ANÁLISE POLÍTICA, ECONÓMICA E SOCIAL NO ESPAÇO EUROPEU DEZEMBRO DE 2014 – ANO II – Nº 3 – DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
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EDITORIAL Para este mês de crónicas e opiniões da “Europa Hoje ao Meio-Dia”, escolhemos focar o tema da “transparência política”. Muito se fala hoje em dia em “transparência política”, não remetendo necessariamente para as premissas da honestidade, da corrupção e da hipocrisia. Pode-se muito bem debater a “transparência” através do prisma em que os vários agentes políticos adoptam uma certa postura perante o eleitorado. Ser “transparente” está mais próximo do conceito de verticalidade do que do radicalismo da criminalidade. Este deixemo-lo para um outro tipo de análise. Aqueloutro é o que verdadeiramente define o político e as políticas, bem como o seu real instinto para a gestão da coisa pública, sendo portanto o que nos interessa a todos nós, eleitorado e cidadãos desgastados com mentiras eleitorais, reflectidas em posterior incapacidade para o exercício da governabilidade de acordo com os interesses das pessoas. Nem sempre aquele que cumpre a Lei e as regras do jogo o faz de forma “transparente”. Tal e qual como um árbitro que num jogo de futebol marca uma grande penalidade encenada por um jogador espertalhão que se mandou ao chão, as pessoas continuam a ser permissivas com o sistema social, económico e político do qual estão prisioneiras, sendo cúmplices em penalidades marcadas em jogos que condicionam as suas próprias vidas, sem saberem o que podem fazer para o contrariar. Sabe-se que algo vai mal. Sente-se isso. Porém, não se consegue definir exactamente o quê. Torna-se difícil identificar a origem desse mal-estar que nos afecta de uma forma geral. Acredito que seja por isso que, na realidade, existem tão poucos textos que falam sobre a “transparência política”. Do muito que se escreve, maioritariamente fala-se antes na falta dela, até porque a bem da verdade, teremos que admitir que relativamente a este tema essa é a única coisa da qual temos certeza absoluta. Sensíveis a essa realidade, os autores dos textos seguintes esforçaram-se por transmitir as suas melhores reflexões sobre um assunto que muito mais terá para dizer. Votos de boas leituras!
Carlos Romeira
NOTA DE REDACÇÃO Se desejar enviar as suas sugestões poderá fazê-lo para o seguinte e-Mail: europahojeaomeiodia@gmail.com
FICHA TÉCNICA Direcção: Teo Cavaco e Carlos Romeira Ano II – número 3 – Dezembro de 2014 Distribuição Gratuita Publicação exclusiva em www.issuu.com
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A luta contra o tráfico de seres humanos no contexto da UE – por Júlia Tomás – A abertura recente das fronteiras, juntamente com a situação económica precária dos países da Europa de Leste, teve um efeito direto sobre o fluxo de tráfico de pessoas no continente.
O relatório do Eurostat de 2013 (1), que analisa os dados adquiridos de 2009 a 2012, constata que 61% das vítimas sinalizadas e identificadas (mulheres, homens e crianças) é proveniente dos Estados-Membros, sendo a maioria de origem romena e búlgara. O Eurostat constata ainda que 15% das vítimas são crianças e a maioria é do sexo feminino (80%). Cerca de 62% das vítimas são traficadas para fins de exploração sexual e 25% para fins de exploração laboral. A maioria das vítimas de exploração sexual é feminina (96% em 2010) e a maioria das vítimas de exploração laboral são masculinas (77% em 2010). De acordo com algumas estimativas, até 120 mil mulheres e crianças são introduzidas ilegalmente na Europa ocidental anualmente (Comissão Europeia, 2009). O tráfico de seres humanos (TSH) é expressamente proibido no artigo 5.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (2).
