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Campinas, 11 a 24 de abril de 2016 - ANO XXX - Nº 652 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
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CORREIOS
FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT Imagem: Divulgação
O cheiro do ódio 3
Pesquisa coordenada pelo professor Fabio Papes, do Instituto de Biologia, descobriu uma população de neurônios no nariz de camundongos, fornecendo pistas que podem explicar determinados comportamentos humanos. Na investigação, que teve a participação do doutorando Thiago Nakahara, os neurônios dos animais foram associados a massacre de filhotes por machos adultos. O trabalho foi publicado no periódico internacional BMC Biology.
Na imagem de microscopia, realizada com o auxílio de uma sonda molecular específica, a luz vermelha florescente mostra as células descobertas pelos cientistas em roedores de laboratório: novos neurônios sensoriais
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Opções para o controle microbiológico na água Ética e cidadania na Retórica de Quintiliano
Metástase é tema de edição da ‘Science”
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Qual é o impacto dos ‘dias da consciência’?
Para um armazenamento seguro de dados em nuvens O ingresso do circo nas grades curriculares
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América do Sul foi povoada em duas etapas
TELESCÓPIO
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Acaso e modernidade no teatro de Roberto Gomes
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TELESCÓPIO
CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br Foto: ESA/Rosetta/NAVCAM/Divulgação
Cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko, onde foram detectadas moléculas orgânicas por sonda da Agência Espacial Europeia
difuso em que se encontra o Sistema Solar originou-se a partir de 14 a 20 supernovas dentro de um grupo em movimento”, escrevem os autores. “Aqui, descrevemos cálculos das trajetórias e massas mais prováveis das progenitoras dessas supernovas, o tempo e o local das explosões “.
Compreensão gera atração
Ingrediente da vida Ribose, um açúcar essencial para a estrutura do RNA, pode ser produzido no espaço por meio da irradiação de pedaços de gelo cósmico com a luz das estrelas, afirma artigo publicado na revista Science. “A ribose é a subunidade molecular central do RNA, mas sua origem abiótica é desconhecida”, lembram os autores, vinculados a instituições da França, México e Dinamarca. O RNA é essencial para a vida como existe na Terra, e cientistas acreditam que essa molécula pode ter desempenhado um papel fundamental na própria origem da biosfera. O artigo prossegue: “Observamos a formação de quantidades substanciais de ribose e de uma diversidade de açúcares estruturalmente relacionados” entre os resíduos orgânicos obtidos em um gelo, produzido em laboratório, análogo ao existente no espaço interestelar, depois de o material ter sido tratado com radiação ultravioleta e aquecido. Esses resultados, lembram os autores, são consistentes com análises da superfície glacial do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko, feitas pela sonda espacial Philae. Nota divulgada pela Science destaca que o resíduo orgânico produzido pela irradiação do gelo é solúvel em água, uma constatação importante para o campo da astrobiologia.
Humanos na América do Sul A disseminação dos seres humanos pela América do Sul – o último continente habitável alcançado por nossa espécie – ocorreu em duas fases distintas, diz artigo publicado na revista Nature. Com base em dados de carbono-14 de mais de mil sítios arqueológicos, pesquisadores da Universidade Stanford deduziram que uma primeira onda de expansão populacional ocorreu há 14 mil anos. Essa onda, no entanto, não gerou um crescimento exponencial, mas sim uma série de assentamentos de população baixa, situação que se manteve por oito mil anos, incluindo um período de quatro milênios em que a população sul-americana viveu ciclos rápidos de explosão e colapso, sem crescimento líquido.
A segunda onda, com crescimento exponencial e sustentado da população humana, teve início por volta de 5,5 mil anos atrás: nos três mil anos seguintes, o número de pessoas no subcontinente cresceu três vezes. Os autores especulam que esse crescimento foi possibilitado pelo aumento do sedentarismo e pelo avanço da agricultura.
Especial metástase A revista Science da última semana traz uma seção especial sobre câncer, com foco em metástases. Um editorial específico propõe uma maior cobertura, no sistema público de saúde, para exames de perfil molecular de células cancerosas. Reportagem avalia a hipótese de que tumores produzem “exomas”, vesículas portadoras de moléculas que se espalham pelo corpo e podem tornar outros órgãos mais propensos ao câncer. Uma revisão da literatura analisa os estudos sobre as diferenças genéticas entre tumores primários e suas metástases. Outros trabalhos tratam de diferentes aspectos da doença, incluindo a resistência à quimioterapia.
Estrelas mortas Átomos de um isótopo de ferro encontrados na crosta terrestre, no fundo do mar, indicam que pelo menos uma estrela explodiu na nossa vizinhança há 2,2 milhões de anos, de acordo com trabalho publicado na revista Nature. Pesquisadores da Alemanha e de Portugal criaram um modelo do transporte de Ferro-60, um isótopo produzido na explosão de supernovas, até a crosta marítima da Terra. Eles concluíram que a distribuição e a abundância do material são melhor explicadas pela detonação de duas estrelas, a 2,3 milhões e 1,5 milhão de anos atrás. A estrela mais próxima, localizada a 90 parsecs (293 anos-luz) teria uma massa 9,2 vezes maior que a do Sol e a mais distante, a 100 pasecs (326 anos-luz), 8,8 massas solares. “A Bolha Local de plasma quente e
Sermos capaz de compreender, facilmente, como uma pessoa se sente aumenta a atração que sentimos por ela, diz estudo publicado no periódico PNAS. “Seres humanos interagindo com outros seres humanos precisam ser capazes de entender as motivações e afetos do parceiro de interação, frequentemente sem troca de palavras”, escrevem os autores, de instituições alemãs. Na realização da pesquisa, pediu-se a 92 voluntários do sexo masculino que assistissem a clipes de vídeo representando mulheres em diferentes manifestações de emoção. Os voluntários deveriam descrever qual a emoção representada, e qual o nível de confiança que tinham na descrição feita. Para determinar o nível de atração, pediu-se aos homens que ajustassem o “zoom” de uma foto de cada mulher até uma distância que lhes parecesse “confortável”. Houve correlação entre o grau de confiança na descrição da emoção e o índice atratividade. Além disso, os pesquisadores submeteram os voluntários à ressonância magnética funcional do cérebro, e descobriram que os níveis elevados de certeza quanto à descrição emocional e o alto índice de atração correlacionavam-se também à ativação de áreas de recompensa do cérebro.
‘Dia da Consciência’ conscientiza? O uso de datas comemorativas – os chamados “dias da consciência” – para chamar a atenção do público em geral para questões sociais ou de saúde tem se tornado cada vez mais comum, mas a pesquisa sobre o impacto real dessas celebrações sobre a atitude e o comportamento da população ainda é inconclusiva. Agora, um artigo de pesquisadores da Universidade Estadual de San Diego (EUA), publicado no periódico online JMIR Public Health and Surveillance, sugere que pelo menos uma dessas datas – o Grande Dia Americano sem Tabaco, comemorado nos Estados Unidos na terceira quinta-feira de novembro – tem um efeito notável, ao menos no mundo virtual. Os autores vêm monitorando a mídia e a atividade online dos americanos nessa data desde 2009, e detectaram um aumento significativo da busca por informações sobre como parar de fumar no Google e na Wikipedia, bem como uma disseminação maior de mensagens motivacionais a respeito no Twitter, durante o Grande Dia, em comparação com datas normais. “Comparado ao que seria de se esperar num dia normal, o Grande Dia Americano sem Tabaco tipicamente coincide com um aumento de 61% nas notícias sobre parar de fumar e um aumento de 13% nos tuítes estimulando o fim do hábito”, diz nota divulgada pela universidade.
Incertezas sobre o futuro da água Pesquisadores europeus reconstituíram as relações entre clima e disponibilidade de água no Hemisfério Norte ao longo dos últimos 1.200 anos, usando quase duas centenas de bases de dados sobre chuvas, secas, sedimentos marinhos, anéis de crescimento de árvores, núcleos de gelo e outros indicadores. Publicado na revista Nature, o estudo diverge, em seus resultados, das previsões sobre a relação entre água e clima feitas nos modelos climáticos para o século 20. Modelos que levam em conta a mudança climática causada pelo excesso de CO2 na atmosfera preveem uma radicalização das condições hidrológicas, com chuvas e secas cada vez mais intensas, mas a reconstituição não apoia essa conclusão. “Comparamos as anomalias do hidroclima reconstituído com as simulações de modelos da circulação acoplada da atmosfera e do oceano, e encontramos uma concordância razoável para o período pré-industrial”, diz o texto. “No entanto, a intensificação das anomalias médias hidroclimáticas no século 20” apontada pelas simulações atuais “não tem apoio na nossa reconstituição”. Em comentário que acompanha o artigo europeu, o pesquisador americano Matthew Kirby, da Universidade da Califórnia, chama atenção para as incertezas que ainda cercam os modelos da relação entre clima e disponibilidade hídrica. “Não há dúvida de que o aquecimento global vai mudar o ciclo da água na Terra”, escreve. “Quanto mais soubermos sobre o comportamento do ciclo no passado (...) mais confiança teremos nos modelos preditivos”.
Transplante entre espécies O campo polêmico dos xenotransplantes – que pesquisa a viabilidade do uso dos órgãos de animais de uma espécie em outra – bateu um novo recorde, informa artigo no periódico Nature Communications: um coração de porco ligado ao corpo de um babuíno manteve-se vivo durante mais de dois anos, graças a uma nova terapia imunossupressora. Xenotransplantes são estudados como uma opção para a escassez de órgãos humanos para transplante. No experimento descrito, o coração do porco não substituiu o do primata, mas apenas foi conectado a seu sistema circulatório. Os porcos usados haviam sido geneticamente modificados para obter um alto grau de tolerância imunológica nos babuínos. Ao todo, cinco primatas receberam corações “extras” de porco, e os órgãos transplantados sobreviveram pela duração da terapia de modulação imunológica.
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Animais dão pistas sobre comportamentos humanos Foto: Divulgação
CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br
ientistas da Unicamp deram um passo importante para compreender como a troca de sinais entre animais age para desencadear comportamentos, emoções e influenciar interações entre indivíduos, com possíveis implicações para a espécie humana. Em artigo publicado no periódico internacional BMC Biology, o doutorando Thiago Nakahara e seu orientador, o professor Fabio Papes, do Departamento de Genética e Evolução do Instituto de Biologia (IB), descrevem a descoberta de uma população de neurônios no nariz de camundongos associada ao infanticídio – o massacre de filhotes por machos adultos que ainda não iniciaram a vida sexual. “No camundongo, os machos virgens, que ainda não tiveram relação sexual com a fêmea, são agressivos contra filhotes, que, claro, não são deles, são de outros machos”, explicou Papes. Em uma população desses animais, 70% dos machos virgens matam filhotes alheios, segundo detalhado pelo professor. “É um comportamento que depende da troca de sinais químicos, de odores que são liberados pelos filhotes e (...) detectados pelo macho virgem”. A função biológica do infanticídio é bem clara, disse o pesquisador: “O macho virgem elimina os filhotes alheios, aqueles contendo genes de outros machos”. Ele explica ainda que esse é um comportamento adaptativo, que cumpre uma função evolutiva, pois elimina filhotes de outros machos e aumenta a chance do perpetrador transmitir seus próprios genes à geração seguinte.
Na imagem de microscopia, assinaladas em preto, as novas células sensoriais descobertas na cavidade nasal de roedores de laboratório
Foto: Antoninho Perri
SEXO, IDADE E RNA
O artigo na BMC Biology, que também tem como coautores pesquisadores baseados no Reino Unido e nos Estados Unidos, chama atenção para o fato de que as células sensoriais descobertas na Unicamp são as primeiras já identificadas com uma relação molecular específica com a detecção de filhotes. Além disso, são os primeiros neurônios olfativos encontrados a terem atividade diferenciada de acordo com o sexo e o status social do animal, já que a reação violenta desencadeada não acontece em fêmeas, nem em machos que já tenham iniciado a vida sexual. “O comportamento que estudamos é instintivo, gerado no animal sem nenhuma exposição prévia. Os animais utilizados no estudo, os machos virgens, não haviam tido contato com filhotes anteriormente. São comportamentos que aparecem sem aprendizado e sem memória prévia”, disse Papes. Os neurônios foram descobertos no interior de um órgão presente na cavidade nasal do camundongo, chamado órgão vomeronasal. “Começamos esse estudo utilizando uma abordagem moderna, o sequenciamento de RNAs, para encontrar quais genes são expressos nesse órgão sensorial”, relatou o pesquisador. Todas as células do corpo de um animal têm o mesmo DNA: é a forma como os genes se expressam que diferencia, por exemplo, as células da pele das de um órgão interno. E o produto imediato da expressão do DNA são moléculas de RNA, que depois vão controlar a produção de proteínas. “Os neurônios que estudamos têm uma característica funcional especifica, são neurônios sensoriais olfativos, que detectam odores. Nesses neurônios, de todos os genes que existem no genoma do camundongo, apenas alguns estão funcionando, e conseguimos saber quais são, avaliando o RNA”, descreveu Papes. Após o sequenciamento dos RNAs, a equipe teve acesso a todos os genes expressos nos órgãos olfativos, e foi assim que descobriram alguns neurônios sensoriais caracterizados pela expressão de um gene, até então desconhecido, de receptor de odores.
MISTÉRIO
Determinar o papel desses receptores até então desconhecidos passou a ser o foco da pesquisa, iniciada no mestrado de Thiago Nakahara: “O primeiro passo foi descrever esses neurônios: quem são as células que expressam esses genes? Quantas células existem por indivíduo? E, principalmente, qual é a função dessas células?”, exemplifi-
O pesquisador Thiago Nakahara e (à esquerda) e o professor Fabio Papes, coordenador das investigações artigo publicado no periódico ‘BMC Biology’
cou Papes. “Essa talvez seja uma das tarefas mais laboriosas, complicadas que há na biologia: encontrar algo novo em um ser vivo e se fazer a pergunta ‘Para que isso serve, qual sua função?’ ” “Testamos estímulos conhecidos para esse órgão vomeronasal, como por exemplo o cheiro do sexo oposto: expus o macho à fêmea, a fêmea ao macho, expus um macho a outro (macho), para ver se essa população neuronal era ativada. E testei outras coisas ainda, como estímulos fobiogênicos, causadores de medo, como odor de cobra e odor de gato”, relatou Nakahara. “E nenhum desses foi capaz de ativar essa população sensorial. Também testei moléculas que não são relacionadas a esse órgão específico, mas com o sistema olfativo principal do organismo: vários odorantes comuns. Sem resultado”. Um dos passos executados pela equipe do professor Papes foi determinar se essas células receptoras já estavam presentes mesmo na infância dos animais. “Com a maior parte dos receptores olfativos, isso é verdade: eles são expressos já durante o desenvolvimento embrionário”, disse Papes. “Quando o animal nasce, ele já está com grande parte do repertório sensorial pronto. Faz sentido: já está preparado para responder ao mundo”. “Mas, com relação a essas células específicas, algo surpreendente aconteceu: elas não estão presentes quando o animal nasce, elas aparecem apenas quando o animal se torna adulto”, acrescentou. “Então, trata-se de uma população de células diferente, de um receptor que é diferente de todos os outros conhecidos. Essas células só estão presentes no adulto, não nos filhotes e nem no desenvolvimento embrionário”.
