mostrar,

potencialmente,

dar

forma

e

espera

instruir

o

criticar,

estudante

de

maneira a se tornar um artista, designer ou um profissional. À primeira vista, os dois são muito diferentes. Entretanto, em muitos aspectos, os dois Professores de Arte compartilham um campo

de

conhecimento

ancestral

e

comum,

ainda

difiram no racionalismo, educação e contexto.

que

eles

Ou não? Eu

argumento que as ações, filosofias e contextos dentro do qual nós

trabalhamos

como

Artistas

informam

muito

do

que

nós

sabemos e ensinamos. A diferenciação entre a Educação Básica e o Ensino Superior de Professores não é o interesse, ao invés disso, é a maneira como nós Artistas vemos o mundo e como esta visão nos leva ao conhecimento da nossa prática de ensino. Esta posição é sempre presente nesta introdução, assim como nós descobrimos vários métodos para ensinar Arte. Uma consciência do passado traz

tradição,

profissão

como

contemporânea,

vocabulário Artistas então,

e nos

e

aspectos

esquecidos

Professores. permite

Nossa

da

nossa

perspectiva

reinvestigar

aquelas

histórias vindas de perspectivas particulares - e perspectivas ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

158


REVISTA

APOTHEKE educacionais e artísticas - sendo pontos focais. Os parágrafos seguintes

introduzem

e

engajam

vários

tópicos

e

tendências

usados para compreendermos a natureza em mudança do ensino da Arte. A História da Arte é repleta de Artistas distintos, os quais têm contribuído para o processamento e questionamento da sensibilidade estética através do seu meio escolhido. A vida desses Artistas continua através dos seus trabalhos gravados visualmente. Os Artistas são melhor representados em nossos livros de História, então, o que nós fazemos dos Professores de

Arte?

muito

Os

produtos

dos

mais

efêmeros.

Embora

bem

sucedido,

muito

ensino

Professores alguns deles

são,

frequentemente,

registros

são

permaneçam

esquecidos.

do

Ainda,

a

Educação – formal ou informal – é um aspecto necessário do esforço para alcançar a posição do Artista que é anunciado e é o precursor das maravilhas por vir. Então, o que nós fazemos do

Professor

de

Arte?

Artistas

estabelecidos

por

direito

próprio têm, frequentemente, dedicado suas vidas para ensinar outros.

Como,

então,

podemos

começar

um

exame

da

complexa

inter-relação entre fazer Arte e ensinar Arte? Um significativo contribuidor a respeito de tendências em Arte Educação é a preparação ou não dos futuros Professores. Instituições educacionais enfatizam a importância dos estudos artísticos

e

combinações.

da

preparação

pedagógica

em

diferentes

Embora haja muitas possibilidades, o papel do

fazer artístico pode ser praticamente inexistente abrangendo o programa todo. Estudantes com o grau de Mestrado em Belas Artes sabem isto muito bem. A maioria deles, senão todos, tem uma Educação que consiste de práticas artísticas e Teoria da Arte. Estes estudantes se graduam e entram no campo de ensino de Nível Superior e Médio sem a teoria educacional da Arte Educação que outros

estudantes

recebem.

Formados

e

não

formados

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

(em

159


REVISTA

APOTHEKE formação) que estudam dentro de um Departamento de Educação estão mais propensos a receber a Teoria Educacional e menos desenvolvimento artístico ou cursos de Teoria da Arte. Este nem sempre é o caso, mas é uma suposição razoável. Isto não se destina Artes,

a

desintegrar

ao

invés

a

Arte

disso,

Educação

procura

ou

realçar

os as

Mestrados

em

diferenças

na

preparação. É importante entender que não existe um método correto para preparar estudantes para entrar no campo do ensino da Arte. Artistas têm ensinado, com e sem sucesso, diferentes experiências

de

regulamentos

ou

vida

por

graus

centenas são

de

anos.

obrigatórios

Determinados

em

diferentes

contextos, porém existe uma grande variedade de maneiras para obter uma Graduação em Arte ou qualquer outra certificação. Para compreender o século XXI, olhar para o passado ajuda a situar nosso tempo atual. Eu, em última análise, proponho a importância

de

ser

um

Artista

em

nosso

atual

contexto

educacional. Contudo, a ideia de Artista Professor não é nova e não pressupõe uma Graduação específica. É um caminho de pensamento

que

pode

ser

realizado

independentemente

do

contexto. Arte Acadêmica O

desenvolvimento

dos

programas

de

Arte

dentro

da

estrutura institucional é importante para entender a natureza complexa

do

ensino

de

Arte.

Artistas

e

Professores

não

trabalham em um vácuo, as circunstâncias – incluindo tradição, cultura e contexto – assumem papéis chave no entendimento do lugar

e

da

importância

Francesas

estão

disciplina

do

entre

ensino

as de

da

Arte.

primeiras Arte.

Academias a

Italianas

e

profissionalizarem

a

Permeando

certos

valores

e

estabelecendo contratos que regulam a prática e a organização ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

160


REVISTA

APOTHEKE do

ensino,

profissional artesãos.

essas que

A

artísticas

Academias

era

bastante

Academia que

formularam

está

eram,

diferente

uma

das

representada

oficinas

por

frequentemente,

atmosfera dos

orientações

transformadas

em

fórmulas, as quais privilegiavam a noção da produção de Arte. Eu

apresento

que

esta

base

de

trabalho

estabelecida

pelos

acadêmicos é importante para o entendimento atual das escolas de

Educação

Superior.

infraestrutura

As

permanece.

filosofias

Mais

tarde,

mudaram, no

século

mas

a

XIX,

na

Inglaterra, a nomeação de John Ruskin como Professor de Arte e os

subsequentes

Departamento

desenvolvimentos,

de

Arte

dentro

das

incluindo

Universidades

um

novo

Liberais

de

Artes e a inserção da História da Arte como uma disciplina nos EUA, estabeleceram o campo da História da Arte e do Estúdio de Arte como áreas legítimas de estudo no Nível Universitário (fora do Ensino Superior de Arte). Anterior ao século XVIII, a Academia era o padrão profissional. Potenciais Artistas tinham que

se

inscrever

em

uma

Academia

para

ter

sucesso.

Estes

desenvolvimentos sobre os quatrocentos anos passados fizeram bastante pelo movimento do campo para longe das oficinas em direção

a

uma

nova

maneira

de

entender

um

campo

profissionalizado. Embora o mundo da Arte do século XXI, com sua pluralidade ou visões pós-modernas, difiram grandemente da Filosofia do início do século XIX, envolvendo o Romantismo ou Idealismo, os dois

estão

intimamente

alinhados

ao

profissionalizar

seus

respectivos campos. Durante o século XIX, a Academia Francesa estabeleceu um conjunto específico de regras e doutrinas, o qual

organizou

o

campo

e

estabeleceu

um

paradigma

que

constituiu sucesso e promoção. Em comparação, o mundo da Arte do

século

XXI

alterou

este

paradigma

e

ainda

mantém

com

sucesso uma visão pluralística constante através da educação em todos os níveis. Artistas modernos, portanto, rejeitaram as ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

161


REVISTA

APOTHEKE tradições e profissionalização do sistema Acadêmico de Arte e procuraram um novo começo sem regras. As partes do jogo e tradições têm mudado na contemporaneidade, entretanto, existe ainda uma base conceitual que mantém a ordem e a base comum para a hierarquia e sucesso. Assim que as Artes transitaram como um assunto de estudos para dentro das Universidades, as Artes filosoficamente se tornaram uma máquina bem mantida que continuamente

moldaram

mentes

para

entrar

na

fábrica,

onde

deve-se ser um produto para trabalhar dentro dela. Um débito é devido para os Artistas da Renascença, os quais estabeleceram o

começo

da

fábrica

(isso

metaforicamente),

uma

tradição

continuada nas Escolas de Artes de hoje, construídas em um conjunto

conceitual

de

doutrinas

que

praticamente

todos

os

Artistas os quais entram devem seguir. A ideia que não existe uma maneira certa de ensinar ou aprender é, em uma maneira de falar,

a

própria

maneira

de

ensinar

e

aprender

nas

Artes

Visuais, hoje. A ausência ou rejeição de uma filosofia central é a filosofia. As Escolas de Artes seguem a tradição acadêmica e profissionalizante como eles ensinam e mantém um conjunto de regras e orientações firmemente inconsistente. Elkins considera

(2001) a

respeito,

postula

questão “Acadêmico”

“O

um

que é

é

argumento Arte

convincente

Acadêmica?”.

referenciado

em

um

A

que este

sentido

tradicional, se referindo à Arte que é realista, de um período particular,

e

influenciada

por

uma

Academia.

O

sistema

de

ensino de Arte Italiano e Francês, responsável por grandes Artistas dos séculos XVII, XVIII e XIX, são, frequentemente, responsabilizados por esta associação. O termo “Acadêmico” tem se

tornado,

em

alguns

círculos,

uma

expressão

negativa

ou

Kitsch que degrada a matéria do estilo dos artistas do século XIX, adicionando uma ênfase viral. Embora as regras, tradições e hierarquias da Escola Francesa sejam muito diferentes das Escolas Contemporâneas, tais como a Universidade de Yale ou da ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

162


REVISTA

APOTHEKE Escola de Design Rhode Island, a infraestrutura que estabelece regras, sugere práticas e que influencia o campo também são bastante similares. Entretanto,

a

compreendida.

noção A

acadêmica

este

pode

respeito,

ser

também

geralmente,

amplamente

envolve

uma

infraestrutura profissional que suporta o ensino e educação de Artistas

através

de

uma

filosofia

particular.

Agora,

as

escolas e os departamentos de trabalho de Arte hoje estariam horrorizados ao serem comparados a um dinossauro como a École des Beaux-Arts. O modelo desatualizado não poderia preparar Artistas para trabalhar na sociedade altamente conceitual e esclarecida que Artistas de hoje devem navegar. Afinal, para tornar-se

um

Artista

de

sucesso

como

Jeff

Koons

ou

para

praticar seu ofício e engajar-se com o campo semelhante ao de Rachel

Winteread,

não

devemos

nos

matricular

em

um

datado

sistema de educação. Um promissor Artista deve se engajar em questões

do

cotidiano

na

melhor

escola

para

aprender

com

mestres e para estabelecer um fundamento adequado para iniciar sua escalada de sucesso. Ironicamente, isto é exatamente o que um

Artista

Academia. assim

aspirante

A

como

do

Academia todas

as

século

Francesa escolas

XVIII

tinha de

teria

uma

Arte

dito

sobre

filosofia

de

hoje

a

central,

quer

eles

percebam isto ou não. O entendimento de que a Academia era, em sua essência, uma instituição

que

estabelecia

padrões

e

aplicava

doutrinas

é

esclarecedor – não era um estilo particular. Estilos mudam constantemente, até dentro da Academia tradicional. Até este ponto,

a

Academia

do

século

XVI

era

muito

diferente

da

Academia do século XIX. Os registros mais recentes da Academia Florentina não mostram evidências do estudo do nu, nem incluem o incrível número de diretrizes que a Academia do século XIX manteve (GOLDESTEIN, 1996). O nu clássico representa o século ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

