CATÁLOGO - CINEMA TAILANDÊS

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ÍNDICE ÍNDICE

11 A P R E S E N T A Ç ã o

14 f ic h a t É cnica e a g radeciment o s

18 U ma b re v e h ist ó ria d o cinema tailandês Anchalee Chaiworaporn

26 O h o mem q ue m o rreu p o r sua arte Anchalee Chaiworaporn

30 Melhor é impossível: filmes tailandeses em 2015 Anchalee Chaiworaporn

35 Óci o - meditaç ã o, narraç ã o e su b v ers ã o FELIPPE MORAES

40 K at h o e y s e a di v ersidade n o recente cinema tailandês Bernardo de Britto Ribeiro

44 O que o cinema tailandês contemporâneo nos diz sobre as preocupações e ansiedades culturais tailandesas contemporâneas Jéssica Boyd

53 H E Y J O E Luiz Carlos Oliveira Jr.


55 O A b surd o C o rri q ueir o de A pic h atp o n g W eeraset h akul Ruy Gardnier

58 M o v iment o C inema T ailandês L i v r E Uma carta do Movimento Cinema Tailandês Livre

60 “M ade in T h ailand”: o idílic o rural e o tema da identidade tailandesa em T ransist o r Natalie Boehler

72 D esl o cand o “independência” - O discurs o d o cinema independente d o S udeste A si á tic o e suas trajet ó rias Natalie Boehler

87 E N T R E V I S T A s 88 91

A pic h atp o n g W eeraset h akul P en-ek R atanaruan g

107 P R OG R A M A Ç ÃO 108 109 110 111 112 113 114 115 116 117

P ara S empre S eu (1955) S eda N e g ra (1961) O C idad ã o (1977) T o n g pan (1977) P eri g o em Ban g k o k (2000) A s D amas de Ferr o (2000) T ransist o r M o nrak (2002) S índr o mes e U m S écul o (2006) Hist ó ria M undana (2009)

118 119

P o nt o de Fu g a (2015)

Tio Boonmee, Que Pode Recordar Suas Vidas Passadas (2010) Freelance: A ta q ue d o C o raç ã o (2015)


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A CAIXA é uma das empresas que mais investem em cultura no Brasil. Através de seleção pública, torna democrática a participação de produtores e artistas de todo o país no processo. Dessa forma, garante a transparência e a possibilidade que um grande público tenha acesso à exposições, teatro, shows, dança e cinema. A vida pede mais que um banco. Pede mais cultura, lazer e arte.

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CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

A CAIXA Cultural apresenta ao público a mostra Cinema Tailandês. A mostra vai exibir, através da seleção de 12 filmes, um panorama histórico do que há de mais significativo na produção cinematográfica tailandesa, em um recorte inédito no Brasil. O patrocínio a esse projeto é um meio de proporcionar aos seus visitantes o contato com essa cultura aparentemente tão distante.


A descoberta de um novo cinema CINEMA TAILANDÊS

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Até o ano de 2010, quando Apichatpong Weerasethakul subiu ao palco principal do Palácio dos Festivais para receber a Palma de Ouro em Cannes, o cinema tailandês era praticamente desconhecido entre nós, embora alguns filmes produzidos no distante Sudeste Asiático já frequentassem a cena alternativa dos nossos festivais. A partir da premiação, houve um aumento de participação dessas produções, que se revelaram surpreendentes por sua cinematografia tão longeva quanto potente e singular – a Tailândia produz cinema pelo menos desde a década de 1940. A mostra Cinema Tailandês é uma oportunidade única de contato com um universo remoto, que guarda com nosso cinema mais similaridades do que imagina o senso comum e mais mistérios do que a nossa imaginação pode criar. Desconhecido do mundo durante muito tempo, o cinema tailandês começou a chamar a atenção internacional no final da década de 1990, com o surgimento de uma nova geração de jovens cineastas. A trajetória histórica do cinema da Tailândia apresenta uma cinematografia sólida e diversificada, que se mantém altamente popular dentro do próprio país. Cinema Tailandês oferece uma breve viagem por esta cinematografia, fornecendo uma vista panorâmica ao público brasileiro. O recorte de doze filmes representa as mais diversas vertentes e importantes obras do cinema tailandês ao longo de sua história. No catálogo de filmes há a projeção da variedade de estilos e gêneros, de temas que envolvem romances históricos, paisagens rurais até a cosmopolita Bangkok, com histórias e personagens urbanos e contemporâneos. Para Sempre Seu (Chuafah Din Salai), de 1955, é o filme mais antigo, e Ponto de Fuga (Vanishing Point), de 2015, o mais recente. No panorama, há diretores como Apichatpong Weerasethakul, o mais renomado e talvez mais peculiar cineasta tailandês em atividade, que passeia pelas artes visuais e produz roteiros extremamente originais, misturando o documental e o ficcional de maneira singular. Vemos também diretores de destaque, como Chatreechalerm Yukol, realizador de grandes sucessos e de carreira duradoura, chegando até a renovação de linguagem na cinematografia tailandesa, proporcionada por nomes como Pen-Ek Ratanaruang. Em termos históricos, o cinema na Tailândia não difere muito da trajetória desta arte em outros países considerados de formação periférica, como é o caso do Brasil. A partir década de 1960, estabeleceu-se uma indústria popular, com filmes que misturavam ação, comédia, musical e romance, e estrelados por atores famosos naquele país. Já na década de 1970, com o movimento estudantil, iniciou-se uma produção politizada, em sincronia com os movimentos de contracultura pelo resto do mundo. No final da década de 1990, em meio a uma crise econômica, a Tailândia viu no próprio cinema


uma forma de revitalizar a economia. Em busca de uma estética visual elaborada que chamasse a atenção fora do país, diretores saídos da publicidade lançaram seus primeiros filmes. Surgiu o “Novo Cinema Tailandês”. Nos anos seguintes, a ascensão internacional continuou com Francis Ford Coppola distribuindo no Ocidente a obra A Lenda de Suriyothai, de 2001. Em 2002, os filmes Transistor Monrak (Monrak Transistor), de Pen-Ek Ratanaruang, e Para Sempre Seu, segundo filme de Apichatpong Weerasethakul, foram exibidos no Festival de Cannes. Foi este cineasta quem levou o cinema tailandês ao ápice do reconhecimento internacional ao receber o Prêmio do Júri em Cannes por Mal dos Trópicos e em 2010 o prêmio máximo, no mesmo festival, por Tio Boonmee, Que Pode Recordar Suas Vidas Passadas. Mesmo com dificuldades financeiras e a censura imposta pelo governo, o cinema tailandês se mostrou um dos mais versáteis e inovadores da atualidade, expandindo seus territórios por obras de gênero e filmes de arte, ganhando público internacional e, ao mesmo tempo, se mantendo forte no próprio país. Outro ponto a destacar é a presença de personagens gays, lésbicas e transexuais, principalmente como protagonistas, que nos filmes tailandeses é muito mais significativa do que no Brasil, nos Estados Unidos, na França e em outros importantes polos cinematográficos. Este aspecto pode ser visto em As Damas de Ferro, que conta a história real de um time de vôlei composto por gays e trans que se preparam para o campeonato nacional. Certamente, trata-se de uma das discussões sociais mais urgentes, e o cinema tailandês, num reflexo da sua cultura, já abriu há muito tempo as portas para a diversidade a partir de suas narrativas. O olhar exótico que costumeiramente se lança sobre a cultura tailandesa poderá se reinventar por meio de um recorte de seu cinema. Uma oportunidade única de trazer ao público brasileiro uma cinematografia rica, diversa e com tanto diálogo a ser realizado.

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Victor Dias e Fabiano de Freitas

Curadores da mostra Cinema Tailandês

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Abramos os olhos para as descobertas que vêm do outro lado do mundo.


AGRADECIMENTOS

Anchalee Chaiworaporn Diversion Electric Eel Films Fábio Bonillo FERNANDA GUIZAN Filmes da Mostra Five Star Production Fortissimo Films GDH Maria da Penha Dias Mono Film Co. Pedro Butcher Raphael Fonseca Sompot Chidgasornpongse Thai Film Foundation T.U.T.A. Viveca Farias

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IDEALIZAÇÃO E CURADORIA VICTOR DIAS E FABIANO DE FREITAS COORDENAÇÃO GERAL E COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO ALESSANDRA CASTAÑEDA PRODUÇÃO EXECUTIVA E PRODUÇÃO AMANDA CASTRO ASSISTÊNCIA DE PRODUÇÃO EXECUTIVA NATALIA MENDONÇA MONITORIA THIAGO TAVARES ASSISTENTÊNCIA DE PRODUÇÃO DANIEL ARAÚJO

ASSISTÊNCIA DE PRODUÇÃO DE CÓPIAS LOUISE LYRIO LEGENDAGEM ELETRÔNICA SILÊNCIO MULTIMÍDIA PROJETO GRÁFICO E VINHETA BALÃO DE ENSAIO [ EVEE ÁVILA E PEDRO LEOBONS ] ASSESSORIA DE IMPRENSA ILUSTRE COMUNICAÇÃO [ PEDRO DE LUNA E JULIANA SAMPAIO ] Tradução e Revisão de Catálogo Fernanda Mello, Fernanda Pantoja E Nely Coelho CONSULTORIA ANCHALEE CHAIWORAPORN REGISTRO FOTOGRÁFICO RODRIGO GOROSITO

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REALIZAÇÃO JURUBEBA PRODUÇÕES

PRODUÇÃO DE CÓPIAS JOÃO CÂNDIDO

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FICHA TÉCNICA

PATROCÍNIO CAIXA E GOVERNO FEDERAL


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CRO NO LO GIA

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U ma b re v e h ist ó ria d o cinema na T ail â ndia

Anchalee Chaiworaporn

1897 A Primeira Projeção de Cinema: A primeira evidência do início da história do cinema da Tailândia apareceu no jornal Bangkok Times de quarta-feira, 9 de junho de 1897, como um anúncio da exibição de The Wonderful Parisian Cinematograph: Picture with Live Movements, no Mom Chaow Alangkan Theatre, de 10 a 12 de junho. 1923 O Primeiro Filme Produzido: O produtor e diretor americano Henry MacRae fez um filme intitulado Nang Sao Suwan (Suvarna of Siam) em colaboração com o Topical Film Service (sob o Departamento de Ferrovias Estatais da Tailândia). Esse filme mudo sobre uma história de amor não foi o primeiro realizado por tailandeses, mas o primeiro a estrelar um elenco completamente tailandês. Foi lançado para o público em 23 de julho de 1923. 1927 O Primeiro Longa-Metragem Local Tailandês, Choke Song Chun (Double Luck), foi produzido pela Bangkok Film Company (propriedade dos Wasuwat Brothers) e lançado em 30 de julho. Foi filmado em 35mm, em preto e branco, e dirigido por Luang Anurakratthakarn, ex-funcionário das Ferrovias Estatais da Tailândia.

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1929 – 1935 O rei Rama vii, também conhecido como rei Prajadhipok, tinha um especial interesse por cinema. Era um cineasta amador e entendia o poder dos filmes na influência da opinião pública e, assim, fez várias políticas para promover a cultura cinematográfica na Tailândia. Oficialmente, abriu diversos grandes cinemas. A lei da censura também surgiu durante o seu reinado. 1931 A lei da censura, conhecida como Lei da Censura de 1930, foi sancionada. 1932 O Primeiro Filme Falado: Depois de realizar o primeiro longametragem, a Bangkok Film Company, agora operando sob o nome de Sri Krung Sound Film Company, fez o primeiro filme tailandês com som sincronizado, chamado Long Tang (Going Astray), que estreou em 1o de abril.


1938 – 1943 Em 16 de dezembro de 1938, o marechal de campo Por Pibulsongkram se tornou o primeiro-ministro e governou como um autocrata. O nacionalismo foi usado para proteger o país da crescente força econômica da comunidade de expatriados chineses e de potências coloniais ocidentais. 1950 O diretor da nouvelle vague Ratana Pestonji entrou para a indústria cinematográfica tailandesa e filmou Panthai Norasing. 1954 Santi-Weena, produzido por R.D. Pestonji e dirigido por Marut, se tornou o primeiro filme tailandês a obter reconhecimento internacional quando ganhou dois prêmios no primeiro Festival de Cinema do Sudeste Asiático. 1961 Seda Negra, de Ratana Pestonji, entrou para a competição do Festival Internacional de Cinema de Berlim. 1962-1970 A constelação de estrelas da Tailândia emergiu, começando com a dupla de herói-heroína Mitr Chaibancha e Petchara Chaowaraj. Eles apareceram juntos pela primeira vez no filme Banthuek Rak Pimchawee (Pimchawee’s Love Diary). 1973-1985 O movimento político estudantil e de contracultura da juventude da Tailândia nos anos 1970 deu origem aos filmes sobre problemas sociais, que frequentemente retratavam a luta de pessoas pobres nas áreas urbanas e de moradores de zonas provinciais. Diretores proeminentes dessa época eram o príncipe Chatrichalerm Yukol, Euthana Mukdasanit, Vichit Kunavut, Surasee Patham, Manob Udomdej e Permphol Choei-arun. As obras incluíam Thepthida Rongraem (The Angel) em 1974, Thewada Dern Din (The Violent Breed) em 1975, Cheewit Budsob (The Hell Life) em 1976, Thongpoon Khoke Pho (The Citizen) em 1977, Thepthida Bar 21 (The Angel of Bar 21) em 1978, Khru Bannok (The Rural Teacher) em 1978, Khon Phukhao (Mountain People) em 1979, Luk Isan (Northeastern Son) em 1982, Mue Puen (The Gunman) em 1983, Namphu (The Story of Namphu) em 1984, e Pheesue Lae Dokmai (Butterfly and Flower) em 1985.

O governo aumentou o imposto sobre filmes estrangeiros de 2,20 baht (US$ 0,06) para 30 baht (US$ 0,86) por metro de filme num esforço para promover o cinema nacional.

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1976 Em 6 de outubro de 1976, o Exército invadiu a Universidade Thammasat, onde estudantes se manifestavam contra o retorno de três tiranos. Um grande número de estudantes foi massacrado e preso. Muitos fugiram para a selva.

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A maioria dos filmes desse período foi selecionada pelos festivais internacionais de cinema de Berlim, Nantes e Havaí.


1977 Distribuidoras de filmes de Hollywood fizeram um boicote e não foram mais para a Tailândia. Mais de 160 filmes tailandeses inundaram os cinemas anualmente. 1985-meados de 1990 O videocassete chegou e o cinema tailandês sofreu uma enxurrada de filmes adolescentes, começando com a formação da Tai Entertainment Company e a chegada dos diretores Thanit Jitnukul, Adirek Wattalela, e Somjing Srisuphab. Alguns dos mais famosos filmes adolescentes dessa era foram Suem Noi Noi Kalon Mak Noi (Be More Crafty Hide Your Dullness) em 1985, Pluem (Delighted) em 1986, a série em seis partes Boonchoo, e Kling Wai Kon Phor Son Wai (The Time Not Beyond) em 1991. Os filmes adolescentes se mostraram tão populares que até mesmo um diretor da era de temas sociais, como o príncipe Chatrichalerm Yukol, acabou fazendo dois, Sia Die (Daughter) em 1995 e sua sequência Sia Die 2 (Daughter 2) em 1996, ambos com foco em questões juvenis. 1991 O Instituto Goethe abriu uma oficina de cinema experimental, que pela primeira vez ofereceu uma oportunidade de tanto os estudantes quanto o público filmarem. 1993 O governo tailandês foi obrigado pelo governo americano a reduzir o imposto sobre filmes importados de 30 baht (US$ 0,86), que tinha sido fixado em 1976, para 10 baht (US$ 0,30) por metro de filme. Essa redução do imposto provocou uma onda de filmes americanos sendo exibidos na Tailândia. 1994 Thailand’s Entertainment Theatres Network e a Golden Village, baseados em Hong Kong e na Austrália, inauguram o EGV, o primeiro complexo de salas de cinema do país.

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1997 Em fevereiro, em meio à crise da indústria, Fun Baa Karaoke, o primeiro filme do diretor de comercial de televisão Pen-Ek Ratanarueng, surpreendeu o mundo do cinema tailandês como o primeiro filme da década a estrear no Festival Internacional de Berlim. Em abril, Dang Bireley and the Young Gangsters (2499 Anthaphan Krong Muang), outro primeiro filme de diretor de comercial de televisão, Nonzee Nimibutr, atraiu o público tailandês atravessando gerações e quebrando todos os recordes tailandeses de público. No mesmo mês, o primeiro Festival de Cinema de Arte foi organizado por companhias privadas para mostrar a obra de estudantes de cinema e artes tailandeses; esse festival marcou a primeira exibição tailandesa do trabalho de Apichatpong Weerasethakul.


Em agosto, o primeiro Festival de Vídeo e Curta Tailandês foi lançado e abriu oportunidades para estudantes e o público em geral. Em outubro, outro diretor da indústria da propaganda tailandesa, Oxide Pang, nascido em Hong Kong, entrou no campo com Who Is Running? 1998 Um jovem e desconhecido diretor, Apichatpong Weerasethakul, silenciosamente fez sua estreia dirigindo Objeto misterioso ao meio-dia, com o financiamento do fundo Hubert Bals do Festival de Cinema de Roterdã. É um documentário ficcional sobre a vida do povo tailandês em quatro regiões. O Festival de Cinema de Bangkok começou em setembro, sob os auspícios do Nation Multimedia Group. 2000 Apesar do lançamento do Novo Cinema Tailandês, filmes locais caíram para apenas nove títulos anuais, incluindo as estreias dos diretores Wisit Sasanatieng, Tears of the Black Tiger, e Yongyoot Thongkongthun, As Damas de Ferro. 2001 Tears of the Black Tiger, de Wisit Sasanatieng, foi o primeiro filme tailandês a entrar na seleção oficial de Cannes, enquanto As Damas de Ferro se tornou o primeiro filme tailandês a ser amplamente distribuído em países estrangeiros — em mais de trinta regiões.

Em Cannes, Transistor Monrak, de Pen-Ek Ratanarueng, foi o primeiro filme tailandês a ser selecionado para o Directors Fortnight. Um homem de lugar nenhum, Apichatpong Weerasethakul também surpreendeu a comunidade tailandesa de cinema com seu desconhecido trabalho Eternamente sua para entrar na mostra Un Certain Regard e vencer o prêmio Mécénat Atladis.

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2003 Pen-Ek Ratanarueng começou sua primeira coprodução internacional de longa-metragem, Last Life in the Universe, estrelado pelo ator japonês Asano Tadanobu e pelo fotógrafo, baseado em Hong Kong, Christopher Doyle. Foi também o primeiro filme tailandês na seleção de Veneza.

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2004 Ong Bak teve seus direitos comprados pela distribuidora francesa EuroCorp, propriedade do mundialmente famoso diretor Luc Besson para lançamentos na Europa, nos Estados Unidos e na Austrália. Na primeira semana de lançamento na França, em abril de 2004, ele começou em quinto lugar nas bilheterias, vendendo 440.495 ingressos em apenas 281 salas.

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2002 Em março, Francis Ford Coppola e o príncipe Chatrichalerm Yukol anunciaram sua colaboração para o lançamento internacional de Suriyothai.


Mal dos Trópicos, de Apichatpong Weerasethakul, foi o primeiro filme tailandês na competição oficial de Cannes e também o primeiro a ganhar o Prêmio Especial do Júri. Em setembro, outra estreia na direção, The Shutter, de Pakpoom Wongpoom e Banjong Pisanthanakul, se tornou o estouro de bilheteria do ano e impulsionou o terror tailandês no mercado internacional. Seus direitos de remake também foram comprados pela Regency Enterprises, de Hollywood, e pela Vertigo Entertainment. 2005 Em 10 de fevereiro, Ong Bak foi lançado em todo o território americano, arrecadando 4.434.189 dólares em sete semanas. 2006 Graceland, de Anocha Suwichakornpong, foi a primeira obra de um estudante tailandês a entrar na Cinefondation em Cannes.

Síndromes e um século, de Apichatpong Weerasethakul, foi o primeiro filme tailandês a participar da competição oficial de Veneza. 2007 O príncipe Chatrichalerm Yukol começou seu segundo épico, King Naresuan, com apoio de fundos governamentais. Tornou-se a mais longa série tailandesa de filmes, com o episódio final (sexto) sendo lançado em 2015. 2008 A atriz de artes marciais Jeeja Yanin foi alçada à fama por sua atuação de estreia em Chocolate, de Prachya Pinkaew, o mesmo diretor de Ong Bak. O primeiro longa-metragem de Aditya Assarat, Wonderful Town, venceu seus primeiros prêmios em Busan e Roterdã, antes de ser internacionalmente distribuído pela Momento Films International, de Paris. Foi vendido para 25 países e convidado para mais de cinquenta festivais.

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2009 A primeira lei de classificação de filmes, de 2008, foi sancionada pelo governo, substituindo a antiga Lei da Censura de 1930. 2010 Tio Boonmee, Que Pode Recordar Suas Vidas Passadas, de Apichatpong Weerasethakul, venceu a Palma de Ouro de Cannes. A diretora Anocha Suwichakornpong finalizou seu primeiro longa-metragem, História Mundana, e venceu vários prêmios internacionais, incluindo Roterdã. Indie Uruphong Raksasad finalizou seu primeiro documentário, Agarian Utopia, e venceu vários prêmios, incluindo o prêmio Asia Pacific Screen’s UNESCO.


O primeiro filme lésbico tailandês, Yes or No, de Sarasawadee Wongsompetch, se tornou um inesperado sucesso, dando origem a vários filmes do gênero no ano seguinte. 2011 Filmes independentes tailandeses entraram em ascensão, tanto no país quanto internacionalmente. Os filmes independentes na Tailândia podem ser classificados em três grupos – independentes comerciais, cinemas de arte start-ups e indie internacional. Os indies comerciais normalmente fazem filmes de gênero, como terror, ação e comédia, da mesma forma que os diretores do mainstream. Os diretores de cinemas de arte startup são diretores amadores sérios, como estudantes de cinema e técnicos que fazem filme e depois os lançam em um cinema de arte em Bangkok. Não esperam altos lucros, apenas exposição. O indie internacional, como o Weerasethakul, normalmente se inscreve para financiamento estrangeiro e depois usa o reconhecimento que teve no exterior para ter um lançamento doméstico. Jovens se juntaram a ele, como Sivaroj Kongsakul (Eternity, 2011), Wichanon Somumjarn (In April the Following Year, There Was a Fire, 2012), Nawapol Thamrongrattanarit (36, 2012), Vorakorn Ruetaivanichkul (Mother, 2012), Nonthawat Numbenchapol (Boundary, 2013), Visra Vichit-Vadakan (Karaoke Girl, 2013), Jakkrawal Nilthamrong (Ponto de Fuga, 2015). Mesmo o diretor veterano Pen-Ek Ratanarueng foi fazer cinema independente com seu oitavo longa, Headshot. Filmes populares tailandeses começaram a entrar no mercado chinês, primeiramente através da pirataria on-line, e depois sendo trazidos oficialmente, com A Little Thing Called Love, de Puttipong Pormsaka Na-Sakonnakorn e Wasin Pokpong, e o filme lésbico Yes or No como os mais bem-sucedidos. Estrelas tailandesas como Mario Mauer, Sucharat Manaying e Suppanad Jitaleela se tornaram ídolos populares. A Little Thing Called Love foi lançado em mais de trinta cinemas um ano depois.

NOTA: Todas as informações são precisas da época da impressão e baseadas no método pessoal de pesquisa e coleta da escritora, pois a Tailândia não tem uma organização central que colete dados ou informações sobre o cinema tailandês. As informações apresentadas aqui foram checadas em fontes em inglês e tailandês na Tailândia, e foram regularmente atualizadas. Mas mudanças podem ocorrer a qualquer momento.

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2015 O oitavo longa-metragem de Weerasethakul, Cemitério do Esplendor, foi exibido na mostra Un Certain Regard no Festival de Cinema de Cannes. O filme foi impedido pelo próprio diretor de ser lançado na Tailândia devido à censura rígida. Ele anunciou que não faria mais filmes em seu próprio país inúmeras vezes.

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2013 Banjong Pisanthanakun, diretor de Shutter, levou seu quarto longa-metragem, Pee Mak, ao topo do ranking de bilheteria no país, um remake dos mais conhecidos contos de fantasmas da Tailândia.


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TEX TOS

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O HO M E M Q U E MORREU POR SUA ARTE Anchalee Chaiworaporn

Todos os direitos reservados.