Em 2011 foi adotada a Diretiva 2011/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à prevenção e luta contra o TSH e à proteção das vítimas (3), que substituiu a DecisãoQuadro 2002/629/JAI do Conselho. Esta nova diretiva adotou uma definição mais ampla do fenómeno e redefiniu regras mínimas comuns para determinar as infrações. Ficou assim explícito que “a exploração inclui, no mínimo, a exploração da prostituição ou outras formas de exploração sexual; o trabalho ou serviços forçados (incluindo a mendicidade, a escravatura ou práticas equiparáveis à escravatura, a servidão, a exploração de atividades criminosas, bem como a remoção de órgãos). Existe exploração sempre que uma pessoa tenha sido coagida”. Acresce que sempre que uma vítima for uma criança, “estes atos de exploração devem ser considerados automaticamente como TSH”. A diretiva fixa pena máxima em, pelo menos cinco anos para a instigação ao TSH, o auxílio, a cumplicidade e a tentativa de cometer qualquer das infrações. Nos casos em que se verificam circunstâncias agravantes (infração contra vítimas particularmente vulneráveis, infração no quadro de uma organização criminosa, se a vítima tenha estado em perigo de vida, ou se a infração tenha sido cometida com especial violência), a pena máxima é de, pelo menos, dez anos. Relativamente à proteção das vítimas, “os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para garantir que seja prestada assistência e apoio antes, durante e após a conclusão do processo penal.” Mais, “as vítimas de tráfico humano devem ter acesso aos regimes de indemnização de vítimas de crimes intencionais violentos”. Além deste instrumento jurídico, a UE destaca-se pelo seu compromisso político na luta contra o TSH através de inúmeras iniciativas, medidas, publicações e programas de financiamento, demonstrando uma atitude proactiva. Esta postura enquadra-se perfeitamente na ideologia europeia cujo pano de fundo é, além do desenvolvimento económico e social, a proteção dos direitos humanos. ■
(1)Eurostat (2013) Trafficking in Human Beings. Bruxelas: União Europeia. (2)http://eurlex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2010:083:0389:0403:pt:PDF (3)Diretiva 2011/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011, relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas, e que substitui a Decisão-Quadro 2002/629/JAI do Conselho [Jornal Oficial L 101 de 15.4.2011].
A transparência na EU – parte I – por Teo Cavaco – "As assembleias estão tomadas por sapateiros, carpinteiros, ferreiros, tendeiros e até vendedores ambulantes, o que faz com que as pessoas de bom gosto e fortuna se afastem da vida pública, abandonando o campo da política às mãos dos demagogos e dos sicofantas (delatores profissionais) ". Sócrates, filósofo ateniense do século V a.C. que não nutria grande simpatia pela democracia
“Jacques Delors, alors Président de la Commission européenne, déclarait en 1988 que "vers l'an 2000, 80% de la législation économique, peut-être même fiscale et sociale, sera d'origine communautaire". De fait, les décisions communautaires font aujourd'hui l'objet d'intenses campagnes de lobbying. http://www.melchior.fr/Le-lobbying-aupres-des-institu.4937.0.html, consultado em 6 de dezembro, 2014
O primeiro lamento era corroborado pelos ricos e nobres, os quais sentiam que, desde que Elfíades tinha conseguido reduzir o poder do Areópago ateniense (espécie de senado vitalício e símbolo do poder dos aristocratas) e que Péricles tinha introduzido o pagamento em forma de subsídio a todo o cidadão pobre que participasse nas tarefas políticas das cidades (mistoforia, o misthos ecclesiastikós), dando a possibilidade a que também os cidadãos de origem humilde pudessem ter a sua atividade garantida nas assembleias, bem como exercer algumas das magistraturas, se estava a encetar um processo que iria necessariamente levar ao declínio das instituições.
A segunda afirmação, talvez aparentemente demasiado cruel, ajuda-nos a perceber que os mecanismos de decisão continuam a ser, não raras vezes, influenciados por interesses vários e nem sempre (quase nunca?) vantajosos para a maioria. A História repete-se, repete-se… O muito ténue equilíbrio entre a necessária participação de muitos, a fim de conferir representatividade às decisões, e a também necessária elevada qualidade destas, só (?) ao alcance das elites, tem sido, ao longo dos séculos, motivo de aceso debate e de teorizações várias. Como sabemos, o regime democrático, desde Atenas, no século V a.C., assenta em diversas instituições detentoras dos poderes básicos (o legislativo, que elabora e vota as leis; o executivo, que as executa e faz cumprir; e o judicial, que julga quem as não observa), instituições estas constituídas por cidadãos, os quais, 1) quando todos podiam participar diretamente no governo da polis constituíam uma democracia direta, ou 2) assente na ação de uns quantos, representantes do povo, uma vez que, gradualmente, o conceito de cidadania se foi alargando e universalizando, em género e condição social, o que inviabilizou a possibilidade de todos poderem ser eleitos. A esta limitação antiga da democracia (representatividade