DESMAME OU AGRESSÃO
A presença de um padrão temporal de expressão de um gene pode estar relacionada à sua função. “Faz sentido levantar uma hipótese sobre o papel dessas células atuando de alguma forma distinta em adultos e filhotes”, disse Papes. “Com isso em mente, levantamos algumas hipóteses”.
“Uma hipótese é que poderia estar relacionada à detecção de leite, levando à geração de algum tipo de repugnância a ele”, exemplificou Thiago. Segundo o grupo, esta ideia faz sentido, pois em determinado momento durante o desenvolvimento os filhotes param de procurar a mãe e buscam alimento por conta própria. Talvez porque o cheiro do leite se torna desagradável? “Essa foi uma possibilidade”, relatou Papes. “Será que esses receptores, no adulto, estão envolvidos no desmame? Eles passam a detectar o leite como um sinal ruim?” Entretanto, este também não foi o caso: o grupo não encontrou ativação das novas células pelos odores do leite obtido de fêmeas lactantes de roedores. Por fim, depois de testar outras possibilidades que distinguem filhotes de adultos, como o comportamento sexual, os pesquisadores levantaram a hipótese de que as células olfativas descritas no estudo detectam odores de filhotes. Já se sabia que, na maioria dos animais, os comportamentos exibidos pelos pais em relação aos filhos dependem de odores, tanto o comportamento de cuidado exibido pelas mães (e algumas vezes pelos pais), como o comportamento agressivo dos machos virgens em direção aos filhotes. “O indivíduo, uma vez estabelecida a maturidade, mas quando ainda é virgem, vai matar os filhotes que encontrar”, lembrou Thiago. “Mas um indivíduo que já teve seus filhotes passa a não matar os jovens, ainda que sejam de outros machos”. Por fim, a análise do órgão vomeronasal de machos virgens expostos, com reação agressiva, a filhotes revelou a ativação das células estudadas. Os neurônios ativos foram visualizados na cavidade nasal pela identificação de um gene que é sempre expresso em células sensoriais ativas, o que só ocorreu em machos virgens na presença de odores de filhotes.
FUTURO
“O único contexto em que as células que o Thiago descobriu são ativadas é em machos virgens. Os pais não exibem ativação
Pesquisadores descobrem população de neurônios no nariz de camundongos dessas células, nem as fêmeas, mães ou virgens. E, como ele disse, esse é um contexto em que há comportamento infanticida, agressivo. Há uma boa correlação aí”, disse Papes. “Quando não há o comportamento, como em pais, mães ou fêmeas virgens, o órgão está silente. Os neurônios continuam lá, eles estão presentes nas fêmeas, por exemplo. Mas não estão ativados de modo algum”. Por outro lado, em situações onde o comportamento agressivo é gerado, as células estudadas são ativadas. “O próximo passo é estudar por que isso acontece”, afirma o professor. “A segunda coisa que pretendemos fazer no futuro é investigar o que ocorre quando removemos as células que descobrimos”, prosseguiu. O grupo do professor Papes, em colaboração com o Dr. José Xavier Neto, do Laboratório Nacional de Biociências (LNBio-CNPEM), vizinho à Unicamp, gerou um camundongo transgênico que não tem esses receptores. “Vamos avaliar qual mudança comportamental acontece”, afirma. Papes lembrou que o laboratório já tem acesso a um camundongo transgênico em que todos os neurônios sensoriais do órgão vomeronasal estão desativados. “Esse camundongo tem uma série de defeitos comportamentais, uma série de comportamentos que ele não executa direito: por exemplo, o comportamento de discriminação dos gêneros é afetado. O macho não cruza apenas com fêmeas, mas também com machos, e o comportamento das fêmeas também se modifica, pois passam a buscar ativamente os machos e a copular entre si”, descreveu Papes. O grupo demonstrou que machos virgens desses camundongos mutantes não praticam infanticídio. Em seu doutorado, Thiago estuda o mecanismo de modulação do olfato por hormônios. “Nos indivíduos que já tiveram ninhada, a população sensorial que descobrimos é desligada. As células estão presentes lá, posso detectá-las, mas elas não são ativáveis pelos filhotes. Por quê? Será um mecanismo que tem a ver com a experiência sexual, que libera hormônios?”, exemplifica o aluno. “Por que as células que detectam os filhotes não estão funcionais, ou não estão desempenhando o papel de criar uma resposta comportamental nos indivíduos que foram pais, e nem nas fêmeas? Qual mecanismo faz essas células desligarem?”
HUMANOS
O orientador disse acreditar que esses resultados podem ter implicações para o estudo dos sistemas sensoriais humanos. “O órgão vomeronasal foi descrito pela primeira vez em seres humanos”, disse. “É conhecido como órgão de Jacobson”, o nome do anatomista que o descreveu, Ludwig Lewin Jacobson (1783-1843). “Muito pouco é conhecido sobre a troca de sinais químicos que existe entre pais, mães e filhos”, acrescentou. “Como no caso humano os sistemas visual e auditivo são os principais sistemas sensoriais, assume-se que a maior parte dos sinais trocados entre as crianças e seus pais passa por esses sistemas. Mas é uma pressuposição sem nenhum tipo de comprovação científica. É possível que as trocas de sinais sejam muito mais extensivas, incluindo, até mesmo, odores. O sistema sensorial olfativo humano é presente, tão complexo quanto no caso dos camundongos, e há evidências de que afeta comportamentos e emoções”. Ele cita como exemplo um estudo clássico, publicado em 1995, no periódico Proceedings of the Royal Society of London, de autoria de Claus Wedekind, que demonstrou que mulheres preferiam o cheiro de camisetas que tinham sido usadas por homens com características do sistema imune diferentes das delas. Segundo Papes, tal fenômeno tem significado biológico, já que mulheres que têm filhos com homens geneticamente diferentes delas mesmas terão filhos com sistema imune mais eficiente. Segundo o professor Papes, outras mudanças comportamentais derivadas da atuação do sistema olfativo podem estar em operação em humanos, inclusive nas interações entre pais e filhos, tema que, ele acredita, representará um importante campo das neurociências nas próximas décadas.
4 Campinas, 11 a 24 de abril de 2016 Foto: Antonio Scarpinetti
Biocidas e membranas de quitosana são opções para controle microbiológico Se o controle microbiológico não for eficaz, até a água do chuveiro pode causar contaminação
Estudo considera viável o uso associado de materiais em sistemas de distribuição de água Foto: Divulgação
MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br
uso associado de biocidas e membranas de biopolímeros é uma alternativa viável ao controle microbiológico de sistemas que envolvem a distribuição de água, em substituição a produtos mais agressivos, que podem causar danos ao ambiente e comprometer a sustentabilidade. A conclusão é tese de doutorado da farmacêutica bioquímica Raquel Vannucci Capelletti, defendida na Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp, sob a orientação da professora Ângela Maria Moraes. De acordo com a autora, o estudo abre uma ampla gama de aplicações para esta estratégia, principalmente a partir da combinação de biocidas com membranas de quitosana. De acordo com Raquel, os micro-organismos estão presentes na Terra muito antes do surgimento da espécie humana. E é muito provável que sobrevivam a ela. Esses seres microscópicos podem ser encontrados nas mais variadas superfícies na natureza, assim como nos processos industriais concebidos pelo homem. Colônias deles podem se concentrar em interfaces úmidas na forma de filmes, formando o que os especialistas denominam de biofilmes. Estes podem ser encontrados, por exemplo, na superfície dos dentes ou em tubulações de água de indústrias, residências e hospitais. A presença dos biofilmes nesses locais, observa Raquel, pode acarretar a propagação de agentes patogênicos para todo o ambiente, provocando eventualmente a contaminação de pessoas. “A presença de biofilmes em tubulações de água de hospitais, por exemplo, pode ser decisiva para a disseminação de doenças infecciosas, principalmente entre pessoas que estejam com o sistema imunológico debilitado, como é o caso de pacientes internados em UTIs. Por hipótese, essa contaminação pode se dar até mesmo no momento do banho, por meio da água do chuveiro”, alerta. No caso de uma indústria alimentícia, prossegue a autora da tese, os biofilmes podem se desenvolver na superfície de tanques e tubulações responsáveis pelo processamento ou transporte dos alimentos, causando sérios riscos de contaminação ou de dano a equipamentos. Uma das maneiras de promover o controle microbiológico é a realização de procedimentos constantes de limpeza e sanitização. Uma das estratégias mais utilizadas é a aplicação de biocidas, substâncias com ação germicida. “Ocorre que o uso indiscriminado desses produtos para combater a atividade microbiana pode gerar culturas resistentes e causar corrosão em tubulações”, observa Raquel. A pesquisadora destaca que a eliminação de biofilmes dos ambientes industriais, hospitalares e residenciais não é uma tarefa trivial. Embora esse tipo de procedimento possa ser feito com 100% de eficácia, nem sempre é recomendável que a erradicação dos micro-organismos seja completa, tanto por causa dos custos envolvidos, quanto por questões técnicas. “Alguns processos industriais podem conviver com pequenos agrupamentos de biofilmes. Entretanto, vale reforçar, pacientes com o quadro de saúde debilitado ou que utilizem próteses ou cateteres correm maiores riscos frente aos biofilmes”.
Segundo Raquel Capelletti, autora da tese, o controle microbiológico é importante para evitar a propagação de agentes patogênicos em ambientes como hospitais e indústrias
A água, lembra Raquel, é um composto essencial ao desenvolvimento dos seres vivos, inclusive dos micro-organismos. “Em outras palavras, onde houver água haverá atividade microbiana. Dependendo das condições desse meio aquoso, podemos ter maior ou menor quantidade de micro-organismos dispersos ou associados”, explica. Em sua pesquisa, Raquel promoveu o uso combinado de biocidas comerciais com membranas de biopolímeros com o objetivo de prevenir a contaminação pelos biofilmes. “Utilizamos biocidas de referência com ação preservante [duradoura] e sanitizante [efêmera]”, informa. Quanto às membranas de biopolímeros, a pesquisadora utilizou materiais desenvolvidos no Laboratório de Engenharia de Biorreações e Colóides da FEQ. Foram testadas membranas produzidas com quitosana [substância obtida a partir da quitina, presente na carapaça dos crustáceos, notadamente caranguejos e camarões] e com alginato [cujas principais fontes são
algumas espécies de alga], ambos de baixa toxicidade a humanos. A quitosana, por si só, apresenta apreciáveis propriedades antimicrobianas em determinadas condições de uso. Já o alginato tem atividade mais limitada. “Durante os testes, foram cumpridas diversas etapas. Primeiramente, nós verificamos se era tecnicamente factível o uso das membranas produzidas com diferentes tipos de quitosana e com o alginato, de forma isolada ou associada a biocidas, em substituição a agentes químicos mais agressivos no controle microbiano”, detalha a pesquisadora. Depois, Raquel avaliou a atividade antimicrobiana dos dispositivos contra micro-organismos usualmente aplicados para validação laboratorial destes sistemas e também contra culturas resistentes oriundas de sistema de água de ambientes industriais. Na sequência, ela procurou determinar a forma de atuação da membrana selecionada como a mais promissora, no caso a produ-
zida a partir da quitosana, e o seu grau de eficácia. “O que pudemos constatar foi que o uso da quitosana e do alginato como materiais para a produção de membranas que incorporam agentes com atividades antimicrobianas se mostrou adequado para a finalidade de controlar o desenvolvimento de biofilmes formado por contaminantes comuns”, afirma. Com base nas etapas cumpridas ao longo da pesquisa, a autora da tese propôs um conjunto de recomendações sobre os cuidados que devem ser adotados pelo segmento industrial. As sugestões também indicam diretrizes para outros ambientes suscetíveis a contaminações, como o segmento de processamento de alimentos, de artigos para uso humano e de amparo à saúde. Segundo Raquel, os ensaios que compuseram o estudo foram realizados em um vestiário localizado em uma unidade industrial que atua no processamento de produtos químicos para linha escolar, no qual foram identificados focos importantes de contaminação e, consequentemente, um elevado potencial de comprometimento da saúde humana. Raquel considera que a pesquisa descortinou uma ampla gama de aplicações para o uso desse tipo de estratégia de controle microbiológico, particularmente o emprego da membrana de quitosana associada a biocidas. “Nós cogitamos dar continuidade ao estudo, dessa vez analisando a viabilidade de uso das membranas para recobrir superfícies de materiais em instalações de distribuição de água, a exemplo do que é feito com as membranas de osmose reversa. Isso permitiria, por exemplo, a incorporação de novas tecnologias de detecção de contaminantes por monitoramento computadorizado em tempo real, para a avaliação mais precisa do desempenho do sistema”, infere. A farmacêutica bioquímica não contou com bolsa de estudo concedida por agências de fomento, mas teve o poio da empresa para a qual trabalha, a Thor Brasil Ltda, que cedeu seus laboratórios para a realização das análises, bem como a liberou em alguns dias da semana para participar dos estudos teóricos e experimentos na Unicamp. “Este tipo de parceria entre o setor privado e instituições de pesquisa de renome como a Unicamp, que resulta na formação de pessoal qualificado e no desenvolvimento de novas tecnologias, é muito importante para a cadeia produtiva e para o avanço do nosso país”, considera Raquel.