163


REVISTA

APOTHEKE XIX e é o aspecto central da Academia tradicional, então, percebe-se

que

estilo

e

conteúdo

mudam

com

a

cultura

e

contexto. As Escolas Contemporâneas Liberais de Artes e as Escolas de Belas Artes, preparando milhares de Artistas por ano, deveriam ser consideradas acadêmicas pelas seguintes razões: Escolas Contemporâneas

certamente

mantém

diretrizes

e

corpo

de

conhecimento considerados sagrados, exatamente como a antiga Arte Acadêmica mantinha. A filosofia de que as regras não importam é uma suposta ideia, assim, uma doutrina ou regra definem a Arte Educação contemporânea. John Baldessari, Ed Ruscha e outros Artistas conceituais e Professores

de

Arte

são

bem

conhecidos

por

dizerem

que

Artistas viraram as costas para as regras, cânones, técnicas convencionais

e

materiais

durante

o

final

do

século

XX

(DANNENMÜLLER, 2006). Através destas ações, futuros Artistas resplandeceram novos caminhos com uma infraestrutura similar guiando suas decisões e, assim, estabelecendo uma doutrina de valor para seguir. O entendimento pluralista do mundo da Arte, regras

e

educação,

usados

nas

Academias

modernas,

são

combinadas para formar uma nova instituição. Possivelmente, poderia-se argumentar que sim, as Escolas de Arte parecem ensinar uma nova doutrina semelhante às regras. Mas

não

ter

uma

faculdade

plena

de

diferentes

ideias,

estéticas e práticas de ensino contradiz esta doutrina? Na verdade,

todas

Filosofia

de

as

Escolas

Baldessari,

de

Arte

muitas

no

mundo

escolas

não

possuem

ensinam

a

diferentes

filosofias até mesmo as que contradizem umas às outras. Não estamos quebrando as regras e diferenciando-nos da Academia como um sistema de governo institucional? Não temos nos movido para além disso? Afinal, há muitas filosofias diferentes de Arte acontecendo ao mesmo tempo. A simples resposta é não. Esta

seria

uma

micro

perspectiva

e

não

um

entendimento

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

164


REVISTA

APOTHEKE abrangente

do

que

está

acontecendo

fora

de

escolas

particulares. O simples fato de que milhares de filosofias concorrentes

trabalham

simultaneamente,

reforça

o

que

as

Academias de hoje ensinam como uma atitude pluralística (com uma visão macro) em direção ao entendimento da Arte Educação e da preparação de Artistas. A filosofia de que não existe uma única maneira correta para se fazer as coisas concorda que virar as costas às regras é de fato a forma correta. Harold Rosenberg, o proeminente crítico, desafiou os artistas de meados do século que estavam matriculados em Escolas de Arte

e

comparou-os

indiretamente

às

Academias

(GOLDSTEIN,

1996). Rosenberg duvidou da Universidade e sua habilidade em preparar os jovens para se tornarem artistas profissionais. Ele afirmou que apenas um dos dez melhores expressionistas abstratos tinha um diploma em Arte. O diploma universitário estava mudando a natureza da expressão artística e, segundo o campo da Arte, a expressão genuína não exige escolaridade. Rosenberg

via

como

negativa

a

inscrição

de

artistas

no

Departamento de Arte da Universidade, ele sentia que nada de novo ou emocionante viria em voltar a praticar a tradição ou manter o seu status quo. A visão de Escola de Arte foi que estudantes estavam comprometendo o estúdio em virtude da sala de aula, o pensamento de que a Arte não pode ser ensinada não é

uma

ideia

nova

e

é

parte

do

argumento

para

uma

nova

Academia. Outro dogma da Arte Acadêmica era o controle que a Academia exercia

sobre

quem

era

capaz

de

ensinar.

Estes

acadêmicos

foram educados de uma maneira similar e, assim, continuavam as tradições e as regras. Para o Ensino Universitário do século XXI é necessário que Professores atinjam um nível específico de educação ou eles não são considerados bons para o emprego. Ao fazer isto, o potencial Professor de Arte deve caminhar através da gauntlet²

do Ensino Superior, antes de ser-lhe

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

165


REVISTA

APOTHEKE dado uma arma e posicionado na linha. Este sistema exige um Mestrado em Belas Artes e, em algumas situações, um Doutorado em

Filosofia

ou

Educação,

ou

ainda,

o

ensino

pode

ser

garantido em áreas correlatas como História da Arte e Arte Educação. Este sistema de promoções exige futuros líderes para se destacarem e terem sucesso no dado sistema antes ensinado nele.

Isto

é

semelhante

ao

processo

acadêmico

usado

para

defender e manter a infraestrutura educacional e garantir a continuidade dos objetivos da cultura. Apenas graduados que praticaram métodos aceitáveis prosseguiriam e se graduariam. Questionar a preparação da Arte ou sua correta preparação é um assunto de muito debate, visto que as filosofias do fazer artístico moderno se desenvolveram mais e mais fragmentadas durante

o

período

pós-guerra.

Reinhardt

(1957),

como

um

Artista-Professor, escreveu “as doze regras (ou como alcançar as doze coisas para evitar)” para a nova academia. Em síntese, a lista é a seguinte:

166

Nenhuma textura Nenhum pincel ou caligrafia Nenhum esboço ou desenho Nenhuma forma Nenhum design Nenhuma cor Nenhuma luz Nenhum espaço Nenhum tempo Nenhum tamanho ou escala Nenhum movimento Nenhum símbolo,

objeto; imagem

nenhum ou

assunto;

signo;

nenhum

nenhuma prazer

matéria; ou

tinta;

nenhum nenhum

trabalho descuidado ou não trabalho irracional; nenhum jogo de xadrez. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Regras e tradições desempenham um papel proeminente na Arte

Educação

renunciou

a

e

Reinhardt

muitos

entendeu

aspectos

da

este

Educação

dilema,

de

Arte

porque Moderna,

propagada durante o século XX. Similar às estruturas do fazer Arte que formaram o Movimento Modernista, os estilos de ensino e

técnicas

subsequentes

tentaram

similares

em

Arte

Educação.

tradições

em

Arte

Educação

A

responder

rejeição

levou

ao

aos

destes

ensino

problemas sistemas

de

e

filosofias

relacionadas ao nada e nem à coisa alguma. A nova Academia está presente em todos os níveis da Arte Educação (da Educação Básica

até

a

Superior)

e

é

preciso

ser

seu

membro

para

ensinar. Profissionalização da Arte Educação A profissionalização da Arte Educação também infiltrou-se no que poderia ser considerado uma subdisciplina ou, em outros casos,

uma

todos

os

disciplina

assuntos,

maior

das

e

Artes,

mais da

abrangente

Arte

que

Educação,

e

envolve separa

ainda, o campo de Educação relacionado. Os campos da Educação e

Arte

relance,

Educação no

são

fortes

Periódico

áreas

de

Internacional

estudo.

de

Em

Educação

um em

rápido Arte

e

Design - periódico de Ensino de Artistas ou Estudos em Arte Educação - mostra um grande número de profissionais os quais trabalham para definir e refinar o processo e conhecimento base da Arte e Educação do Design. O avanço da Arte Educação é afirmado

no

crescimento

da

disciplina

de

Educação.

A

Organização das Associações Nacionais – Associação Nacional de Arte

Educação,

Associação

Associação

de

Artistas

convenções

continuam

localmente

e

a

do

Ensino

Professores definir

nacionalmente.

Este

-,

os

Superior

de

encontros

anuais

propósitos

crescimento

do

Arte, e

campo

demonstra

e

considera a Arte Educação como uma disciplina distinta que ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

167


REVISTA

APOTHEKE combinou dois campos relativamente jovens: Arte e Educação. Este

relacionamento

não

usual

entre

dois

assuntos

gera

confusão quanto ao local onde o Departamento de Arte Educação deve estar localizado dentro da Universidade. Ele deve estar nos Departamentos de Educação ou em Escolas de Arte? Ambos os Departamentos de Educação e Arte oferecem o diploma de Arte Educação. Mas qual seria apto para facilitar tal aprendizagem? Existe um problema similar com o assunto da História da Arte, definir se está no Departamento da História ou da Arte. O advento da Escola Normal, no século XIX, foi importante para o Professor de Arte, porque era uma instituição que preparava especificamente

Professores

para

o

ensinar

Arte

(EFLAND,

1990). Anterior a esta escola, estudantes foram treinados ou educados como artistas ou artesões, que então transmitiam a tradição

ou

ensinados

habilidades

pela

como

necessidade,

Professores. não

como

Eram uma

Artistas identidade

profissional. Não existia ênfase no processo de ensino por si – apenas uma continuação de métodos efetivos. O ato de ensinar tornou-se um assunto de estudo através das Escolas Normais na Inglaterra

e

nos

Estados

Unidos

(EFLAND,

1990;

MACDONALD,

1970). Nestes países, a preparação do ensino foi notada como significativamente

importante

por

causa

de

teorias

contrastantes da Arte Educação. As Belas Artes e as Artes aplicadas foram divididas e cada disciplina necessitou de um tipo

específico

outros

de

treinamento/educação

currículos.

objetivos

diferiam

Os muito

assuntos

de

dependendo

não

estudos, do

disponível processos

contexto.

O

em e

ensino,

então, tornou-se um assunto de estudo (em certas regiões como na Inglaterra e nos Estados Unidos) ao invés do assunto de Arte por ele mesmo. Isto é significativamente diferente das duas alternativas no ensino: preparação artística (objetivo do acadêmico) e dos assuntos de preparação geral (objetivo do Professor de escola). ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

168


REVISTA

APOTHEKE Mestres, clássicos

Professores

até

o

século

e

instrutores,

XXI,

foram

desde

educados

os

tempos

formalmente

e

informalmente na disciplina do fazer artístico, aprendendo um ofício ou explorando a mudança de componentes que compõe a disciplina de Arte. Em essência, eles aprenderam como desenhar e,

então,

ensinaram

desenho.

Este

tipo

de

educação

está

interessado, primeiramente, na preparação do Artista, com o ensino

considerado

como

sendo

menor

ou

não

mencionado

no

aspecto da educação. O estilo ou a filosofia do ensino da Arte,

adotado

instrutores

de

nestes sucesso,

casos,

é

usualmente

intencionalmente

ou

copiado

não.

Os

de

atuais

programas de Mestrado em Belas Artes ao redor do país ainda trabalham dentro deste paradigma, como Artistas potencialmente preparam suas carreiras no ensino sem a mais frágil ideia que eles estão expressando uma filosofia particular ou, em alguns casos,

contrastando

ideias

em

seus

ensinos

uma

noção

particularmente espantosa, porque muitos graduados no Mestrado em Belas Artes buscam a carreira no ensino. A alternativa para um sistema de regras e tradições é uma falta do ensino da Arte. Por não ter esta tradição de criação, pode-se aprender para ensinar, porém deve-se escolher uma – ou mais provavelmente muitas – doutrinas, métodos e filosofias. Isto é, essencialmente, o que os programas de preparação de Professores esperam realizar. Eles não refinam habilidades de desenho ou desafiam a produção artística dos estudantes, ao invés disso, eles introduzem a pedagogia e vários aspectos do ensino. Os primeiros proponentes em Arte Educação, nos Estados Unidos, ensinar

buscavam desenho

preparar

para

seus

professores estudantes

generalistas

desta

maneira

para

(SMITH,

1873). Assim, graduados se fortalecem com uma teoria ou um sistema de Arte Educação sem praticar muitas das experiências do fazer artístico por eles mesmos. Harkening Shaw (1903), no livro Máximas para revolucionários, em Homem e Super-homem: ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

169


REVISTA

APOTHEKE Ele que pode, faz. Ele que não pode, ensina (linha 36) Sendo uma expressão usada para desencorajar Professores, a citação é, frequentemente, repetida e usada incorretamente, mas é aplicável para os primeiros programas de formação de Professores que descontavam a habilidade do fazer artístico. Isto é, onde muitos os quais estudam o assunto do Artista Professor

são

surpreendidos.

Eles

sentem

que

treinamento

artístico é o que, potencialmente, faz um Artista-Professor, em comparação a uma experiência anterior em Arte Educação ou Educação (ZWIRN, 2002). Embora a Educação em Artes Visuais ou Arte Educação pode contribuir para uma identidade alinhada como ser um Artista ou Professor, argumento que ser um Artista é mais do que um grau ou curso de estudo, ao invés disso, é uma maneira de ver e viver. Ser um Artista é fundamental para quem você é. Uma maneira

de

conhecer

e

ser

(HICKMAN,

2005).

Artistas-

Professores não são apenas Artistas que ensinam, muito além disso, o processo de pensamento artístico deles é incorporado dentro de vários elementos do processo de ensino. Uma compreensão conceitual do Artista-Professor não baseia-se na descriminação por grau ou educação, mas trata sobre aplicar o

fluxo

artístico

perspectiva

do

estética

pensamento informa

à

dentro pedagogia

do

ensino. de

ensino

Esta um

potencial em muitos níveis. É preciso considerar, portanto, que esse entendimento do Artista

Professor

é

sintético

e

entrelaçado,

não

é

combinação dos papéis definidos pelas instituições. Relacionamento com o campo do conhecimento

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

uma

170


REVISTA

APOTHEKE Através

de

literaturas

relevantes,

encontrei

assuntos

relacionadas ao Artista Professor considerando que o sujeito é melhor compreendido através de cinco categorias: Educação e a dupla

identidade;

parcerias;

Artistas

Professores

não

tradicionais; História; estudos de Professores individuais. As cinco categorias representam subtópicos de questões maiores do Artista Professor. Estes temas servem como um pano de fundo para o entendimento deste texto como conhecimento histórico e, também, situa o processo do pensamento de muitos contemplado neste tópico.

Há uma excessiva quantidade de pesquisas sobre

o Artista Professor, ainda que nenhuma leve a uma perspectiva holística

do

perspectivas

assunto. de

A

figura

pesquisadores

seguinte e

o

uso

representa de

várias

autores

para

compreender o termo ou conceito do Artista Professor.

Pesquisa de Artista Professor

171

- História - Educação e dupla identidade - Parcerias - Estudos de Professores individuais - Artistas Professores não tradicionais

Figura 1. Cinco características da pesquisa do Artista Professor.