reduzida do total das pessoas os cidadãos eram cerca de 12% da população, deixando de fora da atividade política a maioria e levando a que os direitos desta nunca fossem reconhecidos) juntou-se outra, a de funcionar muito na base da oratória, na arte de bem falar, habilmente explorada por muitos discípulos de sofistas, excelentes oradores que conseguiam quase sempre influenciar as decisões da assembleia popular e condenar ao ostracismo (exílio de dez anos por crimes cometidos, visando sobretudo restringir a ambição e o poder excessivos) muitos adversários políticos. Temos, assim, nos últimos 2500 anos, procurado resolver uma equação muito difícil: ir construindo um regime no qual o maior número possível das pessoas participe nos assuntos da polis (protegendo direitos humanos fundamentais como a liberdade de expressão e de religião, o direito à proteção legal igual, e a oportunidade de organizar e participar plenamente na vida política, económica e cultural da sociedade), assegurando igualmente a responsabilidade no seu governo (alcançada através do uso de uma variedade de mecanismos — políticos, legais e administrativos), com o objetivo de impedir a corrupção e de assegurar que as autoridades públicas continuem responsáveis e acessíveis às pessoas a quem servem. No que ao processo de construção europeia, encetado após o final da II Guerra Mundial, este assunto diz respeito, é relativamente recente a preocupação pela existência de um registo de transparência, tendo este sido criado apenas em 2011, no seguimento dos sistemas de registo criados pelo Parlamento Europeu em 1996 e pela Comissão Europeia em 2008 - este Ato efetivou uma das vertentes da aplicação da Iniciativa Europeia em matéria de Transparência, lançada em 2007 pela Comissão Europeia. (continua)
(continuação) Assim, o registo de Transparência comum (Parlamento Europeu e Comissão Europeia) foi concebido com o objetivo de informar os cidadãos sobre as organizações e os trabalhadores independentes cujas atividades se destinam a influenciar os processos de tomada de decisões da União Europeia, fornecendo ainda um enquadramento a esta atividade através de um Código de Conduta e de um mecanismo de alerta que se destina a permitir detetar e tratar eventuais violações do código e incluindo também um Código de Conduta e um mecanismo de queixas em caso de suspeita de incumprimento deste código. Diz o artigo 11.º do Tratado sobre a União Europeia (UE) que as instituições europeias mantêm um diálogo aberto, transparente e regular com as associações representativas e com a sociedade civil, com o objetivo de otimizar a formulação e a execução de políticas europeias, mantendo relações regulares e legítimas com os principais interessados. Ora, vale a pena perguntar: as Instituições legislam a montante ou a jusante do problema? Por outras palavras: o Registo de Transparência, e respetivo Código de Conduta, aprovados na sequência de muitas organizações terem aberto “serviços europeus” em Bruxelas para exerceram uma “atividade de representação” (fazer valer os seus interesses e em influenciar o processo de tomada de decisões da EU – lobbying),
a) Legitimam a atividade (lobbying)? b) São abrangentes relativamente a todas as atividades do âmbito da sua aplicação? c) São eficazes, descansando os cidadãos em relação à bondade das decisões tomadas pelos seus representantes? d) São periodicamente avaliados e revistos?
Procuraremos, na segunda parte desta reflexão, responder a estas inquietações, recordando e desejando que o sonho da cooperação europeia mais estreita possa continuar a trazer crescimento e bem-estar duradouros, não podendo ficar cativo numa teia de interesses de uns quantos, por muito poderosos que possam parecer num determinado momento – é que, até agora, todos os Impérios caíram!... ■
Conselho da União Europeia Rue de la Loi / Wetstraat, 175 B-1048 Bruxelles/Brussel Belgique/België Tel: +32 2 281 61 11 É no âmbito do Conselho da União Europeia, conhecido informalmente como Conselho da UE, que os ministros de cada Estado-Membro se reúnem para adoptarem legislação e assegurarem a coordenação das políticas da UE.
Missão - Aprovar a legislação da UE - Coordenar as políticas económicas gerais dos países da UE - Assinar acordos entre a UE e países terceiros - Aprovar o orçamento anual da UE - Definir as políticas externa e de defesa da UE - Coordenar a cooperação entre os tribunais e as forças policiais dos países da UE
Parlamento Europeu Rue Wiertz/Wiertzstraat 60 B-1047 Bruxelles/Brussel Belgique/België Tel: +32 2 284 21 11 Diretamente eleitos de cinco em cinco anos por sufrágio universal, os deputados do Parlamento Europeu representam os cidadãos da UE. O Parlamento é, juntamente com o Conselho da União Europeia («o Conselho»), uma das principais instituições da UE com poderes legislativos. O Parlamento Europeu desempenha três funções principais: - Debate e aprova a legislação da UE (juntamente com o Conselho); - Exerce um controlo sobre outras instituições da UE, nomeadamente a Comissão, a fim de assegurar que funcionam de forma democrática; - Debate e aprova o orçamento da UE (juntamente com o Conselho).