Publicação Tese: “Análise da associação de agentes antimicrobianos a biopolímeros para o controle de biofilmes em ambientes suscetíveis ao desenvolvimento de contaminantes oriundos de água” Autora: Raquel Vannucci Capelletti Orientadora: Ângela Maria Moraes Unidade: Faculdade de Engenharia Química (FEQ)
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MARTA AVANCINI Especial para o JU
Retórica, definida no dicionário como a arte da palavra, da boa argumentação, possui uma conotação pejorativa na nossa sociedade, pois é associada ao uso da linguagem para fins de manipulação ou persuasão. Mas nem sempre foi assim. Na Roma Antiga, a Retórica era parte da formação do cidadão na medida em que o exercício da cidadania – entendido como a participação, tanto quanto cabível para a época, na vida da cidade – pressupunha a capacidade de expor, de maneira eficaz, os pontos de vista e os argumentos. Desse modo, a Retórica pertencia ao campo da educação. Naquele contexto, um autor ganhou destaque, mantendo-se como referência até a contemporaneidade: Marco Fábio Quintiliano, cuja obra-prima, “Instituição Oratória”, está sendo publicada pela Editora da Unicamp no âmbito da coleção Fausto Castilho Multilíngues de Filosofia Unicamp, em edição bilíngue latim-português. Os 12 livros originais foram compilados em quatro tomos, dos quais dois já foram lançados – o primeiro (livros, I, II e III) e o segundo (livros IV, V e VI). O terceiro e o quarto tomos, com os demais livros, deverão ser lançados em 2016. Nascido entre os anos 30 e 40 da era Cristã, em Calagurris Nassica, atual Calahorra, Espanha, Quintiliano passou boa parte de sua vida em Roma, onde trabalhou como advogado e professor de Retórica. Morreu na capital do Império Romano por volta do ano 100. Sua obra, contudo, atravessa séculos, mantendo-se relevante em vários campos das ciências humanas – da Filosofia à História, passando pela Linguística. “Quintiliano é um autor importante na formação de filósofos. Seu principal mérito foi fazer uma sistematização da cultura de cidadania, tendo como objetivo formar o cidadão romano”, assinala o filósofo Alexandre Soares, coordenador da coleção Fausto Castilho e professor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). “Na época, participar da cidade, ou seja, o exercício da cidadania tinha como premissa expor os pontos de vista e argumentos. A formação para a cidadania envolvia, então, a aprendizagem da gramática e da argumentação”, complementa o filósofo. É preciso ter em mente, contudo, que na Roma Antiga, uma sociedade em que havia escravos e na qual grande parte da população era iletrada, os preceitos apresentados na obra de Quintiliano podiam ser seguidos por poucos.
UMA PEDAGOGIA HUMANISTA
A oratória é a base da educação, na visão de Quintiliano, contextualiza o historiador Pedro Paulo Funari, professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp. “A oratória é toda esta série de preceitos, exercícios e reflexões que visam a produzir um homem capaz de exercer o seu papel de cidadão, o que, na época imperial romana significava exercer a liderança como funcionário do Estado”. No entanto, tal liderança só poderia ser exercida a contento por pessoas cultas e guiadas em suas ações por elevados padrões morais, o que remete à educação. “Por isso, o objetivo da educação não deveria ser apenas dar uma formação técnica, como chamaríamos hoje, mas oferecer também uma formação moral – ou humanística, nos termos atuais – para que estes cidadãos/funcionários cumprissem bem sua tarefa”, aprofunda Funari. O ideal do sábio, então, seria o homem “experiente em agir e falar bem”. A amplitude e as características da formação do orador relacionam-se com seu papel na sociedade: ele era uma pessoa especialmente habilitada a ler, julgar e produzir em diversas áreas do saber, por isso deveria ter o domínio mais completo possível da linguagem (no caso, o latim e o grego) e de outras áreas com as quais necessariamente ele tinha de lidar. “Sua formação baseava-se nas diversas formas da língua em suas diversas realizações (gramática, poesia, história, filosofia, oratória). Envolvia também outras áreas de conhecimento, como aritmética, geometria, astronomia e música, que constituíam o conjunto do que então se denominavam artes liberais”, detalha Marcos Pereira, professor do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL). “Quintiliano nos legou a ideia de um saber enciclopédico”. Essa visão remete a uma pedagogia que não se limitava à formação do orador; diferentemente, visava à formação geral do ser humano e, em particular, do cidadão, explica o tradutor da obra, Bruno Bassetto, professor titular aposentado da Universidade de São Paulo (USP) na Apresentação do Tomo 1 da obra. Segundo ele, a particularidade das orientações pedagógicas de Quintiliano reside no
Para além da Retórica Foto: Divulgação
Anselmo Ferreira, professor da UFU: “Quintiliano é um autor que tem despertado interesse como fonte antiga de reflexões sobre a linguagem”
O historiador Pedro Paulo Funari: “Vejo como urgente a tarefa de repropor modelos humanísticos de formação e educação dos cidadãos”
fato de que elas se fundamentam no respeito à pessoa com sua individualidade, especialmente nos seus estágios de desenvolvimento segundo a idade e nas influências do meio. O autor valoriza, portanto, a formação do espírito e da emotividade, escreve Bassetto na apresentação.
tre outros aspectos, em afirmações afinadas com a visão contemporânea de língua e linguagem. “Ao longo da obra, o autor lembra que a língua(gem), tal como entende que deva ser empregada pelo seu orador, pauta-se por critérios mais amplos que o da simples correção gramatical. Esta não é, em absoluto, desvalorizada, mas, ao mesmo tempo, ele reitera a necessidade de escolha de formas apropriadas para cada situação discursiva”, explica o linguista. Outro valor importante, na perspectiva do historiador Funari, é a ênfase na formação humanística numa sociedade em que a técnica apresenta-se como valor fundamental. “Certamente, nossa época tem relegado esse papel de formação humanística em nome de uma formação mais técnica. Até mesmo a Retórica tem se convertido em técnica de marketing, mais ou menos no estilo daquela arte criticada por Platão. Em nossa sociedade, cada vez mais controlada pela técnica, vejo como urgente a tarefa de repropor modelos humanísticos de formação e educação dos cidadãos”, conclui ele.
DA ANTIGUIDADE AO RENASCIMENTO
Daí se compreende a influência de “Instituição Oratória” na própria época e no Renascimento, período em que foi referência para os estudos humanísticos. “Por essas características, Quintiliano é um autor que tem despertado interesse como fonte antiga de reflexões sobre a linguagem. O seu pensamento mais geral sobre o lugar da educação na formação do cidadão também é algo que precisa ser retomado”, defende o professor do Instituto de Filosofia da UFU, Anselmo Ferreira. Quintiliano preconiza a formação do vir bonus dicendi peritus ou “o homem bom, perito na arte de falar”. Bonus, ou bom, significa honesto, virtuoso e íntegro – ideal dos métodos pedagógicos, seja nos tempos antigos ou na contemporaneidade. A pedagogia de Quintiliano tem como objetivo, portanto, promover o desenvolvimento integral do homem (moral, social, familiar, intelectual), até fazer dele um ser humano perfeito, base indispensável do orador perfeito. “Como nem todos são oradores ou mestres de Retórica, aquilo que Quintiliano indica para formar o homem perfeito é válido em qualquer época ou lugar, porque procura desenvolver as potencialidades humanas, inatas”, reitera Basseto. Valorizada até o Renascimento como parte da formação para a cidadania, com o passar do tempo e a crescente especialização dos vários domínios do saber, a Retórica – ou a oratória – ficou relegada a um plano secundário em favor de disciplinas (ou de áreas) consideradas mais “científicas”, num processo acentuado a partir dos séculos XVI e XVII no mundo ocidental. Esse movimento se deve, em parte, ao fato de que, na produção dos discursos, a Retórica também lidava com as paixões humanas e com formas de “sedução” dos sujeitos – algo tido como menos científico ou passível de ser racionalizado.
A RETOMADA DE
UMA PERSPECTIVA
Na atualidade, contudo, há um movimento de resgate da Retórica antiga por meio da Nova Retórica, pautado, justamente, por seu sentido pedagógico: ou seja, pela associação da oratória com a ética, presente em autores como Quintiliano. “O resgate se dá no sentido da visão da Retórica a serviço dos valores”, afirma o filósofo Soares. Paralelamente, a amplitude e a interface com diversos campos do conhecimento que caracterizam a “Instituição Oratória” evidenciam sua relevância e interesse para as ciências humanas – da filosofia à linguagem. “Como estudiosos da filosofia e de sua história, não podemos desperdiçar a oportunidade de dialogar com uma obra como essa, de quase 2 mil anos de existência e que toca nos problemas essenciais da filosofia; não é apenas um importantíssimo documento histórico, mas também alimento para nossas reflexões atuais sobre ética, educação e o próprio significado da sabedoria, cuja busca, afinal, é o mister do filósofo”, analisa o filósofo Ferreira. Na área da linguagem, enfatiza Pereira, o valor da obra de Quintiliano manifesta-se, en-
Foto: Antoninho Perri
Foto: Antonio Scarpinetti
A TRADUÇÃO
Apesar da importância da “Instituição Oratória”, não consta haver uma tradução completa da obra, afirma o tradutor Bruno Bassetto. “O Livro X foi traduzido, mas pouco divulgado. A tradução desse livro se deve a seu caráter prático, em que aplica o que havia exposto nos livros anteriores”. As primeiras traduções para a língua portuguesa datam da Idade Moderna. “Uma das mais conhecidas é a de Soares Barbosa, professor da Universidade de Coimbra no século XVIII”, relata o professor Marcos Pereira. “Assim, a publicação da obra na íntegra preenche uma grande lacuna e permitirá o acesso a uma das obras-mestras da Antiguidade latina”, complementa Pereira. O professor Bruno Bassetto está se dedicando à tradução de “Instituição Oratória” há dois anos e espera concluí-la até o final do primeiro semestre de 2016. “Traduzir uma obra de quase dois mil anos não é tarefa muito fácil. A visão subjacente do mundo, presente no autor, é muito diferente da atual”, comenta Basseto. “A espécie humana daquela época é a mesma que a nossa. Essa é a primeira conclusão que se retira desse trabalho”. Nesse sentido, impõe-se um desafio ao tradutor, que deve ser capaz de mostrar a realidade vivida pelas pessoas naquele tempo, reportar seus valores, usos, costumes, instituições, tradições, leis, organização social e outros aspectos, numa linguagem compreensível às
O filósofo Alexandre Soares, coordenador da coleção: “O principal mérito de Quintiliano foi fazer uma sistematização da cultura de cidadania”
O autor e a obra Quintiliano foi um dos mais respeitados pedagogos romanos. Lecionou na escola de Retórica, fundada em Roma. Foi um dos mestres e teóricos da antiga Retórica em língua latina. Ao lado de Cícero e do grego Aristóteles, compõe o antigo panteão de uma área que produziu longa tradição de estudos no mundo ocidental. “Em vida, foi muito influente, mas foi mais importante ainda na posteridade, em particular na Idade Média e a partir do Renascimento, pois serviu de base para a educação durante séculos. Ensinou a escrever e falar, nada menos que isso”, afirma o historiador Funari. A “Instituição Oratória”, sua principal obra, teve mais de duas centenas de manuscritos e somente foi descoberta em sua forma completa no século XV. O Livro I contém uma sinopse da obra e é dedicado à educação da criança até os 12 anos, período em que deve aprender a falar e escrever corretamente. O Livro II enfoca a aprendizagem da oratória. Os Livros III a VII expõem os passos relativos à invenção e à disposição em diversos gêneros (demonstrativo, deliberativo, judiciário com exórdio, exposição, digressão, narração, divisão, proposição, provas, argumentação e silogismo retórico). Nos Livros VIII, IX e X aborda a elocução. O Livro XI é dedicado à memória, apresentação, aparência, gesticulação e trajes do orador. O Livro XII, conclusão do tratado, mostra o “orador completo” em ação.
pessoas do nosso século. “Nem sempre dispomos de palavras para traduzir certas ideias, objetos ou fatos, sendo necessário recorrer a circunlóquios ou explicações em notas de rodapé; mesmo assim, nem sempre se alcança a clareza pretendida”, explica o tradutor. Outro desafio reside na diferença das línguas clássicas (com seu caráter sintético) e das línguas modernas românicas (com seu analitismo). “Para Quintiliano, mestre da arte oratória, a clareza da linguagem é uma qualidade fundamental do orador, da qual trata em vários tópicos. Ora, aquilo que era transparente para um falante do latim, língua dita sintética em sua estrutura, para nós muitas vezes não o é”, contextualiza Bassetto.
SERVIÇO Título: Instituição oratória – Tomo I – Livros 1, 2 e 3 Autor: Quintiliano Tradução: Bruno Fregni Bassetto Páginas: 584 | Preço: R$ 96,00 Editora da Unicamp | Área de interesse: Filosofia Título: Instituição Oratória – Tomo II – Livros 4, 5 e 6 Autor: Quintiliano Tradução: Bruno Fregni Bassetto Páginas: 552 | Preço: R$ 84,00 Editora da Unicamp | Área de interesse: Filosofia www.editoraunicamp.com.br
6 Campinas, 11 a 24 de abril de 2016
Em busca do plasma de qualidade Foto: Antonio Scarpinetti
SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br
ma pesquisa da Unicamp conduzida pela química Sofia Elisa Moraga Galdames estabeleceu parâmetros para auxiliar os médicos na obtenção e aplicação de um grande aliado da medicina regenerativa: o Plasma Rico em Plaquetas (PRP), produto preparado a partir do sangue do próprio paciente e usado com sucesso em terapias para a regeneração de tecidos e órgãos lesados. O estudo avaliou a influência de anticoagulantes na produção e nas propriedades do PRP, estabelecendo o anticoagulante mais adequado para a obtenção de um Plasma Rico em Plaquetas de melhor qualidade. Os anticoagulantes são fundamentais para a obtenção do PRP, evitando o bloqueio de reações de coagulação e mantendo o sangue fluído. O trabalho avaliou o PRP utilizando células-tronco mesenquimais derivadas de tecido adiposo humano. Conforme a pesquisadora Sofia Galdames, um estudo clínico em pacientes do Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp, em andamento, vem apresentando perspectivas bastante promissoras. De acordo com ela, os principais resultados da pesquisa demonstraram que um tipo de anticoagulante à base de ácido cítrico, citrato de sódio e dextrose (ACD-A) está entre os melhores avaliados para estimular o crescimento das células, podendo, deste modo, acelerar ainda mais a regeneração do tecido danificado. Além disso, o trabalho estabeleceu protocolos para a preparação do PRP com anticoagulantes, se utilizando de um modelo matemático que avaliou as propriedades do sangue na eficiência de recuperação do Plasma Rico em Plaquetas. Foram estudados os efeitos dos anticoagulantes ácido tetra-acético etilenodiamina (EDTA), heparina de sódio (HP), citrato de sódio (CIT) e ácido cítrico, citrato de sódio e dextrose (ACD-A). “A padronização do PRP ainda é um desafio porque os estudos que englobam ciência básica são escassos. A seleção de anticoagulantes para a obtenção do PRP não tem recebido a devida atenção, tanto na aplicação clínica como na pesquisa básica. São poucos os estudos relatando a influência dos diferentes anticoagulantes no processo de obtenção do PRP. Deste modo, o trabalho é relevante, sobretudo porque deverá contribuir para melhorar a saúde e condição de tratamento do paciente”, considera a autora do estudo. A pesquisa de Sofia Galdames integrou dissertação de mestrado defendida em novembro de 2015 junto ao Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp. O estudo foi orientado pela professora Maria Helena Andrade Santana, que atua no Departamento de Engenharia de Materiais e Bioprocessos (DEMbio) e coordena o Laboratório de Desenvolvimento de Processos Biotecnológicos (LADPB) da Unidade. Houve a colaboração do Banco de Sangue de Cordão Umbilical e Placentário do Hemocentro (Centro de Hematologia
pequenas quantidades podem continuar sendo produzidas pelas plaquetas de 8 a 10 dias. Isso é o que relata a literatura sobre o tema, mas dependerá do tipo de ativação do PRP”, revela.
