As contribuicoes da psicogenese da lingua escrita no processo de alfabetizacao

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FACULDADE MÉTODO DE SÃO PAULO LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

ROZANA FIGUEIREDO MENEZES

AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO

SÃO PAULO 2014


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ROZANA FIGUEIREDO MENEZES

AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Faculdade Método de São Paulo como requisito parcial para a obtenção do grau de Licenciatura em Pedagogia. Orientador: Prof. Persio Nakamoto.

SÃO PAULO 2014


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FOLHA DE APROVAÇÃO

AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO

Banca Examinadora

___________________________________________________________________ Prof. Persio Nakamoto

___________________________________________________________________ Prof. Virgínia Souza

___________________________________________________________________ Prof. Olavo Egídio Alioto

Aprovado em: 24 de junho de 2014.


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DEDICATĂ“RIA

Dedico este trabalho de pesquisa a todos os amigos e familiares pelo incentivo e, em especial, a minha filha Joyce por estar sempre ao meu lado.


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AGRADECIMENTOS

Na elaboração deste trabalho, devo meus agradecimentos a: Ao meu professor orientador Persio Nakamoto, por seu apoio durante a elaboração deste trabalho; A todos os professores do curso de Licenciatura em Pedagogia; Especialmente à Professora Maria Isabel de Carvalho Andrade; Aos amigos da turma SPNF.


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Não é possível refazer este país, democratizá-lo, humanizá-lo, torná-lo sério, com adolescentes brincando de matar gente, oferecendo a vida, destruindo sonhos, inviabilizando o amor. Se a educação sozinha não transformar a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda. Paulo Freire


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RESUMO A presente pesquisa vem apresentar os resultados sob a perspectiva da teoria construtivista da psicogênese da língua escrita, de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky que, como pesquisadoras, realizaram diversos estudos em aspectos linguísticos. As autoras descrevem o aprendiz como um ser com características ativas e cognitivas que elaboram hipóteses muito abrangentes sobre o funcionamento da aquisição da A presente pesquisa vem apresentar os resultados sob a perspectiva da teoria construtivista da psicogênese da língua escrita, de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky que, como pesquisadoras, realizaram diversos estudos em aspectos linguísticos. língua escrita. A criança, nesse processo, deverá ter acesso a uma diversidade textual, com diálogos e discursos em sala de aula, nos quais serão pesquisadas as diferentes variações linguísticas, percorrendo um caminho que pode ser representado nos níveis pré-silábico, silábico, silábico alfabético e alfabético. Assim sendo, essa construção não é o produto passivo de um método mecânico de ensino. Os métodos não criam conhecimentos, eles são determinados pela relação objetivoconteúdo e referem-se aos meios para alcançar objetivos gerais e específicos de ensino. O objetivo com essa pesquisa é o de compreender e aprofundar sobre as contribuições da psicogênese da língua escrita no processo de alfabetização. Os materiais utilizados para a elaboração desse artigo foram pesquisas bibliográficas em livros científicos e nos PCN, questionário distribuído para professoras das séries iniciais do ensino fundamental e coleta de material da evolução da escrita de alguns alunos. Por meio desse material, chegou-se a conclusão de que os processos de aquisição da língua escrita pelas crianças é mais natural quando trabalhados na vertente construtivista, refletindo na forma como estas se apropriam do processo da língua escrita. Palavras-chave: Língua escrita. Alfabetização. Construtivismo.


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ABSTRACT This research presents the results from the perspective of the constructivist theory of psychogenesis of written language of Emilia Ferreiro and Ana Teberosky. These researchers conducted several studies on linguistic aspects. They describe the learner as an active being with cognitive characteristics that produce hypotheses about the functioning of the acquisition of the written language. The child should have access to a textual diversity, dialogue and discourse in the classroom, which will be researched in the different language variations, that can be represented in the presyllabic, syllabic, syllabic and alphabetic levels alphabet. Thus, this construction is not the passive product of a mechanical method of teaching. The methods do not create knowledge, they are determined by the relation between purpose and content and refer to the means to achieve general and specific teaching objectives. The aim of this text is to understand the contributions of psychogenesis of written language in the literacy process. The materials used for the preparation of this article were literature researches in scientific books and PCN. A questionnaire was distributed to teachers of the lower grades of elementary school and it was also collected material from the evolution of writing of some students. Through this material, the conclusion achieved was the process of acquisition of written language by children is more natural when worked in the constructivist perspective, reflecting on how children acquire of process written language. Keywords: Written language. Literacy. Construtivism.


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LISTA DE FIGURAS

Representação icônica............................................................................................ 27

Representação não icônica....................................................................................

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Letras aleatórias.....................................................................................................

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Escrita silábica sem valor sonoro..........................................................................

32

Escrita silábica com valor sonoro...........................................................................

32

Escrita silábica alfabética..................................................................................... 37/38

Escrita alfabética.................................................................................................. 40/41


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LISTA DE SIGLAS

CENP

Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas

MEC

Ministério da Educação e Cultura

PCN

Parâmetros Curriculares Nacionais – Língua Portuguesa

SEA

Sistema de Escrita Alfabética

SEF

Secretaria da Educação Fundamental


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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................ 11 1 ANÁLISES E REFLEXÕES SOBRE A AQUISIÇÃO DA LÍNGUA ESCRITA....

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1.1 Princípios linguísticos: do tradicional ao construtivismo...................................

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2 A PRÁTICA ALFABÉTICA E A METODOLOGIA..............................................

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2.1 Método sintético................................................................................................ 21 2.1 Método analítico...............................................................................................

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2.1.1 Situações para garantir a alfabetização........................................................

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3 HIPÓTESES PARA ATINGIR A AQUISIÇÃO DA LÍNGUA ESCRITA............... 25 3.1 Nível pré-silábico..............................................................................................

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3.2 Nível silábico..................................................................................................... 30 3.3 Nível silábico-alfabético....................................................................................

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3.4 Nível alfabético.................................................................................................

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4 PESQUISA DE CAMPO E ANÁLISE DOS DADOS...........................................

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3.1 Metodologia aplicada à pesquisa de campo..................................................... 45 3.2 Os sujeitos da pesquisa de campo................................................................... 46 3.3 Aplicação do questionário................................................................................. 47 3.4 Análise e interpretação dos dados...................................................................

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CONSIDERAÇÕES................................................................................................

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REFERÊNCIAS......................................................................................................

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ANEXOS................................................................................................................. 57


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INTRODUÇÃO

Atualmente, a alfabetização é um processo que precisa ser construído por meio de teorias que orientem o trabalho do professor. O objetivo deste trabalho é o de contribuir para a ampliação do debate sobre um tema complexo que é a apropriação do sistema de escrita alfabética. Sendo assim, discutiremos resultados de diferentes educadores e pesquisadores que estão preocupados com a formação dos professores e da apropriação dos aprendizes dos conceitos e das habilidades de ler e escrever. Atrelada a esse conceito, abordaremos a importância e compreensão dos aspectos linguísticos significativos para a evolução da alfabetização sob a perspectiva da psicogênese da língua escrita, teoria de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky. Esta investigação nasce a partir da concepção de que a aquisição do conhecimento da tecnologia da alfabetização se baseia na atividade da criança em interação com o objeto da instrução, demonstrando que esta, antes de ter contato com a escola, tem ideias vagas e faz hipóteses sobre a língua escrita, representando os níveis evolutivos que percorrem até a aquisição da leitura e da escrita durante as séries iniciais do ensino fundamental. Assim, diversos autores, como Ferreiro e Teberosky (1991) principalmente, descrevem como a criança se apropria dos conceitos e das habilidades de ler e escrever intuitivamente, mostrando que a aquisição desses atos com fundamentos linguísticos segue uma perspectiva construtivista e que muitos outros autores têm elaborado questões que tornam possível repensar a prática escolar dentro de uma perspectiva diferente do que foi trabalhado em outras épocas. Dessa forma, para atingir os objetivos deste trabalho, faremos uma pesquisa bibliográfica – baseada em livros e artigos científicos que abordem o universo teórico desenvolvido –; documental – serão utilizados produções de alunos das séries iniciais do ensino fundamental; e de campo – entrevista com professores de escola públicas, demonstrando a prática diária em sala de aula referente a esse assunto. Diante dessa realidade, no primeiro capítulo, procuramos mostrar a importância

da

língua

escrita

como

instrumento

utilizado

em

interações


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socioculturais; a função da escola de garantir a participação dos alunos no mundo letrado; o construtivismo como um produto da ação e reflexão do aprendiz; a construção do conhecimento tendo base no diálogo; estímulos à leitura de variados gêneros literários; e por fim as contribuições de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky na mudança da forma de compreender o processo de alfabetização. Já o segundo capítulo aborda os diferentes métodos tradicionais de alfabetização caracterizados por um sistema fechado em que a aquisição da escrita é vista como a criança aprendendo por meio da repetição e memorização em um processo mecânico, seguindo um modelo preestabelecido, não levando em consideração o contexto sociohistórico nem o desenvolvimento psicológico da criança. A partir dessa perspectiva, a aprendizagem é percebida como o somatório desses elementos mínimos, em que o aluno lê e escreve sem saber para quê, apenas repete modelos predeterminados definidos por métodos analíticos sintéticos, entre outros. O terceiro capítulo descreve como o aprendiz se apropria da habilidade de ler e escrever, mostrando que a aquisição desses atos linguísticos segue um percurso de níveis fundamentais descritos como pré-silábico, silábico, silábico alfabético e alfabético. O quarto capítulo relata a pesquisa de campo, a metodologia, os sujeitos e a análise dos dados. Sabendo que a alfabetização na perspectiva construtivista é concebida como um processo de construção conceitual, contínuo, de grande importância no âmbito escolar, pesquisar sobre esse tema contribuirá com experiências alfabetizadoras em sala de aula, transformando os estudos em atividades pedagógicas.


