V.4 DEZEMBRO
2016
R E V I S T A
VOLUME 4
PINTURA
HOJE
ISSN: 2447-1267 DEZEMBRO 2016
R E V I S T A
Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
ISSN: 2447-1267
Direitos reservados ao EstĂşdio de Pintura Apotheke
Apotheke e-periódico [recurso eletrônico] / Universidade do Estado de Santa Catarina. Centro de Artes. Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais. v. 4, n. 2 (2016) – . – Dados eletrônicos. – Florianópolis : UDESC/CEART/PPGAV, 2016 – p. 296 Semestral Sistema requerido: Adobe Acrobat Reader. Modo de acesso: World Wide Web: <http://revistas.udesc.br/index.php/APOTHEKE/index>. Apotheke e-periódico (acesso em 20 maio 2016). ISSN: 2447-1267 1. Artes Visuais. 2. Arte - Educação. I. Universidade do Estado de Santa Catarina. Centro de Artes. Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais. CDD: 707 - 20. ed. Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca UDESC
expediente REVISTA APOTHEKE Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Universidade Do Estado de Santa Catarina Reitor: Prof.Dr. Marcus Tomas
Centro de Artes – UDESC/CEART Chefe de Departamento: Profª.Mª Rosana Tagliari Bortolin
Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais Coordenadora: Profª.Drª Maria Cristina da Rosa Fonseca da Silva
A Revista APOTHEKE é uma publicação eletrônica de caráter acadêmico-científico, editada pelo Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke, relacionado ao Grupo de Pesquisa [Entre] Paisagens, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da Universidade do Estado de Santa Catarina (PPGAV/UDESC). Com periodicidade quadrimestral, tem como propósito divulgar a produção de pesquisadores brasileiros e estrangeiros que enfocam as relações entre Artes Visuais, Educação e Pintura, em diálogo com diferentes aportes teóricos, visando enriquecer a discussão interdisciplinar do conhecimento nas áreas de Artes Visuais e Educação. Publica artigos, ensaios, narrativas visuais, resultados de investigações baseadas nas Artes, resenhas, entrevistas e traduções. A revista tem como objetivo servir de veículo não apenas para o conhecimento e as pesquisas já consolidadas, mas também para perspectivas inovadoras, tanto no que se refere à argumentação quanto à metodologia, e que se apresentam como alternativas aos modelos estabelecidos. .4. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Equipe Editorial Editora-Chefe Jociele Lampert, UDESC, Brasil Editores Associados Fábio Wosniak, UDESC, Brasil Marta Cabral, Teachers College, USA Editores Assistentes Liane Carvalho Oleques, UDESC, Brasil Adriane Kirst, UDESC, Brasil Juliano Siqueira, UDESC, Brasil Organizadores do volume 4, número 1, ano 2, Fevereiro 2016. Jociele Lampert Fábio Wosniak Adriane Kirst Juliano Siqueira
Lucimar Bello Pereira Frange Olga Maria Botelho Egas Fernando Augusto Conselho Científico Internacional do volume 4, número 2, ano 2, Novembro 2016. José Carlos de Paiva e Silva, Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto Rita L. Irwin, British Columbia, Canadá Teresa Torres De Eça, Universidade do Porto, Portugal Marta Cabral, Teachers College, Columbia, USA
Conselho Editorial Nacional do volume 4, número 2, ano 2, Novembro 2016. Luciana Gruppelli Loponte, Lúcia Gouvêa Pimentel Fernanda Pereira da Cunha Cristian Poletti Mossi Elaine Schimidli Fábio Rodrigues Marilda Oliveira Rita Bredarioli Ronaldo Alexandre de Oliveira Belidson Dias Bezerra Júnior Maria das Vitórias Negreiro do Amaral Christina Rizzi Rejane Galvão Coutinho Talita Esquivel Maria Helena Wagner Rossi Ana Cláudia Assunção Marcos Villela Pereira
Bolsistas Ana Carolina Martins Ferreira Fabiana Burnato Kátia Speck Diagramadora Manuela Cristina Siebert Capa Foto: Exposição Deambulações, de Jociele Lampert
Contato Av. Madre Benvenuta, 1907 Itacorubi, Florianópolis / SC (48) 3321-8300 Centro de Artes Site Grupo: http://www.apothekeestudiodepntura.com
E-mail: apothekestudio@gmail.com
.5. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Prรกtica com modelo vivo, colagem sobre papel - Liane Oleques
.6.
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
sumário Editorial
9
Artigos
11
Por que pensar sobre a autorreferencialidade em pintura hoje? Marilice Corona (UFRGS)
11
Para chegar ao mictório deve-se descer a escada (em dois lances de 8 ou 80) To reach the urinal one should descend the staircase (in two goes of 8 or 80 steps) ) Milton Machado (UFRJ)
35
A Way to Know, A Way to Go Barbara Ellmann (Lincoln Center Educatio)
58
Conversa com Milton Machado José Maria Dias da Cruz
72
Recortes sobre a cor Transformações cromáticas da pintura brasileira: do modernismo à arte contemporânea, Marco Giannotti (USP)
90
Entrevistas
117
Entrevista com o pintor e professor Marco Giannotti (USP), realizada pelo artista e professor Fernando Algusto (UFES)
17
Entrevista com o pintor e professsor Alphonsus Benetti (UFSM),realizada pelo Estúdio de Pintura Apotheke (UDESC)
129
Participações Pintura:Esta jovem bisavó de Java Alphonsus Benetti (UFSM)
152
Seminar Abstract Expressionism: the language of emotions Marco Giannotti (USP)
160
Tradução
175
The Classroom as Studio, G. James Daichendt (BU/PLNU) A Sala de Aula como Estúdio, tradução de Vinícius de Oliveira Santos (UDESC)
Ensaios
152
175
190 Inventário de procedimentos e metodologias para habitar o mundo, Sarah Uriarte
190
Inventário Poético, Odete Angelina Calderan (UNESC)
218
191 Notas sobre a experiência
248
[ENTRE] Ação Educativa e a Arte Como Experiência, Adriane Kirst (UDESC), Fábio Wosniak (UDESC) e Juliano Siqueira (UDESC/UEL)
248
Projeto Albers: Estudos de um objeto/processo, Adriane Kirst (UDESC)
268
Grupo de estudos .7. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
286
.8. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
editorial A palavra APOTHEKE tem origem grega. O substantivo apotheke, designava armazéns do Porto de Atenas na Grécia Clássica; também de origem germânica, indica a origem da palavra botica, boticário ou farmácia. A escolha por esta nomenclatura, ao Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke, decorre da percepção da botica como um lugar de laboratório, de um labor experimental, o que se aproxima da proposta de um Ateliê. A pintura apresenta-se como eixo norteador para o processo artístico deste Grupo de Estudos, considerando o campo ampliado e possíveis desdobramentos para o pensamento plástico pictórico. Trata-se de um Grupo de Estudos vinculado à UDESC Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC/Brasil, coordenado pela Profa. Dra. Jociele Lampert, articulado também, com o Grupo de Pesquisa [Entre] Paisagens - CNPq/UDESC, que acolhe artistas, professores e pesquisadores. A REVISTA APOTHEKE, em seu quarto volume, apresenta o tema da Pintura Hoje, trazendo questões referente ao ensino de pintura e sua materialidade no âmbito acadêmico e fora dele. Textos que tornam-se referência para investigações sobre o processo pictórico e o tempo/espaço da produção pictórica contemporânea entre o espaço das Artes Visuais e o da Arte Educação. Apresenta escritos de professores artistas (pintores) parceiros do Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke, bem como, dá ênfase para as ações do Grupo realizadas ao longo do ano de 2016.
Professora Dra. Jociele Lampert (Editora-Chefe) Professor Doutorando Fábio Wosniak (Editor-Associado) Site http://www.apothekeestudiodepintura.com Facebook https://www.facebook.com/pages/Est%C3%BAdio-de-pinturaApotheke/690107797707990?sk=timeline
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artigos Por que pensar sobre a autorreferencialidade em pintura hoje? Marilice Corona (UFRGS)¹ RESUMO: Este artigo tem como objetivo demonstrar como o estudo sobre a autorreferencialidade em pintura me permitiu refletir sobre meu próprio trabalho e sobre questões relativas à pintura figurativa nos dias atuais. PALAVRAS-CHAVE: pintura; autorreferencialidade; representação ABSTRACT: This article aims to show how the study of the self-referentiality of painting allowed me to reflect on my own work and on issues related to figurative painting today. KEYWORDS: painting; self-referentiality; representation 1. Introdução “Para voltar à pintura é necessário fazer a pintura dar voltas. Porque cada pincelada, cada espaço no quadro está saturado de história, repleto de sentidos instituídos, presos a certas leituras. E tudo isso remete, inconsciente e profundamente, a uma presença social da arte, a um código de visibilidade, a uma instituição e organização de poderes.” (Brito, 1982, p.40)
“Voltar à pintura é fazer a pintura dar voltas”, já teria dito Ronaldo Britto nos anos de 1980 em um texto dedicado ao
¹ Marilice Corona vive e trabalha em Porto Alegre/RS. É artista plástica, com mestrado e doutorado em Poéticas Visuais pelo PPGAV do Instituto de Artes da UFRGS. É professora de pintura do Departamento de Artes Visuais e do PPGAV do Instituto de Artes da UFRGS. http://lattes.cnpq.br/1902184658684723
.11. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
pintor brasileiro Jorge Guinle. Sim, escolher a pintura como linguagem nos dias de hoje é deparar-se tanto com uma longa tradição de imagens e procedimentos diversos quanto com um ferrenho debate teórico sobre sua pertinência. Em se tratando de pintura figurativa, talvez mais caudaloso esse terreno se torne. Em meu trabalho, pensar sobre a autorreferencialidade em pintura
corresponderia
a
colocá-la
diante
do
espelho
a
interrogar-se sobre suas capacidades e possibilidades na formação de
imagens;
a
interrogar-se
sobre
suas
convenções,
seus
discursos, seu poder ilusionista e as confluências que podem ser estabelecidas com a fotografia e outros meios. Na verdade, não é apenas a pintura que se interroga, mas o próprio pintor, que, diante da tela em branco, se interroga na busca de uma tomada de posição. Na
história
da
autorreferencialidade
pintura já
está
ocidental, presente
como
desde
veremos,
a
momento
do
o
surgimento do quadro como objeto, no modernismo apenas tornar-seá mais redutora, explícita e será tomada como bandeira. Nos
anos
50,
o
crítico
americano
Clement
Greenberg
estabelece, de forma dogmática, as bases para as definições das categorias
artísticas
autorreferencialidade.
a O
partir método
da
autodeterminação
crítico
desenvolvido
e por
Greenberg fundamenta-se na ideia de que uma disciplina constituise por usar seus próprios métodos para estabelecer seus próprios limites. O purismo reivindicado pelo crítico americano, segundo o qual a integridade do plano pictórico torna-se a única condição para a pintura, não sendo compartilhada com nenhuma outra arte, expulsa do campo da pintura qualquer possibilidade de narração, ilusão ou referência externa à realidade do quadro. Sendo assim, a pintura
é
entendida
como
verdade,
em
contraposição
ao
“ilusionismo” da pintura naturalista. É importante perceber que a construção deste sistema teórico tinha em vista a legitimação de um programa específico de pintura, ou seja, o abstracionismo norte-americano, sendo Pollock seu mais alto representante. A construção teórica de Greenberg acabou por excluir diversas manifestações
pictóricas
por
não
se
enquadrarem
critérios, veja-se o surrealismo. .12. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
em
seus
O estudo da convencionalidade dos sistemas de representação do espaço, somado à análise dos textos críticos de Clement Greenberg e Léo Steinberg, foi fundamental para que eu pudesse me colocar de forma reflexiva diante de minha pintura. Durante a pesquisa de mestrado, nos idos de 2002, modo
poderia
falar
de
representação
já me perguntava de que do
espaço
na
pintura.
Descobrir um novo espaço pictórico que fosse característico de nossa época, que representasse nossas concepções de espaço e natureza,
parecia-me
sem
sentido.
Voltei-me
então
para
os
postulados de Clement Greenberg e comecei a pensar sobre a autorreferencialidade e a autodefinição da pintura. Parecia-me restritivo pensar minha pintura somente a partir de um discurso sobre a planaridade, o formato do suporte e as propriedades das tintas.
Ao
experimentar
articular
sensações
de
espaço
provenientes de sistemas distintos, e até antagônicos, fazendo uso da perspectiva, muitas vezes interrompida por planos ou pela abstração informal, busquei alcançar um número maior e mais curioso
de
relações,
tanto
estruturais
quanto
metafóricas
(Fig.1). A autorreferencialidade pode assumir um caráter mais amplo através dessas representações, uma vez que não se torna restrita à característica planar do suporte, mas reivindica o trânsito pela longa tradição da pintura e seus diversos modos de produzir imagens. Percebi que poderia tomar os sistemas de representação do espaço não apenas como referentes à realidade exterior ao quadro, mas como recursos operacionais derivados da história da pintura que poderiam ser revisitados. A planaridade como autodefinição e única condição para a pintura também poderia ser questionada, uma vez que o plano é condição necessária, mas não é condição suficiente para que haja pintura. Pensar nesses termos seria procurar a essência da pintura (se é que tal essência pode ser alcançada) e deixar de lado a experiência. As definições do que venha a ser pintura, no decorrer
da
história,
são
baseadas
em
convenções
que,
inevitavelmente, sempre acabam por deixar de fora determinadas produções. Exemplo disso é a leitura redutora feita a Manet por historiadores e teóricos formalistas. Já na segunda metade do século XIX conformava-se um corpo teórico influenciado pelas .13. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Fig. 1 Marilice Corona - A Traição do Suporte, 2001 acrílico sobre tela e lona xadrez – díptico – 100 x 200cm
descobertas da fisiologia no campo da óptica e, ao mesmo tempo, alinhado com a teoria da visualidade pura. Conforme Martins, a leitura
efetuada
pelos
formalistas
sobre
a
obra
de
Manet
“eclipsou o ambiente histórico e pictórico do pintor em nome do purismo de uma linha evolutiva da arte moderna, da qual Manet constituiria
o
marco
zero”
(MARTINS,2001,pp.103-111).
Tais
interpretações perduraram até o princípio dos anos de 1980, ou seja, durante o período em que, de certa forma, a arte moderna ainda gozava de certo prestígio. Calcado
nessas
mesmas
bases
formalistas,
nas
quais
a
visualidade pura era almejada, Clement Greenberg toma Manet como paradigma do achatamento da “cavidade” inerente à pintura de cavalete, pois esta, como ele mesmo diz, subordina o efeito decorativo ao dramático. Ela recorta a ilusão de uma cavidade em forma de caixa na parede atrás dela, e dentro desta, como uma unidade, ela organiza aparências tridimensionais. Na medida em que o artista achata a cavidade em nome da padronização decorativa e organiza seu conteúdo em termos de planaridade ou frontalidade, a essência da pintura de cavalete – que não é a mesma coisa que sua qualidade – está a caminho de ser comprometida. A evolução da pintura moderna, começando com Manet, é constituída em grande parte pela evolução para um comprometimento desse tipo.(GREENBERG, 1989,p.164)
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É somente com o declínio, com o esgotamento da arte moderna e seus discursos que veremos abrirem-se novas considerações e leituras sobre as produções do século XIX. De meu ponto de vista, reduzir
a
obra
imensamente
rica
e
polissêmica
de
Manet
à
planaridade e suas relações formais apresenta-se como um imenso prejuízo. De acordo com as pesquisas efetuadas por Martins sobre o tema, a década de 1980 marca a emergência de novas leituras sobre o artista francês, principalmente no que concerne às suas relações com o realismo. Exposições como aquela comemorativa ao centenário do pintor no Grand Palais, em Paris, em 1983 e posteriormente no Metropolitan Museum of Art, em Nova York, acompanhadas na época por novas produções textuais críticas, possibilitaram uma nova recontextualização da obra do pintor. Ainda segundo Martins, será só nesse momento, quando declina a idéia de arte pura, tendo a abstração como seu corolário, que veremos surgir a possibilidade para a “rediscussão da dimensão semântica da pintura de Manet ou, melhor dizendo, para o reexame das articulações entre sua pintura e o processo extra-artístico da modernidade como um todo” (MARTINS,2001,P. 104). Uma nova aproximação à produção do pintor não apenas nos revela a dimensão política de sua obra, mas a sua intensa investigação da tradição pictórica através das inúmeras citações presentes em sua pintura. Encontramos, nesse caso, referências a Ticiano, Velazquez e Goya, às estampas japonesas, isso sem falar em todas as fontes de imagens, às fotografias e recortes de jornais, ou seja, aos Documentos de Trabalho dos quais se servia. O esgotamento do discurso moderno, somado às práticas e discursos minimalistas e conceitualistas dos anos de 1960 e 70, coloca a pintura em crise. Ouve-se falar, então, mais uma vez, na morte da pintura². Aos poucos, a ideia de definição de categorias – pintura e escultura – vê-se suplantada pela ideia de hibridismo e
²É importante ressaltar aqui, pois muitas vezes o que se tem chamado de “a morte da pintura” tem sido motivo de confusão, que a referida morte não se trata do desaparecimento, aniquilamento da linguagem, mas do esgotamento da pintura abstrata, do modernismo e seus discursos. Tornou-se um marco histórico o texto publicado por YveAlain Bois em 1986, “Painting: the task of mourning”, e que acompanhou o catálogo da Exposição End game: reference and simulation in recent painting and sculpture.
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mistura de linguagens. Os artistas lançam mão das mais diversas práticas para a resolução de suas proposições. A arte pop, os artistas chamados new dadas e o hiper-realismo reabilitaram, das mais variadas maneiras, a representação na pintura através de processos híbridos, estabelecendo um forte diálogo com os meios de reprodução mecânica da imagem. Se, por um lado, o conceitualismo provocara a desmaterialização da arte, exaltando a Ideia em detrimento da forma, pois residia em seus preceitos a crítica ao “formalismo”, por outro lado, a natureza questionadora de suas proposições sobre o conceito de arte e seu aspecto institucional influenciaram, também, a produção pictórica em curso. Nos anos 70, Michel Foucault, através de uma interessante análise das pinturas do artista francês Gerard Fromanger, no texto “Pintura Fotogênica” (2001. p. 347), chama nossa atenção para o resgate da imagem efetuado pelos artistas pop, sobre como havíamos ficado órfãos de imagens com o reducionismo modernista. Nessa mesma década, no campo da literatura, da linguística, da semiologia, da filosofia e da psicologia cognitiva, houve, por exemplo, uma intensa discussão sobre a representação e a linguagem metafórica. A metáfora,
tomada
pela
tradição
clássica
como
ornamento
linguístico, desvio e engano, passa a ser vista e discutida como uma operação cognitiva fundamental. Nos anos de 1980, vamos assistir a uma forte revitalização da pintura, tanto no cenário internacional quanto nacional. A pintura figurativa
reaparece
alinhadas
ao
de
forma
contundente,
neo-expressionismo
alemão
e
e à
manifestações transvanguarda
italiana irão repercutir em vários pontos do mundo. Da década de 1990
para
cá,
uma
nova
geração
de
pintores,
muitos
deles
influenciados pela obra de Gerard Richter, irá debruçar-se sobre as relações entre a pintura e outros meios de produção de imagem, como a fotografia, o vídeo e o cinema. Entre eles, podem-se citar Luc Tuymans, Michael Borremans, Neo Rauch, Peter Doig, Dirk Skreber e uma geração ainda mais recente, como a de Mathias Weischer, entre muitos outros – a lista seria enorme, inclusive de pintores brasileiros. Com relação ao retorno à representação, a produção da chamada Geração 80 assumiu um papel fundamental na história da pintura brasileira. Nomes como Cristina Canale, Luiz Zerbini, .16. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Daniel Senise e, posteriormente, Adriana Varejão tornaram-se referências importantes abrindo caminho para novas discussões sobre a imagem e a representação, revalorizando o papel da pintura figurativa no cenário nacional. Diferentemente dos anos 80, uma nova geração de pintores brasileiros, que tem sua formação no século XXI, não pode ser vista como um grupo em que determinadas diretrizes determinam uma identidade. Como bem comentam Isabel Diegues e Frederico Coelho, “hoje
a
pintura
parece
estar
mais
ligada
a
trajetórias
particulares. Existe mais liberdade na busca de um vocabulário pictórico individual.” ( 2011: 10) Antinomias como figurativismoabstração já não fazem mais sentido e as possibilidades em pintura tornam-se múltiplas. Pode-se dizer que hoje vemos intensificar-se um interesse pela imagem e sua vasta distribuição, por seu poder, seus usos e seus mecanismos na criação de sentidos. Correlacionado a isso, o uso da fotografia como referência para a pintura torna-se prática corriqueira e podem ser de autoria do próprio artista ou apropriadas das mais diversas fontes como fotografias de outras pessoas, conhecidas ou não ou ainda de jornais, livros, revistas, cinema, TV, internet, etc..
O acesso à internet tem colocado os
jovens artistas em contato com a produção recente de importantes pintores do cenário internacional como o americano Mark Tansey, o belga Michäel Boremans
e os artistas da Nova Escola de Leipzig . A
presença de Luc Tuymans e Neo Raush na 26ª Bienal de São Paulo, em 2004 por certo influenciou a nova geração. Portanto, o que me parece importante discutir no campo da pintura não é a luta para comprovar sua pertinência ou perda de soberania, mas a sua capacidade e especificidade na formação de imagens, o estudo de suas estruturas e relações de significação – um meio, entre tantos outros, de produzir imagens e gerar novas significações. O fato de hoje podermos contar com os mais variados meios de reprodução de imagem não legitima a desvalorização da pintura. Ao contrário, incita-nos a investigar a possibilidade de inter-relação desta com esses vários meios. Como teria dito Glasmeier, “se a pintura sempre foi uma reflexão artística sobre outros quadros (a Renascença cita a Antiguidade, a pintura clássica a Renascença, a arte moderna o maneirismo, etc.) a .17. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
riqueza do 'tesouro de imagens' não tem cessado de crescer desde a aparição da fotografia e o cinema” (2002, p.24). Hoje nosso arquivo de imagens tomou enormes proporções. As referências externas em uma pintura representacional não dizem respeito apenas a objetos exteriores, da “realidade”, mas ao universo de outras imagens: impressas, fotográficas, cinematográficas, televisivas, virtuais, etc. Como afirma o pintor americano Mark Tansey, O problema para a representação é achar as outras funções ao lado de capturar a realidade. Eu penso no quadro pintado como uma corporificação do mesmo problema que nós enfrentamos com a noção de “realidade”. O problema ou pergunta é que realidade? Em um quadro pintado é a realidade descrita, ou a realidade do plano pictórico, ou a realidade multidimensional em que o artista e o espectador vivem? Todos os três são pontos envolvidos ao fato que quadros são inerentemente problemáticos. Este problema não é algo que possa ou deva ser erradicado por soluções reducionistas e puristas. Nós sabemos que alcançar efetivamente a realidade é destruir o médium; há mais para ser alcançado usando-o do que por sua destruição (TANSEY, 1992, p. 132).
2. O mito da autorreferencialidade como legado do modernismo Tornou-se lugar comum, através da disseminação das idéias greenberguianas, tomar a autorreferencialidade e a autocrítica da pintura como legados do modernismo. Para Greenberg (1997, 103), “os grandes mestres haviam dissimulado os meios, usando a arte para ocultar a arte”; os rastros deixados pela matéria e pela pincelada eram fatores indesejáveis, visto que distraíam da “ilusão” pretendida, como se a “ilusão” fosse o único objetivo a ser alcançado. Para o autor, “enquanto diante de um grande mestre tendemos a ver o que há no quadro antes de vê-lo como pintura, vemos um quadro modernista antes de mais nada como pintura”. Em “Outros critérios”, de 1972, Léo Steinberg (1997. p.191) demonstra a falibilidade de tais afirmações e chama nossa atenção para a análise descontextualizada em que a crítica modernista se debruça
ao
analisar
a
produção
de
outros
tempos.
Segundo
Steinberg, toda grande pintura, pelo menos dos últimos seiscentos anos, “chamou a atenção para a arte, e persistentemente”. De algumas décadas para cá, alguns historiadores e teóricos da arte têm procurado construir uma análise da produção artística, tanto antiga quanto recente, que se distancia de uma teoria e .18. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
história da arte de caráter evolucionista, reducionista, baseada na sucessão de estilos. O historiador romeno Victor I. Stoichita, em L'Instauration d'un tableau (1999)
tem como objetivo principal tornar visível o
processo pelo qual o trabalho metapictural funda a condição moderna da arte. O autor irá debruçar-se sobre as pinturas do século XVI e XVII, especificamente sobre aquelas produzidas entre as datas de 1522 e 1675, em sua maioria, originárias dos Países Baixos. Escolhe a data de 1522 por ser o ano da revolta iconoclasta de Wittemberg e 1675 por ser a data aproximada em que o pintor Cornélis Norbertus Gijsbrechts, da Antuérpia, cria uma pintura cujo assunto é o avesso de um quadro, ou seja, o assunto pintado é o próprio bastidor (Fig.2), o avesso da pintura. “É nessa zona da Europa que o discurso metapictural, a crise do estatuto da imagem religiosa e enfim, a crise do 'quadro' em si veem-se entrelaçados de maneira indiscutível”. Descomprometida com o Estado e a Igreja, a pintura desse período encontra-se liberta para tratar de temas cotidianos: Interiores, de gênero, pinturas arquitetônicas, natureza morta, gabinetes de amadores, paisagem, retratos, etc... “A tomada de consciência da imagem como imagem é um processo que foi amplamente encorajado pela Reforma”, nos diz Stoichita (1999). Tal tomada de consciência torna-se visível quando as pinturas dão a ver os próprios mecanismos que a engendram. A representação de cartas, mapas, espelhos, portas, janelas, paredes, quadros apresentam-se como dispositivos cuja função vai além da mera representação cenográfica e alegórica. Estão a serviço da explicitação das propriedades do próprio quadro. De acordo com Stoichita, o pintor holandês instala-se diante de sua tela para ver o que é a pintura. Nesse mesmo livro, Stoichita realiza uma meticulosa análise de um quadro da juventude de Rembrandt, intitulado O pintor no atelier,
de
1628
aproximadamente.
E,
o
que
me
interessa,
particularmente, são os aspectos reflexivos que ele aponta. Sabe-se ser comum o tema do atelier na história da pintura. Habitualmente, esses espaços são representados repletos de objetos. Pincéis, tintas, mapas, desenhos, telas enroladas ou apoiadas à parede, cortinas, biombos, um eventual modelo, seja vivo ou não, enfim, instrumentos e ferramentas de trabalho que usualmente estão à mostra com a finalidade de caracterizar o espaço do fazer e da .19. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Fig.2 Cornelius N. Gijsbrechts, Quadro virado, 1670, óleo sobre tela, 66 x 86,5 cm,Copenhague, Statens Museum for Kunst
técnica. Os espaços são cheios. Mas, na minúscula tela de Rembrandt, o que encontramos é o vazio e o grande verso da tela a ser pintada. O atelier minimamente caracterizado é transformado em uma grande arena no qual o pintor e o cavalete se confrontam. Estranha, também, é a proporção do cavalete, que, apesar da diferença de dimensões, é semelhante à do pintor, largo, pesado, atarracado. Usualmente, neste tipo de representação, os cavaletes são longilíneos, quase invisíveis, mas aqui ocupa metade da zona do quadro. Rembrandt não nos distrai com objetos acessórios, apresenta-nos apenas a tensão e o peso do espaço existente entre o pintor e a obra a fazer. Para Stoichita, essa tensão presente em muitos dos quadros desse gênero, alcança aqui seu apogeu, condensando na imagem a instância crítica ou autocrítica do pintor e, consequentemente, acredito eu, da própria obra.
Ele [o pintor] não se representa, todavia, à obra. Ele acaba de fazer os clássicos três passos atrás que todo pintor conhece a significação: estes são “os três passos” que a gente faz, seja antes de atacar a tela, seja antes de um momento de pausa, quando, abandonando a instância operante, o pintor toma a posição da instância crítica (ou autocrítica)(STOICHITA1999, p. 319-320).
.20. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Fig.3 Rembrandt, O pintor no atelier, 1628 aproximadamente – óleo sobre madeira – 25,1 x 31,9 cm, Boston, Museum of Fine Arts
Michael
Glasmeier,
em
seu
texto
“No
atelier:
pintura,
fotografia e outras realidades” (2002. p. 23-24), publicado no catálogo da exposição Cher peintre... peintures figuratives depuis l'ultime Picabia, em 2002, no Centro Pompidou, também parte de uma leitura
deste
mesmo
quadro.
Para
Glasmeier,
tal
obra
é
fundamentalmente sobre a arte da pintura. “[...] Enquanto arte sobre arte, a vacuidade do espaço e o avesso do quadro sobre o cavalete
reenviam
às
questões
levantadas
pela
modernidade.
Enquanto pintura sobre a pintura, a obra combina a técnica, a maestria artesanal e a “Ideia” em uma contingência recíproca” (2002. p. 23-24). O autor salienta o caráter reflexivo do conjunto das obras de Rembrandt,
expresso até mesmo nos quadros de
encomenda. Nesse texto, depois de uma análise tão cuidadosa e perspicaz quanto a de Stoichita – a quem cita –, Glasmeier afirma que “este quadro ocupa um lugar chave no momento em que nos colocamos a determinar a situação da pintura nos dias de hoje”. Se, .21. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
por um lado, Stoichita enfatiza sua leitura na análise da posição crítica e autorreflexiva do autor (Rembrandt) ao criar um “cenário de produção em primeira pessoa”, Glasmaier, por seu lado, amplifica sua
leitura.
Tomando-o
então
como
paradigmático,
o
autor
demonstra como o quadro de Rembrandt levanta outras tantas questões que seriam fundamentais para a pintura contemporânea. Referindo-se, também, à obra de Cornélis Norbertus Gijsbrechts – Pintura enquadrada virada, 1660-75 (Fig.3) ressalta que mais do que o poder assombroso do trompe l'oeil e a autorrepresentação empreendida pelo artista, essa
pintura constrói “um espaço de
pensamento”³, no sentido entendido por Aby Warburg, e que ela resulta portanto, de uma distância consciente entre o pintor e sua obra, depois entre o espectador e o quadro (2002. p.24). Portanto, discutir sobre a representação na pintura contemporânea seria reavaliar a sua especificidade, não no sentido greenberguiano, não como linguagem reduzida à planaridade de seu suporte, mas como mais um meio de produzir imagens. Um meio inegavelmente ligado ao corpo, com características definidas que abarcariam inclusive seu poder “ilusionista”. Um meio extremamente permeável e potente em expressar o manancial de signos produzidos pela cultura.
Ao invés de pensarmos o advento da fotografia como
causa da coação da pintura à abstração, seria melhor ver esta como uma entre tantas possibilidades de caminhos para a pintura. Com relação à fotografia, como diria Glasmeier, devemos perceber que, devido ao “olhar que ela pousa sobre a experiência da realidade,
³ Conforme Antônio Guerreiro, Warburg definiu como condição do pensamento a criação de uma distância entre o eu e o mundo a que chamou de Denkraum, isto é, espaço de reflexão ou de pensamento. “O modo de criação do Denkraum, do intervalo entre pólos opostos (a oposição entre magia e lógica, conciliada, por um momento e nunca de maneira definitiva, no pensamento), é caracterizado como um modo essencialmente simbólico”. Segundo Warburg, “introduzir uma distância consciente entre o eu e o mundo exterior é aquilo que podemos designar como o ato fundador da civilização humana; se este intervalo (Zwischenraum) se torna substrato da criação artística, então esta consciência da distância pode tornar-se uma duradoura função social, cuja adequação ou insuficiência como instrumento de orientação intelectual significa justamente o destino da cultura humana”. Trecho citado por GUERREIRO, A. no artigo “Aby Warburg e os arquivos da memória”, in Enciclopédia e hipertexto. HTTP://www.educ.fc.ul.pt/hiper/resources/aguerreiro-pwarburg/, 30/05/2009.
p.
9,
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acesso
em
ela tem alargado e multiplicado as tarefas, as capacidades de representação e os assuntos da pintura” (2002. p. 25). Segundo David Reed, a pintura não pode ser definida apenas por seus materiais literais.
A pintura continua a ter possibilidades exatamente porque ela é um meio tão difícil de definir. A pintura é a mais impura e a mais adulterada das formas de arte porque sua maior virtude é sua facilidade em absorver influências externas. Ela teve uma simbiótica relação com vários sistemas de crença religiosa e política. Agora, ela pode ter, justamente, uma rica relação com as tecnologias de reprodução mecânica, como a fotografia e o filme, tão bem como com outros campos, como performance, arquitetura, escultura e instalação. Nós podemos ver como ela absorveu, também, a arquitetura, a escultura e a instalação, por exemplo. Thierry de Duve, você mencionou como a relação entre pintura e fotografia ascendeu uma das iniciais reivindicações para a morte da pintura. Ao invés de provocar a morte da pintura, como era esperado, a fotografia e outros meios de reprodução mecânica foram como um beijo de vampiro que tornou a pintura imortal. A pintura é a enfeitiçada/cativa ante os olhos frios da reprodução mecânica e pode fitar de volta da mesma maneira.4
Glasmeier, por sua vez, irá fazer a crítica a uma tradição historiográfica da arte de caráter evolucionista construída como simples sucessão de estilos, visto que “uma história da arte desta natureza termina por alcançar seu zênite na abstração da arte moderna”. As idéias do autor vêm ao encontro do que comentei no início deste artigo com referência aos critérios redutivos de Clement Greenberg. Importante salientar que o texto de Glasmeier integra o catálogo de uma exposição de pintores figurativos contemporâneos, realizada em Paris, em torno das pinturas figurativas dos anos 40 de Francis Picabia. Pinturas estas que, de certa forma,
4
Em 2003, a revista ArtForum convidou Yve-Alain Bois, Thierry de Duve, Isabelle Graw, David Reed, e os curadores da Exposição “Endgame” David Joselit e Elisabeth Sussman, para juntar-se a Arthur Danto, em um painel de discussão, com o objetivo de revisitar e reconsiderar os discursos sobre a morte da pintura nos anos 80. Ver “The mourning after: panel of discussion” in: ArtForum. March 2003. FindArticles.com.04 Feb.2007. http://www.findearticles.com/p/articles/mi_m0268/is_7_41/ai_98918657. Minha tradução. Enciclopédia e hipertexto. HTTP://www.educ.fc.ul.pt/hiper/resources/aguerreiro-pwarburg/, 30/05/2009.
p.
9,
.23. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
acesso
em
do artista. Em seu texto, o autor afirma ser necessária uma revisão da história da arte, principalmente no que concerne à relação entre os pintores realistas do século XIX e o advento da fotografia. Glasmeier sugere que se faça o deslocamento de uma análise baseada na abstração como alternativa para a pintura quando esta vê sua função de reproduzir a “realidade” substituída pela fotografia. Tal deslocamento permitiria “revisar a história da arte dos tempos modernos na tentativa de reabilitar a confrontação dos pintores com a realidade”. Ao fazer-se uma revisão, consequentemente seremos
levados
a
rever
aquelas
produções
figurativas
que
permaneceram à margem da “história” ou, senão à margem, ao menos enfocadas de modo redutivo. A pesquisa empreendida por Stoichita, mesmo estando circunscrita à produção dos Países Baixos no século XVII, é, para mim, de enorme valia por trazer a nu os procedimentos metapicturais utilizados na época. Tal fonte de pesquisa permite-me retomá-los e atualizá-los em meu trabalho prático, bem como traçar aproximações com determinadas pinturas de artistas contemporâneos, como as de Luc Tuymans, Mark Tansey, Matthias Weischer, Josefina Guilisasti, Adriana Varejão, entre outros. No texto introdutório de Vitamin P, Barry Schwabsky (2002, pp. 6-10)- traça um resumido, mas competente histórico das questões modernistas e do conceitualismo a fim de contextualizar a pintura contemporânea. Para este fim, delineia sua análise passando pelos dogmas greenberguianos, que viam na pintura abstrata a explicitação de sua autoconsciência, pela idéia de uma pintura universal de Ad Reinhardt, ao depoimento de Kosuth em 1969, de que toda arte depois de Duchamp é conceitual. De forma brilhante, o autor demonstra que, no radicalismo de cada “discurso” ou engajamento artístico, que no reverso da moeda, está inscrito o que a pintura, desde a pintura clássica, sempre foi de maneira mais ou menos explícita, ou seja, a pintura, mesmo figurativa, sempre foi uma abstração, foi conceitual (a pintura é cosa mentale, já diria da Vinci) e, em um bom número de vezes, autorreferente. Schwabsky também se pergunta do que fala a pintura hoje em .24. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
dia. E seu comentário está exatamente de acordo com o que tenho tentado demonstrar.
Sinto-me imediatamente tentado a eludir minha questão respondendo que cada pintor tem sua própria resposta e que alguns talvez tenham várias. Por suas origens modernistas e conceituais, a pintura contemporânea dá ainda a certeza de que o trabalho de cada artista deve expressar uma posição, que uma pintura não é somente uma pintura, mas também a representação de uma idéia sobre a pintura. Esta é uma das razões pelas quais há, hoje em dia, tão pouca contradição entre pintura figurativa e pintura abstrata. Nos dois casos, a pintura não está lá para representar a imagem; a imagem existe para representar a pintura (ou seja, a ideia da pintura sobre a pintura). O espírito polêmico é inerente a toda prática artística contemporânea, mas não no sentido onde ela invalidaria posições concorrentes (SCHWABSKY 2002, p. 8).
À pintura contemporânea, não interessa a pergunta essencialista O que é a pintura e quais suas especificidades, no sentido greenberguiano, mas quais os modos de se pensar e como fazer a pintura a partir de seus discursos, sua historicidade, bem como estender um diálogo amplamente rico com os variados meios tecnológicos de produção e reprodução de imagem. 3. A autorreferencialidade como assunto da pintura A partir dos anos de 1970, o fim da hegemonia da Pintura como categoria artística, paralelamente ao surgimento das mais diversas formas de manifestação artística, trouxe para o campo da pintura um sentimento de crise e, ao mesmo tempo, uma inteira liberdade de investigação e trânsito pela sua longa história. As perguntas sobre o que é a pintura na arte contemporânea, qual sua função ou o que é a pintura contemporânea estão sempre na ordem do dia. Do meu ponto de vista, a pintura, ao libertar-se dos dogmas tanto extrínsecos quanto intrínsecos a ela, encontra um campo amplo e fértil de possibilidades a serem exploradas. Pode ser investigada a partir de vários enfoques: a partir de seu poder representacional, da materialidade, da expressão, de seu suporte e outros. Considero-a como mais um meio entre tantos outros de dar forma e visibilidade às ideias. A criatividade, nos diz Abraham Moles (1998, p. 59.), “é a aptidão de criar ao mesmo tempo o problema e .25. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
sua solução”, sendo importante agregar a isto que a escolha do meio está indissociavelmente ligada ao problema que se quer criar. Para cada problema, deve-se buscar uma linguagem adequada, na medida em que a própria linguagem impõe suas especificidades. Então, quando escolho a pintura como meio, posso até mesmo trazer elementos narrativos,
metafóricos,
autobiográficos,
extrínsecos
à
linguagem, mas tenho a consciência de que a linguagem e sua própria biografia devem estar pari passu com o conteúdo. Por outro lado, o que é a ênfase de minhas investigações tanto práticas quanto teóricas, o conteúdo temático da pintura pode advir dela própria, de
seu
universo.
Nesse
sentido,
ela
é
tomada
como
autorreferencial. As pinturas e fotografias desenvolvidas em meu processo partem da idéia de autorreferencialidade, de um contínuo desdobrar
da
obra
sobre
si
mesma,
começando
pelo
registro
fotográfico do local onde a pintura será exposta, passando pelos registros do próprio “cenário de produção” e pela transformação destes em documento de trabalho para a pintura. São questões que se colocam e circunscrevem limites de investigação antes do ataque à tela e que durante o processo vão sofrendo alterações pelas surpresas, os acasos que surgem sobre a superfície. Acontece com a pintura a mesma coisa que com a escrita: pensar, ter a cabeça cheia de ideias não é o mesmo que escrever. Como nos diz Marques, escrever é “um ato inaugural: não apenas transcrição do que tínhamos em mente, do que já foi pensado ou dito, mas inauguração do
próprio
pensar
(2001,
p.
13)”.
Assim,
criar
limites,
circunscrever uma área de atenção torna-se um ponto de partida, mas, durante o processo, em uma relação dialógica com a superfície da tela e com o próprio entorno, o espaço de produção, novos eventos e imagens antes impensados vêm associar-se à obra. Em meu trabalho, pintura, fotografia e representação arquitetônica do espaço expositivo, estão intimamente interligados através de diversas estratégias que evidenciam sua interdependência e seu caráter autorreferencial (Fig. 4,5,6,8,9,10). A representação en
abyme,
procedimento
caracteristicamente
metalínguístico,
coloca em circularidade infinita os três espaços que considero interdependentes e que conformam a pintura: o espaço de produção, .26. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
o espaço de representação e o espaço de apresentação.