QUALIDADE DO PRP
Sofia Galdames reconhece que existem inúmeros desafios para a obtenção de um PRP de alta qualidade. Ela esclarece que isto está diretamente relacionado ao número de plaquetas e à sua integridade. “Quanto maior o número de plaquetas íntegras, maior será a quantidade de fatores de crescimento liberados durante a aplicação do PRP. E isso depende, principalmente, do processo de centrifugação e da escolha do anticoagulante.” A química graduada pela Unicamp explica que o processo de centrifugação é utilizado para acelerar a separação de uma amostra de sangue venoso anticoagulado. Durante este processo, fragmentos celulares, como as plaquetas, ficam dispersos no plasma enquanto as células vermelhas do sangue sedimentam rapidamente sob a ação da força centrífuga.
A química Sofia Elisa Moraga Galdames, autora da tese: estudo estabelece parâmetros para obtenção e aplicação de Plasma Rico em Plaquetas
e Hemoterapia) e do Laboratório de Biomateriais Ortopédicos (Labimo), ambos vinculados à Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp. Além da docente Ângela Cristina Malheiros Luzo, que coordena o Banco de Sangue do Hemocentro, e do professor William Dias Belangero, do Labimo, a pesquisa envolveu a parceria do ortopedista e pesquisador da Unicamp, José Fábio Lana. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) financiou o projeto, concedendo bolsa de estudo à pesquisadora. Conforme a autora do trabalho, o Plasma Rico em Plaquetas vem sendo considerado altamente eficaz na medicina regenerativa. Sofia Galdames relata estudos que mostram o sucesso do uso do PRP na regeneração de diversos tecidos, como tendões, cartilagem, tecidos ósseos, úlceras de pele em diabéticos, além de ajudar na recuperação de joelhos com osteoartrite e lesões musculares. “Isso se explica pelo fato da capacidade do Plasma Rico em Plaquetas em fornecer grandes quantidades de fatores de crescimento e acelerar o processo de regeneração, além de evitar qualquer tipo de rejeição na região aplicada, por ser um produto autólogo, ou seja, extraído do próprio indivíduo.” A estudiosa da Unicamp explica que a reparação de tecidos ocorre em etapas no organismo humano: primeiro acontece a remoção das células mortas do local da lesão; em seguida a proliferação e migração de células para o local onde o tecido está danificado; e, por fim, a formação de novas estruturas vasculares. Ela acrescenta que os fatores de crescimento, substâncias responsáveis pela comunicação entre as células, desempenham papel importante, coordenando todo este processo. “O PRP contém uma concentração de três a cinco vezes maior de fator de crescimento que o nível considerado ‘normal’, sendo que aproximadamente 70% dos fatores de crescimento armazenados são liberados dentro de 10 minutos, e quase 100% são liberados dentro de uma hora. No entanto,
PRP DE 3ª GERAÇÃO
O Plasma Rico em Plaquetas vem sendo utilizado desde a década de 1960, conforme o estudo da Unicamp. No início era utilizado apenas como alternativa à transfusão do sangue total. Composto por um concentrado de plaquetas, leucócitos e proteínas, dispersos em uma pequena fração de plasma, o PRP já está naquilo que Sofia Galdames considera ser a sua terceira geração. “Na última década o uso do PRP tem representado uma opção importante para cirurgias de menor extensão, como o tratamento de ossos e cartilagens com dificuldade de cicatrização. E mais recentemente, o Plasma Rico em Plaquetas tem sido utilizado juntamente com biomateriais, como, por exemplo, o ácido hialurônico, uma substância naturalmente presente no organismo humano. Este biomaterial serve como uma espécie de estrutura em implantes para a regeneração óssea e de tecidos moles. Uma das sugestões da minha pesquisa para trabalhos futuros é avaliar as interações do PRP de 3ª geração, ou seja, associado a biomateriais em células mesenquimais adultas.”
Publicação Dissertação: “Estudo da influência de anticoagulantes na produção e propriedades do Plasma Rico Em Plaquetas” Autora: Sofia Elisa Moraga Galdames Orientadora: Maria Helena Andrade Santana Unidade: Faculdade de Engenharia Química (FEQ) Financiamento: Capes
A pele humana em imagens digitais Foto: Antoninho Perri
MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br
esquisa desenvolvida no Instituto de Computação (IC) da Unicamp oferece novas contribuições ao método de detecção de pele humana em imagens digitais. Usualmente, a determinação é feita por meio da análise de cor. Em sua dissertação de mestrado, orientada pelo professor Hélio Pedrini, o cientista da computação Anderson Carlos Sousa e Santos acrescentou mais três parâmetros ao procedimento: segmentação adaptativa, textura e saliência. “Embora seja a variável mais importante, a cor não é suficiente para proporcionar uma identificação precisa”, considera o autor do estudo. De acordo com Santos, a pesquisa desenvolvida no IC está inserida num campo da computação classificado como “aprendizado de máquina”. No caso específico do seu trabalho, o desafio foi buscar soluções que contribuíssem para refinar o método de detecção de pele humana em imagens digitais. O pesquisador explica que a análise exclusiva da cor para esse propósito não é eficaz, por causa das ambiguidades presentes nas fotografias. Exemplos de ambiguidades são roupas, objetos, planos de fundo e até sombras, que não raro apresentam tonalidade muito próxima à da pele humana. “A intersecção entre esses conjuntos torna muito difícil a tarefa de distinguir o que é e o que não é pele”, afirma o cientista da computação. Dito de modo simplificado, o sistema desenvolvido por Santos faz uma segmentação da imagem – espécie de zoom -, identificando inicialmente a pele humana por meio da cor.
O cientista da computação Anderson Santos, autor da dissertação de mestrado: “Embora seja a variável mais importante, a cor não é suficiente para proporcionar uma identificação precisa da pele em imagens digitais”
Depois, a partir dessa determinação, é feita a comparação com as demais regiões da foto, de maneira a deliberar em quais delas também há a presença de pele. Para apurar ainda mais a análise, o sistema estima a textura da pele, que é diferente da textura das roupas e objetos, e também a saliência da imagem, que provê uma indicação da localização da pele. “Ao cruzarmos esses parâmetros, nós conseguimos detectar com mais precisão as regiões de pele e não pele”, reforça o cientista da computação. Santos destaca que esse tipo de pesquisa pode ter aplicação, por exemplo, em sistemas usados em investigações sobre crimes relacionados à pedofilia. O método, assegura, tem capacidade de apontar, através de dados
estatísticos, a presença de nudez em arquivos fotográficos armazenados em um computador. Outra aplicação possível, acrescenta o pesquisador, é na área de vigilância de ambientes não controlados. Um exemplo são os aeroportos. Ao analisar imagens gravadas por câmaras de vídeo dos terminais, o método é capaz de determinar quantas pessoas estão no ambiente a partir da quantidade de pele humana detectada. “Além disso, essa metodologia também pode ser agregada a um sistema de biometria, como o que identifica a face. A curvatura e o delineamento da pele podem colaborar para a identificação, por hipótese, de um rosto contido num banco de dados”, infere o autor da dissertação de mestrado.
As pesquisas em torno da segmentação da pele humana são relativamente recentes no Brasil, conforme o pesquisador. Justamente por isso, os resultados obtidos até aqui ainda carecem de aperfeiçoamento. “Meu trabalho trouxe algumas contribuições nesse sentido. Certamente, outros pesquisadores proporão novas abordagens com o mesmo objetivo”, entende Santos, que contou com bolsas concedidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Agora no doutorado, o cientista da computação voltou a sua atenção para outro tema. Ele está trabalhando com vídeo e vigilância. “É um assunto distinto, mas que me permitirá utilizar o método que desenvolvi no mestrado. A título de exemplo, esse tipo de metodologia possibilita confirmar se uma pessoa que foi filmada por uma câmera é a mesma filmada por outro equipamento. Nesse caso, nós consideramos informações como pele, gesto, vestuário e trajeto para fazer a determinação”, detalha Santos.
Publicação Dissertação: “Melhorias na segmentação de pele humana em imagens digitais” Autor: Anderson Carlos Sousa e Santos Orientador: Hélio Pedrini Unidade: Instituto de Computação (IC)
7 Campinas, 11 a 24 de abril de 2016
Estudo propõe técnicas para a segurança de dados em nuvens Foto: Antonio Scarpinetti
Pesquisador da FEEC define requisitos para que sistema de armazenamento seja simples, seguro e confiável
Vitor Hugo Galhardo Moia, autor da dissertação: “O uso da criptografia em nomes e outros atributos do arquivo cria uma camada a mais de proteção”
LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br
m estudo sobre segurança e privacidade no armazenamento de dados em nuvens destaca um conjunto de problemas e preocupações neste sentido e sugere técnicas para amenizá-los, além de avaliar custos e benefícios destas técnicas e de suas possíveis combinações para oferecer melhor proteção ao usuário. Em sua dissertação de mestrado, Vitor Hugo Galhardo Moia fez um levantamento de soluções comerciais e acadêmicas para o armazenamento de dados em nuvens, definiu requisitos considerados essenciais para um sistema seguro, confiável e simples de utilizar, e ainda desenvolveu uma aplicação que chamou de CPG (Cloud Privacy Guard). A pesquisa foi orientada pelo professor Marco Aurélio Amaral Henriques e apresentada na Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC). Vitor Moia observa que a computação em nuvens já é uma tecnologia conhecida e consolidada, que pode trazer várias vantagens para os usuários. “Dentre outras facilidades, os provedores de serviços de nuvens (CSP – Cloud Service Providers) disponibilizam um espaço em seus servidores para que sejam depositados arquivos pessoais, por exemplo. As vantagens são diversas, como o backup, pois provedores mantêm servidores espalhados pelo mundo: armazenado um arquivo na nuvem, cópias são disparadas para todos os pontos, livrando o cliente da preocupação de fazer backups para guardar seus dados em locais seguros. É preciso atentar, entretanto, para o fato de que provedores gratuitos não garantem que dados não serão perdidos.” O autor da dissertação ressalta também a vantagem financeira, já que o usuário pode contar com recursos computacionais potentes sem os custos associados a infraestrutura e manutenção locais, pagando apenas pelo tempo e espaço que consome (modelo pay-as-you-go). “Contudo, talvez a maior vantagem seja a possibilidade de acessar seu arquivo de qualquer local e em qualquer momento, bastando um dispositivo com acesso a internet. O armazenamento em nuvem é interessante também para empresas, que às vezes compartilham uma mesma base de dados, como cadastro de clientes ou de produtos, que os funcionários podem acessar e atualizar.” Enumeradas as vantagens, Moia retoma o foco de seu estudo, sobre os riscos trazidos pelo armazenamento em nuvens quanto a segurança e privacidade, a começar pelo fato de o serviço ser terceirizado. “Quando uma pessoa armazena seus dados na nuvem, acaba entregando o controle do arquivo ao provedor que, intencionadamente ou não, pode acessá-lo de maneira inadequada. Existem vários CSPs ditos gratuitos, mas sempre existe um preço, que não fica explícito para o usuário. O provedor pode, por exemplo, utilizar as informações em benefício próprio ou vendê-las a empresas de marketing. Mesmo serviços que garantem proteção aos dados,
Publicação Dissertação: “A Study about the Security and Privacy on Cloud Data Storage” Autor: Vitor Hugo Galhardo Moia Orientador: Marco Aurélio Amaral Henriques Unidade: Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC)
Vitor Moia explica que diante dos inúmeros problemas de segurança a serem solucionados, ateve-se à criptografia para um estudo mais detalhado. “Levantamos e classificamos vários provedores de serviços de nuvem que também oferecem a criptografia entre suas soluções. Com base nesse estudo, definimos requisitos de segurança que um provedor deve apresentar para tornar o serviço o mais confiável possível. Avaliamos 17 provedores de serviços de nuvens e aplicações com esta finalidade e, no final, concluímos que eles não são tão seguros como anunciam; nenhum deles cumpriu com todos os requisitos que definimos, havendo ainda muito espaço para melhorias.”
SOLUÇÃO SIMPLES DE USAR
não são tão seguros assim, pois não atendem a requisitos essenciais.”
RECURSO DA CRIPTOGRAFIA
A dissertação traz um estudo sobre as principais preocupações dos usuários quanto a sua privacidade, assim como técnicas para amenizá-las. “Quem quer sigilo dos dados pode recorrer à criptografia, codificando-os de forma que apenas quem detenha um segredo (chave) consiga acessá-los. Outra técnica de proteção é a fragmentação dos dados, dividindo-se um arquivo em muitos fragmentos que são armazenados em nuvens diferentes, impedindo assim que terceiros, incluindo os provedores, tenham acesso à íntegra do conteúdo.”
Mais uma preocupação diz respeito à nomeação e atributos dos arquivos, que geralmente recebem nomes sugestivos demais, como “extrato bancário”, por exemplo, direcionando os atacantes para dados do seu interesse. “O uso da criptografia em nomes e outros atributos do arquivo cria uma camada a mais de proteção. Outros usuários querem manter segredo de sua localização em relação ao provedor e, para isso, também existem soluções. Uma última preocupação é quanto à posse dos dados, ou seja, impedir que o provedor consiga, através das informações armazenadas, chegar à identidade real do usuário; como solução, podemos recorrer a serviços de identificação auxiliares, como os utilizados em sistemas de identidades federadas.”
Identificadas as lacunas neste contexto, o autor da pesquisa propôs uma solução para dar uma camada de proteção aos arquivos armazenados em nuvens. “Depois de comparar os sistemas existentes e de chegar a um conjunto de requisitos essenciais para a privacidade e segurança, apresentamos, como prova de conceito, uma aplicação baseada nesses mesmos requisitos. Esta solução que chamamos de CPG (Cloud Privacy Guard), serve justamente para criptografar os dados dos usuários antes do envio para a nuvem. É uma versão ainda em desenvolvimento, mas que já permite realizar vários testes.” De acordo com Moia, o maior desafio foi chegar a uma aplicação simples de ser utilizada, requisitando o menor esforço possível do usuário. “Um dos problemas identificados em relação à criptografia é a carga extra de trabalho exigida do usuário, com uma série de procedimentos complexos e enfadonhos até para profissionais da área. Com o CPG, o usuário simplesmente arrasta o arquivo para dentro de uma pasta e o próprio aplicativo vai criptografar e migrar os dados para a pasta padrão da nuvem.” Vitor Moia considera que sua dissertação traz informações bastante úteis para o uso da tecnologia de armazenamento de dados em nuvens, como o levantamento e comparação dos principais provedores que estão no mercado, a fim de ajudar o usuário a diferenciá-los e escolher aquele que melhor atende às suas necessidades; o estudo sobre técnicas, chamando a atenção para outros problemas associados a este serviço e não apenas quanto ao sigilo; e ainda os custos e benefícios para cada técnica, quando aplicadas individualmente ou combinadas. “É possível obter maior proteção em diversos aspectos a um custo bem menor do que se imagina. Elaboramos vários requisitos, mas cada usuário tem sua necessidade e talvez não precise de um provedor que atenda a todos eles.”