Antes de Apichatphong Weerasethakul, que insiste no estilo experimental e trouxe fama para o cinema tailandês ao ganhar seu primeiro prêmio em Cannes em 2004, houve um homem que lutou para viver com sua arte e acabou morrendo pelo que acreditava. Hotel Montien, Bangkok, agosto de 1970 O diretor Ratana Pestonji estava bastante otimista quando entrou no Hotel Montien naquela noite úmida de agosto. Depois de anos de frustração, finalmente alcançava seus objetivos. Tinha conseguido fazer o governo agir; o ministro da Economia Bunchana Atthakorn concordara em se encontrar com os diretores tailandeses para discutir meios de apoiar o cinema nacional. Embora tivesse deixado de dirigir filmes seis anos antes, Ratana ainda era o homem do momento. Bunchana abriu o evento, mas todos os que se encontravam na sala de conferência do hotel estavam ansiosos para ouvir o que Ratana tinha a dizer – o discurso dele seria de longe o mais importante. Numa conversa com o vice-presidente da Associação de Produtores de Cinema Tailandês, Sa-nguan Matthawaphan, Ratana não conseguia disfarçar a alegria: “Sa-nguan, faz tanto tempo que esperamos por este dia. Espero que finalmente consigamos o que queremos”.

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Depois que o ministro encerrou sua fala, diversos diretores subiram ao palco, um após o outro, para fazer sua defesa pelo financiamento governamental. Finalmente, era a vez de Ratana; ele tinha pedido para falar por último. Eram nove da noite. “Quando comecei a fazer cinema”, começou ele, “Sadet Ong Chai Yai (príncipe Bhanu Yugala) tinha acabado de me contratar como fotógrafo de um filme que ele queria fazer chamado Phanthaay Norasingh. Investi cada baht que ganhei nas minhas produções, e agora tenho que fazer propaganda para sobreviver. Os distribuidores estrangeiros pilharam os cinemas tailandeses…” Ratana perdeu a voz. Em seguida, na frente de um público chocado, desabou no chão, inconsciente. Incapaz de ressuscitá-lo, os amigos


de Ratana correram com ele para o hospital mais próximo, o Chulalongkorn. Ele morreu três horas depois de infarto no miocárdio. Ratana tinha devotado os melhores anos de sua vida ao cinema; sua morte mandou ondas de choque para a indústria. Alguns dias depois daquela reunião de 17 de agosto, o governo decidiu instaurar o Comitê para Divulgação do Cinema Tailandês. A nova organização seria responsável por promover e estimular o investimento em filmes nacionais. O nome de Ratana foi gradualmente desaparecendo da memória coletiva. Hoje, 35 anos depois de sua morte, poucas pessoas se lembram das conquistas desse homem notável. Nascido na Tailândia, filho de uma família de origem iraniana, Ratana mostrou, desde pequeno, um interesse ávido por fotografia. “Papai era apaixonado por câmeras desde criança”, lembra-se Phannee Trangkhasombat, a filha de Ratana, em uma recente entrevista. “Contaram-me que ele desmontava e remontava sua câmera tantas vezes que o meu avô decidiu mandá-lo para a Universidade de Londres estudar engenharia.” Na Inglaterra, mergulhado nos estudos, Ratana ainda encontrava tempo para tirar fotos, e ganhou diversos prêmios em concursos de fotografia. Depois de se formar, voltou para casa com um diploma em engenharia que nunca usou. Rapidamente encontrou emprego como vendedor de filme, e começou a explorar uma forma de arte que na Tailândia ainda dava os primeiros passos – a cinematografia. Em 1937, fez seu primeiro filme amador, Taeng – a história de uma jovem tailandesa. Taeng foi selecionado para a Competição de Cinema Amador de Glasgow, Escócia, e ganhou o prestigioso prêmio Alfred Hitchcock.

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Ele assumiu o projeto com um entusiasmo sem limite. “Papai quase morreu durante as filmagens”, recorda sua filha. Ao tentar capturar o ângulo mais dramático para um clímax do filme, “quase foi esmagado por um navio – ele sempre buscava a perfeição. Conseguia saltar do meio do caminho no último minuto, segurando a câmera como um recém-nascido”.

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Ratana continuou seu trabalho como vendedor até conhecer Sadet Ong Chai Yai (príncipe Bhanu Yugala), uma figura poderosa na indústria cinematográfica tailandesa. O príncipe o convidou para exercer seu talento como cinegrafista no filme Phanthaay Norasingh, em 1949.


Dois anos após o início de sua carreira profissional, Ratana expandiu seus horizontes dirigindo o primeiro longa-metragem, Tukkata Jaa (Querida boneca). Foi muito bem-recebido. Fundou a própria produtora, a Hanuman Moving Pictures, em 1953. Ratanna sabia que agora tinha de levar as coisas a sério. Enquanto a maioria dos diretores tailandeses se contentava em filmar em 16mm, que necessitava de dublagem na pós-produção, somente o padrão internacional era o suficiente para Ratana. Ele filmou sua primeira produção, Santi-Weena, no superior (e mais caro) 35mm, com som direto. Dessa vez, ele se concentrou apenas na fotografia, entregando a direção para Khru Marut.

Santi-Weena foi selecionado para o Festival de Cinema do Sudeste da Ásia, em Tóquio, junto com outros 36 longas-metragens do Japão, das Filipinas, de Hong Kong, da Malásia, de Taiwan, da Índia, do Ceilão, do Paquistão e da Tailândia. O filme levou três prêmios, melhor fotografia, melhor direção de arte e o Golden Harvest Award por melhor apresentação cultural asiática. Mas o governo tailandês não se impressionou. Retornando de forma triunfante, cheio de prêmios na bagagem, Ratana ficou surpreso com o tratamento recebido. Não apenas teve de pagar 5 mil dólares em imposto (125 mil bahts) pela câmera Mitchell de 16 mil dólares que ganhou no festival, como também foi multado em mil bahts por não ter submetido seu filme à censura tailandesa. No entanto, não foram apenas nuvens negras, pois o filme foi muito elogiado na Tailândia e distribuído na Rússia e na China – algo inédito para o cinema tailandês.

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Embora frustrado com a burocracia tailandesa, o vigoroso diretor continuou seu trabalho como diretor e fotógrafo em Chua Fah Din Salai (Para Sempre Seu), Rongraem Nark (O Hotel Diabólico), Sawan Mued (Paraíso Escuro), Phrae Dam (Seda Negra), o qual ele enviou para o Festival Internacional de Cinema de Berlim em 1961, e Namtam Mai Warn (O açúcar não é doce), assim como alguns documentários. Os longas de Ratanna normalmente incorporavam um experimento. Rongraem Nark foi todo filmado em apenas um set – uma técnica difícil, que Hitchcock empregou de forma bem-sucedida no filme Festim diabólico. Seus filmes muitas vezes iam contra a corrente por ousar ter finais infelizes – os quais normalmente destroem a arrecadação nas bilheterias. Esse é provavelmente o motivo pelo qual seus filmes eram mais respeitados do que de fato assistidos. Phannee disse: “Não era sempre que perdíamos dinheiro. Apenas o Rongraem Nark


e o Phrae Dam foram fracassos financeiros. Mas é verdade que, na maioria das vezes, ganhávamos mais elogios que dinheiro”. Quinze anos depois do primeiro filme profissional, Ratana decidiu que era hora de parar. Estava frustrado com o processo todo e sua saúde não se adequava mais às exigências da indústria do cinema Mas ele não conseguiu se afastar completamente. Continuou a lutar por apoio e cofundou a Associação de Produtores de Cinema Tailandês. Como presidente da associação, ele constantemente argumentava com o marechal Thanom Kittikajorn, discutindo a importância dos filmes tailandeses – até o último suspiro. Phannee recordou aquela noite trágica, “Estresse e raiva foram as principais causas da morte de meu pai”, insistiu Phannee. “Se papai não tivesse feito aquele discurso, descarregando sua paixão, não acho que ele teria morrido tão cedo.” “Papai tentou trazer fama e respeito para o seu país. Mas o governo não se importava. Ele com frequência reclamava que ‘o governo tampava os ouvidos sempre que tinha algo a dizer’.” Mas o martírio de Ratana não ajudou muito a causa. A comunidade do cinema tailandês esteve disposta por pouco tempo, e a indústria está enfrentando as dificuldades de sempre. Hoje, o governo parece apoiar mais o cinema tailandês. Porém, ainda tem de ser sob a condição de que arte você vai fazer. Isso é visto claramente na reação do Estado a Tropical Malady e Ong Bak – dois filmes que simultaneamente trouxeram a fama tailandesa. Embora o último tenha ganhado dois prêmios do governo, o de Diplomata da Cultura para o ator Tony Jaa e o de Prestígio para o produtor, Mal dos Trópicos ainda caminha na estrada do silêncio e da solidão.

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M el h o r é imp o ssí v el: f ilmes tailandeses em 2015 Anchalee Chaiworaporn Em 2015, a mídia local proclamou, como sempre, o declínio do cinema tailandês. As bilheterias continuaram a cair e produtores inexperientes tentaram atrair o público com grande divulgação para que os espectadores corressem para ver seus trabalhos nem que fosse por curiosidade. Apesar disso, o ano foi cheio de ideias novas, diversidade e fluidez. Novos rostos – incluindo o de mulheres e gays – chegaram e apresentaram novas visões, tanto estética quanto comercialmente. Os gêneros estavam diversificados, e havia lugar até para os documentários. Novos festivais pareciam surgir a cada mês. O público nunca teve tanta opção.

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Se 2014 foi o ano da bolha cinematográfica tailandesa, 2015 foi um momento de progresso, embora isso possa levar alguns anos para ficar realmente evidente. Lançamentos locais caíram de 67 para 57 títulos, a maioria vinda de novatos. Estúdios produziram apenas alguns títulos – não mais, talvez menos, que seus colegas independentes. Mesmo o estúdio mais produtivo, Sahamongkol Film, reduziu sua produção de dois títulos por mês para nove por ano. O resto – Gmm Tai Hub, Five Star Production, M-Thirty-nine, o recém-inaugurado Transformation Films e o Mono Films – fez entre um e três filmes. Todos os estúdios ficaram muito seletivos e hesitaram em fazer novos investimentos. Os orçamentos diminuíram, já que produções locais sempre foram consideradas de alto risco e as estrelas não conseguem mais atrair os espectadores. Os estúdios também tinham de levar em consideração que o público tinha se tornado bem mais seletivo e crítico. Sob essas circunstâncias, a única maneira de sobreviver foi melhorando a qualidade. M-Thirty-nine é um exemplo claro disso. Ex-produtor de blockbusters – às vezes bobos –, o estúdio abriu os braços para o veterano Wisit Sasanatieng, que não fazia um filme havia cinco anos, para o longa de terror Senior. O quinto trabalho de Sasanatieng apresentava um estilo híbrido, criativo e bem-humorado. Uma aluna do ensino médio, Mon, tem um sexto sentido e pode encontrar fantasmas pelo cheiro – como um cão que fareja. Os amigos acham que ela é uma psicopata que fala


sozinha, mas no mundo interior de Mon, ela é perseguida por um cara invisível, o Senior. A dupla se depara com vários incidentes estranhos e vê diversos fantasmas na escola, então decide se unir e investigar várias mortes e assassinatos misteriosos. Sasanatieng desafia o público ao criar novos tipos de fantasmas, e mostra sua criatividade combinando cinema de arte e estilos populares de forma inovadora. Como Andy Warhol, Sasanatieng há muito é conhecido como um homem de alta e baixa cultura. Muitas caras novas seguiram seu exemplo. Entre eles, Nawapol Thamrongrattanarit se tornou o mais controverso e bem-sucedido jovem diretor a cruzar a fronteira do cinema de arte para o cinema popular. Conhecido por ser um escritor jovem e badalado, o autodidata Thamrongrattanarit começou a carreira de diretor fazendo curtas experimentais. Como jovem escritor, foi convidado pelo gth a se juntar ao time de roteiristas, pois seus filmes também tinham como público-alvo jovens urbanos. Quando quis estrear com seu 36 (2012), Thamrongrattanarit usou os próprios recursos. Com a ajuda de produtores de cinema de arte, Soros Sukhum e Aditya Assarat, 36 foi premiado em Busan. Seu segundo longa-metragem, Mary Is Happy, Mary Is Happy (2013), foi financiado pela Biennale College Cinema. Ambos os trabalhos tiveram um sucesso inesperado, tendo bom desempenho mesmo com seu lançamento limitado em Bangkok e no interior. Sendo um jovem escritor popular, Thamrongrattanarit sempre atrai jovens multidões para o que quer que faça. Então, o gth não hesitou em convidá-lo para se juntar à empresa e fazer seu terceiro longa, o Freelance: Ataque do Coração (Freelance: Ham puay... Ham phak... Ham rak mor) (2015).

Imediatamente depois de Freelance: Ataque do Coração, o gth lançou May Who? (May Nai Fai Rang Frer), o segundo longa do jovem

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Mas a aposta funcionou, e Freelance: Ataque do Coração se tornou o segundo maior sucesso de bilheteria do ano, arrecadando mais de 2,2 milhões de euros e arrebatando vários prêmios locais.

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Talvez inspirado por sua própria experiência como freelancer, Freelance: Ataque do Coração acompanha a vida de um designer gráfico que é aconselhado pela dermatologista a mudar seus hábitos de workaholic para curar uma brotoeja. Ele faz o que lhe é dito, mas descobre que não consegue cumprir seus prazos. Thamrongrattanarit emprega um estilo alternativo de fazer cinema – interpretação naturalista, sequências longas e câmera na mão – em uma comédia romântica. Foi um desafio para o estúdio, há muito conhecido por seus filmes água com açúcar para o grande público.


diretor Chayanop Boonprakob (SuckSeed, 2011). O filme tinha sido engavetado em 2015 devido a escândalos envolvendo a atriz principal Narikun Ketprapakorn. Os fãs do gth estavam felizes com a volta do estilo regular da empresa, e o filme alcançou o terceiro lugar nas bilheterias, arrecadando 1,8 milhão de euros. May Who? foi aplaudido pela crítica por seu excelente elenco, roteiro conciso e edição de ritmo acelerado, e foi indicado para todos os prêmios locais. Outros diretores estreantes também entraram para a indústria, misturando estilos artísticos com filmes de gênero. O diretor de cinema indie coreano Josh Kim transformou seu curta-metragem Draft Day em seu primeiro longa, o Como Vencer no Jogo (Sempre) (How to Win at Checkers) (2015). O filme foi inscrito para representar a Tailândia no Oscar de melhor filme estrangeiro e ano passado foi apresentado em Udine. Outra novata, Anucha Boonyawatana, empregou edição lenta e cinematografia meticulosa em seu primeiro filme de terror gay. The Blue Hour retrata a vida de dois jovens gays que perambulam por lugares desérticos e se envolvem no assassinato das próprias famílias. Boonyawatana se inspirou em vários homicídios da Tailândia, e os descreve em um filme que é tanto surreal quanto realista. Quando novatos trabalham como um time, o resultado pode ser imprevisível. Grace foi tão controverso que foram lançadas duas versões – uma para maiores de 18 anos e outra para maiores de 20. Kulp Kaljaruek o produziu; a dupla de diretores Pun Homchuen e Onusa Donsawai desenvolveu o projeto a partir de um curta-metragem. Grace fala dos hábitos populares entre os adolescentes tailandeses, que amam compartilhar a vida pessoal nas redes sociais e ganhar “curtidas”.

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As novas faces também incluíram seis diretoras. Kanittha Kwanyoo se tornou a diretora mais bem-sucedida do ano passado devido ao escandaloso problema da censura por que passou seu terror budista Arpat. O filme conta a história do noviço Sun, que é forçado a ser ordenado. Ele não consegue se livrar de seus desejos humanos e vai atrás da ex-namorada antes de se apaixonar por uma garota que mora perto do templo. O jovem monge também encontra muitas pessoas estranhas – um louco, um abade em sofrimento e um misterioso monge mais velho que aparece durante a noite e o ajuda. Arpat foi proibido por um grupo religioso em razão das atividades dos personagens. Mais tarde, diversas cenas foram excluídas e o título mudou. Os espectadores então correram para assistir ao filme, que chegou ao quarto lugar nas bilheterias. O expatriado inglês Paul Spurrier tentou seu segundo terror tailandês com The Forest, seguindo seu longa P (2005). Filmado com orçamento limitado, The Forest explora a vida de aldeãos na remota


Tailândia. Um monge se muda para uma vila rural para recomeçar a vida como professor. Está cheio de esperança e inspiração. Ele conhece uma garota muda que é intimidada pela filha do chefe local e faz amizade com um garoto na floresta. The Forest é um filme de terror silencioso com uma linda cinematografia e uma profunda exploração das relações humanas. O diretor veterano Apichatpong Weerasethakul fez a primeira exibição de seu oitavo longa-metragem, Cemitério do Esplendor em Cannes, na mostra Un Certain Regard, com a enorme e calorosa recepção de sempre. Em razão da discussão contra a política contemporânea tailandesa, o filme foi lançado na sua terra natal. Cemitério do Esplendor detalha a estranha relação de uma dona de casa, tia Jen, que se voluntaria para cuidar de um soldado que sofre de uma estranha doença do sono. Mais uma vez filmado em sua cidade natal, Khon Kaen, Weerasethakul explicitamente faz um comentário direto contra a ocupação militar e o domínio do poder real na Tailândia. O diretor também anunciou que esse seria seu último trabalho filmado no país e que provavelmente o projeto seguinte seria realizado em um país sul-americano. Alguns diretores se saíram bem internacionalmente com filmes de arte. Jakkrawal Nilthamrong finalmente lançou seu filme experimental de estreia, Ponto de fuga (Vanishing Point) (2015), depois de ganhar o Tiger Award de Roterdã no ano anterior. Baseado num acidente que ainda o assombra, Nilthamrong combina história pessoal com budismo para produzir uma obraprima experimental. Da mesma forma, Uruphong Raksasad lançou a parte final de sua trilogia documental agrária, Song of Rice (2015).

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Quase no final de 2015, o gth, o mais bem-sucedido estúdio tailandês, chocou a indústria inteira encerrando suas atividades – somente para reabrir um mês depois. Os acionistas G (Grammy Film) e H (Hub Ho Hin) fundaram uma nova empresa chamada gdh 559, na qual algumas das ações foram distribuídas para seus diretores e funcionários. O T (Tai Entertainment) fez uma fusão com um novo império do entretenimento, o Monogroup, formando um novo estúdio chamado T Moment.

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Outro experiente diretor Kongdej Jaturonrassamee lançou seu sétimo filme, Snap, logo após a première em Tóquio. Snap é mais f ácil de entender que seus outros trabalhos, e ele achou que um lançamento local imediato faria com que o filme fosse bem nas bilheterias. O filme é sobre dois ex-amantes que se encontram numa festa de casamento. Isso leva a nostalgia e algumas revelações. É um doce retrato do amor nos tempos da Tailândia controlada pelo Exército.


O surgimento de novos diretores e a volta de alguns veteranos trouxeram diversidade. Terror e comédia são hoje mais populares do que nunca, mas também havia drama, romance, animação, cinema experimental, cinema de arte e documentários. Alguns desses gêneros migraram para áreas como terror gay, comédia de terror, comédia romântica e animação gay. Isso aumentou a opção dos apreciadores de cinema. De forma geral, o traço comum do cinema tailandês dos últimos dois anos foi a produção diversificada realizada por empresas menores. A indústria agora compreende muitos grupos fragmentados, e as produções dos estúdios às vezes não são tão diferentes das produções independentes. Diversos gêneros podem estar contidos em um só filme, e cinema de arte e cinema popular se fundiram. O resultado é um momento muito rico e gratificante para o cinema tailandês.

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Anchalee Chaiworaporn Anchalee Chaiworaporn escreve para revistas especializadas em cinema na Tailândia e no exterior a mais de duas décadas. Ganhou o prêmio de melhor crítica de cinema na Tailândia no ano 2000 e melhor escritora de longa-metragem em 2002. Desde esse mesmo ano, ela viaja entre a Asia e os Estados Unidos para pesquisas sobre cinema asiático através de recursos estrangeiros. Contato: ancha999@gmail.com


Óci o: meditaç ã o, narraç ã o e su b v ers ã o Felippe Moraes O artista visual japonês On Kawara iniciou Today Series, a obra pela qual é mais conhecido, em 1966, e a produziu até sua morte, em 2014. Trata-se de uma série em que, com gestos muito simples, mas de retumbantes consequências conceituais, escreve sobre um fundo monocromático a data do dia em que esta foi produzida, sempre seguindo a regra de que, caso não conseguisse terminá-la antes da virada para o dia seguinte, seria destruída. Essa série, pela compreensão cronológica ou acronológica que produz, de certa maneira suspende o tempo e distorce a nossa própria concepção do mesmo, de forma que, ao escrever este primeiro parágrafo, uma das principais dificuldades para descrever os processos empreendidos foi justamente escolher os tempos verbais corretos e suas respectivas concordâncias ou discordâncias.

Um contemporâneo de On Kawara, o taiwanês Tehching Hsieh, um dos primeiros grandes expoentes da performance, é um artista pertinente no que diz respeito a essas condições levantadas sobre

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O mesmo parece acontecer com os filmes Síndromes e Um Século, Mal dos Trópicos e Tio Boonmee, Que Pode Recordar Suas Vidas Passadas, do diretor tailandês Apichatpong Weerasethakul, e História Mundana, de Anocha Suwichakornpong. Em cada uma dessas obras, o tempo parece suspenso, retirado de circulação como um sistema monetário ultrapassado, produzindo a noção que Mike Featherstone chamaria de “presentes perpétuos”. A própria comparação com um sistema monetário é muito pertinente para a apreensão temporal desses filmes e a relação estabelecida com o tempo na contemporaneidade. Segundo Marx, “capital é trabalho morto”, e trabalho está intimamente ligado a tempo de vida: o que se aprende, produz, consome, imagina e todas as outras práticas humanas tangíveis ou intangíveis. Desta forma parece que, em verdade, se vive em um momento em que o maior dos artigos de luxo é o tempo per si. Em uma era em que seres humanos são avaliados por produtividade e consumo, ócio pode tanto ser um ato de extravagância e opulência como também um posicionamento político revolucionário e de subversão de uma ordem vigente.


o tempo e a relevância ou não de um sujeito sob o jugo social de “produtivo” ou “improdutivo”. Em 1980 o artista iniciou Time Piece, uma das cinco obras da série One Year Performances, em que instalou em seu apartamento um relógio de ponto, o qual era acionado uma vez a cada hora completa. Em cada um destes momentos o artista parava o que quer que estivesse fazendo, vestia um macacão de operário fabril, batia ponto e se fotografava ao lado da máquina. O comprometimento com o trabalho era tamanho que, das 8.760 vezes que tinha que bater ponto ao longo de um ano, perdeu apenas 134. É curioso reparar como, pouco antes de iniciar essa performance, Hsieh raspou o cabelo para que seu crescimento fosse uma forma de dar tangibilidade ao tempo por meio do desenvolvimento fisiológico do corpo do sujeito, visível na sutileza das diferenças entre uma fotografia e outra e principalmente no conjunto monumental de todas elas agrupadas e seriadas. Esse detalhe se torna uma das grandes potências da obra, inclusive sobrepujando o relógio como marcador de tempo, em que, na escala de um ano, as meras doze horas marcadas em cada um de seus ciclos se tornam quase irrelevantes.