Educação e a Dupla Identidade Identidade

é

frequentemente

um

assunto

de

importância

para aqueles que usam o termo “Artista Professor” (ORSINI, 1973). Artista Professor como um título parece bom, algo que adiciona além de enfatizar o papel dual de ser um Artista e um Professor praticante. Contudo, há muitas características que pesquisadores têm usado para definir o que é um Artista. Por ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE exemplo, é necessário exibir, ter representação na galeria ou manter uma prática de estúdio ativa para ser um Artista? Outro identificador

é

o

nível

de

educação

ou

da

qualidade

da

educação recebida. Ter um grau de Bacharelado em Belas Artes ou um Mestrado contribui muito para a identidade de muitos Artistas Professores como Artistas. Pesquisas demonstram que a educação (nível e tipo) de Artistas Professores tem um profundo efeito no ensino, baseado em estudos anteriores (HANSEL, 2005; LUND, 1993; ZWIRN, 2002). O tipo de escola que eles frequentam (Escola de Arte versus Escola de Educação) e as aulas que eles escolhem ter (estúdio de

Artes

versus

ramificações

na

relacionamento

Arte

Educação)

identidade.

do

Artista

possuem

Zwirn

importantes

(2002)

Professor

como

um

abordou

o

enigma.

Em

contrapartida, Weiss (2001) examinou muitas interpretações que estudantes formados.

Pós-Graduados Em

muitas

tinham

de

circunstâncias,

Professores quando

a

Artistas

identidade

é

dirigida, o Artista Professor é visto como um dilema, onde o papel de um não suporta os objetivos ou características do outro.

Características

atitudes

estereotipadas

despreocupadas,

dos

Artistas

atividades

incluem

espontâneas,

arranjos/condições de trabalho atípico e objetivos associados com

exposição,

exibição

e

galerias

ou

museus.

Em

contrapartida, o Professor está, frequentemente, trabalhando em

um

sistema

estruturado.

Os

regimentado

que

é

sistemático

objetivos

são

associados

ao

e

altamente

sucesso

de

estudantes e são menos pessoais em sua natureza. Assim, uma identidade

associada

com

ambas

destas

posições

pode

ser

confusa e frustrante para aqueles interessados em manter ambos os papéis. O

papel

do

Artista

Professor,

no

Nível

Universitário,

incita um número de problemas. Risinhoover & Blackburn (1976) escrevem

sobre

Artistas

e

suas

dificuldades

com

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

as

172


REVISTA

APOTHEKE responsabilidades criativo

em

limitadoras

posições

Universitário.

Os

de

que

diminuem

Professor

sujeitos

de

o

Arte

entrevistados

resultado no

eram

Ensino

Artistas-

Professores trabalhando dentro de contextos universitários ao redor

dos

Estados

desconfortáveis,

Unidos. assim

Os

como

autores

documentaram

histórias

de

relações

sucesso

sobre

ligações em combinar

ensino com ser um Artista. Apesar do

sucesso,

reconhecem

dentro

os

da

autores

configuração

da

que

a

posição

Universidade,

é

do

Artista,

problemática.

Os

produtos artísticos (pintura, escultura, filme entre outros) criados como

por

Artistas,

conhecimento.

Educação

Superior

entrevistados

frequentemente,

Combinado (Doutorado

combatem

essa

com

não

são

diferentes

versus posição

credenciais

Mestrado), não

reconhecidos os

usual.

da

Artistas

Apesar

de

muitas Universidades se moverem além, reconhecendo produtos artísticos

como

conhecimento,

elas

ainda

combatem

a

significação de certos produtos e como mensurar ou avaliar tal trabalho. O

estudo

de

identidade

de

Ritenbuagh

(1989)

examinou

profissionais de Arte Educação, os seus papéis percebidos e seus

status

líderes

como

administradores,

organizacionais,

Artistas,

estudiosos

e

colecionadores,

Professores.

Os

educadores incluídos no estudo eram de todos os níveis de instrução, da Educação Básica à Educação Superior, e incluíram aqueles na administração. As descobertas deste estudo, juntamente com Dohm (2000) e Zwirn (2002), mostram evidências da complacência do Professor de Arte com seus títulos. Autores,

tal

como

Dohm

(2000),

escreveram

sobre

a

carreira da Educação em Arte e o treinamento e habilidades necessárias para Graduados de hoje. A identidade, certamente, está atada à Educação, assim como é menos provável ver Arte Educadores como Artistas. Mas seria isso o melhor para a Arte ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

173


REVISTA

APOTHEKE Educação? No passado, a preparação artística sempre tomou a cena principal. Agora, aqueles papéis estão sendo revertidos através

de

importantes presença

avanços e

quando

o

na

educação

pedagógica.

Artista-Professor

Professores

de

tem

Arte

Títulos

uma

tentam

são

significante

descrever

seus

papéis dentro de instituições educacionais. Este ainda não é o propósito deste texto – o Artista Professor é mais que um título. Parceiras Circunstâncias

particulares

que

unam

o

Artista

e

o

Educador na sala de aula também são uma opção na compreensão do duplo papel. Nesses casos, o Artista Professor é usado para descrever a combinação de duas pessoas diferentes (Artista e Professor) ou o papel do Artista visitante na sala de aula. Douglass (2004) examina iniciativas específicas em Arte que facilitam a parceria entre Artistas e Educadores na sala de aula. Esses programas ilustram o papel dual que existe na Arte Educação e esta parceria entre dois indivíduos é uma solução para a combinação do papel dual do Artista e Professor. Uma

compreensão

da

colaboração

que

acontece

entre

Artistas e Professores tem sido estudada para aprender sobre os muitos benefícios de tais contribuições (DOUGLASS, 2004; KINSEY, 2001; STROKES, 2001). As colaborações entre Artista e Professor,

de

Douglass

problemas

com

jovens

métodos/estratégias Professores,

usam

(2004), em

que incluindo

estão

situação

os

relacionadas de

Artistas,

percepções

da

risco

e

servindo sua

aos os como

eficácia.

A

categoria parceria traz à mente museus que recrutam Artistas para visitar salas de aula de escolas públicas. As parcerias entre Artista e Professor, quando funcionando perfeitamente, convocam as qualidades desejáveis para ambos - o Artista e o ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

174


REVISTA

APOTHEKE Professor - a encontrar as necessidades de um grupo específico de estudantes. O Programa de aprendizagem do Museu Salomon R. Guggenheim usa a combinação de parceria por colocar os Artistas de Nova Iorque nas escolas públicas da cidade. Os Artistas Professores colaboram

com

os

Professores

de

sala

de

aula

para

criar

projetos de Artes relacionados aos temas do currículo escolar. Estas parcerias têm sido muito bem sucedidas para ambos os lados (Museu e Escola), especialmente, porque as descobertas mostram

a

importância

literário,

pensamento

deste

crítico

programa e

no

habilidade

desenvolvimento em

resolução

de

problemas (RANDI KORN & ASSOCIATES, 2007).

Professores Artistas não tradicionais Posições profissionais do Artista Professor, tipicamente, incluem o emprego na Educação Básica e no Nível Superior. Contudo, há outras posições fora de sala de aula para o ensino de

Arte.

oportunidades

em

Museus,

Galerias,

Centros

de

Arte, empresas privadas e sem fins lucrativos. Pujol (2001) abordou a eficácia do Artista-Professor dentro do espaço do Museu, enquanto Hanson (1971) investigou a eficácia do Museu ensinando Artistas a trabalharem com Professores tradicionais de sala de aula. Quem seria melhor para interpretar o trabalho artístico em um Museu ou Centro de Arte do que uma pessoa com uma prática artística ativa? Estudos usando o termo “Artista Professor”, nesta

em

contextos

categoria.

tradicional

usa

não

Tipicamente, suas

tradicionais o

perspectivas

de

Artista como

um

ensino,

caem

Professor

não

Artista

aumentar a experiência estética do visitante. História ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

para

175


REVISTA

APOTHEKE A

relação

Artista-Professor

documentada

na

determinado

período

histórico.

O

cultura e

de é

relatos

o

Historiador

também

tipo

em

sido

históricos

mais

Arte

tem

comum

Educação

bem

sobre

de

um

trabalho

Efland

(1990)

escreve sobre o Artista Professor no começo do século XX. Aqueles Artistas Professores, em particular, fizeram um nome para eles mesmos entre os anos 1920 e 1940, desenvolvendo uma maneira de ensino que encorajou a auto expressão. Outras sido

histórias

escritas

reconstruídas

pelo

ponto

de

de

Arte

vista

de

Educadores antigos

têm

alunos,

promovendo um olhar alternativo para a aprendizagem (CHEUNG, 1990).

Por

exemplo,

Brown

(1990)

usa

dados

de

Artistas-

Professores extraídos de relatos de antigos estudantes, usando aulas

gravadas

e

objetos

de

aula

para

reconstruir

sua

Artista-Professor

são

História. Referências abundantes

e

o

históricos

(BYRD,

históricas termo

é,

1963;

para

o

frequentemente,

EFLAND,

1990;

usado

ELKINS,

em

textos

2001;

LOGAN,

1955; MACDONALD, 1970). Contudo, seu efeito recai em aumentar a importância do Professor como um Artista. Hans Hofman e Georgia O’Keeffe são bons exemplos por ambos serem conhecidos pelas

suas

Artistas

contribuições

Professores

contribuições

para

de

por

a

Arte

ensino, causa do

mas

de

são

suas

século

XX.

chamados

de

significantes Em

um

nível

superficialmente significante, o Artista Professor, na veia histórica, é um título decorativo. Estudos Individuais de Professores Vários

autores

abordaram

a

relação

Artista-Professor

através de estudos de casos individuais (BEER, 1999; BROWN, 1990; DOUGLASS, 2004; KENT, 2001; TUCKER, 1998; WOLFE, 1995). ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

176


REVISTA

APOTHEKE Pelo estudo excepcional de Artistas Professores, pesquisadores são capazes de escrever sobre características que contribuem para

a

compreensão

do

ofício

deles.

Retratos

de

Artistas-

Professores têm sido estudados para esclarecer as qualidades que

eles

compartilham

com

outros

(BROWN,

1990;

CAMPEBELL,

2003). Cho (1993) examinou a combinação da função do ArtistaProfessor

no

Professores:

nível Hans

escolar, Hoffmann

pelo e

estudo

Josef

de

Albers.

dois A

Artistas-

análise

dela

focou seus ensinos, fazeres artísticos, exposições e escritos. Ela, simultaneamente, ofereceu sugestões desta pesquisa para Artistas-Professores que equilibravam suas duplas carreiras. Este tipo de pesquisa compartilha traços úteis que servem como um modelo para o ensino. Uma

pesquisa

qualitativa

na

eficácia

do

ensino

é

importante para o campo da Arte Educação. Brow (1990) e Wolfe (1995) forneceram exemplos de ensino e aprendizagem em salas de

aula

de

Professores-Artistas.

Pesquisadores

como

Tucker

(1998) escrevem para educar futuros Artistas-Professores na esperança

que

tais

estudos

possam

ser

usados

como

uma

referência para aprimorar a prática. O

uso

da

crítica

e

o

encorajamento

do

pensamento

metacognitivo por estudantes, do Artista-Professor, foram os assuntos

de

estudo

(KENT,

2001).

Traços

específicos

de

Artistas-Professores – tal como espiritualidade, por Campebell (2003), e o uso da repetição – também foram estudados para promover

o

ofício.

proporcionaram

uma

Risenhoover

fonte

primária

&

Blackburn

valiosa

através

(1976) de

uma

coleção de entrevistas com Artistas-Professores. Os Artistas Professores

escolhidos

para

a

publicação

são

limitados

à

pintores, escultores e músicos, os quais endereçam assuntos de ser um Artista e Professor no Nível Universitário. O estudo também relação

tratou ao

de

tópicos

trabalho

em

pertencentes

uma

instituição

à

criatividade burocrática.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

em Este

177


REVISTA

APOTHEKE recurso é um bom exemplo da difícil questão discutida por Zwirn

(2002)

sobre

o

duplo

papel

que

Artistas-Professores

devem equilibrar. Apesar de estudos de caso proverem excepcionais registros dos

indivíduos,

poucos

Artistas-Professores

tomaram

as

matérias em suas próprias mãos ao publicarem informações ou currículos para ajudarem futuros Educadores de Arte com seus duplos

papéis.

Rockman

(2000),

um

experiente

Artista-

Professor, escreveu um livro voltado para Artistas usarem no ensino

de

Arte

no

Nível

Universitário.