A segurança num provedor Requisito
Preocupação
Segurança das chaves criptográficas
Gerenciamento correto das chaves criptográficas. São considerados fatores como o tempo de vida de uma chave e sua guarda correta.
Deduplicação segura
Garantir que técnicas de economia de espaço, usadas por provedores para evitar duplicação de dados que possam comprometer a privacidade dos usuários.
Alto nível de sigilo
Buscar modos de implementação de criptografia em serviços de nuvem, que possam trazer mais segurança e menos riscos à privacidade do usuário.
Trust no one (Não confie em ninguém)
Oferecer mais garantias de que o usuário seja o único capaz de acessar seus dados, através do uso exclusivo de uma chave criptográfica (senha) não compartilhada com o provedor da nuvem.
Sigilo dos atributos dos arquivos
Proteger os atributos de um arquivo (nome, datas de criação e última modificação, tamanho, etc.) contra acesso não autorizado por terceiros.
Open Source (Código fonte aberto)
Manter em domínio público o código fonte da aplicação de proteção a fim de evitar vulnerabilidades ou “portas dos fundos” que possam comprometer a segurança e privacidade dos usuários.
Autenticidade do software
Permitir que usuários possam verificar a autenticidade de uma aplicação, isto é, que ela foi realmente gerada pelo seu desenvolvedor, a fim de evitar que atacantes possam alterá-la sem serem detectados.
Autenticação Multi-fator
Aumentar a segurança do processo de autenticação, utilizando dois ou mais fatores para este fim. Ex. de fatores de autenticação: algo que o usuário saiba (senha), algo que ele possua (smartphone ou cartão com chip) e algo que ele seja (características biométricas como digitais, íris, etc.).
Usabilidade
Reduzir a complexidade do software criptográfico a fim de facilitar sua utilização, exigindo um menor esforço sem o comprometimento da segurança.
Fonte: Divulgação
8 Campinas, 11 a 24 de abril de 2016
O circo chega às escolas Tese investiga alcance da introdução de atividades circenses nas grades curriculares
RESULTADOS
Foto: Divulgação
CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br
s atividades circenses vêm despertando, nos últimos 20 anos, um crescente interesse dos profissionais de educação física, especialmente dos que atuam na escola, configurando-se como uma nova possibilidade para a integração da educação corporal, estética e artística. Em decorrência do grande interesse despertado em educadores e educandos, nas últimas décadas tem sido grande a introdução dessas atividades nas grades curriculares escolares e mesmo em outros espaços educativos formais e não formais. Elas têm sido utilizadas em ONGs como atividades de lazer e vêm sendo cada vez mais introduzidas nas escolas e nas universidades. Na Faculdade de Educação Física (FEF) da Unicamp existem projetos de extensão envolvendo as artes circenses e vários segmentos da sociedade. Essa disseminação ocorre tanto no cenário internacional como nacional e, paralelamente, cresce significativamente a produção acadêmica sobre o tema com vistas a subsidiar essa prática nos aspectos didático-pedagógicos. É nesse contexto que se insere a tese desenvolvida por Teresa Ontañón Barragán, orientada pelo professor Marco Antonio Coelho Bortoleto da FEF, que aborda o circo na escola como elemento de integração da educação corporal, estética e artística. O trabalho procura mostrar como o circo contribui de modo singular para uma maior sensibilização corporal, bem como para uma educação estética e para o desenvolvimento da expressividade dos estudantes. Esse tipo de atividade representa um importante diferencial na educação física escolar em que normalmente as atividades circenses são introduzidas pelos professores da área. Mas há casos em que sua incorporação está em consonância com programas curriculares. Essas iniciativas abrem novas perspectivas para alunos que não se sentem confortáveis nas aulas de educação física, particularmente quando não se inserem nos esportes coletivos. A pesquisadora, licenciada em Ciencias de la atividade física y del deporte pela Universidad Politécnica de Madrid, veio ao Brasil pela primeira vez em 2008, ainda como estudante, dentro de um programa de intercâmbio que a Unicamp mantém com a universidade espanhola. No período de um ano em que aqui permaneceu teve oportunidade de conhecer na Unicamp o Grupo Circus, que se dedica ao estudo e pesquisa das artes circenses. Depois de retornar ao seu país para completar a graduação, voltou em 2010 à Unicamp para o mestrado quando pesquisou as relações e as possibilidades pedagógicas entre o circo e a educação física. Em 2013 deu continuidade a essas pesquisas ao nível de doutorado, que acaba de concluir. Durante esse tempo ela teve oportunidade de ministrar cursos para professores tanto no Brasil (São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Santa Catarina, Mato Grosso) quanto no exterior (Colômbia, Argentina, Espanha) e participar como professora do curso de Atividades Circenses, para crianças, e de cursos de extensão, todos oferecidos pela FEF. O estudo de Teresa está inserido na linha de pesquisa do grupo coordenado pelo professor Marco Bortoleto e pela professora Ermínia Silva, que se ramifica em vários segmentos como história do circo, segurança no circo, pedagogia das atividades circense, circo na escola, formação do artista de circo, entre outras. Através de reuniões periódicas o grupo presta assistência a interessados na arte circense, como artistas e professores e também promove atividades para crianças. Além de ter publicado vários artigos em periódicos internacionais, a autora ganhou prêmios e, em decorrência de um de seus trabalhos, lançará ainda no primeiro semestre deste ano o livro Circo: horizontes educativos.
Estudantes durante atividade circense: o lúdico na berlinda
A propósito a pesquisadora afirma: “As situações que o esporte e as artes fomentam são diferentes. A arte circense desenvolve a expressividade, a educação corporal, artística e estética que atinge em uma área mais sensível, mais humana, de que, no meu entendimento, o mundo se ressente”. Na França aparecem formalmente no currículo entre outros conteúdos os esportes na natureza, os coletivos, os individuais e as atividades de expressão, que privilegiam o circo e a dança. Os professores organizam o curso de educação física com base nessa gama de possibilidades, o que permite maior estruturação das atividades circenses. No Brasil elas dependem mais da vontade do professor, do seu interesse, de sua formação. No colégio francês o professor responsável enfatizava sempre que a introdução do circo possibilitava fugir um pouco do tecnicismo que envolve os esportes que despertam maior interesse dos alunos. Foto: Antonio Scarpinetti
A PESQUISA “Com a pesquisa pretendíamos verificar o que estava acontecendo com o circo na escola”, diz a autora. Para tanto, o primeiro passo consistiu em levantar a bibliografia consultando livros, artigos e trabalhos acadêmicos sobre o tema. A quantidade de publicações encontradas surpreendeu, levando ao exame de mais de 200 documentos produzidos no Brasil e no exterior. Dentre as publicações envolvendo circo e escola e relativas à pedagogia e à função educativa do circo ela constatou que o Brasil ocupa a terceira posição, superado apenas pela França e Espanha, países com maior tradição circense. A pesquisa se completou com observações realizadas nas práticas escolares, a exemplo do que já fizera no mestrado, quando se concentrou em uma escola brasileira e outra espanhola. Os trabalhos do doutorado se alicerçaram em uma escola particular do Brasil, o Colégio Oswald de Andrade, em São Paulo, e outra pública da cidade de Onnaing, na França, o Collège Saint-Exupéry. Nessas oportunidades Teresa se preocupou em verificar como se desenvolviam as aulas, a pedagogia e os conteúdos utilizados, observações que complementou entrevistando os professores. Ela descobriu que o projeto de circo no Oswald de Andrade estava incorporado ao currículo, juntamente com esportes coletivos e dança, e vinha sendo desenvolvido há 18 anos por um professor graduado na FEF. Na sua avaliação o projeto funciona muito bem em termos de conteúdos, promovendo outros tipos de relações entre os alunos, pois nas atividades circenses não há as competições inerentes a práticas esportivas.
Teresa constata que a introdução do circo na educação vem crescendo, as experiências nas escolas aumentam, cada vez mais professores se interessam em utilizá-las e amplia-se a bibliografia sobre o tema. Na FEF são constantes os convites de redes de professores que querem frequentar cursos que os possibilitem a levar o circo para suas escolas. Nessa esteira ela, inclusive, foi levada a dar vários cursos pelo país. Em relação aos alunos ela percebe que a participação é muito boa e que esse tipo de atividade os motiva. O conteúdo alegre os atrai, diferentemente do que não raro acontece em educação física, particularmente com os que não se dão bem com esportes coletivos. Acrescente-se a isso as várias possibilidades de atuação como malabarismos, equilibrismos, acrobacias, mágicas e a participação de palhaços, considerados os atores do circo. Esse espectro se estende às questões de gênero. Além do que, essas atividades facilitam a inclusão de portadores de necessidades especiais pela flexibilidade de adaptações, o que nem sempre acontece nos esportes. Todas estas razões atraem os professores, que se mostram muito interessados, embora a maioria não se sinta seguro em levar o circo para a escola por não dispor de formação para tanto. Os que o fazem são aqueles que em geral têm alguma afinidade com o circo e procuram conhecimentos fora da universidade, mesmo porque é muito recente o interesse dessas instituições pelo circo. Para Teresa o Brasil é pioneiro nessas iniciativas: “Nós temos aqui no curso de graduação da FEF uma disciplina relacionada ao circo na escola denominada Circo na educação física, que inclusive cursei durante meu intercâmbio. Mas não há dúvidas de que a formação do professor constitui limitação séria. Tanto é que nós somos muito procurados por professores que querem levar o circo para a escola, mas não sabem como fazê-lo. Essa formação é urgente porque se trata de um conteúdo que se pode revelar perigoso se não for bem conduzido pelo professor”.
RECOMENDAÇÕES Com base em seus estudos e observações a pesquisadora alinha alguns elementos que devem ser considerados ao se propor levar o circo à escola. O primeiro deles refere-se à necessidade de contar a história do circo. Ela defende, como em outras atividades, que o conteúdo da cultura corporal tem um desenvolvimento, um contexto, pois não aparece do nada. “O circo tem toda uma história que precisa ser mostrada para que o conteúdo faça mais sentido para o aprendiz, despertando seu interesse”, enfatiza. Outra questão refere-se à procura da forma pedagógica que mais se adapte ao contexto. Não se pode ensinar da mesma forma uma criança de seis anos e outra de quinze anos. Deve-se considerar o universo que permeia os alunos, suas origens, dificuldades que revelam. O professor não pode deixar de pensar o que quer fazer e por que. É imperioso, também, que o professor tenha formação, seja ela adquirida na universidade, seja fora dela, de forma a ter contato com conteúdos e experiências que o credenciem a executar com competência as tarefas a que se propõe. Há ainda a necessidade de fomentar nos alunos a cultura da segurança, pois no circo há atividades que podem oferecer perigo. O professor, além de se responsabilizar pela segurança, tem que incutir nos alunos a consciência da necessidade de observar princípios de segurança que vão servir para o resto de suas vidas. Outra recomendação da pesquisadora é a de trabalhar no processo de aprendizagem com jogos, através de situações lúdicas. Ou seja, para o desenvolvimento das técnicas, que pode se revelar chato, há necessidade de recorrer ao lúdico, de forma que a criança ou o jovem, passando por diferentes jogos devidamente programados, chegue ao pretendido desenvolvimento técnico. Aliás, o lúdico é a essência do circo. Por fim, Teresa deixa muito claro que o circo é uma arte e como tal tem que ser trabalhado na escola, promovendo relações estéticas, artísticas e de expressão. Por falta de formação adequada, há professores que o tratam apenas tecnicamente e ignoram a arte, o que, para ela, não faz sentido. A pesquisadora considera “superinteressante” que profissionais do circo auxiliem o trabalho do professor. Há docentes que já procuram essa parceria. Em Campinas existem várias escolas fazendo isso. Cria-se a possibilidade de o aprendiz praticar e acompanhar a atuação do artista, além de receber orientações dele.
Publicação
Teresa Ontañón Barragán, autora da tese: “A arte circense desenvolve a expressividade, a educação corporal, artística e estética”
Tese: “Circo na escola: por uma educação corporal, estética e artística” Autora: Teresa Ontañón Barragán Orientador: Marco Antonio Coelho Bortoleto Unidade: Faculdade de Educação Física (FEF)
9 Campinas, 11 a 24 de abril de 2016
Pesquisadora sugere programa de monitoramento da pesca em Paraty Foto: Antoninho Perri/Divulgação
Projeto de bióloga é alternativa para atenuar conflito entre caiçaras e ICMBio SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br
bióloga Ana Carolina Esteves Dias, pesquisadora do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, delineou, em sua dissertação de mestrado, um programa para monitorar de modo participativo a pesca artesanal na comunidade de Tarituba, em Paraty, no Estado do Rio de Janeiro. A comunidade está situada ao norte do município, próxima da divisa com Angra dos Reis. Integrando o cenário social e econômico ao contexto ecológico, o programa proposto procura conciliar a conservação do ambiente costeiro-marinho sem prejudicar a atividade de pesca artesanal dos caiçaras locais. Há 10 anos uma série de conflitos vem sendo registrados em Tarituba, informa a pesquisadora da Unicamp. Ana Carolina explica que os principais pesqueiros do local estão situados dentro da Estação Ecológica (ESEC) de Tamoios, unidade de conservação de proteção integral criada em 1990 pelo governo federal como contrapartida à implantação das usinas nucleares de Angra dos Reis. A estação, administrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), só começou a ser monitorada e fiscalizada efetivamente nos últimos dez anos, data em que apareceram os primeiros conflitos após a proibição da pesca. “Trata-se de uma unidade de conservação de proteção integral em que não pode existir a pesca. Mas, ao mesmo tempo, vive no local uma comunidade que sempre pescou ali, mesmo antes do estabelecimento da unidade. Os pescadores afirmam que a pesca é a sua sobrevivência. O objetivo do programa, que ainda não foi aplicado, é obter informações sobre a importância da pesca para a comunidade e seus possíveis impactos no ambiente marinho local para subsidiar uma proposta de gestão com enfoque ecossistêmico”, explica Ana Carolina. De acordo com ela, a abordagem ecossistêmica de gestão presa pelo balanço entre as necessidades sociais, econômicas, culturais e ecológicas. “O programa de monitoramento delineado durante a pesquisa integra aspectos sociais e ecológicos. Seu objetivo é possibilitar a identificação de caminhos para a conservação do ambiente costeiro-marinho em questão, sem prejudicar os modos de vida caiçara dos pescadores de Tarituba”, salienta. O estudo foi orientado pela pesquisadora Cristiana Simão Seixas, afiliada ao Programa de Pós-graduação em Ecologia do IB. A orientadora atua também junto ao Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam) da Unicamp. O trabalho contou com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), na forma de bolsa à pesquisadora. Houve ainda a concessão de uma bolsa de intercâmbio do Santander Universidades, visando custear a estadia de três meses da estudiosa da Unicamp no Centro Nacional Patagónico (CENPAT) em Puerto Madryn, Argentina. Lá, ela estudou sobre a inclusão do conhecimento dos pescadores em programas de monitoramento participativo da pesca artesanal no Brasil e Cone Sul (Argentina, Chile e Uruguai).
