Da Contorno até a Colina. em CORES
FABRICIO BRANCO
desenho de CarybĂŠ
DA CONTORNO ATÉ A COLINA. A Bahia é provida de uma riqueza cultural extraordinária e a Lavagem do Bomfim é um evento onde ela aflora radiante e eclética, transbordando através do povo que comparece e toma as ruas do Comércio até a Colina do Sagrada. Pelo trajeto é notável a energia que emana. A cada esquina a mistura de raças e cultos, classes e gerações, transformam um dia sob o sol escaldante num filme da vida real, onde cada um assume seu papel intrínseco, sagrado e profano, neste fantástico cenário que é a maior festa de largo de Salvador. As pessoas estão preferencialmente de branco, como a tradição exige. Tem de vir em paz, com a alma limpa. Todos seguem a mesma direção. A caminhada inspira, revela. Ora assumo um olhar investigativo, totalmente dirigido por instinto, ora me deixo levar como protagonista da minha própria experiência, imerso na folia. Há música em todo lugar, muita algazarra, batucadas, carrinhos de café supersônicos, fanfarras, charretes, dj’s, astros misturados à toda toda gente comum. Uma caixa de som na laje, um cercadinho e uma coreografia ensaiada. Na mala do carro, sistema de som alerta, pagodão carcumendo no centro, axé, samba de raiz. Eu quero é Rock. Tem também. Eletric sound system. É o CD do Baiana tocando no Bar do Reggae. A gastronomia é para dar energia para a caminhada e o cardápio vai desde o meninico à feijoada. Para começar, uma lambreta no Mercado Modelo e a batida de tamarindo geladinha, como aperitivo para iniciar os trabalhos. Um abará com pimenta e camarão mais à frente, no Mercado do Ouro. Na barraca dessa menina tem coração de galinha com camarão seco. Espetinho ali, acolá e mais adiante. O que não falta é filé miau legítimo. Uma banana real pra destrair os dentes. Quebra queixo, cocada e arroz doce. Tssssssssss. Abro outra latinha. Skol, Schin ou Itaipava. Quando aparece uma Heineken, é 5 conto a lata. E as cores se tornaram super acesas, é um laranja de furar o olho, um verde que avemaria e o amarelo desce redondo. Salve o Senhor do Bomfim da Bahia! Dedico a quem tem Fé.
O registro fotojornalístico deste editorial, é resultado da compilacão de imagens produzidas durante a Lavagem do Bomfim • Salvador, Bahia • janeiro de 2017.
GLÓRIA A TI NESTE DIA D GLÓRIA A TI REDENTOR QU NOSSOS PAIS CONDUZISTE PELOS MARES E CAMPOS BA DESSA SAGRADA COLINA MANSÃO DA MISERICÓRDIA DAI-NOS A GRAÇA DIVINA DA JUSTIÇA E DA CONCÓRD GLÓRIA A TI NESSA ALTUR ÉS O ETERNO FAROL, ÉS O ÉS, SENHOR, SENTINELA A ÉS A GUARDA IMORTAL DA DESSA SAGRADA COLINA MANSÃO DA MISERICÓRDIA DAI-NOS A GRAÇA DIVINA DA JUSTIÇA E DA CONCÓRD AOS TEUS PÉS QUE NOS DE AOS TEUS PÉS QUE NOS DE TRATA E EXULTA NUM FÉR A ALMA EM FESTA DA TUA DESTA SAGRADA COLINA MANSÃO DA MISERICÓRDIA DAI-NOS A GRAÇA DIVINA DA JUSTIÇA E DA CONCÓRD
DE GLÓRIA UE HÁ CEM ANOS À VITÓRIA AIANOS
A A DIA RA SAGRADA GUIA AVANÇADA A BAHIA.
A A DIA ESTE O DIREITO ESTE A VERDADE RVIDO PREITO A CIDADE
A A DIA.
A devoção ao Senhor do Bonfim foi introduzida no Brasil no século XVIII por um capitão português que tinha realizado uma promessa caso sobrevivesse a uma tempestade no mar.