Ela

sentiu

que

a

maioria dos Artistas não são bons Professores (possivelmente um sintoma do currículo do Mestrado em Belas Artes). Seus escritos Educadores

são em

direcionados seus

para

ajudar

empreendimentos

futuros

Artistas

educacionais.

Kellman

(1999) escreveu com o propósito de oferecer aos Educadores de Arte um valioso conhecimento do ponto de vista de um Educador de Arte mais experiente. Walker (2001) abordou a Educação do Artista Professor da perspectiva de um Artista. Através de entrevistas, o Artista se torna um Educador na sala de aula, discutindo

dificuldades

e

métodos

únicos

para

abordar

esta

educação. A

maioria

desses

estudos

de

caso

sobre

a

relação

do

Artista-Professor, lidou com problemas pertinentes ao ensino de qualidade. Uma pequena quantidade discutiu os problemas de ser um Artista profissional e apenas alguns poucos estudos comentaram sobre a necessidade de pesquisas adicionais na área de liderança e Educação de Arte. John Steuart Curry foi o primeiro Artista em residência em uma Universidade Americana – no caso, a Universidade de Wisconsin. Em meados do século XX, a ideia do Artista em residência continuou a se desenvolver após a 2ª Guerra Mundial, porque os administradores sentiram que os estudantes ganhariam uma melhor Educação em Artes a partir

de

Artistas

profissionais

(RISENHOOVER

&

BLACKBURN,

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

178


REVISTA

APOTHEKE 1976).

Esta

tradição

continuou,

mas

sob

certa

confusão

no

campo da Arte. Apesar da disposição apropriada do Departamento de

Arte

Educação

poder

ser

debatido,

o

Artista

Professor

sempre compartilhará duas áreas de estudo. Racionalidade

e

mudança

de

objetivos

no

ensino

de

Arte

Americano O propósito de ensinar Arte é importante para entender o termo de Artista-Professor. A escolha de preparar Artistas ou uma

grande

quantidade

de

objetivos

variados,

mudou

nosso

entendimento de porquê ensinamos Arte. Efland (1990) fornece um

profundo

relato

das

várias

racionalidades

do

ensino

de

Arte, nos Estados Unidos. Apesar dele, principalmente, focar nas

justificativas

de

Arte

Educação

como

um

componente

de

educação pública, as tendências e valores que a sociedade tem usado para validar os estudos em Arte, são um esclarecimento para aqueles que estão entrando no campo. A Arte tem sido ensinada por várias razões, incluindo preparação de Artistas, expressão

pessoal,

terapia,

estética,

história,

treinamento

industrial, nacionalismo, paz entre outros. Siegesmund (1998) expressa sua frustração e ansiedade com este sentimento de que as

justificativas

conflitantes

que

racionalizam

a

Arte

Educação não são um aspecto positivo para o campo. Estou

preocupado

que

qualquer

sucesso

que

a

Arte

Educação atual tenha seja baseado mais nesta política de abarcar diversas concepções de arte juntas do que na força

de

um

raciocínio

educacional

claramente

articulado, persuasivo e duradouro. Estou preocupado que a ausência de um centro conceitual na abordagem eclética ao

currículo

de

Artes

irá

se

provar,

por

fim,

problemática. Meu medo é que sem um centro, o padrão histórico

de

ciclos

educacionais

persistirá

e

as

reformas curriculares atuais se provarão efêmeras como ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

179


REVISTA

APOTHEKE as reformas curriculares do passado. (SIEGESMUND, 1998, p.198)

O

medo

de

Siegesmund

é

compreensível,

mas

o

que

ele

considera como fraqueza da Arte Educação, Davis (2005) aponta como a sua força. A metáfora de, constantemente, aplicar novas lentes é usada por Davis (2005) para traduzir o vocabulário do aprendizado em Arte em outras propriedades. Repensar e alargar as fronteiras da Arte Educação é, certamente, diferente da ausência de um centro. De fato, o centro da Arte Educação parece se expandir conforme estudamos a História de como a Arte é ensinada. Este debate único, embora desencorajador para alguns,

pode

Artistas

servir

como

um

exemplo

Professores

para

se

adaptarem

da

maleabilidade

de

(artisticamente)

e

continuarem a influenciar e transformar nosso entendimento em muitas culturas e contextos diferentes. O advento de novos estilos

e

movimentos

surgimento

do

na

homem

História das

da

Arte,

cavernas

a

até

partir

os

do

Artistas

contemporâneos trabalhando em Nova Iorque, não enfraqueceu o significado

das

Artes

Visuais,

mas,

em

vez

disto,

ampliou

nosso entendimento do que é possível. Arte para a Educação Industrial Antes Estados

da

Unidos

Guerra era

Mundial,

associada

a

ao

Educação

em

treinamento

Artes do

nos

Desenho

Industrial. Um sistema de Educação para preparar os designers foi adotado do sistema de South Kensington de Arte Educação, da Inglaterra. Estes Professores de Artes esperavam introduzir habilidades de desenho apropriadas para avançar o estado de Design de um jovem país. Os Estados Unidos perceberam que a Grã

Bretanha

estava

perdendo

seu

posto

em

manufaturas

e

comércio por pelo menos os últimos 25 anos, na segunda metade do

século

XIX

(CHALMERS,

2000).

Em

comparação,

os

Estados

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

180


REVISTA

APOTHEKE Unidos estavam atrás da Grã Bretanha, então, algo deveria ser feito

para

corrigir

esta

deficiência

(CHALMERS,

2000).

O

argumento econômico para produtos melhor desenhados requeria habilidades

artísticas

superiores,

as

quais

exigiam

uma

infraestrutura educacional para uma Arte Educação técnica. Walter Smith (1836-1886), outrora diretor da Escola de Artes em Leeds, era o instrutor treinado de South Kensington, contratado

pelo

Estado

de

Massachusetts

para

introduzir

um

sistema de Educação em Design nas escolas públicas de Boston (CHALMERS, House,

2000).

Smith

vitoriano

foi

Como

estudante

colega

Christopher

de

Dresser.

na

London’s

classe

do

George

Wallis

Marlborough

notório

Designer

(discutido

na

parte 2) lecionou na escola deles inúmeras vezes, durante os anos de 1840, quando Dresser e Smith eram estudantes e tinham uma forte influência no corpo estudantil (HALÉN, 1993). Como Smith era Graduando da South Kensington, existe uma ligação teórica entre as antigas iniciativas de Arte Educação, nos Estados

Unidos,

e

programas

de

Arte

Educação

aprimorados

durante o século XIX, na Bretanha. Smith (1873, p.42) declara que “o tipo de desenho que o Estado de Massachusetts requer e exige para que seus cidadãos tenham uma oportunidade de estudo é chamado ‘desenho industrial’... um importante elemento no sucesso do comércio e das manufaturas”. Dentro do amplo contexto da Revolução Industrial, estes designers criaram padrões, decoração e ornamentos para itens desde papel de parede até encosto de cadeiras e desenhos de carpetes. A apreciação pública do design e seu ofício foram resultado

de

uma

educação

apropriada,

elevando,

assim,

a

percepção estética da população que produzia e comprava tais produtos (SMITH, 1873). A educação de estudantes e um aumento do bom design no mercado cultivaram o público como um todo. Smith não apoiava o desenho para fins estéticos, em vez disto, ele pensava que “o desenho deveria ser considerado como um ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

181


REVISTA

APOTHEKE servo ou veículo, para ajudar a expressão no estudo de outros assuntos, como é na Geografia, por meio de desenhos de mapas” (SMITH, 1873, p.10). Foi uma aplicação prática do ensino das Artes,

onde

pragmático. Americana,

estudantes Como

a

uma

Arte

era

aprenderam primeira

ensinada

um

ofício

que

era

iniciativa

educacional

propostas

industriais,

para

entretanto, conforme os tempos mudaram, também mudou a forma que a Arte foi sendo ensinada. Arte como agente cultural Após a década de 1920, o propósito industrial do ensino da Arte enfraqueceu enquanto distinção das oportunidades que o design tomou lugar. A Arte passaria a ser ensinada para fins culturais (EFLAND, 1990). A apreciação da Arte por ela mesma e as maravilhas da natureza eram justificativas suficientes para estudar e ensinar Arte. Ruskin (1971) defendeu uma opinião semelhante, em que o estudo da natureza leva o indivíduo a entender Deus e a moral. Na verdade, a fé, a moral e o império foram todos relacionados à Arte (BELL, 1978). Semelhante aos movimentos

de

educacionais

Arte,

que

foram

reagiram

construídas

um

ao

sobre

outro,

ou

filosofias

reagiram

contra

teorias anteriores. Como Professor de Arte na Universidade de Oxford

e

movimento

autor do

de

Elementos

design

de

industrial,

Desenho,

Ruskin

criticando

reagiu

sua

ao

abordagem

fabril e a falta de influência artística (MACDONALD, 1970). Além foram

disso,

praticadas

muitas

teorias

simultaneamente,

concorrentes ao

invés

progressiva ou uma compreensão de ideias.

de

trabalharam uma

e

melhoria

A História tende a

lembrar a teoria dominante até críticas históricas recentes. De algum modo, as ideias de Ruskin tiveram pouca influência na Educação Pública, porque ele não era politicamente envolvido e seus escritos eram, às vezes, muito vagos e mal interpretados ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

182


REVISTA

APOTHEKE (MACKDONALD, 1970). Até que em 1872, Ruskin abriu a incipiente Escola de Desenho Ruskin (Rusking Drawing School), praticando o South Kensington - sistema mencionado anteriormente. Para entender a História da Arte Educação do século XX, nos Estados Unidos, Efland (1990) categoriza as maiores áreas na

instrução

Racionalista

artística e

como

Reconstrutivista,

Expressionista.

Estas

Científica,

categorias

foram

construídas para organizar as diversas aplicações e teorias, e para servir como uma ferramenta útil na compreensão das várias bases teóricas. Siegsmundo (1998) também usa estas categorias para o seu propósito de expressar a ausência de um centro. Criticamente, eles servem como marcadores nas quais as várias e diversas Teorias da Arte Educação podem ser discutidas fora de uma linha do tempo ou cronologia. Defensores da corrente Expressionista mantém a ideia de que

ensinar

Arte

facilita

as

habilidades

imaginativas

e

autônomas do estudante, com a expressão como sendo o objetivo principal. Arte como um agente expressivo e origem para o ensino é um tema dominante ao longo do século XX e do século XXI, aparecendo de diferentes formas. Primeiro, o Movimento Progressista,

defendido

por

John

Dewey

(1944)

e

Andreas

Kazamias (1966), realizado através de um currículo centrado no estudante (EGAN, 2002).

Isto é significante em comparação a

um currículo centrado em matérias no qual uma lista definida de

objetivos

é

produzida

e

despejada

em

cada

estudante.

Herbert Spencer (1966) defendeu o progresso como darwinismo social. Como a sociedade industrial, no século XIX, progrediu, também deveria a Educação progredir. De acordo com Spencer, isso

poderia

ser

realizado

pela

busca

de

conhecimento

científico de maior valor e não de informações irrelevantes. O

trabalho

de

Dewey

é

mais

reconhecido

do

que

o

de

Spencer, mas as ideias de Dewey são construídas a partir da fundação alicerçada por Spencer (EGAN, 2002). A crença central ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

183


REVISTA

APOTHEKE que

por

trás

do

progressismo

é

a

de

que

atendendo

a

natureza do estudante, seu modo de aprendizado e estágios de desenvolvimento,

este

é

o

modo

como

eles

aprendem

(EGAN,

2002). O currículo centrado na criança aborda cada estudante como um único ser e a informação deve ser fornecida apenas quando o estudante está pronto. Isto pode ocorrer através de questionamento, exemplo,

o

diálogo

instrutor

ou

observando

apresentaria

uma

o

estudante.

perspectiva

Por

quando

o

trabalho do estudante poderia se beneficiar de tal instrução para

expressar

ele

mesmo,

inteiramente.

Nesta

situação,

o

estudante aplica seu conhecimento recente quando ele(a) deseja ou necessita. Uma corrente avançada de pensamento progressista continua, contemporaneamente, em todos os níveis de Educação nos Estados Unidos, com muitos educadores esperando que isso resolvesse os desafios educacionais do período. É comum ver uma atenção individualista como essa em campos Universitários, além de Escolas Básicas, em diversos formatos.

184

O Expressionismo é também alinhado com o Movimento da Arte Moderna e teorias que se desenvolveram durante o século XX.

