Fazendo 101

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FAZENDO 101 o boletim do que por cá se faz

junho 2015

gratuito

a própria palavra europa é de origem grega

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Ficha Técnica

Sumário

Crónica

Directores aurora ribeiro tomás melo

a ilha... por helena melo medeiros .10104

Colaboradores albino pinho ana lúcia almeida assunção melo fernando nunes helder marques da silva helena melo medeiros joão daponte nuno rafael costa paco garcia paulo alexandre monteiro paulo vilela raimundo ricardo ribeiro

Sociedade

as tribos por paulo vilela raimundo .10106

Arte

Revisão aurora Ribeiro

the american century por assunção melo .10108

Capa lúcia de brito franco Paginação raquel vila

Cinema

cowspiracy por ricardo ribeiro

Projecto Gráfico ilhasCook

ilustração Raquel Vila

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História

o dori por paulo alexandre monteiro .1016

Ciência

campanhas de investigação por helder marques da silva .10118

or t o P s em a t Pi r a Pim julho Nov a da c e o gr i r d 9 áb é li t e r ário mio 21h30 F f aia ia l e ns Bale da livre e Entra 2 de ça ju d an 21h0 lho 0 d e A B an c o rt assoc cultural fazendo Entra istas da liv rua conselheiro medeiros nº 19 re l eit u r 9900 horta a propriedade

sede

periodicidade

tiragem

mensal

500 exemplares

impressão

o telégrapho

registado na erc com o nº125988

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FAZENDO 101 Capa Lúcia de Brito Franco

ele chegou descontraído caminhando sozinho. devagar se vai ao longe devagar eu chego lá mostra­-me o teu rosto menina mulher da pele preta combinação de cores perfeição tropical Quando estamos no mar, as ondas, por vezes parecem montanhas, movendoaqui onde estão os homens no pela horizonte. Balanceando eu vou -se torcer paz, alegria e amor. o casco do barco, no oceano que parece infinijá consultei os astros to. Sentimos na pele, o quão precioso pode­-seévoar até às estrelas estarsozinho vivo face aos elementos granao sair diosos da ilhada natureza. Estar atento ao que nos rodeia. A atenção é essencial na viuma cabana vência do lugar e esta varia consoante peixe fogo cru a percepção de cada um. Consoante a figo sãodisponibilidade e o nível a que nos disa obra solar está completa o lugar. pomos a vivenciar e a força é toda a força O diamante caminho que tenho seguido é de ponta de abertura ao deslumbramento. O glória do mundo próximo com os elementos, contacto o que écaptado que eu quero mais in situ através dos sentidos. Olhar, cheirar, saborear, escuse eu sei que asentir, vida é bela e linda. tar o mundo como se fosse uma criansaudade até que é bom ça. Com uma curiosidade inata de melhor que caminhar sozinho quem experimenta a graça de estar o simples pode ser belo vivo, neste corpo, aqui e agora. e o belo pode ser simples Mar é o tema principal do projeco certo Ao muito verdadeiro to artístico que estou a desenvolver e em todo o mundo se vive

Residência artística, no Banco de Artistas, Horta Exposição de pintura de 31 de Julho a 9 de Agosto

no Faial. Desde pequena que pratico mergulho em apneia e, tenho pelos Açores um fascínio especial. Ir ao mar é estar lá em comunhão plena. O projecto incide a atenção sobre a captação sensorial do mundo submarino. Como transmitir pictoricamente, as sensações físicas do corpo no meio dos elementos? A luz atravessando a coluna de água, o som que se propaga ao longe e ao perto se sente no corpo, a temperatura e a sua variação consoante a corrente e a profundidade, a escuridão e a pressão à medida que descemos, o sabor da água, a força das correntes, os diferentes níveis de visibilidade. A sensação resultante do encontro com a vida marinha.

Fernando Nunes

Para além do mar, há outras fontes de inspiração. A força ígnea que molda a terra. As florestas verdejantes, os sinuosos contornos curvilíneos da paisagem. A transição entre rocha preta escaldante e o mar frio. O ar quente e o interior da floresta fresco. A lumínica da atmosfera ao longo do dia, variando com a nebulosidade e a altitude.

O século começa com o Ano Internacional da Mobilização contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Todas as Formas de Intolerância. “Porto 2001” é a nomenclatura usada na iniciativa do Porto Capital Europeia da Cultura 2001 em conjunto com a cidade holandesa de Roterdão. É por essa altura que se dá o lançamento da edição em português da Wikipédia. O Instituto Açoriano de Cultura publica o livro de fotografias “A’ssimetrias”, de Américo Silva. O poeta terceirense, Emanuel Félix, dá a conhecer a obra “Viagens na Minha Era” (Lisboa, Temas e Debates) e a poetisa micaelense, Renata Correia Botelho, publica “Avulsos, por causa” (edição de autor, fora do mercado). Eugénio de Andrade, autor do poema “Urgentemente” e de uma vasta obra poética, recebe o prémio Camões. Os cineastas Joaquim Pinto e Nuno Leonel filmam em São Miguel o documentário “Rabo de Peixe”, que obteve recentemente uma remontagem para estar presente na edição do festival de Berlim, fora de competição. No seguimento das eleições autárquicas de Dezembro desse ano, o Primeiro Ministro António Guterres pede a demissão e são convocadas eleições legislativas antecipadas pelo Presidente Jorge Sampaio.

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NÃO ESTEVE PRESENTE NO LANÇAMENTO DA 100ª EDIÇÃO? O Fazendo conta… Fascínio, desterro ou exclusão, a ilha tem despoletado sentimentos contraditórios por parte de quem a procura ou de quem nela se vê forçado a permanecer. Agridoce destino, quiçá, rodeado de pitadas de sal por todos os lados. Felizmente rico, neste prato cultural das periferias insulares vai-se fazendo alguma coisa de útil. No lançamento da centésima edição do Fazendo, entre vários ilustres convidados, marcou presença o Professor Doutor António Pinto Ribeiro, cujo estudo incide sobre as Teorias das Culturas e a Estética, a Programação Cultural e Artística. Para ele o imaginário da ilha assenta num binómio antigo que tem funcionado como um arquétipo da cultura ocidental aquando da relação ilha-continente. A ilha, lugar utópico, tal como Saramago a via, lugar de salvação, do abrigo como o foi para Robinson Crusoé, da liberdade (ilha de Lesbos, ilha dos amores do canto IX dos Lusíadas); mas também ilha da condenação perpétua (Tarrafal, Sta. Helena, ilha de Próspero). E do ponto de vista da autorrepresentação, a ilha, de modo geral, funciona como o lugar do desterro, da exclusão, do lugar de onde se quer fugir). Feita a apresentação do tema, a assistência visionou um excerto do filme Robinson Crusoé (1954), de Luís Bunuel, relativo ao primeiro encontro de Robinson com aquele que, mais tarde, seria nomeado de Sexta-feira. Robinson Crusoé é um romance escrito por Daniel Defoe, publicado originalmente em 1719, no Reino Unido. A obra é a autobiografia fictícia do personagem-título, um náufrago que passou 28 anos numa remota ilha tropical próxima da Trindade, encontrando canibais, cativos e revoltosos antes de ser resgatado. O título original da obra em in-