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CAPÍTULO 1 ANALÍSES E REFLEXÕES SOBRE A AQUISIÇÃO DA LÍNGUA ESCRITA

Para aprender a ler e a escrever, são necessários um processo cognitivo e também uma atividade sociocultural, que é essencial para a criação de vínculos entre o cultural e o conhecimento (VYGOTSKY, 1989). A criança, para que possa aprender a ler e a escrever, precisa se apropriar de inúmeros saberes disponíveis na sociedade, mas que não estão ao alcance tão facilmente. Cabe ao professor proporcionar a todos o desenvolvimento das habilidades linguísticas; orientar o aluno com atividades e trabalho de leitura e escrita para que ele seja ouvinte, falante, leitor e escritor de diversos tipos e gêneros textuais; e que possa, gradativamente, compreender que os textos podem ser estudados e organizados a partir de suas características composicionais comuns, de seus aspectos linguísticos, de suas funções e situações comunicativas. Com a alfabetização, o indivíduo ultrapassa a sua visão egoística de mundo e torna-se um ser social na medida em que incorpora em seu dia a dia aquilo que se constitui primado da civilização. Através da capacidade da leitura e dessa nova forma de apreender o mundo, o indivíduo alfabetizado adquire um instrumento de análise da realidade, diferente do que já possuía como não alfabetizado. Ele pode compreender melhor sua própria realidade, a realidade da sua família e da sua cidade, bem como a realidade social com a qual está comprometido. É importante, portanto, observar que no ato de alfabetizar, de ensinar as primeiras letras, dando ao aluno acesso às formas avançadas da cultura, o professor não pode enganá-lo ou lhe ensinar ilusões. Ao ser alfabetizado, o menino não deve ser deformado. Lembre-se de que ele está ganhando um instrumento de análise da realidade e de compreensão do mundo que deve ser também instrumento de luta pessoal e social, com o qual ele adquire um novo conceito de ação na sociedade. Se o processo de alfabetização é tão importante, os professores-alfabetizadores devem estar conscientes de que o aluno deve ser muito bem alfabetizado, para bem compreender e analisar o que lê e escreve. (RODRIGUES, 1985, p. 91-92)

Para isso, é preciso que a escola tenha um compromisso em alfabetizar, garantindo um trabalho reflexivo sobre as características e os funcionamentos do sistema de escrita. Assim, compete à escolarização oferecer aos alunos um âmbito de alfabetização configurado por contextos significativos de aprendizagem, funcionais e relevantes, os quais oferecem experiências e relações organizadas, válidas para apreender e construir as bases e os fundamentos práticos da leitura e da escrita (entendidas como interpretação e produção


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de textos, desde o início da aprendizagem, cada qual a partir de suas possibilidades, buscando o progresso permanente), para facilitar o domínio do código escrito, autônomo e crítico do mesmo. Paralelamente, deve-se promover a descoberta da utilidade da língua escrita como meio de comunicação (sobretudo por meio do tempo e do espaço), como fonte de informação e deleite, sem esquecer as possibilidades de expressão que a escrita oferece. No entanto, apesar da evidente relevância da língua escrita, ainda prevalecem concepções instrumentalistas e práticas em que a instrução descontextualizada e a avaliação como medição impedem qualquer outra atividade significativa e relevante. (PÉREZ; GARCIA, 2001, p. 47)

O idioma é um instrumento essencialmente utilizado em interações socioculturais e é por meio dele que o ser humano se comunica, tem acesso à informação, produz conhecimento. Assim, um projeto educativo comprometido com a democratização social e cultural atribui à escola a função e a responsabilidade de garantir a todos os seus alunos o acesso aos saberes linguísticos necessários para o exercício da cidadania, o que é direito inalienável de todos (BRASIL, 1997). No entanto, primeiro a língua se desenvolve de forma oral e, posteriormente, com as práticas diversas de ensino da leitura e da escrita. O processo de construção da escrita como o desenvolvimento da linguagem falada ocorre por meio da qualidade de interação com o adulto. O domínio da língua escrita e a participação do aluno no mundo grafocêntrico em que vivemos têm se representado como um grande desafio e um problema significativo para o sistema escolar, visto que não simplesmente o alfabetizar, mas todo um processo que leva tempo e recursos que não são tão previsíveis. Nesse sentido, é necessária a adoção de uma metodologia adequada para que as crianças sejam alfabetizadas em nosso país, assumindo a definição de alfabetização, em sua especificidade, como conjunto de técnicas para exercer a arte e ciência da escrita. Essa metodologia pode ser tradicional ou construtivista. No inicio dos anos 80, começaram a circular, entre educadores, livros e artigos que davam conta de uma mudança na forma de compreender o processo de alfabetização; deslocavam a ênfase habitualmente posta em como se ensina e buscavam descrever como se aprende. Tiveram grande impacto os trabalhos que relatavam resultados de investigações, em especial a psicogênese da língua escrita. (BRASIL, 1997, p. 20)

A psicogênese da língua escrita é uma abordagem psicológica de como a criança se apropria da língua escrita e não um método de ensino. Portanto, cabe aos


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professores fazerem uso desses estudos como uma atividade pedagógica, porque esses trabalhos ajudaram a compreender aspectos importantes de aprendizagem. Como definir então o ensino a partir de uma perspectiva construtivista? Seus traços essenciais poderiam ser enunciados da seguinte maneira: ensinar é colocar problemas a partir dos quais seja possível reelaborar os conteúdos escolares e também é fornecer toda a informação necessária para as crianças poderem avançar na reconstrução desses conteúdos. Ensinar é promover a discussão sobre os problemas colocados, é oferecer a oportunidade de coordenar diferentes pontos de vista, é orientar para a resolução cooperativa das situações problemáticas. Ensinar é incentivar a formulação de conceitualizações necessárias para o progresso no domínio do objeto de conhecimento, é propiciar redefinições sucessivas até atingir um conhecimento próximo ao saber socialmente estabelecido. Ensinar é – finalmente – fazer com que a criança coloque novos problemas que não teriam levantado fora da escola. (LERNER, 1982, p. 120)

Há, então, a necessidade de se promover tais reflexões nas salas de aula, para que uma mudança de paradigma possa ser instaurada quando houver a necessidade de obter relativo sucesso a partir de outras realidades.

Princípios linguísticos: do tradicionalismo ao construtivismo Consciente de seu valor no processo de alfabetizar, o professor pode realizar um trabalho com o foco no Sistema de Escrita Alfabético (SEA). Sabemos que o aprendiz nasce em um mundo em que existe uma grande quantidade de materiais escritos. Ao abandonar os antigos métodos de alfabetização, o docente pode garantir um ensino sistemático que, por meio de atividades reflexivas, desafiem a criança a compreender como funciona a escrita alfabética para poder dominar suas combinações de letra e som em um processo espontâneo de entendimento da língua escrita. A apropriação do código linguístico não será uma atividade baseada na memorização das correspondências entre sons e letras, o processo de ensino aprendizagem do SEA deve ser organizado por meio de uma escrita e leitura desenvolvidas numa linguagem real significativa. Emilia Ferreiro e Ana Teberosky (1991) mostram várias possibilidades de reflexão sobre o construtivismo, ou seja, a construção do conhecimento por parte do aprendiz, que sabe e reflete seus conhecimentos, tem o educador como mediador.


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Desde o início da década de 80, o ensino da língua portuguesa na escola tem sido centro da discussão acerca da necessidade de melhorar a qualidade da educação no país. O conhecimento disponível nos anos 60 levava a buscar no aluno a causa do fracasso escolar, o que tinha sua lógica, visto que para uma parte dos alunos o ensino parecia funcionar. Uma boa ilustração dessa abordagem são os exercícios de prontidão. Pensava-se que aos alunos que fracassavam devia faltar algo, sendo, então, necessário compensar esse déficit para que pudessem aprender. (BRASIL, 1997, p. 20)

Como é um assunto importante para a escola, à alfabetização tem sido uma questão bastante discutida. Tradicionalmente o processo começava e terminava dentro da sala de aula, pois o professor seguia uma metodologia que achava adequada para garantir o ensino ao aluno. Segundo Weisz (2003), chega ao Brasil, no século passado, a visão da criança como um ser com características cognitivas, ativo e construtor do seu próprio conhecimento. Essas eram ideias da chamada Escola Nova, construindo um modelo de ensino que tinha por principio a valorização do indivíduo como ser livre, ativo e social. Por não privilegiar os conteúdos escolares, a Escola Nova foi profundamente criticada no Brasil, especialmente nos anos 1970. Seu modelo de ensino favorecia a inserção das crianças pobres que vinham de casa com uma bagagem cultural que não era valorizada na escola, no universo da cultura reconhecida socialmente. A escola falhava por não oferecer, a essas crianças, condições de aprendizagem da cultura necessária à cidadania. (WEISZ, 2003, p. 31)

Hoje a concepção construtivista está fazendo a diferença na questão pedagógica. De acordo com essas ideias, Telma Weisz (2003, p. 24) diz que: Na concepção de aprendizagem que se tem chamado de construtivista na qual o conhecimento é visto como produto da ação e reflexão do aprendiz – esse aprendiz é compreendido como alguém que sabe algumas coisas e que, diante de novas informações que para ele fazem algum sentido, realizam um esforço para assimilá-las. Ao deparar com questões que ele se coloca como problemas, depara-se também com a necessidade de superação. E o conhecimento novo aparece como resultado de um processo de ampliação, diversificação e aprofundamento do conhecimento anterior que ele já detém.

Dessa maneira, Weisz (2003, p. 20) complementa dizendo que: As pesquisas realizadas nos anos 1970 por Emilia Ferreiro e Ana Teberosky e colaboradoras sobre o que pensam as crianças a respeito da escrita – a chamada psicogênese da escrita – evidenciaram os problemas que a metodologia embutida nas cartilhas cria para muitas crianças. Segundo mostrou a psicogênese da língua escrita, em uma sociedade letrada, as crianças constroem conhecimentos sobre a escrita desde muito cedo, a partir do que podem observar e das reflexões que fazem a esse respeito. Em busca


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de uma lógica que explique o que não compreendem quando ainda não se alfabetizaram, as crianças elaboram hipóteses muito interessantes sobre o funcionamento da escrita.