A
autorreferencialidade como tema, através do uso que faço de procedimentos metapicturais, não objetiva a busca de alguma essência, mas antes está a serviço da construção de um espaço de jogo que implicará, por sua vez, um espaço de reflexão no qual pintor, quadro e espectador estarão envolvidos. O termo reflexão deve ser tomado aqui em seus dois sentidos: dos fenômenos visuais e suas duplicações (reflexos), mas também espirituais e prospectivos (análise); de concentração do espírito sobre si próprio, suas representações, idéias, sentimentos. Ou, ainda, utilizando o que já foi dito acima por Glasmeier em relação à obra de Rembrandt, a construção de “um espaço de pensamento”.
Fig.4 Marilice Corona – Espaço de jogo, 2010 – acrílico e óleo sobre tela Área total 190 x 600cm - Exposição En abyme,2010 – Espaço Cultural ESPM – Porto Alegre
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Fig.5 Marilice Corona – Cenário de Produção, 2005-2009 – acrílico e óleo sobre tela – Área total 190 x 600cm. Exposição En abyme,2010 – Espaço Cultural ESPM – Porto Alegre
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Fig.6 Marilice Corona – Autoscopia, 2015 –óleo sobre tela – 40 x 60cm
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Fig.7 Marilice Corona – Exposição Autoscopias, nov. 2015 Galeria Bolsa de Arte – Porto Alegre
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Fig.8 Marilice Corona – Espaço de Jogo – O retrato de Tatiana, 2015 –óleo e acrílico sobre tela – 120 x 180cm. Coleção Museu de Arte do Rio Grande do Sul (MARGS)
Fig.9 Marilice Corona – Espaço de Jogo – O retrato de Tatiana, 2015 –óleo e acrílico sobre tela – 120 x 180cm. Montagem MARGS
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Fig.10 Marilice Corona – A quarta parede, 2015 –óleo e acrílico sobre tela – 120 x 180cm
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Para chegar ao mictório deve-se descer a escada em dois lances de 8 ou 80 To reach the urinal one should descend the staircase in two goes of 8 or 80 steps Este texto é uma versão revista e modificada de palestra com o mesmo título, contribuição do autor ao ciclo de debates sobre os anos 80, organizado por Guilherme Bueno, no MAC-Museu de Arte Contemporânea de Niterói, agosto de 2003.
Milton Machado¹ Resumo Partindo da consideração de que a tradição da pintura e a tradição do readymade são tradições concorrentes – portanto igualmente formativas e constituintes, no território da arte, de seus julgamentos e vigências – reflete-se sobre a condição de ambas as práticas
no
determinadas
contexto posturas
da
arte
contemporânea.
assumidas
por
Com
artistas,
atenção
a
críticos
e
historiadores no trato com a produção pictórica brasileira dos anos 80, sugere-se que uma revisão crítica de seus postulados esteja ainda por fazer. Abstract Departing from the consideration of Painting and the Readymade as concurrent traditions, therefore formative and constituent, in the territory of art, of its judgments and negotiations, the author looks at the condition of both practices in the context of contemporary art. Considering the reading of the pictorial production in the 1980s in Brazil on the part of artists, critics and historians, the author suggests that a critical revision of its postulates is still due. Palavras-chave: Pintura e readymade/Brasil anos 80
Estratégias
de edição/Painting and Readymade/Brazil 1980s Editing as strategy
¹ Milton Machado é artista plástico. Professor Associado da Escola de Belas Artes, no Departamento de História e Teoria da Arte e no Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais, PPGAV-EBA-UFRJ. Tem textos publicados em diversos meios impressos e on-line.
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Para chegar ao mictório deve-se descer a escada (em dois lances de 8 ou 80) Uma tela pode estar completa a ponto de nem mais o ar poder passar por ela, mas só é uma obra de arte se deixar espaços suficientes para que passem cavalos.²
16. Para chegar ao mictório deve-se descer a escada. Em outras palavras: foi a tradição da pintura o que permitiu o aparecimento do readymade. O readymade dialoga com a tradição da pintura tanto quanto
um
Cézanne
dialoga
com
um
Poussin,
ou
quanto
um
Rauschenberg dialoga com um de Kooning meticulosamente apagado (Erased de Kooning, 1953).
Daí que a manobra de colocar bigodes na Mona Lisa foi um desvio oportuno para evitar barbeiragens. Em todos esses casos, trata-se de um mesmo tipo de reverência. Reverência e traição: em arte, uma das modalidades mais elevadas da reverência – ou o diálogo mais profícuo entre artistas – é (justamente) a traição. Cézanne dizia: “Cada vez que me afasto de um Poussin tenho uma idéia melhor de mim mesmo”. Não teria sido para ter uma idéia melhor de si mesmo que Duchamp precisou afastar-se de um “retiniano” Courbet? Pois: para que possamos ter uma idéia melhor
² Huang Pin-Hung, citado por Gilles Deleuze e Felix Guattari, in O que é filosofia, Editora 34, 1997.
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de nós mesmos, cada vez que nos afastamos de (um, outros) Duchamp, não seria preciso reverenciar o readymade e a sua tradição? Caso contrário, como poderemos traí-los?
15. A história não passa procuração, daí que é preciso cuidado com os veredictos, principalmente os que se pretendem “históricos” com suas sentenças finais. Isso vale para o veredicto que Joseph Kosuth pretendeu definitivo, em Arte Depois da Filosofia (Art After Philosophy, 1969³) em que se recusa à pintura (e à escultura) o papel de investigar a “natureza” da arte. Ora, o readymade não veio para decretar o fim da pintura e de suas investigações, e sim para decretar – mas sem oferecer garantias – a continuidade da arte. Por isso, a pintura-em-continuidade teve e tem que levar em conta o readymade, sua existência e sua tradição. Em outras palavras: para reencontrar a pintura, o artista deve voltar a subir
as
escadas
que
o
levaram
ao
mictório.
Vestido,
de
preferência, vale dizer recomposto, com a compostura que se espera de um artista que presta suas homenagens às “fontes” e a todas as demais histórias da arte.
³ Disponível em http://www.ubu.com/papers/kosuth_philosophy.html
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14. Voltar a subir as escadas: seria isso o que se quis dizer nos anos 80, quando se propalava a tal “volta da pintura”? Ora, não é a volta da pintura o que era importante nos anos 80. A pintura, de fato, nunca se foi. O importante era o interesse dos artistas pela persistência
da
imagem,
pela
sobrevivência
da
imagem
como
elemento potencial de significação, em um momento de sua máxima saturação por abuso de exposição e excesso de visibilidade, e que poderiam levá-la a um estado de máximo esvaziamento de sentido. Só que essa pesquisa, esse voltar-se para a imagem, não privilegiou um meio em particular – não privilegiou a pintura, como não privilegiou a fotografia ou o vídeo, ou o cinema – justamente porque o estado de máxima saturação da imagem tende a homogeneizar todo e qualquer suporte (isso, no entanto, não impede que se possa considerar as fotografias, por exemplo, de uma Cindy Sherman mais significativas ou interessantes do que as pinturas, por exemplo, de um David Salle, para o desenvolvimento da pesquisa – nos Estados Unidos – e para a própria potencialização da imagem universal).
13. A arte, em sua longa e contínua história de descontinuidades, já teve que dar conta de outras rupturas. Michael Baxandall, em O Olhar Renascente4, lembra-nos que, com os desenvolvimentos da perspectiva
no
Quattrocento,
aumentou
consideravelmente
4
a
Michael Baxandall, O olhar renascente: pintura e experiência social na Itália da Renascença, Jorge Zahar Editores, 1989.
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incidência de ângulos retos e de formas prismáticas, tanto na pintura quanto na escultura e na arquitetura – vale dizer, no real. Outra ruptura, e com efeitos igualmente importantes sobre a imagem e a representação, ocorreu no século 19, com a invenção da fotografia. Muitos acreditavam que a fotografia decretaria o fim da pintura (da mesma forma que alguns cientistas do século 19 afirmaram que as viagens de trem, devido às “altas velocidades”, fariam mal à saúde, deixando incuráveis sequelas, incluindo a cegueira e as doenças mentais). No entanto, sabemos da relevância da fotografia para as conquistas do Impressionismo, assim como sabemos que o Impressionismo – visto por muitos como doença mental ou cegueira – foi um descarrilamento da pintura que colocou a arte devidamente nos trilhos. 12. Uma pintura que leve em conta o aparecimento e a tradição do readymade. Que pintura seria essa? Difícil dizer, a não ser que se adote o tom de blague modernista de um Greenberg vaticinando que uma tela em branco já é uma pintura, embora não necessariamente uma pintura bem-sucedida. É menos importante dizer que pintura é essa do que fazer dessa pintura uma pintura bem-sucedida. Em outras palavras: é possível que os esforços dos pintores que se dedicaram àquilo que, nos anos 80, costumava-se chamar de “má pintura”
tenham
resultado
em
uma
pintura
que
dê
conta
da
existência e da tradição do readymade. Afinal, não fosse a estratégia de apropriação e nomeação que é típica do readymade, a estratégia de apropriação e nomeação da pintura (gênero) pelos bons pintores de más pinturas não teria sido possível. A assim nomeada, ainda que nem sempre apropriada, má pintura dos anos 80 presta mais homenagens aos piores readymades do que às melhores pinturas. Uma boa má pintura dos anos 80 é menos uma grande pintura do que o Grande Vidro é uma grande pintura. O Grande Vidro não é um trabalho de pintura, mas é um trabalho da pintura, assim como a pintura é um trabalho da arte. É possível que os cubistas mais ortodoxos (Gleizes, Metzinger...) tenham reconhecido ser este o caso de Nu Descendo a Escada, e que tal reconhecimento os tenha levado, em nome da pintura, dos veredictos, dos tratados e da 5
ortodoxia, a recusá-lo. Se ao menos o nu descesse vestido... (vale dizer, recomposto etc. etc. ...) .40. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
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11. Uma pintura que leve em conta a tradição do Grande Readymade e a tradição da Grande Pintura deve ser uma pintura capaz de aguentar o tranco de ser taxada como algo em que se tropeça quando, andando para trás, nos afastamos para ver melhor uma instalação, performance, ou qualquer outra obra contemporânea que não seja de pintura – subvertendo a célebre e irônica definição de Ad Reinhardt 6
de escultura . Só que o objeto contemporâneo em questão, esse também tem que segurar o tranco de poder ser taxado assim: toda vez que me afasto desse objeto eu tenho uma idéia melhor sobre a pintura. 10. Não sei se o leitor já conseguiu localizar em seus arquivos visuais exemplos satisfatórios dessas tais pinturas que levem em conta a tradição essa e aquela do grande isso e aquilo… Eu também teria dificuldades em formular uma lista de pintores cujas pinturas eu considero isso e aquilo … Mas eu gostaria de dar dois exemplos que me parecem óbvios, de artistas estrangeiros: Gerhard Richter e Robert Ryman, exemplos de pintores do tipo que estou sugerindo que 7
procuremos .
5
É sabido, segundo relato – irônico, fatalmente – do próprio Marcel Duchamp, que o júri do salão de inspiração cubista que recusou Nu Descendant un Escalier (1912), do qual faziam parte os pintores e teóricos Albert Gleizes e Jean Metzinger (autores do tratado Du Cubisme, 1912), teria solicitado ao artista que “mudasse ao menos o título”. 6
Escultura, segundo a definição de Reinhardt, seria aquilo em que se tropeça quando nos afastamos para ver melhor uma pintura. 7
Citar pintores tais como Rauschenberg, Johns, Warhol, Lichtenstein... seria apelar demasiadamente para o óbvio. No entanto, nunca é demais remeter ao texto Other Criteria, de Leo Steinberg (Outros Critérios, tradução publicada em Clement Greenberg e o debate crítico, org. Gloria Ferreira e Cecília Cotrim de Melo, tr. Maria Luiza X. de A. Borges, Jorge Zahar Editores, Rio de Janeiro 1997), e a sua definição da “flat-bed painting” praticada por Rauschenberg, cujos suportes presisavam ser resistentes o suficiente para suportar, por assim dizer, o peso do mundo (mundo sobre tela?).
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Vendo essas imagens de pinturas de Richter e, mais ainda, ouvindo com atenção o próprio pintor afirmar “eu pinto para fazer fotografia” (um pintor que afirma isso, colocando a fotografia na rota de um estratégico afastamento da pintura – e/ou o contrário – só pode estar querendo provocar nossos tropeços, para que caiamos de cara e em cheio tanto nesta quanto naquela): não nos parece, como sugeri, que as estratégias de Richter são muito mais próximas de um certo “nominalismo pictórico” (o termo é de Duchamp) do que de um certo e irrestrito (puro) pictorialismo? Não seria mais conveniente classificarmos essas pinturas como exemplos de um incerto e restrito pictorialismo? De um pictorialismo vagante, extravagante, errante, que caminha s/em qualquer direção? Que, se propõe alguma direção para a pintura, o faz na direção oposta à da Grande Pintura, com a qual parece marcar e atualizar um permanente desencontro? Que, diante da grande narrativa que a Grande Pintura constituiu no Modernismo, a recupera por meio de pequenas grandes pinturas que magnificam as pequenas narrativas?
.47. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
.48. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Reproduções fotográficas não fazem justiça a pinturas, em especial às de Robert Ryman. Essas imagens ilustram o ensaio Radiant Dispersion (Dispersão Radiante), por Jeffrey Weiss, para a revista Artforum, setembro de 2002. Trata-se de um texto sobre Prototype (Protótipo), uma série recente de trabalhos de Ryman, cuja execução envolve aplicações e retiradas de fitas adesivas, até a fixação dos suportes – são placas delgadas de acetato – ao muro, 8
pela própria aderência da tinta .
Cito duas frases do autor que o editor selecionou como chamadas (tradução minha):
Pode-se dizer que os três Protótipos já produzidos até agora [2002] constituem manifestações efêmeras de um trabalho que também existe num estado puramente conceitual. O título reflete perfeitamente essa ambiguidade: cada encarnação da pintura, completa por em e si mesma, é também um 'protótipo' para a próxima.
Um Protótipo de Ryman se auto-sustenta. Começando com as pinturas produzidas por remoção de fitas, esse feito improvável – que é, acima de tudo, uma jogada de extrema inteligência e humor – representa um desenvolvimento histórico na filosofia e na prática da pintura.
9. Diante deste trabalho de Ryman, que busca uma pintura (quadros) auto-portante, todo estrutura, parece fazer mais sentido ainda a pergunta (de Arthur Danto, nossa): Robert Ryman representa o fim, ou um reinício da pintura? Não sei se há resposta nem se é o caso de se procurar responder a tal pergunta. O que sabemos é que a pintura de Ryman representa um modo de a pintura conviver com os tantos outros modos de se fazer arte: performance, instalação, foto, filme, vídeo, ações de toda ordem. Sim, porque esses Protótipos, antes e depois de serem pinturas mas sem deixar de ser pintura, são ações, são atos de pintura.
8
Vídeos sobre Prototype podem ser vistos em http://www.pbs.org/art21/artists/ryman/clip1.html
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8. Mas, e daí? Não seriam todas as pinturas atos de pintura? O que teriam então estas pinturas de extraordinário, que possa nos levar a caracterizar como pintura mais o ato que as engendra do que os resultados – os fatos consumados – de tais atos de pintura? Não seria, então, melhor pensá-las, ainda a partir desse seu meio, mas na direção de um outro fim, outro fim que não os resultados que tais pinturas apresentam, no fim? O que quero dizer é que atos de pintura podem ter outros fins além de se constituir como pinturas. Em outras palavras: um dos fins de uma pintura que leva em conta essa e aquela tradição do grande isso e aquilo, isto é – e agora falando clara
e
francamente
–,
de
uma
pintura
que
já
se
quer
contemporânea, é trair a pintura que já se quis pura. Ora, não foi a pintura que “se quis” pura; quem queria que a pintura se quisesse pura eram os grandes críticos modernistas, como Clement Greenberg e Michael Fried, que se recusavam a ouvir da pintura – ou da arte – seus pedidos lancinantes de “eu quero é chocolate” (um blend, mistura processada a partir de grãos distintos de cacau). Já me referi – maldosamente – em outro texto9, à frustração de Michael Fried (em Art and Objecthood, 196710) diante de sua bola de cristal, vendo tudo e prevendo de tudo com impressionante acuidade e nitidez – performances (happenings), instalações (ambientes), intervenções no espaço real (land-art, earth works), ações “teatrais” de toda ordem, que lhe eram incomodamente contemporâneas – e reclamando, contrariado: “Mas que droga de bola de cristal, que me mostra tudo, menos o que mais quero ver, quando o que mais quero ver é o mais puro cristal!” Assim como o mais impuro cascalho contemporâneo assombrava a bola do mais puro cristal modernista, a pintura que já se quis pura assombra a pintura-em-continuidade com o fantasma de uma pintura descontinuada. Pois é justamente essa descontinuidade aquilo a que se costuma referir como “morte da pintura”. A morte da pintura
9
The imaginary encounter between Hélio Oiticica and Kasimir Malevich in the open air, or How an American art critic lent his innermost essence to a Dutch curator, contribuição do autor à mesa-redonda sobre o trabalho de Helio Oiticica, inIVAInternational Institute for the Visual Arts, Londres, 1999, por ocasião do lançamento do CD-Rom HO-Supra Sensorial, de Katia Maciel, produção N–Imagem/UFRJ, Rio de Janeiro 1998. 10
Ver Arte e Objetidade, in Arte & Ensaios #9, PPGAV-EBA-UFRJ, 2002, tr. Milton Machado.
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é como um fantasma modelado em chiaroscuro. A morte da pintura só nos interessa se for mantida viva – tarefa essa que cabe a nós, imortais. 7 (PATAMAR). Essas ações de Robert Ryman (e mesmo certas ações do pictorialismo
incerto
e
vagabundeante
de
Gerhard
Richter)
incorporam, inevitavelmente, operações de COPY e PASTE. O que pretendo
sugerir
característica
é
do
que
as
trabalho
estratégias
de
contemporâneo,
EDIÇÃO e
não
são
apenas
uma de
trabalhos de arte contemporânea, mas de qualquer trabalho que pretenda, no âmbito de suas particularidades, operar sobre as verdades. Operar sobre as verdades é uma maneira de se manipular o Real. Exemplo: a transmissão de guerras reais por diferentes canais de televisão mostra guerras diferentes, e irreais. Certas guerras são, nesta lógica, melhores programas do que outras. Bem, já foi o tempo – tempos de Mondrian, Malevich etc. – em que era necessário a pintura operar sobre a verdade que afirmava que a pintura é o real: pintura como “presentação”, e não mais como representação. Hoje, o tal Real não basta como verdade para as operações sobre as verdades da pintura. A pintura, que já se quis pura, que já se quis representação, que já se quis presentação, hoje quer contar histórias: narrar. E essa narrativa inclui contar, da própria pintura, essas suas próprias – e as impróprias – histórias. A rigor, a pintura sempre quis contar histórias; mas esta sua prerrogativa ancestral esbarrou – e tropeçou – no duro e puro cristal do credo formalista, que se dispôs a extirpar, da pintura e da arte, toda e qualquer exterioridade. E conseguiu: a dicção formalista conta, da pintura e da arte, uma história imprópria, ao considerar que a pintura e a arte têm algo de próprio. E aí está alguma justificativa para a persistência pósmoderna
da
imagem
e
da
recuperação
de
seu
potencial
de
significação, a que me referi acima. Até Manet, a quem nos acostumamos a ver referido como o precursor da pintura moderna (ver Greenberg em Pintura Modernista
11
, por exemplo) por causa de
11
Publicado em Clement Greenberg e o debate crítico, org. Gloria Ferreira e Cecília Cotrim de Melo, op. cit..
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Manet - Luncheon on The Grass 1863
suas
conquistas
formais,
de
suas
manchas
cromáticas,
da
autonomização do gesto e da cor, da afirmação da planaridade etc., está sendo revisto e re-estudado e, cabe frisar, a partir dos anos 80 e até, com especial brilhantismo, pelo próprio Michael Fried, com a proposta de se re-contextualizar Manet, agora pelo viés dos dramas, dos temas, da historicidade – vale dizer, das narrativas – 12
que sua pintura encerra .
12
Ver, a respeito dessa tendência de re-interpretação de Manet: Manet's Modernism: the Face of Painting in the 1860s, por Michael Fried, The University of Chicago Press, 1996; Voici, 100 ans d'art contemporain, Gand, 2000, por Thierry de Duve; e mais próximo de nós, A pintura da vida moderna: Paris na arte de Manet e de seus seguidores, por T.J. Clark, tr. José Geraldo Couto, Companhia das Letras, Rio de Janeiro 2004; A reinvenção do realismo como arte do instante, por Luiz Renato Martins, revista Arte & Ensaios #8, PPGAV-EBA/UFRJ 2001, além de, pelo mesmo autor, Manet, uma mulher de negócios, um almoço no parque e um bar, Jorge Zahar Editores, Rio de Janeiro 2007.
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6. É possível que a utilização das técnicas de edição de COPY e PASTE ajudem (mas sem garantias) a pintura contemporânea a dar conta dessa e daquela tradição do grande isso e aquilo. A boa utilização de tais técnicas pode levar à produção de eficazes narrativas. Operar sobre as verdades da narrativa equivale a escrever a história. Isso pode soar como uma deslavada mentira, mas a história mais verdadeira, mesmo que suja e impura, é a história mais bem escrita. Não fosse assim, as histórias escritas por Greenberg e Fried (sobre limpeza e pureza) não mereceriam o crédito que lhes é devido. A boa utilização das técnicas de edição de COPY e PASTE pode evitar que uma pintura seja cópia ou pastiche 13
da pintura já editada no passado que hoje se quer re-editar bem .
5. São muitos os pintores contemporâneos (além de Richter e Ryman) que se utilizam de técnicas de edição para produzir suas próprias narrativas. Só para citar alguns exemplos imediatos, desta vez de artistas brasileiros, e que começaram a trabalhar nos anos 80: Beatriz Milhazes, Adriana Varejão, Leda Catunda, Daniel Senise, Luiz Ernesto, Luis Zerbini... Não é só por isso, mas é também por isso que se mantém aquecido o interesse por suas narrativas e, de modo geral (na verdade, particular), por suas pinturas.
4. Mesmo que nos aproximemos, perigosamente, da Grande Cópia, há diversas modalidades de mímesis: pode-se copiar a natureza, podese copiar pinturas, pode-se copiar fotografias... Dentre as várias modalidades da mímesis, a mais problemática é fazer cópias da arte. E uma de suas consequências mais problemáticas é que coisas que se parecem com arte fazem com que o circuito e o mercado se pareçam com arte. 13
Não é difícil demonstrar como o próprio Manet utilizou o que se poderia identificar como estratégias de edição – melhor dizer, de montagem, arriscando uma tentativa aproximação do cinema – em suas pinturas, de regra rejeitadas. O escândalo que Le Déjeuner sur l'Herbe, por exemplo, provocou entre seus detratores deriva – em grande parte, mas não apenas – de sua construção fragmentada, como que por montagem a partir de recortes incongruentes, que a academia só poderia estranhar, respaldada pelas regras da boa composição e da unidade pictórica. Ver, a esse respeito, Manet..., de Luiz Renato Martins, supra-citado.
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Quando, nos anos 80 (e pelo mundo afora), o circuito e o mercado falavam de um retorno da pintura, talvez pretendessem que uma certa pintura de retorno traria de volta a arte, e a arte de volta à vida. No entanto, sabemos: só uma arte assombrada – revisionista, historicista – pode retornar do além para “vi-ver” de
novo,
e
mesmo
assim
como
cópia,
repetição
e
pastiche
(COPY/PASTE não é garantia). Nos anos 80 (e pelo mundo afora), talvez
influenciados
por
um
Zeitgeist
apressado,
sem
tempo
suficiente para constituir um espírito, muitos críticos operavam mal sobre as verdades da pintura porque escreviam mal a história 14
(ou a teoria) da arte . Entre nós, a tendência dominante era a de representar jovens artistas como uma espécie de empiristas inspirados embalados por alguma forte emoção, afagando certa (ou uma incerta, restrita) “pintura expressionista” com carícias de vampiro, e atribuindo a preferência a algum tipo de fissura geracional. Por isso, muito daquela crítica, muitas daquelas pinturas e muitos daqueles pintores já não produzem reflexões no espelho. Ou melhor, produzem: se observarmos o espelho mais atentamente, para além do lusco-fusco e da homogênea palidez de superfície,
veremos
que
jaz
ali
uma
potência
adormecida.
Zeitgeist: o mostrador da meia-noite é o mesmo que anuncia o meio15
dia: de um lado, mancha cromática; do outro lado, borrão . 3. Finalmente, ainda no cruzamento entre a edição e a re-edição, proponho um jogo, com recursos de tradução, traição, ilusionismo e vampirismo, onde me utilizo de técnicas de COPY e PASTE para produzir uma pequena narrativa sobre modos de operar sobre as 14
Isso vale, igualmente, para parte da crítica que, simetricamente à celebração interessada (o Zeitgeist é um mostrador de dupla-face), proclamava que a pintura havia chegado a um irremediável impasse, portanto desprovida de qualquer interesse. 15
De fato, os jovens pintores que começaram a atuar nos anos 80 eram exatamente isso: jovens artistas em início de atuação, daí que se deva considerar seus primeiros trabalhos como experimentações, legítimas e de todo desejáveis. Muitos daqueles artistas acabaram por afastar-se da pintura para se aproximar de outros meios. Se algum reparo deve ser feito, trata-se de rever os postulados que, em geral, regiam a apropriação crítica dessa produção, a meu ver ainda por fazer. Muitos críticos importantes preferiram não dedicar a devida atenção a tal produção, um parti-pri necessitando igualmente de revisão. Em muitos casos, coube aos próprios artistas
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verdades, ainda que com o risco de deletá-las:
SALVE O DELEITE > LI > SA VE OLI DELE TE a arte
da pintura
a arte
da pintura
2. Naqueles anos 80, arautos de uma pintura de retorno procuraram instilar um vírus (com o pretexto de SALVAR a arte, bem entendido) que quase acabou por comprometer seu próprio sistema operacional. Um vírus anti-pluralista, que parecia querer confundir ou apagar da memória, principalmente, a produção dos anos 60 e 70, acusandoa de posturas indesejáveis, herdadas de sua igualmente suspeita linhagem conceitual. Lembro-me de ter assistido a uma palestra de um importante crítico, em uma galeria igualmente importante do Rio de
Janeiro,
ambos
franca
e
sinceramente
envolvidos
com
a
propagação da boa nova – o retorno da pintura – na qual se fez uma seleção cuidadosa de quais artistas teriam alguma relevância para o desenvolvimento da então emergente produção de pintura. Em outras palavras, quais artistas eram capazes de produzir reflexões em seus espelhos. Picabia entrou. Duchamp ficou de fora. Pretendendo fazer de Duchamp – entre outros (um, outros) excluídos da projeção de slides em loop da história da arte – um “desafeto” de jovens pintores, alguns críticos influentes – com o devido reconhecimento da relevância de suas atuações profissionais e de suas contribuições para a reflexão
(se quisermos, sobre a
“natureza” da arte) – pareciam querer impedir que jovens pintores produzissem uma pintura “afetada”. Uma pintura afetada seria uma pintura que é um meio entre os meios. Uma pintura que é um meio entre os meios faz pensar em contínuas trocas de lugar, em movimentos de contínua e permanente translação / tradução / tradição / traição, até como formas de refrescar nossas memórias sobre as sutilezas da etimologia. Ao contrário, colocando a pintura no centro em um momento (de pluralismo) em que já não havia mais centros, em que só havia meios, entremeios, espaços-entre, distâncias-em-proximidade, pareciam querer impedir a pintura de traduzir-se para outros idiomas, deixando-a falando sozinha, .55. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
auto-centrada e ensimesmada, produzida mas improdutiva, inchada mas ainda faminta – e por chocolate. 1. DELETAR é uma forma de apagar da memória, em alguns casos sem a devida reverência, nem que seja pelos zeros e pelos uns, entre outras sutis diferenças, em um sistema que não tem nada de binário. Por caprichos de programação, o vírus que deveria deletar o que se costumava referir pela alcunha geral e imprecisa de “conceitualismo”,
e
que
se
procurava
culpar
por
atitudes
indesejáveis tais como “hermetismo”, “racionalismo”, “elitismo”, ou até mesmo por uma imperdoável “empáfia”, quase acabou deletando o que se pretendia salvar. Ainda bem que prevaleceu a velha regra do “salve-se quem puder”. E a pintura-em-continuidade – SALVE! – 16
essa felizmente pôde, e ainda pode . ZERO. Piso onde já é chão. Sugiro chegar a mais esse fim que reinicia o térreo com o embalo de João Cabral de Melo Neto, poeta tradicional. O que se segue é a segunda parte do poema Na Morte de Marques Rebelo, que Cabral dedicou à memória do escritor e amigo, neste ano [2007] em que se comemora – ou se deveria comemorar com a devida reverência – seu centenário de nascimento (06/01/1907). E como José Maria Dias da Cruz, que é pintor e amigo tradicional (mais próximo dos 80 anos do que dos anos 80), é uma espécie de memória viva de Marques Rebelo, que era seu pai e amigo, creio que podemos re-dedicar o poema (numa estratégia à la readymade)
à
memória
viva
da
pintura,
dos
pintores,
dos
escritores, de seus pais, de seus filhos, legítimos, bastardos, e de todas as suas famílias.
16
É menos importante dizer que pintura é essa do que fazer dessa pintura uma pintura bem sucedida.
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Fuzilar o gesto no vôo; mas que o gesto assim fuzilado prossiga no seu vôo vivo e conserve vivo seu pássaro. Fuzilar o gesto de jeito que aquele vôo assim cortado não se corte num instantâneo; mas continue a voar parado. Continue ainda a se fazer, a se voar, com todo espaço; conserve o gesto e o pulso de antes, e não morra, embora caçado. 16. ... espaços suficientes para que passem cavalos ...
NOTA: Imagens do acervo do autor
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A Way to Know, A Way to Go
Barbara Ellmann¹ ABSTRACT Barbara Ellmann, a New York painter and freelance teaching artist, describes an innovative concept that combines her work as a fine artist and as an aesthetic educator into an exhibition's unusual design. She discusses the experiences that led to her exhibition and the ideas that have developed over thirty-five years of painting and teaching.
As an educator at The Museum of Modern Art
and The Whitney Museum and having observed the distance between curatorial decisions and the location of educational experiences she questions how else art could be presented to the general public and to student groups. AN OPEN BOOK, work by Barbara Ellmann is an attempt to break the wall-text conventions of explanatory and didactic language by providing instead visual support materials for visitors to explore in the exhibition itself. On reflection both obvious and a surprise to her was the discovery that a lifetime of work as an artist had led to the innovations visible in this exhibition. ENCAUSTIC; TEACHING ARTIST; INSTALLATION I have known all my life that I was an artist of some sort but it wasn't always clear if I would be a dancer, or a musician, or an actor, or a painter.
I was lucky enough to grow up in an
environment where I was given the chance to find out how I would develop and which of these forms of expression would take hold of me. I was curious and then influenced by some extraordinary people. Not my immediate family, but some family friends-- not artists
¹ Barbara Ellmann nasceu em Michigan, nos Estados Unidos. Atualmente vive e trabalha em Nova York. Suas pinturas foram expostas em galerias e museus de todo o país e além fronteiras, incluindo o Museu de Arte Haslla Mundial, Museu de Arte de Bellevue, o Museu de Arte Montclair e o Museu de Arte Parrish. Ellmann é professora de Artes no Lincoln Center Education desde 1980. É também educadora no Museu de Arte Moderna, e no Museu Whitney ; ela ensina oficinas de encaustica para a empresa R & F Handmade Paints em seu Ateliê em Long Island.
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exactly but to my mind artistic. Their thinking was quirky, they traveled, they collected objects that appeared exotic to me — souvenir spoons, embroidered ribbons,
Japanese
screens,
Cambodian
sculptures,
French
chocolate wrappers. Professional dancing came first and, like performing, teaching came along with it. As an artist in the schools I was working with teachers and students. So when I retired from dancing with a New York modern dance company I found myself hired by Lincoln Center for the Performing Arts' education program. I have remained at Lincoln Center Education since 1980 where I am a practitioner of aesthetic education. When I am asked, I explain that I teach others—from 4-year-olds to forever-yearolds — how to have deep and meaningful engagements with works of art. My serious painting began a few years prior to this, professional dancing had an expiration date attached to it. I had seen those fine photographs of an elderly and infirm Henri Matisse cutting glorious shapes out of hand colored paper and I decided that was the way to go. I fell for encaustic painting, working with pigmented beeswax, and so began what I have come to understand as my mature creative work. I am exploring a broad range of imagery in my painting that is in response to my lived experience. As I move through the city, its rush and complexity enter my mind with abstract references to people, architecture, and events. There are things to notice everywhere, and to live and work here means an abundance of information coming at me daily that needs to be sorted, categorized, and filtered for use in my work.
The motions
of shapes pushing, squeezing, leaning, and bulging and the expressive nature and vitality of color are constantly in view. As these experiences enter my painting they are transformed, edited, expanded upon, and layered into my abstract vocabulary of color, line, and shape. When I reflect on my working process I can't help but think about my part-time work as an educator.
Whether at Lincoln
Center, the Museum of Modern Art, or the Whitney Museum, the process and pedagogy of teaching in order to stimulate the viewer's
encounter
with
works
of
art
have
expanded
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my
understanding of what is involved in making a great painting or sculpture. I have been deeply affected by studying the work of other artists and looking for the organizing principles, the outstanding details, the working methods and techniques that they have employed in their work.
Deconstructing the work of others
has helped me to construct my own work and to describe, analyze, and interpret what is happening in front of me while painting. The cliché that those who can't, teach, does not apply here. Close to my life as a painter has been my teaching and I have been committed to developing both roles with equal passion. Painting has been in ways more personally rewarding, for some unknown part of yourself is revealed to you while you work. Indeed teaching has been more performative for me and its successes are instantly felt and mirrored back by my excited students displaying and reporting the aesthetic experience they have just had. A friend of mine describes this as making the world a safer place for art. It is my artistry that makes me so effective in my teaching—my enthusiasm, my creative ideas for inventing art activities, my ability to listen and my eagerness to respond—all emerge from my artist self. In
2013
an
independent
curator,
Sophia
Marisa
Lucas,
suggested organizing an exhibition that would combine my painting with my teaching and posed the question to me of what that might look like. I had never presented myself as an educator to the fine art world and was worried how that would be received. My reputation as an educator has taken me to Hong Kong, Shanghai, Singapore, Seoul, Mexico City and all over the United States but my professional standing as a painter has not been as far reaching. So it was worth trying to bring the two parts of myself together to see if that would create a new and expanding interest in my painting. We worked on the exhibition together over the next few months and created AN OPEN BOOK, work by Barbara Ellmann. The exhibition appears without wall text, and was created to be read and understood entirely on visual terms by following your own inquiry into what is before you.
The title is in itself an
invitation. While it suggests a frankness and transparency, it also implies the action involved in taking in the material presented. It asks the viewers to respond to the work in their own .60. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
also implies the action involved in taking in the material presented. It asks the viewers to respond to the work in their own way, making sense out of patterns, associations, contrasts, and connections to their own experiences. The paintings are displayed in large grids, in groups of individual panels with up to thirty discrete parts. These groupings become communities where the interactions between panels converge, collide, and conflict. The viewer is encouraged to identify and discover an entry point into the work, letting
the
eyes
navigate
their
own
pathways,
across
and
throughout the grid. Looking at the differences and similarities among the individual panels leads one to imagine associations and make personal meaning. The viewer is drawn in and opens up to the many possibilities and ways of understanding my work. What is the viewer reminded of? Where has the viewer seen this before? What is this
like?
All
of
these
questions
are
encouraged
by
the
exhibition's design. The viewer's response becomes a central concept in this plan. Lucas in her curatorial statement describes it like this, “Ellmann has
invited
visitors
to
take
on
a
critical
role
in
this
exhibition, as makers of their own aesthetic experience. AN OPEN BOOK is in part precisely about this collaboration. Her work and the viewer's response are a key subject of the show — an experiment in mutual exploration of the reflexive natures of artistic practice and aesthetic education; instruction and learning; experience and perception; subject and object.”
TURNING TOWARD, encaustic on 20 wooden panels 24”x24” each, 2013
.61. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
OUR BELIEFS, encaustic on 30 wooden panels 24x24 inches each, 2013
.62. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
WHERE TO STOP, encaustic on 30 wooden panels 24x24 inches each, 2013
.63. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
PICTURE IT, encaustic on 20 wooden panels 24x24 inches each, 2013
GAMEBOARDS, beeswax and mixed media on kitakata, each 10x10 inches, 20012013(detail)
.64. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
In AN OPEN BOOK, the curator and I brought together four multi-paneled
installations
of
paintings
made
up
of
100
individual sections and a large group of 230 wax-dipped drawings. In addition to the artwork was a room full of related contextual materials to encourage active viewing and participation.
It was
the inclusion of these materials that was an unusual exhibition choice to make, where traditionally “educational” materials appear separate from the artwork all together. Why is that? In my museum teaching experience where we are actively trying to involve audiences in deeply noticing the artwork on display, all that is presented is a wall label with the who, what, where, and when of the art object and sometimes a bit of art history. Frequently the art education related to an exhibition doesn't happen near the galleries. Separated by distance teaching might take place in a school, in a classroom at the university or museum, or in a studio. If the artwork is shown in these settings it is on a screen or poster, or, worse, a postcard, where the materiality, color, and scale of the original are altered.
For many reasons
this disturbs me. I have seen “Starry Night” reproduced all over the world where students learn he cut off his ear; but what about that great painting? Let's look at that! And in person! AN OPEN BOOK included contextual information and educational opportunities around the corner of the wall and adjacent to the artwork's
display
in
a
non-didactic
way.
Again,
without
instructions on what to do or how to interact with these materials the following were gathered there. First, a large format photograph of the view from my studio, where all of this work was made.
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View From My Studio Window
My painting has been influenced by this place where I work, this view, the grid of the city's streets, the crowds, and the city's architecture. An ipad with an app allowed visitors to rearrange the twenty panels that make up PICTURE IT and send their arrangement to a tumblr feed that could be accessed outside of the exhibition. The ipad was connected to a projector so other viewers could observe the
process
of
rearrangement
taking
place.
Throughout
the
exhibition these potentialarrangements were viewed by me and Sophia, the curator, and each week we selected a new configuration for the gallery walls. This very process mirrors what takes place in my studio practice and determines how individual panels become grouped into installation grids. The grids are unfixed so in each site a new grouping is formed.
.66. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Contextual Information Lab, installation view, Richmond Center for the Visual Arts
Laminated
photo
cards
of
places,
patterns,
stacked
objects, and natural forms that have multiple connections to the abstraction that occurs in the work of AN OPEN BOOK, hang on hooks and can be transported around the exhibition to stimulate and encourage conversations about how real life experience morphs into abstraction. What is it about these photo cards that
can
be
found
in
these
paintings?
There
are
many
associations to be made through likenesses of color, shape, and line.
.67. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Tools and Touch Panels in the Contextual Information Lab, Richmond Center for the Visual Arts, Western Michigan University
To give a sense of the material process a number of elements were
included.
Touch
panels
that
invite
visitors
to
feel
encaustic's sensuous waxy surface, a case of tools of the sort that I use to create a range of textures, a box of encaustic bricks that suggests that the paint needs to undergo an alchemical process to become a painting, and a looping ďŹ lm of the painting of the touch panels to further demonstrate the solid liquid solid transformation that is involved in the making of these works and how the tools are utilized to produce them. .68. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
The exhibition has been presented twice so far in Kalamazoo, Michigan at Western University's Richmond Center for the Visual Arts and in Palm Desert, California at the College of the Desert's Marks Art Center.
Both of these
exhibitions had their primary institutional support from aesthetic education programs -- Education for the Arts in Kalamazoo, and The McCallum Theater's Aesthetic Education Program
in
Palm
Desert.
A
catalog
accompanied
the
exhibition with an introduction by Sophia Marisa Lucas and essays by Albert Mobilio and Joseph McElroy. It is my hope that AN OPEN BOOK, still available as a touring exhibition, will have more venues. More than 3700 people visited the exhibition in its two iterations, which exceeded our expectations. Dr Alexandra Miletta from Mercy College researched the project in Michigan; her report on student outcomes as a result of studying an exhibition through
aesthetic
educational
experiences
will
forthcoming.