O
culto ao Senhor do Bonfim foi trazido para o Brasil em meados do século XVIII. Essa devoção foi introduzida no país por Theodósio Rodrigues de Faria, capitão de mar e guerra da Marinha portuguesa que chegou a ocupar cargos na administração colonial. Theodósio era dono de três navios negreiros, que traziam escravos da África Ocidental para o Brasil. Durante uma tempestade marítima, Theodósio prometeu que, caso sobrevivesse, faria um esforço e traria, pessoalmente, uma imagem do Senhor do Bonfim e da Nossa Senhora da Guia para o Brasil. Quando Theodósio trouxe a imagem do Senhor do Bonfim para Salvador, ele e outros devotos tentaram criar uma irmandade oficial com o objetivo de promover culturalmente a devoção ao Senhor do Bonfim. Essa irmandade teria a função de cuidar do templo construído ao Senhor do Bonfim e da realização da festa. No entanto, a criação dessa irmandade não foi autorizada. Depois que o Senhor do Bonfim foi introduzido no Brasil, sua devoção tornouse bastante popular em Salvador. Com o passar do tempo, esse culto foi sendo incrementado por novas tradições, como a prática da lavagem da escadaria e o uso das fitas como amuletos. O padroeiro oficial de Salvador é São Francisco Xavier, logo, Senhor do Bonfim é considerado o padroeiro não oficial da cidade.
A construção da Igreja do Bonfim iniciou-se logo depois que Theodósio trouxe as imagens do Senhor do Bonfim e da Nossa Senhora da Guia para o Brasil, em 18 de abril de 1745. A imagem do Senhor do Bonfim era uma réplica daquela que estava em Setúbal, cidade natal de Theodósio. Enquanto o templo estava em construção, as imagens foram depositadas na Capela da Penha. Como local para a construção da igreja foi escolhida uma colina que ficava em uma propriedade chamada Alto do Mont Serrat. Com o tempo, essa colina passou a ser conhecida como Colina do Bonfim. Em 1754, as obras internas da Igreja do Bonfim ficaram prontas. No dia 24 de junho daquele ano, aproveitando os festejos juninos, a imagem do Senhor do Bonfim foi transferida, em uma procissão, da Capela da Penha para a Colina do Bonfim. As obras da igreja encerraram-se em 1772, quando as torres da Igreja do Bonfim foram finalizadas.
O OPAXORÔ
A JAGUATIRICA
Uma das tradições mais conhecidas da Festa do Bonfim é o ato de presentear uma pessoa com uma fita do Senhor do Bonfim. A fita é um amuleto muito conhecido dessa devoção e, de acordo com a tradição, deve ser colocada no pulso de uma pessoa. Cada fita deve conter nós, que simbolizam um pedido feito silenciosamente ao Senhor. Em geral, cada fita amarrada no pulso contém três nós. Acredita-se que os pedidos serão atendidos quando a fita se romper. Esse costume começou a fazer parte da tradição do Senhor do Bonfim em 1809 e foi uma ideia de Manoel Antônio da Silva Servo, tesoureiro da devoção que procurava uma forma de aumentar a arrecadação de dinheiro para a adoração do Senhor do Bonfim. Na época, as fitas eram chamadas de “medida”, já que tinham o mesmo tamanho do braço direito do Senhor do Bonfim. Por isso, as fitas produzidas no século XIX chegavam a ter 50 centímetros de comprimento. Eram produzidas de algodão e usadas de diversas formas, como decoração, proteção, marcador de livros, etc. Atualmente, as fitas são produzidas de maneira bem diferente. Geralmente, são feitas de poliéster e possuem um tamanho bem menor do que o observado no século XIX. As fitas do Senhor do Bonfim também têm uma forte relação com o sincretismo religioso, pois suas cores podem estar relacionadas com orixás oriundos de religiões de matriz africana.
As informações que temos a respeito da Lavagem do Bonfim são pouco precisas. Os historiadores não sabem ao certo o momento em que essa tradição iniciou-se, mas sabe-se que aconteceu no século XIX, provavelmente no início desse século. Uma lenda fala que a tradição foi iniciada por um português que estava grato ao Senhor do Bonfim por ter sobrevivido à Guerra do Paraguai. Outra lenda afirma que a tradição foi iniciada por um devoto de Oxalá, orixá do candomblé. Uma terceira hipótese afirma que a lavagem da escadaria começou por conta da dança de São Gonçalo, que era realizada na Igreja do Bonfim. Conta-se que as devotas de São Gonçalo tinham o costume de lavar a Igreja do Bonfim antes da dança, e isso fez com que a prática ganhasse força. A Festa do Bonfim tem como ponto de partida uma procissão seguida pela lavagem da escadaria da Igreja do Bonfim. A festa inicia-se na quinta-feira que antecede o segundo domingo posterior ao Dia de Reis (6 de janeiro). As festividades relacionadas ao Senhor do Bonfim prosseguem nos dias seguintes e encerram-se no domingo. É uma festa tão tradicional que, em 2013, foi tombada pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) como patrimônio imaterial do Brasil. A Igreja do Bonfim, por sua vez, é tombada desde 1938. Por Daniel Neves Graduado em História