Ana Carolina Esteves Dias, autora da dissertação, na Unicamp e em reunião com representantes da comunidade (destaque): conciliando preservação e atividade econômica
TERMO DE AJUSTE DE CONDUTA A bióloga esclarece que o programa de monitoramento ainda precisa de uma revisão, tanto da comunidade de pescadores quanto do ICMBio, de modo a definir a gestão operacional, indicando, por exemplo, os responsáveis pelas coletas dos dados. Para o início das atividades de monitoramento há a necessidade da assinatura de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) entre os pescadores locais, o ICMBio e o Ministério Público Federal de Angra dos Reis. A proposta do TAC foi discutida entre esses atores como uma possibilidade de atenuar o conflito. Pelo termo, a pesca artesanal em determinadas áreas da ESEC Tamoios passaria a ser temporariamente permitida com o devido monitoramento e fiscalização. Desde que a fiscalização começou a ser feita, as atividades de pesca, desembarque e ancoragem estão proibidas na Estação. Conforme o ICMBio, o objetivo é preservar o riquíssimo ecossistema insular e marinho da Baía da Ilha Grande. “Para chegar ao monitoramento nós precisamos de dados das espécies pescadas, em qual época do ano e qual a relevância da pesca para a comunidade. Um aspecto importante na época era que os pescadores achavam que a fiscalização era feita de forma desrespeitosa. Portanto, um dos objetivos é monitorar a percepção dos pescadores quanto à abordagem da fiscalização também. Ao final, este programa irá apontar informações no sentido de fornecer alternativas para esta situação de conflito: é proibido pescar, mas, ao mesmo tempo, tem gente que precisa dessa pesca”, revela Ana Carolina.
ALTERNATIVAS POSSÍVEIS A estudiosa da Unicamp propõe duas alternativas à atual configuração da ESEC Tamoios a fim de solucionar os conflitos existentes. A primeira delas seria redefinir os limites da Estação, englobando novas áreas, como habitats reprodutivos, e excluindo as áreas utilizadas para pesca pelos caiçaras locais (blocos 1 e 2). A unidade de conservação está dividida em 12 blocos, compreendendo 29 ilhas, ilhotes, lajes e rochedos num raio de 1.000 metros em seu entorno. Conforme literatura científica utilizada na pesquisa, os pesqueiros mais utilizados pelos caiçaras de Tarituba estão na Ilha Comprida (que pertence ao bloco I da ESEC Tamoios), Rochedo de São Pedro, Ilha da Araraquara (que compõem o bloco II), Ilha de Araçatiba, Ilha do Cedro, Laje Branca, Ponta dos Meros, Sete Cabeças, Araçaíba, Ilha do Pelado, Ilha Sandri (que pertencem a outros blocos ou a áreas adjacentes à ESEC Tamoios) e baía de Paraty. A segunda alternativa apontada pela bióloga seria recategorizar os blocos 1 e 2 para uma unidade de conservação de uso sustentável, possibilitando, assim, a conciliação da conservação dos recursos com as atividades pesqueiras de Tarituba. “A reformulação da gestão da ESEC Tamoios pode ser um marco na gestão ambiental brasileira no que diz respeito à gestão adaptativa dos recursos naturais e conciliação da conservação ambiental com modos de vida tradicionais. Se o TAC não for celebrado, os conflitos existentes na região podem ser potencializados, desestimulando o respeito e o cuidado das comunidades extrativistas frente aos recursos”, pondera. Foto: Divulgação
Publicação Dissertação: “Monitoramento participativo da pesca na comunidade de Tarituba, Paraty-RJ: conciliando conservação e pesca artesanal” Autora: Ana Carolina Esteves Dias Orientadora: Cristiana Simão Seixas Unidade: Instituto de Biologia (IB) Financiamento: CNPq Vista parcial da comunidade de Tarituba, em Paraty, no litoral fluminense: conflitos se arrastam há dez anos
Conforme o estudo, Tarituba possui 430 habitantes e 65 pescadores cadastrados na ESEC Tamoios. Desses, 25 são classificados como pescadores comerciais artesanais e 40 como pescadores não comerciais de subsistência, conforme a Lei da Pesca (Lei nº 11.959/2009). Os caiçaras locais estão associados à colônia Z-18 de pescadores de Paraty e são em sua maioria homens, embora algumas mulheres exerçam a atividade de pesca para a extração de mariscos e caranguejos. Após o início das atividades do programa, Ana Carolina informa que os resultados do monitoramento seriam discutidos, anualmente, junto ao Conselho Consultivo da ESEC Tamoios, para medidas corretivas, revisão, complementação dos compromissos estabelecidos pelo TAC e, se os dados apontarem essa possibilidade, a renovação do TAC.
SOCMON Para delinear o programa de monitoramento em Tarituba, a pesquisadora da Unicamp se baseou no método utilizado pelo SocMon (Global Socioeconomic Monitoring Initiative for Coastal Management), programa de monitoramento socioeconômico de comunidades costeiras que visa subsidiar informações para a gestão local e gerar informações que possam ser comparadas globalmente. “O SocMon já é aplicado em mais de 30 países e está em fase piloto em três unidades de conservação no país. No Brasil, a implementação do método foi discutida junto ao ICMBio com o objetivo de criar mecanismos de aplicação das informações geradas na gestão das áreas monitoradas e de manutenção no tempo. Tarituba revelou que a flexibilidade do método atende às necessidades locais quanto ao delineamento do programa. No entanto, o guia, ao ser traduzido para o português, também deve conter novas formas de transmissão do conteúdo para além da linguagem escrita. A capacitação dos envolvidos, assim como a coleta e análise dos dados do monitoramento deve ser um processo contínuo”, informa. Ela ressalta ainda que a participação da comunidade local nas atividades de monitoramento não é uma garantia efetiva de que o conhecimento dos pescadores seja incorporado à gestão da unidade de conservação. Ana Carolina afirma que, para isso, é preciso uma abordagem voltada para o conhecimento e o compartilhamento de informações de uma maneira mais balanceada. “Muitas vezes a informação passada pelos gestores não é compreendida pelos pescadores e vice-versa. Não basta, portanto, apenas participar de reuniões”, pontua.
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Painel da semana
Painel da semana Redação científica - O Espaço da Escrita oferece aos do-
centes, pesquisadores de carreira, aos alunos de graduação e aos de pós-graduação da Unicamp, o curso básico “Método lógico para redação científica”. Será no dia 11 de abril, às 8h30 horas, no Auditório III do Centro de Convenções da Unicamp. O curso terá 8 horas/aula e será ministrado pelo professor Gilson Luiz Volpato (Unesp/Botucatu). Ele foi organizado para todos que queiram aprender do zero ou aperfeiçoar a escrita de textos acadêmicos desde a perspectiva da ciência empírica. Para mais informações acesse o link http://www. cgu.unicamp.br/espaco_da_escrita/workshop_metodo_logico_redacao_cientifica_basico_campinas.php Oficina de desenho com Isabelle Cedotti - Explorar o contato com os elementos que estão a nossa volta para formar imagens através de técnicas de desenho de observação. Este é o objetivo da oficina de desenho que será ministrada pela artista Isabelle Cedotti, dia 11 de abril, às 14 horas no Centro Cultural de Inclusão e Integração Social (CIS-Guananara), à rua Mário Siqueira 829, no bairro do Botafogo, em Campinas-SP. A oficina, que é organizada pelo Grupo de Projetos de Extensão (GPECIS), tem como públicoalvo jovens e adultos e será realizada até 20 de junho, às segundasfeiras. Cedotti é formada no curso de Artes Visuais pela Unicamp e tem descoberto por meio dos encontros da arte, diferentes maneiras de perceber o mundo a sua volta. Contribuiu como assistente durante quatro anos no Projeto Maré, projeto de xilogravura do artista brasileiro Ernesto Bonato, entrando em contato com o dia a dia no atelier e com as técnicas de xilogravura, desenho e pintura. Desenvolve seu trabalho de investigação nas áreas do desenho, pintura e dança. Mais detalhes pelo telefone 19-3231-6369. Migração internacional, refúgio e políticas - Seminário busca dialogar com distintos campos disciplinares, avançando no conhecimento teórico-metodológico, bem como debater, com atores governamentais e a sociedade civil, as políticas migratórias (e/ou a ausência delas) e as políticas sociais para os imigrantes no Brasil do século XXI. O evento ocorre no dia 12 de abril, às 8h30, no Memorial da América Latina. A organização é da professora Rosana Baeninger (Nepo-Unicamp). O evento tem como públicoalvo acadêmicos, gestores, ministérios, comunidades imigrantes. Mais detalhes pelo telefone 19-3521-5897 ou e-mail roberta@nepo. unicamp.br Fórum de ciência, tecnologia e inovação - Com o tema “As instituições-memória e as tecnologias da informação e comunicação: desafios contemporâneos”, evento ocorre no dia 12 de abril, às 9 horas, no Centro de Convenções. O Fórum será transmitido pela TV Unicamp e está sob a responsabilidade da professora Maria Elena Bernardes, do Centro de Memória Unicamp (CMU). Na primeira palestra, às 9h15, o professor Daniel Flores, doutor em documentação e sub-chefe do Departamento de Documentação da UFSM, aborda o tema “Sistemas informatizados de acesso e gestão da preservação em documentos históricos permanentes. Programação completa e inscrições no link http://www.foruns.unicamp.br/foruns/projetocotuca/ forum/htmls_descricoes_eventos/tecno81.html Organizações civis e violência: uma pesquisa interdisciplinar de longa duração - Palestra será proferida por Ana Paula Galdeano Cruz, pesquisadora do Cebrap, São Paulo, dia 13 de abril, às 16h30, na Sala da Congregação do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH). O encontro com a docente integra as palestras das Oficinas de Etnografia, evento focado em exercer regularmente a discussão pública, a crítica mútua e a resolução cole-
Teses da semana
tiva de questões concretas relacionadas com a etnografia, enquanto modo de fazer e produzir conhecimento partilhado pelo conjunto alargado das ciências sociais. A palestra é dirigida ao público interessado no assunto e está sob a organização do Centro de Estudos de Migrações Internacionais (CEMI) do IFCH. Mais informações pelo telefone 19 3521-1601 ou e-mail seceven@unicamp.br Seminatec - Está aberta a chamada para a pré-inscrição e a submissão de trabalhos para o XII Seminatec 2016 – Workshop on Semiconductors and Micro & Nano Technology. O evento ocorrerá nos dias 14 e 15 de abril, no Instituto de Física “Gleb Wataghin” (IFGW). As inscrições podem ser feitas até um dia antes do evento. Já os trabalhos devem ser submetidos até duas semanas antes de sua realização. Para mais detalhes acesse o link http://www.ccs. unicamp.br/seminatec/. De caráter anual, o Seminatec 2016 objetiva promover a discussão das tendências tecnológicas e científicas nos campos de micro e nanotecnologia em semicondutores e materiais correlatos. No programa do evento estão previstas palestras e painéis e a participação de membros destacados da academia e do setor privado, além de uma sessão de pôsteres. Outras informações podem ser obtidas pelo telefone 19-3521-5435. Oficina de desenho com Rafael Ghiraldelli - Evento acontece no dia 14 de abril, às 14h30, no Centro Cultural de Inclusão e Integração Social (CIS-Guananara), à rua Mário Siqueira 829, no bairro do Botafogo, em Campinas-SP. Nela, Ghiraldelli mostrará os conceitos do desenho expandido para estimular a criatividade. A oficina, que é organizada pelo Grupo de Projetos de Extensão (GPECIS), tem como público-alvo crianças, jovens e adultos. Ghiraldelli atua como artista visual e ilustrador freelancer na cidade de Campinas-SP e região, além de trabalhar com poéticas voltadas à web arte, videoarte, instalação, animação e pintura. Com seu curta-metragem experimental de 2015, “A última guerra em Canudos: a barganha”, o artista teve a oportunidade de divulgar seu trabalho em diversas mostras de cinema no Brasil para um grande público, fazendo relação com as múltiplas linguagens pelas quais também se expressa através do tema abordado: a figura humana, inserida em contextos distópicos permeados por tensões entre o imaginário e o real, a memória e o esquecimento, o físico e o virtual. Cursa atualmente o quarto ano de Graduação em Artes Visuais no Instituto de Artes (IA) da Unicamp. Mais detalhes pelo site http://www.cisguanabara.unicamp.br/ Campanha da voz - O Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp promove a Campanha da Voz – Dia Mundial da Voz, em 15 de abril, das 9 às 16 horas, no Ambulatório de Otorrinolaringologia, localizado no 2º andar. Neste dia, os pacientes e visitantes do Hospital terão acesso a orientações de profissionais, que farão avaliações médicas e fonoaudiólogas da Voz. A Campanha da Voz coordenada pela Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), tem como objetivo orientar as pessoas quanto aos problemas de voz que podem interferir na qualidade vida e nas relações de trabalho, como professores, operadores de telemarketing, entre outros. A Campanha da Voz foi criada em 1999 com participação da Unicamp. Em 2003 foi reconhecida internacionalmente, quando o dia 16 de abril passou a ser o Dia Mundial da Voz. Vinte e dois olhares - No dia 15 de abril, das 10 às 16 horas, no Espaço Cultural Casa do Lago, à Av. Érico Veríssimo 1011, no campus da Unicamp, a artista plástica Fernanda Mendes apresenta seus mais recentes trabalhos na exposição “Vinte e dois olhares”, com curadoria da crítica de arte e historiadora Ude Fairbanks. Inspiradas em cartas do Tarô, cada obra traz um tema e uma composição visual definida a partir da interpretação e do significado das cartas. A carga dramática contida em cada uma delas é marcada pelo uso de tons escuros e fortes do laranja, verde e azul. “Nos vinte e dois painéis estão o meu olhar sobre o tema, representado por figuras e formas fluídas e orgânicas, preenchidas com cores que me emocionam”, relata a artista. Mais detalhes pelo e-mail julia@d2comunicacao.com.br
Eventos futuros
Caminhada da integração - A Diretoria Geral de Recursos
Humanos (DGRH) e a Divisão de Educação Infantil (DEdIC) organizam, dia 16 de abril, às 8h30, na Praça da Paz, a Caminhada da Integração. O objetivo é promover a integração entre as famílias, as crianças e a escola, fortalecer laços de amizade e estimular a prática da atividade física. No evento serão recolhidos brinquedos para serem doados à Fundação Síndrome de Down. Mais detalhes no link http://www.dgrh.unicamp.br/noticias/5a-caminhada Visões da ciência - Para incentivar a divulgação de pesquisas científicas por meio da linguagem visual e promover reflexões sobre as práticas científicas no cotidiano das pessoas, em 2013, a Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (USP/ESALQ) promoveu a primeira edição da Exposição fotográfica “Visões da Ciência”, atividade ao ar livre itinerante, que apresentava em imagens as diversas interfaces da fotografia no mundo científico. Agora em 2016, com o slogan “Por detrás do Observador”, a 2ª edição tem inscrições abertas até o próximo dia 17 de abril. Mais detalhes pelo e-mail ciro@usp.br Encontro de Educação Musical - Com a temática “Educação musical e tradições populares no Brasil”, o IX Encontro de Educação Musical da Unicamp será realizado de 18 a 20 de abril, no Instituto de Artes (IA). O evento, que é organizado por docentes e discentes do curso de licenciatura em Música, tem como públicoalvo estudantes de graduação e arte-educadores. No encontro ocorrem workshops, oficinas, mesas-redondas, comunicações orais e apresentações artísticas. Os professores Lucilene Silva, Lydia Hortélio, Maria Vera Athayde, Gilber Souto Maior, Fernando Tocha, Sue Turíbioe o Grupo Pana-Paná ministrarão oficinas no evento. As mesas-redondas serão coordenadas pelos docentes Ivan Vilela, Alik Wunder, José Roberto Zan, Suzel Reily e Alberto Tsuyoshi Ikeda. Informações e inscrições pelo e-mail contatoeemu@gmail.com ou no site http://eemunicamp.blogspot.com.br/ Qualidade da água - A Comissão de Pesquisa Faculdade de Tecnologia (FT) da Unicamp organiza no dia 18 de abril, às 14h30, no auditório PA03 da FT, o evento “Entendimentos comparativos de respostas governamentais em relação à qualidade da água”. O público-alvo são docentes e alunos. Mais detalhes pelo e-mail thiago@ ft.unicamp.br
Teses da semana Artes: “Improvisação e interação na “Escola Jabour”” (douto-
rado). Candidato: Raphael Ferreira da Silva. Orientador: professor Antônio Rafael Carvalho dos Santos. Dia 15 de abril de 2016, às 14 horas, na sala 3 da CPG do IA. Computação: “Técnicas de compilação para apoiar a migração de dados em sistemas NUMA” (mestrado). Candidato: Guilherme Guaglianoni Piccoli. Orientador: professor Edson Borin. Dia 18 de abril de 2016, às 14 horas, no auditório do IC2 do IC. Educação Física: “Políticas públicas para o lazer de aventura: entre esporte e turismo, fomento e controle do risco” (doutorado). Candidata: Marília Martins Bandeira. Orientadora: professora Silvia Cristina Franco Amaral. Dia 15 de abril de 2016, às 13 horas, no auditório da FEF. Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo: “Oxidação química avançada em área contaminada com hidrocarboneto de petróleo (BTEX e TPH): aplicação de peróxido de hidrogênio e persulfato de sódio” (mestrado). Candidata: Rosa Maria Bosquê. Orientadora: professora Eglé Novaes Teixeira. Dia 15 de abril de 2016, às 9h30, na sala de defesa de teses 2 da FEC.