Os PCN (BRASIL, 1997) reforçam que o aluno precisa ler e escrever, mesmo que não saiba fazê-los da maneira considerada correta. Para isso, é necessário oferecer oportunidades, condições de aprendizagem, não só centrar a prática de codificação de sons e letras, mas considerar a escrita como intenção de dizer algo, a interpretação e o que efetivamente se escreve. O ensino da leitura e da escrita deve ser visto como a prática de um sujeito agindo sobre um mundo com o objetivo de transformá-lo. É por meio dessa prática que desenvolvemos nossa capacidade linguística e, com isso, criamos a capacidade de entender melhor o mundo que nos cerca. Por isso, conhecer diferentes tipos de textos não é decorar apenas regras gramaticais, mas compreender o entorno por meio de diferentes produções escritas. As atividades de análise linguística são aquelas que tomam determinadas características da linguagem como objeto de reflexão. Essas atividades se apoiam em dois fatores: a capacidade que temos de refletir, analisar, pensar sobre os fatos e os fenômenos da linguagem; e a propriedade que a linguagem tem de falar sobre a própria linguagem, uma metalinguagem (FREIRE, 1988). Isso torna possível organizar um trabalho didático de análise linguística, aqui denominado como análise de reflexão sobre a língua, cujo objetivo principal é melhorar a capacidade de compreensão e expressão dos alunos em situações de comunicação tanto escrita como oral. As atividades de análise linguística não são uma invenção escolar. Por exemplo, quando alguém, no meio de uma conversa, pergunta “O que você quis dizer com isso?”, está realizando uma atividade epilinguística. Quando planejadas didaticamente, situações desse tipo podem constituir uma importante fonte de questionamento, análise e organização de informações sobre a língua e, no processo de ensino, devem anteceder as práticas de reflexão metalinguística, para que essas possam ter algum significado para os alunos. (BRASIL, 1997, p. 53)

O objetivo de se ensinar a ler e escrever deve estar centrado em propiciar ao estudante a aquisição da língua portuguesa, de maneira que ele possa exprimir-se corretamente, ensinado pelo professor por meio de estímulos à leitura de variados


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textos, nos quais serão pesquisadas as diferentes variações linguísticas (WEISZ, 1988). Assim, uma prática significativa depende do interesse do professor em planejar as suas aulas com coerência, visando à construção de conhecimentos com os alunos, relacionando à necessidade de se trabalhar a leitura e a escrita com diálogos e discussão em sala de aula, onde a criança lendo, escrevendo, com e para o outro, conceberá a escrita como prática dialógica, ou seja, a criança aprenderá a dizer o que pensa e o que deseja pela escrita (VYGOTSKY, 1989). Para Ferreiro (1996), a leitura e a escrita são sistemas construídos paulatinamente. As primeiras escritas feitas pelos educandos no início da aprendizagem devem ser consideradas como produções de grande valor, porque de alguma forma os seus esforços foram colocados nos papéis para representar algo. Segundo Paulo Freire (1988), no Círculo de Cultura, essa atitude de sujeito curioso e crítico é fundamental para começar a alfabetização. O exercício dessa atividade crítica, na análise da prática social, da realidade em processo de transformação, possibilita aos alfabetizandos aprofundar o ato de conhecimento na pós-alfabetização e também assumir diante de seu cotidiano uma posição mais curiosa. A posição de quem se indaga constantemente em torno da própria prática, em torno da razão de ser dos fatos em que se acha envolvido. Na etapa da alfabetização, o que se pretende não é ainda uma compreensão profunda da realidade que está analisando, mas desenvolver aquela posição curiosa referida acima; estimular a capacidade crítica dos alfabetizandos enquanto sujeitos do conhecimento, desafiados pelo objeto a ser conhecido. É exatamente a experiência sistemática desta relação que é importante. A relação do sujeito que procura conhecer com o objeto a ser conhecido. Relação que inexiste toda vez que, na prática, o alfabetizando é tomado como paciente do processo, puro recipiente da palavra do alfabetizador. Neste caso, então, não diz a sua palavra. (FREIRE, 1988, p. 44)

A aprendizagem de procedimentos eficazes tanto de fala como de escrita, em contextos mais formais, dificilmente ocorrerá se a escola não tomar para si a tarefa de promovê-la (FREIRE, 1988). Para Ferreiro (2013), temos que auxiliar essas crianças em seu caminho para a alfabetização, mas considerando sua inteligência e não as tratando como ignorantes.

Os

alunos

fazem

questões

legítimas,

de

grande

relevância


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epistemológica, ao pensar a escrita. A mesma escrita reduzida, banalizada e deformada pela tradição escolar, que converte didaticamente um objeto cultural complexo em um instrumento de codificação rudimentar. “Alfabetizar, sim, mas sabendo que a criança, sujeito da aprendizagem, é um ser pensante; que a ação educativa pode apelar para sua inteligência, exatamente para não inibir a reflexão nascente”. (FEREIRO, 2013, p. 33)

O processo para a aquisição da leitura e da escrita está relacionado ao ambiente escolar, onde ocorre à reflexão compartilhada entre os alunos e professores, sendo assim ler e escrever não são tarefas sugeridas como lição de casa, mais atividades essenciais ao ensino da língua, portanto, o lugar onde as crianças aprendem é a própria sala de aula (FERREIRO, 2013). Assim, vemos que a finalidade principal da escola é formar alunos com habilidades e competências de desenvolver a leitura e a escrita com autonomia, ou seja, aprendizes cujas capacidades vão além do simples ato de ler e escrever.


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CAPÍTULO 2 A PRÁTICA ALFABÉTICA E A METODOLOGIA

Sendo o método de alfabetização compreendido como um caminho, direção ou um significado, é importante se ter um para possibilitar o ensino e a aprendizagem como um conjunto de procedimentos planejados sistematicamente. Uma pedagogia articulada com os interesses populares valorizará, pois, a escola; não será indiferente ao que ocorre em seu interior; estará empenhada em que a escola funcione bem; portanto, estará interessada em métodos de ensino eficazes. Tais métodos se situarão para além dos métodos tradicionais e novos, superando por incorporação as contribuições de uns e de outros. Portanto, serão métodos que estimularão a atividade e iniciativa dos alunos sem abrir mão, porém, da iniciativa do professor; favorecerão o diálogo dos alunos entre si e com o professor, mas sem deixar de valorizar o diálogo com a cultura acumulada historicamente; levarão em conta os interesses dos alunos, os ritmos de aprendizagem e o desenvolvimento psicológico, mas sem perder de vista a sistematização lógica dos conhecimentos, sua ordenação e graduação para efeitos do processo de transmissão-assimilação dos conteúdos cognitivos. (SAVIANI, 1986, p. 22)

A construção do conhecimento no caso, a aquisição da língua escrita, portanto, não é o produto passivo de um método mecânico de ensino, que treina o aluno para decifrar um código, mas resultado da própria ação do aprendiz, de suas capacidades cognitivas, de sua competência linguística e de sua interação com o contexto letrado (MORTATTI, 2006). O construtivismo se apresenta não como um método novo, mas como uma “revolução conceitual”, demandando, dentre outros aspectos, abandonaremse as teorias e práticas tradicionais, desmetodizar-se o processo de alfabetização e se questionar a necessidade das cartilhas. (MORTATTI, 2006, p. 10)

De acordo com Ferreiro (2001), tradicionalmente, as decisões a respeito da prática alfabetizadora se têm centrado na polemica sobre os métodos utilizados. Métodos analíticos contra os métodos sintéticos, fonéticos, contra o global, entre outros. Para Ferreiro e Teberosky (1991), a preocupação dos educadores tem-se voltado para a busca do melhor ou do mais eficaz dos métodos, levando a uma polêmica entre dois tipos fundamentais: método sintético e método analítico. Na aprendizagem inicial, as práticas eram feitas a partir da apresentação das unidades que deveriam ser memorizadas, letras, fonemas, padrões silábicos – no


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caso dos métodos sintéticos – ou textos, frases com um repertório de palavras que deveriam ser memorizadas – no caso dos métodos analíticos – sempre com base em uma sequência a ser seguida. O aluno só poderia ser apresentado a novas unidades uma vez que tivesse memorizado as anteriores (AZEVEDO; MARQUES, 1997).

Método sintético O método sintético estabelece uma correspondência entre o oral e o escrito, entre som e grafia, por meio do aprendizado de letra por letra ou sílaba por sílaba e palavra por palavra (ROAZZI; LEAL; CARVALHO, 1996). O método sintético é o mais antigo dos métodos de alfabetização e é o que prevê o início da aprendizagem a partir dos elementos mais simples, ou seja, letras, fonemas ou sílabas. A aprendizagem é percebida como o somatório desses elementos mínimos, por meio de varias ligações, levam os alunos a ler palavras, frases e textos. Esse método está ligado diretamente entre o som e a grafia, ou seja, entre o oral e o escrito, parte de unidades menores, para analisar unidades maiores. O aluno aprende em um processo mecânico e repetitivo, não levando em conta o contexto sócio-histórico nem o desenvolvimento psicológico do aprendiz. .

Roazzi, Leal e Carvalho (1996, p. 8) ressaltam: Assim, os defensores dos métodos fônicos adotaram o pressuposto de que cada letra dispõe de certa autonomia fonética e se baseia nas intuições fonéticas da criança e em sua capacidade de imitação de sons específicos. Basicamente, trata-se de fazer pronunciar as letras, aprendidas uma de cada vez, de acordo com seu valor fônico, como se pronunciam enquanto unidades das palavras. Desta forma, o método fônico possuiria a vantagem de não criar interferências entre o conhecimento dos nomes das letras e o conhecimento do som correspondente. Apesar do avanço apresentado pelo método fônico em relação ao método alfabético, não são eliminados os problemas do mecanismo e repetitividade da aprendizagem, obrigando ainda a criança a estar longe por um longo período de tempo dos significados das palavras e dos textos, verdadeiro objetivo da aprendizagem da leitura.

Por esse método, a aprendizagem é feita primeiro por meio de uma leitura mecânica do texto, de uma decifração das palavras, vindo posteriormente à sua leitura e compreensão.


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Nesse método, as cartilhas são utilizadas para orientar os alunos e professores

no

aprendizado,

apresentando

um

fonema

e

seu

grafema

correspondente por vez, evitando confusões auditivas e visuais. Como esse aprendizado é feito de forma mecânica, por meio da repetição, o método sintético é tido pelos críticos como o mais cansativo e enfadonho para as crianças, pois é baseado apenas na repetição e é fora da realidade da criança, que não cria nada, apenas age sem autonomia (ROAZZI; LEAL; CARVALHO, 1996).

Método analítico O método analítico, também conhecido como método olhar-e-dizer, coloca o estudante diante de um conjunto de palavras que elas reconhecem globalmente, por meio da memorização, e, aos poucos, quando aprende uma pequena quantidade de palavras, estas são apresentadas em combinações diferentes para construir sentenças significativas. Após as crianças dominarem um conjunto de palavras de forma estável, passa-se a enfatizar que os símbolos das letras representam determinado som específico como descreve Roazzi, Leal e Carvalho (1996, p. 9): Os métodos analíticos são aqueles que propõem um ensino que parte das unidades significativas da linguagem, isto é, palavras, frases ou pequenos textos, para depois conduzir análise das partes menores que as constituem (letras e sílabas).