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glês é: The Life and Strange Surprizing Adventures of Robinson Crusoe, of York, Mariner: Who lived Eight and Twenty Years, all alone in an un‐inhabited Island on the Coast of America, near the Mouth of the Great River of Oroonoque; Having been cast on Shore by Shipwreck, wherein all the Men perished but himself. With An Account how he was at last as strangely deliver’d by Pyrates. Mas qual a pertinência desta obra (com um título à medida do século XVIII!) para compreender a importância da ilha enquanto lugar físico e imaginário? Aqui o homem dito civilizado encontra um ser que considera inferior e torna-se senhor dele. É a personagem Robinson quem afirma: “Chamava-me Meu Senhor.” “Robinson reproduz, assim, toda a civilização europeia na ilha, a começar pela violência e pela afirmação da supremacia do europeu como colono subjugando o Sexta-feira.” –referiu António Pinto Ribeiro. De seguida, a audiência pôde visionar um excerto do filme da peça shakespeariana escrita entre 1610 e 1611, A Tempestade, com Christopher Plummer, dirigida por Des McAnuff. Tida por muitos críticos como a última peça escrita pelo dramaturgo inglês William Shakespeare, a obra passa-se numa ilha remota, onde Prós-

pero foi exilado num ato de traição política. Próspero, duque de Milão por direito, planeia colocar a filha Miranda no poder, mediante ilusão e manipulação. Próspero de nome, o mago poderoso invoca então uma tempestade, visando assim atrair o irmão António (agora duque) e o rei Alonso de Nápoles (cúmplice do irmão), para a ilha. Com a ajuda do disforme escravo Caliban e do assexuado Ariel (que se pode metamorfosear em ar, água ou fogo), na ilha, lugar de revelação, António revela a sua vileza, o rei Alonso lá encontra a sua redenção e Miranda, o seu casamento com Ferdinando, filho de Alonso. Então, o que representa a ilha? “Qual é então o discurso do ilhéu, do periférico?”-interrogou retoricamente António Pinto Ribeiro. “É o de ser múltiplo e plural.” -res-


crónica

pondeu. A ilha é, segundo Edward Said, lugar de “ múltiplas identidades”. E é em busca destas múltiplas identidades que o discurso prosseguiu. Então, a ilha é símbolo do que de mais profundo, íntimo, obscuro e secreto existe na alma de cada ser, ou mesmo de uma nação. Citando Eduardo Lourenço que afirmou em recente entrevista ao Público (18 de maio) que “[e] m todos os momentos importantes, as nossas referências continuam a ser as mesmas, as do Império perdido”, António Pinto Ribeiro ressalvou o problema da identidade e da representação do povo português que teima “em não querer abandonar um passado em tantas coisas mítico porque construído com base em narrativas provenientes de uma só face: a da gló-

ria passada.” Deste modo revela-se “a incapacidade que uma comunidade revela para lidar com o presente a partir de culturemas do presente –, problema que consiste em evocar um passado construído como auto-representação do país e da comunidade, resulta no reforçar de uma identidade passadista e anacrónica a partir de discursos em loop e de uma certa produção cultural material e imaterial.” E é então que faz uma crítica aos recentes discursos do governo: “Além de kitsch, este tipo de discurso que temos ouvido dos governantes é parasitário do presente, sendo um revivalismo e também uma tentativa de vingança contra as narrativas científicas mais inovadoras que as ciências humanas e sociais produziram em Portugal e na Europa nas últimas décadas.” Ainda no discurso político apelou a uma “identidade sem fronteiras”. De um modo geral, há uma tendência para segmentar a cultura. Fala-se em cultura portuguesa, cultura espanhola, etc., mas esta conceção revela-se anacrónica, pois a globalização da economia, dos fluxos de bens e pessoas permitem a um português criar e produzir fora do seu país de origem; do mesmo modo um estrangeiro pode residir em Portugal e fazer o mesmo. A identidade está em construção e resulta de vários fatores. António Pinto Ribeiro defende que “se abandone a designação de cultura nacional – as expressões “cultura portuguesa” ou

“cultura espanhola” ou “chinesa” – e que se passe a falar da cultura que se produz em Portugal ou em Espanha ou na China e que por outro lado se possa ir mais além quando as tradições ou as narrativas de um país possam ser problematizadas a partir de fora das suas fronteiras geográficas.” O mesmo se verifica no domínio da programação cultural. António Pinto Ribeiro defende que “uma programação ou uma curadoria de uma forma não necessariamente explícita (quase nunca) para além de apresentar obras, artistas, textos, filmes, programas de educação cultural é uma programação de valores; sim, transmite valores. E o cinema e a literatura estão plenos de valores como a democracia, a bondade, o cuidado. Quer na ilha, quer na periferia, não se deveria falar de cultura, mas de “práticas culturais não sujeitas a uma mítica e falsa identidade local...porque esta é uma construção do passado…” E, mesmo vivendo em ilha, poder-se-á ser cosmopolita através das relações culturais. E agora, para vós, leitores, espero que este artigo vos tenha agradado… mas que vos tenha sabido a pouco, pois termino com duas frases de António Pinto Ribeiro: “Nunca dar aos públicos tudo o que eles querem… Dar-lhes sempre uma parte do que desejam.” Um agradecimento especial ao Professor Doutor António Pinto Ribeiro por tão gentilmente ter cedido as suas notas, sem as quais não seria possível transcrever ipsis verbis as suas sábias palavras.