Destaque do Portal
“Aplicação do modelo River 2d em estudos de desvio de rios” (mestrado). Candidato: Bruno Pecini. Orientador: professor Tiago Zenker Gireli. Dia 19 de abril de 2016, às 9 horas, na sala de defesa de teses 2 da FEC. Engenharia de Alimentos: “Desenvolvimento de sistemas lipídicos funcionais e aplicação em embutidos cárneos fermentados” (mestrado). Candidata: Maristela Midori Ozaki. Orientadora: professora Marise Aparecida Rodrigues Pollonio. Dia 11 de abril de 2016, às 14 horas, no salão nobre da FEA. “Proteólise de queijo prato com diferentes teores de sal” (mestrado). Candidata: Débora Parra Baptista. Orientadora: professora Mirna Lúcia Gigante. Dia 15 de abril de 2016, às 14 horas, no salão nobre da FEA. “O papel da levedura Saccharomyces cerevisiae na estabilização de emulsões envolvendo hexadecano e uma fase aquosa” (mestrado). Candidato: Aureliano Agostinho Dias Meirelles. Orientador: professor Andreas Karoly Gombert. Dia 19 de abril de 2016, às 9 horas, na sala 2 da Extensão da FEA. Engenharia Química: “Membranas de nanofibras com alta adesão para liberação bucal de fármacos” (doutorado). Candidata: Silvia Vaz Guerra Nista. Orientadora: professora Lucia Helena Innocentini Mei. Dia 14 de abril de 2016, às 9h30, na sala de defesa de teses da FEQ. “Estudo do efeito de argilas organofílicas na cristalização do poli (ácido D,L- láctico)” (mestrado). Candidata: Renata Brandão Brito Ramos. Orientadora: professora Ana Rita Morales. Dia 15 de abril de 2016, às 10 horas, na sala de defesa de teses da FEQ. Filosofia e Ciências Humanas: “Morte e cidade na antiguidade tardia: transformações da topografia urbana e da topografia mortuária na cidade de Cartago” (mestrado). Candidato: Rafael Aparecido Monpean. Orientador: professor Pedro Paulo Abreu Funari. Dia 20 de abril de 2016, às 9 horas, na sala da congregação do IFCH. Física: “Medidas do efeito magnetocalórico convencional e anisotrópico por medida do fluxo de calor com dispositivos Peltier” (doutorado). Candidato: José Carlos Botelho Monteiro. Orientador: professor Flávio César Guimarães Gandra. Dia 19 de abril de 2016, às 14 horas, no auditório da Pós-graduação do IFGW. Matemática, Estatística e Computação Científica: “Resposta do campo eletromagnético em meios condutores” (mestrado profissional). Candidato: Yuri Flores Albuquerque. Orientador: professor Edmundo Capelas de Oliveira. Dia 13 de abril de 2016, às 14 horas, na sala 253 do Imecc. “Otimização de funções, funcionais e controle Fuzzy” (doutorado). Candidato: Michael Macedo Diniz. Orientador: professor Rodney Carlos Bassanezi. Dia 19 de abril de 2016, às 14 horas, na sala 226 do Imecc. Odontologia: “Avaliação do comportamento mastigatório em adolescentes com sobrepeso e obesidade” (mestrado). Candidata: Aline Pedroni Pereira. Orientadora: professora Paula Midori Castelo Ferruá. Dia 11 de abril de 2016, às 9 horas, no anfiteatro 2 da FOP. “Análise biomecânica de infraestruturas totais fixas maxilares confeccionadas de acordo com os conceitos all-on-four ou all-on-six” (doutorado). Candidata: Claudio Lopes Brilhante Bhering. Orientador: professor Valentim Adelino Ricardo Barão. Dia 15 de abril de 2016, às 14 horas, na sala da Congregação da FOP. “Financiamento e gasto do sistema único de saúde: Avaliação da eficiência dos municípios da região de saúde rota dos bandeirantes do Estado de São Paulo” (mestrado). Candidato: João Alves dos Santos Neto. Orientador: professor Luiz Renato Paranhos. Dia 18 de abril de 2016, às 9 horas, na sala de seminários do Depto. de Odontologia Social da FOP.
Destaque do Portal
Vestibular: Comvest recebe pedidos
de isenção da taxa a partir do dia 20 Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp (Comvest) receberá a partir do próximo dia 20 de abril, os pedidos de isenção da taxa de inscrição do Vestibular Unicamp 2017. Os pedidos deverão ser realizados até dia 23 de maio, exclusivamente pela internet, nesta página. Para finalizar o processo, o candidato deve enviar a documentação necessária (descrita no Edital), pelo correio, para a Comvest até o dia 24 de maio. A falta de qualquer documento e/ou o envio após o prazo excluem o candidato do processo. Este ano, continuam valendo as duas mudanças promovidas no ano passado. A primeira delas é que para candidatos às licenciaturas em período noturno (modalidade 3) não há mais a exigência de haver cursado escola pública, ou seja, candidatos oriundos de escolas particulares também poderão pedir a isenção da taxa de inscrição. A outra mudança diz respeito aos candidatos das demais modalidades, em que não é mais exigido ter cursado o ensino fundamental II na rede pública, mas somente o ensino médio, integralmente. As isenções da taxa de inscrição do Vestibular Unicamp são oferecidas em três modalidades: 1- para candidatos provenientes de famílias de baixa renda (renda líquida máxima de R$1.100,00 por morador do domicílio); 2- funcionários da Uni-
Foto: Antonio Scarpinetti
A lista dos estudantes contemplados com a isenção será divulgada dia 29 de julho. Também a partir desta data, os contemplados começam a receber – exclusivamente via correio eletrônico – um comunicado de que foram beneficiados. Importante: Os contemplados não são automaticamente inscritos no Vestibular Unicamp 2017. É preciso, posteriormente, fazer a inscrição no vestibular, utilizando o código de isento fornecido pela Comvest. Para efetuar sua inscrição no Vestibular Unicamp, os candidatos isentos deverão utilizar um formulário específico. O calendário completo com as datas de inscrição e provas do Vestibular Unicamp 2017 será divulgado em breve.
ISENÇÕES NO ANO PASSADO
camp/Funcamp; e 3- para aqueles que se candidatarem aos cursos de Licenciatura em período noturno (Ciências Biológicas, Física, Letras, Licenciatura Integrada Química/Física, Matemática e Pedagogia). Os pré-requisitos são: ter cursado o ensino médio integralmente em instituições
da rede pública de educação (não se aplica à modalidade 3); ser residente e domiciliado no Estado de São Paulo e já ter concluído ou concluir em 2016 o ensino médio. A Comvest oferece 6.640 isenções na modalidade 1; 100 na modalidade 2 e um número ilimitado de isenções na modalidade 3.
No Vestibular Unicamp 2016, 5.995 candidatos que pediram a Isenção e preencheram os requisitos necessários para receber o benefício foram isentos de pagar a taxa de inscrição. A Comvest recebeu 7.298 pedidos. O Programa de Isenção do Vestibular Unicamp é parte do Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social (PAAIS), que prevê que estudantes que tenham cursado todo o ensino médio na rede pública de ensino brasileira recebam pontos a mais nas notas obtidas no Vestibular Unicamp.
11 Campinas, 11 a 24 de abril de 2016
ARTIGO
por: Caio Navarro de Toledo
Um marco histórico na vida política da Unicamp Foto: Antoninho Perri
Inauguração da Placa-Totem, ocorrida no último dia 17 de março: homenageando os membros da comunidade acadêmica punidos pela ditadura
Placa-Totem inaugurada pela Reitoria em cerimônia pública no último dia 17 de março é, a meu ver, um marco histórico na vida política da Universidade Estadual de Campinas. Além de homenagear os membros da comunidade acadêmica que foram punidos pela ditadura militar (1964-1985), a obra instalada na Praça das Bandeiras simboliza também um claro repúdio aos golpes contra o Estado de direito democrático. Denominada de “´Reconhecimento, Memória e Verdade Histórica” a Placa-Totem foi a solução encontrada pela Reitoria a fim de atender uma das Recomendações do Relatório Final da Comissão da Verdade e Memória “Octávio Ianni” 1 ; por meio dessa Recomendação, a Comissão solicitava que a Reitoria produzisse um artefato artístico que questionasse a honrosa menção feita, em extenso Painel da Praça das Bandeiras, ao militar golpista Mal. Humberto de Alencar Castelo Branco. De forma democrática, a CGU – em resposta a um documento dirigido à Reitoria (subscrito por 35 docentes de várias unidades da Universidade) –, convidou uma comissão de signatários para examinar o assunto em uma reunião. Na conversa foi aprovada uma proposta, feita pela Reitoria, da construção de uma Placa-Totem no campus; no mesmo encontro, a CGU solicitou à comissão de docentes a elaboração de um texto a fim de constar da obra 2 .
RECONHECIMENTO E HOMENAGEM
Por meio desta iniciativa, a Unicamp torna público seu reconhecimento e presta homenagem a dois tipos de membros da nossa comunidade: a) Todo/as os que estavam vinculado/ as à Universidade quando sofreram punições por injunções ou pressões do regime militar. Esses arbítrios se manifestaram de diferentes formas: prisões, torturas, perseguições e afastamentos. 1 2
No Relatório Final da Comissão da Verdade e Memória da Unicamp a quase totalidade desses membros é mencionada. Foram eles: Ademir Gebara, Alberto Pelegrini Filho, Alberto Zeitune (in memoriam), Alcides Mamizuka, Álvaro Caropreso, Anamaria Testa Tambellini, Antônio Sérgio da Silva Arouca (in memoriam), Cristina Possas, Edson Corrêa da Silva, Eduardo Maia de Carvalho Freese, Eleonora Machado Freire (in memoriam), Elisabeth Moreira dos Santos, Francisco Eduardo Campos, Francisco Viacava, Gustavo Zimmermann, Hélio Rodrigues, João Aidar Filho, Joaquim Alberto Cardoso de Melo (in memoriam), José Augusto Cabral de Barros, José Eduardo Passos Jorge, José Rubens de Alcântara Bonfim, José Welmovick, Lais Tolentino, Luiz Antonio Vasconcelos, Luiz Carlos Toledo, Marilia Bernardes Marques, Osvaldo de Oliveira, Raimundo Araujo dos Santos (in memoriam), Rodolpho Caniato, Rosali Ziller de Araújo, Rubens Murillo Marques e Simão Lukowiecki (in memoriam). b) Todo/as os demais membros da comunidade acadêmica que – antes de pertencerem aos quadros da Unicamp – sofreram algum tipo de sanções por parte do regime militar. Esta específica homenagem tem um inequívoco significado político e educacional: durante os 21 anos de regime discricionário, a Unicamp foi uma instituição que, de forma destemida e sem hesitação, abriu suas portas a dezenas de pessoas que foram perseguidas e punidas pela política de terror implantada pela ditadura militar. Nesta categoria se encontram o/as que foram preso/as, torturado/as, exilado/as políticos e afastado/as de suas funções públicas. Esclarecendo que a lista abaixo não é exaustiva, os seguintes membros da comunidade acadêmica se enquadrariam nesta situação:
Álvaro Caropreso, Ana Fonseca, Ana Valderez (in memoriam), Ângela Araujo, Ângela Soligo, Antônio Carlos de Oliveira, Benito Damasceno, Bento Prado Ferraz Junior (in memoriam), Bernardino Figueiredo, Carlos Alberto Lobão, Carlos Eduardo Viegas da Silva, Carlos Estevam Martins (in memoriam), Carlos Lessa, Claudio Torres (in memoriam), Clovis Goldemberg (in memoriam), Dilma Rousseff, Elza Berquó (in memoriam), Frederico Mazzucchelli, Helena de Freitas, Izabel Marson, João Quartim de Moraes, Jorge Baptista Filho (in memoriam), Jorge Mattoso, José Serra, Leda Gitahy, Liana Aureliano, Lourdes Sola, Luiz Carlos Freitas, José Luiz Paes Nunes, José Machado, José Tomaselli, Leslie Denise Beloche, Lúcio Flávio Rodrigues de Almeida, Luiz Carlos Cintra, Luiz Werneck Vianna, Lylia Guedes Galetti, Maria Lygia Quartim de Moraes, Marcelo Moreira Ganzarolli, Marco Aurélio Garcia, Maurício Tragtenberg (in memoriam), Nelson Rodrigues dos Santos, Ondina da Silva Pregnolatto, Osvair Vidal Trevisan, Paulo Freire (in memoriam), Paulo Roberto Beskow, Paulo Renato de Souza (in memoriam), Raul Pont, Renato Dagnino, Robêni Baptista da Costa, Roberto Romano da Silva, Roberto Schwarz, Sandra Negraes Brisolla (in memoriam), Sebastião Velasco e Cruz, Sérgio Salazar, Sérgio Silva, Sônia Draibe, Sílvio de Alencastro Pregnolatto, Vilma Barban, Waldir Quadros, Waldir Ribeiro Gallo e Zenaide Machado. Na sessão pública que homenageou os membros da comunidade acadêmica que lutaram contra a ilegitimidade do regime militar, a Unicamp reiterou seu permanente compromisso com o pensamento crítico, a verdade histórica e os valores da democracia.