Sendo assim, cada fonema passa a ser trabalhado até que o a aprendiz se torne capaz de converter as letras e os sons mecanicamente. De modo semelhante, nos métodos que se parte de sentenças, propõe-se que os alunos memorizem sentenças e façam a leitura global até que passem a reconhecer partes dessas sentenças em outras sentenças. Esses métodos de alfabetização tradicionais estão desvinculados da realidade dos aprendizes, não levam em consideração a formação de alunos leitores e escritores críticos nem o contexto social. Daí a necessidade imperiosa de recolocar a discussão sobre novas bases. Se aceitarmos que a criança não é uma tábua rasa onde se inscrevem as letras e as palavras segundo determinado método. (FERREIRO, 2001, p. 29)


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Nessa perspectiva, é preciso que o professor tenha claro que não basta o aluno dominar o SEA, precisa saber fazer uso dos diferentes materiais escritos, saber ler, escrever textos nas mais variadas situações sociais, com crítica e reflexão. Como se percebe, os métodos tradicionais de alfabetização não favorecem a formação de aprendizes leitor e escritor. Os métodos são determinados pela relação objetivo-conteúdo, e referem-se aos meios para alcançar objetivos gerais e específicos do ensino, ou seja, ao “como” do processo de ensino, englobando as ações a serem realizadas pelo professor e pelos alunos para atingir os objetivos e conteúdos. Temos, assim, as características dos métodos de ensino: estão orientados para objetivos; implicam uma sucessão planejada e sistematizada de ações, tanto do professor quanto dos alunos; requerem a utilização de meios. (LIBÂNEO, 1994, p. 149)

Situações para garantir a alfabetização Algumas práticas levam o aprendiz a pensar que aquilo que existe para conhecer já foi estabelecido como um conjunto de coisas fechado que não podem se modificar. Há prática em que as crianças ficam de fora do conhecimento, como espectador passivo ou receptor mecânico, sem nunca encontrar respostas aos porquês e aos para quês que já nem se atrevem a formular em voz alta. De acordo com a autora, nenhuma prática pedagógica é neutra. Todas estão apoiadas em um processo de aprendizagem e são elas, não os métodos que a língua escrita domina. (FERREIRO, 2001, p. 31)

Para garantir ao aluno o seu direito de aprender, é indispensável que o professor também tenha assegurado os seus direitos de aprender a ensinar. A competência do professor é tão importante tanto para ele como para a escola. A competência profissional também significa a capacidade de saber identificar problemas,

usar

e

mobilizar

todos

os

recursos

existentes,

inclusive

os

conhecimentos teóricos e práticos para exercer as diferentes demandas da atividade escolar, portanto é ter e ser capaz de responder aos desafios que a realidade apresenta e isso não se aprende apenas estudando (WEISZ, 2003). A escola pode fazer muito para ajudar as crianças, especialmente aquelas cujos pais, analfabetos ou semianalfabetos, não possam transmitir-lhes um conhecimento que eles mesmos não possuem. O professor é quem pode diminuir esta carência evitando ficar prisioneiro de suas próprias convicções: as de um adulto já alfabetizado. Para ser eficaz, terá que adaptar seu ponto de vista ao da criança. (FERREIRO, 2001, p. 61)


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O professor precisa de uma formação teórica sólida para apoiar sua prática, entender a natureza da língua escrita, como ocorre a sua aquisição pela criança para poder interferir, mediar e respeitar o processo de construção na fase inicial da aprendizagem. E o que é um professor, na ordem das coisas? Talvez que um professor seja um funcionário das instituições que gerenciam lagoas e charcos, especialistas reprodução, peça num aparelho ideológico de Estado. Um educador, ao contrário, é um fundador de mundos, mediador de esperanças, pastor de projetos. Não sei como preparar o educador. Talvez que isto não seja nem necessário, nem possível... É necessário acordá-lo. E aí aprenderemos que educadores não se extinguiram como tropeiros e caixeiros. Porque, talvez, nem tropeiros nem caixeiros tenham desaparecido, mas permaneçam como memórias de um passado que está mais próximo do nosso futuro que o ontem. Basta que o chamemos do seu sono, por um ato de amor e coragem. E talvez, acordados, repetirão o milagre da instauração de novos mundos. (ALVES, 1984, p. 26)

Considerando que muitas crianças chegam à escola sabendo a função da escrita porque tiveram oportunidades de interagir com ela em seu meio cultural, tem vantagem das que não tiveram as mesmas oportunidades, portanto, os professores precisam proporcionar em sala de aula a interação da leitura e da escrita como uma prática discursiva e dialógica no processo de aprendizagem, desde a fase inicial.


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CAPÍTULO 3 HIPÓTESES PARA ATINGIR A AQUISIÇÃO DA LÍNGUA ESCRITA

Como já foi escrito, a criança pode iniciar seus conhecimentos no mundo da escrita muito antes que qualquer tentativa formal de ensino seja proposta. Nesse sentido, Ferreiro e Teberosky (1991) apontam uma sequência psicogenética de construção da escrita, caracterizada como níveis: o Pré-silábico: as escritas produzidas não são veículo de comunicação, partindo de uma etapa inicial onde a escrita ainda não representa a fala; o Silábico: a criança já estabelece relação com os aspectos sonoros da linguagem; o Silábico-alfabético: a criança chega a uma correspondência alfabética, compreende que a escrita representa o som e a fala; o Alfabética: a criança percebe que cada um dos caracteres da escrita corresponde a valores menores que a sílaba e já produz escritas alfabéticas. Essa construção dá continuidade a uma linha regular, organizada em três grandes períodos: 1º) o da distinção entre o modo de representação icônica (imagens) ou não icônica (letras, números, sinais); 2º) o da construção de formas de diferenciação, controle progressivo das variações sobre o eixo qualitativo (variedade de grafias) e o eixo quantitativo (quantidade de grafias) – esses dois períodos configuram a fase pré-linguística ou pré-silábica –; 3º) o da fonética da escrita, quando aparecem suas atribuições de sonorização, iniciado pelo período silábico e terminando no alfabético. Essa aprendizagem segue um processo como descreve Weisz (1988, p. 73): A criança começa diferenciando o sistema de representação escrita do sistema de representação do desenho. Tenta várias abordagens globais (hipótese pré-silábica), numa busca constante de lógica do sistema, até descobrir – o que implica uma mudança violenta de critérios – que a escrita não representa o objeto a que se refere e sim o desenho sonoro do seu nome. Neste momento costuma aparecer uma hipótese conceitual que


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atribui a cada letra uma sílaba oral. Está hipótese (hipótese silábica) gera inúmeros conflitos cognitivos, tanto com as informações que recebe do mundo, como com as hipóteses de quantidade e variedade mínima de caracteres construída pela criança.

Todo esse processo corresponde a uma progressão caracterizada por descobertas que envolvem a noção de fonemas, o que nos leva a pensar nos próprios progressos que a criança pode fazer em termos de seus conhecimentos fonológicos e que podem estar relacionados com a sequência de construção da escrita apontada por Ferreiro e Teberosky (1991). Conforme Ferreiro (2009), para compreender essa forma de escrita não organizada da criança, é preciso entender os processos de passagem que ocorrem, até se obter a escrita adequada que conhecemos. Sabemos que cada um destes níveis caracteriza-se por formas de concepção que atuam da mesma maneira que qualquer esquema assimilador: absorvendo a informação dada, deixando de lado parte da informação disponível, mas não assimilável, e introduzindo sempre um elemento interpretativo próprio. O resultado são construções originais, tão estranhas ao nosso modo “alfabetizado” de ver a escrita, que parecem caóticas à primeira vista. Nossa tarefa foi e (ainda é) a de compreender a “lógica interna” desses modos de organização, bem como a de compreender as razões da substituição de um modo de organização por outro, isto é, os processos de construção do conhecimento neste campo específico. (FERREIRO, 2009, p. 10)

Portanto, a psicogênese da língua escrita descreve como o aluno se apropria da construção da escrita e da leitura, mostrando que a aquisição desses atos linguísticos segue um caminho. Ele precisa, então, responder a duas questões: o que a escrita representa e o modo de construção dessa representação.

Nível pré-silábico Nesse momento inicial, a criança pensa que pode escrever com desenhos, rabiscos, letras ou sinais gráficos, imaginando que a palavra assim escrita representa a coisa a que se refere. Assim, elas buscam diferenciá-los de suas garatujas ou desenhos (inicialmente sem e, posteriormente, com figuração). As produções escritas das crianças – que antes eram consideradas meras garatujas – adquiriram um novo significado. Agora sabemos interpretá-las como escritas verdadeiras que não falta uma sistematização. São escritas que se baseiam em outros princípios. As crianças podem usar letras como as nossas, e escrever “em outro sistema”, assim como, no início da


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aquisição da linguagem oral, podem utilizar palavras da linguagem ambiente, mas com diferentes regras de combinação. (FERREIRO, 2009, p. 83-84)

Nessas primeiras tentativas de escrita, a criança não faz diferenciação entre a grafia de uma e de outra palavra, ignorando a escrita como representação da fala. Nessa fase, elas representam a escrita por meio das seguintes hipóteses: o Representação icônica: escrever é o mesmo que desenhar, expressa seu pensamento por meio de desenhos, não tendo a noção de escrita no sentido propriamente dito.

Figura 1. Representação icônica (criança de quatro anos e cinco meses). Como

podemos

observar

nessa

sondagem,

a

criança

não

tem

conhecimento da escrita, representando-a por meio de desenhos, porque para ela escrever é o mesmo que desenhar.


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o Representação não icônica: a criança inicia o conceito de escrita, mas ainda não reconhece as letras do alfabeto e seu valor sonoro, expressa seu pensamento com rabiscos.

Figura 2. Representação não icônica (criança de cinco anos e três meses). Nessa sondagem, a criança mostra seu pensamento por meio das garatujas e dos rabiscos. Ela inicia o conceito de escrita, mas não compreende as letras do Sistema de Escrita Alfabética nem o seu valor sonoro. A ausência de relação entre a escrita e as propriedades sonoras das palavras, quer no sentido de identificar os sons que as compõem, assim como quantificá-lo, pode revelar que, em termos de um conhecimento metalinguístico, a criança, nessa fase, ainda não analise os componentes sonoros das palavras.


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o Letras aleatórias: já conhece algumas letras do alfabeto, mas as utiliza aleatoriamente, pois não faz nenhuma correspondência sonora entre a fala e a escrita. Para escrever, é preciso muitas letras.