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sociedade

Nunca existiu uma população global “tão habilitada, tão bem formada, tão consciente, tão…, tão…., tão...” Da janela da nossa memória coletiva constato que, desde que nos conhecemos como espécie, sempre vivemos de um modo gregário e dependentes do grupo. Esta característica vem-se fazendo sentir desde que os primeiros hominídeos se organizavam em família, tentando sobreviver num planeta que em tudo lhes era perigoso e claramente fora do seu controle. Desde então, a raça humana vem crescendo exponencialmente em número e em abrangência territorial, sendo atualmente a espécie que, no âmbito de todas as espécies vivas do globo terrestre, mais influencia o ecossistema e, claramente, mais o agride. Porém, a necessidade intrínseca de vivência em sociedade vem mantendo e intensificando essa vocação demonstrada como necessária para sobreviver. Será mesmo assim? Das religiões às raças, dos partidos aos lobbies de interesse, das escolas aos empregos,… a verdade é que ainda hoje insistimos nesse modelo social, deixando de fora todos os que por falta de convicção ou de espírito de liderança/vassalagem se demonstram como “fora de formato”. Numa época em que generalizadamente se “embandeira em arco” com

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AS TRIBOS Paulo Vilela Raimundo

Yuppies, Hipsters, Y a afirmação de que nunca existiu uma população global “tão habilitada, tão bem formada, tão consciente, tão…, tão…., tão...” verificamos que mesmos os que se pretendem assumir como indivíduos originais, autosuficientes e independentes… se refugiam em modelos pré-definidos e com códigos, linguagens e atitudes de sub-raça. Durante todo este processo evolucionista, vem-se esquecendo que todas as moedas têm duas faces e, como seria de esperar, a consolidação de um grupo parcelado do resto da espécie humana vem gerando a coesão interna (quando verdadeira…) e a exclusão dos demais, fracionando a sociedade e propiciando atitudes de “nós contra os nossos”. Quem não idolatrou os já decanos Yuppies? Que, qual deuses do Olimpo financeiro ocidental, se deliciavam com os proventos das miragens por eles construídas e dos sonhos dos comuns mortais por eles cultivados, na ostentação provocatória de um ficcionado conceito de beleza e de um indestrutível controlo do futuro.

Com o tempo, fomo-nos familiarizando com novos padrões urbanos, que tentando encontrar uma atitude “out of the box” mais não fizeram que recriar modas e atitudes, recorrendo para tal aos sótãos e baús da ancestralidade. Dessa busca surgiram os Hipters que sob roupagens de lenhador snob (camisas de flanela, barbas a condizer,…) se tentavam demarcar dos restantes pelo uso generalizado dos gadjets da moda (iPhones, iPads, i…) e pelo consumo de comida artesanal gourmet. Como se não tivéssemos mais nada que fazer do que interiorizar estes códigos e atitudes de identificação desses grupos auto excluídos pelas alegadas e imaginárias diferenças, eis que surgem os Yuccies, sustentados no conceito de Young Urban Creative, como pessoas jovens, urbanas e criativas. Como que reencarnando os alegados defuntos Yuppies e Hipsters, estes assumem-se como “seus filhos culturais” pretendendo ser bem sucedidos e criativos (o que até me parece


of Game Plants

Cryptomeria Paco Garcia

ilustração Tomás Melo

Não é estranho que a Cryptomeria japonica seja criticada. Obviamente porque ocupa muito espaço, principalmente a nível aéreo, sendo do conhecimento de todos a diminuição da oferta de ar na região.

Yuccies... bem…) mas socialmente confinados “a pessoas de uma classe económica específica e maioritariamente brancas” (Quartz) e que usufruindo do “...“privilégio” de uma educação superior, não querem só ficar ricos rápido, mas querem ficar ricos rápido enquanto mantêm a sua “autonomia criativa”. Também desta, a originalidade, a liberdade criativa e o direito de opinião individual estarão subjugados a regras comportamentais e a gostos e preferências incontornáveis... Mesmo correndo o risco de “queimar as minhas asas”, e em alternativa a uma busca obsessiva da minha tribo, creio que vou rever o filme “Fernão Capelo Gaivota” (1).

(1) Baseado no romance de Richard Bach (Jonathan Livingston Seagull – a story), publicado em 1970 e recriado para cinema por Hall Bartlett, com música de Neil Diamond.

Desde muito jovens, as Cryptomerias (masculinas, femininas e hermafroditas) começam a consumir dióxido de carbono e água em doses que a OPEP (Organização de Países Exportadores de Petróleo) considera excessivas. Esta organização promove, a partir de diferentes lugares do mundo, estratégias para evitar que plantas e outros organismos se reunam e consumam este tipo de substâncias, já que produzem uma quantidade assombrosa de oxigénio. Muitos especialistas indicam que a causa pode ser a falta de movimento (a maioria tem uma vida sedentária) e pelo excesso de chuva que o céu produz, a qual, é utilizada pelas «Creep» (nome que elas usam para se referirem a elas próprias nas suas comunicações) para crescer e engordar. As «Creep» estão a gerar uma tão grande impressão no mundo rural, que estão a incitar a que outras espécies vegetais se unam a elas numa espiral de crescimento imparável. Entre elas encontram-se também algumas plantas invasoras (de clara influência espanhola) que se têm conseguido integrar muito bem, mas, isso sim, sem nunca se desapegarem do seu intruso sotaque. É com estas linhas que convidamos a população a abraçar as «Cryptomerias». Não está confirmada a sua eficácia, mas dizem que faz crescer o cabelo e a barba.


O ROMPANTE ARTÍSTICO DA AMÉRICA NA EUROPA

arte

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THE AMERI A segunda metade do século XX representou, para a América, a oportunidade única de contribuir, decisivamente, nos meios artísticos, para a criatividade e inovação, palavras até então conotadas com o Velho Continente. Várias foram as razões que permitiram esta hegemonia repentina. Para além do Armory Show e do refúgio da intelligentia europeia para os E.U.A. aquando das guerras mundiais, devemos perceber que, também houve condições culturais, políticas, económicas e sociais, propícias ao desenvolvimento de “sementes artísticas”, autóctones do continente americano. Deste modo, para além da ambição e de formar nos últimos 50 anos uma lista de artistas de primeira linha, condicentes com a vanguarda europeia, era necessário trabalhar a sociedade e a cultura de modo a florescer um gosto assente na arte. O resultado desse trabalho começa com o Expressionismo Abstrato e com o surgimento da Escola de Nova Iorque, que propunha um novo trajeto à arte americana, até à data figurativa no sentido de um realismo. De facto, a necessidade de uma hegemonia ligada ao Expressionismo Abstrato gerou, posteriormente, toda uma série de respostas que despertaram o gosto do figurativo e da aceitação de mulheres artistas, mas destes factos falarei mais à frente. É a este dinamismo cultural americano do segundo pós guerra que, em 1941 Henry Luce chama de “American Century” antevendo,