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Em Síndromes e Um Século é onde essas questões talvez estejam mais presentes. Com uma característica e obstinada lentidão, o filme arrasta a cronologia de maneira tão poderosa que passa a deixar de existir seja em sua narrativa, que em muitos momentos se torna irrelevante, seja na própria apreensão do observador. Ao assistir ao filme, em alguns momentos entre a perda de atenção para com a história desenvolvida na obra e seu retorno à própria presença do sujeito observador em seu corpo, perde-se também a noção de que se está assistindo ao filme por quinze minutos, quiçá por alguns dias. Ao retomar a atenção ao filme, percebe-se que pouco se perdeu do desenrolar da história, e talvez seja esse um de seus aspectos mais potentes. Quase como uma oposição ao cinema comercial, em que cortes se multiplicam em progressões aritméticas, talvez até geométricas, o grande mérito do filme é justamente o tédio. É curioso como essa expressão, tão abominada na contemporaneidade, em que tudo deve ser rápido, divertido e surpreendente, acaba por se tornar um precioso artefato na obra de Weerasethakul. Em 2009 a revista DASartes colocou a seguinte questão ao artista espanhol Antoni Muntadas: “Em algum momento você chegou a dizer que a arte deve ter uma função social, uma utilidade. Nesse caso, não se pode falar em arte sem público, sem comunicação. Você se interessa especialmente pelo público...” Ele respondeu: “Eu vou dizer algo que acho que já disse, e que muita gente já disse também. Não há livro sem leitor nem filme sem alguém que o veja. O público fecha o círculo, e o faz de diferentes formas. (...) Acho que a interpretação e os valores pessoais precisam ser enfatizados. Voltemos ao lema: Atenção: Percepção requer envolvimento.” Talvez


dois dos grandes méritos dos filmes de Apichatpong Weerasethakul sejam justamente a sua inação e sua inutilidade, tidas como artefato de subversão de uma ordem vigente paradoxalmente produzindo a percepção do sujeito pela própria ausência momentânea de atenção para com o filme que se está assistindo. A resposta do artista é muito pertinente à discussão aqui levantada sobre o próprio fato da perda de atenção do observador. Em um ato já político e subversivo, como discutido anteriormente, dedicando a opulência do seu tempo à retórica e à emblemática inutilidade prática de uma obra de arte (e por isso mesmo com uma indubitável função social, como defendida por Muntadas, nesse caso de louvação à ociosidade), torna-se ainda mais poderoso quando o sujeito se desprende dela pelo tédio intencional provocado pela narrativa, fazendo-o habitar, por alguns instantes, um ambiente subjetivo de ócio e improdutividade. Desta maneira, desenvolvendo o pensamento de Muntadas, diria inclusive que, não só “percepção requer envolvimento”, como também o desprendimento e a desatenção podem desenvolver outra percepção sobre o filme em questão. Como o artista mesmo diz, “o público fecha o círculo e o faz de diferentes formas”. Aqui o círculo é fechado com a potência política da inércia, da inatividade e da desatenção.

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Ao discutir os filmes em questão e colocá-los ao lado das obras de Kawara e Hsieh, assim como da presença dos monges, é impossível não pensar sobre os próprios exercícios meditativos destes religiosos, como também dos artistas, e na proposta da experiência do espírito como libertação do que se conhece como Samsara, ou o ciclo das encarnações, no qual, segundo o budismo, estamos encarcerados enquanto não atingimos o grau de iluminação. Em História Mundana essa questão fica muito clara desde o título, que,

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É igualmente pertinente perceber a presença quase obsessiva dos monges budistas nos filmes de Weerasethakul, seja caminhando ao fundo de um plano integrados à paisagem, seja como personagens relevantes ao desenvolvimento da narrativa. Talvez pela presença constante na formação do diretor na Tailândia e por sua natural convivência com essas figuras, ou como um indício silencioso e intencional do apreço do autor pelo esgarçamento do tempo, os monges tornam-se chaves na compreensão da intencionalidade dessa lentidão e do deslocamento do sujeito da sua apreensão de tempo/espaço. Essa presença também levanta obviamente a questão da espiritualidade associada a essas figuras e como que essa experiência cronológica pode subverter tanto uma apreensão religiosa da existência quanto uma secular, trocando uma possível compreensão da vida como um território de expiações por uma da existência despretensiosa e baseada na contemplação, ou na noção de consumidores/produtores que subvertem a ordem ao se tornarem tediosas figuras praticantes da inação.


em contato com a narrativa, discute a própria vulgaridade da vida de cada um de nós e das histéricas louvações ao ego, em um apreço pessoal pela própria história e uma preocupação egoísta acerca dos próprios problemas. No filme fica nítida a revolta da personagem principal quanto a sua deficiência física, suas elucubrações existenciais e a possível tensão sexual com o coadjuvante. Em dado momento essa vulgaridade é confrontada com saltos quase esquizofrênicos dessa narrativa mundana para imagens cósmicas pairando entre o abstrato e o figurativo, mostrando o que parecem ser galáxias em alguns momentos, abstração em outros, exercícios formais e cromáticos até voltar a uma figuração intencionalmente desconexa da narrativa. Isso também fica nítido ao final do filme, em que nos é apresentada a sequência de um parto, sugerindo, entre outras possibilidades, que a vida segue a despeito das vulgares preocupações para com o ego e que Samsara segue seu movimento perpétuo acima de qualquer vontade ou presença. Os monges podem ser, na verdade, a epítome da ociosidade, não só como prática espiritual, mas também como questionamento de determinadas práticas adotadas socialmente, tidas como necessárias, funcionais e/ou objetivas, mas que, de fato, nada mais são do que devaneios e pequenos pormenores que desenvolvemos para preencher o tempo de vida que nos resta. Nestes termos é imprescindível pensar sobre o monge budista que ateou fogo ao próprio corpo em 1963 em Saigon para protestar contra a guerra do Vietnã. Esse ato, com tintas fortemente performáticas, e talvez por isso mesmo tão pertinente à veiculação de sua mensagem, denuncia as incongruências das práticas tidas como funcionais da vida vulgar que acabaram por culminar na guerra. Sua placidez e serenidade ao suprimir, em martírio, a própria vida em nome de uma causa não só ressalta a inação e a passividade frente ao fogo que o consumia como meditação, mas também como desenvolvimento narrativo, e, acima de tudo, um ato de subversão política com a potência de mudar o curso da história.

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Felippe Moraes Felippe Moraes é artista, pesquisador e curador. Mestre pela University of Northampton. Fundador do LargoLAB de desenvolvimento de projetos de artistas em residência na Despina | Largo das Artes e do projeto HARP (Humanitarian Art Research Platform) orientando a pesquisa visual de artistas refugiados da Síria, Congo e Colômbia. Finalista do Prêmio EDP 2014 no Instituto Tomie Ohtake (SP).



K at h o e y s e a di v ersidade N o recente cinema tailandês Bernardo de Britto Ribeiro Estima-se que a cada cento e sessenta e seis pessoas do sexo masculino nascidas na Tailândia uma é transexual. O que faz com que as mulheres trans, ou kathoey, sejam mais comuns nesse país do que em qualquer outra parte do mundo. O termo kathoey - muitas vezes traduzido para o inglês como ladyboys -, é bastante conhecido, no entanto, não serve somente para designar mulheres trans, como a princípio nos faz parecer, mas sim um terceiro sexo: nem homem e nem mulher. Refere-se a toda orientação sexual e identificação de gênero, já que no país não existem propriamente discussões distinguindo os dois temas, que difere da cisheteronormatividade. Portanto, kathoey significa transexual, gay, hermafrodita, lésbica, bissexual ou qualquer outra forma de se referir aos homossexuais.

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Num país onde a religião exerce uma enorme influência sobre a população, o budismo praticado por lá entende a questão dos kathoey como cármica, ou seja, as pessoas nasceram dessa forma, pois viveram desregradamente em alguma vida passada. Aparentemente trazendo assim uma visão mais tolerante para a questão, já que, como qualquer pessoa pode vir a nascer com essa espécie de punição cármica, não seria correto julgá-la por pecados de vidas passadas. Mas, ao mesmo tempo, essa visão budista para a questão também estigmatiza ao tratar do assunto como castigo adquirido e ignorar as nuances da complexa sexualidade humana. Sendo assim, pesquisas apontam que a maior parte da população tailandesa é intolerante em relação à homossexualidade. E é em meio a esse contexto de realidades extremas, entre a grande quantidade de transexuais e um enorme preconceito da população, que os filmes tailandeses que abordam questões relacionadas aos kathoey se apresentam. Retratam diferentes realidades e trazem diferentes questões, com propostas de linguagem não menos distintas entre si.


O cinema com temática kathoey é o terceiro gênero cinematográfico mais produzido na Tailândia, sendo a maioria desses filmes comédias que se utilizam de estereótipos para tratar do tema. O interesse por esse tipo de filme surgiu, em parte, com o enorme sucesso nacional e internacional alcançado, no ano 2000, pelo filme As Damas de Ferro, dirigido por Yongyoot Thongkongtoon. Comédia caricata, baseada em fatos reais, que mostra a trajetória do time de voleibol masculino, majoritariamente formado por homens gays, transexuais e travestis, vencedor do campeonato nacional tailandês, em 1996. Nesse time temos representados todos os tipos de kathoey e as dificuldades específicas que cada um enfrenta não só no meio esportivo, mas, principalmente, na sociedade. Temos os crossdressers, que sofrem preconceito pela forma extravagante de se vestir e agir; a transexual, que é tratada como rainha no circuito de shows, mas não consegue ter uma vida amorosa condizente com o seu novo corpo; os gays, que muitas vezes preferem se casar com uma mulher, tendo uma rotina homossexual clandestina, a enfrentar o preconceito da sociedade e, por fim, a lésbica, que talvez seja a personagem mais marginalizada, ou ao menos a mais sem esperanças em relação a uma aceitação social ou felicidade amorosa que o filme apresenta. Os personagens, desde o princípio, são apresentados como arquétipos de cada subcategoria de kathoey existente. Assim fica mais claro e didático, excluindo-se possíveis subjetividades dos personagens, apresentar os problemas vividos pela comunidade LGBT naquele país. A tensão social e sexual entre os personagens héteros e gays é sempre latente, na maioria das vezes extremamente desfavorável para esse último grupo.

Em uma abordagem bastante distinta, só não extremamente oposta, pois continuamos dentro de um mesmo contexto sócioreligioso, está Mal dos Trópicos (2004). O filme é dirigido por Apichatpong Weerasethakul, um cineasta contemporâneo, surgido já do esgotamento das questões modernas do cinema,

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O filme, acima de qualquer tentativa de documentar uma época ou recriar fatos reais com precisão, quer nos mostrar que a alegria, a perseverança e a dedicação podem vencer o preconceito e fazer com que aqueles personagens alcancem grandes conquistas. No entanto, continua sendo um filme inspirado em um acontecimento notório da história do país, e a sua abordagem extremamente popular faz com que as cartelas com os destinos dos personagens sejam inevitáveis, ao subir dos créditos. E é nesse momento, com certo desconforto, que podemos constatar que pouca coisa mudou na vida daqueles então-personagens, agora pessoas, após terem conquistado o prêmio máximo do campeonato esportivo. A luta e o sofrimento continuaram os mesmos de antes e, provavelmente, sem tanta purpurina.


buscando inspirações e referências no além-cinema, como na arte contemporânea e na arquitetura, mas também numa ideia bastante crua e visceral a respeito da espiritualidade e da natureza. Nesse contexto, o diretor apresenta um filme dividido em duas partes, em que os pontos de ligação entre elas estão longe de serem claros ou óbvios, mas quando analisados como um contínuo mostram uma forma interessante e original de representação da homossexualidade, e também da condição humana. A primeira parte do filme exibe um casal formado por dois jovens rapazes apaixonados que dividem seu tempo juntos em diversas atividades corriqueiras. Um romance leve e sutil entre duas pessoas que descobrem o desejo e a paixão. A separação física entre os dois, porém, se torna necessária e, quando anunciada, acontece mesmo dentro do quadro. Um dos personagens se afasta até magicamente sumir na escuridão. É nesse momento que a ruptura acontece também no próprio filme. Um dos personagens parte em uma jornada de caça a uma fera que continuamente vem matando animais da região. Nesse momento a natureza, a espiritualidade e o desejo se misturam no filme de forma surpreendente. Animais, homem e floresta estão no mesmo patamar enquanto personagens com alma e desejo. A floresta é viva, cheia de seres sobrenaturais, e o homem consegue se comunicar com os animais que, por sua vez, possuem espíritos que vagam pela mata.

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Na busca pelo animal predador, que a essa altura já atingiu status de criatura mística, tendo inclusive na sua representação humana o mesmo corpo de seu ex-namorado, o protagonista começa uma luta que é ao mesmo tempo uma atração absoluta e uma quase fusão de personalidade/espírito com esse animal e seu próprio desejo. Ao final do filme é difícil compreender se ele está caçando o animal, se reencontrando com ele ou se tornando um igual. Como em uma história de amor e desejo iniciada em vidas passadas, os dois personagens, homem e animal - ou talvez animal e homem - se encaram, se compreendem, se reencontram. Após falar de dois filmes que, apesar das diferenças, apresentam personagens claramente homossexuais, História Mundana (2009), de Anocha Suwichakornpong, é um filme que se estrutura na incapacidade da realização de um desejo sexual latente nunca verbalizado ou explicitado. O fio condutor do filme de Suwichakornpong é a relação entre um jovem paralisado da cintura para baixo, após um acidente de carro; seu pai distante, porém sempre presente nos arredores; e seu novo enfermeiro. Aos poucos, com o surgimento dessa nova figura masculina que não seu pai, o jovem passa a recuperar alguns


dos pequenos prazeres da vida. Mas a impotência sexual e a dependência que tem de seu pai não permitem que tais prazeres sejam suficientes para ter uma existência satisfatória. O filme então faz questão de nos mostrar, e ao personagem também, nosso lugar no universo. A morte como nascimento, o corte do cordão umbilical como libertação para uma nova vida, na qual um novo ciclo de possibilidades se abre. Cabe ao enfermeiro, por fim, libertar a tartaruga de estimação do protagonista e deixar seguir no fluxo das águas de um rio a única ligação entre os dois. Muitos filmes foram lançados com protagonistas homossexuais após o sucesso de As Damas de Ferro, filmes tão diferentes entre si como os citados neste texto. De comédias rasgadas a filmes de ação e luta, passando por dramas mais sérios e românticos, até os filmes da vanguarda do cinema contemporâneo. Toda essa diversidade mostra a necessidade de inúmeras e diferentes representações desses tipos de personagens para o público que absorve esses filmes. Reflete também um crescimento, mesmo que lento, da aceitação desse tema por parte da população tailandesa. E que, cada vez mais, a popularização desses filmes gere discussões e ajude a solucionar questões básicas de direitos civis, ainda muito precários, da comunidade LGBT naquele país.

Universidade Estácio de Sá e tem especialização em arte e filosofia na PUC-RJ. Participou dos núcleos de pesquisa “A Imagem do Corpo e o Corpo como Imagem: A Obra de Matthew Barney”e “Cinema Expandido e o Corpo Feminino”. Trabalhou como diretor de arte nos curtas “Toque”, de Renata Doné, “Dora”, de Rodrigo Schulz e “Ondas”, de Pedro Modesto.

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Bernardo de Britto Ribeiro Bernardo de Britto Ribeiro é bacharel em cinema pela

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O q ue o cinema tailandês c o ntemp o r â ne o n o s di z s o b re as pre o cupaç õ es e ansiedades culturais tailandesas c o ntemp o r â neas? Jessica Boyd Para responder a esta pergunta, vou citar alguns filmes contemporâneos, February, Transistor Monrak, Rahtree – Flower of the Night e Síndromes e um Século (Sang Sattawat), para discutir as principais fontes do medo retratado pelo cinema tailandês. Então concluirei que o cinema tailandês contemporâneo funciona como uma janela para a realidade tailandesa, no qual o traço mais interessante parece ser a reflexão, relembrar para inspirar como melhor proceder em um ambiente influenciado pelo ocidentalismo, pela crise e pelos “outros”.

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Começarei falando da crise econômica e depois me voltarei para os contatos com o Ocidente e as distopias, o resultado visível do anteriormente mencionado ocidentalismo. Em seguida, mencionarei as formas de nostalgia que surgiram das ansiedades contemporâneas, antes de argumentar que talvez esta nostalgia não seja uma volta ao passado, mas um “reenraizamento” — se inspirar no passado. Terminarei discutindo as preocupações que cercam o fraturamento da sociedade e a censura estatal. Crise econômicA Primeiramente, é importante situar o cinema tailandês contemporâneo na crise econômica de 1997-98. Tejapira a descreve como “a pior crise econômica tailandesa desde 1929” e Knee cita as subsequentes “revoltas culturais e econômicas da virada


do século”. No pós-1997, a Tailândia produziu inúmeros filmes reacionários, repletos de diferentes percepções e respostas à instabilidade social. Contato com o Ocidente February, de Yuthlert Sippapak, e Transistor Monrak, de Pen-ek Ratanaruang, são dois exemplos de filmes que dão vida a preocupações e ansiedades contemporâneas. Giram em torno do contato com o Ocidente. Harrison descreve essa exposição ao ambiente ocidental como tendo um “impacto emocionalmente debilitante e desestabilizador”. A debilitação literal e metafórica está mais visível em February, que se torna o local visual onde conceitos de nacional (tailandês) e estrangeiro (“outro”) colidem de forma dramática. Essa colisão não é apenas cultural, mas uma realidade dramática quando Tailândia e Nova York se encontram pela primeira vez quando ocorre o sequestro de Kaweta por um taxista. Kaewta representa o corpo-geográfico tailandês, um corpo que é quase destruído ao colidir com um carro, ao colidir com a ocidentalização. Yuthlert joga com espaço e luz para retratar o perigo da situação dos dois protagonistas. Cenas noturnas, iluminação escura e opressora e espaços claustrofóbicos transformam a escuridão metafórica e o perigo do Ocidente em uma escuridão literal.

February não apenas apresenta a questão do lar e do estrangeiro para o espectador, mas também o convida a se engajar ativamente nos questionamentos desesperados do protagonista em relação a lar, identidade e o eu, para que os dois talvez encontrem o caminho de casa, a Tailândia, juntos.

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No início de My Girl, o personagem principal, Jaeb, está em Bangkok. Sua vida na cidade é retratada como uma existência distópica e solitária, com pouco contato humano. Sua vida urbana tem falta de intimidade. Essa existência artificial é contrastada de forma incisiva com suas memórias de infância, que o invadem em meio a uma onda de músicas pop grudentas.

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Distopia Em February, Kaewta pode ter feito da Tailândia um lar, mas em My Girl, Killer Tattoo, 6ixty 9ine e Transistor Monrak as imagens cinematográficas são concebidas para mostrar o que acontece quando o “lar” (Tailândia) é maculado por forças modernizadoras. A distopia que esses filmes retratam é uma alusão ao medo contemporâneo tanto da ocidentalização quanto da globalização. A ideia da distopia urbana adverte os espectadores para que se afastem de existência tão banal e sigam na direção da extremamente diferente (imaginada) utopia do interior.


Embora My Girl nos leve da cidade para o interior, o Transistor Monrak, de Pen-ek Ratanaruang, começa com Pan e Sadao levando uma vida idílica, até mesmo clichê, no interior. As provações por que passam o casal apresentam ao espectador importantes alusões à gradual degradação da cultura tailandesa. O personagem de Pan nos adverte sobre os perigos urbanos de Bangkok, enquanto Sadao, sua contraparte literal (esposa) e metafórica (interior), nos lembra da moralidade “tailandesa”. Conforme o filme avança, Pan fica cada vez mais distante de suas raízes do interior. Quanto mais distante, mais as coisas se deterioram. Pen-ek joga com este conceito de espaço; a localização de Pan se torna representativa do vazio que se forma entre os valores verdadeiramente tailandeses e a corrupção urbana. Em uma cena comovente, vemos Pan, que é relegado a fazer guirlandas nos bastidores, cantar para seu reflexo no espelho. O espelho, no entanto, está rachado e quebrado, exatamente como os sonhos que Pan tinha da cidade. O filme nos ensina que a vida na cidade não é a existência dos sonhos a que muitos aspiram, mas, em vez disso, uma estranha bolha onde nada é o que parece: Pan é um faxineiro; o coreógrafo é uma travesti; e Dao, a cantora de folk, teve de dormir com alguns homens para chegar a um “estrelato” que está longe de ser brilhante.

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É seguro dizer que o filme apresenta uma desilusão tão lúgubre que chega a ser cômica: Pan veio para a cidade virar cantor, mas acaba virando faxineiro, um assassino, e escapa por pouco de se tornar vítima de um estupro. O senso de humor sombrio de Pen-ek entra mais uma vez em ação quando Pan e seu amigo estão em uma festa beneficente para arrecadar dinheiro para os pobres. Os moradores ricos de Bangkok estão todos presentes pela nobre causa, que envolve uma maravilhosamente satirizada competição de quem se veste com a roupa de pobre mais convincente. Pan e seu amigo são os mais desgrenhados da festa, até que percebem que são pobres de verdade, momento em que são agredidos e jogados na sarjeta. O humor da cena é uma importante alusão à distorção da sociedade e às estruturas de classe em jogo. Através da tumultuada jornada de Pan de volta ao interior e das lições que ele aprende ao longo do caminho, Pen-ek delineia lições que a Tailândia também precisa aprender face à modernização, ocidentalização e internacionalização. Vemos Pan deixar de ser o caipira metido a machão, o duvidoso empresário de luk-tung, para se tornar o homem que volta para o interior para cumprir com seus deveres familiares.


O personagem de Sadao também carrega com ela uma importante alusão ao estado emocional da sociedade. Knee argumenta que ela representa “uma preocupação pelas necessidades e emoções humanas básicas que estão, por implicação, sob ameaça na Bangkok e na Tailândia modernas”. Nostalgia e nostalgia estatal Filmes nostálgicos são a reação mais comum do cinema tailandês contemporâneo às preocupações e ansiedades culturais do país. Por meio da popularidade dos filmes nostálgicos e, claro, da exploração pelo Estado desse sentimento para criar “a nostalgia estatal”, o cinema tailandês demonstra que, no pós-1997, a sociedade contemporânea estava ávida por escapar das realidades sociais.

My Girl foi um enorme sucesso de bilheteria na Tailândia. Na verdade, fez tanto sucesso que foi o nono filme tailandês que mais arrecadou entre 2000-10. Essa popularidade reflete o fato de que no rastro da crise econômica, e de uma onda de filmes pós-modernos como Tears of the Black Tiger e 6ixty 9ine, o público tailandês começou a receber bem filmes f áceis de assimilar. My girl criou um espaço nostálgico que tinha uma distância segura da crise tailandesa. Em essência, os seis diretores do filme convidaram os tailandeses a deixar a vida adulta e aproveitar a reflexão nostálgica por meio do veículo da infância. Embora Tears of the Black Tiger seja um filme nostálgico, sua falta de sucesso nacional demonstra que não era acessível às massas tailandesas. My Girl, no entanto, é situado com segurança na infância. Conforme diz Kong Rithdee, cinema é uma “ferramenta efetiva em nos ajudar a lembrar, e o fofo My Girl é um banquete romântico de lembranças”.

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Embora o filme esteja na memória de Jaeb, o final traz o público de volta ao presente. Nós, espectadores, junto com Jaeb, testemunhamos o quanto sua cidade rural se transformou com o tempo. A loja de esquina da família foi substituída por uma franquia da 7/11, pistas poeirentas se tornaram estradas movimentadas e Noi Nah vai se casar. Certamente já não estamos mais no reino infantil de Nárnia. Quando o filme se aproxima do fim, Jaeb diz, “a viagem de volta para casa me fez perceber como as coisas mudaram”. Apesar dessas mudanças físicas, as memórias de Jaeb permanecem intocadas pelo tempo, assim como sua imagem congelada de Noi Nah e a ideia concebida do que é ser tailandês. As duas estão preservadas na memória do público, pronto para ser carregado para o futuro incerto.


Nostalgia estatal Nostalgia estatal mexe com emoções similares, embora de uma forma mais calculada e que encontra suas raízes na propaganda.

The Legend of Suriyothai e The Legend of King Naresuan, ambos de Chatrichalerm Yukol, nos apresentam um tipo diferente de nostalgia e tipos diferentes de preocupações e ansiedades. Esses dois filmes exemplificam a transformação da nostalgia em uma commodity e a criação da nostalgia estatal. McCormick fala sobre “o potencial político da nostalgia”, algo que foi muito explorado por esses dois blockbusters nacionais. Tal exploração extensiva da nostalgia parece demonstrar que o governo tailandês gostaria que o público esquecesse que tem a capacidade de forjar um novo futuro, um futuro que tem influência tanto do passado quanto do presente. Por meio das cenas épicas de batalha, guerreiros e salvadores reais admiráveis fomentam (criam) um orgulho nacional em um esforço de reprimir a ameaça do estrangeiro. Essa “nostalgia nacional” sugere um aumento da influência ocidental na Tailândia e a subsequente reação do Estado a ela. Seria possível argumentar que o investimento de tanto dinheiro e de tempo de transmissão para a monarquia na verdade implica a influência de seu declínio e, subsequentemente, uma tentativa um tanto desesperada de reacender algum simulacro do orgulho real e do nacionalismo. Reenraizamento McCormick argumenta que a nostalgia “lembra o passado, um tempo utópico ao qual o presente deveria aspirar e se esforçar para recriar”. Também argumentaria, em vez disso, que, mais que recriar o passado, filmes nostálgicos tailandeses como o Tears of the Black Tiger prega que a vida contemporânea seja inspirada por um passado relembrado de forma afetuosa, em vez de ser baseado nele.