AN OPEN BOOK, installation view, Richmond Center for the Visual Arts, Western Michigan University
.69. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
be
The exhibition has been presented twice so far in Kalamazoo, Michigan at Western University's Richmond Center for the Visual Arts and in Palm Desert, California at the College of the Desert's Marks Art Center. institutional
Both of these exhibitions had their primary
support
from
aesthetic
education
programs
--
Education for the Arts in Kalamazoo, and The McCallum Theater's Aesthetic
Education
Program
in
Palm
Desert.
A
catalog
accompanied the exhibition with an introduction by Sophia Marisa Lucas and essays by Albert Mobilio and Joseph McElroy. It is my hope that AN OPEN BOOK, still available as a touring exhibition, will have more venues. More than 3700 people visited the
exhibition
in
its
two
iterations,
which
exceeded
our
expectations. Dr Alexandra Miletta from Mercy College researched the project in Michigan; her report on student outcomes as a result of
studying
an
exhibition
through
aesthetic
educational
experiences will be forthcoming. What I have observed in art classes of different kinds at the elementary, secondary, and university levels is that there are programs that teach good technical art skills of drawing and painting and other studio practices. But what type of idea is worth making art about? How do we teach students to have a new and fresh approach to making work? What can students acquire from looking at master works by artists that can shake up their conservative thinking?
What
kind
of
teaching
would
help
to
produce
a
contemporary artist admired as much as Van Gogh, whose work would be equally treasured 100 years from now? These are questions I am wondering about in my teaching now and I am sure that they will be showing up in my painting.
What subject matter is worthy of
contemporary painting? How will painting be affected by all of the new technologies that everyone has in their pockets? How might I capture the confusion of these times? In my studio I am facing twenty new wooden panels, gessoed and prepped with a smooth layer of beeswax. I am staring at the fresh blank squares and wondering what will I do? How can I break from what I have known to something not yet clearly formed in my mind? What will I do to turn my thoughts into actions? On a train traveling in northern Scotland recently I looked out the window at .70. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
the rolling green landscape and while focusing on the distance I also saw the close-up shrubs and trees dissolve into horizontal stripes as the train sped by, a strange experience combining an image of natural landscape and green barcode. I know there is something in that.
.71. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Conversa com Milton Machado
José Maria Dias da Cruz¹ Breves anotações “Fuja de estudar com aquele que produz uma obra destinada a morrer com ele” “Triste o discípulo é aquele que não ultrapassa seu mestre” Leonardo da Vinci
A crise do século XIX Com a industrialização várias crises surgiram: a luta de classes, por exemplo, a neocolonização da África, problemas econômicos, desemprego, concentração de renda e a consequente desigualdade social, etc. A arte as percebeu. Surgiram escritores como Charles Dickens e artistas como Coubert, Daumier, os impressionistas, uns mostrando o dia a dia dos menos favorecidos (Daumier, ver figura 1) e esses últimos, os impressionistas, saindo do atelier para pintar ao ar livre. Há aqueles que saíram de Paris; Van Gogh, admirador de Millet que introduz o espressionismo, Gauguin que se interessa pela arte primitiva do Taiti, vindo depois a influenciar Picasso e Cézanne, que cria as bases da arte moderna. A arte, para dar conta dessas crises, teve que pensar em um espaço plástico aqui no espaço imediato e não mais lá. E se lá, como muitos pintores continuaram a fazê-lo, mas que mostrasse com novas ideias as diversas faces dessas crises.
Fig 1 – O vagão de terceira classe - The Thirdclass Carriage, óleo sobre tela Daumier 1860-1863
¹ Em 1951, estudou de pintura com Jan Zach e de desenho com Aldary Toledo. Em 1956 viajou a Europa onde residiu em Paris e estudou com Emilio Pettoruti. Frequentou a Academia da Grande Chaumiere. A partir de 1973, ja de volta ao Brasil, passa a dedicarse exclusivamente a pintura. Equilibrando figura e geometria, transparencia e forma pura, sem apelar para as distorções subjetivas ou supra-reais. Seu enfoque diz respeito a representação fotográfica da realidade e sua transposição num espaço virtual.
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Alberti, considerando uma visão monocular pensa no espaço plástico, sendo o suporte a base de uma pirâmide e seu vértice, um ponto para o qual o olho dirige além dessa base, portanto, lá. Leonardo, ao estudar os limites dos corpos passa a considerar uma visão bi ocular na medida em que esses limites não se definem mais como uma linha com um valor absoluto. No Tratado da Pintura, Leonardo da Vinci diz que “devemos observar com muito cuidado os limites de qualquer corpo para julgar se suas voltas
participam
de
curvaturas
circulares
e
concavidades
angulares”. (Ver figuras 2, 3, e 4).
Fig 2
Fig. 3
.73. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Fig 4
Apesar dessa visão biocular, o espaço plástico vinciano permaneceu ocorrendo lá, além do plano do suporte. Na época de Leonardo não havia termos específicos para texto sobre teoria da pintura. Michel Ângelo se referia às superfícies de suas obras
como
'no
finitas'.
Leonardo
da
Vinci
se
refere
aos
serpenteamentos circulares e angulares. O termo serpenteamento, atualmente, poderia ser definido como o deslocamento de um ponto que geraria uma linha potencialmente ativa e sempiterna. Um objeto, quando visto, seria circular à medida que giraria em torno de seu eixo. Simultaneamente, as concavidades angulares se referiam a um espaço plástico além do objeto e que dariam a noção de profundidade. Essa frase de Leonardo da Vinci se relaciona, .74. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
também, à construção de um espaço plástico. Curioso é nos lembrarmos de uma frase de Cézanne: “Os objetos no espaço são todos convexos, as horizontais dariam a extensão e as verticais, a profundidade.”
Tanto
Leonardo
como
Cézanne
estudaram
uma
perspectiva além da monocular proposta por Alberti. Caravaggio, que abole a visão biocular, dá início a um espaço que enfatiza o plano do suporte, portando um espaço plástico ali, no plano do suporte. (Ver figura 5)
Fig, 5 – Cesto de frutas, óleo sobre tela, Caravaggio
Voltemos a Leonardo. Diz ele, no Tratado da pintura, que quando o pintor transpõe algo da natureza para o suporte mata a pintura pela primeira vez e cabe ao pintor evitar uma segunda morte, e isso ele consegue considerando o serpenteamento que anima o espaço plástico. Vale então, considerando o que estamos querendo mostrar, vermos o famoso quadro de Magritte. (Ver figura 6).
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Fig. 6 - A traição das imagens, óleo sobre tela, Magritte
Creio que, considerando o que acima escrevemos, podemos dizer que Magritte está matando a pintura por uma segunda vez ao recusar um espaço plástico lá, ali ou aqui. Ou, dialeticamente, mostrando-nos a inutilidade desse espaço plástico lá para uma arte de seu tempo. Poderia ter escrito. Isto não é um espaço plástico. Mas esse quadro, contudo, é coisa mental. Podemos também, por esse quadro, aproximar Magrite de Duchamp, já
que recusa ocupar o espaço tradicional
da pintura. Frases de Cézanne
“Somente um cinza reina na natureza e alcançá-lo é de uma dificuldade espantosa” “Entre o modelo e o pintor se interpõe uma plano, a atmosfera.”
.76. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Com essa última frase, Cézanne, considerando uma visão biocular, introduz um espaço plástico não mais além do suporte, lá, como preconizava Alberti, além do plano do suporte ou ali, mas aqui, coincidindo com esse no qual nos orientamos. Temo aqui uma questão topológica, pois há uma fronteira entre o espaço plástico e o imediato. A arte ocorrendo em um espaço aqui tem, então, como conviver com as crises que apontamos no início deste breve resumo, as quais se adensam atualmente. Talvez, por uma questão de sincronicidade, apontada por Jung, o inconsciente coletivo ou de espírito de época, parece-me compreensível que Duchamp tenha colocado nesse espaço à frente do quadro, sua obra, A Fonte. Mais tarde, Hélio Oiticica afirma que havia um problema na pintura contemporânea, a cor. Espacializa a pintura e cria o parangolé e os relevos. Nessas obras, o espaço plástico ocorre aqui no espaço imediato. E diz mais ainda, que a era da pintura de cavalete estava definitivamente encerrada. Não o entendo afirmando a morte da pintura, mas condenando os quadros que insistiam num espaço plástico lá ou ali; em minha opinião, é uma pintura que cativa uma elite vivendo em outra realidade. O Cinza sempiterno, o rompimento do tom e o serpenteamento vinciano Nos dias atuais, já não acreditamos nas coisas com valores absolutos ou como certezas inquestionáveis. Temos de romper o cerco, descartar o círculo cromático absoluto. E também redefinir as cores. Daí dizer que há as cores abstratas substantivas, que são ideias platônicas e subsistem por si mesmas. E há as concretas adjetivas, cuja condição é ser no colorido, rompem-se e se dirigem para o cinza sempiterno e ocupam um espaço plástico aqui. O pintor lida com as duas. Veja umas assemblages por mim realizadas, figuras 7,8 e 9.
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Fig. 7
.78. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Fig. 8
.79. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Fig. 9
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Cézanne,
ao
usar
o
rompimento
do
tom,
mostra-nos
a
manifestação do cinza sempiterno – uma atmosfera entre o quadro e também considerando o serpenteamento vinciano – faz com que o espaço plástico coincida com esse no qual nos orientamos, aqui. Mas vale observar que o mestre afirmou que pintamos somente uma fração do espaço, uma vez que um colorido total nos é interditado. Antevê, assim, a geometria dos fractais. Há uma relação entre o cinza sempiterno e o serpenteamento e Cézanne a percebeu, criando as bases de uma nova perspectiva e não mais a idealizada como a que foi criada no Renascimento, ou seja, mono-ocular e ocorrendo além do suporte. Sobre o cinza sempiterno temos de considerar as cores concretas adjetivas. Elas são um par, contém em si sua cor oposta, estão sempre se rompendo por ação de sua oposta e por contrastes, ora ganhando ou perdendo cromaticidade. Na passagem entre uma cor e sua oposta, temos um ponto, um não espaço e um não tempo. Como todas as cores se rompem, diremos que esse ponto é um pré ou pósfenômeno, isto é, as cores para ele convergem e divergem. Na assemblage por mim realizada (ver figura 10), mostro a passagem de um vermelho em direção a sua
cor oposta, um específico verde e sua
reação com o serpenteamento vinciano. Assim, podemos afirmar que o espaço da pintura na contemporaneidade ocorre aqui; nela, também, podemos observar que se baseia nas novas geometrias, com a topologia e a dos fractais. Uma arte ocorrendo aqui, no espaço no qual
nos
orientamos,
expandiu-se,
incorporando
outras
manifestações. Na obra de Milton Machado podemos observar, além de uma visão obviamente biocular até mesmo em seus quadros, uma relação com a música, com a poesia, com o olfato, com a filosofia, com o serpenteamento e o cinza sempiterno, a semiologia, a política, etc. O cinza sempiterno, o rompimento do tom e o serpenteamento Na
assemblage,
abaixo,
podemos
observar
que
o
sexto
intervalo ao lado do quinto e do sétimo, ora é avermelhado, ora esverdeado diante do observador ou de uma testemunha. Entre elas, .81. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
o serpenteamento que anima o espaço. Aqui terceiro
podemos
nos
excluído
e
referir às
do
às
lógicas
terceiro
aristotélicas
incluído.
Na
do
lógica
aristotélica, diz-se que um vermelho não é um verde. Permanecem, assim,
em um único âmbito de realidade.
Na lógica do terceiro
incluído, consideramos outro patamar de realidade sem ferir a concebida por Aristóteles. Se incluirmos como um terceiro termo as ideias das cores abstratas e concretas, podemos afirmar que um vermelho
abstrato
substantivo
não
é
um
vermelho
concreto
adjetivo. No diagrama mostrado no quadro aqui assinalado como a figura 10 neste texto, podemos considerar como o terceiro termo o rompimento do tom, o cinza sempiterno ou o serpenteamento vinciano. Diremos, então, que o sexto intervalo ao lado do quinto é avermelhado e, ao lado do sétimo, esverdeado. Temos, assim, mais um exemplo da lógica do terceiro incluído sem ferir o axioma de Aristóteles. Tais considerações vão nos permitir ver as obras de Milton Machado que, abaixo, comentamos com maior profundidade.
.82. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Fig. 10
.83. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
O QUE É UM QUADRO HOJE? Abaixo, uma troca de e-mails entre Milton Machado e eu. Desse vídeo, abaixo citado, foram retiradas as fotos que agora comento. Ver figura 11.
Fig. 11- Milton Machado
“Tem um vídeo que se chama PINTURA. As imagens são de umas câmeras/salas
de
pintura
com
tintas
líquidas
de
peças
industriais. Um fundo de uns 3 x 5 m, com uma densa e profunda camada de graxa preta cheia de sulcos verticais, sobre a qual escorrem tintas que marcam e colorem essa superfície com imagens fortuitas muito belas. E, como se não bastasse tanta beleza pictórica, corre uma cascata de água, lavando a “pintura” o tempo todo, produzindo os sulcos e respingos e brilhos e refexos. Rapaz, é bonito demais, e poucos pintores seriam capazes de pintar imagens tão belas quanto aquelas, que podem lembrar um Iberê, mesmo um nosso querido Braque. Estou muito contente com o resultado. Não sei de nada também. Quem sabe é por que se engana. De cabeça fria não nasce flor. Ainda mais maria-sem- vergonha.” .84. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Minha resposta: Caro Milton Como disse, fiquei impressionadíssimo com as fotos. O escrito já está pronto na minha cabeça, mas confesso que não será imediatamente transcrito. Estou muito cansado. Trabalhando muito e, por sorte, você não está me vendo. Passo horas sentado sem nenhum gesto, salvo aqueles naturais, respiração, por exemplo. Ou deitado e idem. Às vezes, caminhando, além do gesto da respiração, alguns passos. Mas dentro da cabeça! Acrobacias inimagináveis! Pintar um quadro, por enquanto, nada. Mas meus olhos ainda são de um pintor. Por eles escrevo. O fato é que seu trabalho me servirá para as aulas. Estou discutindo o que é um quadro hoje (ou pintura). Um pequeno resumo. O seu trabalho não é um quadro. O axioma da não contradição é respeitado. Um não quadro não é um quadro. Por aí temos
um
único
grau
de
percepção
e
realidade.
A
lógica
aristotélica permanece. Uma coisa não pode ser verdadeira e falsa simultaneamente. Na minha frente vejo, entretanto, pelas fotos, a imagem de um quadro. Podemos dizer então que a PINTURA, a obra de Milton, não é uma pintura. Temos, então, outro grau de percepção e realidade. Seu trabalho é um quadro ou o pensamento de um, ou da própria pintura. O axioma da não contradição é respeitado. Um quadro não é um não quadro; uma pintura não é uma não pintura, etc. Aqui vale citar Poussin que diz que ou vemos simplesmente, e ver simplesmente é apenas considerar o objeto e, nesse caso, vemos por dentro.
E
perdemos
prospectivamente
e,
o
que
está
nesse
caso,
por três
fora.
Ou
coisas
então têm
vemos
que
ser
consideradas: o saber do olho, as diversas distâncias e os eixos visuais. Portanto, já podemos pensar a partir da lógica do terceiro incluído, através de um terceiro termo sem ferir o axioma da não contradição. Temos, a partir do olhar prospectivo que nos propõe
Poussin,
no
mínimo,
dois
patamares
de
percepção
e
realidade. Se considerarmos esse olhar prospectivo, outros graus de percepção e realidade são possíveis, nunca ferindo o princípio da não contradição. .85. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Em meus estudos sobre as cores, o terceiro termo pode ser, tenho que pensar mais, o cinza sempiterno que permite uma dimensão temporal. Um olhar que permita uma percepção pelos intervalos e de um espaço fracionado. Nessa sua obra, olhares que excluem dos objetos seus respectivos valores absolutos e as classificações estratificadas. Vale dizer, um objeto, sem um valor absoluto, pode permitir percepções além de seu simples aspecto. E tem mais, sua condição depende do contexto onde se encontra. Não existe por si só. Aquela questão que já conversamos: temos que vê-lo por fora para compreendê-lo, também, por dentro. Dependendo do que está fora, o que está dentro se modifica. De qualquer forma, podemos dizer que pintar um quadro é cobrir uma superfície com uma ou mais cores. E podemos fazê-lo usando pincéis. No seu caso não foram usados pincéis, mas as pinceladas aparecem. Rastros de pinceladas se fazendo. O eterno presente? Nas diversas distâncias, por exemplo, temos o que você defende, as distâncias em proximidade. Nos eixos visuais, o que Cézanne nos adverte: as horizontais dão a extensão; as verticais, a profundidade e estas últimas em seu trabalho jorram em cascatas. Mas a horizontalidade é uma só. Uma dialógica interessante entre o permanente e o transitório. E assim o espaço plástico se torna multidimensional. Pela citação de Francisco Inácio Peixoto, grande contista que participou nos primórdios de nosso modernismo do movimento Verde, acontecido na pequena cidade mineira, Cataguases: “Sonhava e o sonho, desdobrando-se em mil facetas coloridas, prejudicava-me o sono e a vida. Vinha o desvario, vinha a hesitação e, entre hesitações e desvarios, passei dias.” Um fim, assim como nessa citação se desenha, e isso se repete em seu trabalho com mais ênfase. Há o momento no qual a obra deixa de existir. Deixa? A obra é iluminada por um raio poético, conforme nos aconselha nosso querido Braque. Repare, Duchamp também está presente: um objeto encontrado, mesmo que nos cacos de sua imaginação, que se transforma. E, assim,
transformam-se
também
os
cacos
imaginados:
aqueles
emprestados de Beuys, a graxa, por exemplo. E “entre o sono e a vida...”, etc. Outra obra de Milton Machado .86. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Outra Obra de Milton Machado
Fig 12 - The Wicked One, and Two, Velas, mesa de aço e vidro, ferro, pavios, fogo. 1990
Desse trabalho comentarei como a segunda vela, acessa nas duas extremidades, topologicamente, quando a cera derretida cai sobre um pavio, gerando outra vela. Vejo esse trabalho também, poeticamente, como uma metáfora; vida, morte e ressurreição. Vale aqui transcrever uma observação do Milton em um livro sobre minha obra, “Interiores de reflexão”. “Devemos dizer que o primeiro não é primeiro, se não houver depois dele um segundo. Consequentemente, o segundo não é apenas aquilo que vem como algo que chega com atraso depois do primeiro, mas que permite ao primeiro ser o primeiro. Assim, o primeiro não tem como ser o primeiro por sua própria potência, por seus próprios meios: o segundo deve ajudá-lo com toda força de sua demora. É através do segundo que o primeiro é o primeiro. A 'segunda vez' tem, portanto, uma prioridade sobre a 'primeira vez', pois está presente, já desde a primeira vez como condição prévia para a prioridade
da
primeira
vez
(sem
que
ela
que
ela
seja,
evidentemente, uma 'primeira vez' mais primitiva): daí que a 'primeira vez' é na realidade, a 'terceira vez'.” ( Vincent Descombe, Le même et l'outre: quarentecinq ans de phiolophie française (1933-1978), Paris, Minuit, 1979, pag. 170). Volto aqui a falar de Poussin. Considerando só uma primeira vez, veríamos simplesmente, de uma forma abstrata, seu aspecto e vendo-a só por dentro. Com a chegada de uma segunda vez, veríamos, prospectivamente, e por fora para vermos também por dentro. .87. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
O Semáforo
Fig. 13 - vidro pintado, lanterna e madeira.
Essa obra de Milton Machado nos leva a perceber o cinza sempiterno e o serpenteamento. Um espaço plástico aqui, portanto, mas sendo consideradas várias esferas de realidade. Mostra também uma relação com a semiologia, metafórica e poeticamente os momentos de parar, esperar e avançar.
.88. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Um poema de Raul de Leoni Legenda dos dias O Homem desperta e sai cada alvorada Para o acaso das cousas... e, à saída, Leva uma crença vaga, indefinida, De achar o Ideal nalguma encruzilhada... As horas morrem sobre as horas... Nada! E ao poente, o Homem, com a sombra recolhida Volta, pensando: Se o Ideal da Vida Não vejo hoje, virá na outra jornada... Ontem, hoje, amanhã, depois e, assim, Mais ele avança, mais distante é o fim, Mais se afasta o horizonte pela esfera; E a Vida passa... efêmera e vazia: Um adiantamento eterno que se espera, Numa eterna esperança que se adia...
.89. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Recortes sobre a cor Transformações cromáticas da pintura do modernismo à arte contemporânea1
brasileira:
Marco Giannotti
2
Resumo:
O principal objetivo deste projeto consiste em analisar as principais transformações que ocorreram na pintura brasileira a partir do modernismo tendo o estudo cromático como fio condutor. Pretende-se mostrar como paulatinamente a pintura brasileira adquire certa autonomia estilística justamente na medida em que os pintores salientam as propriedades expressivas e espaciais da cor.
Abstract:
The purpose of this project is to analyze the main changes that occurred inBrazilian painting from the chromatic point of view. It is intended to show how gradually Brazilian painting acquires
certain
stylistic
autonomy
precisely
insofar
as
painters emphasize the expressive properties of color and space.
1
O artigo desenvolve tópicos apresentados na palestraproferida pelo autor durante seminário internacional AND PAINTINGorganizado pela universidadede Belas Artes de Lisboa no dia 24 maio de 2014. 2
Marco Giannotti é pintor, professor Associado da Escola de Comunicação e Artes da USP. Formou-se em Ciências Sociais na USP, e realizou suas exposições individuais nas principais galerias e museus de São Paulo e Rio de Janeiro. Defendeu seu mestrado em filosofia com a tradução e introdução crítica da Doutrina das Cores, de Goethe (1749 1832). Participou de duas versões da Bienal do Mercosul e do Arte Cidade, e de algumas exposições coletivas internacionais. Defendeu sua tese de livre-docência intitulada A sombra da Imagem. Forma o grupo de pesquisa sobre a cor no departamento de artes plásticas da USP. Convidado em 2011 para ser professor visitante durante o ano letivo na Universidade de Estudos Estrangeiros de Kioto, publica o livro Diário de Kioto pela Martins Fontes com apoio da embaixada do Brasil em Tóquio. Recentemente realizou uma exposição no Instituto Tomie Ohtake e na Galeria Raquel Arnaud.
.90. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Apresentação
O presente estudo se enquadra no âmbito de um projeto mais amplo
de
pesquisa
professores
sobre
que o
coordeno
fenômeno
com
conjunto
cromático
na
de
arte
contemporânea nas suas diversas manifestações.
3
alunos
e
moderna
e
Devido a seu
aspecto complexo, a cor requer um estudo multidisciplinar que envolve tanto o aspecto prático como teórico na interpretação da cor.
4
Reflexões
distintos
sobre
tendo
o
a
cor
fenômeno
abrange
ensaios
cromático
na
sobre arte
artistas
moderna
e
contemporânea como fio condutor. Tomo como de partida o livro Doutrina das Cores de Goethe, fruto de 20 anos de pesquisa e que foi parcialmente vertido para o português em minha tese de mestrado realizada em 1993. O termo Doutrina (Farbenlehre) busca contemplar tanto o aspecto prático como teórico na interpretação da cor. Aliás, esta obra, muito criticada quando foi publicada em 1810, tornou-se a partir do século XX cada vez mais reconhecida mundo afora. Já no final do século dezenove, estudos em fisiologia 3
O GRUPO DE PESQUISAS CROMÁTICAS é formado atualmente por alunos e professores de Universidades de São Paulo (USP, FAU e UNESP) e a Faculdade de Belas Artes de Curitiba. Busca uma análise ampla do fenômeno cromático a partir do estudo de artistas, filósofos, antropólogos, e cientistas. O grupo parte do entendimento de que a cor constitui uma linguagem, e como tal, requer aprendizado e reflexão. A cor faz parte de modo indissociável do mundo, da natureza que nos rodeia, da arquitetura etc. Tais processos, de uso e percepção da cor, não ocorrem de modo fixo, inalterável, mas trazem consigo marcas próprias de cada época e dos diferentes meios socioculturais. No que concerne ao campo das artes plásticas, a presença da cor se faz constante nas obras que compõem a história da arte; fato que sugere que o estudo da cor como tema pode tanto responder indagações sobre uma tradição cultural quanto fundamentar novas experimentações, inclusive aquelas que fazem uso de novas tecnologias. Contudo, percebe-se que, mesmo no interior do campo das artes, são relativamente poucos os estudos que se dedicam à cor como um objeto de estudo. A proposta de abertura de um espaço de debate -cujo cerne das discussões gira em torno de diferentes percepções e concepções da cor -,situado em um espaço de grande circulação da comunidade acadêmica, como a USP, em São Paulo, favorece o fluxo de ideias entre pessoas oriundas de diversos campos de conhecimento, resultando na possibilidade promissora de troca e intercâmbiode informações. Importa, neste sentido, ressaltar a pertinência do tema deste projeto como uma ferramenta de extensão do conhecimento construído no campo das artes plásticas para setores mais amplos da sociedade. Assim, entende-se que a cor configura um universo de pesquisa que, sob determinado ponto-de-vista,é capaz de interligar diferentes áreas do conhecimento. 4
Em sua tradução brasileira a palavra Doutrina (Lehre) remete ao fato de que para Goethe as cores não podem ser analisadas teoricamente, mas devem ser antes vivencia das na realidade (wirklichkeit). Na Doutrina das Cores(1810) as cores são interpretadas como fenômenos que aparecem não só na própria retina, mas também nas superfícies, nos objetos assim como na cultura de modo geral (aspectos sensíveis e morais). Faço uma análise destas questões no Prefácio da Doutrina das Cores da edição brasileira, editora Nova Alexandria,1993, resultado da tese de Mestrado apresentada à Faculdade de Filosofia da USP, com uma seleção do livro vertida para o português. A ideia de partir das diferenças cromáticas para entender a arte moderna e contemporânea surgiu em Desvio para a Pintura, minha tese de Doutorado apresentada à Escola de Comunicação e Artes da USP em 1998.
.91. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
humana evidenciaram que a cor não é apenas um fenômeno físico exterior e objetivo, mas também algo fisiológico, ou seja, produto da interação entre a nossa retina e o cérebro. Se por um lado a empreitada de Goethe em buscar uma teoria geral para explicar o fenômeno cromático se mostra impossível atualmente, por outro lado, o poeta não deixa de levar em consideração as diferentes práticas da cor, de modo que este fenômeno aparece para um químico de maneira distinta do que para o pintor etc. não há efetivamente, um único ponto de partida para o estudo da cor. Por outro lado, a divisão inicial entre cores fisiológicas, físicas e químicas presentes no livro de Goethe permite refletir sobre concepções cromáticas distintas ao longo da história. Se no impressionismo predomina a interpretação fisiológica da cor, a interpretação das cores físicas segundo Goethe é muito instigante para entender como os pintores modernistas passaram utilizar a cor como elemento autônomo, calcado na superfície da tela. Por fim, as cores químicas nos ajudam a compreender a volta ao uso do pigmento puro em artistas como Yves Klein e Hélio Oiticica na década de sessenta. De uma maneira geral, todos os artigos que pretendo desenvolver oscilam entre uma análise calcada em obras especificas e considerações históricas mais abrangentes. Neste enfoque específico sore a pintura ocidental, as cores adquirem maior autonomia frente ente ao desenho. Este processo que vem desde a Renascença se distingue por três fases (ou recortes ideais) distintas: no primeiro momento, quando o olhar é regido pelas leis da perspectiva, o ponto de vista se espelha no ponto de fuga virtual, na medida em que ambos criam a ilusão de um espaço tridimensional. As cores neste caso, em maior ou menor grau, são sempre monitoradas por um desenho previamente dado. No segundo momento, a partir do século XVII, o olho é visto como um instrumento óptico móvel e a retina como um órgão capaz de produzir as cores. A superfície da tela passa a espelhar a retina, visto que ambas produzem cores em um espaço bidimensional, seja na superfície da tela, seja na própria retina. No Impressionismo as cores ganham mais autonomia, na medida em que passam a sugerir um espaço pictórico a partir de suas relações. Em seguida, durante o Modernismo, quando o vínculo entre a visualidade pictórica e o mundo percebido se quebra, as cores passam a ser entendidas como elementos construtivos capazes de estabelecer novas relações espaciais à revelia de um mundo previamente representado. Esta conquista do espaço começa com a afirmação da .92. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
autonomia da pintura frente o mundo percebido, neste sentido, a pintura tende a se firmar como tinta aplicada na superfície da tela. Não que os artistas não soubessem que toda pintura é feita sobre um plano bidimensional, a pintura sempre jogou com esta ambiguidade entre um mundo representado em duas dimensões e o espaço percebido em três dimensões, mas, na medida em que a pintura é vista como uma pintura, e não um correlato óptico da visão, os pintores modernos tendem a salientar oque uma pintura tem de particular, ou seja, o fato de situar-se apenas em dois planos. Os pintores modernos percebem efetivamente que não existe uma correlação fixa entre a pintura (de duas dimensões) e o mundo percebido. Existem certos mecanismos visuais tais como constância cromática, visão seletiva, que não podem ser projetados diretamente em uma superfície plana. A pintura afirma assim sua autonomia no início do século XX. A tela torna-se um terreno livre para as experiências cromáticas. O pintor moderno não procura reproduzir nos quadros as mesmas cores que vê. A pintura é uma realidade vivente e autônoma e não apenas uma representação. A cor ganha sua autonomia quando é pensada como um fenômeno vivo que existe por si mesmo, e não como um simples meio de representar o mundo sensível. Não há mais a ideia de um espaço estabelecido a priori. A construção do espaço pictórico é mediada tanto pelo trabalho do artista como pela experiência do olhar do observador. Antes do que uma simples tela projetada, a visão representa a possibilidade de apreendermos as coisas ao nosso redor. Ela não pode ser mais entendida segundo um modelo estático: “a visão é uma ação”5.O olhar se torna móvel e ubíquo e a cor começa a ser pensada à revelia de um ponto de vista fixo ou até mesmo de uma figura desenhada previamente. Torna-se possível experimentar diferentes abordagens espaciais da cor. Apresento a seguir um breve resumo do que pretendo realizar nos próximos anos como projeto de pesquisa. Refletir sobre as transformações da pintura brasileira moderna e contemporânea a partir de uma perspectiva cromática pode parecer a primeira vista um projeto por demais ambicioso. A grande dificuldade em traçar um panorama é cair em generalidades banais. Logo, o que pretendo aqui, é fazer um recorte, de modo que, ao analisar apenas 10 obras de 10 pintores que se destacam no panorama brasileiro espero levantar questões que considero paradigmáticas de cada período. O uso excessivo de citações de depoimentos dos artistas e de críticos especialistas no assunto se justifica aqui pela necessidade de ser
5
MERLEAU-PONTY,M., Phenomenologie de la Perception, p.432.
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I. A luz tropical em questão - Almeida Júnior
A luz forte e os tons muito aproximados tendem a romper ameaçadoramente a distância entre todos os elementos do quadro. Cultura e natureza, homem e coisas têm traços demais em comum, e quase poderiam estar um no lugar do outro. O chão do terreiro se transporta com pouquíssimas nuances para a parede de paua-pique....Nesta tela o homem sofre o meio, em vez de determiná-lo... O sol é o grande personagem deste "Caipira picando fumo".”6 (Rodrigo Naves).
Almeida Junior, Caipira Picando fumo - 1893
As dificuldades extraordinárias em interpretar e reproduzir a natureza brasileira são explicitadas de maneira recorrente pelos pintores no século XIX. Segundo Buckle "tão luxuriante é a vegetação que a natureza parece desregrarse na ostentação de seu poder (...), em meio a essa pompa e fulgor da natureza, nenhum lugar é deixado para o homem."7 Neste quadro a luz domina toda a cena. Sua intensidade se revela na claridade ofuscante e na proximidade entre todas as coisas, que não têm um contorno muito marcado. As nuances cromáticas são dizimadas pela intensidade da luz solar, que parece cegar nossos olhos. Paradoxalmente, a natureza aparece aqui não pela sua vegetação luxuriante, mas mediante seu poder devastador da luz tropical. Ao invés do claro escuro que confere volume e permeia as relações cromáticas em boa parte da pintura europeia a partir do Renascimento, a originalidade deste quadro está em justamente romper com estes paradigmas. Manet talvez tenha sido o primeiro artista a utilizar esta luz direta que apresentava os corpos de forma escancarada, como no caso de Olímpia. A "artificialidade" compositiva chocou os costumes da época e abriu as portas para novas investigações sobre a construção dos focos de luz em uma pintura. No caso de Almeida Júnior a fonte de luz não provem da artificialidade iluminação urbana, mas resultante da força da luminosidade presente na natureza tropical.8
6 NAVES, Rodrigo. Almeida Júnior: o sol no meio do caminho ISSN 0101-3300 Novos estudos. CEBRAP no.73 São Paulo Nov. 2005 http://dx.doi.org/10.1590/S0101-33002005000300010 7 idem 8 Não sei ainda se alguma análise mais profunda foi feita sobre a importância da viagem de Manet ao Brasil para seus estudos de luz e cor: "Foi no Brasil que Manet desenvolveu um certo gosto pelo exótico, pelas mulheres e desenvolveu uma repulsa ao escravismo. Marcou-o muito a luminosidade da baia de Guanabara que haveria de deixar traços marcantes na sua maneira de pintar. http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%89douard_Manet#Primeiros_anos
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II. Transformações da palheta de um imigrante - Lasar Segall
Nada mais difícil de ser visto, interpretado e usado do que a cor. Na obra de Segall, como se sabe, as preferências vão aos terras, aos cinzas, aos verdes pálidos, aos ocres finos, ao amarelo-laranja, aos vermelhosescuros, ao amarelolimão. Entretanto, que complexas operações se realizam no laboratório íntimo do pintor, antes desses tons atingirem o último estado! Que densidade carregam essas tintas sóbrias, que expressividade na sua aparente pobreza! Falar de despojamento. . . não sei: antes prefiro mencionar a valorização dessas cores que afirmam sua força autêntica em tão numerosas telas. Antes prefiro sublinhar a riqueza dessas tintas sóbrias que, sustentando a construção plástica, conferem-lhe nobreza e dignidade exemplares. De resto, a cada pintor corresponde uma necessidade técnica e uma atmosfera próprias. O que interessa mais de perto é o resultado final. E os resultados da segalliana são dos mais convincentes. (Murilo Mendes).
A
Lasar Segall, Eternos Caminhantes, 1919 e Paisagem Brasileira-1925
Lasar Segall, nasceu em Vilna, capital da Lituânia, na época sob o domínio do Império russo. Com 15 anos instala-se em Berlim e frequenta a Academia Imperial de Belas Artes, de onde seria afastado em 1909 por expor na Freie Sezession, período no qual sua obra esteve fortemente influenciada pelo expressionismo. Em 1913, Segall vem pela primeira vez ao Brasil; realiza exposições em São Paulo e Campinas, onde percebe-se já em sua obra uma forte .95. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Paulo e Campinas, onde percebe-se já em sua obra uma forte influência do expressionismo do grupo Die Brücke. Em 1923 instala se definitivamente no Brasil. A partir daí passa a ser uma das figuras centrais do Modernismo Brasileiro, atuando como um contraponto alemão às influências francesas. Neste período surgem temas brasileiros em sua obra como na que procuramos analisar a seguir. Se compararmos Paisagem Brasileira com qualquer pintura 9 de sua fase europeia , como por exemplo Eternos Caminhantes, é possível observar como as formas tem contornos menos angulosos e tensos, as pinceladas e as cores se atenuam. Segall abre mão dos contrastes cromáticos expressionistas em nome de uma fase contemplativa, como afirma Mário de Andrade. Paisagem Brasileira retrata uma natureza bucólica e talvez paradoxalmente harmônica visto que, ao invés de retratar os contrastes sociais brasileiros como fizera na Europa, aqui vemos antes uma paisagem distante e idílica. Aqui os homens, os animais, as casas, a natureza, o sol, convivem em perfeita harmonia. III. Anita, a cor na berlinda
Um belo dia fui com uma colega ver uma grande exposição de pintura moderna. Eram quadros grandes. Havia emprego de quilos de tinta e de todas as cores. Um jogo formidável. Uma confusão, um arrebatamento, cada acidente de forma pintado com todas as cores. O artista não havia tomado tempo para misturar as cores, o que para mim foi uma revelação e minha primeira descoberta. Pensei, o artista está certo. A luz do sol é composta de três cores primárias e quatro derivadas. Os objetos se acusam só quando saem da sombra, isto é, quando envolvidos na luz. Tudo é resultado da luz que os acusa, participando de todas as cores. Comecei a ver tudo acusado por todas as cores. Nada nesse mundo é incolor ou sem luz. Procurei o homem de todas as cores, Lovis Corinth, e dentro de uma semana comecei a trabalhar na aula desse professor. Comprei incontinente uma porção de tintas, e a festa começou. Continuava a ter medo da grande pintura como se tem medo de um cálculo integral. (Anita Malfatti).
A exposição de Anita Malfatti, em 1917 instiga os artistas e jovens intelectuais a se organizar como grupo e promover a arte moderna nacional, que terá lugar em São Paulo, embalado pelo progresso e industrialização acelerada, contando ainda com a presença maciça de imigrantes. Uma vez que na antiga capital do Brasil, Rio de Janeiro, perdurava a tradição burguesa e conservadora presente na Academia de Belas Artes, é em São Paulo que abre-se espaço para novas iniciativas modernas. Por causa de .96. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
uma atrofia no braço e na mão direita, Anita utiliza a mão esquerda para pintar. Como o jovem Picasso, se inspira num mundo marginal. Na sua fase mais original e intensa busca retratar imigrantes ou marginalizados como A louca. O homem amarelo se destaca pelo uso de traços e cores fortes, expressionistas. Amarelo neste caso tanto remete a uma cor intensa, como a uma raça, a japonesa. Infelizmente sua exposição teve grande resistência, e Anita perece nunca mais ter se recuperado do ataque brutal sofrido pelo artigo de Monteiro Lobato. Mais uma vez a pintura brasileira perde a força motriz expressiva da cor. Anita Malfatti se retrai e volta novamente ao estudo acadêmico. Após essa época, alterou sua temática, produzindo, naturezas-mortas, retratos, paisagens e cenas populares. Suas pinturas perdem a luminosidade intensa e a riqueza cromática da fase inicial.
Anita Malfatti, O homem amarelo, 1915-16
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IV. Antropofagia cromática - Tarsila do Amaral
"Encontrei em Minas as cores que adorava em criança. Ensinaram-me depois que eram feias e caipiras. Segui o ramerrão do gosto apurado...Mas depois vinguei-me da opressão passando-as para minhas telas: azul puríssimo, rosa violáceo, amarelo vivo, verde cantante, tudo em gradações mais ou menos fortes conforme a mistura de branco. Pintura limpa, sobretudo, sem medo de cânones convencionais. Liberdade e sinceridade, uma certa estilização que datava a época moderna. Contornos nítidos, dando a impressão perfeita da distância que separa um objeto de outro". (Tarsila do Amaral).
É no curso acadêmico de desenho com Pedro Alexandrino que Tarsila conhece Anita Malfatti, que então já tinha uma abordagem mais modernista. Posteriormente ela e alguns colegas do curso de Pedro Alexandrino fazem aulas de pintura com Georg Elpons, que lhes
apresenta
técnicas
diferentes
das
acadêmicas,
como
a
aplicação de cores puras, diretamente do tubo. Em 1920 viaja para Paris e estuda na Académie Julian. Ao retornar ao Brasil em 1922, depois da semana de arte moderna, forma em São Paulo, o Grupo dos Cinco10. O aprendizado europeu será digerido aqui, no contato com o grupo. A artista pinta com cores mais ousadas e pinceladas mais marcadas. Em 1923, novamente em Paris, frequenta o ateliê de André Lhote, Albert e Fernand Léger. Após uma viagem às cidades históricas de Minas Gerais a inicia a chamada fase pau-brasil, em que mergulha na temática nacional. Em 1928, pinta Abapuru tela que inspira o movimento antropofágico, desencadeado por Oswald de Andrade e Raul Bopp. O movimento buscava realizar uma plataforma nacional que conseguisse absorver as principais conquistas da arte moderna naquele momento, centrada em Paris e, ao mesmo tempo, digerir estas influências a partir da realidade local. Neste período, a geometria é abrandada. As formas crescem, tornam-se orgânicas e adquirem características fantásticas, oníricas, a linguagem surrealista se impregna do folclore brasileiro. Mário de Andrade busca mostrar as diferenças entre a "brasilidade" de Almeida Júnior e de Tarsila: "(...) o que faz mesmo aquela brasileirice imanente dos quadros dela é a própria
10 O grupo dos cinco era composto por Anita Malfatti, Mário de Andrade, Menotti del Picchia e Oswald de Andrade. Ver a este respeito http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=a rtistas_biografia&cd_verbete=3386&cd_item=18&cd_idioma=28555O
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realidade plástica: um certo e muito bem aproveitado caipirismo de formas e de cor, uma sistematização inteligente do mau gosto que é de um bom gosto excepcional, uma sentimentalidade 11 intimista, meio pequena, cheia de moleza e de sabor forte” . Ao contrário da pintura de Almeida Junior onde o sol se faz presente mediante a iluminação acachapante, aqui o sol aparece estilizado, como todas as figuras. A palheta é bem simplificada e o que realmente aparece como novidade do ponto de vista da composição, além contorno distorcido dos corpos, é justamente uma aplicação chapada das cores, que não mais são distribuídas em função do foco de luz. Ao buscar uma palheta "caipira", nacional, sua pintura se torna cromaticamente mais rica e vibrante, outras referências como a do Muralismo mexicano podem ser notadas. V. Volpi e a reinvenção da têmpera A questão é que sempre pintei as minhas pinturas que 'saem', nunca fui atrás de corrente alguma. Os concretistas me convidaram, fui expor com eles. . . mas nunca pensei em seguir alguém ou qualquer corrente. Uma vez em 57 ou 58 fomos ver uma casa aqui perto, com o Mário Pedrosa, tinha umas linhas geométricas minhas na fachada, ele achou fantástico, eram dos anos 1930 ou 1940. . . Sempre pintei o que senti, a minha pintura aos poucos foi se transformando, começa com a natureza, depois aos poucos vai saindo fora, às vezes, continua, eu nunca penso no que estou fazendo. Penso só no problema da linha, da forma, da cor. Nada mais. Meus quadros têm uma construção, o problema é só de pintura, não representam nada. Isso vem aos poucos, é uma coisa lenta, é um problema, toda a vida foi assim. (Volpi).