Comissão Europeia Rue de la Loi / Wetstraat 170 B-1049 Bruxelles/Brussel Belgique/België Tel: +32 2 299 11 11 A Comissão Europeia é uma das principais instituições da UE. Para além de representar e defender os interesses da UE no seu conjunto, a Comissão prepara os projectos de legislação europeia e assegura a execução das políticas e dos fundos da UE.
Missão A Comissão representa e defende os interesses da UE no seu conjunto. Para supervisionar e executar as políticas da UE: - Propõe nova legislação ao Parlamento e ao Conselho; - Gere o orçamento e afecta os fundos da UE; - Garante o cumprimento da legislação da UE (em conjunto com o Tribunal de Justiça); - Representa a UE a nível internacional, incumbindo-lhe, por exemplo, negociar acordos entre esta e países terceiros.
Terá o pensamento europeu uma matriz própria? -- por Luís Monteiro -O Pensamento Europeu “soube receber os legados que lhe chegaram” (…), mas “por ter perdido nas últimas décadas o seu predomínio, transformou-se num processo incompleto que continua em construção”.
O Espaço Geográfico hoje entendido como Europa tem, na sua génese, proveniências de Civilizações de antanho, mormente Egípcia, Mesopotâmica, Hebraica, Persa, Grega, Romana - entre outras -, as quais influenciaram o Pensamento Europeu e, por essa razão, se Edgar Morin assevera na sua obra “Pensar a Europa”, que “… pode-se dizer que, num primeiro tempo, o islão faz a Europa, nela enclausurando a cristandade (século VII), e que, num segundo tempo, a Europa se faz contra o islão, ao fazê-lo retroceder em Poitiers (732)”, eu colocaria a questão de outra forma: - Não terá o Pensamento Europeu sofrido, também, ascendências (anteriores às dos Muçulmanos) dos grandes bandos de Alanos, Suevos e, posteriormente, dos Ostrogodos e dos Visigodos que nos deixaram como herança o Direito Visigótico? É indubitável que somos legatários de duas géneses, ambas concebidas entre o Eufrates e o Nilo, há vários milénios: o Egipto e a Mesopotâmia (constituída pela Suméria, pela Caldeia, pela Babilónia e pelos Assírios) por um lado e de onde emergiram o universo, os deuses e o homem, gradativamente gerados; e por outro, os Hebreus que adoptaram a existência de um Deus que, a partir de nenhures, criou o cosmos e o ser humano à Sua Imagem. Se na primeira forma de entendimento a Grécia Antiga vai colher percepções que, hodiernamente, ainda fazem mover o orbe terrestre e a sociedade global, a segunda maneira de compreender será a inspiração para a Revolução Cristã.
De todas estas Civilizações ancestrais, o hoje chamado Pensamento Europeu adquiriu conhecimentos sem fim, todavia, com o passar dos séculos e com todas estas proficiências alcançadas, a Europa continuou a não ter, no seu alvor, uma matriz singular. A Fonte Grega e o Princípio Latino afluem da sua periferia e são-lhe anteriores; a Origem Cristã advém da Ásia e só brotará na Europa no final do seu primeiro milénio. Todos estes primórdios serão revolvidos e agregados - na confusão dos povos conquistados, dos conquistadores, dos latinizados, dos germanizados e dos eslavizados -, antes de se agruparem e de se confrontarem. Se demandarmos o âmago da Europa no seu dealbar, só descobriremos uma consciência europeia efémera, dado que muitos foram os povos - do norte, do sul, da Ásia e do Médio Oriente -, que subjugaram este Espaço Geográfico, que o habitaram e que lhe deixaram não só as suas Culturas, como as suas raízes. Longo foi o percurso até que o Continente Europeu tomasse consciência que havia gerado um Pensamento próprio que deu “vida” ao mundo através de etapas extraordinárias (Idade Média, Renascimento, Iluminismo, Revolução Industrial e Científica, etc.) e se hoje em dia não podemos descrever a Europa em termos geográficos com exactidão, dada a não existência de fronteiras definidas a leste (e a actualidade continua a certificar tal), podemola expressar como uma noção política, económica, social, cultural, religiosa, etc., que soube ganhar contornos de relevância no mundo e que hoje em dia ainda é decisiva na tomada de importantes decisões a nível global, conquanto essa preponderância se esteja a esboroar devido a forças e interesses estranhos e, também, atendendo a uma condução política - ao nível dos mais elevados quadros governamentais europeus -, assaz pobre e nada carismática. Após a 2ª. Guerra Mundial, com a interferência dominadora da Cultura Americana na Europa, a qual conseguiu “cristalizar” a criatividade europeia, resta-nos uma questão fundamental: - Que é feito da hegemonia do Pensamento Europeu e do seu intervencionismo