de certo modo, a possibilidade única, a oportunidade inalienável de um país prestes a “definir-se” e a “ampliar-se” pronto a entrar em competição cultural com a Europa. Desgastado, física e moralmente pela guerra, o Velho Continente abriu brecha de modo a que se substituíssem as capitais artísticas - De Paris para Nova Iorque - catapultando não só esta última, mas todo um continente para a cena internacional. Sob o estigma de uma responsabilidade e necessidade de afirmação acrescida, a chave para este sucesso está na leitura atenta das propostas vanguardistas, de modo a dar-lhe um novo sentido. Foi o que de facto fizeram artistas emigrados como Mark Rothko, Willem de Kooning, Hans Hofmann e Arshile Gorky, enquanto que Jackson Pollock e Clyford Still, vieram de outras partes do país. Uma das propostas revistas foi o surrealismo, introduzido por uma jovem comunidade de artistas nos anos 40 através do contacto de exposições, a absorção surrealista enfatizou o mito do inconsciente, bem como incluiu o uso do automatismo e do acaso, e a utilização de técnicas baseadas no processo intuitivo em detrimento da conceção racional. Em 1948 muitos destes artistas surrealistas ao aban-


ICAN CENTURY

Assunção Melo

donarem Nova Iorque, e uma vez de volta à Europa permitiram um distanciamento que se tornou numa via abstrata radical – Expressionismo Abstrato. Este tipo de pintura gestual e de ação foi o mote para o desenvolvimento do suporte físico, numa escala sem precedentes na pintura de cavalete. Para Clement Greenberg, que escreveu “em cima” do acontecimento em 1950, o tamanho monumental desta pintura é definidora das suas características no que concerne à inserção do próprio sujeito no espaço de ação e não fora dele, como até então acontecera. Pollock diz a esse respeito: When i am in my painting, I’m not aware of what I’m doing…because the painting has a life its own. Ao fazer um corte radical com as convenções picturais do passado, Pollock pinta diretamente com a tinta abandonando todos os mediadores. Assim a tela apresenta-se como uma “arena” onde há lugar para o registo do corpo enquanto agente pictural. A este resultado dá-se o nome de “Action Paintig” ou seja, a via que quebrou com todas as distinções entre arte e vida. Há, neste sentido, toda uma implicação cósmica, ao imprimir o gesto de um homem, assumido na sua bidimensionalidade, e ao romper com

todo o sentido ilusório de perspectiva e de representação. Se tivermos em conta que essa representação é o reflexo de uma sociedade, esta só se viria a concretizar, definitivamente, com a “Pop Art” que tornou o “sonho americano” numa realidade tangível, forjada no materialismo da época: Disneyland, Drive-in, McDonalds, etc., enfim, toda uma década de abundância fomentadora da cultura de consumo e que vem assumir o oposto do Expressionismo Abstrato. No entanto estas duas vias convivem lado a lado, sem conflitos, pois também são o reflexo de uma sociedade a dois níveis. Se por um lado, os mais puristas criticavam o abandono da figuração, a arte moderna como destruidora do standard americano e como possível fomentadora do comunismo, por outro lado, não nos podemos esquecer que foi ao figurativismo que os regimes totalitários, ditatoriais e comunistas foram buscar a sua base de apoio, para o fomento dessas ideologias. Neste sentido, ao contrário do que poderia parecer foi o Expressionismo Abstrato que representou, diria mesmo, simbolizou o escape e a diferença das políticas antidemocráticas. Na Segunda Geração da Escola de Nova Iorque, assistimos a ligeiras mudanças quer de focos artísticos (aparecimento da Escola de Belas Artes de S. Francisco e da Escola de Chicago),

quer de atitudes. Esta última prendese a uma mudança de método, uma vez que o Expressionismo Abstrato estava a tornar-se numa espécie de “academia” com muitos “imitadores”, o que não deixava de refletir um certo desgaste. Assim, e influenciados pela exposição de Monet no MoMA em 1955, esta segunda geração procurou o “Impressionismo Abstrato” que se liga mais a um lirismo emergente nos trabalhos de Gaston e Mitchell. Para além disso, o aparecimento de mulheres no mundo artístico, não seria novidade se não constituíssem um “corpo” uniforme e um potentado quantitativo / qualitativo como foi o caso de Joan Mitchell, Jay DeFeo, Joan Brown, Louise Nevelson, Elaine de Kooning, Louise Bourgeois, entre muitas outras. Associada ainda a esta nova geração está o figurativismo de Alex Katz’s, Larry Rivers, Frank O’Hara e Edwrd Hooper, apresentando-se, dentro do realismo, como inovadores no sentido em que se distinguiam da fotografia, apostando nos pormenores do quotidiano vivencial. Para concluir, foi com Pollock catapultado para o panorama artístico por Greenberg que se abriu a brecha no século XX de modo a surgir uma América apostada em concorrer com a Europa. A sua capacidade de interiorização das propostas das vanguardas europeias foi a chave mestra para a rentabilização dessa “brecha”. A capacidade de dotar essa arte de um sentido completamente novo foi, uma lição de vida.

fotografia de Vivian Maier *

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cinema

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Era essa a proposta. Filmar em 35mm a curta-metragem The Syndrome! Havia pouco dinheiro (a deslocação para os Açores e a opção do realizador por filmar em película haviam-no consumido quase todo), eram só 3 dias de rodagem, uma equipa pequena (quase nenhuma iluminação) e muitos décors, mas em São Miguel (o que me convinha!), o jovem realizador espanhol Pedro Calero parecia interessante, a história era estranha, a produção British (Channel 4) e, sobretudo, era em 35mm!

FAZENDO

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Era essa a proposta. Filmar em 35mm a curta-metragem The Syndrome

O ritmo aqui é outro, tudo é pensado e preparado cuidadosamente. Nada da fúria de gravar tudo e todos de todos os ângulos e mais algum a que o digital convida…

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Po n a d João

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Os meus colegas da AGECTA interessaram-se e acabaram por ser 4 dias de rodagem, 19 décors (caíram 2), e uma equipa com 2 portugueses, 2 espanhóis (1 deles catalão), 2 ingleses, 1 italiano (napolitano, diz ele e até parece que o Garibaldi ainda não chegou a Nápoles!) e o actor anglo-alemão Frederick Schimmel-Schmidt. Trabalhámos muito, normalmente das 8h às 22h, ou mesmo 24h (com rodagem de 11 horas diárias), mas comemos bem, no Alcides, no ¾, no Cais 20, nos Irmãos Dias, no Cantinho do Cais e na Quinta dos Sabores. O tempo é o que se sabe, mas não fazia mal, diziam, não havia

continuidade… Claro que houve um plano pelo qual tivemos de esperar que passasse uma chuvada forte (um exterior nos Ananases Arruda) e outro (também exterior, na Ermida na Lagoa das Furnas) onde tivemos de alterar o que estava previsto por causa da luz excessiva (céu limpo sem qualquer nuvem que nos valesse)! Décors magníficos todos, interiores e exteriores, dizem eles e nós bem sabemos, e prometem voltar para outras produções, garante o produtor inglês. E a equipa portuguesa de produção (o Ricardo Reis e eu), saiu-se bem! Foi duro, mas já tenho saudades! Um único senão; por causa das filmagens não pude estar com o meu amigo neptuniano Norberto Serpa em breve visita a São Miguel!