Figura 3. Letras aleatórias (criança de sete anos). Nessa sondagem, a escrita de Ryan (sete anos) mostra que ele já conhece algumas letras do alfabeto, mas não reconhece seu valor sonoro, acha que para escrever precisa de muitas letras, utilizando-as aleatoriamente. Realismo nominal: a criança acha que os nomes das pessoas e das coisas têm relação com os seus tamanhos. Exemplo: se pedirmos a uma criança para escrever elefante e tartaruga, ela utilizará mais letras no elefante porque ele é maior. A superação do realismo nominal ocorrerá no fim da escrita pré-silábica. [...] a intenção subjetiva do escritor conta mais que as diferenças objetivas no resultado: todas as escritas se assemelham muito entre si, o que não impede que a criança as considere como diferentes, visto que a intenção que presidiu a sua realização era diferente (se quis escrever uma palavra num caso, e outra palavra no outro caso) [...]. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1991, p. 183)

Já num segundo momento, há um progresso gráfico: a criança utiliza as letras de maneira mais definida, percebendo a quantidade mínima de letras para haver a escrita. Nesse nível pré-silábico, ela se utiliza das letras que têm na memória (por


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exemplo, seu próprio nome), faz a leitura do que escreveu sem estabelecer uma correspondência entre os segmentos do falado aos do escrito. [...] a criança deste nível tende a rejeitar outras possíveis escritas de seu nome que apresentem as mesmas letras, mas em outra ordem. Porém, a correspondência entre a escrita e o nome é ainda global e não analisável [...] cada letra vale como parte de um todo e não tem valor em si mesma [...]. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1991, p. 190)

A aquisição que a criança faz sobre as letras depende das influências culturais, e a presença de pais e familiares alfabetizados poderia ser uma das condições para o avanço mais rápido rumo à hipótese alfabética. Desse modo, desde os primeiros anos de escolarização, espera-se que os professores planejem situações de escrita que, ao mesmo tempo, favoreçam a aprendizagem do funcionamento da escrita alfabética e possibilitem o acesso aos textos escritos de modo a garantir a interação social em diversos ambientes e tipos de interação. Grossi (1985, p. 5) diz que: A didática do nível pré-silábico se caracteriza pela criação de um ambiente rico de materiais e atos de leitura escrita, não há seleção e ordenação de letras ou palavras para vivenciar, as crianças tomam contato com todas as letras e com qualquer palavra [...], alfabetizar-se é muito mais do que manejar a correspondência entre sons e letras escritas.

Nível silábico Nesse nível, a criança supõe que a escrita é a fala, a palavra falada começa a ser decomposta em unidades silábicas que definem a quantidade de letras a serem utilizadas, sendo que a ordem de pronúncia das sílabas na palavra é projetada na sequência de letras escritas. É uma etapa em que os alunos se esforçam para dar mais sentido às hipóteses que fazem sobre os enunciados sonoros, procurando encontrar unidades menores a sílaba (os fonemas) que justifiquem a possibilidade de representá-la por mais de uma letra – por exemplo, para CEBOLA grafar, CBA (C=ce, B=bo, A=la), Para PATO, PO (P=pa, O=to). Esta situação é típica quando o requisito da quantidade mínima se impõe. O relevante é que a criança, procurando outras letras para colocar, não repete nenhuma das anteriores (FERREIRO, 2013). É comum as crianças usarem menos ou mais letras do que as palavras requerem. Esse tipo de escrita tem sido considerado tradicionalmente como omissão


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de letras (FERREIRO, 2001) e aborda que, do ponto de vista da escrita adulta convencional, faltam algumas letras. No entanto, do ponto de vista do aluno em desenvolvimento, esse tipo de escrita é acréscimo de letras, sobretudo para a criança que aprendeu que precisa ir além da sua análise silábica prévia. Pode-se constatar, então, como podem ser opostas as análises acerca dos mesmos dados. As crianças aprendem a escrever por meio de observação e reprodução dos exemplos das escritas que os rodeiam, por isso se deve concluir que algo está omitido em sua reprodução. [...] a criança passa por um período da maior importância evolutiva: cada letra vale por uma sílaba. E o surgimento do que chamaremos a hipótese silábica. Com esta hipótese, a criança, dá um salto qualitativo com respeito aos níveis precedidos [...]. (FERREIRO; TEBEROSKY, 1991, p. 193)

Em termo de conhecimento metalinguístico, esses processos indicam que a criança está se tornando mais atenta às características sonoras das palavras, o que, muito provavelmente, pode ser atribuído aos avanços em sua consciência fonológica, especialmente quando chega ao nível do conhecimento da sílaba. Entretanto, essa relação letra-sílaba será empregada como uma estratégia de planejamento da escrita, podendo definir antecipadamente o número de letras que deverão ser utilizadas: para cada sílaba, uma letra. A partir desse nível, se o professor conhece o contexto da situação de escrita, poderá ler as produções das crianças sem necessidade de pedir que eles, os autores, contem o que escreveram. A escrita silábica é o resultado de um dos esquemas mais importantes e complexos que se constrói durante o desenvolvimento da leitura-e-escrita. Esse esquema permite à criança relacionar, pela primeira vez, a escrita à pauta sonora da palavra: uma letra para cada sílaba; tantas letras quantas sílabas. (FERREIRO, 2001, p. 79)

Nessa fase, a criança representa a escrita por meio das seguintes hipóteses: o Escrita silábica sem valor sonoro: a criança escreve uma letra ou um sinal gráfico para representar a sílaba, ou seja, letras de forma convencional mais utilizadas sem seu valor sonoro convencional.


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Figura 4. Escrita silábica sem valor sonoro (criança de sete anos). Como podemos observar, nessa hipótese, a criança escreve uma letra ou um sinal gráfico para representar a sílaba, não fazendo correspondência entre a escrita e a pauta sonora, pois o número de letras não equivale ao número de sílabas. Escrita silábica com valor sonoro: a criança escreve uma letra para cada sílaba utilizando letras que correspondem ao som da sílaba; às vezes, usa só as vogais e outras só as consoantes, ou seja, vogais com valor sonoro convencional.

Figura 5. Escrita silábica com valor sonoro (criança de quatro anos).


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Nessa hipótese silábica com valor sonoro, Pedro Augusto (quatro anos) escreve uma letra para cada sílaba com correspondência sonora. Ele acredita que para escrever deve haver uma quantidade mínima de letras e, às vezes, usa só as vogais outras só as consoantes. De acordo com Ferreiro e Teberosky (1991), a leitura e a escrita é um processo construtivo antes de passar para o outro nível, e três pontos devem ser incluídos: o As vogais podem constituir uma sílaba representando tais fonemas (as, ta, ma, le, si, fo etc.) em função do que se pretende escrever; o A hipótese silábica é uma construção original da criança e não formas estáveis que já possuem de memória; o A criança busca, em suas escritas, sempre unidades menores compondo a totalidade, tentando representar por escrita. De acordo com Leal e Moraes (2010, p. 35-36): Para compreender as propriedades do sistema alfabético, é necessário que a criança se aproprie de uma série de conhecimentos, tais como: - Se escreve com letras, que não podem ser inventadas, que têm um repertório finito e que são diferentes de números e outros símbolos; - As letras têm formatos fixos e pequenas variações produzem mudanças na identidade destas (p,q,b,d), embora uma letra assuma formatos variados (P,p,D,d); - A ordem das letras é definidora da palavra e, juntas, configuram-na, e uma letra pode se repetir no interior de uma palavra e em diferentes palavras; - Nem todas as letras podem vir juntas de outras e nem todas podem ocupar certas posições no interior das palavras; - As letras notam a pauta sonora e não as características físicas ou funcionais dos referentes que substituem; - Todas as sílabas do português contêm uma vogal; - As sílabas podem variar quanto às combinações entre consoantes, vogais e semivogais (CV, CCV, CVS, v, CSvV, V, CCVCC...), mas a estrutura predominante é a CV (consoante-vogal); - As letras notam segmentos sonoros menores que as sílabas orais que pronunciamos; - As letras têm valor sonoro e certos sons podem ser notados com mais de uma letra.

Nessa perspectiva, podemos observar que as crianças, desde cedo, devem vivenciar atividades que a levem a pensar sobre as características do nosso sistema de escrita, de forma reflexiva, lúdica, inseridas em atividades de leitura e escrita de diferentes textos. Dessa forma, elas conseguirão produzir textos com autonomia,


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consolidando as correspondências grafofônicas relacionadas aos diferentes eixos da língua portuguesa. É importante considerar, no entanto, que a apropriação da escrita alfabética não significa que o aluno esteja alfabetizado. Apesar das práticas escolares, seu problemas não é compreender tal ou qual regra de correspondência sonora, tal ou qual escrita isolada. Seu problema é compreender a natureza do sistema de escrita que a sociedade lhes oferece. Para compreendê-lo enquanto sistema estão obrigadas a reconstruí-lo como um conhecimento pré-elaborado. (FERREIRO, 2001, p. 95, grifo do autor)

Segundo Ferreiro (2013), nas escritas silábicas, a fronteira silábica fica marcada, já que, quando se lhes permite escolher, as crianças preferem caracteres separados e cada letra, separadas das outras, corresponde a uma sílaba. Na escrita alfabética,

esta

fronteira

desaparece.

Parte

da

dificuldade

reside

no

desaparecimento dessa fronteira. A passagem do “saber fazer” no plano da ação verbal ao “pensar a respeito” dos elementos do produto dessa ação verbal é, nada mais e nada menos, que a transformação da linguagem – instrumento de ação – em objeto de reflexão. É preciso colocá-la fora de si mesmo e dos outros falantes. Tirá-la do contexto comunicativo é concebê-la como um objeto a ser considerado em si mesmo e por si mesmo. A grande dificuldade reside em que não se trata de um objeto do mundo físico ou cultural que preexiste à ação do sujeito sobre esse objeto. A língua oral existe à medida que existem atos de fala. (FERREIRO, 2013, p. 74)

Nível silábico-alfabético É quando se encontra nesse nível silábico-alfabético que a criança se mostra capaz de produzir escritas com maior correspondência sonora, ainda assim apresenta oscilações como uma letra para cada sílaba ou uma letra para cada som, demonstrando claramente, assim, o nível intermediário entre a correspondência silábica e a correspondência alfabética. [...] a criança abandona hipótese silábica e descobre a necessidade de fazer uma análise que vá ‘mais além’ da sílaba pelo conflito entre a hipótese silábica e a exigência de quantidade mínima de grafias (ambas exigências puramente internas, no sentido de serem hipóteses originais da criança) e o conflito entre as formas gráficas que o meio lhe propõe e a leitura dessas formas em termos de hipótese silábica (conflito entre uma exigência interna e uma realidade exterior do próprio sujeito). (FERREIRO; TEBEROSKY, 1991, p. 196)


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Em outra etapa do estudo, Ferreiro observou a criança realizando a tarefa de escrever consecutivamente uma mesma lista, primeiramente com lápis e papel e, em seguida, no computador. Focou a análise, portanto, em pares de palavras, o que evidenciou produções intrigantes: no caderno, ela representa soda como AS e no computador OD. Salame vira SAM no papel e ALE no computador. Apesar de conhecer todas as letras de soda e de salame, ele não as coloca juntas. O fenômeno, explica Ferreiro (2013), é chamado de alternâncias grafofônicas. Creio que presenciamos a alternância de centrações cognitivas sobre dois aspectos da unidade sílaba. A sílaba oral é considerada a partir de duas ancoragens diferentes. As letras escolhidas correspondem a essas duas ancoragens. A centração no “aspecto vocálico” da sílaba é seguida de uma centração no “aspecto consonântico” da mesma sílaba. A mesma sílaba é ouvida “a partir de outro lugar”. (Ouvida a “vista”, porque a escrita permite vêla). (FERREIRO, 2013, p. 66).