As transformações estilísticas de Volpi a partir do emprego da têmpera serão objeto de um estudo mais detalhado. Por ora apresento alguns tópicos que serão aprofundados. A obra de Alfredo Volpi será abordada neste ensaio a partir de uma questão técnica: a utilização da têmpera no final da década de 1940, justamente no período da consolidação do seu estilo e de sua palheta. Penso a técnica não como forma acadêmica, mas, como diria Francastel, uma forma de saber virtual que permitiu aos homens do Renascimento imaginar cidades ideais na pintura, inaugurando, assim, um modelo urbanístico baseado na perspectiva, que aos poucos transforma as cidades medievais, dispostas de modo caótico, em cidades modernas planejadas. 11
Naves, Rodrigo, idem
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Atualmente a técnica é entendida apenas sob a ótica da tecnologia; nota-se a ausência de um pensamento sobre as questões técnicas vinculadas à imaginação. É contra este senso comum que teóricos como Argan irão demonstrar o sentido simbólico de uma inovação tecnológica como a cúpula da Catedral de Florença, assim como
Francastel,
que,
em
seu
longo
estudo
sobre
questões
técnicas, relaciona-as com a imaginação e com o potencial utópico do homem. Na arte moderna, as análises restritas a procedimentos técnicos são raras e muitas vezes decepcionantes, pois ficam, na maioria das vezes, aquém dos estudos teóricos sobre arte. A arte moderna
obrigou
solitário,
até
o
artista
mesmo
a
quando
depurar assume
sua
técnica
declaradamente
de
modo
certas
influências. Já há algum tempo procurou-se estabelecer os critérios que distinguem a atividade do artista do artesanato, e, para isto, foi preciso reformular a noção de técnica. A técnica não se resume a um conhecimento sobre a fabricação homogênea de objetos utilitários O artista, ao inventar novas regras e proporções na arte, não está simplesmente reproduzindo um saber artesanal; está criando uma nova técnica de abordar os materiais, formulando, assim, uma nova linguagem. Volpi passa a utilizar a têmpera quando sua pintura torna-se mais calcada na superfície da tela e a cor, por sua vez, passa a ter um papel predominante na formação do espaço. A têmpera demarca o processo de amadurecimento de Volpi, pois a transparência do óleo muitas vezes tornava suas pinturas diáfanas em demasia. Por outro lado, a têmpera ressalta a presença corpórea do pigmento sobre a superfície da tela, faz o pigmento respirar, produzindo uma intensa saturação cromática. Não é à toa que vários pintores modernos procuram resgatar técnicas tradicionais como a encáustica, a têmpera e o afresco; trata-se de uma forma de bloquear a janela virtual que surge na pintura mediante o emprego da velatura da pintura à óleo. Ao buscar algumas considerações sobre a têmpera no livro de Ralph Mayer sobre técnicas pictóricas, somos induzidos a imaginar a obra de Volpi: .100. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Aplique pinceladas únicas em uma só direção, e não para frente e para trás. Não passe no mesmo ponto duas vezes seguidas, se desejar repassar, espere um período curto para fixar um pouco, após o que se pode pintar novamente na mesma direção. [...] O manuseio tradicional da têmpera é em pinceladas leves e hachuradas. [...] Apesar do poder de cobertura destas camadas sucessivas, o fundo e as camadas inferiores ainda contribuirão com seus efeitos para o resultado final. [...] Uma translucidez pode algumas vezes ser recuperada sobrepintando-se uma zona opaca com camadas finas e transparentes. Este tipo de pintura não é definitivamente um método ideal para principiantes ou para os que preferem um estilo impulsivo ou extemporâneo; é preferido por aqueles cujo esquema de trabalho é deliberado e planejado12.
Não creio que Volpi tenha aberto livros sobre a interação cromática, mistura ótica etc. Não há uma separação nítida entre teoria e prática, como no caso dos concretistas, que se apoiavam num manifesto ou em um programa - e talvez por este motivo algumas de suas obras são monótonas à primeira vista. Volpi não busca fazer da arte um projeto construtivo. Neste sentido, vejo uma tensão constante, em suas pinturas desse período, entre forma e cor. É quando a geometria não é aplicada a priori, quando as formas se tornam gastas pelo tempo que sua obra se torna única. Uma variação entre linha, cor, forma, espaço que não é apenas formal, é uma experiência poética. Por isto é que seus quadros nunca são previsíveis, pois surgem de uma experiência sempre renovada do exercício da imaginação. A escolha dos seus temas não segue um esquema, é sempre uma nova experiência. Apesar terem um aspecto esmaecido, sua cores não deixam de produzir um efeito estético impactante. O fato delas não aparecerem de imediato, mas através de um processo contínuo de rememoração, faz com que cada cor se projete em outra para poder aparecer. As cores nunca são puras: o azul é o azul refletido em um verde esmeralda e assim por diante (a ideia de uma cor pura não é uma ficção?). Em todo o caso, a lição de Matisse de que a cor é sempre relação se faz presente. Em Volpi não apenas as cores, mas também as formas só adquirem significado se entendidas no interior do seu contexto. Uma forma retangular pode tanto parecer uma porta como uma janela; um traço negro pode sugerir a imagem de um mastro, mas num outro instante pode sugerir também o detalhe de uma janela. Cores e formas vivem sob um processo contínuo de mutação. 12 MAYER, Ralph. Manual do artista de técnicas e matérias. São Paulo: Martins Fontes, 1996, p. 295.
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As
bandeirinhas
parecem
como
que
num
processo
de
metamorfose; adquirem uma propriedade orgânica, pois surgiram de um processo de mutação. Na verdade são elementos que surgem dos telhados das fachadas, que sempre produziam bandeirinhas em negativo. Volpi é um exemplo para aqueles que ainda acreditam no potencial expressivo da pintura, visto que as questões que acompanham seu trabalho nunca são estritamente pictóricas, mas remetem sempre a determinadas experiências de vida. Ao falar sobre a atualidade do belo, Gadamer nos dizia que uma obra-de-arte deve ter uma dimensão simbólica, induzir ao jogo e remeter a uma festa, pois uma obra reúne as pessoas. Como ninguém, Volpi faz destes preceitos uma forma de vida artística. VI.Um salto para o espaço: Hélio Oiticica Já não tenho mais dúvidas que a era do fim do quadro está definitivamente inaugurada. Para mim a dialética que envolve o problema da pintura avançou, juntamente com as experiências (as obras), no sentido da transformação da pintura-quadro em outra coisa (para mim o não-objeto), que já não é mais possível aceitar o desenvolvimento "dentro do quadro", o quadro já se saturou. Longe de ser a "morte da pintura", é a sua salvação, pois a morte mesmo seria a continuação do quadro como tal, e como "suporte" da "pintura". Como está tudo tão claro agora: que a pintura teria de sair para o espaço, ser completa, não em superfície, em aparência, mas na sua integridade profunda. (Hélio Oiticica)13.
Segundo Luciano Figueiredo, Hélio Oiticica: "é um dos casos raros na arte brasileira onde o artista elabora teorias, conceitua e pensa a própria obra. Assim o fez desde os anos de aprendizado e desenvolveu uma forma própria como sua poética, ao longo de toda a sua trajetória. Para Oiticica, escrever foi inicialmente um meio de 'fixar' questões essenciais no campo da arte e isto está bem claro em seus primeiros textos, curtos e ainda sob a forma de diário. Oiticica participou ativamente de um dos períodos mais fortes da crítica de arte no Brasil: os anos neoconcretos. A própria produção de obras nesse período demandou, por parte da crítica de arte, uma conceituação inteiramente voltada para as questões novas que as obras apresentavam, disso resultando uma feliz impregnação entre obras e ideias, que instaurou uma nova maneira de ver e sentir a obra de arte. (...) 14.
13 OITICICA, Hélio Notas, 16/02/1961 Aspiro ao grande labirinto, Rio de Janeiro, Rocco, 1986 14 FIGUEIREDO, Luciano. Introdução. In: OITICICA, Hélio. Aspiro ao grande labirinto. Introdução Luciano Figueiredo; Mário Pedrosa; compilação Luciano Figueiredo; Lygia Pape; Wally Salomão. Rio de Janeiro: Rocco, 1986. p. 5-6.
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Considero
Aspiro
ao
Grande
Labirinto
um
dos
melhores
escritos de artista realizados no Brasil. Chega a ser emocionante ver como o artista utiliza a linguagem escrita de forma projetiva e nã meramente descritiva dos seus trabalhos. Ou seja, a escrita é uma forma de antecipar obras que o artista pretende realizar no futuro. Também impressiona a maneira como o jovem Oiticica retoma questões
formais
e
cromáticas
alavancadas
pela
vanguarda
modernista, em especial Mondrian e Malevich, antes mesmo destes artistas serem reavaliados pelo minimalismo americano. Em 1959, Hélio Oiticica passa a integrar o Grupo Neoconcreto. Abandona os trabalhos bidimensionais e cria relevos espaciais, bólides, capas, estandartes, tendas e penetráveis.
"Toda a minha evolução de 1959 para cá tem sido na busca do que vim a chamar recentemente de uma nova objetividade e creio ser esta a tendência específica da vanguarda brasileira atual (...)."
Para Hélio Oiticica haveria uma tendência à superação dos suportes tradicionais (pintura, escultura etc.), em proveito de estruturas ambientais e objetos. O artista marca o início da transição da tela para o espaço ambiental, o que ocorre nesse ano com os Bilaterais - chapas monocromáticas pintadas com têmpera ou óleo e suspensas por fios de nylon - e os Relevos Espaciais, suas primeiras obras tridimensionais. Toda a minha transição do quadro para o espaço começou em 1959. Havia eu então chegado ao uso de poucas cores, ao branco principalmente, com duas cores diferenciadas, ou até os trabalhos em que usava uma só cor, pintada em uma ou duas direções. Isto, a meu ver, não significava somente uma depuração extrema, mas a tomada de consciência do espaço como elemento totalmente ativo, insinuando-se aí, o conceito de tempo. Tudo o que era antes fundo, ou também suporte para o ato e a estrutura da pintura, transforma-se em elemento vivo; a cor quer manifestar-se íntegra e absoluta nessa estrutura quase diáfana, reduzida ao encontro dos planos ou à limitação da própria extremidade do quadro. Paralelamente segue-se a própria ruptura da forma retangular do quadro. [...]"15
15
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Ao chegar ao limite da pintura, Hélio Oiticica busca superar as barreiras entre o subjetivo e o objetivo. A própria noção de obra é questionada. A nossa estrutura perceptiva como um todo passa a determinar o elo de significação entre a obra e o espectador. Esse elo não se faz apenas mediante uma relação visual, implica em um embate corpóreo entre o observador e obra. A obra de Hélio adquire cada vez mais uma dimensão arquitetônica. Alguns projetos foram feitos recentemente, após sua morte, como no caso de Inhotim. Ao absorver e digerir de maneira independente e
autônoma
as
grandes
questões
da
vanguarda
o
movimento
Neoconcreto de certa forma resolve a o dilema colocado pelo manifesto antropófago. Ao se colocar em pé de igualdade e se projetar para o futuro, o neoconcretismo assume para si uma posição vanguardista para sua época e resolve a questão de uma arte nacional que absorve aos problemas da vanguarda, mas procura ao mesmo tempo os resolver diante de uma problemática local. Trata-se portanto de refletir neste caso como os artistas absorvem as grandes transformações internacionais justamente no momento em que a questão da "identidade nacional" já está resolvida. Na década de 50 o Brasil deixa de ser um pais eminente costeiro, e volta-se cada vez mais para o seu próprio interior. A mudança da capital do Rio de Janeiro para Brasília não é mero sintoma desta transformação. De certa forma cumpre-se o ideal modernista de realizar uma cidade efetivamente que surge a partir do nada, no meio do serrado.
Hélio Oiticica, Bilaterais, 1959
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VII. O anos negros de Iberê Camargo
Iberê Camargo, Expansão, 1964
Iberê Camargo, Solidão, 1994
Em seu ateliê, em Porto Alegre, aponta-me uma tela que acabara de retocar pela enésima vez, me diz: ´Parecia, de início, que eu ia pintar uma alvorada. Terminei fazendo um noturno. O que posso fazer? Tenho uma visão trágica da vida. Não sou um homem alegre, não vejo nenhum futuro para a humanidade, nenhum céu (...). 'São dois os tempos perceptivos em sua pintura. O primeiro aproxima-se do tátil, é altamente provocativo, sensorial. Apenas o interdito secular nos inibe de tocar a superfície pintada e sentir fluir, nos dedos, torvelinho de emoções tumultuadas. Tem-se a sensação de que o quadro foi concluído ali, naquele exato momento. A tinta aparece, ainda, molhada, o gesto vibra, a cor pulsa entre negros e violetas. Bem óximo ao quadro, portanto, o que se sente é a pura materialidade da pintura. Depois, a distância, os planos se abrem e as formas se organizam, surgindo, como consequência, misteriosas figuras, fantasmas ameaçadores. (Frederico Morais).
Em 1954 Iberê Camargo participou com Djanira e Milton da Costa na organização do Salão Preto e Branco e, no ano seguinte, do Salão Miniatura, ambos realizados em protesto às altas taxas de importação de material artístico. Pretendia alertar para o risco dos pintores brasileiros ficarem sem cores. Iberê insiste nessa militância até o fim de sua vida. Sempre atento as questões técnicas, utilizava a tinta belga Blockx produzida desde 1865. A qualidade dos pigmentos e do óleo de linhaça permitem um alto grau de expressividade cromática, além de permanência.Entretanto, a exceção do seu último quadro intitulado "solidão" de 1994, que se destaca pela grande escala e pelo contraste entre os azuis e laranjas aplicados de maneira diáfana, de modo que as figuras .105. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
parecem fantasmas, Iberê trabalhou na maior parte do tempo com uma palheta escura. Tive a oportunidade de o visitar em seu atelier, e pude ver uma pintura inicial que impressionava pela grande variedade de matizes e gestos. Mas, a medida, que pintava, seu trabalho tendia a se escurecer. A tendência ao escurecimento de sua paleta e a dedicação a temas ligados ao ambiente de estúdio se acentuam a partir de 1958. Seu trabalho deixa de procurar a rítmica das cores nas paisagens e passa a se interessar majoritariamente pela disposição dos objetos em naturezas-mortas. Nesses quadros, predominam tons escuros, azulados e violetas. Progressivamente, um pequeno objeto, utilizado por Iberê como brinquedo em sua infância, toma conta das telas: o carretel. A pintura dos carretéis, a princípio, compõe uma série de naturezas-mortas. Com o tempo, aqueles corpos roliços perdem sua função representativa e se tornam formas espessas de tinta. Será o início do trabalho abstrato de Iberê Camargo. Essa produção engrossa ainda mais a massa de tinta e incorpora mais cores. Um aspecto mais gestual dá origem aos trabalhos feitos a partir dos anos 1960, bastante próximos da abstração informal, que se tornam conhecidos como Núcleos, Estruturas e Desdobramentos. No começo dos anos 1970, aparecem signos e figuras reconhecíveis pontuando as pinceladas grossas de cores indefinidas de sua pintura. De certo modo, esta dinâmica prenuncia a volta à figuração do artista nos anos 1980. O ano de 1980 é particularmente dramático para o pintor, que é preso por ter matado um homem. Ao ser absolvido, em 1982, ele volta a viver em Porto Alegre. A pintura que começa a fazer depois ganha tom dramático. A princípio, insere figuras humanas que convivem, em grandes telas, com signos mais corriqueiros de sua obra. Ele se retrata em meio a carretéis e cubos. Paulatinamente, a figura humana torna-se o centro da cena das pinturas de Iberê Camargo. A partir da segunda metade da década de 1980, pinta personagens solitários, sombrios e disformes. A ação das telas ocorre em um fundo indefinido, feito com tinta grossa e pintado com grande maestria. Surgem aí as chamadas séries dos Ciclistas, das Idiotas e um de seus últimos conjuntos de obras intitulado Tudo te é falso e inútil, de 1992.16
Iberê
buscava
uma
grandiosidade
clássica
extemporânea
difícil de ser vista hoje em dia. Seus cadernos de viagem a Europa mostram como estudava meticulosamente as cores de grandes mestres da pintura como, Velásquez, Goya ou Ticiano. Iberê sempre buscou 16
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction= artistas_
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uma corporeidade pictórica. Vale a pena fazer um contraponto com a fase final de Ticiano, e em especial no Castigo de Márcias onde a pele escalpelada do músico se torna uma alegoria da própria materialidade da tinta. Paradoxalmente, no seu último quadro, que parece ter sido feito a la prima, quando as figuras parecem perder a sua corporeidade, a intensidade cromática sempre oculta pelas massas negras parece aflorar como uma forma de despedida. VIII. Mire: Respire!
Depois de ter substituído a técnica clássica do óleo ou das camadas alternadas de óleo e têmpera pela das massas plásticas e do gesso, conseguiu produzir os seus melhores quadrados, retângulos e círculos. Descobriu as ricas possibilidades dinâmicas e dramáticas do losango irregular. Suas figuras geométricas foram se carregando de tensão. Em 1954 Mira expusera no Museu de Arte Moderna algumas paisagens de tendência ontológica, admiráveis pela singeleza e melancolia. Suas despretensiosas e toscas casas, pintadas com uma técnica rudimentar, já continham o germe de algumas das soberbas realizações de hoje. Faltava-lhe porém o senso do vazio e o domínio da textura. Dez anos depois Mira transubstanciaria a solidão e a melancolia individual no drama cósmico de suas paisagens ontológicas. As casas deixaram de ser refúgios de criaturas sem horizonte. Abrem-se agora para o espaço insondável. (Mario Schenberg).
Mira Schendel, Sem Título têmpera acrílica e folha de ouro sobre compensado. 1975
Mire! Respire! Na arte moderna muitos pintores procuram resgatar técnicas tradicionais como a encáustica, a têmpera e o afresco; trata-se de uma forma de bloquear a janela virtual que surge na pintura clássica mediante o emprego da velatura da pintura à óleo. Mira Schendel escolhe a têmpera porque ela permite que a cor respire, pulsando no espaço real. A presença do pigmento é enfatizada assim como elemento primordial da cor. De 1954 a 1956, faz pinturas encorpadas em tons geralmente sombrios, como cinza e ocre, de matéria densa e opaca, em têmpera ou óleo sobre madeira ou tela. Mira explora diferenças de opacidade e brilho que cada cor pode ter, uma alquimia cromática nos materiais. .107. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Ao chegar no estúdio Mira olhava longamente para as pinturas e dizia: “um bom trabalho tem que respirrarrr”. A cor, o pigmento tem sempre que dar a sensação de ir para o ambiente e sair da superfície pictórica. Por este motivo é que ela empregava a têmpera, técnica que permite manter o pigmento com todas suas propriedades cromáticas sob um aglutinante. Neste momento começava a discorrer sobre fenomenologia, sobre a corrporreidade da obra de arte, alguns conceitos que tinha descoberto especialmente com Schmitz um filósofo alemão. O fato é que ela nos ensinou a olhar para a arte de maneira diversa, resgatando sua dimensão sensível, sinestésica de uma obra de arte. Os conceitos empregados na sua construção deveriam ser apreendidos não a priori, mas de maneira reflexiva, no embate corpóreo entre espectador e a obra. Ficava meses a fio matutando como seria a nova série de pinturas, ela sempre trabalhava com uma série fechada para não se repetir. De uma hora para outra trabalhava incansavelmente durante um mês e logo apresentava um novo conjunto bastante distinto da série anterior. Se a série anterior era branca e preta pautada no desenho como força motriz, Mira tentaria nesta nova série explorar o contrário, a cor com diversos índices de refração da luz conforme a técnica empregada. A produção artística de Mira Schendel foi marcada assim pela constante experimentação, é constituída por múltiplas séries de trabalhos, experiências bastante diversas quanto a formato e dimensões. Mistura técnicas e usa diferentes suportes e materiais, como gesso, cimento, areia e argila, com o que obtém superfícies densas e evidencia o suporte como constituinte ativo da obra. Na obra acima o formato vertical e o circulo claramente remetem à pintura japonesa, com a qual Mira sempre flertou, principalmente pelo seu potencial gráfico. Contudo, neste quadro, a folha de ouro aplicada sobre um fundo azul da Prússia, além de criar um contraste cromático, investe de vários sentidos a geometria aplicada: o circulo dourado aparenta ser um por de sol amarelado, o que poderia ser kitsch por instantes evoca o sublime, embora sua dimensão simbólica reiterada pelo ouro nos faz lembrar que estamos concretamente apenas diante de uma pintura. A cor está no limiar da sua transformação em luz. Para Mira, o quadro não se faz mais pela relação de cores. A cor se torna um veículo, onde cada matiz determina um caminho diferente de formalização da pintura. Mira sempre soube utilizar a cor como afirmação da sua existência efêmera. .108. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
IX. Dialética cromática em Jorge Guinle
Jorge Guinle, O ano do Dragão, 1986
No meu caso, por motivos emocionais, estéticos, se encontra uma mescla do abstrato-expressionismo gestual, de De Kooning e do Matisse, até um surrealismo automatista. Mas cada apropriação de um estilo, de um pensamento inicial, é desviada do propósito inicial da escola escolhida justamente pela inclusão de uma outra escola que seria sua negação. Por exemplo, o lado decorativo, joie-de-vivre matissiano das cores, seria negado pela construção ritmicamente exacerbada do abstrato expressionismo. Por outro lado, a tragédia desta mesma pincelada abstracionista é negada pelo otimismo da cor e pela ambiguidade cômica da operação. A possibilidade e o prazer de sempre alargar e nutrir essas contradições formam a base da minha práxis artística. O sublime poderia justamente surgir nessa crítica do sublime já embalsamado e obsoleto, nessa fronteira exígua, onde ele nasce e desaparece. (Jorge Guinle)
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A década de 80 foi marcada pela tentativa de recuperar a dimensão
expressiva
da
pintura
diante
da
arte
conceitual
produzida nos anos 70. Entretanto, este esforço, em retomar a expressão através da pintura, muitas vezes se mostrou ingênuo e até mesmo superficial. A recuperação da pintura e de seu passado foi feita na maioria das vezes de modo alegórico, onde os jovens pintores não conseguiam se libertar das referências advindas do neoexpressionismo
alemão
ou
de
uma
linguagem
pop
tardia.
Entretanto, surge um pintor que, embora tenha falecido muito jovem, logo se tornou uma referência para uma geração. Jorge Guinle representava uma “volta à pintura” de grande qualidade, ao contrário da “Bad Painting” muito em voga na época. Pintura é emoção, ela tem de nascer de dento das pessoas, no estômago, no coração, só na cabeça não dá... A pintura é fruto de uma experiência, não nasce como teoria.... investem no presente, no prazer nos materiais precários. O jovem artista dos anos 80 não se sente absolutamente comprometido com temas, estilos, suportes ou tendências. Joga para o alto qualquer coerência....A nova pintura.. é uma reação a arte hermética, purista e excessivamente intelectual predominante nos anos 70... rigor e objetividade na década de 60 eram, na verdade, um excessivo hermetismo... um álibi que escondia a empáfia dos artistas conceituais tratando de matérias...que não eram de sua competência. (Jorge Guinle)17
Guinle procurava um diálogo aberto com a escola francesa de pintura, em particular com o último Monet, Matisse e Bonnard. Suas pinturas exibem uma trama cromática extremamente refinada, feita através de uma aplicação rigorosa de pinceladas, formando um “all-over”
(que
surgiu
durante
o
Expressionismo
Abstrato
americano) onde cada gesto parece conter uma experiência diversa. O diálogo com a tradição não o impediu de ter uma consciência clara dos problemas de seu tempo, como, por exemplo, o resgate do gesto expressivo frente ao impasse do minimalismo, que retirava qualquer resquício de subjetividade da obra de arte. 17 Jorge Guinle apud Canogia, 2010, Anos 80 - embates de uma geração. Barleu edições Ltda, 2010.
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Essas telas exigem um olhar furioso mas extremamente culto,
com
uma
vasta
memória
moderna.
A
operação
é
vertiginosa, exaustiva e engaja um olhar físico, pronto a sentir as palpitações da matéria, a energia dos gestos, as diferentes e divergentes decisões do artista - os ataques bruscos, as manobras obsessivas, os vários humores que cada
tela
parece
literalmente
exalar.
Não
há
como
percorrê-las a partir de um ponto de vista ideal: é necessário experimentá-las pelos poros da pintura. (...) Diante dessas telas revivemos o dilema básico, a aporia, da arte contemporânea - toda a liberdade, a disponibilidade imaginável, atuando entretanto em território fechado, no claustro da Arte e da Cultura. Instalação, happening, objeto, escultura ou pintura, seja qual for o suporte, a questão se impõe com a mesma premência: como fazer existir a arte no mundo contemporâneo? E, bem entendido, não se trata de algum vago desejo de mudar o mundo, e sim, antes e decisivamente, do próprio estar no mundo. Por isso em mais de um sentido, o diálogo das telas de Jorge Guinle se faz não apenas com as linguagens modernas mas também com a realidade institucional dessas linguagens, não só com a pintura mas com tudo o que aconteceu a ela. Interiorizadas, introjetadas no seu drama irônico, estão tanto a genial aventura
da
arte
moderna
quanto
o
seu
triste
fim
institucional, tanto o mundo da arte quanto a arte no mundo. Apenas tudo isso é vivido na qualidade de pintura, e jamais a título de comentário de clichês visuais. (Ronaldo Brito))18
Suas últimas obras, diáfanas, representam uma reviravolta em seu percurso. Quadros simples, com a tinta bem diluída em terebintina,
recusam
qualquer
concessão
ao
belo
efeito
cromático. Estas pinturas revelam o desespero em atribuir sentido a cada gesto, como se estivesse à procura de dissimular a morte. Jorge Guinle foi capaz de juntar arte e vida com uma intensidade invejável, sem cair nos clichês de uma expressividade fácil. 18 BRITO, Ronaldo. Paroxismos de pintura. In: GUINLE, Jorge. Jorge Guinle. São Paulo: Galeria Luisa Strina, 1984. p. [3-6].
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IX. Em busca de um lugar: Carlos Vergara
Carlos Vergara, Boca de Forno, 1989
Fui emergir na cor...Fui para lá e assim conheci uma mina de amarelo, a limonita, que é o óxido de ferro, e achei também uma fábrica de cerâmica e uns fornos onde eles calcinavam o amarelo para fazer o vermelhão. A partir dali, fiquei amigo de pessoas da região e comecei a ir com frequência. Em 1970, fui mas não fiz nada, só peguei o pigmento, vim para o Rio e misturei com areia. Fiz umas garrafonas, uns potes de cor natural. Mais tarde, em 1989, quando estava chateado com o que estava fazendo, falei: vou voltar para as minas. Joguei o trabalho na estaca zero e decidi reinventar minha pintura. Fui só com a minha resina vinil e as telas. Lá percebi que havia uma pintura, resultado da moagem dos pigmentos que se depositava sobre tudo. Tinha uma camada de pintura que eu capturava com a tela. Era impressionante. As bocas de forno, aquilo que você vai ver aqui no meu ateliê, eram coisas muito eloquentes, muito fortes mesmo. Me tocaram muito. Numa das viagens a Minas Gerais, passando de carro por Congonhas do Campo, encontrei uma equipe do IPHAN [Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional] que estava restaurando os Passos do Aleijadinho pintados pelo Mestre Athayde. Cheguei, me apresentei aos restauradores e perguntei: “Que pigmento é este?” Então eles responderam: “Óxido de ferro, desta região de Minas Gerais”. Naquele momento me mostraram o seguinte: na verdade a pintura no Brasil é inventada por Athayde, no século XVII em Minas Gerais. A pintura brasileira começou lá... (Carlos Vergara)19. 19 MARIANO, Fabíla Salles.Preseça: entrevista com Carlos Vergara. Entrevista inédita que será publicada na Revista ARS N. 24
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Vergara paradoxalmente atinge seu ápice quando abre mão de uma palheta diversificada em nome de uma cor local. Neste caso, não se trata de uma abordagem impressionista que busca tornar visível a apreensão do mundo exterior, mas antes de buscar a cor no lugar em que ela foi feita, produzida. Neste sentido, ele se aproxima das pesquisas
cromáticas
de Hélio
Oiticica,
principalmente
nos
bólides, onde trabalha com pigmento puro. Se sua pesquisa não abre mão da superfície planar da pintura como faz Oiticica, suas pinturas, devido a sua grande escala, possuem uma dimensão arquitetônica que impressiona. Leva a prática da monotipia ao extremo, buscando assim um aspecto indicial na pintura que permite
uma
volta
a
figuração
sem
cair
nas
malhas
de
uma
representação tradicional. A sua busca por um lugar onde a cor existe de forma plena de certa forma nos faz lembrar da busca pela luminosidade que grandes coloristas como Van Gogh, Klee e Matisse, que foram buscar no mediterrâneo uma presença cromática intensa, diversa daquela encontrada na Europa do norte. O mesmo périplo foi feito por Goethe, que vai se deparar com o colorido da paisagem e da pintura em sua viagem à Itália entre 1786 e 1788. A partir dai que o poeta se interessa pelos estudos cromáticos. Neste sentido vale a pena mais uma vez buscar uma analogia com as cores químicas da Doutrina das Cores: Denominamos químicas as cores estimuladas em certos corpos, mais ou menos fixas, que neles se intensificam, deles podem ser extraías e transmitidas a outros corpos, às quais, por essa razão, atribuíos uma certa qualidade imanente. Em geral, caracterizam-se pela durabilidade. As cores podem se fixar nos corpos com maior ou menor duração, de modo superficial ou penetrante.20
"Emergir na cor", como afirma o artista, implica vivenciar a cor no lugar em que a cor nasce, não apenas como fruto da percepção, mas no manuseio da cor enquanto pigmento puro. A cor emerge num duplo sentido: ao sair da boca de forno e ao impregnar a entretela aplicada sobre a superfície pictórica. A imagem resultante parece como fruto do ato físico de calcar uma superfície sobre a outra.
20 GOETHE, Doutrina das Cores, editora Nova Alexandria, 1993. Tradução Marco Giannotti, p. 127
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Pelo fato da impressão resultante nunca ser homogênea, temos a sensação de que a imagem resultante está sempre nascendo e se apagando, como um pequeno pedaço de carvão incandescente no interior de um forno a lenha. O óxido de ferro presente em Minas salienta a particularidade das cores brasileiras, visível em nossa terra. Por outro lado, remetem aos primeiros pigmentos produzidos pelo homem, que é possível ver na serra da Capivara há cerca de até 60.000 anos!
21
X. Beatriz Milhazes: a cor como paródia
Beatriz Milhazes, Succulent Eggplants, 1996
A técnica que utilizo na pintura reside no princípio da colagem. Pinto padrões em uma folha de plástico e colo a imagem resultante na tela. Em seguida retiro o plástico, como num decalque. Minhas pinturas são feitas a partir do ajuste destas pequenas peças, cada qual pintada separadamente. Na verdade há muitas camadas. utilizo as mesmas folhas há cerca de dez anos, são impregnadas de memória e seu uso permite certa irregularidades.22
21
http://www.icmbio.gov.br/portal/o-que-fazemos/visitacao/ucs-abertas-avisitacao/199-parque-nacionalda-serra-da-capivara.html 22 MILHAZES apud And painting. p. 175 documents on Contemporary Art Whitechapel Gallery, MIT Press.
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A monotipia aparece também como um fator decisivo na obra de Beatriz
Milhazes.
As
imagens
são
pintadas
sobre
plástico
transparente, posteriormente são descoladas, como películas, e aplicadas na tela por decalque. Os motivos e as cores são transportados para a tela por meio de colagens sucessivas. Assim como em Vergara, o método de impressão confere uma dimensão temporal a imagem. Mas, ao contrário do primeiro, que busca uma genealogia da cor, o aspecto ornamental e decorativo de sua pintura parece achatar as cores numa superfície única. Sem dúvida, trata-se de uma grande colorista, sua palheta parece cada vez mais diversificada. Em trabalhos mais recentes as cores tornam-se mais luminosas e impactantes. A paródia aqui não deve ser vista com uma conotação negativa. Assim como Tarsila, Milhazes parte de imagens e padrões presentes no folclore brasileiro. O carnaval aparece como uma referencia, de forma que as formas geométricas adquirem uma organicidade na medida em que se transformam em alegorias: Pela primeira vez, estou pensando em voz alta que, no trabalho com a cor, faço uma ligação entre vida e pintura. O carnaval - uma festa popular brasileira frenética sempre me estimulou com seu visual, atmosfera, loucura, beleza etc. Os desfiles, com suas combinações de cores e conceitos, são muito malucos, mas por outro lado todas essas coisas estão muito longe da pintura, do meu ateliê, do meu cotidiano. Ao contrário de Hélio Oiticica, que também trouxe referências do carnaval para o seu trabalho, eu jamais, em nenhum momento, fiz parte do mundo do samba ou do carnaval. E nunca quis fazer parte. Sou uma carnavalesca conceitual. O mesmo acontece com a cultura psicodélica e a religião, ainda que eu acredite em Deus. Acho que uma caminhada na praia é a melhor maneira de conectar geometria séria e carnaval"23
Ser carnavalesco e conceitual ao mesmo tempo implica em uma estratégia de distanciamento em que, no final das contas, não se é nem uma coisa nem outra. Dai uma sensação de artificialidade em suas pinturas. Sua grande receptividade no mercado internacional deve-se não só a qualidade do trabalho, mas pelo fato de ela saber ilustrar como ninguém a fantasia do olhar estrangeiro sobre o Brasil.
23
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction= artistas_
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Com este breve périplo histórico não se pretende uma visão evolutiva, ou finalista, mas antes de analisar como ao se engendrar na cultura local, genuinamente brasileira, alguns pintores encontraram seu lugar. Neste caleidoscópio cromático a cor se faz presente de modo inteiramente distinto em cada caso. Se a arte brasileira conquistou certa autonomia estilística a partir da década de 50 com o neoconcretismo, cabe indagar se a nova geração, neste mudo virtual da internet que dissolve a dimensão temporal
e
geográfica
da
imagem,
ainda
possui
uma
certa
singularidade ou se já se integrou ao mercado globalizado da arte. Vimos como ao dialogar diretamente com as vanguardas europeias, a arte brasileira deixa de importa-las colocando-as fora de contexto, ou fora de lugar, segundo a conhecida análise de Roberto Schwarz. Cabe indagar como após o golpe de 64 este projeto utópico modernista entra em crise, e as transformações ocorridas no mercado de arte, sua globalização etc. de certa forma diluem essa questão. Ao buscar uma pintura "internacional" nossa cor local de certa forma não se perde? Se por um lado esta busca num mundo globalizado pode parecer conservadora, por outro lado, vale indagar se uso da cor torna-se massificado principalmente devido ao monopólio de grandes empresas de tintas e pigmentos. Uma reflexão histórica sobre as técnicas inserida na construção poética de cada um dos artistas apresentados pode ser um caminho para encontramos nosso lugar num mundo cada vez mais virtual.
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entrevistas Entrevista com o pintor e professsor Marco Giannotti¹ Entrevista realizada pelo artista Fernando Augusto2 Fernando Augusto: Em 2013 houve a exposição e lançamento do livro: Diário de Kioto no Instituto Tomie Othake. Nesta ocasião, Agnaldo Faria perguntou sobre qual seria a diferença, para você, entre construir a cor e tomar uma cor já dada. Poderia comentar? Pensa, uma coisa muito interessante, porque o Albers ao fazer uma análise da cor ele quase volta ao Goethe, à cor, quase pensar ele em um contexto muito isolado. Quase como a colagem no mundo. Parece que para entender a cor em sua complexidade. A cor é uma coisa tão complexa que para entende-la, a gente tem que criar um mundo outro. A cor não existe, como diz Matisse. Estou olhando para você, estou supondo que é um azul, a luz está acabando, então daqui a pouco não vai ter mais cor. Quando não tem mais luz, não tem mais cor. Essa instabilidade da cor é o lado mais fascinante, que diz respeito até à nossa existência. A gente vai acabar, como um dia de sol. O Tunga antes de morrer disse “o mais fascinante não é a sombra, é a luz”. É entre luz e sombra que existimos, que a cor ¹Marco Giannotti é pintor, professor Associado da Escola de Comunicação e Artes da USP. Formou-se em Ciências Sociais na USP, e realizou suas exposições individuais nas principais galerias e museus de São Paulo e Rio de Janeiro. Defendeu seu mestrado em filosofia com a tradução e introdução crítica da Doutrina das Cores, de Goethe (1749 - 1832). Participou de duas versões da Bienal do Mercosul e do Arte Cidade, e de algumas exposições coletivas internacionais. Defendeu sua tese de livre-docência intitulada A sombra da Imagem. Forma o grupo de pesquisa sobre a cor no departamento de artes plásticas da USP. Convidado em 2011 para ser professor visitante durante o ano letivo na Universidade de Estudos Estrangeiros de Kioto, publica o livro Diário de Kioto pela Martins Fontes com apoio da embaixada do Brasil em Tóquio. Recentemente realizou uma exposição no Instituto Tomie Ohtake e na Galeria Raquel Arnaud. 2
Possui graduação em Artes Plásticas pela Universidade Federal de Minas Gerais(1987), mestrado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo(1995) e doutorado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo D E A Sorbonne(2000). Atualmente é professor titular da Universidade Federal do
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existe. A cor, ao contrário da forma e da linha, que é uma coisa mais ideal, exibe a nossa contingência como ser humano. Pense, os pássaros têm uma visão muito mais apurada, eles são quadrivisuais, têm capacidade de olhar com muito mais acuidade. Os cachorros são bivisuais. Então, uma cor sempre exibe a condição do ser. Por isso que ela coloca questões tão filosóficas, tão instigantes. Exibe exatamente nossa condição, do que é estar aqui e agora. Por isso que ninguém entende. Mesmo, vamos pegar o Albers, não há uma teoria geral da cor. Há uma vivência geral da cor. O Albers fala: isso aqui é uma carruagem que te leva para um aprendizado melhor; mas, isso não vai fazer você um melhor artista. Por isso que todos esses tratados sobre a cor foram muito bonitos em uma espécie de utopia e racionalização do processo artístico e deu em burros n'água. Por isso que a gente vive uma certa crise na academia, a gente tem que se reinventar a cada momento para pegar o melhor do aluno e fazer ele ser alguém. É muito difícil e muito diferente do estilo de uma matemática, onde o ensino claramente qualifica o aluno. A gente está sempre lidando com algo incomensurável, é muito difícil. Por isso que eu acho uma coisa bonita do grupo, sabe? O Apotheke, o nome já indica que é uma certa comunidade em que se partilha, em uma ilha tão linda, tão maravilhosa, mas também tão isolada. Uma vontade de saber em comum. Achei isso tão bonito, um aluno chegou “vou mostrar a minha tatuagem”. E o desenho era bom, não era ruim, isso é arte. Uma coisa meio tímida, entendeu? Tem que ser como meus filhos são, mais arrogantes. Mais autênticos. Não adianta querer agradar o outro não sendo o que vocês são. Tem uma questão que é muito forte: a perda da identidade. Isso em arte é fundamental. Hoje estava falando com um grande amigo meu e ele falou uma coisa muito profunda, por que o caiçara coloca a cadeira contra a lagoa? Por que um caiçara põe a casa contra a lagoa? Porque a lagoa é lugar de trabalho, não de contemplação. Essa questão acho fundamental. Um sujeito que vem de um setor empresarial e que explica muito melhor que vocês porque os caiçaras não olham pra lagoa, porque lugar de
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trabalho não é lugar de contemplação então, o lugar do artista é o lugar da contemplação, é uma coisa incrível. Isso já dá muito o que pensar. A lagoa, para o caiçara, não é lugar para se contemplar. Isso já é uma questão maravilhosa. Enquanto para nós, como turistas, é a questão essencial. Olhar o mundo. O bom professor, como dizia o Albers, faz ver. É o mais importante, incitar em ver o mundo. Senão, para que serve a arte? Então, pensar até uma questão de inclusão social em fazer com esses pequenos caiçaras, que eles aprendam em uma simples noite a olharem para a lagoa, essa visão de olhar para a casa, se voltar para a lagoa e não voltar, só esse fato pode ter uma mudança radical. Aí que eu acho que a arte educação pode funcionar. Se a arte educação pela teoria da teoria da teoria, você vai ficar sempre na teoria. Eu quero que a arte educação faça com que o caiçara volte a olhar para a lagoa, tá bom? Eu quero voltar daqui a um tempo e vocês vão dizer. Fernando Augusto: Pergunta Em 2015 você realizou uma exposição na galeria Raquel Arnaud, chamada ENTROPIA, constando de 10 telas em diferentes
dimensões.