A

expressão

própria

era

valorizada

e

representava

um

distanciamento da indústria e do comercialismo. “A maioria da Educação Artística auto expressiva, como eles ... defenderam, era por Artistas que estavam profundamente inspirados com a convicção de que existe uma afinidade entre a atividade do Artista e a expressão gráfica da criança” (EFLAND, 1990, p. 196). Franz Cizek, um influente Professor vienense, esperava libertar

a

criatividade

defendendo

um

“tirar

a

tampa”,

abordagem similar da Educação baseada em Emile, de Rosseau (1764/1979)

totalmente

natural

e

não

influenciada

pela

sociedade. Siegesmund (1998, p. 200) afirma que o uso da “Arte como um veículo para expressar a emoção é postulado como essencial para a liberação das preocupações cognitivas onerosas e acesso ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE para o inconsciente, que juntos resultam em um desenvolvimento positivo do crescimento”. A Arte torna-se um assunto leve, de acordo

com

Siegesmund,

não

implicando

em

resultados

acadêmicos. É um lugar para clarear a mente e tornar-se um indivíduo bem equilibrado. Apesar das conclusões de Siegesmund serem

questionáveis,

Educação

que

assunto

tem

de

sociedade.

ele

sido

interesse Contudo,

levanta

um

aspecto

para

criticado

e

incompreendido

individual

e

não

sem

a

corrente

relevante

a

Arte

como para

Expressionista,

um a os

princípios do Progressismo não teriam suportado tornarem-se a filosofia

dominante

no

campo

da

Educação

(EGAN,

2002).

O

Expressionismo representa um aspecto e força na área do ensino que muitos continuam a abraçar (ou adotar). Um

grupo

Expressionismo

de

Artistas-Professores

tradicional,

arraigados

rotularam-se

como

no

Artistas-

Professores no início do século XX, enquanto alcançavam ideais progressistas

(EFLAND,

1990).

Em

essência,

este

grupo

de

Professores, incluindo Victor D`Amico, sentiu que o ato de ser Artista

os

colocaria

numa

posição

melhor

para

liberar

e

facilitar a natureza criativa dos alunos, algo que um não especialista em Arte não poderia fazer, porque eles não teriam a experiência necessária de ser um Artista. Antes disso, era comum as Artes Visuais não serem ensinadas por Professores de Arte. Invocando a Filosofia Progressiva e o Movimento de Arte Infantil, mencionado anteriormente, este currículo centrado na criança atendeu às necessidades individuais dos estudantes. Esta experiência de ser Artista colocou o Artista-Professor em uma

posição

estudantes

melhor que

para

estavam

reconhecer encontrando

e

trabalhar

problemas

com

os

artísticos

similares aos que os Professores também haviam encontrado. Reconstrutivismo

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

185


REVISTA

APOTHEKE Através

da

corrente

Reconstrutivista,

Efland

(1990)

escreve como a Arte tem sido usada como um agente para a transformação desde

social.

Artistas

A

partir

individuais

de a

investigações grupos

pessoais,

organizados

de

profissionais em Arte preocupados com mudanças no mundo, a Arte

é

uma

cultural.

poderosa

ferramenta

Morais/valores,

para

democracia

e

provocar

a

cidadania,

mudança têm

sido

todos tópicos populares dentro desse paradigma e não é preciso viajar muito longe para perceber o poder da Arte para mudar ou desafiar o processo de pensamento e ações do público em geral. Usar a Arte como uma lente para engajar-se criticamente com condições

sociais

e

valores,

ao

invés

de

vê-la

como

uma

disciplina, libera esta corrente de pensamento, cuja base pode lutar por várias causas, incluindo pureza do ar, reciclagem, direto

das

mulheres,

controle

de

armamento,

mudanças

no

governo ou salvar espécies em risco de extinção, isso para citar apenas algumas.

186

A Arte para o nacionalismo foi uma reação ao envolvimento da América na 2ª Guerra Mundial. Efland (1990, p.231) captura o aspecto essencial deste movimento ao afirmar que “a guerra representou um desafio especial para os Arte Educadores, que tiveram

que

demonstrar

compromissada democracia, pessoal”.

com a

Logo

a

que

luta

mesma que

a

para

liberdade a

economia

Arte

era

preservar que se

ideologicamente

a

liberdade

permitia lançou

a

para

e

a

expressão suportar

o

esforço da guerra, a Arte Educação seguiu com projetos para promover

mensagens

de

apoio

para

as

tropas

no

exterior.

Artistas contemporâneos que ensinam ou fazem Arte para causas sociais defendem ideologias similares. A Sociedade Internacional para a Educação através da Arte (INSEA)

foi

fundada

em

1951

com

o

propósito

de

trocar

informações em relação às Artes Visuais, em uma Arte para o movimento de paz (EFLAND, 1990). A Arte tem a habilidade de ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE expressar

assuntos

difíceis

e

serve

como

porta-voz

para

o

engajamento. A Arte para o movimento de paz é um exemplo no qual o fazer Arte, o processo artístico e a apreciação foram usados para promover a consciência ou arrecadar dinheiro para causas importantes. Usar a Arte para promover a paz continua sendo

uma

estratégia

para

indivíduos

e

comunidades.

Nesta

perspectiva, a INSEA continua o diálogo facilitando o debate através de conferências, projetos especiais e publicações. A corrente

Reconstrutivista,

maleabilidade

e

a

força

mais

abrangente

tarde,

ilustrou

a

da

Educação.

Em

Arte

essência, o Reconstrutivista pensa que a Arte Educação diz respeito

à

consciência

crítica

ao

invés

da

apreciação

ou

expressão. Neste paradigma, a Arte se torna uma ferramenta para propósitos e disciplinas sem limites. Racionalismo Científico

187 Efland ideias

(1990)

que

têm

descreve

raízes

na

o

racionalismo

ciência

e

científico

afirma

que

como

todos

os

problemas filosóficos podem ser resolvidos através de métodos científicos.

Esse

movimento

ou

corrente

de

influência

se

apropriou de disciplinas definidas pela Ciência como um ponto de

início

objetiva Embora

para para

o

a

reforma.

observar

racionalismo

Também,

postula

empiricamente científico

os

possa

uma

perspectiva

fenômenos falar

de

físicos. condições

físicas, é impossível ter uma visão objetiva separada do modo como entendemos o mundo. Como o filósofo Thomas Nagel (1986) reconhece,

somos

os

primeiros

obstáculos

no

caminho

da

realidade objetiva - Nagel não pensa a realidade como apenas algo físico. O progresso da Ciência não é dividido ordenadamente a partir

das

correntes

de

influência

Reconstrutivista

e

Expressionista. Na realidade, as descobertas científicas do ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE século XIX abasteceram os primeiros pensamentos progressistas através

de

pessoas

descobertas

de

como

Charles

Herbert

Darwin

e

Spencer, sua

que

Teoria

usava

da

as

Evolução

(EFLAND, 1990; Egan, 2002). A separação e categorização serve como uma ferramenta de organização para conectar ideias que contém

fundações

diferença

de

conceituais

doutrinas

similares.

fundamentais

A

variedade

tece

uma

e

complexa

tapeçaria conforme as ideias surgem e são tecidas dentro do panorama

da

filosofias

Arte

são

Educação.

menos

Em

efetivas

ou

retrospectiva, mesmo

algumas

prejudiciais

-

o

conceito de Herbert Spencer a respeito de qual conhecimento é de

maior

expandem

valia

-

para

horizontes

desenvolvidos

e

(Teorias

a

Arte

Educação,

continuam do

a

enquanto

ser

outros

pesquisados

Progressivismo).

À

luz

e

destes

movimentos, as correntes históricas de Arte Educação estão em constante movimento.

188 Produzindo Artistas ou produzindo pessoas artísticas? Dadas as várias teorias e ideologias praticadas no campo da Arte Educação, no passado e no presente, o que aconteceu ao preparar os Artistas? Uma resposta fácil é dividir o ensino escolar do ensino acadêmico e usar o divisor estereotipado de que

Professores

de

escola

preparam

jovens

e

crianças

para

aprender sobre as Artes (ou, possivelmente, uma das várias justificativas atmosfera

anteriormente

acadêmica

prepara

mencionadas), Artistas.

enquanto

Entretanto,

que

a

também

argumentei que a Academia pratica um método de Arte Educação contraditório, portanto preparar Artistas não é um objetivo suficiente,

consistente

ou

notável

para

ser

um

Artista

Professor. Se aceitarmos o caso relevante de Arthur Danto (1992), de que as fronteiras entre a alta e a baixa Arte foram quebradas ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE para

além

da

divisão

entre

Belas

Artes

e

o

processo

industrial, há um ofuscamento da educação que um indivíduo recebe na grade escolar comparada à da Universidade? Nenhum destes dois contextos tem um currículo constante e o Professor Escolar é um produto da Universidade. Por conta da relação próxima

dos

Professores

Escolares

de

hoje

em

dia

e

dos

Professores Universitários, Professores da Educação Básica e da Superior, aderem às estruturas similares. Como alguém que trabalha em ambos os mundos, estou constantemente confuso se há uma diferença ou se isto deveria realmente importar. Atualmente,

pensamento

visual

é

um

termo

usado

para

justificar o estudo da Arte em todos os níveis. Assim, os recentes desenvolvimentos da Arte Educação estão fazendo esta divisão bastante leve, o que acredito ser uma grande força. Conforme os estudantes da Escola Básica estudam os movimentos artísticos e exercícios de desenho, o Professor espera que estes

exercícios

preparem

seus

estudantes

para

serem

inteligentes apreensores do mundo. Isto está na mesma veia dos estudantes

de

Arte.

impressionante,

O

crescimento

especialmente

da

porque

prática existe

artística

mais

é

Artistas

praticando hoje em dia que todos os Artistas da Renascença juntos.

Embora

indústrias

da

haja, Arte,

a

atualmente,

aspectos

maioria

Graduandos

dos

prósperos em

Arte

das das

Faculdades da nação não suportarão à si mesmos como Artistas tradicionais. Uma situação similar existe com a maioria dos Bacharéis (todos os Bacharéis em Matemática não se tornarão matemáticos).

Esse

argumento

é

usado

diversas

vezes

por

Professores da Escola Básica (que perceberam que todos os seus estudantes não se tornarão Artistas) em suporte à um currículo que

apoia

filosofias

desenvolvimento

de

educacionais

estudantes

alternativas,

equilibrados

ou

como

pensadores

críticos. Assim tornar-se um Artista não é sempre o objetivo da Educação Básica ou da Universidade. Afinal, Graduados não ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

189


REVISTA

APOTHEKE estão

limitados

a

se

tornarem

Matemáticos

ou

Historiadores

quando recebem estes diplomas. O propósito da educação não é mais amplo do que a preparação para o trabalho? Hetland

et

al.

(2007)

hipotetiza

oito

disposições

cognitivas e atitudinais dentro de programas de Arte: -

desenvolver

habilidades

que

incluam

aprender

a

usar

ferramentas; - empenhar-se e persistir através de problemas com foco; - visionar o que não pode ser observado; - expressar ideias através da Arte; - observar e desenvolver habilidades visuais; - refletir sobre, questionar e avaliar o seu trabalho; - expandir e explorar além de suas capacidades; - entender o mundo da Arte e o contexto da História da Arte. As disposições se combinam para representar processos de pensamento no estúdio facilitados por programas de Arte de qualidade.

Estes

objetivos

combinados

poderiam

ser

considerados uma forma artística de pensar o ensino. Organizálos e aplicá-los nas salas de aulas e estúdios poderia ser similar a aplicar os elementos e princípios do Design. Arthur Wesley Dow (1899/1926) organizou um sistema estrutural para desenhar

imagens

em

seu

texto

composition.

Elementos

como

notan³ , linha e cor foram definidos e demonstrados como forma de controlar os produtos estéticos. Saber quais combinações de elementos usar – ou apenas estar ciente do que elas são –, desperta possibilidades na criação de composições. Ao invés de produzir

a

mesma

imagem

repetidamente,

um

conjunto

de

diretrizes é estabelecido (que contemporâneos podem seguir ou quebrar)

para

organizar

suas

criações.

Os

elementos

e

princípios do Design, através de Dow, tornam-se uma ferramenta de organização estética. Na sala de aula, elas adquirem outra ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

190


REVISTA

APOTHEKE linguagem,

incluindo

exploração.

Combinar

técnicas a

motivacionais,

mistura

correta

pesquisa

das

e

disposições

educacionais similares aos princípios de Dow, levam à criação de uma experiência relevante de aprendizado. A metáfora do Artista

funciona

perfeitamente

Artista

Professor

molda

e

nesta

cria

situação,

poderosos

conforme

o

ambientes

de

reorganizada

e

aprendizado. Ensinar redefinida

Arte em

circunstâncias

é

uma

tradição

numerosas culturais

que

instâncias e

foi

para

contextuais.