actuante no orbe terrestre (mesmo tendo em conta que em 1957 foi criada a Comunidade Económica Europeia)? O Processo de Globalização, aquele que fez os Países unirem-se em torno da União Europeia, é o mesmo que traz problemas e faz as Nações repelirem-se. Acontece que ao entrar num Bloco Económico - seja ele qual for - os Estados devem saber que precisam abdicar de alguns interesses por força de um desejo maior. O que resta agora, é observar o que pode ainda advir deste Processo Global e como a Europa conseguirá (ou não) superar os desafios que se apresentam e aproveitar a queda da supremacia Norte-Americana, para recuperar a sua preeminência de outrora e instalarse decisivamente no topo da Economia Mundial e da Cultura em particular. Ultimando e retomando o tema básico desta prédica, acrescentaria que o Pensamento Europeu, mesmo não tendo uma matriz própria, soube, com o decorrer dos séculos, receber os legados que lhe chegaram, desenvolvê-los, transmudá-los e enformar-se como Espaço relevante, porém, por ter perdido nas últimas décadas o seu predomínio, transformou-se num processo incompleto que continua em construção. Embora seja um Continente envelhecido em termos demográficos, é ainda, na sua forma de pensar e actuar, um imberbe que se deixa influenciar por valores que não são os seus e calcorreia, titubeante, a estrada que o conduz a milhas de lado algum. ■
Da transparência e do encandeamento, ou a justiça no país dos minimecos – por Pedro Esgalhado – O país dos minimecos é dado assim a efusões de júbilo por dá cá aquela palha, da mesma forma que dá mostras de apatia quando devia precisamente manifestar-se. Vem isto a propósito de, por uma daquelas coincidências que mais parecem bruxedo, que um ex-micromeco acaba a contas com a justiça precisamente na mesma altura em que exactamente o mesmo aconteceu num outro país que todos nós conhecemos (mas nunca citamos). Os paralelismos entre esse país e o dos minimecos são - neste caso como em quase todos - imensos. Vejamos se, contando todos os contornos de que é possível aqui o cronista lembrar-se, a coisa vos parece familiar: Aqui há atrasado, houve uma revolução no país dos minimecos para depor um regime hediondo e obscuro, para o substituir por um outro transparente, alegre, luminoso. Correram-se os horrificos algozes responsáveis pela atrofia cultural e económica anterior para os substituir por uma nova casta de gente impoluta e esclarecida (ou pelo menos assim se reclamavam, assim eram vistos os arautos da nova corrente). Vai daí, o país dos minimecos outorgou-se o epíteto de democracia e passou a falar-se livremente de tudo (ou quase), e a fazer-se praticamente tudo (e mesmo mais) e até eleições livres passou a ter.
O país dos minimecos passou do inferno ao paraíso atravessando uma "casa partida" chamada Confederação Faquioutu, onde recebeu não dois, mas sim quaquiliões de contos, dos quais os minimecos ainda viram alguma parte. Durante anos, o país dos minimecos viveu esse milagre que era o de comer e beber à tripa forra e gozar férias pagas, mesmo não produzindo a ponta de um... (bom: vocês sabem!). Os minimecos não estavam muito preocupados com o destino dos quaquiliões - para eles a coisa ia pingando e só por isso, quem prometesse deixar pingar mais, mereceria a sua confiança e seria eleito. Acontece que um dos eleitos, já na condição de ex-eleito, veio agora a cair na mão da justiça minimeca - diz-se que no mundo a Justiça tarda mas nunca falha e a justiça do país dos minimecos aí está a comprová-lo: tardou, mas parece apostada em não falhar. De permeio, ficaram muitos outros micromecos a quem se imputam pecados semelhantes ao deste e a quem a justiça deste país ainda não beliscou - acreditemos na asserção e tenhamos fé, esperança, e acima de tudo... muita paciência: quem já esperou de alguns a dezenas de anos, bem pode esperar outros tantos, isto porque reparar o mal feito é algo que já ninguém acredita possível. De permeio ficaram escutas destruídas e leis produzidas - leis que pretendem proteger os micromecos da má língua popular, ocultando-lhes rendimentos e benesses, perpetuando-lhes privilégios merecidos ou nem por isso. Isto da transparência tem limites e a justiça tem que guardar segredos. Sob o pretexto de que "todos os cidadãos são iguais perante a Justiça", vem a justiça do país dos minimecos e monta um espectáculo que bem prova que ela não é igual perante todos os cidadãos: este novo caso do micromeco agora engaiolado está sob os focos dos órgãos de mass-media. Ninguém vê nada para lá da cortina de luz. Estão todos encandeados e confundem toda esta luz com transparência. Não é. Como sempre (e não só no país dos minimecos, nem no tal outro) quando a justiça se quer mostrar, o julgamento faz-se na rua... Será isto transparência? Não sei. Primeiro, antes de mais, esperemos por resultados. Depois veremos... ■