Você
poderia
comentar
sobre
as
obras
apresentadas e o título desta exposição? Foi um sentimento geral que a gente tem até hoje de desordem geral que o Brasil vive, como projeto, como país, em que nada se fundamenta. A ideia de uma espécie de caos onde curiosamente se acaba em um tamanho estado de entropia em que, uma certa ordem no final, está quase se afogando e encontra um bastão onde se apoia. Então acho que, a gente está vivendo no Brasil; o Brasil é um Estado entrópico. É engraçado, eu mesmo já não estou pintando. Tem uma coisa muito mais a la Albers, tem umas janelas fechadas que têm um impacto
da
luz,
uma
luz
que
sobressai
através
da
janela
indicando... Realmente fico muito triste, sabe, com o Brasil. Eu, quando tinha 18 anos, estava em uma exposição em Los Angeles, lá, rumando como artista e veio o plano Collor. Agora tem isso. Essa .119. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
questão que até, acho que no texto da Sílvia, o texto do Sísifo, o eterno recomeço e agora devido ao mercado, alguns artistas estão se lançando no comércio internacional e outros não. E isso está muito atrelado a uma questão muito séria que é o mercado de arte. É uma questão, ao meu ver, um tanto perigosa. O mercado de arte está sendo totalmente dominado por alguns colecionadores que ditam o que vai ser bom. Ou seja, o poder reflexivo da universidade pensar de uma maneira autônoma em relação ao mercado acabou. O poder das galerias de pensar também acabou. Então hoje, os museus, vejo uma situação muito frágil em que literalmente, vai ser um colecionador e na sua veiculação com grandes instituições de fora é que vai decidir se você vai ser artista ou não. É uma coisa muito assustadora. Por isso é bom sempre resgatar essa experiência europeia, alemã. Porque pensem, é muito importante, como que a Alemanha se reconstrói como imagem depois da maior atrocidade contra a humanidade. Como o país pode se reconstruir e fazer uma seleção que bate a 7 a 1 o Brasil. Com muita humildade, com muito sentido de que temos que refundar o que nós somos. Temos que aprender com a cultura, que é o grande eixo. Em qualquer lugar do mundo, você vai ter um Instituto Goethe. Em qualquer grande cidade do mundo, de Porto Alegre ao Cairo. A experiência do Cairo foi incrível, uma cidade destruída que só tinha as pirâmides e o Instituto Goethe. É curioso você pensar que, em uma cidade destruída, você tenha o museu do Cairo e o Instituto Goethe. Ou seja, eles conseguiram se reconstruir como nação através da cultura. Não é à toa que eles têm uma relação de ciúme, muito diferente. É importante dizer que eles recusaram o sistema europeu, eles se recusam ao sistema burocrático em que o aluno tem um monte de matérias; lá é uma nação quase medieval. É o professor mestre e um sujeito que se identifica com o mestre, goste ou não, vai pintar na minha sala. Não quer, vai embora. Quer, fica para assistir .120. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
a algumas aulas. Imagine, que coisa maravilhosa, você lá dando aula de pintura para quem quisesse. Essa coisa de pintar, pra quem não quer pintar, pra que? Eu gosto mais para obrigar aluno a não pintar,
tá
certo?
Acho
que
tem
que
voltar
às
coisas
mais
elementares, alimentação, olhar, dormir, comer e viver de uma maneira digna. É isso que a gente tem que fazer. Muitas vezes esse excesso de teoria quase nos tira de questões elementares do que nós somos. Você fica lá, “bla bla bla do bla bla bla”, entendeu? Isso deixo para meu pai, que é um grande filósofo e realmente conhece a filosofia a fundo, pra realmente entrar nessas questões. Acho que cada um tem que saber, o pescador tem que saber pescar o peixe, o filósofo tem que saber que ele tem que fazer metafísica e um pintor tem que saber que ele tem que fazer pintura e que um cozinheiro tem que saber que ele tem que fazer comida. Hoje em dia nessa “mistureba” geral que virou, todo
mundo está querendo fazer
aquilo que não sabe. Simples assim, vamos voltar a ser mais humildes, entender o que nós somos, senão a
gente não vai para
lugar nenhum. Fernando Augusto: Ao longo desses trinta anos atuando como artista você identifica algumas recorrências nos seus trabalhos, nas diferentes fases? Quais seriam? Estou retomando uma fase de 1996 em que volto a ser mais figurativo e é muito curioso, sabe? Quando jovem, fiquei muito suscetível a críticas. Outro dia encontrei o Lauro Brito e foi muito curioso quando ele fala que o maior artista brasileiro é o Goeldi atualmente. Há 30 anos atrás não era. Era o Sued, sendo que a gente estava em uma exposição do Sued. Então, com todo o respeito aos grandes críticos a quem tenho uma grande admiração, a criação e a crítica são coisas totalmente opostas. Você nunca pode pautar sua criação artísticas pela crítica. São meios diversos. Pense, a .121. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
crítica sempre parte de uma análise de uma obra pronta, sendo que a criação é sempre um devir. Então quando houve essa confusão entre crítica antes da obra estar pronta, criou esse monstro que é a arte contemporânea, que é uma coisa que não tem mais obra. Então o curador convida o artista para direcionar ele à própria criação. Está tudo errado. Não queria dar uma entrevista para vocês porque eu estou vendo, falam muito da teoria após o fim da arte, também já é uma citação, do Danto, que não sabe muito bem diferenciar fenomenologicamente a obra de arte; muita teoria em cima da experiência artística. Vocês estão levando isso a um paradoxo final. Eu estou fora. Está chato. A arte contemporânea é a coisa mais chata que existe. Quando a Associação Nacional de Psicanálise me chama para explicar a arte como (****), chega a um ponto em que não sei mais explicar a arte contemporânea. Sabe por quê? Porque não me interessa mais. É muito chata. Umas alunas estavam falando do Hopper. Vamos olhar para o Vermeer? Quando eu falo de afresco, vamos olhar para o Rafael? Vamos olhar mais para a arte.
Vamos
entender o que é a arte. Ficou uma espécie de 'falacionice' em que efetivamente a experiência estética e espiritual do homem com a imagem que vai para uma experiência não verbal, por isso que você faz as coisas em imagens, que se perdeu. Então assim, não querem ver isso, então eu fico fora. Eu acho que o espaço da universidade, que podia essencialmente ser um lugar de resistência ao mercado, ficou um lugar burocratizado, emburrecedor, empobrecedor da experiência da pesquisa. As pessoas ficam olhando para os mesmos livros, repetindo as mesmas coisas e não têm a capacidade de olhar aquilo que está em volta e fazer disso uma experiência de vida. Então, acho que a gente está passando uma crise muito séria no Brasil. Ou a gente vai cair em um populismo generalizado, ou a gente vai sentar e criar focos, pontos onde se pode criar núcleos de esperança. Atualmente não vejo nenhum. .122. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
E por isso que eu volto ao Beuys; o Beuys não é referência bibliográfica.
Se
querem
entender
as
coisas,
vivam
sinestesicamente. Quando o Picasso começou a por areia na pintura, ele
queria
dar
um
sentido
sinestésico.
Todos
nós
estamos
transformando a arte em uma coisa chata que ninguém entende e ela nem é física quântica, algo que é muito difícil explicar. Acho que nós todos, professores, artistas, temos que nos repensar. Senão ela vai acabar, como diz o Foucault, com a imagem do homem que foi criada na Terra, como os Maias acabaram. A gente está caminhando muito rápido para fazer com que a arte não tenha o menor sentido. A arte vida é um núcleo de tensão, a arte sempre foi algo mais espiritual, mais vivo. A gente faz arte porque a gente tem medo da morte, por isso a gente cria uma imagem. Se a arte e vida ficam uma coisa igual, para que arte? Não tem o menor sentido.
Fernando Augusto: Tendo em conta a sua experiência docente como professor da escola de Comunicação e Artes da USP... Como você vê as mudanças curriculares que o curso de graduação em Artes Visuais vem sofrendo?
Um porre monumental. Tudo errado. O problema é muito sério, como é que a gente vai criar critérios de avaliação para uma coisa muito específica, que é uma criação essencialmente individual, que é a criação artística? Acho que a gente tem que ter outros sistemas muito diferentes de avaliação, muito mais pautados no mérito da obra, não vinculados à universidade, nem ao mercado, nem aos museus. Se o National Endowment for the Arts foi fechado, hoje em dia a arte está totalmente na mão de avaliação. Por exemplo, eu tinha um aluno muito bom. Ele estava querendo estudar pintura zen budista. Qual é o interesse disso no Brasil? Ele submeteu 4 vezes essa tese ao comitê de avaliação, todos falaram que a tese era .123. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
excelente, mas em uma situação de crise, será que isso é tão relevante? Então assim, talvez tenha uma razão. Mas ao mesmo tempo, não dá para você submeter a avaliação da criação artística aos mesmos parâmetros de uma tese (****), ser um comitê totalmente fluente, com muito mais abertura, com maneiras de ver a proposta em questão desde o princípio, sem os formatos. Por exemplo, para submeter meu aluno, tenho que refazer meu currículo de acordo com os critérios da (****), acha que eu tenho vontade de fazer isso? Não. Então a gente fica quieto, na minha casa, cozinhando, pintando, aliás, cada vez mais. O que eu gostaria de fazer são as coisas essenciais: cozinhar, pintar, ensinar, viver com meus filhos e minha mulher. Pronto. Parece que a universidade não entende que isso é a essência do que você é. Ela sempre cria empecilhos burocráticos, 'burrocráticos', em que você faz o relatório do relatório do que você quer fazer. Por isso eu, cada vez menos, me candidato
a
qualquer
papel
institucional,
seja
chefe
de
departamento. Não me adequo a uma coisa tão burocratizada, a uma política estudantil tão agressiva. Eu não quero. Não quero mais fazer parte desse Brasil desacelerado, quero fazer o meu trabalho. Ensinar as pessoas que queiram me ouvir, com quem eu posso mostrar um pouco do meu amor, que foi viver esse mundo das imagens, onde a imagem tinha um certo significado. Sabe o que eu acho que é o grande problema? O desespero que está acontecendo é que as imagens não têm mais sentido para essa nova geração. Aí a falta de mesura, de medida. Fernando Augusto: Você atua no Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais na Área de Concentração: Poéticas Visuais e na Linha de Pesquisa: Processos de Criação em Artes Visuais. Como você vê as exigências da academia com relação às pesquisas do âmbito das poéticas visuais?
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Nós estamos tentando mudar. Várias reuniões pedagógicas das quais eu fiz parte, que não sei se vão dar fruto, mas eu acho que é uma iniciativa em diminuir uma carga doentia de disciplinas. Muitos alunos reclamam que eles têm um monte de disciplina e não têm nem hora para pintar. Eles ficam fazendo disciplina, disciplina, disciplina, disciplina, e parece que o MEC criou uma coisa tão doentia que o aluno parece que tem que justificar a existência dele por uma série de medidas burocráticas que não tem nada a ver com a essência da criação artística. Então, a gente está tentando reduzir, acho que há uma iniciativa nesse sentido de cada aluno fazer pintura 2 e acabou. Escultura 2. A gente faz um básico em 2 anos e depois cada um faz seu caminho. Essa ideia, quase de um governo militar, de achar que você tem que monitorar o sujeito até o fim, de prestar contas de tudo que ele faz, é um saco. Emburrecedor e não produtivo. Por que aí, na hora que ele tem que fazer a criação dele, não faz. Aí o orientador fica com aquela situação, “Pô, te dei liberdade, mas aí na hora H você não vai”, aí fico sendo chefe de escoteiro, entendeu? Sabe, a liberdade é consentida, cada um com sua consciência, fica essa coisa de sempre um estar meio olhando o que outro vai fazer porque parece que cada um não sabe fazer o que quer. Estou perdendo a vontade de orientar. Não sou chefe de escoteiro. Cada vez mais vem aquela frase do Matisse, não sou muleta à qual você vai apoiar sua criação. Parece uma coisa meio infantilizada essa relação, uma espécie de escoteiro. Estou achando muito chato. Estou achando muito chato dar aula. Eu dou aula a 18 anos, gostei demais de dar aula. Estou achando um porre dar aula, virou uma experiência quase bancária, burocrata, fria, em que você não pode nem tomar uma cerveja com o aluno por medo de sofrer um processo por assédio, por ter falado algo inoportuno. Está chato. Talvez eu seja um pescador de outra coisa. u acho que o único futuro da educação, porque veja assim, não vejo nenhum problema, desde a questão de ascendência do PT, de tornar a educação algo mais acessível à população. A questão é que .125. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
universidades como a USP tem que escolher se vão ser escolas de elite. Como você pode ter uma escola de elite como Harvard, 20.000 alunos, a USP com 90.000 alunos, não é possível. Então você tem que fazer escolhas. Acho que a gente pode fazer escolhas, pode ter universidades realmente de maior acesso, mas não são essas que efetivamente vão poder criar um ensino de qualidade. Não tem como, não dá para fazer. Se nos Estados Unidos não dá para fazer, como a gente quer fazer aqui no Brasil? O problema é que a gente quer tudo no Brasil e não quer nada. Então a gente quer um ensino de alta qualidade e ao mesmo tempo aumentando o número de vagas. Não tem como manter a qualidade de pesquisa com 90.000 alunos. Isso que me fez, por exemplo, desistir das relações internacionais. Não posso assumir um compromisso em que eu não me sinto capaz de responder, entendeu? Não posso assinar meu nome. Nessa loucura toda, já convivi com 16 greves, já perde a graça. Talvez eu esteja ficando mais conservador, como diz o Agamben, mais revolucionário no sentido de que, os grandes conservadores são aqueles que estão realmente pensando as mesmas questões da arte para não ficar só no discurso, (***), aliás, como preservar a arte nesse mundo onde a imagem não tem sentido? Tem questões muito mais importantes do que ficar
de
novo
protestando
contra
o
governo
Alckmin
que
é
conservador e não dá mais. Acho até que a greve pode se reverter em outro tipo de manifestação de forma a fazer que a sociedade entenda nossas questões. Não que a gente pareça um bando de maconheiro desavisado que não tem o que fazer e que fica só fazendo greve. Não, a gente trabalha pra caramba, a gente tem um comprometimento enorme. Uma das coisas mais divertidas é mostrar, depois de uma aula de afresco para os meus alunos, agora vocês estão entendendo a grandeza de um Michelangelo. Eles não têm a dimensão, eles acham que aquela imagem surge do nada. Eles não entendem o empenho, o trabalho humano, o material, o desgaste físico de você ficar 16 horas por dia de ponta cabeça. Por isso, volto a dizer, e não é que estou elogiando demais, não é isso, não é esse meu papel, realmente o grupo Apotheke tem essa postura de trazer a experiência .126. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
artística para uma coisa mais humana. Tipo aqui, olha só, estou preparando uma alimentação muito séria, porque não tenho uma panela adequada, eu tenho um fogo e não posso deixar o fogo estragar meu risoto. Eu poderia estar fazendo a minha encáustica aqui e estaria com o mesmo problema. Cada fogo tem a sua temperatura e como é que eu vou lidar com a mesma proporção entre o pigmento e a cera? Por isso eu gosto tanto da pintura e cozinha de artista. Eu tenho um fogo forte e uma panela péssima, como é que eu faço? Gambiarra. Estou tentando fazer o melhor possível.
Marco Giannotti, Diário de Kioto e de Fundo o trabalho Quadrante. http://www.marcogiannotti.com/
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1
Entrevista com o pintor e professor Alphonsus Benetti
2
Organização e realização: Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke
3
Apotheke: como é ser artista na universidade?
Alphonsus: Bom, ser artista na universidade, eu acho que é uma situação bem diferente, peculiar, especialmente sendo um pintor, que é o meu caso, pois me coloco mais como um pintor do que artista visual. Sabe, é uma situação peculiar, porque há algumas coisas que eu penso serem interessantes, algumas são muito boas e outras, não. Por exemplo, ter um espaço garantido para trabalhar como eu tenho, um ateliê, é muito bom. Saber que ele continua e mesmo
que
não
receba
auxílio,
ele
vai
continuar.
Isso
é
interessante. E outra coisa é saber que eu tenho uma fonte de recursos que me permite viver para a pintura, para a arte em primeiro lugar, do que da arte. Por outro lado, você tem menos mobilidade para fazer certas coisas. Eu vou todos os dias à Universidade, eu tenho que orientar, mas eu não pinto no ateliê da universidade, porque tenho um ateliê em casa onde trabalho à noite. São essas situações bem peculiares que é ser um pintor, um artista na universidade. Mas, como eu dizia, é muito interessante você ter contato com essa gente, com a juventude, com jovens que estão querendo fazer pintura. É um espaço que não está correndo risco até o momento em que o currículo permitir. Eu vou me aposentar e o espaço vai parar quando eu sair? O artista plástico precisa batalhar alguma coisa para viver… é difícil em início de carreira ou em determinada época da sua carreira viver só disso, só do seu trabalho. ¹ Entrevista concedida ao Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke/UDESC/novembro de 2015. 2 Desenhista, professor de artes plásticas e pintor nascido no Rio Grande do Sul em 1953. Atua como professor de pintura na Universidade Federal de Santa Maria. http://site.ufsm.br/ http://galeria.ufsm.br/artista/alphonsus-benetti/108 3 As perguntas foram realizadas pelos diferentes membros do Estúdio de Pintura Apotheke e serão identificadas na entrevista como “Apotheke”.
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Apotheke: Na sua dissertação de Mestrado em Educação e Arte (UFSM), cuja temática foi pedagogia da pintura, como você observou o espaço das Artes Visuais na Universidade? Alphonsus: O meu trabalho foi dentro da universidade, ou seja, como é que se dava, como é que ocorria… vamos dizer… essa construção de um trabalho de pintura, pintura/pintura. Como é que você orienta um pessoal e faz com que eles cresçam e produzam pintura em um ateliê de pintura numa universidade? Basicamente, foi um estudo de caso, tomando todo o pessoal que trabalhava comigo
no
ateliê
naquele
momento,
usando
os
instrumentos
adequados para investigar isso, desde entrevistas, observações, registros; foi um trabalho demorado, mas muito interessante, achei muito bom, muito legal… A conclusão a que chego é que você precisa fazer um trabalho prático com eles e tem que levantar uma série de questionamentos; é prático-teórico, mas a prática tem que estar forte com participação deles, de todos… é assim que a coisa vai se colocando. Eles têm anseios, desejos; eles colocam isso para você, e você interfere, possibilitando essa construção, essa orientação do trabalho deles; Isso ficou bastante claro, evidente, inclusive com os instrumentos que a gente usou para examinar, coletar naquele momento. Cercamos-nos de uma série, de cuidados, já que era um trabalho dentro da área que eu trabalhava. Apotheke: Como pintor, por que você escolheu um Mestrado em Educação? Alphonsus: Naquele momento, porque o que eu podia fazer era em Arte-Educação. Eu escolhi esse Mestrado e havia a possibilidade de fazer esse trabalho dentro do ateliê e, outra coisa, eu não podia sair naquele momento, era a possibilidade que eu tinha na universidade. Não sei se eu conseguiria, mesmo hoje, com alguma abordagem
específica
em
pintura?
Eu
gostaria
de
ter
feito
evidentemente em pintura, em pintura especificamente. Mas foi a possibilidade de trabalhar dentro da universidade, o orientador permitiu e me deixou até bastante à vontade… para fazer este .130. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
trabalho dentro do ateliê sabe. Eu não podia sair naquele momento, trabalhei o tempo todo sem bolsa, sem redução de carga horária, fazendo o trabalho no prazo exigido. Mas foi legal, porque me possibilitaram isso. E foi legal, pois eu pude fazer esse trabalho dentro do ateliê com o pessoal da pintura. Apotheke: O ateliê seria este “novo” espaço de aprendizagem para as Artes visuais? Alphonsus: Eu acho que sim, considero muito importante o ateliê como espaço de aprendizagem. Eu defendo de maneira muito veemente o espaço do ateliê como espaço de crescimento, de desenvolvimento da criatividade das pessoas, de criação de percursos individuais, tudo isso eu defendo muito. Pode parecer contra corrente, mas é um espaço precioso e acho fundamental que as universidades possam oferecer isso. Porém, a tendência parece ser meio contrária. As universidades, seguindo cada vez mais padrões tecnológicos e burocráticos, buscam enquadrar algumas propostas, algumas áreas sensíveis como a nossa, com esse tipo de especificidade, enquadrar num outro regime geral de coisas, numa formatação única. Ou seja, estes espaços, estas possibilidades podem se perder. Eu sempre entendi a universidade como essa variedade de possibilidades. A universidade tem que ser um local aonde as diversas formas de conhecimento, de diversidade...
Em
que as formas de abordagem do conhecimento humano, do campo da cultura, da arte têm que se dar de diversas maneiras. Não pode ser uniformizado, partindo de padrões... que é o que está ocorrendo muito hoje com padrões brasileiros e com cobranças. Eu ouço muito as pessoas dizerem: “Ah, mas isso não pode, porque o sistema, isso não pode, porque a Capes… isto não se pode fazer, porque o CNPQ…” Isso é o empobrecimento da universidade… Tanto é assim, que nós lá, por exemplo, não contratamos mais ninguém de notório saber. Há um item no regimento na universidade que permite a contratação de pessoas de notório saber e, na nossa área, poderia ocorrer isso, na área de teatro, na área da música, alguém de notório saber, mas eles
não
contrataram
mais
ninguém
porque
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sempre
se busca o referendo acadêmico. O professor tem que ter o referendo acadêmico, ainda que um notório saber possa ser uma pessoa brilhante, que vai contribuir muito na universidade. Em resumo, fechando a pergunta… a Universidade para mim é universal, tem que ter muitas possibilidades, quer-se ensino científico, tecnológico… quer-se um perfil tecnológico, tudo bem, mas tem que ter outras possibilidades, que cresçam, que se desenvolvam ali. Algumas dessas possibilidades que ficam, às vezes, à margem e que são meio desconsideradas, para mim são fundamentais,
são
importantíssimas,
vão
trazer
frutos
mais
importantes à comunidade toda do que algumas dessas propaladas propostas tecnológicas bem a favor da corrente que está aí.
Apotheke: Você, com o coletivo de professores, na década de 1980 (na UFSM), fez uma mudança curricular e essa mudança transformou um currículo que era bem tecnicista em um currículo em que o estudante podia escolher o que ia fazer, não havia mais a ênfase
nas
disciplinas
(obrigatórias).
A
avaliação
era
qualitativa e o interesse do estudante tinha bastante valor, pois cada estudante podia fazer o seu próprio currículo.
Como você vê
a diferença da formação em Artes Visuais com essa mudança curricular? E se quiser também comentar, não só da diferença da formação depois dessa mudança, mas também da diferença dos artistas e dos professores de arte formados neste novo currículo.
Alphonsus: Bom, vou falar um pouco da experiência anterior e dessa do currículo que vocês conhecem e que nós chamávamos de currículo
novo.
Eu,
quando
ingressei
na
universidade,
nós
estávamos no regime militar… e o currículo era aquele que se mencionou. Então, você entrava no curso e eles te davam umas folhas mimeografadas na época dizendo: “você faz tudo isso. Acabando isso, você está aprovado, está formado com notas, com tudo mais”. Quer dizer, você não escolhia nada… os professores .132. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
também você não sabia bem quem eram, nem muito o que estavam vindo fazer… Minha primeira professora de história da arte era uma professora de música, ela não sabia nada da história da arte, das artes visuais, plásticas; puseram-na para dar aula e ela trazia sempre três slides só, os mesmos, e queria falar de música, porque ela entendia de história da música. Eu passei também pela implantação
da
primeira
turma,
aquela
da
polivalência
da
licenciatura curta, que também era um projeto do governo militar, que não se preocupava muito com a qualidade do trabalho, mas havia provavelmente o interesse de poupar recursos; colocar menos professores; um só devia dar conta de teatro, música e artes visuais, o que era uma furada, pois pouca gente tem a capacidade de fazer isso. Além disso, vou falar um pouco daquele momento… só depois de ter feito essa licenciatura obrigatória de dois anos, para a qual eu não me inscrevi no vestibular, mas fui obrigado a fazer para poder ingressar no bacharelado. Foi a parte que me interessou bem mais e aí fazer o ateliê que eu queria. Na época, os ateliês
eram
muito
poucos.
Havia
alguns
professores
que
trabalhavam em ateliês, nós tínhamos o ateliê de escultura; um ateliê de cerâmica. A pintura tinha um pouco mais de gente e um professor de pintura que orientava; um ateliê de tapeçaria que desapareceu, mas que na época estava cheio de gente; e era isso, eu queria fazer pintura e fui para lá. Aí tinha os professores Carriconde, Yeddo Titze, que está em Porto Alegre e hoje está aposentado. Foi
4
um
trabalho
bem
interessante!
Para
mim
foi
muito
interessante! Eu estava a fim de pintura, curtia muito isso e, chegar a trabalhar, começar isso com eles, foi uma experiência muito boa, mas, para chegar a isso, eu tive que passar pela licenciatura curta e toda aquela obrigatoriedade. Na própria pintura tive que seguir toda a grade que eles tinham; era obrigatório fazer aquilo. Com a mudança curricular que a gente
4 Yeddo Titze Faleceu no dia 8 de junho de 2016, aos 81 anos, em Porto Alegre, vítima de um atropelamento.
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fez, nesse novo currículo, a gente mudou tudo isso. Na época em que eu cursei era tudo por nota; o professor dava a nota e, às vezes, nem olhava o trabalho da gente, nem estava lá, não aparecia na universidade e surgia a nota que ele lançava em um caderno. Então, com o currículo novo, mudamos tudo isso e uma das primeiras ideias foi a seguinte: cada pessoa que estudava arte era uma pessoa diferente, não era que nem garrafa, todas iguais, que entravam lá e quando estavam preenchidas, todas da mesma forma pegavam o diploma… Todas com o mesmo “líquido”, igual e o mesmo diploma… Não, a primeira coisa: são diferentes e precisam receber conhecimentos e/ou buscar conhecimentos diferentes para cada um. Para isso, precisam escolher também, mas para escolher, a gente colocou um início para todo mundo junto. Tinham que ter um contato experimental que é o que chamávamos de núcleo comum: nos dois semestres iniciais funciona uma grande disciplina com vários professores
trabalhando
juntos
nela.
Avalia-se
cada
aluno
coletivamente, o que ele fez em todos os dias. No final do semestre há as avaliações com parecer escrito, sem nota para todos eles… E por que isso? Porque tem muita gente que nunca teve nenhum contato antes com as artes visuais, mas tem vontade de fazer. Então, o currículo novo possibilitava primeiro um contato experimental com todos os procedimentos e conteúdos de teoria, de cor, de desenho, de espaço, de volume; experimentam tudo durante o primeiro ano. A segunda parte do nosso curso, do nosso currículo, é a livre escolha dos ateliês. Os estudantes vão tomando um caminho: “Eu estou gostando mais dessa área, dessa modalidade, eu acho que vou escolher o ateliê de escultura com orientação do Peciar”, por exemplo. Então, começou-se a considerar a escolha dos alunos. Escolhiam
como
iam
organizar
o
seu
currículo
junto
com
o
orientador. Aqui entrava a escolha dos alunos e você sentava e conversava para fazer o seu currículo semestral.
“Bom, eu vou fazer isso” e
acho que você pode fazer tais disciplinas complementares ou ateliês complementares, então, você pode fazer gravura, mais desenho ou menos desenho, trabalhar mais com cor, cada um de certa maneira tinha um currículo mais específico e a formação final se .134. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
dava a partir do cumprimento em determinado tempo, de certo número de horas de trabalho. E você podia ficar aprofundando mais conteúdos por opção própria, se necessário. Eu gosto muito deste currículo, porque possibilitava, por exemplo, pela estrutura orgânica que tinha, que você desativasse áreas momentaneamente se não houvesse professor, pois saiu, se afastou, ficou doente… desativa e cria áreas novas… você acrescenta áreas novas. E acrescentamos, depois, fotografia, vídeo, que no início não havia. Você
podia
atividade…
acrescentar, bastaria
por
para
exemplo,
isso
mosaico
chegar
um
ou
uma
outra
profissional,
um
professor, um pesquisador, um artista que trabalhasse com essa modalidade. A gente abre um ateliê para ele trabalhar. Então, tinha
toda
essa
flexibilidade,
que
eu
acho
muito,
muito
interessante, sem precisar desmontar ou remontar um currículo novo. Você podia fazer mudanças, podia inserir elementos e nas teorias também, na parte teórica, de acordo com as necessidades ou mudanças que a gente ia tendo no corpo docente. A diferença era essa, para mim uma diferença muito grande. Eu me sinto muito gratificado de ter trabalhado nessa proposta desde a criação e continuar trabalhando nesse projeto. Não me sinto bem com a minha experiência de estudante; eu costumo dizer que devido ao que fizeram com a gente, com aquela educação artística licenciatura polivalente; devíamos ser indenizados. Eu cheguei quando o Geisel fechou o Congresso Nacional e cassou várias pessoas
naquele
mês
de
maio;
eu
recém
tinha
entrado
na
universidade. Os militares queriam formar mão de obra rápida, barata. Mas, a qualidade daquilo era muito ruim; não há condições de trabalhar arte com crianças com essa formação polivalente de dois anos.
Aquela formação de professores, aquele projeto da
ditadura militar durou dezesseis anos e formou muita gente daquela maneira; esse pessoal é responsável por muito daquela imagem que se tem nos colégios por aí, dos professores de arte. Professores de artes que são pessoas desanimadas, deprimidas, de 'saco cheio', que tiram licença, que se afastam, que não agüentam mais os alunos.
Este
projeto
da
ditadura
militar
também
ajudou
a
consolidar aquela imagem dos professores de arte que são aqueles .135. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
que se chamam o tempo inteiro para fazer bandeirinha de São João, para decorar as festinhas, decorar salas... Ou seja, não se tem respeito por esse professor. Muita gente que saiu da universidade, naquela época, honestamente e foi trabalhar e encontrou este cenário que eu digo para vocês. E muitos hoje se aposentaram, saíram, ficaram doentes; é o quadro geral que você tem do professor de artes nos colégios, nas escolas, alguém que não é respeitado, não é levado a sério. Acho que nós com o novo currículo (UFSM) formamos artistas e professores de arte muito melhores, mais capacitados, tem muita gente boa que se formou no novo currículo, competentes, mais maduros, com outro projeto, uma coisa séria mesmo. Uma licenciatura que nós tivemos temporariamente era diferente, era licenciatura ligada ao bacharelado… ali saiu uma leva de professores ótimos. Bem no início, nas primeiras turmas, era muito bom, era um pessoal que vinha do bacharelado e fazia licenciatura, era um pessoal que tinha formação, conhecimento de arte, da área e depois ia fazer licenciatura. Mas a maioria não atuou nos colégios; foi adiante, foi para a pós-graduação, para outros lugares, para as universidades… não ficaram nos colégios atuando. E na questão de minha formação em arte, naquele início, bah! Eu lembro, fazia pintura, eram três pessoas no ateliê: uma vovozinha que fazia pintura comigo, que já faleceu. Fazia pintura comigo outra menininha e eu. Na escultura tinha só duas pessoas fazendo, depois mudou tudo, bons grupos na escultura, bons grupos na pintura. A história dos ateliês mudou muito e produziu todo um pessoal que está por aí, alguns até no exterior, eu acho que essa mudança foi muito gratificante, muito boa e bem mais consistente; mais gente também, passou a ter ateliê com dez pessoas, mais de dez… um pessoal atuando o tempo inteiro naquele espaço. Outra responsabilidade do professor era a de orientador, tinha que orientar o seu aluno no ateliê, não só na pintura, não só na escultura, mas em todas as atividades que o aluno fizesse durante a semana na universidade. Então, os professores tiveram outro comprometimento, outra responsabilidade, outra presença. Quando eu estudei pintura, o professor vinha quando ele queria, ele .136. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
aparecia uma vez a cada quinze dias na universidade, por uma hora… caminhava dentro da sala, olhava e não dizia nada… Eu ia todo dia pintar… morava na casa do estudante, na frente do Centro de Artes da universidade… ia para as outras aulas, depois ia pintar. E você gostaria que ele dissesse alguma coisa, afinal você estava ali pintando, pintando. Então, isso mudou muito, mudou bastante… Eu respeito muito esse currículo, sei que ele foi uma proposta trabalhada longamente. Sua discussão amadurecida; foi aprovado por uma equipe de muitos professores, por unanimidade. Hoje, se aprova currículo por maioria, o que não é uma boa ideia; porque se tu aprova por maioria simples um currículo, tu tens muitos adversários na trincheira, tem a turma que quer tocar o currículo novo e a turma que vai puxar o tapete, porque não concorda. Currículo não se faz com votação por maioria, tu tens que dialogar e convencer a equipe toda… até o pessoal se convencer… vamos argumentar… vamos explicar tudo até o pessoal entrar em acordo. Porém, se aprovar por maioria, tem gente que vai dizer: “Eu não vou aparecer lá agora, eles que aprovaram que se virem, eu não vou ajudar naquilo, eles que façam, já que eles queriam isso”; Vamos ter problemas com isso. Mas essa experiência curricular que nós temos foi para mim muito gratificante e me sinto muito bem de ter participado
desde
a
criação
deste
“novo
currículo”
e
do
desenvolvimento de tudo isso…
Apotheke: Essa experiência de currículo tem trinta anos em funcionamento? Alphonsus: Não chega bem a trinta, ele começou a funcionar em 1990, quando foi implantado. Antes foi discutido… nós levamos quatro
anos
trabalhando
em
cima
dele,
dialogando;
quando
apresentamos a proposta no Conselho Superior da Universidade eu era coordenador, eu não era conselheiro e fui ao conselho naquele dia para defender a proposta, porque a gente achou que podia ter algumas resistências, ele era o único na universidade em cursos de graduação com avaliação por parecer e com livre escolha. O aluno .137. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
escolhia a trajetória curricular e ainda tinha a avaliação com banca onde o orientador não avaliava, ficava fora. Eu nunca avaliei meus orientandos, avalio outros ateliês. Esta proposta curricular foi muito bem aceita na ocasião no Conselho da Universidade; o pró-reitor nos defendeu, foi uma coisa muito bonita, muito positiva, mas a gente tinha um pouco de temor. Apenas as pósgraduações haviam começado a trabalhar com avaliação por parecer. Os professores do Núcleo Comum avaliavam juntos, seis a sete professores avaliando cada aluno e fazendo parecer escrito diante do trabalho do aluno e depois conversando com ele. E isso mudava muito as coisas... Nesse processo, a gente não tem como premiar um aluno que não apareça ou punir um aluno que, vamos dizer, discorda de você. Quando eu avalio o meu aluno, posso ter um instrumento de controle e pressão. Se o aluno concorda comigo, posso dar um prêmio para ele… Se ele discordar e bater o pé, mesmo que ele tenha razão, eu posso punir. Ouço
dizer,
de
alunos
que
abandonaram
outros
cursos
perseguidos por professores através de instrumentos de avaliação. O professor dar aula e avaliar pode gerar coação e perseguição; Eu me sinto muito bem orientando e não avaliando. O novo currículo não gera esta situação de coação e perseguição; No nosso currículo pelo menos é assim… até agora ainda é assim… o restinho que está sobrando é desse jeito. Na maior parte da universidade não acontece isso, se eu dou aula e avalio, eu posso muito bem… com a nota ou o conceito na minha mão… usá-los como um instrumento a favor ou contra o aluno. Então no “novo currículo”, a gente procurou eliminar isso, a gente apresenta o trabalho do orientando e eles avaliam. Como não é um só, são três, é mais difícil que eles 'aprontem' alguma coisa ou tenham algum preconceito, ou alguma coisa pré-estabelecida contra alguém. Trata-se de um parecer de três pessoas e ainda os membros da banca podem fazer pareceres individuais se eles não concordarem entre si... se eu estou com vocês dois numa banca e discordar da avaliação de vocês; vocês dois podem fazer um parecer e eu posso fazer um à parte. E apresentamos os dois pareceres ao aluno. “Olha, eles dois acham isso e eu acho isso, diferentes pontos de vista nesse aspecto do seu trabalho”. A avaliação por banca é mais justa; acho esse projeto bem interessante. .138. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Questões com referência no questionário de Joe Fig presente no livro Inside The Painter´s Studio1
5
Apotheke: Como você avalia a sua atuação como artista depois que começou a lecionar? Como ficou dividido esse tempo? Bom, são duas situações nesse caso; primeiramente, acho que consegui fazer um trabalho de pintura, de pintor, sempre. Talvez não tanto como eu gostaria de fazer, porque tem a questão de ser professor, mas por outro lado penso que só poderia ser professor do que sou, sendo artista, sendo pintor. Eu não iria ensinar, ter um ateliê de pintura, não seria professor de pintura se não pintasse, jamais faria isso; se fui bem ou não, dizem melhor os que trabalharam comigo ou estudaram. Creio que faço um trabalho sério, honesto, gosto de ser muito sério no meu trabalho e com os alunos. Eu nunca poderia ser professor de alguma coisa que eu não faça, da mesma maneira que eu nunca cobrei dos meus filhos uma formação, um aprofundamento, um estudo, além daquilo que eu pudesse fazer; eles podem fazer tudo o que eles quiserem agora, eu não cobro nada que eu não faça ou que eu não possa fazer.
Apotheke: Acha que sua identidade tende mais para ser um professor ou para ser artista ou há integração entre as duas? Eu não sei como eu sou visto neste aspecto, provavelmente exista uma situação intermiediária onde as duas coisas se fundem, provavelmente seja uma fusão disso. Muita gente me chama de professor em alguns lugares ao me encontrar, e outros me chamam de pintor, artista, entende, então ficou um pouco nesse meio caminho. É inegável que a minha atuação, ao longo do tempo, como professor de pintura ou professor de ateliê de pintura… pode gerar essa imagem de um professor orientador de pintura, porque já se passaram algumas gerações comigo. 5 Entrevista realizada pelo estúdio de pintura apotheke, com os direitos cedidos e referência no livro de Joe Fig, Inside The Painter´s Studio (Princeton Architectural Press,2009).
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Apotheke: Você enquanto artista/professor divide o seu processo criativo, colocando-o como material de reflexão em sala de aula? Você leva os seus estudos? Às vezes, quando eu sugiro, peço para eles fazerem estudos de trabalho, posso conversar com eles em um terreno comum, porque eu também faço. Quando eles têm dificuldades com alguma coisa na pintura, eu também posso conversar em um terreno comum, que é comum à gente; nesse sentido, temos só uma experiência diferente. Eu também conheço as dificuldades desse fazer e, às vezes, eu digo para eles: “tenho sugestões”.