E

se

adaptar

Arte

às

Educadores

reajustam a composição do ensino a fim de potencializar seu efeito. A natureza estética de ensinar Arte é valiosa para impulsionar como uma metáfora. Similar a um pintor retrabalhando uma tela, novas ideias emergem

e

diferentes

algumas

instâncias

em

parcerias vez

de

tornam-se

outras.

De

importantes modo

similar,

em o

Artista Professor também ajusta a composição da sala de aula, mudando lógicas, filosofias e, às vezes, a elaboração, para melhor capturar e comunicar o que é importante. *** O ancestral comum da profissão de Artista Professor se empresta a quebrar barreiras entre os níveis de instrução de Arte

desde

a

Educação

Infantil

à

Universidade.

A

atual

adaptação da Academia tem contribuído para este entendimento democrático

reforçando

ideais

pluralísticas,

que

afirmam

múltiplas perspectivas. Felizmente, as Artes têm a habilidade de se deslocar e se ajustar à mudança, uma grande força que garante a prática da Arte, apreciação e Educação serão sempre um serviço à sociedade. Perceber essas trocas e mudanças e como

elas

são

manipuladas,

remonta

às

várias

decisões

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

191


REVISTA

APOTHEKE estéticas que um Artista faz quando cria uma peça de Arte, por exemplo. Enquanto que um Artista usa várias linhas para comunicar emoções

particulares,

objetos

táteis,

ambiente

de

o

Professor

ruído/voz

aprendizado

e

que

de

Arte

conceitos é

também

para

conducente

manipula

produzir

ou,

às

um

vezes,

obstrutivo para o aprendizado. Assim, as razões para ensinar não fazem o Artista Professor. Na realidade, as justificativas para a Arte Educação, em todos os níveis, são mais próximas do que pensado anteriormente. Além disso, a Educação não aparenta fazer o Artista Professor, embora, certamente contribua para a sua autoestima. O verdadeiro conceito em aplicar uma forma estética para enxergar e entender é o fator central que requer abranger

um

pensamento

profundo

sobre

ser

um

Artista

Professor. ¹ Texto Original: DAICHENDT, James. Artist Teacher: A philosophy for creating and teaching. Chicago-USA: The University of Chicago Press, 2010, p. 3-27. ² Uma punição anteriormente utilizada no serviço militar em que um indivíduo é forçado a correr entre duas linhas de homens armados, que vão batendo enquanto o outro percorre o centro. ³

O

termo

japonês

“Notan”

é

usado

por

Dow

para

representar

a

qualidade do claro e escuro na gradação de tons. “Notan-Beauty” é também

usado

para

representar

a

harmonia

resultante

de

espaços

claros e escuros.

G. James Daichendt, Ed.D. Dean, Arts and Humanities Point Loma Nazarene University E-mail: jimdaichendt@pointloma.edu www.artistteacher.com Tradução: Fábio Wosniak Revisão em Inglês: Bárbara Cidral Revisão em Português: Luciana Finco Mendonça

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

192


REVISTA

APOTHEKE

193

ENSAIOS ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

194

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

195

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

196

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

197

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

198

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

199

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

200

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

201

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

202

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

203

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

204

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

205

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

206

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

207

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

208

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

209

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

210

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

211

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

212

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

213

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

214

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

215

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

216

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

217

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

218

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

219

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

220

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

221

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

222

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

223

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

224

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

225

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

226

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

227

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

228

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

229

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

230

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

231

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

232

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

233

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

234

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

235

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

236

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

237

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

238

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

239

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

240

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

241

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

242

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

243

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

244

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

245

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

246

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

247

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

248

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

249

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

250

NOTAS SOBRE EXPERIÊNCIA ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE O exercício de Albers como propulsor da experiência de Dewey Adriane Cristine Kirst Andere de Mello (UDESC)

251

Exercício com papéis – Quando 3 cores parecem 4 (Projeto Albers – Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke)

Dois importantes teóricos norteiam os estudos do Estúdio de Pintura Apotheke, são eles: John Dewey e Joseph Albers. O primeiro,

John

Dewey,

nasceu

nos

Estados

Unidos

em

1859,

psicólogo, filósofo, professor e cientista político e social, foi um dos fundadores do pragmatismo e da educação progressiva. O pragmatismo, segundo Kaplan (2010), na introdução do Arte como Experiência, “[…] não é um oportunismo na busca de fins materiais,

mas

uma

avaliação

de

meios

e

fins

por

suas

condições e consequências na experiência” (p. 9). Para Dewey, o pragmatismo é fundamentalmente uma revolta contra o hábito mental,

ou

seja,

aquilo

que

fica

unicamente

no

plano

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

das


REVISTA

APOTHEKE ideias. Contudo, é importante ressaltar que sua filosofia não se restringe ao plano da ação, mas parte dela, para ampliar-se na filosofia do pensamento e do sentimento (KAPLAN, 2010, p. 11). Por sua vez, Joseph Albers nasceu na Alemanha em 1888, um artista, professor, designer, fotógrafo, tipógrafo e poeta. Em 1933, migrou para os Estados Unidos e foi lecionar na Black Mountain

College,

uma

instituição

educacional

de

ensino

superior, voltada principalmente para o ensino de Arte, que possuía

nas

suas

bases

grande

influência

das

teorias

pedagógicas de John Dewey. Ambos partem da concepção de que o aprender ocorre na experiência. A experiência é algo complexo na teoria de Dewey (2010). Ela

faz

perceber

as

diferenças

entre

aquelas

banais

e

as

significativas; as interrompidas e as que têm repousos; as que cessam e as que terminam em uma consumação; as intelectuais e as

estéticas.

Para

Dewey

(2010),

um

dos

problemas

da

aprendizagem é não perceber a importância de se entregar, e abrir-se para perceber as coisas sem pressa, “[…] para ver uma paisagem tal como o geólogo a vê” (p. 136). Um olhar atento está

intimamente

segundo

o

autor,

ligado ela

é

à tida

experiência como

algo

estética,

contudo,

ocasional,

e,

como

consequência, ocorre um distanciamento entre Arte e público. O olho e o aparelho visual podem estar intactos, e o objeto pode estar fisicamente presente – a Catedral de Notre Dame ou o retrato de Hendrickje Stoffels pintado por Rembrant. Em um sentido simples, os objetos podem ser “vistos”. Podem ser olhados, possivelmente ser reconhecidos, e ter os nomes corretos ligados a eles. Mas, por falta de uma interação contínua entre o organismo total e os objetos, estes não são percebidos, decerto não esteticamente (DEWEY, 2010, p. 136).

É na experiência que Albers leciona. É dela que nasce sua teoria das cores, nos exercícios empíricos que fazem ver a interação e a instabilidade inerente a elas. Em suas aulas, ele põe em prática a teoria de Dewey. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

252


REVISTA

APOTHEKE A

percepção,

para

Dewey

(2010),

é

distinta

do

reconhecimento, sendo, também, mais verídica para com aquilo que se olha. Para ele, só se pode ver o que se espera ver. De modo geral, desprende-se pouco tempo para a contemplação. “Ver, perceber, é mais do que reconhecer” (p. 91). Assim

como

Dewey

(2010),

Albers

(2013)

entende

que

a

percepção vai além do reconhecimento e funda sua teoria da cor, justamente na percepção a partir da experiência, fato que o tornou fundamental na área da Arte, pois quebra paradigmas em relação às teorias mecanicistas. Para Albers (2013), não é possível sempre planos.

estudar

em

um

Ela

a

cor

contexto, é

relativa,

isoladamente,

pois

envolvida

formas,

em

confunde,

e

ela

isso

se

encontra

contrastes

fica

claro

e

nos

exercícios que propõe. Por exemplo, quando duas cores iguais parecem sobre

ser

diferentes,

outras

cores,

ou

simplesmente ao

por

contrário,

estarem quando

dispostas

duas

cores

diferentes parecem uma mesma, ou ainda, quando há a ilusão de transparência. A cor tem muitas faces, e uma pode se fazer parecer duas cores diferentes. No design original para o estudo IV I, as listras azul-escura e amarela, na horizontal, podem ser levantadas para mostrar como a tira de cor ocre, na vertical, é da mesma cor, tanto na parte superior, como na parte inferior. Aqui é quase inacreditável que os pequenos quadrados superior e inferior sejam parte da mesma faixa, e, portanto, da mesma cor. E nenhum olho humano normal é capaz de ver os dois quadrados como iguais (ALBERS, 2013 – Trad. nossa).

Albers dirigiu sua atenção ao estudo da cor, percebendo que não é válido estudá-la isoladamente. É possível visualizar a

influência

de

Dewey

(2010),

que

de

modo

mais

amplo,

compreende que não é concebível estudar a Arte ou ter uma experiência estética isolando-as da vida. Ao contrário, é na interação efetiva que o acontecimento se dá.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

253


REVISTA

APOTHEKE Exercício: interação e percepção

254

Exercício com papéis – Escalas, transparências (Projeto Albers – Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke)

Quando Albers (2009) propõe aos seus alunos exercícios para

que

percebam,

descubram,

investiguem,

produzam

a

interação da cor, ele acaba por impulsionar, ao mesmo tempo, para que aconteça uma experiência mais profunda com aquilo. Por meio da pesquisa e investigação empírica torna o objeto de estudo revelador, contribui para que aconteça, então, aquela experiência atenta, singular, da qual nos fala Dewey (2010). Ao fazer os exercícios que Albers (2009) convida, ou seja, ao

experienciar

procurando próximas,

os

empiricamente papéis,

analisando

a

o

que

é

proposto,

selecionando

as

paleta,

sobre

tom

cores, tom,

coletando,

colocando-as para

depois

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE recortar

os

papéis,

fazer

uma

quase

curadoria

de

como

apresentar, notar os valores tonais primeiro, a escala, ir do claro para o escuro, encontrar os tons intermediários. Compor, brincar, montar de diferentes formas. Não colar, ou prender e estabelecer um fim, mas deixar aberto para outras descobertas. Primeiro do branco para o preto, depois com outras cores, muitas

paletas.

Investigar

a

transição

entre

as

cores.

Observar a intensidade, o brilho, a opacidade, a transparência, a luz, a sombra, o espaço, ou seja, como tudo age e reage no modo de perceber a cor. A

cor

não

é

estática.

Ela

interage,

atua,

modifica,

camufla, confunde o olho. Albers (2009) indica isto no fazer, mostra esses acontecimentos em ato, em exercícios. Na

pedagogia

de

Albers

(2009)

era

incentivado

o

autoconhecimento, quando o aluno é estimulado a ter interesse, curiosidade em investigar. Podem-se elencar alguns princípios nos quais suas práticas e estudos sobre a cor se fundavam. Como por exemplo, para ele, a percepção visual dificilmente vê a cor como é fisicamente; a cor é o material mais relativo; sempre engana; provoca várias leituras; é prudente que seja estudada em comparação ou contraste com outra; o fato físico não condiz com o psíquico. A prática vem antes da teoria é deste preceito que parte, e os exercícios que propõe não tem o objetivo

de

ilustrar,

pois

são

modos

de

interagir

(ALBUQUERQUE, 2013). Albers

(2009),

na

artista/professor/pesquisador,

sua por

meio

prática dos

exercícios

como que

proporcionavam aos alunos formas de investigar e descobrir, relaciona-se diretamente com as teorias propostas por Dewey (2010). O exercício, a atividade consciente, é que detona a experiência, as descobertas, os devaneios: O artista interessa-se pelo exercício de atividades dotadas de uma referência claramente objetiva – um efeito sobre o material, a fim de convertê-lo em um ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

255


REVISTA

APOTHEKE veículo de expressão. Brincar continua ser uma atitude de liberdade da subordinação a um fim imposto por exigências externas, em contraste com o trabalho pesado, mas se transforma em trabalho pelo fato de essa atividade estar subordinada à produção de um resultado objetivo. Ninguém jamais observou uma criança absorta em sua brincadeira sem se conscientizar da completa fusão do brincar com a seriedade (p. 480).

O

autor

faz

notar

a

importância

do

exercício,

da

experimentação, do brincar com os materiais, sem a obrigação do produto final. Contudo, é nesse processo que o produto, a fatura, vai se moldando e acontecendo, para então culminar na criação de algo.

REFERÊNCIAS ALBERS, Joseph. Interaction of color. London: Yale University Press, 2013. ALBUQUERQUE, Marcelo. Laboratório de cor: paradigmas do estudo da cor na contemporaneidade. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Artes da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2013. DEWEY, John. Arte como experiência. São Paulo: Martins Fontes, 2010. KAPLAN, Abraham. Introdução. In: DEWEY, John. Arte como experiência. São Paulo: Martins Fontes, 2010. Adriane Cristine Kirst Andere de Mello http://lattes.cnpq.br/1209118072455218 Possui Bacharelado e Licenciatura em Artes Plásticas pela Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC, Mestrado em Artes Visuais (Ensino) e atualmente cursa o Doutorado em Artes Visuais (Ensino), também pela Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

256


REVISTA

APOTHEKE Experiência, percepção e pedagogia da cor Juliano Siqueira (UEL/UDESC)

A percepção é o ponto de contato entre a pedagogia da cor e a noção

de

experiência

estética

de

Dewey.