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O Tears of the Black Tiger, de Wisit Sasanatieng, é uma fantástica ilustração do reenraizamento nostálgico, que pega a nostalgia e a transforma num casaco de sonhos tecnicolor. No rastro do crash econômico de 1997 e do influxo de produções de filmes nostálgicos, o filme cria um tipo novo e importante de nostalgia. O set de filmagem falso, a brilhante atuação exagerada e as cores gritantes sugerem de forma poderosa que Wisit não está sendo nostálgico porque deseja que o espectador volte para o passado, mas porque quer prestar homenagem a um tempo passado, na esperança de que possamos nos inspirar no passado e no estrangeiro para transformar o presente. Isso é fortemente comunicado pelo fato de Wisit ter pegado o clássico filme de caubói e transformado um ocidental em um tailandês.


Wisit usa atores tailandeses famosos dos anos 1970, pegando o velho e transformando-o em novo mais uma vez. Outro exemplo disso é Wisit buscar inspiração no diretor tailandês Ratana Pestonji Sociedade fraturada Ao considerar o que o cinema contemporâneo tailandês nos diz sobre as preocupações e ansiedades culturais tailandesas, é interessante observar o terror tailandês e a maneira como esse gênero manipula ideias de morte, abandono e engano para representar a sociedade fraturada tailandesa. Usarei os exemplos de Nang Nak, de Nonzee Nimibutr, e o Rahtree: Flower of the Night, de Yuthlert Sippapak, para demonstrar isso. Em Nang Nak, há a fugaz possibilidade de que a morta Nak e seu marido Mak possam viver em algum tipo de harmonia. Da mesma forma, em Rahtree: Flower of the Night, Buppha começa uma relação post-mortem similar com Ake. Isso acontece antes de percebermos que Ake também está morto e que assistimos ao relacionamento de dois fantasmas, vivos, e, no entanto, mortos. Esse cruzamento estranho entre vida e morte reflete os conflitos sociais dentro da sociedade tailandesa. De acordo com Komg Rithdee, “a possibilidade de uma existência harmoniosa entre pessoas de diferentes aprendizados e naturezas está exatamente no coração do nosso atual conflito social. Os ‘fantasmas’ estão entre nós”.

Rahtree: Flower of the Night é classificado como terror, com a maior fonte de terror sendo Buppha: uma garota que sangra até a morte depois de um aborto. No entanto, eu argumentaria que o verdadeiro terror reside dentro da sociedade e de seu tratamento em relação a essa jovem, que é estuprada, enganada, engravidada, forçada a abortar, abandonada e assassinada pela apatia da sociedade.

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Temos duas cabeleireiras gordas transexuais que nunca têm clientes, um lojista preguiçoso e inepto e seu assistente incapacitado; a esposa corrupta, sem vaidade e desagradável, proprietária da loja; seu marido que nada faz além de rezar; o funcionário também incapacitado da proprietária; o padrasto pedófilo e sexualmente abusivo de Buppha; e, finalmente, Ake, um jovem rico de Bangkok que destrói a vida de Buppha para ganhar uma garrafa de bebida,

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O filme também fez uma alusão cômica e agressiva aos “Outros”. No início, parece que Buppha é o “Outro”, o monstro mortífero feminino que deve ser exterminado. De fato, todos os personagens do filme estão desesperados para tirá-la não só do apartamento, como da face da terra. No entanto, os personagens que tanto temem Buppha porque ela é diferente (o.k, morta) são eles próprios um grupo de desajustados: corrompidos, questionáveis, estrangeiros ou tudo isso junto. São os fantasmas vivos do mundo urbano. Talvez então possamos entender seu medo absoluto de Buppha como um medo simbólico de sua própria “qualidade de ser outro”.


para não mencionar um desfile de exorcistas ineptos. Não parece muito promissor para a sociedade tailandesa. Censura Filmes como Síndromes e um século transmitem de forma poderosa as realidades políticas e sociais da Tailândia de hoje. Estar preso e amordaçado pelas leis de censura talvez seja o que torna esses filmes alusões tão importantes para as preocupações e ansiedades tailandesas contemporâneas. A mordaça força diretores a encontrar novos meios de expressão e, assim, abre portas para uma forma diferente de contar história. Eu argumentaria que a obra de Apichatpong é o retrato mais preciso e verdadeiro da vida tailandesa contemporânea e de todas as suas preocupações e ansiedades, no qual ele não atribuiu um ideal tailandês e se livra das algemas do que é ser tailandês. Numa entrevista, Apichatpong disse sobre Síndromes e um século: “Meu filme vai olhar para o passado para enxergar o futuro. Simplesmente pessoas vivendo, inspirando e expirando, encontrando-se umas com as outras — isso já é um milagre”. Os filmes de Apichatpong são normalmente difíceis de entender, mas é essa transitoriedade que é tão forte em seu trabalho, que transforma seus filmes em uma experiência. Em vez de explicitamente se revoltar contra as amarras políticas e sociais, Apichatpong cria com habilidade uma sensação que transmite a realidade tailandesa. Em Síndromes e um século, a maior parte do filme se passa dentro das paredes de um hospital. Um lugar de cura, doença, nascimento, vida e morte. Para não mencionar os médicos que escondem bebida alcoólica em pernas artificiais, dentistas cantores de folk e monges que oferecem chá. Uma cena particularmente notável nos coloca nas vísceras do hospital, observando um tubo de metal extrair fumaça. Interpreto isso como a representação visual de Apichatpong da falta de sabor da vida, que perdeu sua espiritualidade e uniformidade concreta.

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Schager declara que Síndromes e um século “não é apenas um adorável tributo ao passado, mas (uma) tentativa de preservação experimental”. Discordo disso e defendo que, apesar ter um aspecto de passado e presente, um dos traços marcantes de Síndromes e um século é que o passado se funde com o presente, as memórias se misturam com a realidade e o tempo se torna atemporal. Em vez de entender o trabalho de Apichatpong como uma ode ao passado, eu o entendo como uma inflexível ode à realidade, na qual todas as peças fragmentadas de vida e a sociedade fraturada se juntam para formar o que percebemos ser nossa própria realidade.


Enquanto Transistor Monrak, 6ixty 9ine, Killer Tattoo, Hotel Angel, February (e a lista continua) fazem alusão explícita ao medo da ocidentalização e retratam batalhas individuais contra o mal urbano, Síndromes e um século aceita, incorpora e consome a nostalgia, a distopia, o medo e produz uma representação da vida tailandesa drogada embora lúcida, clara embora confusa, concisa embora intricada. Todas as contradições e confusões agem como tijolos que transmitem uma mensagem importante sobre a identidade tailandesa: não há uma identidade. O fato de o filme ser difícil de entender talvez seja a alusão mais importante de Apichatpong às preocupações e ansiedades culturais tailandesas contemporâneas. Em vez de constantemente tentar entender os inexplicáveis altos e baixos sociais, políticos e econômicos da sociedade tailandesa, talvez seja melhor aceitar a transitoriedade política e prosseguir com o sentimento com o qual somos deixados depois de assistir um dos filmes de Apichatpong. Segundo Rithdee: A palavra tailandesa para natureza… é dharma-chart, cuja raiz linguística é baseada na palavra dharma. Nos ensinamentos do dharma budista somos ensinados que tudo é impermanente. É apenas ilusão, ou sonho, ou memória. O cinema de Apichatpong é dharma-chart — o cinema da impermanência. Como ele mesmo está aprendendo como deixar as coisas fluírem, não se sentir preso, talvez devamos fazer o mesmo quando assistimos aos seus filmes. Conclusão Para concluir, a grande diversidade do cinema tailandês contemporâneo retrata um grande número de preocupações e ansiedades culturais tailandesas.

Jess Boyd é teórica do cinema e pesquisadora. Especializada em Língua e Cultura Vietnamita e em Estudos de Desenvolvimento no Vietnam pela SOAS - School of Oriental and African Studies, na Universidade de Londres. Entre suas publicações está “The Thai Time Machine”, na Our Magazine entre outros estudos asiáticos. Contato: jessicaltboyd@gmail.com

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Particularmente no cinema do pós-1997, assim como em filmes mais contemporâneos, como os de Apichatpong, há um claro desconforto em torno do reconhecimento dos tempos de mudança, e uma busca subsequente sobre como prosseguir. A busca predominante por e o retorno à identidade tailandesa através da nostalgia é a resposta mais comum. Apesar disso, a mensagem predominante do cinema contemporâneo tailandês parece ser a que não há identidade tailandesa singular para recuperar, e, que, em vez disso, a sociedade tailandesa deveria buscar inspiração no passado para permear seu presente.


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HEY JOE Luiz Carlos Oliveira Jr. A história começa em 27 de setembro de 2002, na sala 1 do Estação Botafogo. Ao meio-dia. Eternamente Sua, o objeto misterioso daquele e de todos os festivais por que passou, nos convidava a uma sessão de hipnose. Um convite que aceitamos não se sabe exatamente como – o filme simplesmente acontecia, e nós simplesmente íamos aonde ele indicava. Era confirmada, de uma vez por todas, a sobrevivência do cinema para além de qualquer constrição que a cultura visual favorecesse. A “polícia dos signos”, treinada durante décadas para que nada escapasse a seu arsenal analítico, não tinha o que fazer diante daquela experiência que, à parcela legível das imagens, antepunha a beleza crua e direta dos seus significantes primários. Ao final de Eternamente Sua (prêmio Un Certain Regard em Cannes 2002), todos, como que saídos de um sonho bom, não podíamos mais exigir muita coisa dos filmes seguintes do festival (arrebatamento que se repetiria dois anos mais tarde, com Mal dos Trópicos).

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Apichatpong Weerasethakul: Soubemos de pronto que aquele nome esquisito deveria ser “aprendido” (logo, logo alguém teria o ímpeto de lhe emprestar um apelido internacionalmente pronunciável: Joe). Ao descobrir qual filme ele havia feito antes de Eternamente Sua, a conexão com o que, para nós, fora a “cena originária” não poderia ter sido maior: o primeiro longa-metragem de Apichatpong Weerasethakul se chama Objeto Misterioso ao Meio-dia. E é um filme que, apesar de a câmera volta e meia assumir uma postura de reportagem, se revela muito mais como bricolage do espaço e do imaginário nele incrustado (há mesmo algo de um “pensamento selvagem” no cinema de Apichatpong). Como todo filme dele, inclassificável; tanto documentário como ficção científica – e nenhuma das duas coisas. A despeito de qualquer generalização que se possa tentar, a constatação fundamental é a de que Apichatpong filma o mundo num momento que antecede a separação e a organização diferencial de seus objetos. Um mundo em que as coisas ainda não receberam nomes, transposto para uma linguagem que, corrompendo a fórmula saussuriana (“em linguagem, existem apenas diferenças”), evolui por desdiferenciação. Antes de uma estrutura estática de nomes designando coisas, pessoas, lugares e eventos, os filmes de Apichatpong trazem um presente fugidio, composto por corpos que se banham na poesia imanente do tempo. Não há narrativa possível senão através do presente bruto, antinarrativo por excelência.


É curioso que a história do que a obra desse cineasta desperta venha a ser uma história de intimidade. Ver Mal dos Trópicos cria o mais feliz dos paradoxos: de uma hora para outra, somos íntimos de um mistério. Conhecemos bem esse mistério: tão de dentro que se torna impossível transpor suas bordas. Como pode se dar isso, intimidade sem entendimento? Escrever-lhe uma carta não adiantaria, pois a experiência com Mal dos Trópicos é daquelas que não se pode partilhar nem com o autor. É muito mais uma experiência que se funda no contato direto com o sorriso do ator durante os créditos iniciais. Ele sorri olhando para nós; um sorriso tímido, mas infinitamente simpático. A primeira parte de Mal dos Trópicos, que pode iludir o olhar com imagens relativamente conhecidas do cinema contemporâneo, não é em nada realista, não é uma abordagem objetiva a se contrapor à f ábula mitopoética da segunda metade. Já está em jogo, mesmo nas passagens mais prosaicas daquela primeira parte, uma apreensão mágica do mundo (com a mesma carga naïf depois corroborada). Bastarecapitular as cenas e perceber que tipo de relação o cineasta estabelece com esse espaço “não pré-estilizado”: a visita à gruta, o cachorro encontrado na estrada, a cena musical com a cantora, a ida ao cinema, a sucessão de blocos narrativos mais ou menos soltos (desde um grupo de soldados achando um cadáver no meio do mato até o romance entre dois rapazes): tudo conflui para um sentimento oceânico de contiguidade total entre os seres, o tempo e o espaço.

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Mal dos Trópicos foi prêmio da crítica na Mostra de São Paulo e, em maior ou menor intensidade, agradou também ao público em geral. Surpresa? Nenhuma: o contrário seria algo como não preferir vivenciar a imagem a apenas conhecê-la de vista. Seria tapar os ouvidos para aquela “canção de felicidade” que é cantada por “cada gota da alma”. Seria deixar escapar por entre os olhos a chance rara de ver o mundo ser filmado enquanto está nu. E seria negar uma das maiores provas recentes da vitalidade do cinema. Dessa obra que vem se construindo de forma grandiosa, fica desde já a certeza de que dormir não é mais tão importante, pois Joe nos mostrou a possibilida de de sonhar ao meio-dia.

Luiz Carlos de Oliveira Jr. Luiz Carlos de Oliveira Jr. é críitico, professor, curador, roteirista e diretor. Doutor em Meios e Processos Audiovisuais pelaECA-USP, com período sanduíche na Université Sorbonne Nouvelle - Paris 3. Autor do livro “A mise en scène no cinema: do clássico ao cinema de fluxo”. Atuou como crítico de cinema na revista eletrônica Contracampo.


O a b surd o c o rri q ueir o de A pic h atp o n g W eeraset h akul Ruy Gardnier O cinema de Apichatpong Weerasethakul opera a partir de duas concepções de beleza. Uma é a beleza do cotidiano, a dimensão lúdica do tempo vivido em momentos amenos de prazer, o tempo que escorre em conversas despretensiosas, em gestos de afeto, nos instantes não narrativos de um sorriso, uma paisagem, uma incidência luminosa do sol sobre seres e objetos. Outra é a beleza da magia instaurada pela ficção e pela narração, seja ela fantástica, delirante ou memória mitológica, uma beleza que brota do poder da fabulação e da aproximação de imagens distantes entre si. O cinema em geral contempla muito bem esses dois tipos de beleza ‒ de um lado, o cinema descritivo, “realista”; de outro, o cinema de mundos fantasiosos, o sobrenatural, a ficção científica. Mas são raríssimas as ocasiões em que esses dois modelos de beleza aparecem ao mesmo tempo, sem estarem opostos. Para Weerasethakul, entre as duas concepções não há antagonismo nem contiguidade, mas complementaridade em um mesmo plano de existência: o mágico surge do banal como se a ele pertencesse, e o banal faz-se mágico pela singeleza do detalhe ou pela construção, via linguagem cinematográfica, de uma temporalidade intensa, de fruição do momento, de um “tempo morto” que se transforma em tempo ultravivo.

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É fascinante notar como filme a filme, e sempre de modo diferente, Apichatpong Weerasethakul constrói a partilha comunicante entre cotidiano e fabulação mágica. Em Objeto Misterioso ao Meio-Dia, ela se dá através do registro documental que vai de localidade em localidade propondo a diferentes grupos de pessoas que inventem, à maneira do cadavre exquis dos surrealistas, novos passos para uma mesma história, que se tornará progressivamente delirante. Em Eternamente Sua, há uma história bastante simples de amigos que vão dar um passeio pela floresta, mas tudo é magnificado pela pujança da paisagem, pelas variações luminosas das diferentes horas do dia e pela soberba e detalhada construção temporal, que amplifica a sensorialidade e a força dos gestos, fazendo, a partir da narrativa, uma especulação sobre o “tudo flui” heraclitiano. Em Mal dos Trópicos, surge pela primeira vez em seu cinema


a estrutura cindida em duas partes: a primeira dá conta, em registro de doçura cotidiana, do amor entre um soldado e um camponês, ao passo que a segunda trata desse mesmo amor através de uma fabulação de perseguição e embate na selva, envolvendo espíritos animais e uma dimensão quase pansexual da existência e do mundo. Ainda que a estrutura pareça separar cotidiano e mundo mágico, as duas partes se espelham o tempo inteiro na percepção do espectador. No filme seguinte, Síndromes e Um Século, a estrutura também se divide em dois momentos espelhados. Primeiro vemos o registro cotidiano de um hospital de cidade rural, em seguida vemos o aparato tecnológico e, em comparação, muito mais asséptico de um hospital de cidade grande. Dessa vez, as duas partes são aproximadas o tempo inteiro, seja por cenas quase iguais que acontecem em cada metade, seja por “rimas” discretas que ajudam a estruturar a comparação entre as duas partes e provocam o ricochete mental do espectador (por exemplo, o momento em que todos os personagens do plano olham para cima, no primeiro momento por causa de uma flor no alto de uma árvore, no outro por conta de um brinquedo voador teleguiado). Se o ambiente high-tech do hospital de cidade grande já produz por si só uma sensação de ficção científica, com suas próteses motoras e grandes exaustores, o olhar de Apichatpong Weerasethakul faz com que todo o filme, e consequentemente o hospital rural, seja banhado desse estranhamento-maravilhamento diante da vida e dos hábitos das pessoas, das crenças religiosas e superstições até as experiências científicas que produzem objetos excêntricos e aparentemente mágicos.

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Em Tio Boonmee, Que Pode Recordar Suas Vidas Passadas (vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes em 2010), Weerasethakul retorna à estrutura narrativa contínua (isto é, não bipartite) de seus primeiros filmes. Mas já que o personagem-título pode relembrar suas vidas passadas, o filme incorpora cenas que irrompem brusca e magicamente na duração. À narrativa da pré-morte de Boonmee, rodeado por familiares em seu sítio, surgem cenas espetaculares de uma princesa da antiguidade que se apaixona e faz sexo com um bagre num cenário paradisíaco de cachoeira, ou de um boi que deambula pela floresta até que seu dono consegue reencontrá-lo (nunca é especificada qual vida passada de Boonmee está sendo exibida: princesa, bagre, boi ou dono). Mas a própria narrativa contínua já coloca o mágico e o cotidiano num único plano de existência, fazendo surgir numa mesa pós-jantar o espírito da esposa falecida e a fantástica aparição de seu filho desaparecido, que retorna como um espírito-macaco de vibrantes olhos vermelhos. O espanto inicial dá lugar a uma situação de plena naturalidade, como se todas essas diferentes camadas da existência ocupassem um único lugar, e não há nada de muito


estranho em que isso aconteça dessa forma. O filme consegue operar um registro em que vida e morte, percepções e memórias, presenças e ausências partilham praticamente um mesmo mundo. Tudo isso com uma serenidade espantosa e encantadora de tom, que fascina por uma simplicidade avessa a todo espalhafato. Cemitério do Esplendor, seu longa mais recente (ele também tem uma extensa produção de filmes de menor metragem, igualmente deslumbrantes e estimulantes), segue o mesmo caminho, tomando como ponto de partida uma enfermaria em que soldados dormem ininterruptamente, quase-vivos ou quase-mortos, enquanto especula-se que isso acontece porque a construção do prédio foi feita em cima de um cemitério ancestral e os espíritos estão sugando a energia vital dos doentes. Uma faceta determinante do estilo de Apichatpong Weerasethakul é o modo como trabalha com premissas narrativas palpáveis, familiares ao espectador de cinema tradicional, mas instaura um regime narrativo muito tênue, que permite digressões bruscas, instaurações fantasiosas delirantes (nesse aspecto, e apenas nesse, faz sentido compará-lo ao cinema de David Lynch) e situações frontalmente prosaicas que têm valor em si mesmas, sem obrigação de levar adiante a história a ser contada. Essa narratividade solta faz com que o mundo inteiro se torne ficção, ou ficcionável. Um movimento misterioso de câmera, uma cena de pessoas fazendo ginástica numa praça ou uma tenda de caraoquê podem se tornar automaticamente parte da história, mesmo que não haja nenhum personagem diretamente envolvido nesses momentos. Filmar passa a ser então medir as diferentes velocidades do mundo, as variações de existência, incorporá-las à curiosidade em perceber suas belezas, suas sutilezas de ritmo e movimento e traduzir em imagens a emoção do modo como elas se manifestam no campo visível. Cotidiano e mágico, esse escorrer do mundo é a matéria-prima com que Apichatpong Weerasethakul faz seu cinema.

Ruy Gardnier é crítico, pesquisador e professor. Fundador das revistas eletrônicas Contracampo e Camarilha dos Quatro, professor de cinema da Escola Darcy Ribeiro e crítico do jornal O Globo. Editou os livros-catálogos de retrospectivas dos cineastas John Ford, Samuel Fuller, Abel Ferrara, Rogério Sganzerla e Julio Bressane, tendo sido também curador das duas últimas.

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M o v iment o C inema T ailandês L i v re (Uma carta do Movimento Cinema Tailandês Livre) Para: Assembleia Legislativa Nacional e Governo Tailandês O filme Síndromes e Um Século (Sang Sattawat), recentemente submetido ao Conselho de Censura, só seria aprovado para ser lançado na Tailândia se quatro cortes fossem feitos. Como resultado, o diretor Apichatpong Weerasethakul decidiu cancelar o lançamento comercial do filme no país e manteve sua posição de não cortá-lo. Ele emitiu uma declaração: Eu, um diretor, trato meus trabalhos como meus próprios filhos e filhas. Quando os concebo, passam a ser donos de suas próprias vidas. Não me importo se as pessoas gostam deles ou os desprezam, contanto que eu os tenha criado com a melhor das intenções. Se essa a minha prole, por alguma razão, não pode viver em seu próprio país, deixem que seja livre. Uma vez que existem outros lugares que os recebem calorosamente pelo que são, não há motivo para mutilá-los em razão do medo do sistema ou da ganância. Caso contrário, não há razão para que se continue a fazer arte.

Em seguida, o representante do diretor entrou em contato com o Conselho e solicitou que a cópia do filme enviada para avaliação fosse devolvida, incluindo uma carta confirmando que o filme não seria exibido comercialmente e que nenhum recurso seria enviado. No entanto, o Conselho se recusou a devolver a cópia e insistiu que só a devolveriam se os quatro cortes fossem feitos pelo próprio Conselho (veja mais detalhes em http://a-century.exteen.com).

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Consequentemente, a retenção da cópia suscitou diversas discussões, especialmente na internet. Um grande número de pessoas ressentidas, funcionários de ongs e acadêmicos se conectaram para expressar sua discordância com políticas de censura tão arbitrárias, as quais consideram uma forma de opressão que o Estado emprega para restringir a liberdade de expressão das pessoas. O Conselho de Censura Tailandês ainda opera com base em uma legislação antiquada que data da Lei do Cinema de 1930, uma época em que o país ainda era governado por uma monarquia absolutista.


É de surpreender que o cinema tailandês continue a ser sistematicamente tolhido, mesmo depois de diversas tentativas feitas pela comunidade cinematográfica nos últimos trinta anos defendendo a completa reformulação da lei, cuja essência funciona, de todas as maneiras, contra o espírito da genuína democracia. O episódio vergonhoso em relação a Síndromes e Um Século, um filme que trouxe inúmeras críticas positivas e atenção ao cinema tailandês, acontece em 2007, ano em que a nova Constituição está sendo esboçada pela Assembleia Nacional Legislativa. Isso apresenta uma oportunidade para todos nós, a comunidade local e os amantes de cinema do mundo todo, exigirmos e reclamarmos nossos direitos humanos básicos para livremente receber informações e nossos direitos para nos expressar através do cinema, que permanece o único meio que está acorrentado ao perverso pilar da prática antidemocrática. Nós, abaixo assinados, expressamos a posse de nossos direitos humanos básicos e a dignidade de seres humanos sob uma sociedade democrática. Exigimos que a Assembleia Legislativa Nacional decrete o cinema como uma forma de comunicação de massa para que ele seja libertado das algemas da intervenção estatal e restrição, da mesma maneira que formas de comunicação como o rádio, a televisão e os jornais há muito tempo foram libertadas. Estamos fazendo este abaixo-assinado não apenas por uma decisão justa para o Síndromes e Um Século, mas também por uma modernização há muito necessária na legislação tailandesa no que concerne à censura no cinema. Exigimos que as autoridades revisem a legislação para abandonar a prática de cortes e proibição de filmes e que instaurem um sistema de classificação como o utilizado em países livres. Essa é a única maneira de o cinema tailandês e todo cinema que for ser exibido na Tailândia poderem estar livres das algemas de uma barbaridade legal antiquada.

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https://facthai.wordpress.com/2007/04/16/free-thai-cinemamovement-english/

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Sinceramente, Os abaixo assinados.