Nota do Autor: Porque me foi solicitado, esclareço os leitores menos familiarizados com o povo de que fala a crónica e a sua envolvência, sobre a terminologia seguinte: Minimecos - cidadãos anónimos de um povo que muito se parece com um outro que todos bem conhecemos, mas que eu nunca cito. Micromecos - todos os minimecos que por qualquer via se guindaram a um patamar de decisão que lhes confere a capacidade de influenciar a vida dos restantes minimecos (normalmente, gente da política, mas também do mundo empresarial ou da alta finança) Confederação faquioutu - irmandade das costas voltadas constituída por cada vez mais países cujos interesses nem sempre são convergentes, nascida inicialmente para criar sinergias económicas e fomentar a cooperação, mas com resultados cada vez mais duvidosos (por razões que facilmente se percebem)
Política transparente não é política invisível – por Carlos Romeira – “Como se tem vindo a verificar, e pelas piores razões, esse problema de corrupção entre os órgãos políticos transnacionais é transversal a quase todos os Estadosmembros”
Tenho escrito poucos textos que se privam de uma reflexão crítica profunda. Este será um deles (ou quase), porque o que vem a seguir é apenas baseado em factos e não em especulações. Não precisamos de ser muito perspicazes para entendermos que algo tem ido muito mal no cenário político europeu. Neste momento parecem distantes os tempos em que olhávamos para a Itália de Berlusconi com um certo desdém e criticismo como se todos os rótulos de corrupção política se colassem apenas à “bota da Europa”.
Como se tem vindo a verificar nos últimos meses, e pelas piores razões, esse problema de corrupção entre os órgãos políticos transnacionais é transversal a quase todos os Estados-membros. Na Alemanha alguém foi preso por vender, com ilegalidades, alguns submarinos. O ex-Presidente da França, Nicolas Sarkozy foi detido para interrogatório, e ao recém-eleito Presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, foram apontadas responsabilidades no caso de branqueamento fiscal, à época em que ele fora Primeiro-Ministro do Luxemburgo. As suspeitas que recaíram sobre Juncker (e vamos lá ver como isso ainda há-de ficar) vieram preencher o cantinho do regozijo das vozes críticas da Esquerda política europeia. Mas enquanto ainda se ouviam réstias desses sorrisos, rebentava em Portugal o escândalo da detenção do também ex-Primeiro-Ministro José Sócrates, que tal como Juncker ainda não se sabe se é culpado (ou do quê) mas que veio alimentar de igual forma o “contentamento descontente” da Direita política mais crítica e partidarista. Se a Esquerda ri da Direita e esta da Esquerda, quem se ficou a rir de ambos foram as vozes separatistas que defendem o fim do projecto comunitário, por sua vez ligadas à extrema-direita (apesar de elas negarem esta conotação óbvia). Porém, desenganem-se aqueles que os julgam os “únicos puros” e que a corrupção é um problema que apenas fala “esperanto”, pois é público que a francesa Le Pen financiou o seu Partido com dinheiro “questionável” proveniente da Banca russa e o britânico Nigel Farage possui contas em Off-shore, nas Ilhas de Man. Não sendo uma imoralidade necessariamente uma ilegalidade, e não sendo uma detenção de um “mero suspeito” sinónimo de uma condenação em tribunal, o que é certo é que perante tanto fumo, certamente que haverá um grande fogo algures. O problema é que ninguém quer um incêndio na sua própria quinta e por isso vão apontando armas e canhões em todas as direcções, esquecendo-se do mais importante: apagar o fogo! Neste momento, a Europa possui uma política que presta especial atenção aos problemas relacionados com a corrupção generalizada, branqueamento de capitais, tráfico de influências e fuga fiscal. No entanto, pouco se tem mostrado em termos de medidas e posições efectivas nessa área, e para deixar os europeus descansados, não deveria apenas sê-lo, mas também parecê-lo. É certo que se deve preservar a separação dos poderes e não interferir nas decisões jurídicas, mas a União Europeia não pode promover políticas transparentes, praticando apenas políticas invisíveis. ■