Conforme Cagliari (1999), a alfabetização depende essencialmente do conhecimento da categorização gráfica e funcional. Nisso se localiza um divisor de águas: quem consegue, fica tentando em vão outras maneiras de aprender. Grande parte do trabalho de alfabetização deverá voltar-se, portanto, para o estudo desses dois aspectos. Para decifrar a escrita, é de suma importância que os alunos conheçam os nomes das letras, bem como consigam identificar o som que representam a sua forma. Para decifrar isso, Cagliari (1999) afirma que os nomes das letras são: “a, bê, cê, cê-cedilha, dê, ê, efe, gê, agá, i, jota, cá, ele, eme, ene, ô, pê, quê, erre, esse, tê, u, vê, dáblio, xis, ípsilon, zê”. Notar que o nome da letra H não se escreve com H; o nome da letra K é com C (porque não se escreve palavras comuns com K na nossa língua); no nome da letra W não aparece o som correspondente, nem no nome da letra Y. Isso mostra que no nosso sistema o princípio acrofônico não está mais presente em todas as letras. No entanto, isso acontece principalmente com letras de pouco uso como K, W e Y; a letra H é exceção. Se as letras não tivessem esses valores, poderíamos, por exemplo, escrever CASA com as letras APXP (onde A = C, Para = A, X = S) ou mesmo MRIT, desde que houvesse uma convenção que permitisse isso.


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Além disso, seguindo as possibilidades geradas pela ortografia, a palavra pronunciada casa, em princípio, poderia ser escrita das seguintes formas (apesar de apenas a primeira forma ter sido escolhida pela ortografia).

- CASA - CAZA - CAXA - QASA - QAZA - QAXA - KASA - KAZA - KAXA

Distinguir as letras do alfabeto umas das outras e de outros sinais gráficos como os sinais ortográfico e marcas da escrita é fundamental para o processo de ensino-aprendizagem no qual a criança está inserida. Uma letra não pode ocupar qualquer posição em uma palavra, o nome dê, por exemplo, representa o som /d/, que é o som mais comum que a letra D apresenta. (CAGLIARI, 1999).


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Dois exemplos de escrita silábico-alfabética:

Figura 6. Escrita silábico-alfabética (criança de sete anos). Como podemos observar na escrita de Vitória (sete anos), ela escreve com a preocupação em relacionar os fonemas e os grafemas, às vezes, com sílabas completas e em outras não. Ainda se confunde no som de algumas letras e nem sempre escreve marcando todas as unidades menores que as sílabas no caso da palavra MÇNHA (que representa MAÇA), características dos silábicos-alfabéticos.


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Figura 7. Escrita silábico-alfabética (criança de sete anos). As figuras 6 e 7 mostram que as duas crianças encontram-se no nível de hipótese silábico-alfabético sob a perspectiva da psicogênese da língua escrita. Assim, as crianças parecem passar pelas fases pré-silábica e silábica, atingindo finalmente a alfabética.

Nível alfabético Nesse nível, o aluno já compreendeu o sistema de escrita, entendendo que cada um dos caracteres da palavra corresponde a um valor sonoro menor do que a sílaba. Agora falta ele dominar as convenções ortográficas. Assim, a criança compreende que a escrita das sílabas que compõem as palavras faladas nem sempre podem ser constituídas por elementos menores. Pode-se perceber que essa forma de pensar a escrita pela criança implica uma capacidade para segmentar as palavras em seus constituintes fonéticos, a qual é considerada como conhecimento segmental. Essa descoberta fará com que os critérios quantitativos sejam


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ampliados, buscando um ajuste maior em relação ao número de fonemas que compõem as palavras e ao número de letras que os escreverá. De acordo com Ferreiro e Teberosky (1991, p. 213): A escrita alfabética constitui o final desta evolução. Ao chegar a este nível a criança já franqueou a ‘barreira do código’, compreendeu que cada um dos caracteres da escrita corresponde a valores sonoros menores que a sílaba, e realiza sistematicamente uma análise sonora dos fonemas das palavras que vai escrever. Isto não quer dizer que todas as dificuldades tenham sido superadas: a partir desse momento a criança se defronta com as dificuldades próprias da ortografia, mas não terá problemas de escrita, no sentido estrito [...].

As crianças fazem algumas considerações importantes sobre a escrita nessa hipótese: o Compreendem que a escrita tem uma função social: comunicação; o Compreendem o modo de construção do código da escrita; o A dificuldade que apresentam é a correspondência das grafias, com vários valores sonoros, principalmente nas sílabas irregulares; o Conhecem o valor sonoro de todas as letras ou de quase todas; o Algumas escrevem frases sem deixar espaços entre umas ou outras palavras, separando-as na hora da leitura; o Apresentam

erros ortográficos

comuns, cabendo ao

professor

compreender e aceitar esses erros e facilitando o processo dessa evolução; o Não é ortográfica nem léxica. Dois exemplos de escrita alfabética:


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Figura 8. Escrita alfabética (criança de sete anos). Nessa sondagem de escrita alfabética, o aprendiz passa a compreender que a escrita da sílaba que compõem as palavras faladas nem sempre podem ser constituídas por elementos menores. As palavras podem ser segmentadas por partes, percebendo que as regras de correspondência são ortográficas e não fonéticas.


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Figura 9. Escrita alfabética (criança de sete anos). Podemos perceber que Sabrina (sete anos) já domina o Sistema de Escrita Alfabético, fazendo as correspondências entre os fonemas e os grafemas, atingindo a compreensão de que as letras se unem para formar palavras. Em todas estas situações explicadas o propósito dos adultos não é o de informar a criança. Mas a criança recebe informação sobre a função social da escrita participando desses atos (inclusive se se limita a observar, pois sua observação pode envolver uma importante atividade cognitiva). É provavelmente através de uma ampla e contínua participação nesse tipo de situações sociais que a criança acaba conseguindo compreender por que a escrita é tão importante na sociedade. (FERREIRO, 2001, p. 100)

Assim, a construção da língua escrita é um processo que deve ser constituído em uma prática discursiva e dialógica. Nessa perspectiva, o professor deve influenciar no desenvolvimento da leitura e da escrita do aprendiz, de maneira


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que ele possa expressar-se corretamente e fazer uso de modo competente de diferentes tipos de textos e nas mais variadas situações sociais. Conforme Azevedo e Marques (1997), nenhum desses questionamentos têm, evidentemente, por objetivo, negar a importância da psicogênese da língua escrita para o enfrentamento do grave problema do analfabetismo de crianças e adolescentes brasileiros. Entretanto, reconhecer o avanço não é tudo. É preciso ter a consciência clara que o problema do analfabetismo não é resolvido porque não há vontade política suficientemente forte para consegui-lo e de que se trata, portanto, de uma problemática ideológica e de estar alerta para impedir que os avanços sejam apropriados como armas ideológicas. A aproximação da teoria construtivistainteracionista de alfabetização escolar corre o risco sério de transformá-la em mais um artefato ideológico e, como tal, em um obstáculo antes que um catalisador da emancipação das classes oprimidas. Isso porque – tal como vem sendo praticada – essa abordagem parece muito mais propícia à formação do ledor do que do leitor e, portanto, muito mais coerente com a estratégia astuciosa de uma escola de ensino fundamental que, na tradição liberal, proclama-se universal pública, gratuita, destinada à socialização do saber, mas que, na prática, constrói-se uma escola de saber miúdo, de saber elementar, bem adequada ao adestramento mínimo – necessário e tolerável – do exercício de reserva de trabalhadores acríticos, obedientes e pouco qualificados. Por isso mesmo, vale a pena perguntar se não terá chegado o tempo de buscar, criticamente, o para além de Emilia Ferreiro. Dermeval Saviani (1986, p. 72) ressalta: Esse fenômeno histórico do surgimento daquilo que chamamos de “Escola Nova Popular” põe em evidência que a questão escolar na sociedade capitalista, dada a sua divisão em classes com interesses opostos, é objeto de disputa. Assim como a escola tradicional, proposta pela burguesia, voltase contra seus interesses obrigando a uma recomposição de hegemonia através da Escola Nova, assim também a Escola Nova não fica imune à luta que se torna predominante e toma conta das cabeças dos professores, é inevitável o surgimento de pressões no sentido de que a Escola Nova se generalize. Se o escolanovismo pressupõe métodos sofisticados, escolas mais bem equipadas, menor número de alunos em classe, maior duração da jornada escolar; se se trata de uma escola mais agradável, capaz de despertar o interesse dos alunos, de estimulá-los à iniciativa, de permitirlhes assumir ativamente o trabalho escolar, por que não implantar esse tipo de escola exatamente para as camadas populares onde supostamente a passividade, o desinteresse, as dificuldades de aprendizagem são maiores?