“M ade in T h ailand”: o idílic o rural e o tema da identidade tailandesa em T ransist o r M o nrak Natalie Boehler

Quando o terceiro longa-metragem do diretor tailandês Pen-Ek Ratanaruang, Transistor Monrak, apareceu em 2001, havia anos que a indústria de cinema tailandesa experimentava uma notável ascensão. Desde 1997, com os surpreendentes sucessos de 2499 Antapan Krong Muang, Daeng Bireleys and the Young Gangsters e Fun Bar Karaoke, que foram exibidos no Berlinale e aclamados pela crítica, produções inovadoras mudaram a aparência e a autoimagem do cinema tailandês.

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O surgimento de uma jovem geração de cineastas influenciou enormemente a estética e os processos de produção. A variedade de temas foi de repente ampliada. Filmes tailandeses recentes apresentam gêneros diferentes e gêneros híbridos ― revivendo gêneros tailandeses, usando gêneros estrangeiros ou misturandoos de forma transversal — e usam estilos variados, da estética de anúncios a imagens granuladas dos filmes independentes reminiscentes do cinéma vérité. A nova atividade em produção foi excepcional e ganhou impulso nos anos seguintes. Um dos efeitos notáveis dos novos filmes foi gradualmente levar o público tailandês de volta aos cinemas, mudando os telespectadores, de adolescentes a um público mais educado, maduro e diverso. Novos modos de produção emergiram: junto com filmes mainstream desenvolvidos por grandes estúdios comerciais, filmes semiindependentes brotaram. Esses filmes são produzidos de forma independente ou semi-independente e depois distribuídos por grandes produtoras. Filmes independentes, por outro lado, são produzidos inteiramente fora do sistema de estúdio. O chamado Novo Cinema Tailandês foi criado por diretores como Wisit


Sasanatieng, Nonzee Nimibutr, Pen-ek Ratanaruang, Yongyooth Thongkonthool e Jira Maligool, que tinha previamente trabalhado na indústria de propaganda e vídeo musical. A euforia em relação a essa recuperação pode ser mais bemcompreendida em vista do pano de fundo histórico. A fase anterior criativa do cinema tailandês teve lugar nos anos 1970 quando a Tailândia produzia inúmeros filmes relacionados à crítica social que também eram internacionalmente assistidos. No entanto, essa onda logo chegou ao fim sob um governo restritivo. Os blockbusters de Hollywood dominaram e monopolizaram o mercado nos anos 1980. Poucos filmes locais eram realizados. Foram produzidos com orçamentos muito limitados e eram de má qualidade, seguindo o esquema genérico e as convenções populares dos gêneros tailandeses, como o filme de fantasmas, a comédia com travestis, ação e melodrama romântico adolescente. Tinham uma fórmula nítida, sendo produtos de massa projetados principalmente para um público de baixa renda, rural e adolescente. Isso lhes dava o status de entretenimento da classe baixa, cultural, econômica e tecnicamente inferior comparado ao cinema mais glamoroso importado dos Estados Unidos, da Europa e de Hong Kong. A opinião convencional era de que o cinema tailandês era basicamente assistido pela classe trabalhadora. Internacionalmente, esses filmes não eram de forma alguma assistidos. Visto fora do país, o cinema tailandês era praticamente inexistente. Na Tailândia, as produções locais eram chamadas, de forma nada lisonjeira, nam nao (água turva, pútrida) em razão de sua falta de profundidade, tramas que não se desenvolvem e reputação sem atrativos.

O filme tailandês se torna transnacional Talvez o aspecto mais marcante do novo cinema tailandês seja a transnacionalidade. Enquanto valores de produções maiores eram

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A pouca criatividade e a forma repetitiva também se deviam à estrutura rígida e estagnada da indústria cinematográfica. O monopólio das produções era compartilhado por algumas poucas empresas, grandes conglomerados do entretenimento que uniam a indústria musical com a do cinema, aproveitandose do sistema de estrelas locais que compunham um importante argumento de vendas da música e do cinema. Como não existia subsídio governamental para a produção ou cultura cinematográficas, quase nenhum filme independente era produzido. O cinema era enfaticamente entendido como entretenimento, não como arte, e era produzido como um item de consumo rápido e barato. Nesse contexto, não é nada surpreendente que os novos filmes bem-sucedidos tenham sido recebidos com grande entusiasmo e engatilhado muitas novas produções, algumas das quais muito bem-recebidas.


uma razão para a repentina popularidade dos filmes locais, uma razão igualmente importante pareceu ser sua recém-adquirida visibilidade internacional e o fato de que viajaram para o exterior e foram recebidos com aprovação, às vezes chegando a ganhar prêmios. Essas carreiras transnacionais eram ainda mais notáveis pelo fato de as produções tailandesas terem raramente, até aquele ponto, cruzado a fronteira do país. Embora influências de fora sempre tenham sido claras e recebidas com interesse, o fluxo cultural permanecera grandemente unidirecional. Apenas alguns filmes em particular viajaram para o exterior para serem exibidos a um público estrangeiro. Por razões do idioma, e como a grande massa do mainstream seguia uma fórmula imutável que atendia ao público rural ou de baixa renda, sua exportação não era considerada uma opção.

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Assim, a reviravolta ocorrida de 1997 em diante trouxe uma mudança substancial na autopercepção do mundo do cinema local. O reconhecimento dos países estrangeiros gerou um imenso senso de autoestima. Sucesso internacional, especialmente em regiões de primeiro mundo como Europa e Estados Unidos, tem uma longa tradição de ser percebido como prestígio, elevando o significado da cultura nacional além dos limites da nação e afirmando-a fortemente. Essa elevação da autoestima envolveu outros desenvolvimentos transnacionais da indústria cinematográfica tailandesa, como a exportação dos direitos de distribuição dos filmes e dos dvds para os mercados americanos e europeus. Uma novidade importante para o cinema tailandês foi o início de sua distribuição a nível mundial. Inúmeras produções foram compradas por distribuidoras internacionais, talvez as mais famosas sejam As Damas de Ferro (2000) e Ong Bak (2003). A nova experiência de ser comercializável para o público estrangeiro também estimulou o interesse em coproduções. Mais tarde, a indústria tailandesa coproduziu com Hong Kong, Cingapura e Europa a uma proporção sem precedentes. Sair do mercado tailandês se tornou crucial para os projetos cinematográficos, pois é a chave para a visibilidade internacional assim como para o valor comercial no mercado global. Esse crescimento internacional alterou a imagem da Tailândia em relação a sua própria indústria cinematográfica, que cada vez mais é vista como um negócio a ser levado a sério, oferecendo oportunidades que podem de fato ser lucrativas. A exposição ao circuito internacional deixou traços: conforme cineastas, estudantes de cinema, acadêmicos e jornalistas viajam para o exterior para ir aos festivais e conferências, trazem para casa influências estrangeiras, inspirações e know-how que podem encontrar lugar em novas produções. Muitos cineastas da geração mais jovem passaram um período substancial de tempo no exterior, frequentando escolas de arte ou cinema nos Estados Unidos e na Europa e, assim, acostumando-se ao estilo de vida estrangeiro,


aos padrões internacionais de produção e às convenções do negócio de filmes internacionais. A transnacionalidade se torna um aspecto de crescente importância em carreiras artísticas. Na verdade, talvez não seja coincidência que o início do novo cinema tailandês tenha sido ele próprio abastecido por fatores ligados a transnacionalidade: um aumento na produção de valores inspirados pelos padrões da propaganda, elas mesmas tendo como modelo o sofisticado estilo de propaganda internacional; o fato de diversos cineastas terem estudado e ganhado experiência nos Estados Unidos e na Europa e, bem importante, o aumento do consumo de cultura, adaptado de países industrializados, e a expansão da cultura dos multiplex. A crescente transnacionalidade do fluxo cultural global é um desenvolvimento geral. Conforme as viagens pelo mundo, a mobilidade e a migração de trabalho aumentam, uma crescente parte da população do mundo se torna exposta aos produtos culturais estrangeiros. Por sua vez, esses produtos são fortemente influenciados por movimentos transnacionais, experiências do estrangeiro transculturalizadoras e integradoras. Isso envolve mudanças rápidas na dinâmica da indústria cinematográfica internacional. Produtos projetados com comercialidade internacional em mente são cada vez mais enraizados, financeira e criativamente, em múltiplos países a fim de maximizar o interesse e o apelo em um público diverso. Embora o domínio do cinema americano seja incontestável no mercado mundial, a tendência recente na direção de um cinema global move a atenção da indústria e do público para filmes de outros países. À medida que influências estrangeiras se tornam populares no cinema de Hollywood, o público mainstream se torna ciente do chamado cinema mundial como alternativa. O recente interesse pode aumentar a autoestima dos filmes não americanos. Ao mesmo tempo, essa indústria cinematográfica está cada vez mais ciente do papel da transnacionalidade na indústria cinematográfica local e tem como objetivo fazer parte dela.

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A transnacionalização do cinema, produzida através de forças econômicas, envolve mudanças nas práticas culturais: assim como a aparência do cinema muda, também muda a compreensão do eu nacional e sua relação com o Outro. Ver a cultura como um “esquema de significados contingente ligado a dinâmicas de poder” significa que práticas culturais estão embutidas em estratégias de posicionamento, controle e manobra: o fazer cultura está ligado a processos de reconfiguração de cultura e identidade. Dessa forma, à medida que os filmes tailandeses miram no mercado estrangeiro, a questão da identidade tailandesa e suas várias interpretações mudam de significado. A possibilidade de vender os filmes tailandeses para o exterior, encorajados pelo surgimento do interesse no cinema asiático desde meados dos


anos 1990, levou a uma rápida reconfiguração da autoimagem da nação. Ao mesmo tempo, as tendências da transnacionalização são obviamente contraditórias em relação à noção clássica da cultura e do cinema nacionais. Do espaço desses dois conceitos, surgem traços no recente cinema tailandês, como exploraremos no caso de Transistor Monrak. O colapso econômico de 1997 e o ressurgimento da khwam pen Thai É importante considerar os efeitos da crise econômica tailandesa do final dos anos 1990, uma das piores da história do país, nos seus filmes. O ano de 1997 marcou o auge da crise econômica que se estendeu por todo o Sudeste Asiático. Milhões de pessoas ficaram desempregadas. O baht, a moeda nacional, se desvalorizou em 1o julho de 1997 e a recessão que se instaurou obrigou a Tailândia a pedir ajuda para o Fundo Monetário Internacional. Antes dessa data, a Tailândia era um dos países da região que mais se desenvolviam, com potencial para fazer parte da lista dos Países Recentemente Industrializados, como a Coreia do Sul, Taiwan e Cingapura. A florescente economia era baseada numa política de dependência do capital estrangeiro ― investimentos vindos do exterior movimentaram o mercado de ações, o preço das terras e a oportunidade de emprego para homens de negócios. Globalização era a palavra do momento até a bolha estourar. No contexto da crise, khwam pen Thai se tornou uma vigorosa ideologia, deixando sua marca na economia e no desenvolvimento cultural. Khwam pen Thai pode ser descrita como uma forte consciência da própria identidade como um cidadão do Estado tailandês e da própria origem como estando firmemente enraizada na cultura tailandesa. Também denota características imaginadas dos cidadãos da nação como um todo.

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À medida que a vida foi ficando mais difícil, a Tailândia redirecionou sua orientação de um Ocidente genérico idealizado para uma Tailândia específica. Houve uma forte tendência cultural, social e econômica de redescobrir a própria história do país, o conhecimento local e as raízes culturais, uma ideologia que se abastecia na falta de confiança no Ocidente que tinha surgido com as dificuldades trazidas pelo colapso econômico do país. Valores percebidos como ocidentais, especialmente o consumismo, crença no progresso e na constante inovação, eram agora vistos com ceticismo, e havia um difundido desejo por valores nativos, confiáveis, que podiam sustentar o país, seu bem-estar e sua identidade no longo prazo. Num discurso amplamente assistido, o rei enaltecia a importância de uma vida moderada, incentivando o povo tailandês a controlar seus gastos e viver uma vida mais simples e menos materialista. O governo também promoveu o ideal de autossuficiência econômica, baseada na cultura dos


tempos passados e dependendo menos do investimento monetário estrangeiro do que da autossustentabilidade. A ideologia da volta às raízes tailandesas ressoava em vários aspectos da vida no país, com muitas pessoas vendendo pertences supérfluos para sobreviver e deixando a cidade para voltar para suas cidades natais por uma vida mais simples. Em pouco tempo, a popularidade do termo khwam pen Thai se tornou uma tendência, um slogan comparável a uma marca registrada — produtos como “o verdadeiro café tailandês” ou “noodles no velho estilo” apareceram, muitas vezes trazendo o adjetivo boran (antigo, indígena). Houve um renascimento da medicina antiga tailandesa e da massagem curativa; formas retrô de cultura popular, como antigas revistas em quadrinhos e revistas e músicas populares dos anos 1980, voltaram à moda, e móveis recém-fabricados eram estilizados para parecerem antiguidade. A nostalgia fez com que todos esses produtos vendessem bem, em claro contraste com os ideais de autossuficiência, simplicidade e modéstia que deram, em primeiro lugar, credibilidade à khwam pen Thai. A própria khwam pen Thai se tornou um item de consumo altamente popular. A transformação do termo em commodity, ligado ao crescimento do poder de consumo da classe média dos anos 1980 em diante, envolveu uma alienação do povo tailandês do que era sua identidade nacional. Kasian Tejapira criticou isso como a seguir: Khwam pen Thai foi arrancada de seus contextos sociais tradicionais, desprovida de sua aura e transformada em um significante que flutua livremente, que pode ser comoditizado por mercadorias de qualquer nacionalidade ou origem. (…) Essas formas comoditizadas transformaram, quer queira ou não, a khwam pen Thai em uma opção de identidade entre muitas outras no mercado livre de uma pluralidade de significações sem limites, no mesmo sentido que Coca-Cola é apenas uma opção entre muitas outras marcas de refrigerante, Singha Beer é apenas uma opção entre muitas outras marcas de cerveja e assim por diante. No processo, khwam pen Thai se tornou mais uma opção entre

No entanto, o conceito não é uma invenção da crise econômica de meados dos anos 1990. Como escreveu Thongchai Winichakul muitos anos antes da crise econômica: Hoje, na Tailândia, há uma difundida suposição de que existe tal coisa como uma natureza ou identidade tailandesa comum: khwam pen Thai. Acreditam existir há muito tempo, e todos os tailandeses devem estar bem conscientes dessa virtude. A essência da khwam pen Thai foi preservada até os dias de hoje apesar do fato de a Tailândia ter se transformado imensamente na direção da modernização nos últimos

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tirados de acordo com as circunstâncias cambiantes.

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uma variedade de significantes nacionais/étnicos para serem vestidos ou


cem anos. Como outro discurso nacionalista, ele presume que os grandes líderes (nesse caso, monarcas) seletivamente adotaram para o país somente as coisas boas do Ocidente, enquanto preservavam ao máximo os valores tradicionais.

Embora o discurso de khwam pen Thai tenha uma longa história, nunca houve de fato uma definição clara e única de seu conceito. Kasian Tejapira descreve o construto imaginário de khwam pen Thai como segue: (…) características imaginárias reconhecíveis da khwam pen Thai, construídas pela etno-ideologia nacionalista oficial patrocinada pelo Estado, (incluem): • A nação tailandesa como uma harmônica comunidade (nacional). • O Estado como um desdobramento orgânico da hierarquia tradicional da família, para a comunidade, para a nação. • Vigilância contra o “o outro ideológico e político” e “outsiders” arbitrariamente deturpados em termos raciais e étnicos como “não tailandeses”. • Desvio da origem de problemas sociais para o nível da moralidade pessoal. • Khwam pen Thai é culturalmente única. • Budismo como religião nacional. Por mais que o Estado tente, a identidade nacional tailandesa nunca se encaixará em um todo homogêneo e não problemático para as pessoas comuns. Na prática, o que é considerado identidade tailandesa é mais parecido com um mesmetizador fantasmagórico de uma ou mais dessas características.

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O dualismo cidade/país em Transistor Monrak Transistor Monrak conta a história de Pan, um jovem do interior apaixonado por música. Ele gosta de cantar nas feiras populares de sua cidade, e seu charme ingênuo e despreocupado e o talento para cantar fazem dele um animador nato. Em uma dessas feiras, ele se apaixona por Sadao. No dia do seu casamento, seu presente para ela foi um rádio transistor, símbolo de seu amor pela música e da felicidade do jovem casal. Logo em seguida, Pan tem de deixar a cidade para servir o Exército tailandês. Em um momento instintivo, ele abandona o Exército e foge para Bangkok para perseguir seu sonho de se tornar um


cantor. Seduzido por falsas promessas, ele é contratado como mensageiro de uma agência de shows medíocre. A realidade mostra sua face: muitas reviravoltas desafortunadas do destino o levam a uma plantação de açúcar para ser um trabalhador comum e o transformam em um pequeno criminoso. As coisas vão de mal a pior, e só depois de vários anos de sofrimento, decepções e sentenças de prisão Pan finalmente retorna para sua cidade e sua esposa, implorando por perdão. A vida no interior é retratada como uma esfera bucólica e arcaica e a natureza como bela e generosa: canais entrecortam a área, provendo uma fonte de vida e servindo como meio de transporte para os barcos a remo dos camponeses. As tradicionais casas de madeira tailandesas construídas sobre palafitas são cercadas por uma paisagem verdejante que provê todas as necessidades da população: safras crescem nos campos, madeira para a construção de casas e ervas que servem como remédio natural. O trabalho não parece tão árduo, mas uma fonte de alegria comunitária, e a natureza é, ao mesmo tempo, um meio de subsistência e uma fonte de prazer. A relação entre o ser humano e a natureza aparece intacta e harmoniosa. O retrato do ambiente rural puro e modesto é crucial para o enredo, pois abre o filme de forma idílica, permitindo o clima tranquilo e a inocência do romance e estabelecendo um nível de felicidade que muda com a partida de Pan. Embora sua vila seja retratada como um idílio onde o tempo parece não passar, a cidade grande é retratada como caótica, corrupta e feia, como uma selva urbana desprovida de valores, princípios e calor humano básicos. Laços familiares e integridades estão perdidos e o contato social é marcado pela desonestidade, pelo oportunismo e egoísmo.

O contraste é reforçado pelo estilo visual do filme. As cenas rurais são filmadas em cores vivas e luz clara, exibindo close-ups de

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Transistor Monrak é construído em torno do contraste dualístico entre a esfera rural e urbana, idealizando a vida no interior e caracterizando a cidade como um lugar hostil. Colocadas em rígida oposição, os dois espaços contrastantes significam o tradicional e o estilo de vida moderno — isto é, ocidentalizado ―, claramente atribuindo valores morais a cada um deles. Em uma cena na qual Sadao, a jovem esposa de Pan, vai procurar por ele em Bangkok, ela leva consigo duas garrafas de plástico com água de chuva pura da sua cidade como um presente para ele. Ela o encontra, mas, tristemente, seus planos de ficarem juntos de novo são destruídos no último minuto. Conforme Sadao anda com dificuldade pelo trânsito de Bangkok, deixa cair as garrafas, que rolam pelo asfalto e se perdem. Mostradas em close-up, as garrafas simbolizam a perda da pureza e inocência que a vida dura na cidade impõe aos recémchegados. Ao mesmo tempo, significam a perda da fé de Sadao e, finalmente, sua desilusão com Pan.


detalhes da natureza, enfatizando a paz e a harmonia da cidade natal e da vida em família de Pan. As cenas em Bangkok são mais escuras, filmadas em alta velocidade, o filme é exposto por tempo insuficiente e depois tratado em laboratório para dar às imagens um visual granulado, bruto, que vai refletir o sentimento de Pan de estar perdido em um mundo cruel. A vida no campo sempre foi um símbolo poderoso para a ideologia da khwam pen Thai, representando um lar harmonioso e pacífico onde os valores da família e da comunidade prevalecem. O significado vem como uma reação à rápida modernização desde a Segunda Guerra Mundial, que tem sido recentemente enfatizada no contexto da globalização: conforme a tensão entre o desejo de ser tailandês e o impulso de participar do hedonismo e consumismo global cresce, a esfera rural acena como um ideal nostálgico. Também significa abundância – vida agrícola, embora às vezes significando trabalho árduo, cultiva autossustentabilidade e uma conexão de confiança com a generosidade da natureza. Não apenas esse mundo rural utópico abriga um ideal de beleza e harmonia, como também de valores morais como simplicidade, respeito pela natureza e igualdade. Dessa forma, se torna um local ético, um estilo de vida especialmente puro. Diferentemente da situação em muitos países industrializados, onde a vida no campo é completamente ilusória, visto que estilos de vida rurais autossuficientes desapareceram completamente, a vida rural tailandesa continua a ser uma alternativa real e tangível à vida urbana. A esfera urbana se passa em Bangkok, a capital, porque ela é a única metrópole tailandesa. O papel que Bangkok normalmente desempenha nos filmes é da cidade opressivamente grande, realista, desorientadora, um lugar onde pessoas inocentes do interior se aglomeram em busca de dinheiro, fama, ou os dois, e com frequência se perdendo na selva de concreto e sua sujeira moral. Estradas, o aeroporto e o ocasional estrangeiro são significantes de modernidade e internacionalidade. Na verdade, representações diferentes de Bangkok são uma raridade.

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A fronteira entre Bangkok e o rural é um traço recorrente nas tradições artísticas, literárias e intelectuais tailandesas, especialmente em um movimento conhecido como sinlapa pua chiwit (arte pela vida), que é altamente preocupado com ideais e estéticas realistas sociais, apreciação da arte folclórica e um comprometimento da libertação política das massas. Foi considerado como um exemplo de oposição cultural durante a ditadura militar da Guerra Fria. O cinema tailandês tem uma conexão com motivos rurais faz muito tempo. Nos anos 1970, um movimento cinematográfico depois chamado de Nouvelle Vague tailandesa emergiu. Cineastas como Wichit Kounavudh, Cherd Songsri, Euthana Mukdasnit e Chatrichalerm


Yukol basearam o olhar de seus filmes na estética do realismo social. Eles normalmente adaptavam a literatura sinlapa pua chiwit e usavam a música folclórica lookthung em seus filmes, repetidamente inspirando-se no mito do rural. Esse mito, como uma personificação da ideia de khwam pen Thai, ao mesmo tempo implica a noção de vida no interior como cultura original. A autenticidade imaginada do rural, no entanto, ignora o fato de a cultura indígena ser, ela própria, composta por influências múltiplas das diversas regiões que hoje formam a Tailândia. Assim, o mito da autenticidade está ligado ao mito da homogeneidade da nação. Khwam pen Thai e o passado com pastiche No entanto, Transistor Monrak não apenas entrega-se à nostalgia pelo passado, mas o trata com uma certa distância fundamentada em uma consciência do rígido dualismo interior/cidade e sua história na cultura tailandesa. Ao tratar elementos discursivos da khwam pen Thai como pastiche ou, às vezes, de forma ironizada, o filme faz alusão à construção da identidade nacional. Referências a khwam pen Thai estão por todo o filme e, mais obviamente, no muito estilizado tema do dualismo entre o rural e o urbano. Referências posteriores aparecem no diálogo. Quando um vendedor flerta com Sadao e a convida para ir ao cinema, ela que saber se o filme é tailandês ou estrangeiro, porque, nas suas palavras, “os atores estrangeiros não são tão bonitos”.

Transistor Monrak também se refere a modos pré-modernos de narrativa que derivam de uma era pré-tecnológica, antes do aparecimento do cinema. Entre esses elementos de estilo narrativos de contação de história tradicional e teatro estão o peculiar personagem narrador, os personagens estereotipados e também as cenas de performance altamente irrealistas, nas quais os personagens começam a cantar em situações um tanto improváveis. Elas se inspiram na oralidade e na performatividade realçada, ambas chaves nas tradições da contação de histórias da região e, dessa forma, uma clara narrativa khwam pen Thai.