Para

Dewey

a

experiência estética está diretamente relacionada à percepção do objeto, ao contrário das correntes da Estética que situam este

tipo

de

experiência

como

algo

meramente

mental,

conceitual. Não que a experiência intelectual para Dewey não possa ser estética. Uma experiência intelectual pode até ser estética; todavia uma experiência estética nunca é meramente intelectual.

Neste

sentido

a

percepção

não

está

sempre

texto

refere-se

principalmente

subordinada ao intelecto. Pedagogia

da

proposições Basiaco,

cor dos

Miguel

discípulo

de

neste artistas Angel

pintura

Josef

Pareja de

Albers,

e

Roger

Pareja

que

Silvestre

Bissière.

estudou

em

às

Peciar

Peciar 1937

é

com

Bissière em Paris. Busca-se neste texto articular as ideias destes artistas com a noção de experiência estética de Dewey. Roger Bissière ensinava sobre a cor e deixava o desenho de seus discípulos sem orientação, nem crítica. Deixar o desenho livre

é

um

princípio

pedagógico

no

sentido

de

respeito

absoluto à iniciativa pessoal. Todavia falava sobre o “sentido da

cor”.

Nenhuma

teoria,

somente

a

sensibilidade,

a

experimentação e a intuição de uma cor que se constrói pelas relações

de

finalmente

cada o

cor

sentido

no do

contato todo

que

com

as

compõe

outras o

cores

e

conjunto:

a

harmonia. A pedagogia da cor herdada por Peciar propicia a pintura-pintura, sem literatura, sem realismo, sem fantasias, sem conteúdos conceituais. Ver a cor. A percepção é a base como em Alber. O caminho é a experimentação como em Dewey; experimentação apaixonada, às vezes dolorosa e solitária. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

257


REVISTA

APOTHEKE Peciar ao apresentar a pedagogia de Bissière, destaca que ele não corrigia as cores “sujas” ou “mal colocadas”, não corrigia as cores que se afundavam ou saltavam do plano. Sua pedagogia levava o estudante a duvidar da cor, do tom, do matiz que destrói a intenção harmônica; sem receitas, sem fórmulas, sem teoria,

sem

intelectualismo.

“Análise”

sensível,

dúvidas

e

ênfase nos encontros felizes das cores. Nesta pedagogia cada centímetro quadrado deve ter sua cor com toda consciência de claro-escuro, de frieza ou de calor. Tudo é cor! A cor nasce na

paleta,

depois

sensibilidade pesando

seu

para tom,

o

toque

avaliar seu

a

no

lugar

forma

matiz.

A

cor

correspondente;

colorida na

no

busca

da

conjunto, unidade

indissolúvel da grande variedade, sem destoar. Peciar fala de todas as cores “cantando” e se fazendo ouvir sem estridência. Esta pedagogia da cor de Bissière-Pareja-Peciar se aproxima da maneira

experimental

de

estudar

e

ensinar

desenvolvida

por

Albers, onde a cor é o mais relativo meio empregado na arte, que nos engana e ilude continuamente. Albers confirma que as leis e normas de harmonia cromática não são pressupostos da experimentação,

ele

investe

em

estimular

os

estudantes

a

produzir efeitos cromáticos definidos através da apreciação da interação das cores. O objetivo é desenvolver a vista para a cor através da experiência mediante um processo de “tateio”, ou seja, observar a ação das cores e senti-las. Sua docência desenvolve a capacidade de observação e articulação. Numa aproximação destas pedagogias das cores com a experiência de

Dewey,

podemos

pensar

num

rompimento

com

a

concepção

dualista teoria e prática. Parte-se da prática experimental, único ponto donde pode derivar-se esta “teoria das cores”. Nenhum sistema de cor, afirma Albers, pode desenvolver por si só a sensibilidade necessária para perceber a relatividade e falta de estabilidade das cores. Nesta pedagogia o que conta não é o conhecimento de fatos, mas sim a visão, o ver. ParteISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

258


REVISTA

APOTHEKE se de uma constatação visual da interação das cores até chegar a uma consciência da interdependência da cor com a forma e sua localização, com a intensidade luminosa e com a tonalidade. Como Bissière, Albers não dá respostas concretas, mas sugere modos de estudo da cor. Esta pedagogia da cor refere-se a um dos princípios básicos de Dewey: “a experiência é uma questão de interação do organismo com seu meio”. Experiência como interação quer dizer que nunca é meramente mental, nem meramente física, por mais que um desses fatores predomine. Dewey problematiza a ideia que supõe que a experiência ocorra dentro de um “eu”, dentro de uma mente. Quando se rompe a relação do ser com o mundo, somos divididos em fragmentos. Dewey considera a interação continua e

variada

com

o

ambiente,

ao

contrário

das

correntes

da

Estética que separam o organismo e o mundo, com base na ideia que

a

qualidade

estética

não

faz

parte

do

objeto,

mas

é

projetado nele pela mente.

259

Uma pedagogia da cor tem o foco na experiência estética, onde não existe distinção entre o “eu” e o objeto. A experiência é estética na medida em que o organismo e o meio cooperam na instauração

da

experiência,

na

qual

ambos

ficam

plenamente

integrados que desaparecem. Em japonês usa-se o termo Kenshō, em

chinês

Wu,

para

referir-se à

realização

da não-

dualidade entre o sujeito e o objeto. Na

experiência

controle

do

experiências

estética

“eu”,

a

com

questão

‘práticas’

e

a

cor é

não

necessidade

perceptual

‘intelectuais’.

O

diferente ‘sujeito’

do das da

experiência estética fica livre do desejo diante do por do sol ou

de

uma

pintura,

seus

desejos

se

realizam

na

própria

percepção. Ele não quer o objeto em nome de uma outra coisa. Considera-se a percepção por si mesma, como a realização plena de nosso ser psicológico.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE O artista ao usar a cor tem uma experiência em que a ação não é

automática,

mas

tem

um

toque

emocional

e

imaginativo.

Considerando Dewey o foco da pedagogia da cor é a percepção direta,

pois

a

obtusidade

na

percepção

nunca

pode

ser

compensada por nenhum volume de conhecimento, nem pelo domínio de

teorias

substituam

abstratas. a

Não

percepção

existem

sensível

regras

para

se

nem

padrões

chegar

à

que

unidade

construída pelas relações dos planos de cor numa obra. Dewey

ajuda

a

perceber

de

forma

sensível

às

incontáveis

interações que compõem as cores na experiência. Parafraseando Dewey ao abordar a crítica de arte, podemos afirmar que uma pedagogia

da

cor

tem

a

função

de

reeducar

a

percepção,

auxiliar no processo de aprender a ver, eliminar preconceitos, retirar os antolhos que impedem os olhos de ver, rasgar os véus

decorrentes

do

hábito

e

do

costume,

aprimorar

a

capacidade de perceber. A capacidade de perceber é o que aproxima a pedagogia da cor da filosofia da experiência. Peciar lembra que quando damos nomes

às

conceitos antolhos

cores

perdemos

mentais que

esta

tornam-se

impedem

a

capacidade

os

de

percepção;

preconceitos,

percepção

da

os

interação

véus, das

os os

cores;

percepção que está além do pensamento conceitual e do controle do “eu”. Referências: Albers,

Josef;

La

interacción

del

color.

Madrid:

Alianza

Forma, 1980. Basiaco,

Silvestre

Peciar;

Memórias

personales

sobre

la

pintura del maestro Miguel Angel Pareja. Comunicação pessoal do autor, s/ edição; 64p., Montevidéo, 2014. Dewey, John; Arte como experiência. São Paulo: Martins Fontes, 2012. Juliano Siqueira ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

260


REVISTA

APOTHEKE http://lattes.cnpq.br/8014633709940019 Professor no curso de Licenciatura em Artes Visuais da Universidade Estadual de Londrina. Doutorando em Artes Visuais (UDESC). Mestre em Educação e Artes (UFSM). Bacharel em Escultura e Licenciado em Desenho e Plástica (UFSM). Coordenador do PIBID/CAPES/UEL/Artes Visuais (2013-2016).

261

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

262

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

263

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

264

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

265

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

266

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

267

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

268

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

269

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

270

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

271

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

272

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Fábio Wosniak http://lattes.cnpq.br/6525393533253057 Doutorando em Artes Visuais na Linha de Pesquisa de Ensino das Artes Visuais sob a orientação da Profa. Dra. Jociele LampertPPGAV/UDESC; Mestre em Artes Visuais na Linha de Pesquisa de Ensino das Artes Visuais - PPGAV/UDESC; Ator; Pedagogo habilitação em S.I. e E. I /2006 e S.E./2012 FAED/UDESC; Psicanalista; extensão em História, Sociedade e Cultura - PUC/SP e imaginação Infantil e Arte Educação ? PUC/SP. Fábio trabalhou como Coordenador; Assessor Pedagógico e Professor de Artes em instituições Públicas e Particulares de SC e SP. Em São Paulo, Fábio trabalhou nos anos de 2006 - 2011 como Assessor da Prefeitura do Município de São Paulo em Arte Educação, Brincadeiras e Teatro. Vice-Coordenador da Rede de Educadores de Museus de Santa Catarina - REM/SC (Gestão 2013-2015), membro/ pesquisador do Grupo de Pesquisa Arte na Pedagogia Coordenado pela Profa. Dra. Mirian Celeste Martins (Mackenzie/SP), membro/pesquisador do Grupo de Pesquisa Entre Paisagem (UDESC/CNPQ) e integrante do Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke - ambos coordenados pela Profa. Dra. Jociele Lampert (UDESC).Participa como editor assistente no periódico online Revista Apotheke. atuando principalmente nos seguintes temas: Arte Educação, Arte e Pedagogia, Formação Docente em Artes Visuais.

273

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

274

ENSAIO VISUAL ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Sobre cores: estudos do Estúdio de Pintura Apotheke O Estúdio de Pintura Apotheke trouxe, em seu terceiro ano de atuação, a proposta de realização do Projeto Albers para seus pesquisadores. Durante vinte semanas, trabalhamos com tarefas específicas

que

permearam

Albers, Interaction

of

o

conteúdo

Color.

do

Cada

livro

de

Josef

pesquisador

vem

desenvolvendo um projeto final, com estudos a serem realizados fora dos encontros semanais, os quais apontam como proposta de trabalho

estudar

intensidade

e

transparência, partem

do

estudamos

a

sequência

luminosidade, adição

livro,

e

dos

gradação,

subtração.

compreendendo

anteriormente

conteúdos: fundos

Tratam-se

também,

(encáustica,

as

valores,

invertidos,

de

eixos

que

técnicas

que

cianotipia,

antotipia,

colagem, monotipia, aquarela, suminagashi e pintura a óleo). Interaction of Color é uma publicação singular nos estudos das cores e Josef Albers tem sido nossa referência como Artista Professor, estudo

pois

de

articulando

construiu

cores, formação

exercícios

baseados artística

na e

práticos

Arte

como

reflexões

pautados

no

Experiência,

pedagógicas

que

aproximam-se dos escritos de John Dewey. Seu estudo se faz relevante, pois propõe uma percepção sobre o aprender a ver, construindo a percepção do olhar e do fazer artístico. Referências: ALBERS, Josef. A interação da cor. São Paulo: Martins Fontes, 2009. DEWEY, John. Arte como experiência. São Paulo: Martins Fontes, 2010.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

275


REVISTA

APOTHEKE

276

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

277

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

278

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

279

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

280

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

281

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

282

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

283

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

284

QUEM SOMOS ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

Jociele Lampert Desenvolveu pesquisa como professora visitante no Teachers College na Columbia University na cidade de New York como Bolsista Fulbright (2013), onde realizou estudo intitulado: ARTIST'S DIARY AND PROFESSOR'S DIARY: ROAMINGS ABOUT PAINTING EDUCATION. Doutora em Artes Visuais pela ECA/USP (2009); Mestre em Educação pela UFSM (2005). Possui Graduação em Desenho e Plástica - Bacharelado em Pintura, pela Universidade Federal de Santa Maria (2002) e Graduação em Desenho e Plástica Licenciatura pela Universidade Federal de Santa Maria (2003). Professora Adjunta na Universidade do Estado de Santa Catarina. Foi Coordenadora de Estágio CEART/UDESC (2006-2009); Foi Chefe de Departamento de Artes Visuais DAV/CEART/UDESC (20092011); Coordenadora do PIBID/CAPES/UDESC da área de Artes Visuais (2011-2015). Atua no Mestrado em Artes Visuais PPGAV/UDESC na Linha de Pesquisa de Ensino de Arte e na Graduação em Artes Visuais DAV/UDESC. É membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Arte, Educação e Cultura UFSM/CNPq. Membro/Líder do Grupo de Pesquisa Entre Paisagem UDESC/CNPq. Coordenadora do Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke (UDESC). Tem experiência na área de Artes Visuais, atuando principalmente nos seguintes temas: pintura, arte e educação, formação docente. É membro associado da ANPAP. Email: jocielelampert@uol.com.br

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

285


REVISTA

APOTHEKE Adão Roberto Swatowiski Natural do Rio Grande do Sul, aeronauta aposentado, com graduação em Artes Plásticas pela UDESC. Reside em Florianópolis e dedica-se, principalmente, à pintura e desenho, explorando o veio da abstração geométrica e campos de cor.