Assim, em universos culturais complexos como o nosso, há um afastamento necessário e inevitável entre a língua escrita e as línguas faladas, cada um fala a


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língua com o vocabulário, a sintaxe e a pronúncia recebidos em sua comunidade nativa. Essa língua é tão boa quanto todas as outras. Na escola, depois de aprender a representar por escrito o seu falar nativo, aprende-se o vocabulário, a sintaxe e a ortografia convencionais do português escrito. Tal aprendizagem deve ser-lhe dada como uma porta que se abre para o vasto mundo do saber e do trabalho e não uma pedra tumular a atirar sobre o seu falar de casa. É por isso que dissemos ser melhor deixar as coisas mais ou menos como estão. A parte correspondente ao mais é a de que a meta consiste em facultar a todos o uso passivo e ativo da língua escrita. A parte correspondente ao menos é a de que antes de chegar à língua escrita padrão, a escola deve aceitar a expressão linguística do aluno que usa a língua nativa de sua comunidade (LEMLE, 1988). [...] ao lado da correção e da incorreção (e a correção é de cada variante de língua), não faz sentido, a não ser por uma metáfora, dizer “isso está errado em português”. Nunca há um erro em português, haverá sempre um erro numa variedade de língua. Uma forma ou construção pode estar errada numa comunidade, mas com certeza é vigente em outra comunidade. Nessa mesma linha de pensamento é certo que ninguém aprende o português, nós sempre aprendemos uma variedade ou algumas variedades de língua histórica, isso sem falar nas diferenças cronológicas, diacrônicas da mudança. Em suma, nós não falamos, não conhecemos a língua portuguesa na sua totalidade e em suas variedades regionais, sociais e nacionais. Ainda mais porque nossa língua ainda é muito pouco estudada; há muito por se fazer em matéria de registro e descrição das variedades da língua portuguesa. É um domínio virgem, quer num capítulo paralinguístico, que é o capítulo da fonética e da fonologia, quer num capítulo puramente gramatical, que é o capítulo da morfossintaxe, quer num capítulo da lexicologia e da semântica [...]. (AZEREDO, 2007, p. 15)

Assim, em uma sociedade letrada saber ler e escrever é insuficiente para o conhecimento adquirido e desenvolvido, para responder as demandas da sociedade é preciso ter capacidade de não apenas decodificar letras e sons, mas entender os significados e usos das palavras em sua totalidade. Portanto é necessário o desenvolvimento de um trabalho sistemático e diário que leve os alunos a refletir sobre os princípios desse sistema, a fim de levar o processo de ensino aprendizagem de modo significativo.


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CAPÍTULO 4 PESQUISA DE CAMPO E ANÁLISE DOS DADOS

Com as pesquisas construtivistas sobre a psicogênese da língua escrita, que teve como destaque as pesquisadoras Emilia Ferreiro e Ana Teberosky, entre outros pesquisadores, a alfabetização passou a focar o como ensinar para como aprender. Ou seja, para além de discussões sobre os métodos, as questões relativas ao processo do sistema de escrita alfabética ganharam destaque. Com objetivo de investigar as reflexões encontradas ao longo do levantamento bibliográfico, foi realizada uma pesquisa de campo com abordagens qualitativas no âmbito escolar. A pesquisa de campo originou-se pelo fato de a alfabetização não se tratar apenas do ato de ensinar ler e escrever. Alfabetizar requer do professor atitudes que favoreçam a interação, disposição, estudo, criatividade e possibilidades de intervenção pedagógicas mais significativas. É nesse sentido que Severino (2007, p. 23) ressalta: Na pesquisa de campo, o objeto/fonte é abordado em seu meio ambiente próprio. A coleta dos dados é feita nas condições naturais em que os fenômenos ocorrem, sendo assim diretamente observados, sem intervenção e manuseio por parte do pesquisador. Abrange desde os levantamentos (surveys), que são mais descritivos, até estudos mais analíticos.

A pesquisa de campo foi realizada nas salas de aulas da Escola Estadual Marechal Floriano, localizada na Rua Dona Júlia, 37 – Vila Mariana, cidade São Paulo.

Metodologia aplicada à pesquisa de campo Para esta pesquisa, foi utilizado, como ferramenta, um questionário. Sobre isso, Severino (2007, p. 125), define questionário como: [...] conjunto de questões, sistematicamente articuladas, que se destinam a levantar informações escritas por parte de sujeitos pesquisados, com vistas a conhecer opinião dos mesmos sobre assunto de estudo. As questões devem ser pertinentes ao objeto e claramente formuladas, de modo a serem bem compreendidas pelos sujeitos. As questões devem ser objetivas, de modo a suscitar respostas igualmente objetivas, evitando provocar dúvidas, ambiguidades e respostas lacônicas.


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A escolha das professoras teve como critério a experiência em sala de aula em escolas públicas, principalmente nos anos iniciais, período em que ocorre o processo de alfabetização e pelo fato de eu atuar como aluna pesquisadora do programa bolsa alfabetização, nesta instituição de ensino. Para conhecer a atuação das professoras pesquisadas nas classes de alfabetização, foi aplicado um questionário, estratégia utilizada para obter informações acerca da problemática da pesquisa, e também para verificar como elas se posicionam em relação às questões propostas. Serviram também para refletir sobre sua trajetória escolar e sua concepção de professora. O questionário utilizado nesta pesquisa (ver roteiro em anexo) contém 11 questões, sendo oito fechadas algumas com justificativas das respostas, e duas abertas. Todas as questões foram aplicadas a professores alfabetizadores atuantes em salas de aula. Tanto as perguntas abertas como as fechadas foram formuladas com a intenção de investigar o tema da pesquisa, que serão analisadas e comentadas, tendo como ponto de referência as respostas das professoras, para que se possa fazer uma comparação mais acentuada sobre a pesquisa. Neste questionário procurou-se identificar por meio de perguntas abertas e fechadas as características e o funcionamento do sistema de escrita. Diante disso, foi desenvolvida uma pesquisa exploratória com abordagem qualitativa. A pesquisa qualitativa refere-se à totalidade de metodologias com referências de estudos críticos de como se produz o conhecimento. Dessa forma, as respostas das professoras entrevistadas variam de acordo com as noções básicas que elas adquiriram na área do conhecimento, experiência de vida e vivências de cada uma das entrevistadas.

Os sujeitos da pesquisa de campo Com o intuito de pesquisar sobre as considerações encontradas ao decorrer desta pesquisa bibliográfica, foi elaborado um questionário entregue a quatro professoras alfabetizadoras de escolas públicas, atuantes em sala de aula, sendo que três possuem formação de nível superior, uma possui o magistério e está


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cursando o superior. A amostra pesquisada teve como critério os anos iniciais, período em que ocorre o processo de alfabetização. Reforçando a garantia do sigilo e preservação da identidade dos entrevistados propostas no Termo Livre e Esclarecido, a transcrição das respostas do questionário, foram colocadas como professoras A (terceiro ano); B (segundo ano); C (primeiro ano); e D (primeiro ano); todas do ensino fundamental I. A seguir, uma tabela com os dados das entrevistadas.

Tabela 1: Perfil dos sujeitos da pesquisa. SUJEITO IDADE

FORMAÇÃO

A

39

Magistério Pedagogia (cursando)

B

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Pedagogia

C

50

Pedagogia

D

61

Pedagogia História

TEMPO DE FORMAÇÃO Mais de 10 anos Mais de 10 anos Mais de 10 anos 5 a 10 anos

PÓSGRADUAÇÃO – – Deficiência visual Educação infantil

O ambiente de atuação dessas professoras entrevistadas é a sala de aula, elas incorporam no trabalho diário novas perspectivas de aprendizagem para que o caminho da alfabetização seja percorrido com segurança.

A aplicação do questionário Os entrevistados receberam com o questionário, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, para serem informados do conteúdo pertinente da pesquisa e permitissem a utilização e propagação de suas respostas, com a preservação de suas identidades. Os questionários foram entregues pessoalmente para as professoras a fim de serem respondidos espontaneamente, sem intervenção da pesquisadora, com prazo


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adequado e as entrevistadas demonstraram interesse em colaborar com a pesquisa. As questões com abordagem qualitativa estavam todas colocadas em uma só folha. Foi observado que todas as docentes procuraram responder da melhor forma possível, dando significado a suas respostas, com clareza.

Análise e interpretação dos dados A análise dos dados foi realizada com base nas respostas das professoras sobre o conhecimento que cada uma tem sobre o processo de alfabetização, na qual se obtiveram resultados por meio de um questionário com perguntas fechadas e abertas. Dessa forma, os resultados obtidos refletem a análise do questionário sobre as opiniões das professoras a respeito da importância da alfabetização e as formas necessárias para ter uma boa aprendizagem. As quatro primeiras perguntas estão sintetizadas no Tabela 1. Na quinta pergunta, Você fez/faz algum curso pelo governo?, as professoras responderam da seguinte forma: - Professora A: Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa – PNAIC - Professora B: Letra e vida: Projeto Intensivo no Ciclo – PIC; - Professora

C:

Professor

alfabetizador;

Informática;

Ensino

da

matemática para os anos iniciais; - Professora D: Professor Alfabetizador; Teia do Saber; Letra e vida; Informática; Ensino da matemática para os anos iniciais. Podemos perceber que esse tipo de formação ajuda os professores a repensarem a própria prática, moldando-a de acordo com os novos movimentos dentro da pedagogia da alfabetização (BRASIL, 1997). Com isso, a formação continuada em serviço, de acordo com Libâneo (1994), vai se constituindo como um fator essencial para o desenvolvimento profissional do professor dentro das novas diretrizes.


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Quanto à sexta pergunta, Você se considera tradicional, contrutivista ou ambos, as professoras responderam da seguinte forma: (A) construtivista; (B) ambos; (C) construtivista; (D) construtivista. Relevante pensar que a professora B responde que é tanto construtivista quanto tradicional. Ela afirma que utiliza atividades diversificadas para alfabetizar seus alunos. Para Libâneo (1994), muitos professores se autoformam dentro de um imaginário que o remete a seus professores do passado, quando ainda eram alunos. Sendo assim, estamos atrelados a um modelo tanto tradicional, remetendo ao passado, como ao construtivista, baseando-se em novas formas de trabalhar dentro da sala de aula. Para Ferreiro e Teberosky (1991), o ideal seria pensarmos no alfabetizando como uma pessoa que deve construir sua forma de adquirir a linguagem escrita baseando-se nas próprias hipóteses. Na sétima pergunta, Na sala de aula, há separação de alunos com dificuldades dos que estão em processo avançado de alfabetização?, as professoras foram unânimes em dizer que não fazem essa distinção. - Professora A: Não, porque o caminhar junto é que fará a criança avançar. - Professora B: Não, porque cada aluno tem seu tempo de aprendizado. - Professora C: Não, acredito que cada aluno deve avançar no tempo adequado e que podemos propor desafios e acreditar no seu crescimento. - Professora D: Não, sala heterogênea. Cada aluno avança de acordo com seu tempo. Apesar das respostas negativas, levantamento informal feito com bolsistas que acompanham professoras do 2º ano aponta que a grande maioria trabalha com as crianças que não conseguem se alfabetizar ou que apresentam problemas de comportamento ou que tem necessidades educacionais especiais. Isso indica que há uma separação dentro da sala de aula para os que não conseguem, por qualquer motivo, acompanhar o ritmo da turma.