De forma lúcida e consequente, a Reitoria entendeu que, ao invés de destruir o Painel que comemora a presença de uma importante liderança do golpe de 1964 no campus da Unicamp, impunha-se erigir uma placa por meio da qual fosse esclarecido que o “Senhor Presidente da República Humberto de Alencar Castelo Branco” foi, na verdade, um proeminente militar que teve elevada responsabilidade pelos crimes do regime de 1964. A instalação da Placa-Totem no campus revela – como afirma o texto nela transcrito – que a Unicamp está afinada com todas as iniciativas de caráter simbólico, dentro e fora dos meios acadêmicos brasileiros, que, hoje, repudiam qualquer homenagem prestada a quem tenha apoiado os arbítrios e as violências perpetrados pela ditadura militar. Foto: Antonio Scarpinetti
Caio Navarro de Toledo é professor aposentado do IFCH/Unicamp e membro da “Comissão da Verdade e Memória ‘Octávio Ianni’” da Unicamp
O Relatório final pode ser acessado pelo site: https://www.comissaoverdade.unicamp.br/
O texto é o seguinte: “Por meio desta Placa, a Unicamp presta sua homenagem aos homens e mulheres da comunidade acadêmica que, lutando pela redemocratização, sofreram violências físicas e morais durante o longo período da ditadura militar. O militar Humberto de Alencar Castelo Branco, dignificado no extenso Painel ao lado, teve papel decisivo no golpe de Estado que derrubou o governo democrático de João Goulart (1961-1964) e na implantação da ditadura militar. Como ficou evidenciado por inúmeras pesquisas históricas e pelos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, os cinco governos militares (1964-1985) causaram profundos danos à economia, à educação, à cultura e ao meio ambiente do país, sendo responsáveis por graves violações dos direitos humanos (prisões, torturas, desaparecimentos e mortes) e pelo sistemático cerceamento das liberdades democráticas. Esta placa cumpre, também, a necessária função de repudiar qualquer homenagem prestada a quem apoiou tais crimes”. O projeto da Placa-Totem é de autoria da arquiteta Flavia Brito Garboggini.
12 Campinas, 11 a 24 de abril de 2016
Tratados sobre a sinceridade Fotos: Divulgação/Reprodução
ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br
m meio ao caos, a retórica vazia, o silêncio, a imobilidade, o olhar perdido no espaço e no tempo: a espera. Um teatro passível, entregue ao destino, marionete do acaso. Uma rebuscada poética usada em longos diálogos. Uma vida particular sofrida e solitária. Mas nem isso impediu que as peças de Roberto Gomes (1892-1922) expressassem sensibilidade e leveza. Foi o que constatou Bianca Almeida em sua dissertação de mestrado apresentada ao Instituto de Artes (IA) sobre as obras teatrais desse dramaturgo brasileiro que retratou o Rio de Janeiro de sua época. Os traços modernos da sua estética tratavam de vida, sentimentos e dores do coração humano. Falavam de pequenos momentos em que o destino muda o rumo dos dias. “O teatro de Gomes se tornou um documento valioso sobre a sinceridade. Nele não era preciso movimentação física, uma vez que quem comandava os enredos era o acaso”, notou Bianca. A autora do estudo, realizado dentro do Programa de PósGraduação em Artes da Cena, chegou a essas conclusões ao analisar quatro peças teatrais do dramaturgo (Ao declinar do dia - 1909, A bela tarde - 1915, O sonho de uma noite de luar 1916 e O jardim silencioso - 1918) que, em comum, sugeriam traços mais significativos da estética simbolista no contexto teatral brasileiro das décadas de 1910 e de 1920. Bianca começou a se interessar por Roberto Gomes na iniciação científica e continuou o tema no mestrado sob orientação da professora Larissa Catalão. Admirou-o pela sua história e como levava a vida das personagens à cena. Pesquisou fontes primárias em diversas bibliotecas e acervos, além de suas peças e encenações. Analisou a sua estética teatral para avaliar essas quatro peças que tinham o amor como combustível para os enredos, a dor e a solidão. Gomes escreveu ao todo nove peças: Ao declinar do dia (1909), O canto sem palavras (1912), A bela tarde (1915), Inocência (1915), O sonho de uma noite de luar (1916), O jardim silencioso (1918), Berenice (1917-8), A Casa Fechada (1919) e Beijo ao luar (1913), esta última ainda desaparecida. O dramaturgo era um autor singular no panorama teatral brasileiro, realçou a estudiosa. Suas peças tinham um ar decadentista sobre o mundo, a vida dos homens, as relações afetivas e a solidão. Acontece que poucos trabalhos revelavam sua obra. As peças raramente foram encenadas, exceto A casa fechada. A dissertação de Marta Morais da Costa, concluída há 35 anos na USP, foi um estudo de fôlego, um levantamento de críticas sobre encenações que resultou no livro Teatro de Roberto Gomes. Na opinião da pesquisadora, as encenações dialogavam com vertentes do teatro moderno ocidental, mas também traziam episódios tipicamente brasileiros. Retratavam cruamente os sentimentos e aflições de personagens ante à realidade carioca. Dois artigos se destacavam como tema central da obra de Gomes: “A dramaturgia de Roberto Gomes, da Casa Fechada à abertura modernista”, também de Marta (2003); e “Formas crepusculares, dores silenciosas: o teatro simbolista de Roberto Gomes”, de Elen de Medeiros, publicado na Revista Pitágoras 500 da Unicamp, em 2011. Havia ainda um pequeno artigo de Cláudia de Arruda Campos – “O simbolismo do teatro brasileiro: deixando a sombra”, publicado na revista da USP em 1994. Resumia o contexto deste autor a partir do livro de Eudinyr Fraga, Simbolismo no Teatro Brasileiro. Na obra, figuravam 12 autores brasileiros com traços de estética simbolista, entre eles Coelho Neto, Goulart de Andrade, João do Rio, Graça Aranha, Oswald de Andrade, Oscar Lopes, Carlos Dias Fernandes, Emiliano Perneta, Durval de Moraes, Marcelo Gama, Paulo Gonçalves e Roberto Gomes. O livro continha dois capítulos – “Simbolismo” e “Teatro simbolista” – que traçavam um percurso desta corrente estética desde Baudelaire e Maurice Maeterlinck até suas influências no teatro brasileiro. Verificavam as razões do surgimento deste movimento no Brasil neorrepublicano. Entre os livros com apontamentos específicos (mas breves) de Roberto Gomes, Bianca encontrou – no Panorama do Teatro Brasileiro, de Sábato Magaldi (1962) – o capítulo “Sensibilidades crepusculares”. Enfocava o movimento decadentista do teatro brasileiro, uma reação contra o naturalismo e a descrença no progresso, na felicidade e na inteligência. Magaldi comentava o teatro de Goulart de Andrade, Oscar Lopes, João do Rio, Paulo Gonçalves e Roberto Gomes. Fazia um resumo crítico das peças A casa fechada, Sonho de uma noite de luar, Berenice e O canto sem palavras. No livro História do Teatro Brasileiro: das Origens ao Teatro Profissional da Primeira Metade do Século XX, organizado por João Roberto Faria e editado por J. Guinsburg, tem um capítulo sobre o teatro pré-moderno de Roberto Gomes. Também no livro Aspectos do Teatro Brasileiro, de Paulo Roberto Correia de Oliveira (1999), mas nada que acrescente às ideias de Magaldi em Panorama do Teatro Brasileiro.
INFLUÊNCIAS
Gomes era um dramaturgo quase esquecido na história do teatro brasileiro. Segundo Bianca, pode ter sido pelo contato que teve com uma dramaturgia inovadora na Europa, ao propor um teatro calcado na psicologia das personagens, não nas ações. O teatro brasileiro de então se reduzia às comédias de costumes ou ao teatro musicado. “Não havia artistas para encenar uma peça que fugia aos padrões realistas ou às comédias, o que fazia com que Gomes perdesse no palco todas as nuances de sentimento e simbolismo de seus textos.”
Bianca Almeida, autora da dissertação: “Não havia artistas para encenar uma peça que fugia aos padrões realistas ou às comédias”
O dramaturgo apreciava Maeterlinck e Henry Bataille, expoentes do movimento simbolista. Os espaços de suas peças eram sempre crepusculares e mostravam a realidade da vida burguesa, a sala da casa de família, o jardim no final da tarde. Também apresentavam o quarto escuro, o invisível e o inobservável. As peças de Maeterlinck valorizavam o gesto, o soluço, o gemido, o silêncio, ao invés da palavra. Eles ganharam espaço no teatro de Gomes nas peças Ao declinar do dia, Sonho de uma Reprodução de diálogo de “O canto sem palavras”, peça de 1912: acaso ditava os enredos noite de luar, Jardim silencioso, Berenice e A casa fechada. Uma tentativa de Maeterlinck e de Gomes era buscar nas peças o maior número de vezes em que o espectador pode se reconhecer no sentimento dos personagens. O “drama estático” no teatro de Maeterlinck causou uma cisão no teatro clássico, caminhando para o moderno. A tragédia grega trazia o conflito entre o herói e seu destino, e o drama no classicismo colocou em cena os conflitos e problemáticas das relações entre os homens e o teatro simbolista. Este foi o motivo do teatro simbolista ser acusado de não ter ação. As falas eram insuficientes para instaurar diálogos. Eram declamações e às vezes longos silêncios. Esta indefinição do conflito causou uma indefinição das personagens, levando Maeterlinck a querer substituí-las por marionetes. Outro traço das peças simbolistas que também estava presente nas peças de Strindberg, Hofmannsthal, Zola e, mais tarde, Eugenie O’Neill e Yeats – é que elas tinham um só ato. Para Szondi, isso indicava que a estrutura dramática tradicional estava em crise. Os simbolistas optavam por peças curtas porque tratavam de momentos exatos em que o destino estava agindo, com tensão do começo ao final, sem respiros, para causar a impressão desejada. A peça era toda a situação da catástrofe. Não havia introdução ou resolução. Só o destino, observou Bianca.
Dramaturgo foi crítico de teatro e música
IMPORTÂNCIA
Roberto Gomes: um simbolista da dramaturgia brasileira
Roberto Gomes nasceu no RJ, filho do comendador Luiz Gomes Ribeiro e da francesa Blanche Ribeiro Gomes. O pai era um dos diretores do Banco Nacional. Aos oito anos, viajou com a mãe a Paris. Mais tarde, cursou humanidades no Lycée Jaison de Sally. Participou de saraus como ator, músico e desenhista. Em 1897, com a falência do Banco Nacional, a família regressou ao Brasil e, em 1902, iniciou o curso da Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais do RJ. Bacharelou-se com distinção. Com a morte do pai, em 1905, lecionou francês e foi crítico da Gazeta de Notícias. Assinou os primeiros artigos com o pseudônimo Bemol. Foi crítico musical e teatral do Jornal A Notícia, onde assinava com o pseudônimo Sem. Foi professor de francês do Instituto Benjamim Constant, funcionário do ensino municipal e inspetor escolar, o mesmo cargo ocupado por nomes da literatura como Medeiros e Albuquerque e Olavo Bilac. Com Bilac e Guimarães Passos, produziu o Guide dês étas Unis du Brésil, um guia turístico do RJ. Em 1922, em Botafogo, Gomes tirou a vida com um tiro no peito, aos 40 anos.
Gomes ambientou suas peças à realidade carioca, pois seriam encenadas nos teatros “sérios” do RJ. Como este não era o trunfo da sua dramaturgia, deixou para trás a chance de ser um precursor no teatro moderno. Mas por que Gomes ficou esquecido nessa história? Suas peças foram pouco encenadas, por isso alguns historiadores omitiram o seu nome, como Múcio Paixão no livro Teatro do Brasil (1917), Lafayette Silva em História do Teatro Brasileiro (1938) e Andrade Muricy em Panorama do Movimento Simbolista Brasileiro (1987). Mesmo sem reconhecimento, o crítico teatral Décio de Almeida Prado o redimiu do esquecimento e o analisou com propriedade em A Evolução da Literatura Brasileira, de 1955, assinalando num trecho: “Era quase um escritor francês, um estranho em nosso teatro”. Ainda que com diálogos poéticos e rebuscamento das palavras, Gomes falava de assuntos comuns e suas peças traziam muitas possibilidades de cena para o teatro contemporâneo. “Não criou heróis trágicos. Revelou pessoas de verdade vivendo como marionetes do destino”, ressaltou. Suas peças foram uma tentativa de relatar as mudanças. “Talvez este seja o traço mais marcante herdado da estética simbolista: falar deste momento, sugerir antes de explicar, deixar nas entrelinhas para que cada qual a interprete”, reforçou Bianca, que é atriz e produtora de marketing.
Publicação Dissertação: “O teatro moderno no começo do século XX no Brasil: Roberto Gomes, texto e cena” Autora: Bianca Almeida Orientadora: Larissa de O. Neves Catalão Unidade: Instituto de Artes (IA)