E aí digo: “não, não vai por aí,
porque vai acontecer tal coisa…”. Porque eu já fiz, já experimentei tantas vezes, sabe. Então, eu acho que é isso. Apotheke: Complementando a pergunta, a respeito da dinâmica que acontece no ateliê, em algum momento você se reúne para ler, estudar, para assistir a filmes, para estar junto e estudar com o grupo todo. Essas escolhas destes instrumentos, como acontecem? Você seleciona, leva para eles ou são
eles que selecionam? Você
escolhe de acordo com a pesquisa deles, de acordo com o interesse comum do grupo? Bom, aí acontece o seguinte, geralmente tratamos disso no início de cada semestre. Quando acontece a primeira reunião, geralmente reúno o pessoal no primeiro dia de aula de ateliê, quando programamos o semestre, damos uma delineada no que vai acontecer e, quanto às questões teóricas, a gente acha muito importante discuti-las. Sabe, na maioria das vezes eu acabo colocando o material, porque eles não têm muita certeza do que querem ver e as experiências são diferentes. Mas muitas vezes fazemos coisas por sugestões deles também; estudamos textos que eles trazem, especialmente dos que estão há mais tempo no ateliê; há um aprendizado bom, muito importante entre o grupo. Quem está no primeiro semestre, recém chegou, não conhece muito, sugere pouco, não quer falar, mas os outros propõe coisas e, às vezes, eles trazem; e dentro da sugestão deles então, eu proponho certas coisas “Bom, agora está se falando muito disso na pintura por aí, .140. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
nas bienais, nas exposições, bom, o que podemos ver de material, de texto sobre isso, quais são os autores, livros, críticos que estão abordando isso agora para a gente discutir aqui em um encontro?” O que nós achamos que está bem, o que não está bem… o que está acontecendo. É desse jeito que a gente faz... Os filmes, eles curtem muito. Alternamos, por exemplo, quando é marcado um trabalho teórico, nós fazemos um bloco teórico e um bloco de filme, para dar uma equilibrada. “Bom, temos tais e tais possibilidades, o que vocês estão achando, podemos ver aquele bloco, aquele autor, aquele cineasta ou podemos juntar algum cineasta que tratou desta questão… Então vai dessa maneira, é conversado, escolhido assim. Na maioria das vezes, eu acabo sugerindo coisas, até por uma questão de experiência, porque eles não se arriscam muito, mas quando
os
mais
experientes
se
arriscam,
a
gente
acata,
e
conversamos sobre o tema proposto e, fora isso, a gente sempre conversa individualmente. Eles chegam para mim: “Eu vi tal coisa, tem um fulano dizendo isso, tem um artigo que saiu sobre isso.” A gente dá uma olhada, pára um pouco, olha, conversa. “É isso, está acontecendo assim, assim”. Às vezes, só com dois ou três deles… e vamos em frente… Evidentemente, eu privilegio, ao longo do tempo, e quem passou por lá conhece, eu privilegio mais a prática, eu dou mais espaço para a prática, não que eu não goste de teoria, de leitura, de livro. Eu gosto muito, eu tenho livros empilhados para ir lendo, que eu vou comprando para ler e não consegui ler ainda e vou lendo. Curto muito isso, mas é que o contexto está ficando muito teórico e tem muita gente trabalhando com teoria, mais teoria… me surpreendo
com
tanta
gente
dando
aula
teórica.
Então,
necessariamente, vou trabalhar mais a questão prática, porque como o contexto nas universidades está virando cada vez mais teórico, procuro fazer um pouco da Curvatura da Vara de Lênin…
Apotheke: Quando foi que você se considerou um artista profissional e quando se sentiu capaz de se dedicar, em tempo integral à arte? Bom, eu considero que trabalho com isso, vivo disso. Desde que eu comecei na universidade, não me considero um artista assim .141. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
profissional, que vive vendendo o seu trabalho… não, sabe… eu sou um profissional no sentido de que eu faço a coisa séria e sempre, de preferência todos os dias, mesmo cansado. Porém, sou uma pessoa que cuida muito mal desse aspecto do comércio das obras, do meu trabalho, eu não vou atrás… Eu pinto, pinto… acumulo no meu ateliê. Às vezes, a Natasha olha e fala: “Mas Alphonsus tu não vais mostrar… Tu só pintas…” Digo: “Tá, pinto, pinto”. Não cuido bem dos negócios com arte. Nesse sentido, eu não sou nada profissional. Apotheke: E quanto tempo, diariamente, de ateliê? Eu gostaria de pintar muito… mas pinto só à noite e em casa, num certo horário, porque o dia todo eu fico na universidade, de manhã e de tarde. À noite eu pinto por algumas horas. No início, eu pintava muito rápido, agora pinto mais lento, o trabalho também está diferente um pouco. Pinto um pouco mais devagar, mas de preferência sempre que eu posso vou para o ateliê, o que faz com que a família reclame: “Tu nunca estás aqui com a gente, tá sempre no ateliê”… mas não é verdade, não vou tanto assim no ateliê, mas eles reclamam disso; o ideal seria ir todo dia, mas às vezes chega uma pessoa lá em casa, um visitante, um amigo, um familiar e então, não vou ao ateliê, fico com eles… às vezes, eu preciso sair para resolver alguma coisa, por exemplo, levar meu pai à consulta médica, recebê-lo na minha casa, esperar com ele no dia seguinte para ir ao médico, aí eu fico com o meu pai, não vou para o ateliê; então, nem sempre rende tudo aquilo que eu queria. Mas eu sigo com o processo, sempre tem um projeto e quadro no cavalete, sendo pintado… vai seguindo… Apotheke: Faz tempo que você trabalha neste ateliê na sua casa? Sempre, desde o início, desde que eu comecei. Quando eu pude ter ateliê, já começei a trabalhar. Faz bastante tempo… uns trinta anos … Apotheke: E a localização do ateliê, acha que influencia no seu trabalho de alguma forma? Acho que a localização do ateliê é uma coisa que pode influenciar e, no meu caso, influencia na produção. Como é junto da .142. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
minha casa, ajuda, facilita. Se eu tivesse que sair de casa para frequentar um ateliê que não fosse o meu para pintar, seria diferente. Talvez me atrapalhasse, diminuísse a produção. O ateliê é junto da casa, separado um pouco, o que permite que a família veja o que quiser, ouça o que queira. Vou para o ateliê e fico sozinho, em silêncio. Pinto em silêncio, sozinho, não ouço música, nada… o tempo inteiro, não ponho música de tipo nenhum. E o pessoal da casa pode ouvir coisas, assistir filmes, assistir novelas. Então eles ficam no outro setor e não atrapalham, ficam lá ouvindo as coisas e o ateliê é silêncio, à noite. “Bah, esse cara é chato, não gosta de música”. Não, eu gosto de música, ouço muitos tipos de música… Só que sou o tipo de cara que é chato, no seguinte sentido: se eu vou ouvir música, gosto de prestar atenção ao trabalho musical do artista, acho que todo músico bom merece que você preste atenção no que ele fez, que não fique assobiando, conversando com os amigos, enquanto ele está apresentando a obra dele. Eu não gosto nada disso, tenho muita pena daqueles músicos que estão se apresentando em um lugar público, em um bar e às vezes são muito bons, fazem um trabalho: Bah! O cara é muito bom e o pessoal: blá blá blá… e ele se puxando, cuidando… Não, não faço isso… quando eu ponho música para ouvir, ouço música, me sento e fico em silêncio ouvindo música. Quando eu vou desenhar ou pintar não ponho nada… não sou contra os alunos ouvirem música, alunos usam fones de ouvido, ninguém ouve música alta no ateliê coletivo.
Apotheke: Com que frequência você vai ao Vale Vêneto(Região da Quarta Colônia Italiana no Rio Grande do Sul) para pintar? O Vale está famoso!!! Ainda não pinto no Vale. Eu vou com a gurizada no Vale, às vezes. Desenho no Vale, eu fico desenhando alguma coisa enquanto eles desenham, eles basicamente desenham e às vezes pintam… Mas pintam projetos, coisas mais rápidas, porque é tipo trabalho de campo, tem que levar material mais leve, fazer um trabalho meio na mão ou então carregar um cavalete de campo, mas eles gostam muito. Tem gente que vai lá e pinta, leva tinta à óleo, tudo e pinta lá no Vale, na frente da coisa mesmo. Mas eu não faço isso, até pela questão da paisagem que falei, eu pouco fiz, deve ter três ou quatro paisagens que eu pintei ao longo da minha vida… e o .143. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Vale é basicamente paisagem, é bom para quem gosta disso… Apotheke: E que tintas você usa? Eu não produzo tintas, eu compro tintas… Geralmente trabalho com tinta à óleo… que gosto muito; e acrílica, alguma coisa. Guache é um material de que eu gosto muito também, eu faço todos os projetos em papel, tudo com guache. Gosto muito mais do que a aquarela… o guache me agrada mais. Tenho trabalhado com algumas tintas importadas há algum tempo, não é nenhum esnobismo, mas acho que são melhores, estava trabalhando com a Winsor & Newton. Apotheke: Gostaria que contasse pra gente a respeito dos teus procedimentos. Você faz os desenhos, faz os estudos, os projetos, leva isso para a tela, pinta em camadas, planeja pintar em camadas, você trabalha quanto tempo na paleta… como isso acontece? Eu posso falar algumas coisas. A primeira coisa, eu sempre faço projetos, estudos. Geralmente faço uma série de projetos sobre alguma coisa que estou me envolvendo naquele momento, naquela época e isso pode durar um tempo. Parte assim de um desejo de acrescentar, de mudar algo que eu tenho em vista, algo às vezes que é bem sutil, mas que para mim é mais forte. Não falo para as pessoas se estou mudando, fazendo uma série de estudos novos. Como eu disse, eu faço estudos em A3, mais ou menos, com guache e coloco cor sempre. Houve uma época em que eu fazia em preto e branco, um bom tempo atrás, mas hoje eu coloco cor, alguma sugestão de cor com guache. Faço um número determinado de estudos e depois que cheguei a um ponto, que achei que está interessante, tá ok, paro e seleciono aqueles estudos, os que eu acho mais interessantes para pintar. Como eu disse antes, de um grupo, eu pinto sempre menos, alguns eu não pinto, deixo de lado e, às vezes, refaço o estudo, se não estou contente. Refaço o estudo com guache, de novo, uma segunda ou terceira versão daquele trabalho e tem outros que depois eu vou seguir pintando. Após, eu passo o estudo para a tela, coloco ele na minha frente e passo para tela; passo o desenho dele numa tela via de regra proporcional. Cuido da proporção do estudo com a da tela para não cortar coisas importantes. Se o estudo tem uma certa proporção, busco a mesma proporção na tela para poder .144. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
ampliar, passar aquele mesmo estudo na tela sem cortar o trabalho. Faço isso com o grafite, um grafite mais grosso, preso a uma vara para eu poder desenhar afastado da tela, para marcar o traçado principal. Depois de ter feito isso, passo em todas as linhas principais, dou uma repassada com um lápis dermatográfico; não uso carvão, uso um dermatográfico preto ou azul pelo seguinte: porque permite que eu trabalhe em cima com as primeiras camadas de óleo sem perder o esboço. Coloco uma camada aquarelada de óleo com solvente,
ele
meio
desmancha
o
desenho
que
eu
fiz
com
o
dermatográfico, mas ele permanece parcialmente. Passo por cima das diferentes áreas uma cor geral que estou achando interessante para aquele trabalho. Preparo essa cor geral e passo aquarelado em muitas áreas do trabalho. Passo por cima das figuras, por fora das figuras e depois eu começo a trabalhar por blocos, separando as coisas. Outra coisa: mesmo no aquarelado inicial trabalho com a paleta na mesa e a tinta à óleo. Eu trabalho sempre procurando a cor, qualquer cor por pequena que seja, primeiro misturo, olho bem a cor aqui para começar aplicar no trabalho lá. Ainda que seja aquarelado, mas uma coisa que acho muito importante, é trabalhar forte na paleta. Tem que misturar fora, tem que procurar a cor que tu queres ali e ver na tela, no trabalho, testar, ver, não improvisar. Há gente que improvisa na tela, que tenta descobrir botando outra por cima, pega pura, mistura, bota solvente para ver se acha um tom lá na tela. Não! Isso pra mim é imperícia, coisa de iniciante. No ateliê, mesmo que a pessoa vá colocar uma cor do tamanho de um grão de milho, eu digo:
“tem que preparar, tem que
achar essa cor, porque lá no trabalho pode fazer uma diferença grande, pode funcionar bem onde você precisa ou então não funcionar e estragar aquela parte do trabalho”. Então misturar, buscar, amassar, tem que amassar, pegar as tintas e procurar tua cor e depois colocar… Na hora de colocar tem que ser espontâneo, não dá para ficar alisando, sei lá, tem que saber aonde vai colocar. É espontâneo para colocar, mas a cor tem que ser bem examinada procurada, para ocupar aquele lugar… Apotheke: Você prepara toda a paleta? Vou procurando cor por cor… depois limpo. Outro procedimento que eu faço, geralmente eu não vou somando misturas na paleta. Faço uma área que trabalhei, bom agora eu quero trocar, tem que .145. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
entrar com outra cor, aí eu limpo a paleta e começo de novo. Nesse sentido, sou bem organizado, não sujo nada, não sujo o chão, não sujo as mãos, não sujo a roupa, não sujo nada e, às vezes, trabalho na pintura, na tela com rodo de serigrafia, botando muita tinta. Um outro problema que acontece, via de regra, principalmente com quem não tem maior tempo de estrada, é começar botando as cores a volta da paleta, começar a pintar e na sequência, trazer tudo para a mistura. Quando você vê, o trabalho perdeu o contraste, fica tudo parecido, porque vai tudo para um bolo uniforme. Então, uma estratégia boa para quem está começando, que eu falo para os meus alunos é o seguinte: “pára aí, tu limpa essa paleta, tu botou um ocre, agora tu trocas, quer botar um vermelho mais escurinho, um vermelho um pouquinho mais rosa, não bota no ocre, faz separado… prepara o vermelho agora aqui, por partes”. A gente vê muito isso na gurizada, às vezes usam um prato para misturar e fica pior ainda. Não tenho nada contra prato, às vezes uso um para preparar o guache, mas mesmo assim, limpo, organizo, enxugo, limpo parte do guache com papel, tiro fora. Apotheke: Quantas paletas você tem? Eu na verdade tenho uma paleta que um amigo me deu e que é de vidro… é uma placa de vidro grosso, tem um tamanho tipo A3, num canto da mesa, cavalete aqui, a paleta ali, as tintas por ali, solvente, e aqui pincéis. Ele me deu esse vidro, um meio centímetro e ainda desquinou. Aí no vidro eu misturo, raspo; aguenta muito bem solvente e tudo. Eu já tive paleta de madeira que durou um bom tempo, depois ganhei uma paleta de acrílico, não durou nada, porque o solvente destrói o acrílico que em seguida começa a rachar. E essa de vidro está sendo ótima! Dura um tempão, porque eu raspo, misturo, amasso, limpo as tintas, passo solvente e o vidro aguenta… A minha primeira paleta, que usei muito tempo, era daquelas tradicionais, não aquela oval… uma outra que é meio quadrada, só arredondada nos cantos com uma abertura para colocar o dedo. Mas eu nunca segurei paleta na mão, ponho na mesa perto da tela. Bem, eu dizia então que não fazer miscelânea de tintas é uma coisa boa, sabe porquê? Porque você aprende, você precisa aprender
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desde os contrastes mais amplos até as sutilezas. Com pintura, com a cor você tem que cuidar isso, tem que se educar para isso, tem que ser atento, tem que ver a riqueza da sutileza, para não embolar tudo numa coisa. Geralmente quem faz isso, acaba fazendo trabalhos parecidos um do outro, tudo meio parecido e com pouco contraste… porque vai embolando tudo. Apotheke: Há objetos específicos no ateliê que têm um significado importante para você? Esta pergunta nunca me fizeram, é a primeira vez… Bem, tem o equipamento de trabalho que é muito importante, tem os cavaletes, as mesas dos alunos, coisas importantes. Temos um grupo de objetos meio velhos guardados em cima do armário, está cheio de objetos que, às vezes, o pessoal pega para desenhar ou para pintar alguma natureza morta, dependendo do interesse de cada um dos alunos. Tem uma mesa que é um objeto muito importante, para juntar o pessoal e tomar café, com bancos mais altos ou então o pessoal traz o banco que está usando diante do cavalete. Acho que são esses objetos. Fontes de luz especiais, não temos. No meu ateliê em casa… o que é especial para mim, bom… tem o meu cavalete, a luminária, uma luminária bem em cima da tela para trabalhar à noite, focada só na pintura. Ali, tenho as coisas no lugar, a mesa, as tintas, os objetos, às vezes tem livros ao lado. O importante é que estejam do jeito que eu deixei… Apotheke: Você ainda usa chapéu? Uso, para pintar uso chapéu sim, porque faz uma sombra nos olhos. E com a lâmpada em cima então me ajuda a visualizar melhor o trabalho. Uso muito chapéu, na rua, por tudo, quando tem sol… eu sou um colono que cresceu usando chapéu, eu gosto muito de chapéu. Apotheke:
E quando você está pensando no teu trabalho, é mais
dentro do ateliê mesmo? E você costuma pintar em pé? A construção do meu trabalho é no meu ateliê sempre. Às vezes .147. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
as ideias que eu tenho, o que eu estou pensando, olhando no meu trabalho, vem de fora, vem no ateliê da universidade. Às vezes, estou ali olhando coisas… vou começar a mexer com uma coisa assim, vou pegar um material, vou mexer com guache, mas vou fazer sempre no meu ateliê à noite, quieto, lá comigo no ateliê da casa. Trabalho sempre em pé, desenho sempre em pé, tanto os projetos quanto a pintura… nunca desenho sentado, nem pinto sentado. O que está começando a pesar, porque está ficando mais difícil agora que eu estou ficando mais velho. Apotheke: E os títulos, como surgem? Eu geralmente trabalho a partir de uma motivação, de uma necessidade, de um desejo, de algo que eu quero fazer. Não coloco os títulos a priori, eu trabalho uma série e depois coloco os títulos; poderia até não colocar, mas coloco porque acho que é um link interessante para quem vai ver, é uma sugestão interessante, às vezes. Eu trouxe o cartaz do 'Tempo de Outono - as sereias de Kafka'. A exposição com esse grupo são trabalhos mais recentes, as gordinhas, e eu nunca tinha feito figuras assim mais gordas, mais vistosas. Até teve um pessoal que disse:
“Ô Alphonsus, agora eu
estou me sentindo representada no teu trabalho”. Essas mulheres, que tem alguns atributos mais eróticos na minha pintura… algumas situações, e juntar isso. Aí entrou um pouco essa questão do 'Tempo de Outono' e aquilo que eu contei das 'sereias do Kafka', as sereias que não cantam. Aí cada uma delas tem um título, eu coloquei títulos que fazem provocações com o mundo de hoje, com lugares de hoje, com o tempo mitológico, com o tempo de Kafka, com as histórias de Franz Kafka mesmo, um cruzamento de coisas... quem vê, presta atenção ou conhece, vai de repente dizer: “Bah, mas tem coisa interessante de repente por aqui nessa sugestão!”
Apotheke: Tem algum lugar no seu ateliê que você observa seu cavalete, que você gosta de ficar, uma mesa, uma cadeira que você gosta de olhar? .148. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Às vezes, eu tenho uma poltrona onde sento um pouco para dar uma olhada. Depois de um certo momento que eu estou pintando, não é muito distante, dou uma olhada com a luz só lá no cavalete, e também em pé, quando entro, quando saio. Gosto de ver de perto e de longe; quando é muito perto tenho que pôr óculos, então, essa foi uma dificuldade que apareceu mais recentemente, antes eu enxergava “tri-bem” tudo e, agora, para ver de perto, para misturar tinta ou para checar o que está acontecendo bem pertinho na tela, tenho que botar óculos. Em geral eu pinto sem, sabe, mas para conferir tenho que botar os óculos. Mas tem lugares para olhar assim “do caminho”. Acho bem importante que existam. Apotheke: Você tem assistentes, já trabalhou com assistentes? Nunca… Apotheke: Já trabahou com outro artista? Nunca… nunca… Apotheke: Como artista você tem um lema ou um credo? Um lema… deixa eu me lembrar…. Eu tenho no meu ateliê escrito num cartãozinho pequeno, fixado na parede onde eu pinto, um pequeno texto que é do Boris Pasternack: “Alerta artista, alerta, não te entregues ao sono És prisioneiro do tempo e refém da eternidade”
Ele usa dois termos fortes: prisioneiro e refém… Não te entregues ao sono.... Acho que realmente é isso, é uma coisa boa, interessante e isso de certa maneira retira muito do glamour que as pessoas acham que existe. Um outro ponto que esse lema traz, esta frase do Pasternack é que, diferentemente de outras ações que o pessoal faz hoje… o pintor não tem opções, quem é verdadeiramente pintor é obrigado a pintar, não dá para chutar o
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balde e sair fazendo qualquer coisa… Acho que é por isso que eu gosto da fala do Pasternack…
Apotheke:: E que conselho você daria para um jovem artista, alguém que está começando?
Barbaridade… DESISTA! (risadas) Estou brincando! Estou brincando… O conselho é o seguinte: a gente precisa continuar pintando… a pintura para mim é muito valiosa… tem que continuar. Primeira coisa: é preciso trabalhar bastante, levar a coisa muito a sério, muito, muito a sério… ser humilde, não falsamente humilde, mas ser humilde, manter-se humilde. Não dá para ficar fazendo exibições de ego no campo da arte. Um artista sério não pode fazer isso. Pode ser uma pessoa extremamente simples, humilde, não precisa de frescura nenhuma, tem que trabalhar seriamente. Acho que o que conta mesmo é o trabalho da pessoa, tanto assim que o artista, às vezes, pode não ser uma pessoa interessante, mas a obra é que é interessante, então tem que ser muito sério, trabalhar, de preferência buscar ser metódico, no sentido de não abandonar, não deixar esfriar, não deixar cair. Acontece com todo mundo, se você interrompe por um tempo, quando volta, você perdeu terreno. É um pouco Sísifo quando abandona a pedra rolada montanha acima, a pedra rola para baixo, tem que buscar de novo. Esse mito de Sísifo serve bem para o artista. Fundamental isso, fazer aquilo que a gente gosta, ter paixão por aquilo que você gosta. A arte, a pintura é uma paixão; engana-se quem diz que ela é uma necessidade. Não! Ela não é uma necessidade, ela é um desejo, é uma paixão. Ela te faz um afago de vez em quando, depois de muito trabalho e acho que os jovens têm que ir nesse sentido, acho muito importante que sejam persistentes, mas isso está muito difícil hoje. Que trabalhem bastante, que se concentrem, isto também está muito difícil… porque talento eles têm mais do que a minha geração e mais do que meus avós e meus pais. Como dizia o Hans Hoffmam sobre os jovens de hoje: “A geracão de novos artistas americanos tem muito mais talento do que aqueles da minha geração, mas o que falta para esta geração é paixão; nós não tínhamos o talento deles…” mas… é com .150. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
paixão que se resolve, o jovem precisa fazer isso, mas está muito difícil no mundo de hoje, porque há uma série de outros elementos que chamam muito a atenção, desviam a atenção. Você tem todas as mídias eletrônicas o dia inteiro conectadas que descentram, que não concentram as pessoas, é necessário atender tudo, um excesso de estímulos e informações. Você tem milhares de amigos, só que são todos virtuais e se precisar ninguém levanta peso pra você. São amigos que te abandonam num clic, então é difícil. O contexto de hoje é muito difícil! É preciso ter paixão e não abandonar a situação. Acreditar e ser humilde. Acho que ser arrogante de jeito nenhum, eu acho que em arte ninguém tem o direito de ser arrogante, por mais maravilhoso e genial que seja.
.151. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
participações Pintura: esta jovem bisavó de Java Alphonsus Benetti (UFSM) Quando este tema me foi proposto, pensei durante algum tempo em não aceitar; afinal, como pintor, não tenho dúvida de que a pintura falada não é a pintura e tampouco
sua pedagogia falada
seria a pedagogia da pintura. Isso, de certo modo, tem posto a salvo os pintores e suas obras no âmbito de uma modalidade expressiva tão questionada (e, por vezes, atacada) ao longo dos últimos
tempos.
Contudo,
refletindo
melhor,
pareceu-me
interessante a oportunidade de poder abordar algumas questões relacionadas à pintura em nosso tempo e, caso isso não se mostre possível, declarar quais são alguns dos meus sentimentos em relação a essas questões. Pode-se ver, de início, que a tarefa não é fácil, até porque se tornou bastante incomum confiar em pintores para se desincumbirem dela com a adequada propriedade. Não bastasse isso, o cenário que se apresenta é, de fato, ainda mais complexo, porque, segundo Tarkovski (enquanto esculpia o tempo), à diferença da ciência, “a arte não raciocina em termos lógicos... é impossível convencer qualquer pessoa de que você está certo, caso as imagens a tenham deixado indiferente”. Portanto, a questão parece situar-se, no caso, na força da imagem numa espécie de potência de que ela pode ser portadora. E a criação de imagens potentes, no âmbito de uma materialidade específica, pode ser um dos melhores aportes da pintura. A partir deste ponto, gostaria de me permitir algumas pequenas incursões sobre a pintura e suas questionadas amarras no contexto da arte em determinados momentos, declarando-me, antes de tudo, pintor, portanto implicado e parcial. Desde que a pintura passou a nos referir e, ao mesmo tempo,se auto-referir
(como, por
exemplo, a partir de Manet), ao falar e se identificar como autora da fala, não mais deixou de ser contestada. Isso exigiu que a pintura, em cada momento subsequente, provasse a sua legitimidade e abriu caminho a
toda uma era, na qual a ela, outrora senhora de .152.
ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
si, que contribuíra inclusive com a ópera, com a fotografia, com o teatro, com o próprio cinema, não se dará trégua. Da Igreja como imagem sacra (como em Giotto) diante da qual se ia rezar, já não são poucos aqueles que na pós-modernidade gostariam de confiná-la numa pobre casa de tolerância e que atendesse pelo codinome de Geni. Há mais de meio século, Herbert Read foi convidado para pronunciar as conferências Charles Eliot Norton na Universidade de Harvard. Ao evento, ele se dedicou durante oito meses, resultando desta
tarefa um pequeno livro, “Imagem e Ideia”, que neste
momento eu gostaria de lembrar e, pouco importando o ambiente atual, dizer que se trata de uma obra seminal. Partindo de algumas abordagens de C. Fiedler e E. Cassirer, desenvolve a tese de que a imagem precede à ideia no início e no processo de construção da civilização humana. Penso que esta premissa deveria continuar sendo, a priori, cara aos artistas e irrenunciável aos pintores. Sem pôr em dúvida uma espécie de “igualdade” entre as formas simbólicas do discorrer, Read entende que se deve estabelecer o direito de prioridade histórica aos símbolos da arte. “Manejamos as
ideias
mediante
a
lógica
e
o
método
científico,
mas
as
apreendemos”, diz o autor, "na contemplação das imagens”. Contudo, este cenário foi sendo paulatinamente estiolado por um tipo especial de estiagem progressiva, abrindo-se, por fim, de maneira mais abrupta ao ambiente do capitalismo tardio. Nele, por várias razões, procurou se solapar, uma a uma, as diversas estruturas de edificação das artes plásticas: a fabricação, a expectativa de permanência, a autoria, a legitimação da obra e a própria imagem. Na decorrente mixórdia enaltecida, o meio se tornou volátil e muito bem nutrido pela descartabilidade. Nesse contexto de propalado fim de algumas grandes narrativas, a pintura consegue ainda se manter (à deriva?) graças ao bom deus do mar da diversidade. Após a exaustão do conceitualismo histórico na década de 1970, à “nulla” de seu ápice, o revival de algumas tendências hoje agrupadas sob o manto genérico de um conceitual, na realidade repõe ou acaba, involuntariamente, repondo questões centrais .153. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
àquele
movimento
sem,
no
entanto,
arriscar-se
àquela
radicalidade. Não há como deixar de perceber que, em essência, a realização máxima do conceito implica a concretização mínima da imagem. (Coeficiente máximo de conceito seria igual ao coeficiente mínimo de imagem). Nesse ponto (no plantão da vez aconselha-se) a pintura deve sustentar-se por outros/novos conceitos. Porém, abdicando às suas especificidades, até quando ela será legítima e terá alguma função como tal? Por este grande viés, em consequência, seria imprudente desvincular
a
pós-modernidade
da
modernidade.
De
fato,
a
contemporaneidade pós-moderna parece estar cumprindo com inegável eficiência aquela estética negativa que, nas palavras de Teixeira Coelho,“marcou o século XX”, fazendo a arte mergulhar no “vórtice cultural do desmanche”. Ainda segundo este autor, “boa parte da arte contemporânea, da arte de vanguarda vista em bienais e que, corporativamente, usa esse rótulo como indicativo de estilo ou movimento - quando é mera datação – foi e tem sido fascinada pela ideia de destruição e, mais ainda, pela busca de autoaniquilação”. Neste mesmo sentido, Argan realiza uma das mais profundas abordagens do cenário em “Projeto e Destino”. Uma das questões centrais que ele vai levantar é por que a arte, “senhora de seus meios”, a partir de determinado momento passa a questionar a própria artisticidade para, ato contínuo, propor-se pela dimensão negativa e, na sequência, encampar o referido autoaniquilamento. Em Argan, todo este “affaire” será analisado num contexto novo, no qual pontifica, fruto do casamento da ciência com a revolução industrial, uma herdeira vistosa chamada tecnologia (com seu conhecido amante e hoje senhor, muito melhorado pelas plásticas da globalização do mercado: o poder econômico). Uma das mais sérias repercussões do processo tecnológico, em nosso caso, diz respeito exatamente aos seu produtos. A tecnologia, em última instância, não mais produz objetos, mas, de fato, imagens e este fenômeno tem trazido decisivas consequências à arte em geral e à pintura em particular. Disso também nos havia alertado Argan. O fenômeno, na visão de Ítalo Calvino (Seis Propostas para o Próximo Milênio), é o responsável pela transformação do mundo em uma espécie de imensa lixeira de imagens, onde se torna cada vez .154. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
mais improvável que alguma delas adquira relevo, diga-se, de qualidade. Nesse caos, tende-se a operar mais por acaso, e o critério, novamente, é a descartabilidade. E um parênteses: parece ironia do destino ou vingança dos deuses o fato de estarmos, de certa forma, condenados a saber identificar as obras de qualidade, mas descrentes, há algum tempo, em utilizá-las como referências, numa espécie de estranha distorção do mito de Cassandra. Aqueles elencos de obras-primas da literatura ocidental, elaborados por autores,
críticos,
estudiosos
e
intelectuais,
tidos
como
referências de qualidade se, paralelamente, fossem elencados às artes plásticas, seriam rejeitados pelos mais variados motivos. Com a referida estética negativa, muitos se esforçaram “honestamente” para que as artes mergulhassem na lixeira das imagens e alguns realizaram, nesse sentido, um esforço adicional em relação à pintura. Esforço que, com o passar do tempo, tem se mostrado, no mínimo, insuficiente. Destruídos os limites, usurpada a
criação
em
nome
da
invenção,
da
novidade
e
mil
outros
estratagemas, a área se abre ao risco da indiferenciação, restando como salvaguardas móveis os conceitos. Convenhamos, como dizem os economistas, não será emitindo moeda sem lastro que salvaremos a economia (arte). Também, não há como deixar de constatar que nos certames atuais de arte se descartam, via de regra, linguagens de longo percurso, mesmo que possuam evidente qualidade, e se aceita toda e qualquer obra com feitios de contemporaneidade como portadora de qualidades tácitas. Assim, questões como as propostas por Rafael Cardoso, relacionadas à existência de fato, de um público
para
a
arte
contemporânea,
se
ela
não
estaria
ultrapassada, se ela não seria cada vez menos atual, procedem. O autor acrescenta ainda uma questão que parece não ser percebida: o porquê de apenas uma parte restrita da arte que se faz hoje ser abrigada sob o manto do contemporâneo,“como se deixassem de ser contemporâneas obras que não compartilham dos mesmos pressupostos conceituais”. É claro que a reflexão crítica e a análise
pertinente
da
obra
de
arte
qualificam
nosso
olhar,
enriquecem nossa visão, nos fazem ver melhor complexas riquezas e contribuem ao desenvolvimento das futuras obras. Porém, diante da .155. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
reificação mefistofélica dos conceitos é preciso ter cuidado, é preciso salvar o anjo. Como diz Ferreira Gullar: “demônio não tem afeto, é só cérebro. Arte não, tem alguma coisa de anjo”. E o mestre uruguaio Pareja, em carta a Silvestre Peciar, referindo-se ao estudo, à análise de todos os porquês do processo de criação, em última instância, “cuidar para não matar o anjo”. Bem, a priori é necessário que se reafirme a crença na pintura, na sua condição vigente de nos significar, se não aos artistas e à comunidade,
pelo
menos
aos
pintores.
E
aqui
um
elemento
importante: sem qualquer pretensão ao religioso ou ao romântico exacerbado, parece-me que pintar, mais do que nunca, se trata de uma questão de paixão e fé. Tarkovski, por exemplo, alarga essa visão ao declarar que um artista que não tenha fé “é como um pintor que houvesse nascido cego”. Por seu turno, ao pintor torna-se muito difícil, por vezes impossível, renunciar (como parece exigir-se hoje) a um tipo de comprometimento interior, psicológico, que o vincula de maneira inexorável à pintura. Seu desejo, ao qual não consegue fugir, é o desejo dos pigmentos, das matérias coloridas plasmando formas, das transparências e das texturas. Da inaceitabilidade do fim do sonho das tintas vinculadas a preponderantes e necessárias abordagens espaciais. Bem diferente do performático, do interventor, do instalador,
cuja
atividade
fundamental
parece-me
ser,
claramente, de signo oposto. Uma atitude que é fruto de uma espécie de sensibilidade nômade (para não dizer, com outro grau de comprometimento), que se prende em “suportes” eventuais à medida que satisfaçam prévias conceitualizações. De qualquer maneira, a pintura, atualmente e no futuro depende e dependerá muito mais dos pintores
e
menos
dos
teóricos,
analistas
e
curadores
da
contemporaneidade pós-moderna. Diante da avassaladora vitalidade de determinadas obras pictóricas, não há como ignorá-las, negarlhes a capacidade de sedução e envolvimento. Não raro, no caso, deparamo-nos com críticas que tecem longas digressões filosóficoconceituais, às vezes, hiperbólicas e confusas, que acabam por dissimular um simples fato: já, ao primeiro contato, “sucumbiram” diante da obra. .156. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Alphonsus Benetti; Com ďŹ&#x201A;ores no cabelo, 2003
Alphonsus Benetti; As Musas Inquietantes, 2006
.157. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Alphonsus Benetti; Via Sacra, 1996
Alphonsus Benetti; Sem tĂtulo, 1991
Alphonsus Benetti; Anche Lui va a Ornesa, 2005
.158. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Da necessidade de que a pintura prove em cada momento a sua legitimidade advém, segundo vejo, muito da sua vitalidade e permanência. Ou seja, aposto em quem tem evidenciado capacidade para enfrentar o “fogo cerrado”. E, claro, não estou só. Peter Greenaway nos aconselha a não perdermos de vista esta linguagem pois, segundo ele, o maior desenvolvimento do ponto de vista intelectual e filosófico virá sempre ( e ele repete o “sempre”) da pintura. “É na pintura figurativa como a de Lucian Freud que está o real perfil da arte dos últimos trinta anos”, sublinha Teixeira Coelho (contemporâneo: sacar do passado de toda a linhagem do Realismo, Nova Objetividade, para fazer arte do presente). Contemporâneo e pós-moderno: não só por retomar a figura, a perspectiva, mas insistir na narrativa que pode incomodar numa “época de sensações em monobloco, opacas e autossolúveis no instante da percepção”. Na realidade a pintura é, por excelência, uma daquelas linguagens que denomino de longo percurso. Quando o homem do paleolítico superior criou na parede da caverna as suas primeiras imagens, foram
lançados
os
componentes
essenciais
desta
modalidade
expressiva ao par de sua avassaladora capacidade de envolvimento e sedução. Daquele extraordinário encantamento inicial até hoje, suspeito muitas vezes que ela, a pintura, tenha se transformado nessa
espécie
desaparecimento,
de em
arquétipo
humano.
termos
especificidade,
de
Seu
hipotético no
mínimo
silenciaria a voz de muitos e empobreceria o olhar de tantos outros. Para Anselm Kiefer e sua pintura pós-Auschwitz: "a pintura não precisa respeitar nada. (...) A paleta é veículo e símbolo de esperança. A obsessão do pintor torna compreensíveis a ressurreição e o ressurgimento”. Também me parece necessário acrescentar que se o estatuto da arte
ainda
não
tiver
encerrado
seu
longo
percurso
de
referenciamento da civilização humana e nele (estatuto) a pintura continuar se mantendo como modalidade plástica muito vigente, será, com certeza, mais pelas suas especificidades, pelo que lhe é absolutamente peculiar como pintura, do que por quaisquer outros fatores. Especificidades que, repito, já estavam presentes quando do seu ancestral surgimento nas paredes das cavernas: vitalidade, revelação, fascínio. .159. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Seminar Abstract Expressionism: the language of emotions Marco Gianotti1 Good afternoon, Before I start my lecture I would like to thank Farida Zaletilo and Asnate Silina from the Mark Rothko Art Centre and also David Anfam who kindly introduce me into this new world. Summary From Goethe to Rothko: new ways of perceiving and creating through color. Rothko's real genius was that out of color he had created a language of feeling. Motherwell
Goethe's Farbenlehre [(1810) translated by Eastlake as “Doctrine of Color"] is a starting point for dealing with color not only in a physical, but also in a physiological way. The impact of such an approach goes beyond Impressionism and even Abstract Expressionism. Mark Rothko is one the painters in 20th century who really managed to create a new conception of space in painting (ho topos) through color. His influence may be felt in painters throughout the world. Unfortunately this conception is often misread by those who consider color to be a decorative element. Abstraction nowadays is rarely viewed as a spiritual or a subjective experience but rather as an exterior sign, especially after Pop art. ¹Marco Giannotti é pintor, professor Associado da Escola de Comunicação e Artes da USP. Formou-se em Ciências Sociais na USP, e realizou suas exposições individuais nas principais galerias e museus de São Paulo e Rio de Janeiro. Defendeu seu mestrado em filosofia com a tradução e introdução crítica da Doutrina das Cores, de Goethe (1749 - 1832). Participou de duas versões da Bienal do Mercosul e do Arte Cidade, e de algumas exposições coletivas internacionais. Defendeu sua tese de livre-docência intitulada A sombra da Imagem. Forma o grupo de pesquisa sobre a cor no departamento de artes plásticas da USP. Convidado em 2011 para ser professor visitante durante o ano letivo na Universidade de Estudos Estrangeiros de Kioto, publica o livro Diário de Kioto pela Martins Fontes com apoio da embaixada do Brasil em Tóquio. Recentemente realizou uma exposição no Instituto Tomie Ohtake e na Galeria Raquel Arnaud.marcog@usp.br
.160. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
I. Goethe's Farbenlehre or Doctrine of [C]olors 1810 Let us take as a starting point the Doctrine of Colors by Goethe, a result of his 20 years of intense research. This book was partially translated into Portuguese in my master's thesis conducted in 1993. Although this work was much criticized when published in 1810, it became in the twentieth century increasingly recognized throughout the world. At the end of the nineteenth century, studies in human physiology showed that the color is not just an external and objective physical phenomenon, but also something physiological, i.e., the product of the interaction between our retina and the brain.2 After a trip to Italy in 1786, where he was enchanted by the colorfulness present in Italian painting as well as in the Mediterranean climate, the young Goethe borrowed prisms in order to begin the study of color. The same impulse toward classical world motivated Rothko: in the spring of 1950 he traveled to Italy and was enchanted by classical architecture and Fra Angelico's paintings.3 From ancient times it was believed that white light was indivisible, so that the colors appeared only when light interacted with shadow (Skieron) or absence of light. Newton ďŹ rst challenged this view by demonstrating that white light can be decomposed into rays that are perceived as different colors according to the degree of refraction. Thus, there was a total reversal in the interpretation of colors: what had been thought to be simple (the light) is understood as multiple. Newton in the Experimentum crucis (1666) demonstrates how color is born from the refraction of white light in a prism. Newton proves that the white light can be decomposed in different chromatic rays. But this experiment could be done only in a dark room: instead of observing the phenomena of nature outdoors, Newton builds an apparatus by which he can control the appearance of the color phenomenon. Although he tried objectively to determine the chromatic phenomenon from its degree of refraction, he never questioned the fact that the colors appear in the eye subjectively. Goethe challenges such physical interpretation of color by looking directly through the prisms. He is therefore against a mechanical interpretation of color. 2
ELIE. M, Lumière, Couleurs et Nature, Vrin, p. 39
3
ASHTON, Dore. About Rothko, Da Capo Press, New York, p. 129. Motherwell above quote, p.138
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One day, while casually looking towards a white wall through a prism, not seeing any color, immediately Goethe assured himself that Newton's theory was wrong. The idea that white light was composed of darker lights, or even by rays, seemed so absurd that he never questioned the indivisibility of light. He was interested in the necessary conditions for the phenomenon of color to manifest. For him, not just color comes from the light, but it appears in the shade. Goethe says that the color itself is something "shady" (ein Schattiges). The degree of opacity is indicating the amount of light and shade for each particular color: a darkened yellow light excites the eye, while the darkness when bleached, produces blue. The colors are essentially opposed and contain themselves an action (light) and passion (shadow). The different proportion of light and dark distinguishes one color from another. Blue is the most negative color because it contains more shade; yellow is the most positive, since it is the closest to the color of the light. Goethe states that colors exist only insofar as they are produced by our retina, which plays an active role in the production of color: colors are made on the "eye and for the eye." Therefore, against Newton, Goethe argued that white light couldn't be decomposed, so that colors appear only when light interacts with shade (Skieron).