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Na oitava pergunta, Há algum material obrigatório (determinado por instâncias superioras) que deve ser usado pelo professor alfabetizador? As professoras diferiram em suas respostas: - Professora A: Não. - Professora B: Sim, Ler e escrever. - Professora C: Sim, Livro didático da língua portuguesa; matemática; Ler e escrever; e atividades propostas pelo EMAI Matemática. - Professora D: Sim, Ler e escrever; Saber matemática; Hoje é dia de português; e pesquisa na Internet. Apesar de a Professora A dizer que não utiliza algum material obrigatório, ela fez um curso (PNAIC), o que impacta na sua atuação em sala de aula, visto dizer ser uma professora construtivista. Já as outras professoras centram-se em material didático do projeto Ler e escrever e outros livros didáticos. Isso é um indicativo que esses projetos do governo incentivam a mudança de prática pedagógica do professor alfabetizador (LEAL; MORAIS, 2010) Na nona pergunta, Você procura novos recursos quando o objetivo de alfabetização

não

é

alcançado?,

todas

as

professoras

responderam

afirmativamente a essa questão, dando as seguintes razões: - Professora A: temos que ir em busca de algo que leve a criança ao crescimento. - Professora B: de alguma maneira tenho que ajudar esse aluno a avançar. - Professora C: um recurso é a tecnologia como notebook, jogos e brincadeiras. Outro recurso é o lúdico, que torna a aula muito mais interessante. - Professora D: procuro a coordenadora pedagógica. Elas se dizem preocupadas com o avanço do aluno e isso é natural, visto que o objetivo precisa ser alcançado geralmente até o final do ano letivo. Procurar ajuda


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em novos materiais ou na pessoa da coordenação é relevante, pois indica certa preocupação no desempenho profissional (BRASIL, 1997). Na décima pergunta, Que tipo de aluno sente mais dificuldade na alfabetização?, as professoras apontaram diversas causas para o problema, todas externas a própria atuação como profissionais da educação. - Professora A: O aluno que não tem interesse em apreender. - Professora B: Aluno com algum problema de aprendizado, déficit de atenção, hiperativo... - Professora C: Acredito que é mais difícil para alunos com alguma deficiência e para aqueles que a família não se compromete com o ensino/aprendizagem. - Professora D: Os alunos que a família não pode cuidar e trazer laudo médico, dificulta o tratamento/aprendizado e o cuidar fica mais difícil. Podemos perceber que o discurso de todas elas recai na mesma hipótese: o aluno que apresenta problemas de aprendizagem. Para Libâneo (1994), a solução para essa questão está, muitas vezes, atrelada ao desempenho do professor dentro da sala de aula. O docente precisa repensar suas estratégias de ensino, repensar sua forma de agir. Isso significa repensar seus métodos para atingir igualmente todas as crianças, evitando estigmatizar aquelas crianças que, por algum motivo, não conseguem aprender. Na décima primeira e última pergunta, Como são as suas avaliações diagnósticas?, as professoras apresentaram respostas diversificadas: - Professora A: Contínuas, através de reescritas, rodas de conversa. - Professora B: Listas de palavras do mesmo campo semântico, parlendas e música. - Professora C: Sondagem (uma vez por mês) de palavras para os alunos não alfabéticos, sondagem de escrita de um trecho de um texto ou cantiga para os alfabéticos, provas bimestrais e atividades em folha.


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- Professora D: Sondagem todo o mês para ver se o aluno avançou nas hipóteses silábicas, e na matemática cálculo solução problema com desafios. Nessa questão, esperávamos recursos diversos para a questão da avaliação, visto que o aluno, de alguma forma, precisa ser avaliado para repensar próximos passos e evolução da aquisição de conhecimentos (BRASIL, 1997). A pesquisa demonstrou que os questionamentos em relação ao domínio da língua escrita e da leitura é um fator relevante para uma participação social mais ativa, uma vez que é por meio dela que o ser humano se comunica, tem acesso à informação, expressa e defende seus pontos de vista, enfim, produz conhecimento. Sendo assim, de acordo com a análise das respostas obtidas no questionário, constatamos que as professoras buscam suportes para desenvolver a prática da alfabetização em sala de aula, estão preocupadas com avanço dos alunos no processo de ensino aprendizagem, desenvolvem as competências necessárias para que os alunos dominem a linguagem de maneira eficaz.


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CONSIDERAÇÕES

Considerando os estudos deste Trabalho de Conclusão de Curso, foi possível compreender os processos de alfabetização, que se desenvolve a partir da análise e reflexão que o aprendiz faz sobre o sistema da língua escrita, como já discutiu neste artigo a alfabetização deve se construir em contextos de uso dos conhecimentos que os alunos possuem, de uma forma discursiva e dialógica, num processo interativo, deve se ensinar, portanto, a partir de variados e significativos textos, expressados como um todo, esse percurso levará à formação de crianças leitoras e escritoras. Como vimos, é necessário que professor considere as escritas do ponto de vista construtivo, representando a evolução de cada criança. Nesse sentido, o diálogo estabelecido na sala de aula, mediado pelo conhecimento, o tipo de atividade proposta, o material de leitura influenciam no pensar e no desenvolvimento da escrita do aluno. De acordo com os estudos da área da linguística, percebe-se que não se constrói a aprendizagem por meio de um método mecânico. A língua é um fenômeno social, não funciona sempre do mesmo jeito, ela muda de acordo com o contexto, a situação de produção e o planejamento do interlocutor. Portanto, a alfabetização não é repetir um modelo pré-determinado, mas a capacidade de fazer uso da linguagem em diferentes situações de comunicação, usar a língua para seus variados fins. Nesse sentido, Ferreiro e Teberosky (1991), com sua teoria psicogenética da língua escrita, estuda a criança como um ser universal que levanta hipóteses sobre a escrita, passando pelo desenvolvimento da aquisição da língua escrita numa ordem determinada. Entendeu-se também que o processo da construção da língua escrita tem uma evolução em níveis, embora esses não devam ser considerados absolutos, podendo haver limitação de um para outro. Portanto os educadores precisam de conhecimentos teóricos sólidos para apoiar sua prática, conhecer como se dá o processo de aquisição da língua escrita


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pelo aprendiz, no início da aprendizagem, e entender a natureza desse objetivo, são questões fundamentais para entender e respeitar o processo de desenvolvimento da criança. Este artigo possibilitou conhecer o desenvolvimento cognitivo das crianças na aquisição da língua escrita, em que elas vão construir de dentro para fora, apropriando-se da alfabetização com diversos gêneros textuais e tendo prazer pela leitura.


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REFERÊNCIAS

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MORTATTI, M. R. L. Histórias dos métodos de alfabetização no Brasil. Conferência proferida durante o Seminário Alfabetização e letramento em debate, promovido pelo Departamento de Políticas de Educação Infantil e Ensino Fundamenta da Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação, realizado em Brasília, em 27 abr. 2006. PÉREZ, Francisco Carvajal; GARCÍA, Joaquín Ramos. (Orgs.). Ensinar ou aprender a ler e a escrever? Traduação de Cláudia Schilling. Porto Alegre: Artmed, 2001. ROAZZI, A.; LEAL, T. F.; CARVALHO, M. R. A questão do método no ensino da leitura e da escrita. Teresina: APECH; UFPI, 1996. RODRIGUES, Neidson. Lições do príncipe e outras lições. São Paulo: Cortez; Autores Associados, 1985. SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. São Paulo: Cortez; Autores Associados, 1986. SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 23. ed. São Paulo: Cortez, 2007. VYGOTSKY, L.S. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1989. WEISZ, Telma. Como se aprende a ler e a escrever ou prontidão: um problema mal resolvido. In: SECRETARIA DE EDUCAÇÃO. COORDENADORIA DE ESTUDOS E NORMAS PEDAGÓGICAS. Ciclo Básico. São Paulo: SE; CENP, 1988. WEISZ, Telma; SANCHEZ, Ana. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem. 2. ed. São Paulo: Ática, 2003.


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ANEXOS

Anexo 1

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO

Você está sendo convidado (a) a participar, como voluntário (a), da pesquisa As contribuições da psicogênese da língua escrita no processo de alfabetização. No caso de concordar em participar, favor assinar ao final do documento. Sua participação não é obrigatória e, a qualquer momento, poderá desistir de participar e retirar o seu consentimento. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a instituição. Será realizada uma avaliação, na qual será mantido, em absoluto sigilo, sua identidade, e não haverá despesas nem qualquer compensação financeira relacionada à sua participação. As informações coletadas para o referido trabalho estarão disponíveis a você, aos pesquisadores e à entidade envolvida, podendo ser divulgados para fins científicos, mantendo sua identidade preservada. Este trabalho está sendo realizado pela acadêmica pesquisadora Rozana Figueiredo Menezes, sob orientação do Prof. Dr. Persio Nakamoto. O telefone para eventuais esclarecimentos é: (11) 5074-1010 (Faculdade Método de São Paulo – FAMESP).

CONSENTIMENTO DE PARTICIPAÇÃO DO EDUCADOR Eu,_______________________________________________, RG__________________, CPF________________, declaro que li as informações contidas nesse documento, fui devidamente informado (a), pela pesquisadora, dos procedimentos que serão utilizados, riscos, benefícios e sigilo da pesquisa, concordando ainda em participar desta. Foi-me garantido que posso retirar o consentimento a qualquer momento, sem que isso leve a qualquer penalidade. São Paulo, _____ de novembro 2013.

_______________________ Assinatura


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Anexo 2 QUESTÕES 1. Nome: 2. Qual a sua formação? ( ) Magistério

( ) Pedagogia

( ) Outra:_______________

3. Quando se formou? ( ) Menos de 5 anos

( ) 5 a 10 anos

( ) Mais de 10 anos

4. Você fez pós-graduação? ( ) Sim. Qual?

( ) Não.

5. Você fez/faz algum curso pelo governo? ( ) Sim. Qual?

( ) Não.

6. Você se considera: ( ) Tradicional

( ) Construtivista

( ) Ambos

Se ambos, em que situações utiliza um ou outro? 7. Na sala de aula, há separação de alunos com dificuldades dos que estão já estão em processo avançado de alfabetização? ( ) Sim. Por quê? ( ) Não. Por quê? 8. Há algum material obrigatório (determinado por instâncias superioras) que deve ser usado pelo professor alfabetizador? ( ) Sim. Você o utiliza? ( ) Não 9. Você procura novos recursos quando o objetivo de alfabetização não é alcançado? ( ) Sim. Por quê? ( ) Não. Por quê? 10. Que tipo de aluno sente mais dificuldade na alfabetização? 11. Como são as suas avaliações diagnósticas?


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