Ricardo Ribeiro

A conspiração das vacas

COWSPIRACY

cinema

O Cine-Clube da Ilha Terceira (CCIT) promoveu no passado dia 21 de maio a exibição do documentário “Cowspiracy: O Segredo da Sustentabilidade”, projecção essa que teve lugar no Pequeno Auditório do Centro Cultural e de Congressos de Angra do Heroísmo.

a combinação de todos os meios de transporte no planeta Terra, ou ainda a assustadora realidade que é termos conhecimento de que 91% da destruição da floresta amazónica teve como principal motivo a utilização desses terrenos para fins agropecuários.

Apesar do nome, “Cowspiracy” baseia-se mais em factos do que propriamente em conspirações. O documentário, que gira em torno da pegada ecológica causada pela criação de animais para alimentação, tem estado nas bocas do mundo, conseguindo captar a atenção do público mais sensibilizado para as questões ambientais… e não só. Ao longo de 85 minutos a plateia é constantemente bombardeada com factos e números que ajudam a corroborar a ideia defendida pela dupla de realizadores Kip Anderson/Keegan Kuhn, de que a exploração animal e respectivos subprodutos são responsáveis por 32 mil milhões de toneladas de dióxido de carbono por ano, ou seja, cerca de 51% da emissão total do planeta.

No entanto uma das partes do documentário que mais surpreende é o facto de os realizadores questionarem diversas Organizações Não Governamentais (ONG), como foi o caso da “Greenpeace”, acerca deste assunto não estar a merecer a devida atenção da parte delas. As reacções, respostas, ou até ausência das mesmas, levam-nos a pensar sobre a história que nos tem sido vendida ao longo dos últimos anos por parte de algumas destas entidades que afirmam de forma categórica estar a defender o ambiente.

Algumas das estatísticas que nos são apresentadas chegam mesmo a impressionar, como por exemplo o facto da exploração animal representar 18% das emissões de gases de estufa, mais do que

Em última análise, com maior ou menor espírito crítico, é consensual dizer-se que “Cowspiracy” leva-nos a pensar acerca da necessidade da sociedade em geral reformular os seus hábitos de vida e alimentares de modo a que o “stress” que colocamos sobre os ecossistemas não seja tão intenso como o documentário nos demonstra.

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sociedade


fotos de Maria Rakka, Alba Olmos e Raquel Vila

fotografia de RocĂ­o Raya


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Tomás M

Tudo o que tenho feito tem sido gritado aos 4 ventos... *

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O que é que pequeno-almoçaste? Papa de aveia! Se o Conde Drácula viesse cá às ilhas onde o levarias? À praia de Porto Pim para tomar banhos de Lua! Qual é a semelhança entre o Pico e o Faial? São duas ilhas bonitas. Se não gostas de chuva o que é que estás aqui a fazer? Quem disse que não gosto de chuva? Eu sou do Porto! Na escola que outra “disciplina” deveria ser obrigatória? Agricultura.


revista com o orcego

Melo

Nome Capicua Idade Peter Pan Profissão Rapper

Porque é que tens alguns projectos na gaveta? Não tenho nada na gaveta. Tudo o que tenho feito tem sido gritado aos 4 ventos. O que é que odeias na internet? Trolls, cínicos e haters em geral. Não odeio, mas dispenso. Que forma de arte é que te aguça os caninos? Aguça-me mais a língua porque tenho tendência para ser incisiva! O que é que gostavas de ter nascido? Estou bem, obrigada. Gostavas de ir morrer longe? Não e espero que a morte esteja longe.

Errata

No número anterior houve um lapso no artigo de Albino Pinho, ficando a faltar um parágrafo. Aqui fica o texto na íntegra, tal como deveria ter sido publicado. As nossas disculpas ao autor e aos lectores.

A vida é um sopro (1), a ilha é a paisagem que a anima

Albino Pinho Tantos são os instantes vividos cremados pela fugaz memória que integra cada dia. O que resta? Pequenas paisagens descritas com audácia. A Ilha. A Ilha pode ser uma porção de terra rodeada por água; um aglomerado de casas dentro de um muro; o planeta com todo o espaço em volta; cada um de nós rodeados por cada existência .... Importante? Talvez a escala do tempo, presente na percepção de sentir a integração do respirar Ilha. Respiramos cada passo, é certo. Tantas vezes, somente, respiramos a cada passo. A Ilha. Trememos. A Ilha treme connosco. Treme a Ilha. Trememos com ela .... Neste compasso, naturalmente, tornamo-nos um só! Os pés sentem a areia quente que queima. Os pés sentem a frescura da areia banhada pela água do mar. O corpo mergulha, tempera-se a água salgada. O ar quente do Sol seca a pele ...; O olhar perde-se aqui e ali, em horizontes “à mão de semear” ou esbarra na Ilha em frente - a paisagem é imensa e é pequena. A escala do tempo suavizada faz emergir a percepção súbtil e inscreve-a na memória do dia: A pequena vaga esbarra na areia em splash de espuma como champagne a festejar a chegada à praia – uma e outra vaga brindam. Ohando de frente a brincadeira, observo, o splash de gotas que alcança o ar em diferentes alturas desenhando uma linha ondulada ao longo da praia - uma borboleta, percorrendo a linha ondulada ao longo da praia, aproxima-se no seu voo desajeitado. Uma e outra gotícula splash quase alcança a sua asa. A borboleta entra no jogo. Parece saber brincar. Imagino integrar-se totalmente no sopro de vida que une sem distinguir. E no horizonte íntimo do olhar visito todas as Ihas na escala do tempo do sentimento maior ... Desde que o vento me sopra na face Velejo com todos os ventos. (2) (1) Expressão de Oscar Niemeyer que deu origem ao documentário sobre a sua vida e obra. (2) Verso do Prelúdio em rimas alemãs, A Gaia Ciência, de Friedrich Nietzsche

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O Testemunha do desembarque

da Normandia

DORI Paulo Alexandre Monteiro

A embarcação que veio a chamar-se “Dori” naufragou ao largo de Ponta Delgada, ilha de São Miguel. Originalmente, integrava a conhecida frota norte-americana dos “Liberty Ships”, construídos entre 1941 e 1945, em plena II Guerra Mundial. Símbolo da força industrial americana em tempo de guerra, este projeto de construção naval em série, materializou-se na construção de 2751 cargueiros multifuncionais.