Ana Camorlinga Graduada em Letras e Literaturas (UFSC), professora, encadernadora, tradutora e achou seu prumo nas Artes. Atualmente, cursa Bacharelado em Artes Visuais (UDESC) onde descobriu os desdobramentos da pintura e, especialmente, se diverte na gama de possibilidades de foto-pintura. É bolsista Apotheke desde 2014.

Ana Carolina Martins Ferreira Graduanda do curso de Bacharelado em Artes Visuais na Universidade do Estado de Santa Catarina desde 2014 e bolsista de extensão do Grupo de Estudos “Estúdio de Pintura Apotheke”, coordenado pela Profª Drª. Jociele Lampert.

Adriane Kirst Possui Bacharelado e ......Licenciatura em Artes ......Plásticas pela Universidade ......do Estado de Santa Catarina ......UDESC, Mestrado em Artes ......Visuais (Ensino) e ......atualmente cursa o Doutorado em Artes Visuais (Ensino), também pela Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC. Fez curso de Introdução a Curadoria na Central Sant Martins, University of the Arts London - UAL. Tem experiência na área de Artes Visuais, investigando processos que aproximem as pessoas da arte, atuando em projetos de formação de alunos, professores e públicos. Estuda principalmente os seguintes temas: arte contemporânea, infográficos e ensino de artes visuais por meio da experiência.

286 Carolina Ramos Nunes Sua trajetória vai da sala aula de escolas públicas até instituições culturais. Atualmente é arte educadora da Fundação Cultural Badesc. Estar em contato com a arte e produções contemporâneas é fundamental para desenvolvimento de sua poética. Dentre as técnicas estudadas no Grupo Apotheke, a Cianotipia e Antothypia são aquelas que conversam com sua proposição sobre o vazio e o tempo de inércia na insanidade e a doença.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Daniela Almeida Moreira

Licenciada em Artes Visuais (UDESC) e bacharel em Letras Português/Língua Brasileira de Sinais (UFSC). Atualmente é mestranda do Programa de PósGraduação em Estudos da Tradução – PGET/UFSC. Participa do Ateliê Alvéolo, da artista Zulma Borges e do grupo Chinese Brush Painting, com o mestre Henry Li. Desenvolve um processo de estudo da pintura com interesse na técnica aquarela, entre outras técnicas do desenho em grafite, giz pastel e carvão, sendo o tema "natureza morta" e "retrato", os assuntos de maior interesse para sua pesquisa. O estudo da aquarela, conduziu a busca do conhecimento sobre os princípios da pintura oriental, introduzindo os conhecimentos da técnica Sumi-ê, que tornou-se objeto de estudo em paralelo com a aquarela.

Daiane Barônio Aspirante a fotógrafa e graduanda de Bacharelado em Artes Visuais pela UDESC. Atuo como bolsista de iniciação cientifica no projeto de pesquisa coordenado pela Prof. Dra. Jociele Lampert

....Fabiana Burnato do Amaral ....Natural de São Paulo ....SP. Cursa atualmente ....Bachrelado em Artes Visuais na UDESC e traz na bagagem uma graduação não concluída em arquitetura e urbanismo. Sua poética 287 figura entre técnico e lúdico, tendo como principal tema de estudo a cidade e suas relações. É bolsista de extensão do grupo de estudo Apotheke desde 2015.

Denilson Cristiano Antonio

Natural de Campo Mourão/PR. Começou a desenhar muito cedo, estimulado pelo interesse em gibis, os quais costumava copiar e recriar algumas histórias. Aos 22 anos fez seu primeiro curso de Artes pela Prefeitura de Foz de Iguaçu, onde residiu desde seu primeiro ano de vida. Mudou-se para Florianópolis em 2006, onde concluiu o curso de Licenciatura em Artes Visuais, em 2014, na Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC). Atualmente, dedica-se à pintura, ao desenho e curadoria, este último vinculado ao trabalho que desenvolve no Museu Hassis/ Florianópolis.

... Fábio Savicki Henschel

....Natural de Itaiópolis ....SC, graduando do ....curso de licenciatura em Artes VisuaisUDESC , atualmente bolsista no programa Pibid de Artes Visuais com orientação da Prof.ª Dr.ª Jociele Lampert.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

Fábio Wosniak Doutorando em Artes Visuais - PPGAV/UDESC,na linha de Ensino das Artes Visuais, sob orientação da Profª. Drª. Jociele Lampert. Licenciado em Pedagogia/Supervisão Escolar pela Universidade do Estado de Santa Catarina, Faculdade de Educação (FAED/UDESC).

Juliano Reis Siqueira Professor de escultura no curso de Licenciatura em Artes Visuais na Universidade Estadual de Londrina. Doutorando em Artes Visuais (UDESC), Mestre em Educação e Artes (UFSM), Bacharel em Escultura e Licenciado em Desenho e Plástica (UFSM). Coordenador do PIBID/CAPES/UEL Artes Visuais (2012-2015). Atua na Formação de Educadores em Artes Visuais com ênfase em educação não formal e arte pública.

Kátia Speck Fotógrafa, Técnica em Informática e graduanda em Bacharelado de Artes Visuais pela UDESC. Atualmente é bolsista de Iniciação científica do projeto de pesquisa coordenado pela Profª Drª Jociele Lampert.

José Rocha

Carlos

da

Artista plástico, bacharel em Artes Visuais/UDESC, 2013 e bacharel em Ciências Econômicas/UFSC, 1978, além de especialista em Administração Pública/UDESC, 1998. Participa do Projeto “Arte Educação pela pintura: produção artística do artista” e cursou, como aluno especial, a disciplina “Sobre Ser Professor Artista”, ministrada pela Profª. Drª Jociele Lampert no Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais/UDESC, 2014.

288

Luciana Finco Mendonça Mestranda em Artes Visuais/UDESC, bolsista CAPES, na linha de Ensino das Artes Visuais. Graduou-se em Licenciatura Letras/UNESP e Artes Visuais/UEL. Leciona desde 2007. É integrante dos Projetos de Pesquisa “Formação de Professores de Artes Visuais: sobre o ensino/aprendizagem de pintura” e “Arte Educação pela Pintura: a produção do artista professor”, ambos coordenados pela Profª. Drª Jociele Lampert.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE Márcia Amaral de Figueiredo Marisete M. Colbeich Formação em Licenciatura em Educação

Artística/Artes

Plásticas

em 1991 pela Faculdade de Artes do Paraná.

Especialização

Fundamentos

Estéticos

Educação

pela

Especialização

FAP/PR em

em

de

Arte

-

em

1992

e

História

da

Arte

do Século XX na EMBAP/PR no ano de 2004.

Atuou

como

professora

de

ensino de arte no ensino fundamental séries

iniciais

Municipal

de

e

finais

Ensino

de

na

Rede

Curitiba,

período de 1987 até 2014.Frequentou o ateliê permanente de escultura de 1996 até 2006, orientação

da

em Curitiba, sob a escultora

Elizabete

Titton.

Atualmente

participa

do

programa

de

no

de

Mestrado

Ensino

Natural de Cachoeira do Sul/RS, é artista visual, atua como professora efetiva no Estado de Santa Catarina e leciona no curso de Design de Interiores/FATENP. Possui bacharelado e licenciatura em Desenho e Plástica/UFSM; especialização em Mídias na Educação/FURG (2012) e Gestão Educacional/UFSM (2005). Integra o Grupo de Estudos e Pesquisa GEPAEC/UFSM. Tem trabalhos, principalmente, nas áreas de desenho, escultura e cerâmica. Participou de várias exposições individuais e coletivas, bem como salões de artes, tendo recebido menção honrosa no XIII Salão de Inverno de Artes Plásticas de Sant'ana do Livramento/RS,2001.

289

Artes Visuais na UDESC. Osmar Yang

Marta Facco Nasceu no Rio Grande do Sul e formou-se em Artes Plásticas pela UFSM em 2001. Possui diversas exposições individuais, coletivas e participações em salões de arte no RS, PR, SC, SP, BA e Buenos Aires/ARG, com algumas premiações. Atualmente reside em Florianópolis/SC, participa do grupo de pesquisa Estúdio de Pintura Apotheke CEART/UDESC, onde interessa-se pelo sensível dos objetos.

Engenheiro Eletricista ....... de profissão, artista . plástico graduado em 2013 pelo curso de Artes Visuais da UDESC. Iniciou como autodidata até os anos 80, quando frequentou o curso da pintora Ida Hannemann de Campos na Galeria Cocaco em Curitiba. Após estadia na Europa de 1998 a 2001, onde frequentou oficinas de pintura da Volkshochschule em Munique (Alemanha), e oficina de restauração em Florença (Itália) retornou ao Brasil para Florianópolis. Frequentou ainda oficinas no CIC (Centro Integrado de Cultura) com a artista Patrícia Laus. Em 2011 teve obra selecionada para exposição na mostra de Arte Cibernética (ABCiber) no Centro de Eventos da UFSC.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


REVISTA

APOTHEKE

Silvia Carvalho Artista, mestranda em Artes Visuais e bacharel em Artes Plásticas, UDESC/SC; Criação e Ilustração, EPA/SP; Design de Interiores, Florianópolis/SC. Suas principais mostras são “FUTURO”, Salão Nacional de Arte Contemporânea e Novas Tecnologias, Jundiaí/SP; “Concurso de esculturas CriAção Scotch”, MuBE/SP; “Estações-pinturas ao tempo”, Espaço Lindolf Bell, Florianópolis/SC; “De dentro pra fora”, MASC, Florianópolis; 20º Salão de Arte, Pinheiros/SP; “Sob a pele”, Universidade Alanus/Alemanha & UDESC; Fundação Cultural BADESC, Florianópolis/SC. Ministra oficinas de Pintura, Desenho e Pigmentos Naturais.

Rita Eger Artista visual, natural de Itajaí, SC, vive e trabalha em Florianópolis, SC, Brasil. Mestre em Matemática pela Universidade Federal de Santa Catarina. Bacharel em Artes Plásticas pela Universidade do Estado de Santa Catarina. Sua obra abrange pintura, desenho, instalação, bem fotografia, arte postal, a palavra e a gravura no campo expandido.

Talita Esquivel

Tharciana Goulart da Silva Mestranda em Artes Visuias sob orientação da Profª Drª Jociele Lampert, graduada no curso de Licenciatura em Artes Visuais, UDESC. Atua como bolsista de iniciação científica no projeto “Paisagem e Ensino das Artes Visuais” (CAPES/PIBID/UDESC). Integrante do grupo de pesquisa “Entre Paisagens” (UDESC/CNPq). Integrante do Grupo de Estudos “Estúdio de Pintura Apotheke”, todos coordenados pela Profª. Drª. Jociele Lampert.

Doutoranda em Artes Visuais, UNESP; Mestre em Artes Visuais/ UDESC; Especialista História e Teorias da Arte/ UEL e graduada em Educação Artística/ Artes Plásticas, UFPR. Atualmente é professora de pintura na EMBAP. É artista plástica, dedicando-se à pintura, fotografia e vídeo. Em 2009, realizou residência artística no Centro de Artes CAMAC/França. Participou de diversas exposições, dentre as quais “Arte Como Experiência”, Fundação Hassis & UDESC, 2014; “Mostra Lote 7 de Arte Contemporânea”, Fundação Hassis, 2013; “Mostra Álbum”, BADESC, 2010; “Corpo Grotesco”, Museu da Escola da UDESC, 2009; “12º Salão Nacional de Itajaí”, 2010; “CAMAC Open Studio”, Marnay-surSeine/França, 2009; “Suitcase, East Lansing e Chicago”, EUA, 2009.

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.

290


REVISTA

APOTHEKE

291

APOTHEKE

ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.3, n.2, ano 2, julho de 2016.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.