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Como o filme imagina o mundo rural como arcadiano e arcaico, normalmente dá a impressão de atemporalidade ou de um tempo híbrido e estranho, um presente moderno com toques retrôs, que às vezes são apresentados como ícones da autêntica cultura tailandesa, como as cenas da feira no início do filme. O passado imaginário também toma a forma de pastiche: numa projeção de cinema ao ar livre, os espectadores do vilarejo assistem com deleite um velho clássico tailandês surgir na tela, um entretenimento tailandês típico dos velhos tempos. Olhando mais de perto, no entanto, o filme é o Tears of the Black Tiger (2000), um filme recente que segue parcialmente o modelo dos filmes de ação dos anos 1960, às vezes imitando a cor desbotada e as ranhuras das velhas cópias. O anacronismo é uma inteligente alusão a Era de Ouro


como esfera imaginária: em uma cena que parece do passado, ou talvez de um passado arcaico atemporal, aparece um filme que não é tão velho, apenas parece velho — na verdade, é provavelmente mais novo que a cena do filme em que se passa; é um tipo de passado refeito, falso. À medida que a historicidade é substituída por uma submissão a estilos passados e ícones, objetos multifacetados se tornam significantes limitados de uma ideologicamente afirmada ideia de nação, e sinais retrôs funcionam como “nostalgia sem história”. O que parece ser despreocupado, malabarismo pós-modernista de significados, pode, em um segundo olhar, muito bem ser um sinal de ceticismo em relação à autenticidade imaginada que parece questionável por causa de sua capacidade de reprodução. Como ressalta Frederic Jameson, duas características principais da pósmodernidade são o uso do pastiche e uma crise na historicidade — colagem cultural sem base normativa de seus elementos, assim como uma desconexão do conhecimento histórico em relação à experiência de vida no mundo presente. Ambos os elementos convergem no uso de imagens com significantes de um passado imaginário. Esse jogo consciente com significantes da khwam pen Thai tematiza uma percepção de sua instantânea reproducibilidade e, assim, seu recente distanciamento da historicidade. Além disso, mostra uma consciência do nacional como um valor idealizado, e da fragilidade de uma khwam pen Thai extremamente idealizada. Também reflete uma profunda preocupação com o nacional, que é tão formativo não apenas para o Novo Cinema Tailandês como para a Tailândia do pós-1997 de forma geral, conforme a transnacionalização e a globalização impelem o país em novos contextos e relações com o estrangeiro, instigando-o a reavaliar seu senso de identidade.

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“Made in Thailand” — ambivalência e fonte de inspiração Depois dos créditos finais de Transistor Monrak, um quadro mostrando letras brancas sobre o preto surge com um dizer “Made in Thailand”. Colocada no fim do filme, essa imagem transmite um significado complexo. De um lado, é uma celebração da produção local, do filme feito em casa — Transistor Monrak surgiu em 2001 no ápice do que na época foi chamado de Novo Cinema Tailandês. Um importante traço recorrente nesses filmes, no entanto, é a maneira irônica ou de pastiche com que lidam com a história do cinema local e a khwam pen Thai. “Made in Thailand” também se refere à etiqueta encontrada em todo tipo de mercadoria, e normalmente sugere uma imagem de produção de baixo custo, de qualidade inferior aos produtos importados. A comparação entre produtos estrangeiros e tailandeses há muito tempo é uma questão sensível com a qual consumidores tailandeses lidam com ambivalência. No hit musical “Made in Thailand”, do início dos anos 1980, a banda


de rock tailandesa Carabao critica as implicações da declaração de produção. Rotular mercadorias com essas palavras implicitamente as associava a mão de obra barata, preços baixos e qualidade inferior aos produtos importados japoneses, europeus e norte-americanos, que eram tão caros que a maioria dos tailandeses não podia comprar. No entanto, conforme a Carabao ressalta, os produtos tailandeses eram normalmente comprados no atacado, exportados, reetiquetados e reimportados para a Tailândia por um preço mais alto, tornandose altamente desejáveis por causa desse status elevado. Isso mudou. Na esteira do ressurgimento da khwam pen Thai no pós1997, “Made in Thailand” normalmente significa uma qualidade especial, um retorno aos valores nacionalistas e nostálgicos. Como resultado da crescente comodificação, uma desreferencialização do que significa tailandês ocorreu: “Made in Thailand” se tornou um rótulo, comparado a uma marca. No entanto, sob esse rompante de autoestima, o consenso de que as mercadorias tailandesas são mais baratas e de menor qualidade continua, emprestando ao rótulo um tipo de personalidade partida. Vendedores em lojas de roupas, por exemplo, continuam a anunciar suas mercadorias como “produtos tailandeses, mas feitos no Japão” a fim de ganhar os compradores. Essa ainda presente aura de inferioridade e seu contraste com o valor emocional das coisas tailandesas também aparecem no marketing dos filmes tailandeses. Parte da razão pelo entusiasmado orgulho do cinema tailandês em seus novos filmes pode muito bem estar em sua competitividade com os padrões de produção de Hollywood: esforçando-se para se igualar com o visual glamoroso dos filmes importados de Hollywood, a indústria se concentrou em alcançar uma superfície estética polida e de aparência cara ao produzir filmes high-concept.

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Como Transistor Monrak tematiza, entre outros temas, a dificuldade e a pobreza da classe trabalhadora da Tailândia, a referência do quadro inserido no fim do filme à mão de obra barata acrescenta um senso de ambivalência e preocupação a nível de homenagem e leve ironia. Os múltiplos significados que o filme cria aqui são sintomáticos das posições que o filme tailandês habita em relação a seu papel como produção nacional e produto de consumo no mercado global. De forma autorreferencial, Transistor Monrak não apenas nomeia, mas também desempenha seu próprio status de produção, sendo feito na Tailândia, apresentando inteira consciência das implicações complexas desse rótulo. A imagem do quadro final então se torna uma alusão à situação do cinema tailandês e sua busca por um lugar no cinema globalizado.


D esl o cand o “independência” O discurs o d o cinema independente d o S udeste A si á tic o e suas trajet ó rias Natalie Boehler

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Introdução Desde o final dos anos 1990, por todo o sudeste da Ásia surgem formas de cinema independente. Diretores de cinema de vários países do Sudeste Asiático estão trabalhando fora dos sistemas dos grandes estúdios e das produções de televisão financiados pelo Estado e produzindo curtas-metragens, longas, documentários e ficções. Isso é notável pelo fato de muitos países do Sudeste Asiático terem um histórico de empregar a mídia de massa como esforço de construção nacional, circulando imagens da nação definidas e homogeneizadas pelo Estado e controlando seu conteúdo com sistemas rígidos de censura. Embora sistemas de estúdio tenham predominado por décadas na região, desde 1970 ou 1980 eles vêm desaparecendo de muitas cidades; no entanto, o mainstream prevalece. Seu produto consiste principalmente em obras genéricas, feitas segundo uma fórmula para consumo de massa, como filmes de gênero, telenovelas e similares. Diretores independentes do Sudeste Asiático conseguem trabalhar em áreas dominadas pela cultura mainstream e pelas restrições impostas pelo Estado por trabalharem com modos alternativos de produção, circulação e exibição. Os custos de produção são tipicamente baixos por usarem métodos simples, salários baixos e, às vezes, mão de obra gratuita; o financiamento é normalmente concedido por fontes privadas, crowdfunding, às vezes por fundos de


desenvolvimento e doações feitas por instituições estrangeiras ou por prêmios em dinheiro recebidos em festivais de cinema. Filmes independentes são distribuídos por pequenas produtoras, muitas vezes do próprio cineasta, e frequentemente por meios informais de distribuição. Muitas dessas produtoras usam a mídia social, como blogs, Twitter ou Facebook, como plataforma de promoção e distribuição de seus filmes. Assim, a internet funciona como uma alternativa às formas de trabalho tradicionais, normalmente produções de estúdio controladas pelo Estado. Por exemplo, a produtora malásia Da Huang Pictures, fundada por quatro cineastas independentes, usa seu site como canal de informação, de negócios, loja on-line para venda de dvds, blog e canal de publicidade — tudo num único lugar. Plataformas on-line para streaming de filmes, como YouTube, Vimeo ou Mubi, são outras formas comuns de circulação, assim como a pirataria. Os filmes são exibidos em locais alternativos e festivais, como o Substation, em Cingapura, ou o Festival de Vídeo e Curtas Tailandês, em locais privados, underground e semiformais, como microcinemas, bares, cineclubes e galerias de arte. Outro meio de exibição proeminente é o circuito de festivais internacionais, especialmente festivais que têm mostras específicas, como o Cinema Mundial ou Filmes Asiáticos, por exemplo, o Festival de Pusan, o de Roterdã e a seção Forum do Berlinale. Em grande parte, essas práticas e estratégias alternativas são possibilitadas pela emergência da tecnologia digital e da internet de alta velocidade na região, inovações cruciais, visto que são responsáveis por possibilidades como o (relativamente) baixo custo das produções, distribuição on-line, circulação via dvd ou streaming. Na verdade, muitos cineastas locais, acadêmicos e ativistas culturais veem o cinema digital como um marco para o cinema independente.

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No curso da última década, esse cinema ganhou ímpeto com o estabelecimento dos festivais regionais e de sites específicos que servem de plataforma e pontos de encontro para a comunidade de cineastas e de espectadores. Embora a cinematografia individual dos países do Sudeste Asiático ainda seja essencialmente entendida como nacional, o alcance regional parece ter ganhado importância. “Cinema independente do Sudeste Asiático” se tornou uma expressão-chave, uma entidade muito discutida na comunidade cinematográfica regional. Entre cineastas, acadêmicos e entusiastas, se tornou uma preocupação local agrupar os filmes da região para, assim, refletir o cinema independente como uma expressão cultural, uma estratégia, e chegar através desse esforço a um denominador comum e a traços universais, e ao mesmo tempo reconhecer a diversidade da região, de seus filmes e de seus meios de representação e produção.


Para muitos cineastas e aqueles que participam do discurso, o elemento de independência é chave nessa prática cinematográfica que é vista como um cinema político subversivo, uma vez que apresenta alternativas não apenas às produções e à estética mainstream, mas também às políticas estatais de conteúdo de mídia e representação da identidade nacional. Muitos filmes tocam em tópicos sensíveis ou inacessíveis, e alguns projetos estão diretamente conectados ao ativismo político: o projeto malásio Kampong Radioaktif (Survival Guide Untuk Kampong Radioakitf, Liew Seng Tat, Tan Chui Mui, Woo Ming Jin e Yeo Joon Han, Malásia, 2011) consiste em quatro curtas-metragens que satirizam os esforços do governo de subestimar os efeitos de longo prazo da radiação na população local; o Festival de Cinema Q!, indonésio, exibe filmes queer, com o objetivo de conscientizar a população para as questões queer e o hiv, embora enfrente os protestos de grupos religiosos conservadores. O cinema independente também se opõe ao mercantilismo, às produções de Hollywood e aos cinemas do grande circuito que dominam a região. A existência de vários manifestos, declarando a independência e a busca por um vocabulário alternativo, é um indicativo do espírito pioneiro que motiva grande parte das produções do cinema independente local.

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A emergência desse tipo de cinema colocou o Sudeste Asiático no mapa internacional. Exibições em festivais e prêmios acumulados por cineastas de repente tornaram visível uma região que era um espaço em branco no mapa cinematográfico, mesmo na narrativa do “Cinema Mundial”. Em seus países de origem, no entanto, onde a maior parte do público se volta para produções de Hollywood, filmes locais comerciais ou os dois, o cinema independente tem um público um tanto marginal. De forma paradoxal, são mais assistidos no exterior por estrangeiros do que em seus países de origem, embora normalmente apresentem forte preocupação com questões e problemas locais. Assim, alguns cineastas se tornaram figuras globais, como os filipinos Lav Diaz e Raya Martin, os diretores malásios Amir Muhammad e Tan Chui Mui ou os diretores tailandeses Aditya Assarat e Apichatpong Weerasethakul. Por essas razões, o cinema independente do Sudeste Asiático foi descrito como cinema trans ou pós-nacional. Elementos do discurso e suas trajetórias O cinema independente do Sudeste Asiático é um tema fértil para o estudo de cinema contemporâneo, pois concentra vários novos aspectos do cinema: o uso de tecnologias digitais, suas implicações estéticas e industriais; marginalidade política; e sua ambientação em uma parte do mundo em grande medida desconhecida para a maior parte dos que estudam o cinema. Essas inovações desafiam conceitos clássicos e epistemologias tradicionais da disciplina — mais obviamente a estrutura do cinema nacional, o dispositivo


cinematográfico, a teoria do espectador e a concentração dos estudos em filmes ocidentais, ou seja, aqueles de Hollywood e da Europa. Este ensaio examina o discurso atual sobre o cinema independente contemporâneo do Sudeste Asiático, especialmente a maneira como é definido e posicionado. Enquanto estudo essas (auto) reflexões, focarei nas ligações entre o independente, o digital e o regional/nacional. Esse nexo de tópicos é especialmente gratificante de ser pesquisado porque toca em diversos assuntos hoje debatidos nos estudos de cinema, em particular a nação como quadro, a era digital e teorias do cinema mundial. Ao analisar algumas vozes que moldam esse discurso, pretendo desfazer algumas das várias tensões que o formam. Como vou explicar, o discurso sobre o cinema independente do Sudeste Asiático mostra paralelos óbvios com e apropriações de vários discursos na história e teoria do cinema. O interesse do ensaio está em como esses discursos tradicionais são recebidos e modificados no Sudeste Asiático contemporâneo. Há várias razões pelas quais me interessei pelo tema. Primeiramente, o discurso sobre o cinema tem repercussões no próprio ato de fazer cinema: cineastas moldam seus autoconceitos e suas identidades na história do cinema global. Como, então, eles se relacionam com certos conceitos históricos? A maioria desses conceitos se origina em partes diferentes do mundo, levantando a questão sobre como lidar com as diferenças geopolíticas e culturais. Além disso, o cinema não ocidental apresenta uma oportunidade importante para refletir os estudos de cinema tradicionais. A transferência da teoria tradicional ocidental para outros lugares inevitavelmente levanta questões de adequação e conclusividade; examinar como essas teorias são tratadas em outros lugares pode oferecer novos impulsos sobre como elas podem ser repensadas e expandidas.

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Independência, o digital e o regional Na discussão sobre o cinema independente do Sudeste Asiático, é dada grande importância à questão da independência, embora, ao mesmo tempo, seu significado pareça ser um tanto vago. Na verdade, a importância do termo “independência” faz da imprecisão de seu significado e da falta de definição para o cinema local ainda mais notáveis. Como observou o acadêmico australiano Benjamin McKay, “Talvez uma ‘definição’ categórica não seja

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Finalmente, conforme viajam pelo espaço e tempo, conceitos e discursos são transformados. Dessa forma, translocalização de processos do discurso e teorias são altamente informativas sobre como a teoria do cinema e sistemas do conhecimento em geral funcionam no presente.


necessária. Mas temos de reconhecer que o independente de uma pessoa é o ‘mainstream’ de outra”. Como ressalta John Lent, o termo “independência” é usado em diferentes contextos, variando de acordo com o lugar, o tempo e o falante. Lent sugere, assim, olharmos para três entidades diferentes nas quais a independência se manifesta no cinema: regulação governamental, os sistemas de estúdio mainstream e os métodos e estilos tradicionais de filmar. Examinada a partir de uma variedade de aspectos, a questão da independência parece tocar em vários níveis, especialmente aqueles de envolvimento político, os níveis industriais e econômicos, assim como o estético e da narração. O conceito de independência cinematográfica tem diversas linhagens na história do cinema, muitas das quais são abordadas na discussão sobre o cinema independente do Sudeste Asiático: cinema independente dos Estados Unidos dos anos 1990, a Nouvelle Vague europeia, o Terceiro Cinema e o cinema póscolonial. Todos englobam os níveis mencionados acima. Cada um articula a independência com as novas tecnologias e as novas maneiras de lidar com o equipamento cinematográfico a fim de reduzir os custos proibitivos e permitir a realização de filmes fora da esfera dos estúdios das grandes produções e seu estilo e conteúdo comercial e simplificado. Além disso, todos se relacionam, embora em graus extremamente diferentes, com envolvimento político e, em alguns casos, oposicionismo. Dessa forma, todos propõem “outro” cinema, que contrasta com e se opõe a formas cinematográficas percebidas como dominantes, principalmente aquela de Hollywood. A seguir, examinarei as inúmeras referências no discurso do cinema independente do Sudeste Asiático às várias tradições e conceitos cinematográficos de estudos de cinema, discutindo-os sob o aspecto de sua translocalização e sua conclusividade para esse novo discurso.

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Confrontando o sistema de estúdio: a influência dos filmes americanos independentes dos anos 1990 Provavelmente o uso mais costumeiro de “independente” se refira a filmes produzidos e distribuídos fora dos grandes estúdios, que dominam ou até mesmo monopolizam a indústria cinematográfica na maior parte do Sudeste Asiático. No entanto, talvez o primeiro impulso para se fazer cinema independente não tenha surgido de condições locais, mas sim seguindo um conceito importado de independência. Quando perguntado numa entrevista se cinema independente é uma reação ao mainstream, ao cinema comercial malásio, o diretor de cinema independente Amir Muhammad refuta a ideia e atribui a forte influência das tendências estrangeiras, especialmente


(…) o hype dos filmes independentes, que não se pode negar começou nos Estados Unidos nos anos 1990. Então temos a ideia romântica de o fazermos à nossa própria maneira. Não acho que era conscientemente uma oposição nesse sentido, pois isso só funcionaria se os filmes mainstream malásios fossem os únicos filmes que existissem. Mas ainda assistimos a filmes mainstream.

Conforme comenta Gaik Cheng Khoo, um acadêmico que estudou o cinema malásio independente, a independência do sistema de estúdio remonta ao cinema independente americano dos anos 1960, e sua origem está no cinema avant-garde europeu dos anos 1920. Nos anos 1990, houve uma convergência de independência e o ideal de glamour hollywoodiano, estrelato e prestígio; a união do mainstream e do independente se tornou influente nos cineastas do Sudeste Asiático. De acordo com esse ponto de vista, a divisão entre a indústria de estúdios mainstream e o cinema independente parece ser menor do que se poderia esperar de um movimento oposicionista. Em vez disso, pode haver muito bem o aspecto da cinematografia independente como emulando uma tensão cinematográfica dos Estados Unidos. Além disso, a fronteira entre o mainstream e o independente é provavelmente menos absoluta que costumava ser, pois houve um recente derramamento de elementos do cinema independente em formas mais comerciais de cinema. Em alguns casos, filmes independentes bem-sucedidos permitiram que seus realizadores fizessem negócio com grandes estúdios, que lhes ofereceram oportunidades como lançamentos comerciais em cinemas locais e projetos com orçamentos maiores. Alguns diretores trabalham simultaneamente dentro e fora do sistema de estúdio, transpõem o abismo entre o independente e o mainstream. O diretor malásio James Lee, por exemplo, faz filmes independentes assim como filmes de gênero malásios, como o filme de terror de 2011, Sini Ada Hantu (Here Got Ghost!).

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Esse derramamento pode estar entre as razões pelas quais alguns críticos falam de um recente fim do cinema independente. O diretor malásio James Lee ressalta como a acessibilidade da cinematografia digital leva a uma grande quantidade de filmes sendo feitos com pouca experiência e sem o completo entendimento do potencial da obra digital, o que leva a uma perda de qualidade. Dessa maneira, “indie” se tornou um rótulo estiloso pelo qual muitos jovens cineastas aspiram, visto que o vídeo digital, mais barato, apresenta a possibilidade de se fazer longas-metragens logo no início da carreira, e o sucesso comercial (e financeiro) de alguns cineastas independentes é um forte incentivo. De acordo com Thaiindie, um grupo de diretores independentes tailandeses, “indie” — a versão popular, badalada, do cinema independente que se estabeleceu no curso dos anos 2000, se tornou um tipo de gênero com formulado com um novo “conjunto de regras”, um estilo fixo que se tornou um tipo de marca comercializada.


Independência estética, alta/baixa cultura e comercialização “indie” O crítico de cinema filipino Alexis Tioseco escreveu sobre o limite entre mainstream e cinema independente estar se tornando cada vez mais embaçado. Embora ele se refira à situação nas Filipinas, essa declaração pode ser expandida a muitas indústrias cinematográficas contemporâneas do Sudeste Asiático. Hoje é mais difícil distinguir os dois pelo formato (vídeo digital versus 35mm), tamanho (curta versus longa) forma (alternativa versus que segue uma fórmula) ou distribuição (limitada versus ampla), pois a velha estrutura e suas fronteiras se confundiram. Produtoras maiores entraram em territórios previamente habitados pela cena do cinema independente, como pequenos festivais, e criaram sub-rótulos empregando jovens diretores que trabalham com baixo orçamento; enquanto isso, as produtoras anteriormente independentes estão produzindo filmes direcionados para uma audiência maior e lançamento em grandes salas de cinema, normalmente aceitando financiamento de grandes produtoras e corporações. Em suma, as convergências que se realizaram expandiram novos nichos na indústria cinematográfica e diluíram a importância do termo “independente”, que, na opinião de Tioseco, “já foi um grito de guerra, mas agora é apenas um gemido, uma ferramenta de marketing, uma referência estilosa”. De acordo com Tioseco, desde que os determinantes industriais e técnicos viram mudanças na conotação, a questão da estética é de particular importância para a noção da independência hoje. Nesse sentido, independência é vista como uma resistência estética e cultural; estética é claramente entendida como tendo alcance político, seguindo a crença que a representação forma a subjetividade do espectador ao posicioná-lo ou posicioná-la de certas maneiras, com base no dispositivo cinematográfico e na teoria do espectador, como cunhado por Raymond Bellour e Jean-Louis Baudry.

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No entanto, nesse ínterim, se tornou uma preocupação comum que a estética do filme independente tenha se tornado também comercial. O filme filipino The Woman in the Septic Tank (Ang Babae Sa Septic Tank, Marlon Rivera, Filipinas, 2011) satiriza o típico estilo “indie”: edição lenta, voz em off, tomadas extremamente longas e fotografia granulada parecem ter se tornado clichê e perderam sua contundência. Ao se afirmar a independência como cultura alternativa e determinar a perda da urgência política e a importância artística que vem com a transformação da cultura “indie” em commodity, um truísmo ocidental aparece: o da baixa cultura versus alta cultura. Nessa noção que foi formada na Europa do século xvii e associa cultura à classe social, alta cultura é vista como uma força para o bem político e moral, como oposto à baixa cultura, de massa, popular, considerada de valor inferior. Na história do cinema atual, a distinção normalmente ressurge


na contrastante justaposição de cinema de arte e cinema comercial. Enquanto cinema de arte é entendido como aquele que se abstém do mercantilismo em prol do foco cerebral e artístico, e que existe por uma audiência de nicho de pessoas de bom gosto, o cinema comercial é considerado não político, entretenimento escapista para as massas. O posicionamento do cinema independente do Sudeste Asiático como cultura alternativa parece, dessa forma, se referir a essa fronteira arte/entretenimento. Cinema digital e nova estética: dogma Ao alinhar prática digital com cultura alternativa, em oposição à cultura comercial, os cineastas do Sudeste Asiático seguem uma noção previamente utilizada por diversos movimentos ou correntes da história do cinema: o uso de tecnologias novas e de custo menor para produzir filmes entendidos como a contraparte alternativa do cinema já estabelecido, como os tipos mais leves de câmera, mais portáteis, utilizados pela Nouvelle Vague e pela Nova Hollywood, a câmera na mão apreciada pelo movimento Dogma dinamarquês ou, mais recentemente, as câmeras digitais como a ferramenta escolhida pela sexta geração dos cineastas chineses. As qualidades e o manuseio dessas tecnologias implicam uma agenda estética e narrativa em contraste com a do mainstream e normalmente apresentam modos alternativos de representação e posição do observador, novos tipos de narrativa e a evitação das estrelas do cinema.

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Em seu manifesto, “Os doze bowowows da impureza”, Khavn de la Cruz, um cineasta filipino independente, alude diretamente ao movimento dinamarquês de vanguarda Dogma 95, fundado por Lars von Trier e Thomas Vinterberg, e seu manifesto e “voto de castidade”. Como seu predecessor dinamarquês, o manifesto de Khavn estabelece regras de filmagem baseadas nos parâmetros tradicionais de fazer cinema — fotografia, luz e cor, gravação de som, mise-en-scène, convenções narrativas e seus semelhantes e defende o uso de equipamentos de baixo custo e soluções simples em vez de tecnologia elaborada e padrões de trabalho de alto nível. Khavn chama seu manifesto de “bastardização” do credo do Dogma, contrapondo o objetivo original da “castidade” com o de “impureza”. Enquanto o manifesto dinamarquês estabelece um conjunto de regras claro com imperativos rígidos, Khavn estabelece suas “regras” como opções que permitem ao diretor o alcance mais amplo possível da criatividade e autoexpressão, a meta maior sendo “Só faça seu filme, agora”.


Ativismo político: Terceiro Cinema, pós-colonialismo e anti-imperialismo Outra noção recorrente na história do cinema independente é o alinhamento de sua característica de alternativo com envolvimento político. Dessa maneira, o cinema é entendido como um modo de resistência estética e cultural contra as autoridades estabelecidas no poder. Como muitas nações do Sudeste Asiático são governadas por regimes autoritários e estão lutando pela democracia, as principais autoridades criticadas pelo cinema alternativo são os poderes do Estado. O cinema independente resiste às ideologias estatais ao falar de tabus e assuntos sensíveis e desafia o controle estatal ao se esquivar da censura, às vezes chegando a fazer graça dela. O curta-metragem do cineasta cingapurense, Royston Tan, Cut (Cingapura, 2004), por exemplo, é um medley satírico de músicas pop e cenas de dança que ridicularizam o Comitê de Censores de Filme da Cingapura depois de ter sido pressionado a fazer cortes em seu longa 15. Aqui, a filmagem digital desempenha um papel vital, pois normalmente permite que se evitem os canais de distribuição e exibição aprovados pelo governo, por exemplo, com o serviço de streaming e dvds caseiros, e ao se fazer publicidade por meio das mídias sociais.