Let us now compare Goethe's interpretation with Rothko's use of color: I use colors that have already been experienced through the light of a day and through the states of mind of the total man. In other words, my colors are not colors that are laboratory tools which are isolated from all accidentals or impurities so that they have a speciďŹ ed identity or purity4.
4
ROTHKO apud ANFAM, Rothko CataloguĂŠ RaisonnĂŠ, Yale Press, p.81
.162. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Rothko's affinities with dark studios, exhibition spaces and paintings is also well known:
- Dore Ashton about his studio in 1959:"He had no lights on, and the great space was dim as a cathedral".5
But it is in the darkness that the light really appears: Mehr Licht (more light) says Goethe before dying, or as Rothko once claimed: "It's light that I am after".6 Any painter whose obsession is light must needs to drawn to shadow."7 According to Goethe there are three manifestations of color. Firstly "as it belongs to the eye and depending on the capacity to act and to react. Secondly, "through colored mediums or with their aid. Finally, when we think of them as part of the object. We call the first physiological, the second, physical and the third, chemical. The former are constantly fleeting, the second are transient, of certain permanence. The latter have a long duration. What distinguishes a chromatic phenomenon from another is its permanence in sight.8 It is the activity of the retina that distinguishes the chromatic phenomenon. Colors are actions (tat) and passions of light (leiden). If the activity of the retina is larger, there is subjective color (physiological); if it suffers an external stimulus for longer, its action is smaller, and the colors are considered
more
objective
(chemical).
The
subjective
or
physiological colors are the most important of the Doctrine and
5
BRESLIN, James. Mark Rothko, a Biography, Chicago Press, p.3. ASHTON, idem, p.137, 155.-Where there is a plane in his works of 1950s there is a shadow. In each case there would be an underpainting meant to be sensed as shadow, and an oscillating surface meant to be sensed as light. ROTHKO, Idem, 412 Motherwell described Rothko's studio for the Seagram series as a "darkened movie set".-The Rothko's retrospective exhibition at the Whitechapel: paintings have their own light in darkness. Idem, ASHTON, p.188 The dark, he said with unitentional symbolism, is always at the top.ROTHKO apud ANFAM, p.88- Often towards nightfall, there is a feeling in the air of mystery, threat and frustration, all at once. I would like my paintings to have the quality of such moments. 6
Idem, p.86
7
ANFAM, Op.cit, p.87
8
Rothko listed three headings related to color: its objective or subjective, its decorative use, and it's sensuous one. BRESLIN, 1993 588, n.42
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the starting point for the analysis and understanding of all the resulting colors:
Impalpable transient colors that we see behind our eyelids when we close our eyes.9
The divergence of Goethe against Newton is thus not a trivial dispute;
it
involves
an
entire
controversy
between
German
idealism and Newtonian physicists. Actually, what was behind this dissent
is
the
clash
of
two
completely
different
ways
of
interpreting nature. German idealism refuses the mechanistic viewpoint, since both nature and art derive from the idea of organism, with an internal purpose. But although Newton tried objectively to determine the chromatic phenomenon from its degree of refraction, he never questioned the fact that the colors had a subjective dimension. If this controversy has become irrelevant for physics, it opens a new perspective for the interpretation of colors. Therefore, the original controversy becomes meaningless since we do not need any more a single criterion for identifying colors: the physical concept of light refraction does not necessarily
preclude
physiological
the
phenomenon.
interpretation When
judging
of
color
as
a
the
color
as
a
physiological phenomenon Goethe was criticized for years by scientists
who
relied
on
Newton.
However,
studies
on
the
physiology of vision, on the rods and cones, evidence the instability of our perception, so that the color as experienced is refers to a sensation, not an object. In 1855, Hermann Helmholtz declared that we never perceive external objects directly; instead, we perceive only their effects on our nervous system. At that point some painters began to deal with the chromatic
9
HIROMOTO, Noboyuki apud Anfam, Rothko- catalogue raisonnĂŠ, Yale University press, 1998, p. 11
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phenomenon as independent of the spatiality constructed by linear perspective.
Rothko
in
his
text
Generalization
since
the
Renaissance has stated that:
It is not difďŹ cult to see why the Florentine artist must have sensed very deeply the inadequacy of pictorial representation with the use of linear perspective alone. It left him without the presence of the sensual element, which he knew from his experience, was a sine qua non for artistic achievement. Now the use of color for its own sensual ends as well as for its structural end had greatly deteriorated since the time of Giotto. Perspective displaced the use of the organic quality of colors, which had previously, in and of themselves, produced the tactile effect of recession and advancement...10
As a teacher he says: The tradition of starting with drawing is an academic notion. We must start with drawing.11
Since 1957, several experiments have shown (especially with Edwin Land) "the existence of "illusions" of color as Goethe's view point, illusions demonstrating a neurological truth - that the colors are not "there" in the world, nor (as maintained the classical theory) an automatic correlative of
wavelength but are
built by the brain. Rothko states: these researches and laws are well known to everyone by now, and we need not go into the explanation here. (Objective impressionism)
If on the one hand the attempt of Goethe in seeking a single general theory to explain the phenomenon is currently impossible, on the other hand, the poet does not fail to take into account the different practices of color, so that this phenomenon appears to a chemist differently to the painter etc. There isn't effectively a single point of view for the study of color.
10
ROTHKO, idem, p. 30, 38, 39
11
BRESLIN, idem, p.133
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However,
the
initial
divisions
between
physiological,
physical and chemical colors in the Goethe's book allow us to think about different chromatic conceptions throughout history. If in the Impressionism dominates the physiological interpretation of color, the interpretation of physical colors help us to understand how modernist painters began to use color as an autonomous element on the surface of the canvas. Finally, the chemical colors helps us to understand the return to using pure pigments in the work of art of artists like Yves Klein and Hélio Oiticica in the sixties. Color is a complex phenomenon that occurs in a variety of spatial situations. How much do we really know about the colors: do they not vary according to the way they present themselves in space? In modern (and especially contemporary) art, it is very common that the works of art demand the temporal experience of the observer himself:
Of all the theories of aesthetics, the one that appealed most to Rothko's imagination was one that insisted on the reciprocity of artist and viewer, of artist and the world - a theory of empathy that had been favoured since the 19th century.12
The processes of perception and use of color does not occur in a fixed mode, but bring with them their own marks of different epochs and cultural backgrounds. The color is thus a language, and as such, requires learning and reflection. Color creates a universe of different fields interconnected. The observations that arise from artistic practice cannot be reduced to a school textbook, especially in an era where the transmission of the secrets of the old masters becomes rarefied. However, each artistic language discussed here reveals a choice, an attitude of the artist toward the world, where the use of certain materials gives the color a single direction. It is very difficult to conceive the chromatic phenomena without focusing on the particular practice of each artist. However, the way of using colors is also related to an aesthetic movement of a distinct period. At the end of the nineteenth century, the introduction of
12
ASHTON, idem, p.78, 103.
.166. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
chemical dyes produced a huge transformation in the painter's palette, which increasingly contains artificial colors. In modern art, the pictorial material becomes significant, and the choice of certain techniques is already an expressive act. The colors applied in painting distance themselves increasingly from perceived things. If there is no longer an exterior measure as mimesis to guide practice, how to find new rules for color? Color charts are very popular as an introduction to color. In fact, they are fascinating at first sight, but soon after the immediate impact, we feel an emptiness contained behind such beautiful hues. On the one hand, they intend to be "objective" insofar as they are calculated 'scientifically'; on the other hand, they are also sterile. Just compare them with the paintings of Rothko, for example, to note how they are devoid of life. Rothko had a great a great antipathy for this "Bauhaus approach" and as a teacher never used color charts.
13
The search for a more rigorous chromatic composition led some artists to research and practice the chromatic theories such as Goethe's, Chevreul's, Ostwald's. In fact, the early abstract painters have adopted a series of chromatic circles, which allowed them to reflect on the color as a standalone language. The mimetic concept itself cannot be understood any longer as a representation of an external nature, but as a search for certain ideals measures that would reveal a hidden nature, ideal, supreme.
Not surprisingly, the use of this
language was based on symbolism, and that this language has become so hermetic. Ivan Kleiun, in the Suprematist Manifest of 1919 states: "our chromatic compositions are subject only to chromatic laws and not the laws of nature." The great color masters of the 20th century like Matisse, Albers and Rothko never used charts as an end; color was always achieved with practice. But the idea that space can be created through color and therefore that the form must be as simple as possible: as a
13
ASHTON, idem, p.131. GAGE, op. cit, 251.
.167. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
primordial
structure.
14
That
relationship between things
15
is
why
Matisse
painted
the
and that Rothko considered the
measures more important than color. Color as a language of emotions
cannot
be
done
alone
theoretically,
but
through
practice, creating works of art. In Rothko's paintings "the optical effects of simultaneous contrast are inhibited by the softening of color boundaries or by the introduction of an intermediate buffer between the tones."16 II. Mark Rothko: color and technique and the language of emotions "It is very difďŹ cult to say anything about Rothko's paintings", as Cristopher Rothko says in the introduction of his father's manuscripts, The Artists Reality: His works communicates on a level that is explicitly preverbal. The dramatic and emotional potential of different colored light, degrees of light and dark and the contrast between highlight and deep shadow, evoke a mood before even a word is spoken or any action is introduced.17 Mark Rothko
In my approach to Rothko I will try to show how color for him is a language of emotions precisely insofar as he develops a unique technique for dealing with color. The interpretation of the color phenomenon is dependent upon a particular practice:
besides oil, Rothko uses tempera to
ensure the presence of pure pigment, color appears to detach from this ďŹ ne dust and begins to dwell in the space. A yellow painted with tempera is radically different from the same pigment used in
14
Rosalind Krauss says something very interesting about the grid as a structure: ' I do not think it is an exaggeration to say that behind every twentieth century grid there lies - like a trauma that must be repressed - a symbolist window parading in the guise of a treatise on optics. KRAUSS, R. The originality of the avant-garde and other modernist myths, MIT press, 1986, p.17 15
"Matisse observed 'I don't paint things, I only paint differences between things' ".ASHTON, op.cit, p.114 16
GAGE, J. Rothko: Color as subject, National Gallery of Art catalogue. p. 253
17
ROTHKO, Christopher. Introduction to The artist's reality by mark Rothko. Yale Press, ROTHKO, Mark, idem, II p. 35
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encaustic paint or oil. If we do not think about the interplay between colors and their material environment, we run the risk of dealing
with
color
as
something
mechanical,
an
abstract
relationship, where color "A" relates to color "B". Rothko is worried about technical problems early as a teacher, studying the relationship between medium and technique. In the late forties he was grinding his own pigments.
18
In an interview with Clay Spohn,
Rothko said that a young artist could prepare himself by learning the physical elements of painting, their use and control. On the other hand, in Rothko's biography, Breslin states that he was very secretive in his working methods.19 He began with raw, unprimed canvas, to which he applied a glue size (mixed with powdered pigments, so that... even the glue would go in a color (rabbit skin)... He began adding unbound powdered pigment and whole eggs...he thinned his paints to the point that pigment particles were almost dissociated from the paint film.20 For the Harvard Murals, Rothko used the pigment lithol fast 21
scarlet , which is extremely fugitive, very sensitive to light. Unfortunately the crimson background of the paintings soon disappeared due to a chemical problem. Thus, we could consider that Rothko in a way was dealing with color as chemical colors in Goethe's interpretation as well as physiological, as the artist notes: The wall should be painted "considerably off-white with umber and warmed by a little red...if the walls are too white, they are always fighting against the pictures which turn greenish because of the predominance of red in the pictures"
22
The burning quality was heightened deliberately as Rothko mixed raw pigments into the final surfaces of these canvases.... He had wished to hang his work near the Turner.23
18
BRESLIN, idem, p.134, 245
19
Idem, p.274
20
Idem, p. 316
21
GAGE, J. Rothko: Color as subject, National Gallery of Art catalogue. p. 249
22
Idem. 411
23
ASHTON, p.155
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At the Turner exhibition at the Museum of Modern Art in New York in 1966, Rothko was particularly taken with a painting called Light and Color, Goethe's Theory - The morning after the deluge Moses writing the book of genesis (1843)
24
Surely Rothko's affinity
with Turner, and Turner's affinities with Goethe prompt us to think about a common world-view (weltanshaung). Mark Rothko knew to create subtle relationships between color areas from his practice in watercolor (used extensively by Goethe as well as Turner). Later on exploring other techniques as oil and tempera he explored variations of chromatic fields, suggesting differences in numerous colors and shades, creating an amazing multiplicity of environments and moods. Paint was applied in thin layers to achieve color brightness. Creating subtle changes, sometimes the paint can be seen in an upward motion across the surface, since the artist sometimes altered the position of the canvas in the final stages of labor. Rothko paints on an unprimed canvas, dying the tissue in order create an identity between surface and hue. Color and structure are inseparable in this case; they are combined to create a unique presence. The forms are created exclusively of color fields, whose translucency establishes a depth that complements and enriches enormously the vertical arrangement of the composition. When using oil paint in contrast with tempera, the painter reaches an effect called film perception, a color layer that appears to hover above the other creating a sense of depth due to color refraction. "The adaptation of the eye to twilight vision, from cones to rods, has, like peripheral view, the effect of transforming the appearance of color from the surface to the film mode"
25
Variations in saturation, hue and tone evoke an evasive shallow surface, although palpable: Rothko's thin technique allows darker shapes to read as light and the white to read as a denser substance - some
24
NOVAK, Barbara, DOHERTY, Brian. Rothko's Dark painting: Tragedy and Void , National Gallery of Art catalogue p. 279 Rothko joked, 'This guy Turner, he learnt a lot from me." REID, Norman, apud BRESLIN, idem, note 1., Chapter 18 http://www.tate.org.uk British: Turner/Rothko, 6 March 2009 25
KATZ, 1935, apud GAGE, op.cit, p.262
26
ASHTON, idem, p.141
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He longed that the scale of his paintings involve the viewer, not a grandiloquent way, but in an intimate and human way. His palette began to darken dramatically from the late 1950s. The artist recalls that this phenomenon started in the paintings that had been ordered but never delivered, for the Four Seasons restaurant. He wanted to provoke the same claustrophobia caused by the enclosed facade of the Laurentian Library in Florence, designed by Michelangelo. He sought an oppressive effect, so he used a "dark palette", darker than anything he had used before. All the paintings had an overlay of red, brown and eventually black that can currently be seen at the Tate Modern in London and at the Kawamura Museum in Chiba. The paintings are meticulously planned for architectural space in order to create an environment that surrounds the viewer. Subsequently Rothko created a set of canvas for a chapel in Houston, Texas where he used two basic colors, black and red, with their light variations complacent and subtle, which referred the plum color, or Bordeaux, to prevent the composition from seeming random or mechanical. Houston Chapel paintings demand a temporal and physical process.
27
Proportions should indicate a precise
scale and rhythm, so as to cause an experience of transcending. Dark colors carry a deep emotion, a black light emanating from these plans. Matisse's musicality, symbolism and the use of color as means of expression have been a strong inďŹ&#x201A;uence for Rothko. Like Matisse, Rothko's black is not used for chiaroscuro, but it is considered as color not only as shadow, with its inner light. Rothko insisted that the place should have zenithal light so that the chromatic variations of his paintings could be noted. The daylight enters through the circular opening in the ceiling of the chapel and alters the appearance of the panels. If a cloud passes in the sky, the room darkens, as do the works. The screens begin to absorb the light and fade afterwards. At other times, when the diffused lighting animates the space, the paintings reďŹ&#x201A;ect the light rays, and become brighter. There is an oscillation between 27
BRESLIN, op.cit 479
.171. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
planarity of the pictorial surface and the perceived depth in these planes, which modifies the space surrounded by panels with varying brightness. Beginning in 1964 he made the first studies on panels and used variations of black, purple and red in order to create violet purple, scarlet, crimson, cold black, hot black, dark black, velvety black, deep blacks, bright black. The work started when assistants helped him to stretch the canvas. This was an important task, as any ripples would alter the behavior of light in the final painting. The artist contemplated this white canvas for a long time. He then applied the bottom base, a procedure recommended by the old masters in which heated and melted glue rabbit skin and mixed the dry pigment with a little oil and turpentine, which produces a thin, transparent color layer. His assistants quickly applied dark backgroundsmainly composed of red, or a plum color created by the mixture of black and red - in order to avoid a monotonous effect. Afterwards, the canvases were arranged in a space that was a replica of the chapel. In Rothko's
earlier manuscript space already appears as
something primordial. Space, therefore, is the chief plastic manifestation
of
the
artist's
conception
of
reality.28
His
paintings are not about space but about the experiece of space.29 Is space one of the urphänomen (the primal phenomena) the contact which, as Goethe thought, submerges a man – once he arrives at perceiving them – in a kind of aprehension that can even reach anguish? Because behind space, so it seems, there is nothing...And before it, there is no possible flight to anything else.30 The artist uses color as expression, as drama, and as a spatializing force, so that the viewer loses an analytical point of view. The painter used a daily emulsion of oil and egg, composed of oil paint, whole eggs, dammar resin and turpentine. His technique of overlapping colors, applied with care, made the
28
ROTHKO, idem, p. 59
29
ASHTON, idem, p.135, 172
30
HEIDEGGER,
l'art et l'espace, Erker verlag 1969 apud Ashton, p.191
.172. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
velvety surface. The proportions of the color fields must have precise scale so as to cause an experience of transcending. The environment was created to make light flow from one screen to
the
other
without
obstacles,
without
the
existence
of
superfluous details. The paintings pulsate, as if its inner light emerges from the darkness of a pit or abyss: they resist the imminent extinction.
31
In order too describe this sensation Dore
Ashton recalls an inscription inside a Chapel in Ravenna: Aut lux nata aut capta hic libera regnat
32
(the light is either born here
or, imprisoned, reigns here in freedom). This inscription could be applied to Houston. When, in the summer of 1959, Rothko visited Pompeii, he claimed a 'deep affinity' between his own murals and those in the House of Mysteries with its Dyonisian theatrical allure - the same feeling, the same broad expanses of somber color. At the end of a long afternoon on which he shows the murals to Ashton, Rothko declared: they are not picturesI have made a place.“33
"A place apart, of 'alterity'. It stands as a sanctuary filled with enlighted shadow".34 As a matter of fact Rothko rediscovered the hidden meaning of contemplation: a space for observation marked out by the augur who predicts the future analyzing the swallow's flight in front of the temple.35 Contemplate Con"tem*plate , v. t. [imp. & p. p. {Contemplated} (# or #); p. pr. & vb. n. {Contemplating}.] [L. contemplatus, p. p. of contemplari to contemplate; con- + templum:
31
N RANGEL, Marcela. Article not published, Color Research Group at the University of São Paulo 32
ASCHTON. Dore. About Rothko. New York: Oxford University Press, 1983, p.172.
33
BRESLIN, idem, p.4, ASHTON, idem, p.155
34
ANFAM, OP.CIT, P.96
35
http://en.academic.ru/dic.nsf/cide/38665/Contemplate
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Rothko and Brazilian contemporary painting I intend to discuss how Rothko has influenced and has been interpreted by Brazilian painters from completely different cultural backgrounds. He still is a reference for the new generation, although the commodification of his imagery via Internet and mechanical ways of reproduction sometimes produces a superficial understanding of his work.
.174. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
tradução The Classroom as Studio 1 G. James Daichendt (BU / PLNU) A Sala de Aula como Estúdio Tradução do artista Vinícius de Oliveira Santos2
Hans Hofmann Hans Hofmann (1880-1966) é amplamente reconhecido por sua importante contribuição ao Expressionismo Abstrato em meados do século XX. Este particular movimento norte-americano, comumente referido como New York School, destacou artistas como Jackson Pollock, Willen de Kooning, e Franz Kline, entre outros. Ainda que estilisticamente os artistas envolvidos se diferenciem uns dos outros, o movimento tem na associação da intensidade emocional com a imagem, a origem de seu nome (Daichendt, 2008). Adquirindo sucesso internacional como pintor entre o final da década de 1940 e na década de 1950, Hofmann realizou exibições ao redor do mundo com o advento de sua popularidade como artista. Apesar do sucesso com a crítica como artista, ele é frequentemente lembrado como um grande mentor e professor. Embora muitos artistas do expressionismo abstrato tenham ensinado em algum grau, o comprometimento de Hofmann com o ensino se situa como algo a parte. Seu desenvolvimento e prática de levar o fazer-arte e a experiência artística diretamente à sala de aula é significativamente distinta em seu papel como um artistaprofessor. O envolvimento de Hofmann na arte iniciou quando ainda jovem 1
DAICHENDT, G. James. Artist-Teacher: A Philosophy for Creating and Teaching. Bristol/Chicago, Intellect Ltd, 2010. ISBN 971841503134 2 Vinícius de Oliveira Santos possui graduação em gravura (EBA/UFRJ) e licenciatura em artes visuais (CEART/UDESC). É mestrando na linha de Processos Artísticos Contemporâneos (PPGAV/CEART/UDESC). Atuou na investigação de saberes locais por meio da atuação com educação ambiental e na capacitação de trabalhadores em projetos e programas de gestão social local. Tem como questão de pesquisa a investigação de vocabulários gráficos na exploração de procedimentos desenvolvidos em estúdio, e relacionados aos locais de compartilhamento de conhecimentos. Como docente atua em espaços formais, e em processos não-formalizados de ensino.
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na Alemanha, estudando e seguindo movimentos artísticos como o Secessionismo (um desenvolvimento do Impressionismo), NeoSecessionismo, e Cubismo (Sutherland, 1989). Trabalhando pessoalmente através destes movimentos e filosofias iniciais da Arte Moderna, Hofmann descobriu sua própria perspectiva e sua linguagem moderna. Esta progressão, provavelmente cheia de frustrações e avanços, é a experiência que ele pôde usar para a abertura de novas visões para os artistas que buscavam compreender a linguagem moderna do artista abstrato. Fazer avanços permite ao artista realizar boas obras; refletir sobre isto e articular a descoberta para os alunos faz um grande ensino. Dar suporte à ambas as coisas é difícil o suficiente; combinando e reorganizando iniciativas para torná-las indistintas é um ato criativo que merece ser celebrado e considerado como modelo. Contemporâneo de Matisse e Picasso, Hofmann não acertou seu passo até bem mais tarde em vida. Uma geração mais velho que os artistas do Expressionismo Abstrato, como de Kooning ou Pollock, ele nem sempre se encaixa perfeitamente em categorizações históricas (Wilkin, 2003), mas em vez disto, ele se constroi com Matisse e Picasso, tanto o achatamento do espaço, quanto a abstração experimental lhe oferecem sucessos e falhas. Entre todas as filosofias que Hofmann encontrou durante seus anos iniciais, o Cubismo parece ser de maior força, ao ver o mundo de uma nova maneira. A aplicação da abstração no mundo real é uma linguegem que Hofmann desenvolveu através de toda a sua vida. Aplicando isto ao ensino foi algo especial. A experiência que ele adquiriu das vanguardas européias foi levada diretamente para a sala de aula, assim como as teorias do Cubismo permitiram a Hofmann tornar abstrato o mundo real, levando seu fazer artístico e seu ensino a novas medidas. Assim como uma idéia desenvolvida em seu estúdio, e a sala de aula atuava como um laboratório onde os estudantes solucionavam problemas similares, a partir do qual reaplicava em suas próprias pinturas. Como artista-professor, o envolvimento com o mundo da arte é essencial. Artistas-professores contemporâneos lêm publicações de arte, visitam museus e galerias e mantêm conversações com outros envolvidos em empreendimentos artísticos. Ainda enquanto um jovem pintor, Hofmann encontrou inúmeros e influentes artistas em cafés, escolas e galerias, incluindo Picasso, Braque, Léger e Matisse (Sutherland, 1989). Estas experiências foram .176. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
importantes, assim como permitiram ao jovem Hofmann ver e experimentar a vida de um artista, algo que mais tarde ele transmitiu a seus próprios alunos. Sem um envolvimento com o campo mais amplo da arte, é difícil falar de uma linguagem com relevância. Apesar do sucesso de Hofmann como pintor, seu papel como professor muitas vezes ofusca suas contribuições artísticas. Oportunidades de trabalho na Califórnia e em Nova York levaram-no à deixar a Alemanha. A primeira de muitas oportunidades que se abriram ocorreu no verão de 1930, para ensinar na Universidade da Califórnia, em Berkeley e na Chouinard School of Art em Los Angeles em 1931, e então novamente em Berkeley. Em 1932 ele aceitou um convite para juntar-se ao Art Students League em Nova York. Através do ensino em várias instituições nos Estados Unidos e Europa, a filosofia educativa de Hofmann se desenvolveu em suas práticas
artísticas.
Um
professor
para
artistas,
muitos
estudantes buscaram sua orientação para aprender a linguagem moderna
que
Hofmann,
o
ele que
oferecia. inclui
Artistas
Burgoyne
notáveis
Diller,
Ray
estudaram Eames,
com
Helen
Frankenthaler, Red Groons, Lee Krasner, Frank Stella e Luise Nevelson. Ainda que este não seja um pré-requisito para um artista-professor atraídos
pela
treinar
filosofia
de
artistas, Hofmann
os
tipos
traduz
sua
de
estudantes
pedagogia
de
encaminhar pessoas para a prática da linguagem moderna voltada à formação de artistas. Isto não foi muito tempo antes de que Hofmann abrisse sua própria escola de arte em Nova York em 1933, batizada
apropriadamente
de
Hans
Hofmann
School
of
Arts,
localizada na 444 Madison Avenue. (Após várias mudanças, a escola de Hofmann fixou-se em Greenwich Village, na 52 West 8th Street.) Facilitando simultaneamente, criatividade e disciplina, a sala de aula de Hofmann serviu como um local de pesquisa, da mesma maneira, para o professor e para o aluno. Como um europeu no Estados Unidos, Hofmann trouxe uma estética modernista um tanto distinta da tradicional academia norte americana. O estilo acadêmico, ou sua influência, tornaramse passado para Hofmann. Em vez disto, ele desejou a liberdade, em sua arte e em seu ensino. Newbury (1979) interpretou esta perspectiva singular como instrução, mais do que treinamento ou direcionamento dos estudantes. A vida e o pensamento modernos .177. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
avançaram para além das técnicas da perspectiva renascentista, e Hofmann procurou novas regras para a linguagem moderna. Esta linguagem incluiu o desenvolvimento e a exploração de tensões espaciais, plasticidade da tela bidimensional, e o uso da côr como agente
expressivo
(Sutherland,
1989).
Este
desenvolvimento
manteve o interesse de Hofmann no pensamento sobre o processo. Isto é evidente pelo modo como seu crescimento artístico beneficiou o desenvolvimento de sua filosofia de ensino. Tendo trabalhado em muitos dos movimentos e estilos iniciais do modernismo, Hofmann obteve riqueza de experiência que ele levou para dentro da sala de aula. Hofmann, o Artista A arte de Hofmann, apesar de abstrata, estava enraizada no mundo real. Suas composições progrediram ao longo de sua vida desde um estilo pós impressionista ao semi abstrato, e associado, em seu trabalho dos últimos anos, à abstração geométrica dos planos. Ele nasceu um ano antes de Picasso e viveu uma década a mais do que Jackson Pollock, uma ilustração para demonstrar quantos movimentos artísticos ele atravessou (Flam, 1990). O trabalho com a Natureza Morta dos anos 30 é a melhor representação para mostrar o cruzamento entre o objeto com cores e formas abstratas. Combinando formas geométricas derivadas de objetos reais
com
tons
ousados,
as
telas
de
Hofmann
tornaram-se
vibrantes, assim como a justaposição de tamanhos se tornou seu foco no anos 40. Formas, cores e planos são critérios constantes para a descrição da estética de Hofmann no modo em que ocupa a superfície plana. A tarefa de Hofmann com a pintura demonstra a importância
do
mundo
natural,
ainda
que
suas
composições
abstratas sejam esboços do mundo real com sinais da tradição das pinturas figurativas e de paisagem. Por quase cinquenta anos, Hofmann não pintou mas em vez disto desenhou constantemente na medida em que buscou trabalhar para fora do Cubismo (Greenberg, 1961). Foi em 1931 que ele começou a pintar novamente, e na década de 40 ele finalmente se comprometeu com a abstração (Greenberg, 1961). Esta progressão no estilo é característica da insistência de Hofmann na importância da simplificação pela abstração. Apesar de .178. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
simplificar a forma, a leitura de uma mensagem universal pôde ser experienciada. A tela, ou o plano da pintura, eram uma superfície bidimensional
solicitando
uma
aproximação
alternativa
no
engajamento com a natureza. Hofmann fala da semelhança do fazer artístico com a magia: O problema da técnica do artista é como transformar o material com o qual ele trabalha, de volta à esfera do espírito. Esta transformação dupla procede de percepções metafísicas, para a metafísica em busca da natureza essencial da realidade. E então a criação artística é a metamorfose dos aspectos físicos externos de algo em uma realidade auto sustentada. Assim é o ato mágico que ocorre continuamente no desenvolvimento de uma obra de arte. (Hofmann, 1967, p. 40)
Elementos da linha e matizes que reagem umas às outras em uma vestimenta mística. A depender de sua colocação, o significado e a reação ocorrem. O artista poderia desenvolver sensivelmente estas relações, mas no caso de Hofmann o cubismo aparece para jogar um papel importante no abandono da educação acadêmica em arte. Na medida em que sua filosofia progrediu para além das relações formais, Hofmann usou o elemento formal da linha para criar e isolar formas. Estas formas começaram a representar expressões do ritmo e do movimento (Sutherland, 1989).
Mesa com chaleira, vaso verde e flores vermelhas, 1936 Hans Hofmann, Óleo sobre madeira Univerity of California, Berkeley Art Museum e Pacific Film Archive.
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Hofmann (1967) enfatiza a importância da criação plástica em sua
pintura.
Plasticidade,
de
acordo
com
Hofmann,
é
a
transferência de qualidades tridimensionais e experiências, para uma superfície bidimensional. No entanto, a criação plástica também envolve expressão. Este plano bidimensional deve também comunicar
experiências
com
a
realidade
em
uma
linguagem
emocional. Uma combinação de expressão e espaço, Hofmann não esperava que esta teoria fosse apreendida rapidamente: O leigo tem dificuldade extrema em compreender que a criação plástica em uma superfície plana é possível sem destruir esta superfície plana. Mas é somente esta plenitude conceitual da experiência plástica que garante a preservação da bidimensionalidade. (Hofmann, 1967, p. 43)
Hofmann se refere ao espaço através da poesia: O Espaço e o Quadro Não podemos ver o espaço só podemos sentir o espaço Já que não podemos ver o espaço também não podemos copiar o espaço e já que nós somente sentimos o espaço devemos inventar o espaço pictórico como o finale da criação pictórica Então devemos ser inventivos em usar os meios pictóricos: a Linha, os planos, os pontos esses são os meios arquitetônicos com os quais construímos o espaço como experimentado experimentado pelos sentidos e não somente percebido pela visão física pois a experiência de visão e espaço juntos criam uma visão interior na junção e pela relação de uma experiência física múltipla com uma reação psíquica (Hofmann, 2008)
A teoria de Hofmann é melhor compreendida na comparação com os tradicionais métodos pregados pela academia. Para adquirir profundidade
em
uma
superfície
bidimensional,
um
acadêmico
deveria fazer uso de sombras pela graduação tonal. Pela adição de tons e sombras nas matizes, se poderia representar do escuro ao claro. Em comparação, a profundidade defendida por Hofmann foi .180. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
criada no plano bidimensional, o qual não imita o espaço. Hofmann declara: Meu objetivo na pintura, assim como na arte em geral é o de criar pulsação, luminosidade e abrir superfícies que emanem uma luminosidade mística, determinada exclusivamente através do desdobramento pictórico, e em acordo com minha mais profunda compreensão da experiência da vida e da natureza (Kuh, 1990, p. 128)
Apesar do sucesso haver tardado, ele foi reconhecido como um pintor de importância pelos críticos e pelo campo da arte (Greenberg, 1961). A primeira retrospectiva de Hofmann ocorreu em 1948 na Addison Gallery em Nova York. Aos 68 anos, Hofmann foi primeiramente conhecido como professor, e através desta exposição muitos de seus trabalhos foram vistos pela primeira vez (Sutherland, 1989). No entanto, foi apenas na década de 50 que vieram à tona as mais fortes imagens, que representam as teorias de Hofmann. Hofmann, o Professor Hofmann iniciou o ensino em 1915, em Munich e terminou sua carreira como professor em Nova York no ano de 1958. Uma característica do seu currículo foi o conhecimento que possuia do universo da arte moderna, e sua permeabilidade para dentro da sala de aula. A arte e os artistas que influenciaram Hofmann foram extendidos para além de sua filosofia do fazer artístico. Notáveis exemplos da arte moderna, em exposições em galerias e museus, apresentaram a extensão e o aspecto integral de sua pedagogia (Cho, 1993). Cho (1993) alega que estudantes puderam visitar exposições de Leger, Van Gogh, de Chirico, Lipchitz, Calder, Gorky e Kandinsky. Através da ampliação de suas aulas para a cidade (Nova York), artistas foram introduzidos ao mestres do modernismo europeu. A emoção das exposições que seguiram na década de 40 e 50, foram integradas ao seu ensino. De forma alguma Hofmann rejeitou os mestres do passado. De fato, Michelangelo e Rembrandt são ambos citados como modo de trazer teorias para realizar a monumentalidade e a universalidade em seus trabalhos (Hofmann, 1967). As forças presentes nas obras dos mestres, ainda que não abstratos, produzem experiências que são físicas e espirituais. Cézanne é também destacado como um .181. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
artista que usa a côr para empurrar e puxar forças através das duas dimensões da tela. Suas imagens, deste modo, pulsam e exalam uma vivacidade que apresentam sensibilidade na decisão. Técnicas modernas - incluindo o espaço cubista, as cores fauvistas, e a colagem - foram todas incorporadas no ensino de Hofmann (Cho, 1993). Na fusão entre tradição e auto expressão, os alunos de Hofmann foram encorajados a cruzar estilos individuais. Isto é aparente quando se compara antigos alunos (Louise Nevelson e Larry Rivers). Enquanto demonstrava ou fazia leituras sobre os movimentos artísticos modernos, Hofmann desejou que seus alunos enxergassem. Este foi o formato clássico com uma filosofia nova. A frustração em fazer o balanço entre o ensino e o fazer artístico é um tema contemporâneo que também atormentou Hofmann. Ele afirma: "Eu não penso que meus longos anos de ensino tenham machucado tanto minhas obras. eles apenas tomaram meu tempo. Eu ensinei por tanto tempo - muito tempo" (Kuh, 1990, p. 125). Apesar do ensino haver sido sua principal saída, também impediu sua produção em alguns momentos. Hofmann trouxe o estúdio para a sala de aula, mas por vezes parece que a sala de aula teve prioridade sobre
a
produção
artística,
um
balanço
perigoso
que
pode
obscurecer e causar esgotamento ao espírito do artista-professor. Uma filosofia de ensino Hofmann foi uma escola de um homem só. Ao trazer sua própria experiência como um artista para a sala de aula, sua educação e prática são ambas destacadas em seus processos de ensino. A prática artística de Hofmann é bastante próxima de sua própria educação
neste
sentido.
As
imagens
tardias
de
Hofmann
são
iluminadas, assim como significam o ápice de sua filosofia da pintura, mas suas pinturas iniciais fornecem evidências para o crescimento e desenvolvimento do processo intelectual. O crescimento que ele experimentou enquanto artista e as qualidades
imateriais
contribuiram
no
seu
desenvolvimento.
Progredindo através de variados estilos, Hofmann obteve uma situação singular para impulsionar seus alunos a entrar no mundo da arte moderna em uma proporção muito mais rápida, se comparada com o processo que ele próprio passou. .182. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
"Quando Hofmann criticava um desenho, ele sentava-se ou se colocava de pé na posição de onde o aluno havia observado o modelo e fazia suas colocações diretamente sobre os desenhos dos estudantes. Às vezes ele 'realmente entrava nele' - então o desenho podia ser submetido a uma série de correções que levava algo como dez minutos, e assim o resultado final era completamente um desenho de Hofmann. Outras vezes, para estabelecer um ponto sobre a alternância de planos ou para esclarecer relações espaciais, ele solicitava a permissão dos alunos para rasgar todo o papel em pedaços os quais ele então reorganizava com fita e percevejos. Quando um aluno pintava em aula, Hofmann, destemidamente, podia pedir os pincéis e a paleta, e pintava diretamente sobre a tela daquele aluno. Era incomum alguém fazer objeção à estes procedimentos drásticos. Nós havíamos sido ensinados à respeito da primazia do processo, não do resultado" (Kahn, 1982, p. 22).
Assim como muitos professores compreenderam, o aprendizado autodidático de um conceito ou processo pode ser pesado e longo, ainda que recompensador. A medida que alguém ensina a si mesmo, pode encontrar um entendimento muito mais complexo dos conceitos ou processos estudados. Provar e experimentar são parte deste processo, assim como as telas de Hofmann demonstram, em exemplos de sucessos e de falhas (Wilkin, 2003). À medida em que Hofmann realizava experimentações com a linguagem moderna da pintura, ele desenvolvia uma compreensão íntima do assunto. O ensino aperfeiçoa as idéias e o professor é aquele quem mais se beneficia com da prática (Anderson & Wark, 2005). Através da coleta de materiais, do planejamento, e do ensino, o instrutor elabora a informação antes da disseminação. Os resultados são evidentes, pela forma em ele continuou a ser buscado pelos artistas estadunienses que esperavam também compreender as descobertas de Hofmann. “Pintar tem muitos problemas mas principalmente é o desenvolvimento sincronizado da côr e da forma” (Hofmann, 1957, p.54), a qual foi a noção que ele procurou compreender na criação de realidades na tela. Estes desenvolvimentos incompatíveis puderam ser entrelaçados para a criação de uma síntese (Hofmann, 1957). “Puxar e empurrar” foi a expressão de Hofmann que descrevia um aspecto importante do controle da superfície pictórica. As forças de expansão e contração eram incitadas pela teoria do puxar e empurrar, como a energia dinâmica que se apresenta na medida em que os planos reagem uns aos outros. Os arranjos de formas .183. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
geométricas
multicoloridas
de
Hofmann
controlam
o
espaço
bidimensional como mudanças trepidantes das placas de côr. Formas básicas compõem a maioria no seu uso. Referidos como planos, estes quadrados, esferas e formas geométricas são ligados ao bloco básico
de
construção
da
natureza
(Newbury,
1979).
Esta
experiência encontra sucesso quando os planos estão em tensão constante e assim relacionados uns aos outros. As linhas também auxiliam neste processo, pois movem-se para dentro e para fora do plano. Elas criam os planos e adicionam movimento na medida em que os elementos individuais interagem. Esta filosofia se desenvolveu ao longo de muitos anos, e sua vontade em compartilhá-la e modelá-la em sala de aula, dá às aulas de Hofmann o mesmo significado de um processo artístico. As forças do puxar e empurrar foram preocupações centrais de suas obras e do seu ensino. Escrever sobre isto e praticar sua filosofia, levou-o, mais adiante, à um refinado entendimento espiritual: As forças do empurrar e puxar funcionam tridimensionalmente sem destruir as demais forças de funcionamento bidimensional... Para criar o fenômeno do empurrar e puxar em uma superfície plana, se deve compreender que, por natureza, o plano da pintura reage automaticamente em direção oposta ao estímulo recebido; então, a ação seguirá enquanto receber o estímulo no processo criativo. Empurrar responde ao Puxar, e o Puxar ao Empurrar... Exatamente a mesma coisas pode ocorrer ao plano pictórico no sentido espiritual. (Hofmann, 1967, p.44)
“Busca pelo real”, frase e título do texto de Hofmann de 1967, foi usada para testar suas idéias a partir das análises do plano da pintura. Serviu como evidência das relações entre as realidades formais e o mundo real, que Hofmann observou e abstraiu em suas telas. Escrevendo inúmeros ensaios e dando continuidade à sua prática de ensino, apesar das mudanças de local e de país, é algo significativo. A tenacidade e a resiliência da mensagem de Hofmann ilustra seu comprometimento e crença na sua filosofia educativa. Sua esperança não foi de confinar, mas de libertar os estudantes com o conhecimento.