(EUA). Aí, integra, a 27 de agosto, um comboio de 119 navios mercantes e 68 navios de escolta, com destino a Port Said, no Egito, ficando em Alexandria, onde chega a 23 de setembro. Já depois de ter alcançado Port Said, a 9 de outubro desse mesmo ano, regressa a Alexandria e de lá parte, no dia 19 desse mês, para Nova Iorque. Fez parte do comboio naval GUS 19, que regressou a Hampton Roads, a 15 de novembro. No dia 15 do mês seguinte, sai de Nova Iorque, sendo fotografado durante a partida, como participante de um comboio naval que viajou até Clyde, Liverpool, na Grã-Bretanha. Chega à ilha inglesa no dia 29 de dezembro.

O estaleiro de Bethelehem Fairfield Inc., sediado em Baltimore, Maryland, produziu o seu primeiro “Liberty Ship”, a 30 de dezembro de 1941. Até ao final da guerra, construiu 384 navios deste modelo, sendo um deles o “Edwin L. Drake”, com o seu bota-abaixo a ocorrer a 31 de julho de 1943. Alçava 7176 toneladas de carga, medindo 130 metros de fora a fora, com 17 metros de pontal e 10,6 de boca. Tinha um único hélice, propulsionado por motor de três cilindros. Atendendo aos registos dos comboios navais organizados na II Grande Guerra, é possível traçar um mapa pormenorizado das ações em que participou.

Durante o ano de 1944, o “Edwin L. Drake” viajou, sozinho ou acompanhando comboios navais das forças aliadas, entre o continente americano, as ilhas britânicas e o continente europeu. Entre as diversas expedições em que participou, é relatado que transportou, em maio desse ano, uma carga onde se incluía cereal e madeira, de Clyde, em Liverpool, até Cardiff. Na Europa, navegou até Murmansk, na Rússia, e Le Havre, junto ao rio Sena, em França. Alcançou o porto francês 11 dias depois do Dia D. Mais tarde, ainda em 1944, transportou um carregamento de barris de combustível para aviação.

Depois de ter sido entregue à US War Shipping Administration, a 10 de agosto de 1943, partiu, no dia 20 do mesmo mês, para Hampton Roads, no estado da Virginia

No final desse ano integrou o comboio naval HX 329, saindo de Nova Iorque, a 29 de dezembro de 1944, na direção de Clyde, Liverpool. De seguida, escalou em

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história No ano de 1947, a International Freighting Corporation, companhia sedeada em Nova Iorque, compra o “Edwin L. Drake” à marinha americana. Os dados tornam-se mais incertos a partir desta fase. Aparentemente, em 1952, numa segunda venda – à Independent Steamship Corporation – o navio é rebatizado como “Seadrake”. Dois anos depois, assume o nome de “Phoenix”. Em 1957, é vendido à Pan Range Shipping, e passa a designar-se “Anassa” e, posteriormente, “Praxiteles”. Por fim, em 1962, assume a sua última nomenclatura: “Dori”. Com este nome, o “Edwin L. Drake” realizou a sua última viagem, saindo de Edem, na Alemanha, com destino a Nova Orleães.

Gourock, na Escócia, a 3 de fevereiro do ano seguinte, e continuou viagem até Molotovsk, na Rússia. Esta rota foi fustigada por raids aéreos inimigos, principalmente entre o Cabo do Norte e a ilha do Urso. Durante os embates, a tripulação do “Edwin L. Drake” é creditada, duas vezes, por assistências no abate de um dos aviões alemães. A 23 de março, parte da Rússia, com 2571 toneladas de crómio a bordo, destinados a Clyde, Liverpool, que alcança a 1 de abril. De seguida integra um comboio naval, vindo a arribar a Baltimore, a 27 de abril, ainda com a mesma carga de crómio. É neste porto americano que a tripulação recebe a notícia da rendição alemã, a 8 de maio de 1945.

A 23 de outubro de 1963, a Pan Range Shipping freta o “Dori” à companhia Bulk Carriers, Ltd que, por sua vez, o subfreta à Nimpex International Inc e a uma sua afiliada, a Import Export Steel Corporation (Impex). A sua missão consistia no transporte de 9800 toneladas de aço em rolo, das cidades alemãs de Bremem e Emden, até Nova Orleães, no estado do Louisiana. Parte a 31 de dezembro, mas nunca chegará ao seu destino. A 16 de janeiro de 1964, naufraga a 800 metros da Igreja de São Roque, praticamente à vista da cidade de Ponta Delgada, na ilha de São Miguel. Acresce à importância da embarcação enquanto participante ativo na II Guerra Mundial – existem apenas dois Liberty Ships ainda operacionais em todo o mundo, estando ambos musealizados – o seu valor enquanto local de naufrágio, a 25 metros de profundidade, junto dos mergulhadores e amantes do mar. O Governo Regional decidiu classificar o “Dori” como Parque Arqueológico Subaquático. Esta ação materializou-se com a criação do Decreto Regulamentar Regional n.º 12/2012/A, de 8 de maio.

No mês seguinte, viaja até Hampton Roads e daí parte para Gibraltar, em comboio naval. Navega, seguidamente, até Nápoles, sem escolta. Alcança a cidade italiana a 10 de junho. Volvidos 5 dias, segue para San Juan, Porto Rico, onde chega a 2 de agosto. A guerra prossegue ainda, no Pacífico, mas durará pouco tempo. Depois de atravessar o canal do Panamá, o “Edwin L. Drake” aporta a Cristobal no dia 7 e a Balboa no dia 14. Neste último porto, a tripulação é informada da rendição japonesa, nesse mesmo dia. Contudo, a sua rota mantém-se inalterada. Chega a Ulithi, na Micronésia, a 18 de setembro e daí continua para Okinawa, no Japão. Por fim, arriba a Tóquio, em Yokohama, a 19 de outubro de 1945. Dando por terminada esta missão, volta aos Estados Unidos, atravessando uma vez mais o Panamá. A guerra terminara para o “Edwin L. Drake”.