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A noção do cinema como ativismo político, meio de resistência e um caminho para a liberdade pode ser encontrada no Terceiro Cinema. O movimento latino-americano dos anos 1970 tinha como objetivo inspirar o ativismo revolucionário de massas e fazer o contraponto aos filmes comerciais escapistas e ao cinema de arte ao fundar um movimento cinematográfico e estético adequado para a situação política e econômica do que na época era chamado Terceiro Mundo. O cinema independente do Sudeste Asiático, ou algo de seu estado de espírito, foi repetidamente entendido como um possível descendente que seguia o espírito politizado, comunitário e radical do Terceiro Cinema. No entanto, embora agindo como vozes de oposição, vários cineastas ou instituições dependem parcialmente do financiamento estatal. Por exemplo, o Centro de Arte e Cultura de Bangkok, financiado pelo Estado regularmente, exibe filmes independentes; o Substation, um centro cultural alternativo de Cingapura, é parcialmente sustentado pelo Estado, assim como o Festival de Curtas Tailandês. Como aponta Mariam Lam, embora o cinema independente vietnamita exista na forma de cinema não comercial, o Estado está envolvido com todos os filmes vietnamitas, dessa forma afastando a definição de independência do nível econômico. O fato de financiamento estatal e cinema independente não estarem separados e, em alguns casos, não separáveis, relativiza o oposicionalismo aberto e radicalismo proposto pelo Terceiro Cinema e obscurece o posicionamento político. Pode ser um indicativo de que o alinhamento com o Terceiro Cinema tenha sido construído por críticos estrangeiros ou diaspóricos em vez de por ativistas locais, muitos dos quais estão


envolvidos e talvez dependam das complexidades da participação do Estado no financiamento do filme e da cultura do cinema e na negociação de seu próprio financiamento político e econômico. Outro aspecto do Terceito Cinema como resistência política é o anti-imperialismo, uma mentalidade que deve ser vista como conclusiva para a situação pós-colonial da maior parte do Sudeste Asiático. A tecnologia digital é às vezes tida como ferramenta vital para o empoderamento da cultura cinematográfica local, já que permite filmagem local com orçamentos muito menores do que o uso de 35mm requereria. Como disse o cineasta filipino Lav Dias em uma entrevista: O digital é a teologia da libertação. Agora podemos ter nossa própria mídia. (…) A questão não é mais que você não pode filmar. Agora você tem um Cinema Independente do Sudeste Asiático. Fomos destituídos disso por muito tempo, fomos negligenciados, fomos desprezados pela mídia ocidental. Isso se devia à logística da produção. Não tínhamos dinheiro, não tínhamos as câmeras, todas aquelas coisas. Agora, essas questões foram resolvidas. Temos as mesmas condições.

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Como a estrutura do cinema internacional mudou profundamente desde os anos 1960, as posições culturais e políticas constitutivas do Terceiro Cinema também mudaram. Hegemonia cultural, eurocentrismo e forças capitalistas não são mais restritas a certas partes do mundo, mas se deslocaram e, em alguns casos, foram até mesmo absorvidas por epistemologias, economias e sistemas de valores não ocidentais. Como escrevem Negri e Hardt, “Império” não pode mais ser alocado geopoliticamente, tornou-se um conglomerado de várias entidades e práticas. Assim, as estratégias anti-imperialistas tradicionais não podem mais ser aplicadas contra nações individuais. Embora o Terceiro Cinema permaneça um

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Aqui, a ascensão do cinema do Sudeste Asiático é descrita como uma oposição ao cinema ocidental como agente da hegemonia cultural, ecoando uma preocupação essencial do Terceiro Cinema. Ver o cinema do Sudeste Asiático como uma reação ao cinema mais dominante — principalmente de Hollywood, mas também outros cinemas mais proeminentes, como o do Japão, de Hong Kong ou da Índia — é uma poderosa fonte de tensão no discurso. No entanto, a resistência no que diz respeito a poderes hegemônicos reivindicados pelos ativistas do Terceiro Cinema mudou desde então, assim como vários cineastas independentes do Sudeste Asiático atuais recebem contribuições de fundos estrangeiros e festivais e outras instituições que apoiam o cinema em regiões economicamente mais frágeis, como o fundo Hubert Bals do Festival de Cinema de Roterdã ou o workshop Produire au Sud, realizado pelo Festival de Cinema de Nantes.


ponto de referência no discurso das culturas cinematográficas não ocidentais, a mudança de coordenadas que localizam o discurso provoca um reajuste na paisagem atual do cinema global. No caso do cinema independente do Sudeste Asiático, isso implica uma redefinição da noção de independência, alinhandose com instituições que oferecem contribuições e negociando o posicionamento transnacional que isso implica. Também levanta a questão das hegemonias atuais e dos novos centros de poder que não estão localizados num espaço geográfico determinado, mas deslocalizados, como instituições de financiamento transnacionais, a política de grandes festivais de cinema e a influência de críticos e instituições acadêmicas. Transnacionalismo, regionalismo, paisagens e a nação As noções de transnacionalismo e regionalismo figuram de forma proeminente no discurso do cinema independente do Sudeste Asiático, como a tecnologia digital figura como forma de transcender os limites do nacional e estabelecer redes globais e regionais. Em sincronia com valores comunitários, acredita-se que o quadro regional ajuda a colocar o cinema nacional individual no mapa do cinema global e reforçar sua presença, fazendo com que a região fique visível como um todo. Vários grupos, instituições e redes envolvidas com o cinema independente do Sudeste Asiático operam transnacionalmente, assim como os sites Criticine e o Southeast Asian Film Studies Institute, o Festival de Cinema Luang Prabang ou o Festival de Cinema do Sudeste Asiático, realizado em Cingapura.

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Muitos críticos asiáticos pós-coloniais teorizaram o regionalismo como um enquadramento conceitual alternativo ao antiimperialismo. Na esteira do conceito de nação como uma comunidade imaginada e do questionamento do lugar do cinema nacional, o conceito de cinema regional parece oferecer um ponto de partida promissor. Tilman Baumgärtel descreve os aspectos digitais e regionais desse cinema com um conceito desenvolvido por Arjun Appadurai. Na abordagem de Appadurai, “paisagens” são espaços nos quais se cruzam as fronteiras criadas por fluxos globais culturais contemporâneos: uma paisagem midiática se refere ao alcance global da mídia e sua habilidade de disseminar informação por todo o mundo; uma paisagem tecnológica se refere à habilidade de a tecnologia transcender fronteiras e limites. Nos níveis de representação e recepção do público, no entanto, o nacional continua a ser de grande relevância, e os filmes nacionais da região ainda são muito reconhecidos como tais. A nação como um poder repressivo e autoritário é normalmente contestada; como muitos filmes fazem alusão a questões políticas e injustiças sociais específicas de seus países de origem, e muitas vezes isso é feito de forma indireta para evitar a censura, espectadores precisam de certo nível de conhecimento do contexto para entender os vários significados.


Desse modo, o conceito de nacional parece persistir como uma entidade e um quadro e referência importantes, lado a lado com os conceitos de regional e transnacional à medida que os cineastas do Sudeste Asiático lidam com um posicionamento geopolítico e espacial múltiplo. Esse posicionamento múltiplo é, em geral, característico do cinema dos dias atuais e de seu movimento para além da linha divisória binária local e global, pois estão incrustados em fluxos econômicos e culturais transnacionais e o complexo arcabouço que eles envolvem. Dessa maneira, o cinema transnacional abre um espaço comunicativo que pode ser habitado ao mesmo tempo por espectadores locais e estrangeiros. Nesse estado de espírito, escritores locais sugeriram uma compreensão do cinema independente do Sudeste Asiático como cosmopolita ou cosmopolítico. Conclusão: dos conceitos tradicionais para um vernacular Embora a união de cinema digital (ou outras inovações tecnológicas), alternatividade e formas de independência seja o padrão subjacente aos conceitos cinematográficos discutidos, também mostra como o cinema independente do Sudeste Asiático se relaciona (parcialmente, em alguns casos) com esses conceitos. Ao fazer isso, esse cinema encontra um lugar na história do cinema global, entalhando seu próprio significado com base em outros discursos, retóricas e credos.

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Essas transformações apontam na direção da situação geral do cinema contemporâneo transnacional. Noções como alternatividade, independência e transnacionalismo não podem mais ser paisagens claras, inequívocas, e anti-imperialismo e mercantilismo no seu sentido original não são mais conceitos válidos, pois antigos sistemas binários se tornaram soltos e foram substituídos por campos de força globalizados e mais complexos.

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Várias tendências da teoria e história tradicionais do cinema são utilizadas no discurso, explícita ou implicitamente, e seguidas de forma um tanto informal. Algumas delas, como o cinema independente americano ou a teoria do espectador, funcionam como uma ponta solta de referência; outras são parodiadas, como no exemplo do Dogma. Ainda outras são adotadas parcialmente e de forma negociada, como o Terceiro Cinema, o anti-imperialismo e o transnacionalismo. Em todos os casos, os conceitos preexistentes são modificados a fim de ganhar flexibilidade. Eles não são absorvidos cega e totalmente, mas, em vez disso, adaptados para contextos locais, significados, condições e preocupações, e dessa forma se fazendo úteis para propósitos locais, criando um ramo próprio, vernacular, de discurso cinematográfico.


Panorama: ampliando o escopo da teoria do cinema Pelo fato de combinar diversos aspectos novos do cinema contemporâneo — a era digital, múltiplos quadros espaciais e cinema não ocidental —, o discurso e movimento cinematográficos que retratei aqui apontam na direção de aspectos da teoria de cinema tradicional que precisam ser reconsiderados ou atualizados. Nesse sentido, o fluxo do discurso do Oeste ao Sudeste da Ásia descrito acima mudaria de direção: O que as modificações que os conceitos da teoria tradicional experimentam em outro lugar dizem sobre a situação dos estudos de cinema hoje? Como muitos paradigmas tradicionais dos estudos de cinema partem das epistemologias de base ocidentais, eles atualmente enfrentam delimitações de alcance e adequação. Conforme a dominância do Ocidente como norma representacional e centro epistemológico é desafiado, um novo reposicionamento de sistemas de conhecimento global é necessário. Entre os campos mais contestados estão aqueles baseados nas noções ocidentais de subjetividade, individualidade e percepção, como a teoria do autor, o dispositivo cinematográfico e a psicanálise. O cânone clássico da história do cinema foi criticado por omitir uma grande parte do cinema mundial; a contextualização do filme não ocidental em termos de história, linguagem e cultura é vista normalmente como um aspecto que falta. Assim como abordagens adequadas em relação ao cinema não ocidental. Ao mesmo tempo, a era digital provoca a questão de como o cinema é redefinido em suas práticas de produção, distribuição e exibição assim como em sua estética. Além disso, a ascensão da coprodução leva ao questionamento do conceito de cinema nacional, apoiado por uma maior reflexão acadêmica sobre o conceito de nação como construção ocidental.

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O tópico apresentado neste ensaio sugere diversos desafios ao estudo de cinema moderno. Mais obviamente, investigar o cinema de uma área geopolítica amplamente desconhecida aos estudos de cinema do Ocidente expande o usual cânone de filmes e da teoria com um foco menos eurocêntrico. Como sugere Lúcia Nagib, o cinema mundial entendido dessa forma não é um nicho oposto a Hollywood ou a cinemas ocidentais conhecidos, mas a soma dos cinemas globais com tudo incluído. A maior parte do cinema independente do Sudeste Asiático é produzida e distribuída digitalmente. Isso implica novas estéticas e práticas. Os modos convencionais de produção, distribuição e recepção do público estão se tornando históricos e progressivamente sendo substituídos por novas estruturas industriais, modos de trabalho e práticas de exibição. Além disso, como esse cinema é transnacional, regional e nacional ao mesmo tempo, ele diverge da categoria de nação como entidade única, assim como de outras abordagens que declaram a nação uma categoria obsoleta e sugerem uma mudança de paradigma distinta, substituindo-a completamente pelo transnacionalismo.


Esse discurso de cinema sobre independência, com seus processos de selecionar, refletir e adaptar ou rejeitar conceitos tradicionais, aponta para aspectos desses conceitos que precisam de revisão. Entre eles estão a consideração de estruturas industriais desconhecidas ou recém-formadas como aquelas do Sudeste Asiático; mudanças no modo de fazer cinema, na distribuição e nas práticas de exibição como resultado da tecnologia digital; o posicionamento da área em relação ao circuito de festivais global (e normalmente encabeçado pelo Ocidente). Noções de independência cinematográfica e cinema político previamente moldadas mencionadas na análise, como as do Terceiro Cinema, anti-imperialismo e dispositivo cinematográfico, já não se aplicam totalmente aos recentes desenvolvimentos e se tornaram linhas de pensamento históricas. Com esse objetivo, a transformação por que passam no discurso do Sudeste Asiático é exemplar para as mudanças no estudo de cinema na era do pós-eurocentrismo, da era digital e da “realocação” cinematográfica. Como todos os sistemas de conhecimento, a teoria do cinema não está presa a um lugar, mas viaja e muda. Conforme seus conceitos circulam, seus contextos e significados flutuam e estão sujeitos a processos de mudança e entrelaçamentos. Eles, com isso, entram em um estado de fluidez no qual seus termos e conhecimentos epistemológicos precisam constantemente ser rediscutidos e, assim, encontrar chances de se reconectarem com o presente. Como Lúcia Nagib coloca, “o cinema mundial, como o próprio mundo, é circulação” — assim como o discurso sobre ele.

convidada do Institute of Film Studies da Universidade de Zurique, na Suiça. Sua pesquisa atual se debruça sobre o cinema do sudeste asiático. Seu campo de pesquisa passa por cinema do leste e sudeste asiático, cinema mundial, globalização no cinema e teoria da cultura. Contato: natalieboehler@gmx.net

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Natalie Boehler Natalie Boehler é pesquisadora. Pós-doutora e professora

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A pic h atp o n g W eeraset h akul Entrevista realizada em julho de 2016 pelos curadores Victor Dias e Fabiano de Freitas

Quase vinte anos se passaram desde que seu primeiro longa-metragem, Objeto Misterioso ao Meio-dia, foi lançado. O quanto sua percepção e abordagem em relação ao cinema mudaram? Hoje em dia você se vê como um cineasta diferente?

CINEMA TAILANDÊS

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Vinte anos atrás, eu estava muito confiante no cinema. Na época, eu fazia filmes para experimentar e ver o que o cinema podia oferecer. Era uma relação pessoal. Agora, sinto que não é mais sobre cinema, mas sobre tudo que o cerca: o processo, a luz, a mudança da percepção social das imagens e assim por diante. Acho que não será uma grande questão se eu não fizer outro filme, por exemplo. Como está a situação política na Tailândia atualmente e como isso influencia seu trabalho? Você disse que não filmaria mais no seu país e que seu último filme, Cemitério do Esplendor, nem mesmo seria lançado lá. Por quê? Você pode pesquisar as notícias sobre o governo militar tailandês no Google. Faço filmes relacionados com minha opinião sobre meu ambiente. É um tanto claro que eu não posso fazer um longa lá. É mais complexo do que um curta ou um trabalho de arte devido ao esquema de distribuição.


Hoje, como você percebe a relação das pessoas com o cinema em seu país? A internet e os serviços de streaming desempenharam algum papel em como as pessoas se relacionam com as produções locais? O gosto das pessoas pelo cinema está mudando rápido por causa da internet. Espero que seja bom ter mais opções. Quanto mais rápido o cinema mainstream se torna, mais valor daremos ao nosso tempo. Espero que então ainda tenha gente que aprecie um tipo diferente de tempo nos filmes. Você já esteve no Brasil. Percebeu alguma semelhança com a Tailândia? Gosto do caos que ambos têm. As pessoas são descontraídas e podem ser loucamente irracionais. Por alguma razão, acho que no Brasil as pessoas lidam com a vida e com a liberdade de forma diferente. Na Tailândia nós somos passivos em relação à política. Ou somos forçados a ser passivos pela educação e pelas armas. Por isso quero tentar fazer filmes em outros lugares; para aprender e para refletir. Eternamente sua apresenta uma versão tailandesa de uma música brasileira bem popular, “Samba de Verão”. Como você descobriu essa música e o que o levou a usá-la no filme? Essa versão foi lançada por uma gravadora tailandesa. É obviamente uma música ensolarada para corações inocentes. Há algo de instintivo no processo de desenvolvimento de seus filmes? Quanto desse processo é intelectual e racional e quanto é emocional, irracional?

Eu vejo a homossexualidade como algo lindo e natural. Prefiro não chamar a atenção para essa questão. Entendo que levará um tempo para mudar a cabeça de muitas pessoas sobre o assunto. Ao mesmo tempo, é importante não impor essa opinião aos outros. Essa revelação tem de chegar naturalmente, com simplicidade.

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Seus filmes frequentemente apresentam personagens gays ou transexuais de uma forma bem cotidiana, descontraída. Quão significativo isso é para você e como isso revela o dia a dia da comunidade lgbt na Tailândia?

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CINEMA TAILANDÊS

Estes aspectos vão e voltam em meus filmes e trabalhos artísticos. Tento diariamente ser menos racional, mas para filmar existem algumas regras. Há o enquadramento, às vezes precisa de escuridão, por exemplo. E em breve a tecnologia introduzirá novas regras.


Sua obra é muitas vezes considerada pós-moderna e não narrativa, mas também parece ter uma forte relação com o cinema tailandês mais “clássico”. É isso mesmo? Qual é sua relação com a obra de Ratana Pestonji ou de Chatrichalerm Yukol, por exemplo? Não penso nas referências, mas há dois tipos de cinema tailandês que eu adoro: os filmes de terror e os épicos ainda que, julgando pelo presente, estes possam ser vistos como propaganda. O que você acha da nova geração de cineastas que estreou nos últimos anos? Anocha Suwichakornpong, Nawapol Thamrongrattanarit e Jakrawal Nilthamrong parecem ter sua obra como grande influência para o trabalho deles. Nós nos conhecemos e compartilhamos o sentimento de fazer algo diferente na comunidade cinematográfica local. Há outras pessoas que em breve vocês conhecerão, como Sompot Chidgasornpongse e Taiki Saiprasit. O que o cinema representa na sua vida? Por que você continua fazendo? É sobre viver e querer continuar vivendo. É um testamento.

CINEMA TAILANDÊS

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P en-ek R atanaruan g Entrevista realizada em julho de 2016 pelos curadores Victor Dias e Fabiano de Freitas

Você faz filmes há quase vinte anos. O que o cinema tailandês mudou desde então? A internet e os serviços de streaming desempenharam algum papel na forma como as pessoas se relacionam com as produções locais?

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CINEMA TAILANDÊS

O cinema tailandês mudou imensamente desde que comecei. Naqueles tempos, cada filme, fosse um filme pessoal ou um mainstream, era lançado do mesmo jeito ou não era lançado. Hoje em dia, cada filme tem sua própria forma de distribuição e promoção graças a internet, Facebook, Instagram etc. Os equipamentos também ficaram muito, mas muito mais baratos. Então, mais pessoas têm acesso à produção cinematográfica profissional. Atualmente, filmes de arte do mundo inteiro conseguem um lançamento aqui nos cinemas de Bangkok. E filmes tailandeses são lançados em todo o mundo também. Há vinte anos, você não estaria fazendo esta entrevista com um diretor tailandês porque você não teria qualquer ideia sobre como era o cinema tailandês. Eu diria que os filmes tailandeses estão mais integrados no cinema mundial. E nossos filmes se tornaram mais sofisticados. O streaming de filmes recém-lançados ainda não é tão popular quanto nos Estados Unidos ou na Europa, você ainda tem de esperar que a pessoa vá ao cinema ver seus filmes no primeiro fim de semana. Mas a situação é muito melhor do que vinte anos atrás.


Olhando para trás, como você vê Transistor Monrak hoje? Você acha que, como cineasta, mudou ou evoluiu?

Transistor Monrak era de um tempo em que eu sentia que sabia como fazer um filme. É considerado um dos clássicos do cinema tailandês. Eu não o assisto faz muito tempo para realmente saber se ele se sustenta hoje. Mas, como um cineasta, eu definitivamente evoluí. Embora não saiba se para melhor ou para pior. Devo dizer que meus filmes depois de Transistor Monrak se tornaram mais reflexivos e carregam um ritmo mais lento. Podem ter se tornado talvez menos “engraçados” de assistir, mas se tornaram mais memoráveis, eu acho. Na sua opinião, qual o papel do cinema no mundo atualmente? Ele mudou desde que você lançou Fun Bar Karaoke em 1997? Acho que o papel do cinema na vida das pessoas mudou desde 1997. Bons filmes ainda tocam pessoas de um jeito que outras artes não conseguem. Cinema é como vinho para mim. Alguns anos você tem uma safra excelente, e em outros você tem uma safra mais ou menos. Como está a situação política na Tailândia atualmente e como isso influencia seu trabalho e a produção cinematográfica tailandesa em geral?

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A situação política na Tailândia hoje em dia é frustrante, para dizer o mínimo. Essa mentalidade militar de extrema direita é muito prejudicial à comunidade criativa. Como artista, seu trabalho sempre tenta carregar algum tipo de reflexão para sua própria sociedade, quer você pretenda isso ou não. E seu trabalho sempre tenta criticar qualquer establishment. Quando esse direito é restrito, por lei, torna sua existência inútil. E é muito frustrante. Ultimamente, só tenho cuidado do meu cachorro, das minhas plantas, janto com amigos e vou às compras e à praia, porque não posso fazer nada que seja político. É uma existência muito amena e vazia. A violência é um elemento constante em seus filmes. Que papel isso exerce no seu trabalho e como isso se relaciona com a sociedade tailandesa? A violência e as pessoas do submundo estão sempre em meus filmes porque minha vida real é muito entediante. Então, essas coisas mais obscuras me fascinam. E acho que esses elementos são muito cinematográficos.


Nos seus últimos filmes os protagonistas passaram a ser do sexo feminino. Por quê? Como você percebe a representatividade feminina na Tailândia hoje? A maioria dos meus longas-metragens tem protagonistas femininas. Fun Bar Karaoke, 6ixty 9ine, Ploy, Nymph, todos têm protagonistas femininas. Tenho interesse em mulheres. Tenho mais interesse na vida de mulheres do que na de homens. Acho que mulheres são mais flexíveis, têm a cabeça mais aberta, são mais resilientes e geralmente mais inteligentes que os homens. Elas simplesmente parecem ter mais profundidade. Quase todos os homens na minha vida são amigos, mas as mulheres são professoras e inspiração. As mulheres tailandesas foram criadas para parecerem indefesas e inocentes por décadas. Foi ensinado a elas que, se parecessem competentes ou inteligentes, nenhum homem tailandês gostaria delas. Elas ficariam solteiras para o resto de suas vidas. Então elas desempenham esse papel. É tão perverso e inteligente. É menos assim hoje, mas nem tanto. Seus filmes podem ser considerados muito modernos, até mesmo pós-modernos. Mas como você se relaciona com o cinema tailandês mais “clássico”? O cinema de Ratana Pestonji ou Chatrichalerm Yukol, por exemplo? Você mencionou Seda Negra como uma grande influência Eu amo o cinema clássico. A maior parte dos filmes que eu amo é de Hollywood da década de 1970, especialmente os filmes de Sidney Lumet. Rede de Intrigas, Um Dia de Cão Afternoon, O Poderoso Chefão, Terra de Ninguém, Manhattan, Perdidos na Noite etc. É o tipo de cinema que acredita totalmente em boas histórias, bons roteiros, boas performances em primeiro lugar. E os filmes iniciais de Ratana Pestonji ou de Chatrichalerm Yukol são assim. Seda Negra é um filme tão ousado e bonito de se assistir. A maioria dos filmes de Ratana Pestonji é ousada e bonita.

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Definitivamente, eles estão mais em sintonia com a vibração da geração jovem do que eu. Com certeza. Todos os três cineastas que você mencionou são meus amigos. Tentamos ajudar e apoiar uns aos outros tanto quanto podemos. No entanto, Anocha e Jakrawal não tiveram oportunidades suficientes de fazer filmes para se tornarem mais próximos do seu trabalho. Nawapol, por outro lado, se tornou um dos mais populares cineastas da Tailândia hoje. É muito versátil, na minha opinião.