Turismo, Portugal e economia europeia – por Paula Fernandes – Falar de Turismo é falar da Globalização, e na importância que o sector representa para a economia, que converge cada vez mais com o crescimento das sociedades e dos mercados. Os países que economicamente estão bem e “recomendam-se”, provocam um crescimento das deslocações das populações, seja em negócios, seja em lazer, influência positiva para as economias nacionais, especialmente as dos países receptores. No caso português, e analisando o 1º semestre de 2014, comparativamente com o homólogo de 2013, verificamos que houve um crescimento substancial no sector do turismo proveniente do estrangeiro, sobretudo o europeu. Segundo dados do INE, as unidades hoteleiras receberam cerca de 7,1 milhões de hóspedes que originaram 19,5 milhões de dormidas (+11,4% do que em 2013). O Reino Unido liderou o ranking dos países que originaram maiores fluxos, com cerca de 3,4 milhões de visitas (+12,4% em relação a 2013), à frente da Espanha, da Alemanha e da França, os países que se seguem na lista dos estrangeiros que mais visitam Portugal. Relativamente às receitas geradas pelo sector, estas atingiram cerca de 4 mil milhões de Euros (+385,1 milhões do que no 1º semestre de 2013, ou seja um aumento de 10,4%). Analisando os dados apresentados, concluímos que o turismo é na sua essência uma âncora para a economia portuguesa, se for promovido de forma sustentada, o que proporcionará ainda maiores benefícios de longo prazo às economias regionais do país, contando para isso com a multiplicidade da oferta de serviços: Hotelaria, Transportes, Entretenimento, Alimentação e o mercado de Bebidas. Portugal só tem a beneficiar, se a curto prazo efectivar parcerias nas redes de desenvolvimento do Turismo na Europa, explorar de uma forma mais alargada novos mercados, especialmente os europeus, não só apostando nos países chamados “clássicos”, mas também naqueles onde as suas economias estão emergentes. Promovendo e facilitando o Turismo, todo o processo de integração dos vários Estados-membros é também mais abrangente, beneficiando-se consequentemente, da troca e partilha de tradições, cultura e patrimónios. Termino com um excerto do texto da Directiva Comunitária P7_P7_TA(2011)0407, emanada do Parlamento Europeu (PE), com base no relatório de iniciativa intitulado «A Europa, primeiro destino turístico do mundo» (o primeiro depois do Tratado de Lisboa) : “Apoiando a estratégia política da Comissão, centrada em 21 acções, o PE pretende relançar um turismo competitivo, moderno, de elevada qualidade e sustentável, assente na dimensão multicultural da Europa e acessível a todos. Os deputados sublinham a importância das medidas tomadas noutros domínios, susceptíveis de terem um impacto determinante no turismo, como o emprego, os impostos e os direitos dos consumidores.” ■
O ideal europeu e o futuro - uma incógnita – por Pedro Esgalhado – Não sei quantos se lembram, mas na minha meninice um dos hábitos de utilidade e gosto mais questionáveis em uso por portugueses (e espanhóis) era o de complementar a decoração que um automóvel trazia de fábrica, aplicando-lhe autocolantes dos mais diversos. (Estávamos na década de 70 e a partir do final da de 80 o hábito começou a perder-se). Um desses autocolantes era uma elipse bordejada de bandeiras de países europeus, com duas letras a preto em fundo branco: EU – Europa Unida. O ideal já então existia e para os pais de família desse tempo – muitos deles nascidos antes do horror da 2ª Grande Guerra – a ambição do eldorado económico ali ao cruzar da fronteira e a abertura política e cultural (para os mais esclarecidos) era um sonho a perseguir. Na minha puerilidade de então, sem nunca ter percebido bem as implicações que uma entidade assim poderia trazer, o que me atraía na ideia radicava nas minhas manias de grandeza – é claro, sabia que tínhamos um império ultramarino, que nesse tempo a descrição de todas as províncias (colónias, se preferirem) faziam parte do programa de ensino da primária. A primária hoje chama-se ensino básico, e embora a realidade seja a mesma, parece-me que se aprende menos que então, não por culpa dos professores, mas das políticas adoptadas. À parte isto, o império era uma realidade distante. E nem a possibilidade da guerra – que para mim era ainda mais distante, porque aos 10 anos de idade, os 10 anos seguintes parecem sempre a própria eternidade – se me afigurava como o meio para o vir a conhecer de perto. Por esse motivo, mais que o Império que então detínhamos, a hipótese de se fazer uma mega-união da qual fizéssemos parte parecia-me atraente. Aos 10 anos de idade é fácil termos ideais de grandeza, mas muito difícil perceber de política