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Campanhas de investigação Helder Marques da Silva

COM O NAVIO DE

A série histórica destas campanhas iniciou-se em 1995, dedicadas à amostragem e investigação das comunidades demersais. Entre as espécies alvo de estudo destacam-se alguns recursos pesqueiros de grande importância para a frota comercial açoriana, como o goraz, o boca negra, o alfonsim, o imperador, a abrótea, o bagre, peixe-espada branco…

O CCTEP pode, por sua vez, solicitar recomendações ao Conselho Internacional de Exploração do Mar (CIEM).

Paralelamente ao objectivo prioritário que é a estimação de abundancias relativas das principais espécies exploradas, recolhe-se e analisa-se um volume considerável de informações biológicas e da pesca que permitem a realização de estudos de biologia básica como crescimento, reprodução, hábitos alimentares, genética,…

A Comissão poderá divergir ocasionalmente dos pareceres científicos, de forma a proporcionar aos pescadores um nível mínimo de estabilidade nas capturas necessárias para assegurar a viabilidade da sua actividade a curto prazo.

Assim, para além de se assegurar a continuidade da recolha de informação estatística independente da frota comercial, essencial para a monitorização dos recursos, este cruzeiro permite também a recolha de informação biológica básica em simultâneo. Tal informação é indispensável para a definição da estrutura da comunidade demersal permitindo, deste modo, a formulação de suposições básicas para a avaliação e gestão dos recursos.

Esta necessidade de tomar decisões equilibradas tem o seu reflexo num princípio geral que consiste em manter as variações intranuais de TAC dentro de determinados limites percentuais, de modo a ajudar o sector a planear o futuro.

O conhecimento científico obtido é fundamental para avaliar as tendências históricas dos recursos pesqueiros e da biodiversidade. Assim, aplicam-se modelos de avaliação aos stocks das populações exploradas e faz-se a avaliação do estado de exploração da comunidade demersal, bem como a padronização de metodologias e procedimentos de avaliação em colaboração com a administração e outros parceiros do sector da pesca da Região. Como resultado final são efectuadas propostas de gestão para a pescaria e divulgada informação relevante, também apresentadas no CIEM-Conselho Internacional para a Exploração do Mar, informação essa sobre o estado de diversos recursos com interesse ou potencial económico.

Ao longo de quase 30 anos temos feito avaliação de algumas espécies, como o goraz. Os resultados indicaram sempre que a captura desta espécie não deveria ultrapassar 900-1000 toneladas/ano. Muitos destes resultados foram apresentados e discutidos na Semana das Pescas dos Açores. Recentemente foi reduzido a TAC de goraz para a área Açores. Este facto resultou de capturas que ao longo da últi-

Estas campanhas de Recolha de Dados da Pesca são fundamentais ao aconselhamento científico no âmbito da Política Comum de Pescas. A TAC (Captura Total Permitida) e as quotas são decididas pelos Estados-Membros com base numa proposta apresentada pela Comissão. Esta proposta baseia-se em recomendações científicas formuladas pelo Comité Científico, Técnico e Económico da Pesca (CCTEP), um grupo de cientistas independentes criado para formular recomendações à Comissão sobre todos os aspectos da política de pescas.

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ciência

o demersal

E INVESTIGAÇÃO ARQUIPÉLAGO ma década e sobretudo em 2005 (1380 ton.) ultrapassaram largamente o nível de captura máxima recomendado para este stock. Os cruzeiros e os resultados dos modelos de avaliação indicaram claramente estarmos perante uma situação de sobrepesca a necessitar da devida correcção. É importante que se entenda, do que atrás se referiu, que a ciência não pode ser confundida com a política. Os cientistas analisam, estudam e propõem as respostas mais adequadas perante o estado de um ou mais stocks. Mas a ciência não é dona da razão. Cabe aos políticos ajustarem a resposta como acharem mais adequado e em função

da sua capacidade de se articularem com os representantes do setor e com o decisor, no caso a Comissão Europeia. Não podem é depois responsabilizarem-se os cientistas quando por incapacidade ou vontade própria se decidiu políticamente ultrapassar os níveis de pesca recomendados científicamente e consequentemente se fica obrigado a reduzir drásticamente o nível das capturas. Até porque os dados indicam que o nível de pesca de goraz adequado à atual situação do stock deverá manter-se abaixo das 400 toneladas, abaixo portanto do TAC agora definido.

Duas décadas a recolher dados para a avaliação dos recursos da pesca e da biodiversidade

ilustração Phelegm *

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algures no mundo alguém é convidado a fazer um retrato das nossas ilhas. Sara Soares

Onde São

Para Ti

os Açores

assinala no mapa onde são os Açore

Luis México Que tipo de pessoas pensas que vivem nos Açores? Hippies.

Que língua falam os Açorianos? Inglês não deve ser. Não tenho ideia nenhuma.

Que transportes se usam nos Açores? Lanchas deve ser o mais típico.

Como é que achas que as pessoas vivem nos Açores? Tem que ser muito difícil viver aí onde não há quase nada. Bom, há comida mas mais nada.

Como será o clima nos Açores? Europa é gelada! E aí devem ter furacões e alguns tempos difíceis com muito sol.

O que pensas que poderia ser feito nos Açores? Um centro de entretenimento para as pessoas se divertirem aí no meio.

Que animais se podem ver nos Açores? Tubarões, focas e baleias.

Qual achas que é a comida Açoriana mais estranha? Não tenho ideia nenhuma.

E o que pensas que as pessoas fazem nos Açores? Pescam para terem algo de comer.

Tem que ser muito difícil viver aí onde não há quase nada... *

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Que tipo de produtos pensas que se exportam? Acho que devem ser barbatanas de tubarão, peles de foca e bijuteria étnica. Poderias viver nos Açores? Pois, acho que não...