Mais do que copiar a natureza, ou
explorá-la como um cientista, o desejo de Hofmann era de que seus alunos/artistas pudessem se comunicar através de suas obras em um sentido mais profundo, que examinasse o modo que a natureza afetava suas sensibilidades (Newbury, 1979). Este estímulo era .184. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
intelectual,
adicionando
uma
camada
conceitual
à
pintura
abstrata. Foi uma crença de que a pintura poderia comunicar algo rico e significante através do arranjo harmonioso de cores. O espaço negativo ou a distância entre os planos também contribuem para a experiência. As linhas-guia não são lineares e podem parecer emotivas para alguém fora da experiência. É um processo difícil de medir, ainda que perceptível e qualitativo. Melhor descrito como experiencial, na criação de três dimensões no plano bidimensional há um grande esforço para todo artista estudante. Hofmann declara: Ser um artista e ser um professor são duas coisas conflitantes. Quando eu pinto, eu improviso, especulo, e meu trabalho manifesta o inesperado e o único. Eu nego a teoria e o método, e conto apenas com a empatia e o sentimento... No ensino, é totalmente o oposto. Devo ter em conta cada linha, forma e côr. Se é forçado a explicar o inexplicável... (Seckler, 1951, p.64)
Apesar das diferenças inerentes entre o fazer arte e o ensino da arte, Hofmann (1967) acreditava que a arte é controlada por uma ordem. Enquanto a criação desta ordem é bem distinta da facilitála, uma filosofia similar permeia o pensamento de seu processo. Para além do estilo, Hofmann esperou de seus alunos o entendimento desta sua filosofia sobre como uma pintura opera. Como aprendiz por toda a vida, a paciência e experiência de Hofmann são aspectos importantes de seu ensino.
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Equinox, 1958 Hans Hofmann Óleo sobre tela Univerity of California, Berkeley Art Museum e Pacific Film Archive Doação de Hans Hofmann
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O Professor-Artista
A grande força de Hofmann como professor, e o fator que levou tantos aspirantes à artistas à sua sala de aula, foi sua habilidade em trazer o estúdio para dentro de sala. Esta habilidade se diferencia em relação à prática artística. Sutherland (1989) escreve que o crescimento de Hofmann como artista se deu paralelamente ao seu desenvolvimento como professor, e que ele foi um professor-artista devido à sua vontade em levar suas experiências do fazer-arte à sala de aula. As descobertas feitas em estúdio foram algo a ser compartilhado. A vida do artista não esteve separada do ensino mas, pelo contrário, melhorou o ensino e vice versa. A arte era regida pela ordem, e Hofmann acreditava que se poderia ensinar esta ordem e harmonia. Wilkin (2003, p.16) escreve: O dinamismo pictórico que Hofmann ambicionou para seu trabalho e lutou para elucidar aos seus estudantes, não foi meramente uma concepção pessoal da estrutura Cubista, mas uma metáfora visível para a oposição das forças – real e metafísica, espiritual e metafórica, emocional e prática – que animaram a existência e fizeram a humanidade humana.
A casa de Hofmann era semelhante a caminhar dentro de uma de suas pinturas. Cores brilhantes e corajosas eram afixadas aos objetos e partes da casa. A matéria de suas pinturas era seu contexto de vida. Demonstrando o compromisso com a côr e seus efeitos nos sentidos, a côr do piso em contraste e em relação à uma cadeira ou tapete tinham possivelmente o mesmo efeito em Hofmann que uma pintura. As forças o fazer artístico e o ensino de Hofmann eram bem reais. Movendo seu pensamento, a mistura de emoções e experiências envolvidas com o ensino, combinadas com decisões complexas na composição das pinturas, representam uma juxtaposição de intenções que complementavam-se e, no caso de Hofmann, ambos, ensino e fazer-arte, afetaram um bom número de espectadores e de alunos. Ter um professor que também apresenta os processos de ser artista é um atributo de importância. Os alunos de Hofmann não concluíram os estudos com a obtenção de um diploma. Em vez disto, eles levaram consigo a noção do que é a arte moderna e uma crescente sensibilidade para a qualidade. .187. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
* * * Ponderação foi o instrumento para o progresso de Hofmann como professor-artista. O ensino marcou a maior parte de sua carreira inicial. O tempo gasto com seus estudantes e sua instrução foram importantes para seu desenvolvimento pessoal enquanto artista. Trabalhando nas idéias com os alunos e encorajando-os a achar suas próprias vozes, Hofmann também desenvolveu sua arte. Nada refina idéias e pensamentos melhor do que ensinando-os e explicando-os à outros. O processo de ensino incita os indivíduos a pensar o currículo de modo crítico, o que do contrário poderia ser negligenciado como um estudo independente. Variados aspectos da pedagogia de Hofmann destacam um processo autocrítico em andamento no fazer artístico e no ensino. O ensino da Arte tem sentido na América, e deveria ser generalizado e mais sigificativo. O problema em civilizar este enorme país não está terminado. O ensino da arte deve se direcionar ao enriquecimento da vida do estudante. O professor deve ser a personalidade-guia para o aluno, e desenvolver sua sensibilidade e seu poder de “sentir” coisas animadas, ou inanimadas, com simpatia... O problema do ensino da arte não é limitado ao problema do desenvolvimento artístico em si, mas inclui os problemas de como produzir artistas, professores compreensivos, entendimento da arte em geral e fruição da arte em paricular. (Hofmann, 1967, p.56)
Hofmann imaginou-se como um pintor que teve de ensinar para praticar suas idéias independentemente (Wilkin, 2003). De modo interessante, com exceção de alguns poucos títulos como professor na Califórnia e em Nova York, as suas experiências de ensino também foi independente. Suas escolas não fizeram parte de nenhuma grande instituição de graduação. A natureza independente que ele desejou em sua carreira como pintor também se refletiu na organização de suas escolas. O fato de que o bom ensino requer uma grande dedicação de tempo e esforço em preparar e dar aulas, pode ser percebido facilmente no desejo de Hofmann em dedicar maior tempo à sua tarefa. Ainda assim, é impossível ignnorar a influência que seu ensino teve em seu fazer artístico. Numa combinação de intelectualismo e emoção, a obra de Hofmann é poderosa em vários níveis (Pearl, 2006). As idéias exploradas no estúdio também se manifestaram em seu ensino; o estúdio foi sua escola, e ele levou aquela sensibilidade aos seus alunos como professor. .188. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
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ENSAIOS
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notas sobre a experiência [ENTRE] Ação Educativa e a Arte Como Experiência
Adriane Cristine Kirst Andere de Mello (UDESC)1 2 Fábio Wosniak (UDESC) 3 Juliano Siqueira (UDESC) RESUMO: Neste texto, são apresentadas reflexões sobre a concepção de Ação Educativa a partir da perspectiva cartográfica de Gilles Deleuze e Félix Guattari (1987) e do pressuposto de um pensamento através da arte como experiência, baseado em John Dewey (2010). O material
educativo
serve
como
dispositivo
de
diálogo,
uma
interface entre a exposição Deambulações Sobre Pintura, a Ação Educativa e a Experiência Estética; nele, o visitante do espaço da galeria contribui ativamente na produção de sentido (Rancière, 2014). Os autores concebem que não há uma maneira única de pensar a Ação Educativa e, muito menos, um modo específico de fazer/pensar uma ação educativa, havendo três espaços híbridos: âmbitos das corporalidades, das espacialidades, reunidos com riqueza em
1
Adriane Cristine Kirst Andere de Mello http://lattes.cnpq.br/1209118072455218 Possui Bacharelado e Licenciatura em Artes Plásticas pela Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC, Mestrado em Artes Visuais (Ensino) e atualmente cursa o Doutorado em Artes Visuais (Ensino), também pela Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC. 2 Fábio Wosniak Doutorando em Artes Visuais na Linha de Pesquisa de Ensino das Artes Visuais PPGAV/UDESC; Mestre em Artes Visuais na Linha de Pesquisa de Ensino das Artes Visuais PPGAV/UDESC; Pedagogo S.E./2012 FAED/UDESC; Psicanalista; Vice-Coordenador da Rede de Educadores de Museus de Santa Catarina - REM/SC (Gestão 2013-2015), membro/pesquisador do Grupo de Pesquisa Entre Paisagem (UDESC/CNPQ), integrante do Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke (UDESC). Membro/pesquisador do Grupo Arte na Pedagogia (MackenzieSP/CNPQ). Atuando principalmente nos seguintes temas: Arte Educação, Arte e Pedagogia, Formação Docente em Artes Visuais. E-mail: fwosniak@gmail.com Currículo: http://lattes.cnpq.br/6525393533253057 3
Juliano Siqueira http://lattes.cnpq.br/8014633709940019 Professor no curso de Licenciatura em Artes Visuais da Universidade Estadual de Londrina. Doutorando em Artes Visuais (UDESC). Mestre em Educação e Artes (UFSM). Bacharel em Escultura e Licenciado em Desenho e Plástica (UFSM).
.248. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
ambientações, situações e paisagens a serem usufruídas e recriadas pelos espectadores. Neste sentido, a atitude cartográfica acolhe as concepções do espectador e recria novas maneiras de pensar as obras,
propiciando
experiências
estéticas
e
um
conhecimento
autônomo sobre as produções artísticas. Palavras-chave:
Ação
Educativa;
Arte
como
Experiência;
Experiência Estética. ABSTRACT:
This
educational
paper
activities
presents in
reflections
the
GillesDeleuze e Félix Guattari
on
cartographic
the
design
of
perspective
in
(1987), and the assumption of a
thought through art as experience, based on John Dewey (2010. The educational material serves as a dialog device, an interface between exposure Wanderings About Painting, Educational Action and Aesthetic Experience, in it, the visitor's of the space gallery, actively contributes to the production of meaning (Rancière, 2014). The authors conceive that there is no a single way of thinking Educational Action and much less a specific way of doing / thinking an educational activity, there are between, hybrid spaces: areas of corporeality, of spatiality, meeting with wealth ambiences, situations and landscapes to be enjoyed and re-created by the spectators. In this sense, the cartographic attitude welcomes the views of the exhibition and recreates new ways of thinking
works,
providing
aesthetic
experiences
and
self-
Experience.
Experience
knowledge about artistic productions. Keywords:
Cultural
Mediation.
Art
as
Aesthetic.
.249. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Prelúdio
A base para a construção deste artigo emerge dos percursos vividos
na
elaboração
do
material
educativo
à
exposição
Deambulações Sobre Pintura da artista Jociele Lampert. A exposição forneceu o contexto para a narrativa cartográfica (DELEUZE e GUATTARI (1987) e KASTRUP (2008)) ancorada na filosofia da Arte como Experiência de John Dewey (2010). Ambas as abordagens teóricofilosóficas, escolhidas para amparar esta reflexão sobre a mediação cultural
se
relacionam
com
as
nossas
experiências
como
pesquisadores em Artes Visuais. Longe de ser previsível e seguro, encontramos
neste
percurso
graus
variáveis
de
dúvidas,
ambiguidades, confusões, vazios e caos; principalmente, no tocante ao processo de elaboração da forma do material. Para pensar a produção de uma exposição (da qual participamos em diversos âmbitos de sua montagem), cujo relato fazemos neste momento,
mais
especificamente,
a
concepção
de
seu
material
educativo, em que pautamos nossas reflexões e indagações a respeito da continuidade e experiência; Para Dewey (2010) é parte da natureza
humana
o
processo
de
ensinar
e
aprender
para
uma
existência continuada de sociedade - não insistir neste processo nos faria recair em uma educação doutrinadora – em um material meramente ilustrativo ou explicativo. Em oposição a esta educação escolástica - material ilustrativo ou apenas de entretenimento - a experiência
possibilita
renovação,
procurando
alcançar
uma
pedagogia democrática. Para ser mais preciso, a educação é o lugar da reorganização e reconstrução da experiência, especificamente de uma experiência estética que, segundo Dewey é a mais sofisticada forma de apreensão do conhecimento (DEWEY, 2010).
Nesse sentido, o material educativo da exposição buscou
desencadear esta experiência estética e democrática, pautada na compreensão e construção do conhecimento coletivo - exercício que pode ser considerado um projeto - no qual, a Arte Educação e a Mediação Cultural têm, atualmente, se esforçado para conseguir. Outro ponto que podemos destacar é aquilo que o próprio trabalho da .250. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
artista incita, ou seja, a experiência de mergulhar nas cores e texturas das paisagens gestuais. O espectador é instigado a também deambular ao acompanhar as deambulações pictóricas de Jociele por Vale Vêneto, Santa Maria e Nova York. Justaposições conceituais
Recorrendo à concepção de Dewey(2010), na qual “a experiência
é um todo e carrega em si seu caráter individualizador e sua autossuficiência” (p.110) e tendo a cartografia como metodologia, (DELEUZE E GUATTARI, (1987) e KASTRUP, (2008)) a mediação cultural na
exposição
espectadores
Deambulacões são
sujeitos
Sobre
Pintura
capazes
de
compreende se
que
reorganizarem
os e
reconstruir por meio ou pela mediação com a Arte. Assim, entendemos que o visitante, ou seja, aquele para quem o material foi criado participa, conjuntamente, contribuindo ao surgimento de novos significados para as obras expostas. Rancière (2014, p.17) discorre a respeito do espectador como alguém ativo no processo: O espectador também age, tal como o aluno ou o intelectual. Ele observa, seleciona, compara, interpreta. Relaciona o que vê com muitas outras coisas que viu em outras cenas, em outros tipos de lugares. Compõe seu próprio poema com os elementos do poema que tem diante de si. Participa da performance, refazendo-a à sua maneira […].
Outras formas de arte, igualmente, pedem outro comportamento
por parte do público. Concede-se uma emancipação ou pelo menos uma tentativa de, onde acontece um “[…] embaralhamento da fronteira entre os que agem e os que olham; indivíduos e membros de um corpo coletivo (RANCIÈRE, 2014, p.3)”.
.251. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Material Educativo
As
transformações
que
originam
novas
invenções
e
novos
significados estão intimamente ligadas às rupturas expressas pela arte contemporânea nas suas mais variadas formas de apresentação ao público – no que tange aos seus materiais e sua concepção como, por exemplo: colagens, rádio arte, vídeo arte, arte sonora, publicações de artista, entre outras. Certamente que isto desafia educadores, arte
educadores,
professores
artistas,
dentro
do
cenário
da
arte/educação. Compreender estas transformações e a forma como a arte contemporânea se apresenta, evidencia a perspectiva de que os artistas contemporâneos,
quebraram os limites do “objeto” de muitas formas e voltaram a centrar a atenção nas relações entre objetos (...) os objetos se converteram em pedaços reciclados de outros objetos que estão unidos em uma collage que se copiam, se duplicam e se multiplicam. (FREEDMAN, 2006, p. 27)
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A cartografia como estratégia da mediação na Exposição Deambulações Sobre Pintura segue as pistas, o traçado de um plano imerso na experiência, que acompanha os efeitos do percurso da investigação sobre o tema “deambulações”. A pesquisa cartográfica exige do cartógrafo uma atenção flutuante, ou seja, não dirigir a atenção a uma especificidade do problema a ser investigado. Sobre esse conceito, Kastrup (2012) esclarece que
para a discussão da atenção do cartógrafo, destaca-se a proximidade quanto à ênfase na suspensão de inclinações e expectativas do eu, que operariam uma seleção prévia, levando a um predomínio da recognição e consequente obturação dos elementos de surpresa presentes no processo observado. Além disso, a atenção seletiva cede lugar a uma atenção flutuante, que trabalha com fragmentos desconexos. (KASTRUP, 2012, p. 35-36).
O que mudaria para o mediador cultural com a atenção flutuante? Talvez a maneira de colocar a pergunta. No lugar dos “quês?” e “porquês?”, quem sabe um “como?” - ou ainda, sugere Kastrup, “vamos ver
o
que
cartografar
está é
acontecendo”(KASTRUP,
acompanhar
processos.
O
2012, que
p. está
45). em
Afinal, jogo
na
cartografia não é a representação do objeto, mas sim “descrever, intervir e criar efeitos-subjetividades” (PASSOS E BARROS, 2012, p. 27) diante do olhar observador do cartógrafo.
.253. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Material Educativo A
cartografia
aproximações
com
desenhada o
que
nesta
Bachelard
Mediação
(1993)
Cultural
denominou
de
tece razão
imaginante. Afinal, trata-se de uma ação educativa em Artes Visuais. O alvo deste percurso é pensar como os espectadores alicerçam a sua cognição nas Artes Visuais – considerando sua subjetividade, seus afetos, sua imaginação; ou seja, um corpo inteiro, não apenas o cérebro, o racional. Este material educativo, como dispositivo de ações, propõe considerar a imaginação tal como uma potência da natureza humana. Conforme afirmou Bachelard (1993, p. 23), “[…] a imaginação aumenta os valores da realidade”. O método cartográfico foi pensado, como já mencionado
anteriormente,
em
ressonância
com
esse
processo
imaginativo. Esta atitude como estratégia instiga experiências de problematização, como o estranhamento e a surpresa. O processo de concepção considerou o imprevisível do acontecimento em si ao se abrir para questionamentos que surgiram nos diálogos e pesquisas .254. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
que antecederam à Exposição. Ao propor no material educativo a deambulação pela exposição, a partir da colocação de algumas questões desdobradas em desenho pelo visitante, considera-se o desenhar como prática cognitiva, conhecer=fazer=ser (VARELA, s/d). A cognição é um fazer, uma prática, uma ação. Kastrup, partindo desta concepção de Varela afirma que: Não agimos para conhecer ou conhecemos para agir. Conhecimento e ação é um mesmo processo. A ação cognitiva tem também uma dimensão ontológica, identificando o fazer e o ser. Para Varela, a ação não põe em relação um organismo e um ambiente, um sujeito e um objeto, mas os configura efetivamente. O breakdown insere a indeterminação no seio da ação. Experimenta-se uma descontinuidade. A experiência presente coloca novos problemas que exigem uma reorganização da ação. O breakdown é a fonte da cognição (KASTRUP, 2008).
Além disso, a cartografia como estratégia combina o rigor científico
com
as
aspirações
poéticas.
Considerando
que
não
pretendemos encerrarmo-nos em respostas absolutas, o intuito neste trabalho cartográfico é o de criar outros mananciais que possam potencializar os debates e as reflexões a respeito do campo das Artes Visuais e da Mediação Cultural. Essas ressonâncias a que preferimos denominar, ou seja, os rastros e vestígios das leituras desencadearam em nosso trabalho a vontade de compreender com rigor metodológico-teórico-poético como a Arte afeta, ou melhor, de que forma aquilo toca o espectador.
Outro olhar permitido pela metodologia cartográfica é o de
abertura
e
ampliação
às
práticas
discursivas.
A
rotina
do
cartógrafo pelo seu estar-junto-no-campo lhe exige uma atitude de não dicotomizar o refletir do agir, do conhecer e habitar. O cartógrafo-aprendiz está na pesquisa como uma criança em sua brincadeira – de corpo inteiro. Parafraseando Clarice Lispector (1978): a pesquisa para o cartógrafo torna-se seu “sopro de vida”. A escrita e a pesquisa do aprendiz-cartógrafo são os reflexos de suas indagações; o trabalho com o inesperado. Segundo Kastrup (2008) e Deleuze e Guattari (1987), O cartógrafo escreve e produz como o poeta e o artista. Começa sem, às vezes, saber o porquê, mas aquilo que o move já existe dentro dele - só precisa encontrar o .255. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
fluxo e o refluxo para emergir, isto é, estar-em-contato, de corpo inteiro, atento. É preciso ser cauteloso, saber entregar-se, perceber, ouvir, ver, pensar. Responder ao imediato do agora. Afinal, tudo são continuidades e ressonâncias de quem somos, para onde queremos ir e o que buscamos.
Mediação Cultural - [re]construção da arte como experiência estética. A filosofia de Dewey (2010) não se refere exclusivamente à ação, mas o que o autor deflagra nesta corrente pragmática é uma teoria do pensamento e do sentimento, onde o pensamento norteia a ação e o sentimento reconhece as consumações dispostas por ela – uma conscientização unificada pelo sentir e agir. Este pensamento está baseado, principalmente, na convicção moral de que “democracia é liberdade”
–
uma
sociedade
democrática
prepara
todos
os
indivíduos, de maneira igualitária, assegurando seus benefícios, por meio de variadas formas da vida associada. Nessa perspectiva, a educação deve proporcionar aos sujeitos um interesse sobre as questões sociais e culturais, inerentes ao espírito humano. Cabe ressaltar
que
estes
pressupostos
se
encontram
fortemente
impregnados na vivência da artista Jociele Lampert, que também é professora de pintura, entre outras disciplinas. Dewey (1956) problematiza o controle e a coerção social, com ênfase na educação, acreditando que os moralistas profissionais, ao considerarem a natureza humana disposta para o mal, assumem a função de podá-la ou a reprimir. A moral está largamente em função de um controle da natureza humana. Por que a moral estabelece regras tão estranhas ou incompatíveis com a natureza humana? O controle tem sido dado a uma oligarquia, e a indiferença às regulamentações se tem originado da brecha que separa os governados dos governantes. (...) De modo geral, tem-se como boas somente as pessoas que fazem o que a elas se determina, e o não cumprimento imediato desta ou daquela instrução constitui sinal de que há alguma coisa errada em suas naturezas (DEWEY, 1956).
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Para o filósofo, a configuração da disposição humana pode ser
possível diante de diversos agentes, mas a educação, ainda, é o espaço chave para que uma filosofia da experiência se concretize como uma “realidade manifesta”. Uma filosofia da experiência no âmago da Educação exige que professores sejam conhecedores exímios do seu processo de aprender e que estejam com seus conjuntos de práticas em constante estado de reflexão. Caso contrário, corre-se o risco de que sua prática pedagógica não passe de um aglomerado de dogmas sem qualquer exame crítico (DEWEY, 2011). Dessa forma, sustenta a ideia de que nenhuma reflexão sobre processos educacionais seja viável sem levar em conta os contextos nos quais aqueles estejam inseridos. Em uma concepção de Mediação Cultural, ancorada na arte como experiência, a mediação é parte de um processo educativo inserido no campo da Arte Educação numa atuação que busca provocar diálogos que ressoem em processos de ensino e de aprendizagem. A concepção de
ação
educativa,
eixo
da
Mediação
Cultural,
focalizou
a
intersecção entre Arte, Experiência e Educação; segundo Martins, a Mediação Cultural é: Fazer pensar a aproximação sensível com a arte, com a provocação de experiências estéticas, a ampliação de repertório cultural e a contaminação da curiosidade, da abertura, do querer se aproximar mais das manifestações artísticas... (2014, p. 214).
As paisagens de Jociele possuem uma potência de criação, as
quais, segundo Kastrup (2008) produzem experiências que acionam blocos de sensações, afectos e perceptos transpessoais (DELEUZE & GUATTARI, 1987). As sensações emergem da matéria sensível das tintas com suas cores, formas e texturas, sensibilizando o espectador,
portando
uma
singularidade,
um
afecto.
Estas
sensações capturam o espectador na experiência do presente vivido, podendo gerar uma transformação do sujeito da experiência.
O método cartográfico da proposta educativa não visa à análise
formal ou conceitual totalizante das obras, nem a um desenho identitário, mas detectar os elementos de processualidade e as .257. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
linhas de força em questão (DELEUZE, 1987). Os signos da pintura forçam a pensar e exigem sentido. Qualquer processo educativo que utilize o método processual cartográfico precisa estar aberto a mudanças, de acordo com a configuração das forças presentes (KASTRUP, 2008). Ao se abrir para o agora, deambula-se no risco e na imprevisibilidade. O método cartográfico se apoia na multiplicidade de significados, nas ambiguidades e problematizações. A experiência singular no encontro com a pintura transcende o eu, transborda aquele que é atravessado pelas cores, provoca a dessubjetivação e a atenção a si.
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Referências BACHELARD. Gaston. A poética do espaço. São Paulo: Martins Fontes, 1993. DEWEY, John. A Arte como experiência. São Paulo: Martins Fontes, 2010. __________. Experiência e Educação. Petrópolis, R.J.: Vozes, 2011. __________. A natureza humana e a conduta: introdução à psicologia social. Bauru: Tipografia e livraria Brasil, 1956. DELEUZE & GUATTARI. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia, v. IV. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1997. FREEDMAN, K. Enseñar la cultura visual: cirrículum, estética y la vida socialdel arte. Barcelona: Octaedro, 2006 LISPECTOR, C. Um sopro de vida. São Paulo: Círculo do Livro:1978. MARTINS, Mirian Celeste. Entre [con]tatos, nuvens e chuviscos mediadores. In: MARTINS, Mirian Celeste (org). Pensar juntos a mediação cultural: [entre]laçando experiiencias e conceitos. São Paulo: Terracota Editora, 2014. RANCIÈRE, Jacques. O espectador emancipado. São Paulo: Martins Fontes, 2014. KASTRUP, Virgínia. Cartografias Literárias. Em: Políticas da cognição. Porto Alegre:Sulina, 2008. VARELA, Francisco. Conhecer: as ciências cognitivas - tendências e perspectivas. Lisboa: Instituto Piaget, (s/d).
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.261.
Imagens da Exposição Deambulações sobre a pintura de Jociele Lampert, aconteceu no MASC entre 25 de maio e 17 de julho de 2016
.262.
.263.
.264.
.265.
Ateliê da Profª Drª Jociele Lampert em sua residência
Imagens das páginas 260 à 266 têm seus direitos reservados ao Estúdio de Pintura Apotheke fonte: www.jocielelampert.com.br
.266.
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grupo de estudos estúdio de pintura apotheke Jociele Lampert Desenvolveu pesquisa como professora visitante no Teachers College na Columbia University na cidade de New York como Bolsista Fulbright (2013), onde realizou estudo intitulado: ARTIST'S DIARY AND PROFESSOR'S DIARY: ROAMINGS ABOUT PAINTING EDUCATION. Doutora em Artes Visuais pela ECA/USP (2009); Mestre em Educação pela UFSM (2005). Possui Graduação em Desenho e Plástica - Bacharelado em Pintura, pela Universidade Federal de Santa Maria (2002) e Graduação em Desenho e Plástica Licenciatura pela Universidade Federal de Santa Maria (2003). Professora Adjunta na Universidade do Estado de Santa Catarina. Foi Coordenadora de Estágio CEART/UDESC (2006-2009); Foi Chefe de Departamento de Artes Visuais DAV/CEART/UDESC (2009-2011); Coordenadora do PIBID/CAPES/UDESC da área de Artes Visuais (2011-2015). Atua no Mestrado em Artes Visuais PPGAV/UDESC na Linha de Pesquisa de Ensino de Arte e na Graduação em Artes Visuais DAV/UDESC. É membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Arte, Educação e Cultura UFSM/CNPq. Membro/Líder do Grupo de Pesquisa Entre Paisagem UDESC/CNPq. Coordenadora do Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke (UDESC). Tem experiência na área de Artes Visuais, atuando principalmente nos seguintes temas: pintura, arte e educação, formação docente. É membro associado da ANPAP. Email: jocielelampert@uol.com.br
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Adão Roberto Swatowiski Natural do Rio Grande do Sul, aeronauta aposentado, com graduação em Artes Plásticas pela UDESC. Reside em Florianópolis e dedica-se, principalmente, à pintura e desenho, explorando o veio da abstração geométrica e campos de cor.
Adriane Kirst Possui Bacharelado e Licenciatura em Artes Plásticas pela Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC, Mestrado em Artes Visuais (Ensino) e atualmente cursa o Doutorado em Artes Visuais (Ensino), também pela Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC. Fez curso de Introdução a Curadoria na Central Sant Martins, University of the Arts London - UAL. Tem experiência na área de Artes Visuais, investigando processos que aproximem as pessoas da arte, atuando em projetos de formação de alunos, professores e públicos. Estuda principalmente os seguintes temas: arte contemporânea, infográficos e ensino de artes visuais por meio da experiência.
Ana Camorlinga Graduada em Letras e Literaturas (UFSC), professora, encadernadora, tradutora e achou seu prumo nas Artes. Atualmente, cursa Bacharelado em Artes Visuais (UDESC) onde descobriu os desdobramentos da pintura e, especialmente, se diverte na gama de possibilidades de foto-pintura. Foi bolsista do Apotheke de 2014 a 2015.
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Ana Carolina Martins Ferreira Graduanda do curso de Bacharelado em Artes Visuais na Universidade do Estado de Santa Catarina desde 2014 e bolsista de extensão do Grupo de Estudos “Estúdio de Pintura Apotheke”, coordenado pela ProfªDrª. Jociele Lampert.
Carolina Ramos Nunes Sua trajetória vai da sala aula de escolas públicas até instituições culturais. Atualmente é arte educadora da Fundação Cultural Badesc. Estar em contato com a arte e produções contemporâneas é fundamental para desenvolvimento de sua poética. Dentre as técnicas estudadas no Grupo Apotheke, a Cianotipia e Antothypia são aquelas que conversam com sua proposição sobre o vazio e o tempo de inércia na insanidade e a doença.
Daniela Almeida Moreira Licenciada em Artes Visuais (UDESC) e bacharel em Letras Português/Língua Brasileira de Sinais (UFSC). Possui mestrado pelo Programa de PósGraduação em Estudos da Tradução – PGET/UFSC. Participa do Ateliê Alvéolo, da artista Zulma Borges e do grupo ChineseBrushPainting, com o mestre Henry Li. Desenvolve um processo de estudo da pintura com interesse na técnica aquarela, entre outras técnicas do desenho em grafite,giz pastel e carvão, sendo o tema "natureza morta" e "retrato", os assuntos de maior interesse para sua pesquisa. O estudo da aquarela, conduziu a busca do conhecimento sobre os princípios da pintura oriental, introduzindo os conhecimentos da técnica Sumi-ê, que tornou-se objeto de estudo em paralelo com a aquarela.
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Denilson Cristiano Antonio Natural de Campo Mourão/PR. Começou a desenhar muito cedo, estimulado pelo interesse em gibis, os quais costumava copiar e recriar algumas histórias. Aos 22 anos fez seu primeiro curso de Artes pela Prefeitura de Foz de Iguaçu, onde residiu desde seu primeiro ano de vida. Mudou-se para Florianópolis em 2006, onde concluiu o curso de Licenciatura em Artes Visuais, em 2014, na Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC). Atualmente, dedica-se à pintura, ao desenho e curadoria, este último vinculado ao trabalho que desenvolve no Museu Hassis/ Florianópolis.
Fabiana Burnato do Amaral Natural de São Paulo - SP. Cursa atualmente Bachrelado em Artes Visuais na UDESC e traz na bagagem uma graduação não concluída em arquitetura e urbanismo. Sua poética figura entre técnico e lúdico, tendo como principal tema de estudo a cidade e suas relações. É bolsista de extensão do grupo de estudo Apotheke desde 2015.
Fábio Savicki Henschel Natural de Itaiópolis - SC, graduando do curso de licenciatura em Artes Visuais- UDESC , atualmente bolsista no programa Pibid de Artes Visuais com orientação da Prof.ª Dr.ª Jociele Lampert.
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Fábio Wosniak Doutorando em Artes Visuais na linha de pesquisa Ensino das Artes Visuais PPGAV-UDESC, sob orientação da Profª.Drª. Jociele Lampert. Mestre em Artes Visuais na linha de Ensino (PPGAV-UDESC). Graduado no curso de Licenciatura em Pedagogia/Supervisão Escolar (FAED/UDESC)
Janaina Schvambach Possui graduação em Licenciatura Plena em Artes - Habilitação em Desenho e Computação Gráfica pela Universidade Federal de Pelotas e Mestrado em Memória Social e Patrimônio Cultural/UFPEL, com bolsa sanduíche realizada na Universidad de Buenos Aires, Argentina. Atualmente é professora do curso de Publicidade e Propaganda, Artes Visuais, Moda, Arquitetura e Urbanismo, Licenciatura Intercultural Indígena e Produção Audio Visual na Universidade Comunitária da Região de Chapecó - Unochapecó.; coordenadora do curso de Especialização lato senso Ensino da Arte: Perspectivas Contemporâneas/ UNOCHAPECO e coordenadora da área de Artes Visuais do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID. Doutoranda em Artes Visuais/ UDESC, Membro/pesquisador do Grupo de Pesquisa Entre Paisagem (UDESC/CNPQ) e integrante do Grupo de Estudos Estúdio de Pintura Apotheke - ambos coordenados pela Profa. Dra. Jociele Lampert (UDESC).Participa como editor assistente no periódico online Revista Apotheke. Atua nos seguintes temas: arte, fotografia, publicidade e propaganda, produção cultural, memória e patrimônio. .290. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
José Carlos da Rocha Artista plástico, bacharel em Artes Visuais/UDESC, 2013 e bacharel em Ciências Econômicas/UFSC, 1978, além de especialista em Administração Pública/UDESC, 1998, atualmente é Mestrando em Artes Visuais na linha de pesquisa Ensino das Artes Visuais (PPGAV-UDESC). Participa do Projeto “Arte Educação pela pintura: produção artística do artista” e cursou, como aluno especial, a disciplina “Sobre Ser Professor Artista”, ministrada pela Profª. Drª Jociele Lampert no Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais/UDESC, 2014.
Juliano Reis Siqueira Professor de escultura no curso de Licenciatura em Artes Visuais na Universidade Estadual de Londrina. Doutorando em Artes Visuais (UDESC), Mestre em Educação e Artes (UFSM), Bacharel em Escultura e Licenciado em Desenho e Plástica (UFSM). Coordenador do PIBID/CAPES/UEL Artes Visuais (2012-2015). Atua na Formação de Educadores em Artes Visuais com ênfase em educação não formal e arte pública.
Katia Speck Fotógrafa, Técnica em Informática e graduanda em Bacharelado de Artes Visuais pela UDESC. Atualmente é bolsista de Iniciação científica do projeto de pesquisa coordenado pela Prof. Dra. Jociele Lampert.
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Luciana Finco Mendonça Mestre em Artes Visuais/UDESC, tendo desenvolvido sua pesquisa na linha de Ensino das Artes Visuais. Graduou-se em Licenciatura em Artes Visuais/UEL e em Letras/UNESP. Leciona para o Ensino Fundamental II e Médio desde 2007. É membro da Equipe Editorial da Revista Apotheke e integrante dos Projetos de Pesquisa “Formação de Professores de Artes Visuais: sobre o ensino/aprendizagem de pintura” e “Arte Educação pela Pintura: a produção do artista professor”, todos coordenados pela Profª. Drª Jociele Lampert.
Manuela Siebert Possui graduação em Artes Visuais pela Universidade do Estado de Santa Catarina (2016). Em 2014 recebeu uma bolsa do governo canadense para realizar um intercâmbio no país, e foi aluna convidada do curso de belas artes da Algoma university na qual foi membro da artist's society e do grupo first generation, e cursou disciplinas avançadas de pintura, gravura e desenho. Possui experiência na área de Artes, com ênfase em Pintura, atuando principalmente nos seguintes temas: estereótipo, ambiguidade, feminino, fantasmagoria, alegoria e fetiche. Sua pesquisa está ligada ao emprego de materiais e processos industriais e mecânicos para a realização de pinturas. Atualmente cursa mestrado em Artes Visuais também na Universidades do Estado de Santa Catarina, na linha de Ensino de Artes visuais sob orientação da Profª Dra. Jociele Lampert. É membro do programa de extensão "Grupo de Pintura Apotheke" e do grupo de pesquisa "Entre Paisagens", ambos coordenados pela Profª Dra.Jociele Lampert, e faz parte da equipe editorial da Revista Apotheke como diagramadora. .292. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Márcia Amaral de Figueiredo Formada em Licenciatura em Educação Artística/Artes Plásticas em 1991 pela Faculdade de Artes do Paraná. Especialização em Fundamentos Estéticos de Arte -Educação pela FAP/PR em 1992 e Especialização em História da Arte do Século XX na EMBAP/PR no ano de 2004. Atuou como professora de ensino de arte no ensino fundamental séries iniciais e finais na Rede Municipal de Ensino de Curitiba, período de 1987 até 2014.Frequentou o ateliê permanente de escultura de 1996 até 2006, em Curitiba, sob a orientação da escultora Elizabete Titton. Hoje, participa do programa de Mestrado no Ensino de Artes Visuais na UDESC.
Marisete M. Colbeich Natural de Cachoeira do Sul/RS, é artista visual, atua como professora efetiva no Estado de Santa Catarina e leciona no curso de Design de Interiores/FATENP. Possui bacharelado e licenciatura em Desenho e Plástica/UFSM; especialização em Mídias na Educação/FURG (2012) e Gestão Educacional/UFSM (2005). Integra o Grupo de Estudos e Pesquisa GEPAEC/UFSM. Tem trabalhos, principalmente, nas áreas de desenho, escultura e cerâmica. Participou de várias exposições individuais e coletivas, bem como salões de artes, tendo recebido menção honrosa no XIII Salão de Inverno de Artes Plásticas de Sant'ana do Livramento/RS, 2001.
Marta Facco Nasceu no Rio Grande do Sul e formou-se em Artes Plásticas pela UFSM em 2001. Possui diversas exposições individuais, coletivas e participações em salões de arte no RS, PR, SC, SP, BA e Buenos Aires/ARG, com algumas premiações. Atualmente reside em Florianópolis/SC, participa do grupo de pesquisa Estúdio de Pintura Apotheke CEART/UDESC, onde interessa-se pelo sensível dos objetos. .293. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Osmar Yang Engenheiro Eletricista de profissão, artista plástico graduado em 2013 pelo curso de Artes Visuais da UDESC. Iniciou como autodidata até os anos 80, quando frequentou o curso da pintora Ida Hannemann de Campos na Galeria Cocaco em Curitiba. Após estadia na Europa de 1998 a 2001, onde frequentou oficinas de pintura da Volkshochschule em Munique (Alemanha), e oficina de restauração em Florença (Itália) retornou ao Brasil para Florianópolis. Frequentou ainda oficinas no CIC (Centro Integrado de Cultura) com a artista Patrícia Laus. Em 2011 teve obra selecionada para exposição na mostra de Arte Cibernética (ABCiber) no Centro de Eventos da UFSC.
Rita Eger Artista visual, natural de Itajaí, SC, vive e trabalha em Florianópolis, SC, Brasil. Mestre em Matemática pela Universidade Federal de Santa Catarina. Bacharel em Artes Plásticas pela Universidade do Estado de Santa Catarina. Sua obra abrange pintura, desenho, instalação, bem como fotografia, arte postal, a palavra e a gravura no campo expandido.
Silvia Carvalho Artista, mestranda em Artes Visuais e bacharel em Artes Plásticas, UDESC/SC; Criação e Ilustração, EPA/SP; Design de Interiores, Florianópolis/SC. Suas principais mostras são “FUTURO”, Salão Nacional de Arte Contemporânea e Novas Tecnologias, Jundiaí/SP; “Concurso de esculturas CriAção Scotch”, MuBE/SP; “Estações-pinturas ao tempo”, Espaço Lindolf Bell, Florianópolis/SC; “De dentro pra fora”, MASC, Florianópolis; 20º Salão de Arte, Pinheiros/SP; “Sob a pele”, Universidade Alanus/Alemanha & UDESC; Fundação Cultural BADESC, Florianópolis/SC. Ministra oficinas de Pintura, Desenho e Pigmentos Naturais.
.294. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
Talita Esquivel Doutoranda em Artes Visuais, UNESP; Mestre em Artes Visuais/ UDESC; Especialista História e Teorias da Arte/ UEL e graduada em Educação Artística/ Artes Plásticas, UFPR. Atualmente é professora de pintura na EMBAP. É artista plástica, dedicando-se à pintura, fotografia e vídeo. Em 2009, realizou residência artística no Centro de Artes CAMAC/França. Participou de diversas exposições, dentre as quais “Arte Como Experiência”, Fundação Hassis & UDESC, 2014; “Mostra Lote 7 de Arte Contemporânea”, Fundação Hassis, 2013; “Mostra Álbum”, BADESC, 2010; “Corpo Grotesco”, Museu da Escola da UDESC, 2009; “12º Salão Nacional de Itajaí”, 2010; “CAMAC Open Studio”, Marnay-surSeine/França, 2009; “Suitcase, East Lansing e Chicago”, EUA, 2009. Participou do Grupo de Pintura Apotheke até o ano de 2015.
Tharciana Goulart da Silva Mestranda em Artes Visuais na linha de pesquisa Ensino das Artes Visuais PPGAV-UDESC, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Jociele Lampert . Graduada no curso de Licenciatura em Artes Visuais (UDESC). Integrante do grupo de pesquisa “Entre Paisagens” (UDESC/CNPq). individuais e coletivas, bem como salões de artes, tendo recebido menção honrosa no XIII Salão de Inverno de Artes Plásticas de Sant'ana do Livramento/RS, 2001.
Vinicio Giacomelli Mestrando em Ensino das Artes Visuais pela Universidade do Estado de Santa Cataria, UDESC. Bacharel em Artes Plásticas com ênfase em pintura pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1998). Tenho experiência na área de Artes e Cultura, atuando como gestor cultural e educativo de instituições culturais, como curador, tutor de ensino à distância EAD UFRGS. Artista Plástico. .295. ISSN: 2447-1267 Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
R E V I S T A
Santa Catarina, v.4, n.2, ano 2, dezembro de 2016.
ISSN: 2447-1267
.296.