internacional ou de relações internacionais... Com o passar dos anos, perdeu-se a mania dos autocolantes e perdeu-se também o império. Menos mal que perdi também esses ideais de grandeza, ou não sei se aguentaria tanta perda (mesmo já tendo outro estofo). Em aparente compensação, o ideal da Europa Unida ganhou corpo - um corpo iniciado a partir da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, que foi sendo sucessivamente alargado a partir dos anos 70 e ao qual Portugal aderia já a meio da década de 80. Para este país, a entrada na então CEE era o equivalente ao reaparecimento de D. Sebastião. Era a chegada do tubo de respiração à mina soterrada. Era a luz ao fundo do túnel (o raio do túnel é que parece muito mais comprido do que então se julgava e a luz tem esmorecido aos poucos). (cntinua)
(continuação) Foi, em termos económicos, um verdadeiro jackpot: Portugal começou a ver jorrarem milhões atrás de milhões e nem precisava de trabalhar para continuar a recebê-los. Aliás, em muitos casos tinha era que parar de trabalhar para continuar a receber. Noutros casos, bastava tão somente dar o ar de reestruturar a produção para receber, ainda que tudo não passasse de uma fraude. Em poucos anos, Portugal permitiu-se modernizar infraestruturas, mas ficou-se por aí. A melhor oportunidade da história do país para der o salto para a modernidade foi esbanjada em bens de consumo, em bens não transaccionáveis e em mecanismos de corrupção sem igual. Como a grande maioria dos “excêntricos” do euromilhões, Portugal tornou-se um insuportável novo-rico e está à beira de regressar à sua habitual condição de velho pobre. Entretanto, os tradicionais mecanismos de produção e a velha forma de vida foram destruídos, o que pode provocar que fiquemos pior do que estávamos antes. Nisto, a radiosa União continuou a crescer e já são 28 os países aderentes. O mito sobrevive e parece contradizer os cépticos.
Mas por mais forte que seja uma aliança, existe uma velha máxima em relações internacionais que postula que “as nações não têm amigos: têm interesses!” – quantos mais países, mais interesses e esses interesses nem sempre são conciliáveis porque, sem surpresas, muitos deles competem entre si. Este crescimento da EU pode muito bem vir a ditar a sua morte. Veremos. Para já, a União tem vários problemas para resolver – quiçá o novo presidente terá a força que o seu antecessor nunca teve (deixemo-nos de coisas: foi escolhido para ser uma figura de proa simpática, mas nada mais). A tão falada “crise económica mundial” é bastante mais profunda do que apenas um problema de crescimento económico: ainda existem mercados para escoamento de produtos europeus, mas as brechas de penetração nesses são cada vez mais estreitas e o que eles pagam pelos nossos produtos é cada vez menos. O primeiro pilar da construção europeia está fortemente dependente da capacidade de ultrapassar o problema económico. Já para não falar de muitos outros vectores deste mesmo pilar cujo acordo das 28 actuais nações não será fácil de conseguir. O segundo pilar ainda é mais complexo: Política Externa e de Segurança Comum – esta é uma área sensível cujo acordo e linearidade não poderá ser conseguido sem convencer os estados-membros a abdicar de parte da sua soberania neste domínio – algo que para países pequenos e indefesos como o nosso não é chocante (afinal de contas, dependemos dos aliados para a nossa segurança e defesa), mas que deverá ser próximo do inaceitável para as nações de maior porte económico e militar. O terceiro pilar, ainda que do interesse de todos no geral, não será mais simples no que respeita aos detalhes: conseguir a “Cooperação policial e judiciária em matéria penal”, não só irá exigir alterações constitucionais em muitos países, como se arrisca a que a montanha venha a parir um rato – dois dos vectores deste pilar respeitam, por exemplo, ao crime organizado e à corrupção, áreas em que países como Portugal, a Grécia ou mesmo a Itália nunca demonstraram uma vontade efectiva de atacar. Em resumo, e depois das mais recentes crises económicas em que se revelou o significado real da solidariedade entre estados-membros (os que têm não querem pagar indefinidamente para os que não têm, e os que não têm entendem que a generosidade dos demais é uma obrigação que lhes incumbe), a continuidade do ideal está, mais do que nunca, ameaçada. No actual estágio de desenvolvimento da organização, não se adivinha que ela se desmembre assim de repente… mas a sua conversão para uma organização irrelevante como as Nações Unidas não é impossível. Aguardemos… ■