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O que você acha da nova geração de cineastas que estreou nos últimos anos? Você tem contato com as obras de cineastas como Anocha Suwichakornpong, Nawapol Thamrongrattanarit e Jakrawal Nilthamrong?


Nós achamos que há muitas semelhanças entre a Tailândia e o Brasil. Você teve contato com produções cinematográficas brasileiras? Não, não tenho nenhum contato com a indústria cinematográfica brasileira. O único filme brasileiro que eu me lembro de ter assistido é Central do Brasil, muito, muito tempo atrás. Não vi nem mesmo Cidade de Deus. Minha ligação pessoal com o Brasil foi com o mundo do futebol. Quando eu era muito jovem, Pelé veio abrir uma escolinha de futebol em Bangkok e eu fiquei cinco dias na escolinha com ele. Pelé talvez tenha sido o primeiro herói da minha vida. Ver o que aconteceu à seleção brasileira na última Copa do Mundo e na Copa América deste ano é de partir o coração. Qual o papel do cinema na sua vida? Por que você continua fazendo cinema? Cada vez que consigo fazer um novo filme, fico muito feliz. Cinema é onde tudo que eu amo se junta: fotografia, contação de histórias, pessoas, arquitetura, música. Mas eu nunca pensei sobre o papel do cinema na minha vida. Continuo fazendo filmes principalmente por duas razões: uma é que ainda não fiz um filme que eu possa dizer que me deixou completamente feliz. Sempre há algo errado quando olho para os filmes terminados. Eu sempre fico um pouco longe das minhas expectativas. Tenho orgulho deles, mas nunca fico inteiramente feliz com eles. Mantenho a esperança de que o próximo será melhor e sigo em frente. A segunda razão é que, apesar dos resultados insatisfatórios, algumas pessoas ainda me dão oportunidades para continuar fazendo-os. E sou muito grato. Um dia, quando isso tiver um fim, porque vai ter, eu ficarei triste.

CINEMA TAILANDÊS

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CINEMA TAILANDÊS

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CINEMA TAILANDÊS

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PRO GRA MA ÇÃO

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12 12 24 24 JULHO JULHO 12JUL TERÇA-FEIRA 16H

F R E E L A N C E: A T A Q U E D O C O R A Ç ÃO

19H

TRANSISTOR MONRAK

13JUL QUARTA-FEIRA

19H

A s D amas de Ferr o

16JUL SÁBADO 16H15

S eda N e g ra

18H

O C idad ã o

18H45

PONTO DE FUGA

18H30

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P eri g o em Ban g k o k

T o n g pan

16H

CINEMA TAILANDÊS

17H

17H

14JUL QUINTA-FEIRA

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15JUL SEXTA-FEIRA

P ara S empre S eu S eda N e g ra

17JUL DOMINGO 17H10

Hist ó ria M undana

19H

P eri g o em Ban g k o k


22JUL SEXTA-FEIRA 16H 18H30

A s D amas de Ferr o

19H

S índr o mes e U m S écul o

20JUL QUARTA-FEIRA 17H

P o nt o de Fu g a

19H

Híst o ria M undana

21JUL QUINTA-FEIRA 17H

19H30

T i o B o o nmee, Que P o de R ec o rdar S uas Vidas P assadas T o n g pan

23JUL SÁBADO 14H50

S índr o mes e U m S écul o

17H

T i o B o o nmee, Que P o de R ec o rdar S uas Vidas P assadas

19H30

D E B A T E: O C inema T ailandês na C o ntemp o raneidade

24JUL DOMINGO 16H 18H20

O C I D A D ÃO F R E E L A N C E: A T A Q U E D O C O R A Ç ÃO

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17H

P ara S empre S eu

CINEMA TAILANDÊS

19JUL TERÇA-FEIRA

TRANSISTOR MONRAK


ชั่วฟ้าดินสลาย

PARA SEMPRE SEU Forever Yours

1955 / DIGITAL / 112 MINUTOS / 10 ANOS PAÍS TAILÂNDIA PRODUÇÃO RATANA PESTONJI DISTRIBUIDORA THAI FILM FOUNDATION

CINEMA TAILANDÊS

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YUPADEE, UMA MULHER CASADA COM UM HOMEM MAIS VELHO, RICO E PODEROSO DA PROVÍNCIA KAMPANGPETCH, SE APAIXONA POR SANG-MONG. Apesar da paixão proibida, os dois acreditam que seu amor poderá durar para sempre. Baseado no romance clássico tailandês Riam-Eang.

DIREÇÃO KHRU MARUT ROTEIRO TAWEE NA BANGCHANG | VICHIT KOUNAVUDHI ELENCO PRAJUAB REUK-YAMDEE | CHANA PRAJUAB | REUK-YAMDEE | CHANA SRI-UBON | HEM SUKASEM | NGAMTA SUPHAPHONGS FOTOGRAFIA RASTANA PESTONJI


แพรดำ�

SEDA NEGRA Black Silk

1961 / DIGITAL / 129 MINUTOS / 12 ANOS

DIREÇÃO RATANA PESTONJI | RATANAVADI RATANABHAND

PAÍS TAILÂNDIA PRODUÇÃO HANUMAN FILM

ROTEIRO RATANA PESTONJI

DISTRIBUIDORA THAI FILM FOUNDATION

ELENCO RATANAVADI RATANABHAND | SARINTHIP SIRIWAN | SENEE WISANEESARN | TOM WISAWACHART FOTOGRAFIA EDWUN PESTONJII | RATANA PESTONJI | TOM WISAWACHART MONTAGEM RATANA PESTONJI MÚSICA PRICHA METARAI PRÊMIOS > BERLIN INTERNATIONAL FILM FESTIVAL >

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URSO DE OURO [INDICADO]

CINEMA TAILANDÊS

SENI É DONO DE UM CLUBE NOTURNO E SOFRE PRESSÃO DE SEU RIVAL, WAN, POR CONTA DE UM EMPRÉSTIMO PENDENTE. Para fugir da situação, assume a identidade de Sema, seu irmão desaparecido – e já morto. Em meio a jogos mafiosos, paixões furtivas e fugas, podem haver consequências desastrosas.


ทองปาน

TONGPAN Tongpan

1977 / DIGITAL / 63 MINUTOS / 10 ANOS PAÍS TAILÂNDIA PRODUÇÃO THE ASIAN FILM GROUP DISTRIBUIDORA GREEN TV

CINEMA TAILANDÊS

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O DOCUMENTÁRIO NARRA A VIDA DO POBRE FAZENDEIRO TONGPAN, QUE PERDEU SUAS TERRAS POR CONTA DE UMA BARRAGEM E LUTA PARA SOBREVIVER. Por causa da mensagem socialista do filme e da suposta ligação com o comunismo, o documentário foi banido pelo governo na época de seu lançamento.

DIRETOR EUTHANA MUKDASANIT ROTEIRO KHAMSING SRINAWK | PAIJONG LAISAGOON | MIKE MORROW ELENCO ONG-ART PONETHON | PETER BELL | SURACHAI CHANTIMATORN FOTOGRAFIA FRANK GREEN


ทองพูน โคกโพ ราษฎรเต็มขั้น

O CIDADÃO Taxi Driver (Citizen I)

1977 / DIGITAL / 124 MINUTOS / 10 ANOS PAÍS TAILÂNDIA PRODUÇÃO CHATRICHALERM YUKOL DISTRIBUIDORA FIVE STAR DIREÇÃO CHATRICHALERM YUKOL ROTEIRO CHATRICHALERM YUKOL ELENCO PINYO PARNNUI | JATUPHOL POOPIROM | WIYADA UMARIN FOTOGRAFIA CHATRICHALERM YUKOL

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MONTAGEM CHATRICHALERM YUKOL

CINEMA TAILANDÊS

TONG-POON SAIU DO NORDESTE DA TAILÂNDIA NO SEU TÁXI, COMPRADO COM DINHEIRO DA VENDA DE SUA FAZENDA. Ao chegar em Bangkok seu carro é roubado por uma gangue e ele parte à procura de seu único bem. Inspirado no clássico do neo-realismo italiano, Ladrões de Bicicletas (1948).


บางกอกแดนเจอรัส เพชฌฆาตเงียบ อันตราย

PERIGO EM BANGKOK Bangkok Dangerous

2000 / DIGITAL / 105 MINUTOS / 10 ANOS PAÍS TAILÂNDIA PRODUÇÃO FILM BANGKOK | PANG BROS DISTRIBUIDORA FORTISSIMO FILMS

CINEMA TAILANDÊS

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UM ASSASSINO SURDO, SEU PARCEIRO E A NAMORADA, UMA STRIPPER DE UM CLUBE LOCAL, VIVEM EM BANGKOK ENVOLVIDOS COM ASSASSINATOS POR ENCOMENDA, até que o chefe cresce na hierarquia da máfia e forma novas alianças. O matador conhece uma inocente farmacêutica; uma traição acontece; e começa a caça sanguinária pelo submundo de Bangkok.

PRÊMIOS > ROTTERDAM INTERNATIONAL FILM FESTIVAL > TIGER AWARD [INDICADO] > THAILAND NATIONAL FILM ASSOCIATION > [VENCEDOR] > MELHOR ATOR | MELHOR ATRIZ COADJUVANTE [INDICADO] > MELHOR DIRETOR | MELHOR MONTAGEM | MELHOR FOTOGRAFIA > TORONTO INTERNATIONAL FILM FESTIVAL > PRÊMIO INTERNACIONAL DA CRÍTICA [VENCEDOR]

DIREÇÃO DANNY PANG | OXIDE PANG

FOTOGRAFIA DECHA SRIMANTRA

ROTEIRO DANNY PANG | OXIDE PANG

MONTAGEM DANNY PANG | OXIDE PANG

ELENCO PAWARITH MONKOLPISIT |

MÚSICA ORANGE MUSIC

PREMSINEE RATANASOPHA | PATHAWARIN TIMKUL


สตรีเหล็ก

AS DAMAS DE FERRO The Iron Ladies

2000 / DIGITAL / 104 MINUTOS / LIVRE

PRÊMIOS

PAÍS TAILÂNDIA PRODUÇÃO TAI ENTERTAINMENT

> BERLIN INTERNATIONAL FILM FESTIVAL >

DISTRIBUIDORA CHOAKCHAI CHAWYAWATTO

READER JURY OF THE “SIEGESSÄULE” | MENÇÃO ESPECIAL > FESTIVAL INTERNACIONAL DE BUENOS AIRES DO CINEMA INDEPENDENTE > MELHOR FILME [INDICADO] > DALLAS OUT TAKES > MELHOR PRODUÇÃO [VENCEDOR] | OUTSTANDING CAST ENSEMBLE [INDICADO] > DUBLIN GAY AND LESBIAN FILM FESTIVAL > PRÊMIO DA AUDIÊNCIA PARA MELHOR FILME [VENCEDOR] MELHOR FILME DE LONGA-METRAGEM [VENCEDOR] > POLITICAL FILM SOCIETY (EUA) > PSF AWARD [INDICADO] > SAN FRANCISCO LESBIAN & GAY FILM FESTIVAL > PRÊMIO DA AUDIÊNCIA | MELHOR FILME LONGA-METRAGEM > THAILAND FILM AND ASSOCIATION AWARD >

DIREÇÃO YONGYOOT THONGKONGTOON

[VENCEDOR] > MELHOR ATOR COADJUVANTE |

ROTEIRO VISUTTCHAI BOONYAKARNJAWA |

MELHOR MAQUIAGEM

JIRA MALIGOOL | YONGYOOT THONGKONGTOON

> TORONTO INTERNATIONAL FILM FESTIVAL >

ELENCO JESDAPORN PHOLDEE | SAHAPHAP TOR

PRÊMIO REVELAÇÃO [SEGUNDO COLOCADO]

| EKACHAI BURANAPANIT | GIORGIO MAIOCCHI | CHAICHARN NIMPULSAWASDI FOTOGRAFIA JIRA MALIGOOL MONTAGEM SUNIJ ASAVINIKUL

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> NEW YORK LESBIAN AND GAY FILME FESTIVAL >

CINEMA TAILANDÊS

BASEADO EM FATOS REAIS, O FILME NARRA A HISTÓRIA DE UMA EQUIPE DE VÔLEI COMPOSTA DE ATLETAS GAYS E TRANSGÊNEROS. Com a chegada de uma nova treinadora, lésbica, eles se preparam para disputar o campeonato nacional.


มนต์รักทรานซิสเตอร์

TRANSISTOR MONRAK Monrak Transistor

2002 / DIGITAL / 129 MINUTOS / 14 ANOS

PRÊMIOS

PAÍS TAILÂNDIA PRODUÇÃO CINEMASIA

> ASIA PACIFIC FILM FESTIVAL >

DISTRIBUIDORA FIVE STAR

[VENCEDOR] > MELHOR ATOR | MELHOR SOM > SEATTLE INTERNATIONAL FILM FESTIVAL >

PHAEN É UM JOVEM DO SUBÚRBIO APAIXONADO POR MÚSICA E QUE SONHA COM A FAMA, mas seu casamento, o serviço militar e as exigências de sua família insistem em afastá-lo de seus sonhos.

ASIAN TRADE WINDS AWARD > THAILAND INTERNATIONAL FILM FESTIVAL > [VENCEDOR] > MELHOR PRODUÇÃO | MELHOR ROTEIRO | MELHOR ATRIZ | [INDICADOS] >MELHOR ATOR | MELHOR DIRETOR > VIENALLE > READ JURY “STANDARD”

CINEMA TAILANDÊS

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104 104

DIREÇÃO PEN-EK RATANARUANG

FOTOGRAFIA CHANKIT CHAMNIWIKAIPONG

ROTEIRO PEN-EK RATANARUANG | WAT WANLAYANGKOON

MONTAGEM PATAMANADDA YUKOL

ELENCO SUPAKORN KITSUWON |

MÚSICA AMORNBHONG METHAKUNAYUDH | CHATCHAI

SIRIYAKORN PUKKAVESH | BLACK PHOMTONG

PONGPRAPAPHAN | SURAPHOL SOMBATCHAROEN


แสงศตวรรษ

SÍNDROMES E UM SÉCULO Syndromes and a Century

2006 / DIGITAL / 105 MINUTOS / 10 ANOS

PRÊMIOS

PAÍS TAILÂNDIA | FRANÇA | ÁUSTRIA

> FESTIVAL DE VENEZA >

PRODUÇÃO ANNA SANDERS FILMS | BACKUP FILMS

LEÃO DE OURO [INDICADO]

DISTRIBUIDORA FORTISSIMO FILMS

> ASIAN FILM AWARDS > MELHOR MONTAGEM [VENCEDOR] | [INDICADO] > MELHOR FOTOGRAFIA | MELHOR DIRETOR > CHICAGO FILM FESTIVAL > MELHOR PRODUÇÃO [INDICADO] > CINEMANILA INTERNATIONAL FILM FESTIVAL > > FRIBOURG INTERNATIONAL FILM FESTIVAL > [INDICADO] > MENÇÃO HONROSA DO JÚRI INTERNACIONAL | GRAND PRIX > INDIEWIRE CRITICS’POLL > 4º LUGAR ICP AWARD

DIREÇÃO APICHATPONG WEERASETHAKUL

FOTOGRAFIA SAYOMBHU MUKDEEPROM

ROTEIRO APICHATPONG WEERASETHAKUL

MONTAGEM LEE CHATAMETIKOOL

ELENCO NANTARAT SAWADDIKUL | JARUCHAI IAMARAN |

MÚSICA KANTEE ANANTAGANT

SOPHON PUKANO | JENJIRA PONGPAS

105 105

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MELHOR PRODUÇÃO DO SUDESTE ASIÁTICO [INDICADO]

CINEMA TAILANDÊS

A HISTÓRIA DOS PAIS DO DIRETOR APICHATPONG WEERASETHAKUL, ambos médicos, e as memórias do próprio diretor sobre seu crescimento num ambiente hospitalar.


เจ้านกกระจอก์

HISTÓRIA MUNDANA Mundane History

2009 / BLUE-RAY / 82 MINUTOS / 10 ANOS

PRÊMIOS

PAÍS TAILÂNDIA PRODUÇÃO ELECTRIC EL FILMS

> ROTTERDAM INTERNATIONAL FILM FESTIVAL >

DISTRIBUIDORA ELECTRIC EL FILMS

TIGER AWARD [VENCEDOR] > BOMBAY INTERNATIONAL FILM FESTIVAL >

CINEMA TAILANDÊS

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O JOVEM AKE E SEU PAI VIVEM SOZINHOS EM UMA GRANDE CASA, CERCADOS DE EMPREGADOS. AKE NÃO PODE SE LOCOMOVER E PASSA OS DIAS TRANCADO NO QUARTO. A chegada do enfermeiro Pun desestabiliza o cotidiano na residência. Primeiro filme da diretora Anocha Suwichakornpong e vencedor do Tigre de Ouro no Festival de Roterdã.

MELHOR DIRETOR [VENCEDOR]| GOLDEN GATWAY [INDICADO] > CAMERIMAGE > MELHOR FOTÓGRAFO ESTREANTE [INDICADO] > GOLDEN HORSE FILM FESTIVAL > NETPAC AWARD [VENCEDOR] > JOGJA-NETPAC ASIAN FILM FESTIVAL > GOLDEN HANOMAN AWARD [INDICADO] > PULSAN INTERNATIONAL FILM FESTIVAL > PRÊMIO NOVAS TENDÊNCIAS > THAILAND NATIONAL FILM ASSOCIATION AWARD > MELHOR DIRETOR DE ARTE [INDICADO] > TRANSILVANIA INTERNATIONAL FILM FESTIVAL >

DIREÇÃO ANOCHA SUWICHAKORNPONG ROTEIRO ANOCHA SUWICHAKORNPONG ELENCO ARKANEY CHERKAM | PARAMEJ NOIAM | PHAKPOOM SURAPONGSANURUK FOTOGRAFIA MING-KAI LEUNG MONTAGEM LEE CHATAMETIKOOL

[VENCEDOR] > TRANSILVANIA TROPHY | MELHOR FILME


ลุงบุญมีระลึกชาติ

TIO BOONMEE, QUE PODE RECORDAR VIDAS PASSADAS

Uncle Boonmee Who Can Recall His Past Lives

2010 / DIGITAL / 114 MINUTOS / 10 ANOS

PRÊMIOS

PAÍS TAILÂNDIA | REINO UNIDO | FRANÇA | ALEMANHA|

> CANNES FILM FESTIVAL > PALMA DE OURO [VENCEDOR]

ESPANHA | HOLANDA PRODUÇÃO KICK THE MACHINE

> ASIAN FILM AWARDS > MELHOR FILME [VENCEDOR]

DISTRIBUIDORA FILMES DA MOSTRA

> CHICAGO FILM CRITICS ASSOCIATION AWARDS > MELHOR FILME ESTRANGEIRO [VENCEDOR] > CHICAGO INTERNATIONAL FILME FESTIVAL > [VENCEDOR] > SILVER PLAQUE | COMPETIÇÃO INTERNACIONAL DE POSTÊRES DE FILMES > RIVERRUN INTERNATIONAL FILM FESTIVAL > PETER BRUNETTE AWARD DE MELHOR DIRETOR > SYDNEY FILM FESTIVAL > MELHOR FILME [INDICADO] > TORONTO FILM CRITICS ASSOCIATION AWARDS > MELHOR FILME DE LÍNGUA ESTRANGEIRA [VENCEDOR] | MELHOR PRODUÇÃO [INDICADO]

DIREÇÃO APICHATPONG WEERASETHAKUL

FOTOGRAFIA SAYOMBHU MUKDEEPROM

ROTEIRO APICHATPONG WEERASETHAKUL

MONTAGEM LEE CHATAMETIKOOL

ELENCO THANAPAT SAISAYMAR |

MÚSICA CHONLATAT CHALODHORN |

THANAPAT SAISAYMAR | SAKDA KAEWBUADEE

THOM AJ. MADSON | ADISAK POUNG OK

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[VENCEDOR] > PRÊMIO DO JURI |

CINEMA TAILANDÊS

SOFRENDO DE INSUFICIÊNCIA RENAL, BOONMEE RESOLVEU PASSAR OS ÚLTIMOS DIAS DE SUA VIDA RECOLHIDO EM UMA CASA PERTO DA FLORESTA, AO LADO DE ENTES QUERIDOS. Durante um jantar com a família, ele recebe duas visitas inesperadas que vão ajudá-lo em sua jornada final.


วานิชชิ่ง พอยท์

PONTO DE FUGA Vanishing Point

2015 / BLUE-RAY / 100 MINUTOS / 14 ANOS

PRÊMIOS

PAÍS TAILÂNDIA | HOLANDA

> ROTTERDAM INTERNATIONAL FILM FESTIVAL >

PRODUÇÃO MIT OUT SOUND FILMS

TIGER AWARD [VENCEDOR]

DISTRIBUIDORA DIVERSION

> HONG KONG INTERNATIONAL FILM FESTIVAL > [INDICADO] > FIPRESCI PRIZE (INDICADO) |

CINEMA TAILANDÊS

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A HISTÓRIA DE DOIS HOMENS TOTALMENTE DIFERENTES, UM TERRÍVEL ACIDENTE DE CARRO E UM CRIME COMETIDO NUMA FLORESTA LONGÍNQUA. Vários fatos apresentados de forma encadeada, mas as peças deste quebra-cabeça não vão tomar um caminho lógico.

GOLDEN FIREBIRD AWARD | CINEMA JOVEM > LIONS FILM AWARD [INDICADO] > NETPAC AWARD [INDICADO] > T-MOBILE NEW HORIZONS INTERNATIONAL FILM FESTIVAL – POLÔNIA > [INDICADO] > GRAND PRIX | COMPETIÇÃO INTERNACIONAL > TAIPEI FILM FESTIVAL > COMPETIÇÃO INTERNACIONAL DE NOVOS TALENTOS [INDICADO]

DIREÇÃO JAKRAWAL NILTHAMRONG

FOTOGRAFIA PHUTTIPHONG AROONPHENG

ROTEIRO JAKRAWAL NILTHAMRONG

MONTAGEM JAKRAWAL NILTHAMRONG

ELENCO ONGART CHEAMCHAROENPORNKUL | DRUNPHOB

MÚSICA PAKORN MUSIKABOONLERT

SURIYAWONG | CHALEE CHOUEYAI | SUVEERAYA THONGMEE


ฟรีแลนซ์.. ห้ามป่วย ห้าม พัก ห้ามรักหมอ

FREELANCE: ATAQUE DO CORAÇÃO Heart Attack

2015 / BLUE-RAY / 130 MINUTOS / 14 ANOS

PRÊMIOS

PAÍS TAILÂNDIA

> OSAKA ASIAN FILM FESTIVAL >

PRODUÇÃO GTH | JORKWANG FILMS CO

ABC AWARD [VENCEDOR] | GRAND PRIX [INDICADO]

DISTRIBUIDORA GTH

> THAILAND NATIONAL FILM ASSOCIATION AWARDS > [VENCEDOR] > MELHOR PRODUÇÃO | MELHOR ATOR | MELHOR ATRIZ | MELHOR ATRIZ COADJUVANTE | MELHOR DIRETOR | MELHOR ROTEIRO | MELHOR TRILHA SONORA [INDICADO] > MELHOR ATOR COADJUVANTE | MELHOR EDIÇÃO | MELHOR FOTOGRAFIA | MELHOR SOM | MELHOR MAQUIAGEM

DIREÇÃO NAWAPOL THAMRONGRATTANARIT

FOTOGRAFIA NIRAMON ROSS

ROTEIRO NAWAPOL THAMRONGRATTANARIT

MONTAGEM CHONLASIT UPANIGKIT

ELENCO SUNNY SUWANMETHANON | DAVIKA HORNE | VIOLETTE WAUTIER

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MELHOR DIREÇÃO DE ARTE | MELHOR FIGURINO |

CINEMA TAILANDÊS

UM DESIGNER FREELANCER AFICIONADO POR TRABALHO SE APAIXONA POR SUA MÉDICA. Enquanto sua vida piora a cada segundo, ele precisa encontrar um modo de alterar o seu destino para além de tudo que construiu.


CINEMA TAILANDÊS

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ESTE LIVRO FOI IMPRESSO PELA GRÁFICA STAMPPA LTDA NO FORMATO 180 x 250 mm. MIOLO PB: 104 PÁG. EM OFFSET 120g/m2 | 1/1 CORES. MIOLO CORES: 16 PÁG. EM COUCHÊ MATTE 120 g/m2 |4/4 CORES. CAPA A CORES EM DUODESIGN 300/m2 | 4/4 CORES.


CINEMA TAILANDÊS

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