o paixão

s

es

EQUESTRE Ana Lúcia Almeida

Moda e Equitação no MAH, na Noite dos Museus 2015

O Museu de Angra do Heroísmo assinalou a Noite dos Museus de 2015, 16 de maio, com um programa subordinado ao tema “Paixão Equestre: Moda e Equitação”, que trouxe ao MAH cerca de 400 pessoas. Além de visitas à Reserva de Transportes de Tração Animal dos Séculos XVIII e XIX e às exposições “E o Aço Mudou o Mundo: uma bateria Schneider Canet nos Açores” e “Do Mar e da Terra… uma história no Atlântico”, que visavam explicitar o papel essencial que os animais de tração e sela assumiram até há bem pouco tempo, quer na vida quotidiana das populações, quer em contextos épicos, foi apresentada a coleção de moda “La Belle Écuyére”, da autoria da estilista Sílvia Teixeira, e realizada uma exibição de arte equestre pela Quinta do Malhinha, no claustro do Edifício de São Francisco. A monumentalidade dos espaços escolhidos, a Sala Schneider Canet , um dos antigos claustros do Convento de São Francisco, convertido em sala de exposição para acolher a única bateria Schneider Canet completa que se conhece em instituições museológicas, e para a qual foram criadas peças de suporte pelo escultor terceirense Renato Costa e Silva de grande efeito artístico, e a Reserva de Transportes de Tração Animal dos Séculos XVIII e XIX, coadugnaram-se perfeitamente com a elegância e requinte das peças da coleção apresentada, inspirada nos tradicionais trajes portugueses de equitação. O garbo e docilidade dos puro-sangue Lusitanos da Quinta do Malhinha e a arte de bem montar dos três cavaleiros, que protagonizaram o espetáculo que encerrou o evento, possibilitaram uma autêntica viagem no tempo, naquela que foi uma noite mágica, com qual se pretendeu sublinhar a ação fundamental dos museus na promoção de novas formas de reinterpretar a tradição.

ilustração Joyce Geleynse

i

sociedade

Com esta iniciativa, o Museu de Angra do Heroísmo associou-se pela oitava vez consecutiva às celebrações da Noite Europeia dos Museus, uma efeméride criada em 2005, pelo Ministério Francês da Cultura e da Comunicação, que visa proporcionar experiências atrativas e fora da oferta habitual por parte destas instituições, de forma a permitir ao público vivenciar tais espaços numa perspetiva diferente, participando em atividades propositadamente organizadas para esse ambiente e horários específicos.

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Texto Vencedor do Prémio de Escrita DiscoverAzores 2015

AMOR BASALTO Nuno Rafael Costa - Acreditas na tristeza? Às vezes a interrogação não espera. É mal-educada, não avisa, ou atende à hora marcada. Gosta de ser assim: acutilante, sob a pele da rudeza. - Corisco mal amanhado! Lembras-te disso, assim, vindo do nada? - Não é preciso engasgares-te, homem! - Nada disso. Só que me desarmaste, Zé! É que se há coisa que retarda o pensar são estes queijos de São João. José sorri. Quer concluir o silogismo. - E do modo como despertam os sentidos, com esta casca amarela, este interior macio... - Lá está. Em todo o caso, diz-me por que é que... Mantém-se o sorriso. Sustem-no o silêncio, breve, antelóquio de quem se enternece na justificação a apresentar. - Por que nasci nesta localidade, Sebastião. Por que cresci neste derrame lávico; por que brinquei, corri, saltei entre os currais de vinhas; por que aprendi a nadar nestes poços; por que me entranhei neste cheiro, de uva, de vinho, que te atrai e se arreiga na tua circulação; por que casei, e aqui fiquei; por que amo este lugar... - Não te entendo! Estás triste? Aonde é que queres chegar? - Ali. – Indica com o dedo. - Para a Ermida de Nossa Senhora? - Sim. - E o que tem? - Tem que nos vamos sentar aqui um bocadinho. Pedimos um lajido, seco ou licoroso, como se preferir, e empurramos para baixo este queijo maravilhoso. O que achas? Não é preciso responder. Elas virão, as respostas. Se intactas ou fragmentadas, dependerá da história, dos muitos receptores por onde já existiu. Para já, é sabido. Basta sentar e descontrair. Apetece beber. Está abafado, as roupas colam-se aos corpos, e estes a elas, desabituados a lidar com a humidade, cem pontos percentuais concerteza. Além do mais, José é da terra, cara sobeja-

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mente conhecida, feitio e tiques inclusive. Não há necessidade de verbalizar o pedido. Para quê? Chega a mão no ar, e os dedos, dois, a expressar o número que lhe corresponde. Aí estão, sem complicações à chegada. Na mesa, fresquinhos como se querem. - E nisto explicas-me a que se deveu a pergunta, não? Seria injusto, por demais infantil, abrir a comporta de lava e desaparecer. Há que estar lá, na recepção do magma, saber se se fica ou não ileso, incorruptível às viscosidades. Talvez o vinho seja um bom escudo, liquidifique a alma, evite-a da solidificação, da secura vulcânica, de se tornar inorgânica, endurecida ao que a circunda. E José não quer isso. De maneira que anui, sem apontar desta vez. Não há necessidade. Chega uma afirmação, enigmática, dessas que se raspa com as unhas à janela da curiosidade. - Amor-basalto. - Amor-basalto? - Acolá. Vês? Sentado nas escadas? - De costas para a cruz, virado para o mar? - Esse mesmo. “- Muito prazer. Bárbara. - Nicolau.” - Conhece-lo? - É meu amigo. Pode-se dizer de infância. - Está a rir-se sozinho, ou é impressão minha? - Não é impressão. Pelo contrário: é uma certeza. E é um riso triste, digno de dó, se é que a pena é digna de existir. - Pressuponho que sabes a razão, é isso? - Não resisti a intrometer-me. Reparei que estava tão atento a olhar o Atlântico... - Que não tem de pedir desculpa, se é o que ia resumir. - Pode-se dizer que sim. - Ele contou-te? - Contar, não contou. Eu juntei apenas as peças, construindo a minha justificação. Ele, propriamente dito, não expunha totalmente as causas.

- Mas sempre deixava escapar alguma coisa! - Deixava. Datas, locais, diálogos... E era só aí, nesses deslizes verbais, que eu me inteirava do que pôde ter acontecido. - E? - Leu o meu pensamento! - Ora essa. E a Bárbara: gosta de fotografar? - Adoro. Mas sou amadora. - Amadora ou não, é uma paixão. - Sem dúvida. E depois, não sei se concorda, mas há locais e locais, e este é daqueles que nos puxa a eternizar a realidade. - É verdade. Este é um desses sítios. - Tu queres ver. Hei rapazinho! Quem é que se adiantou? - O Sr. Medeiros. – Confirma o moço, empregado ao Domingo. - Tarouco! Está cegando, o diabo. Pertencer à terra envolve riscos. Este é um: o calor, mas humano; a proximidade das existências, de se ter nadado nas mesmas águas, atravessado juntos, nas boas e más circunstâncias, as correntes das últimas. É assim. Está-se ainda a ingerir a primeira bebida, quando outra aterra na mesa, elevando a probabilidade, aritmética, doutras se seguirem. - Ainda tomamos um calor daqueles. - Por este andar. Altura em que os copos se unem, e os vidros se tocam, e o som se propaga à área quadrada da sua amizade. Paira a ideia do brinde. O gesto subentendeo, embora daquele não se trate. - Mas perguntavas-me sobre... - Se te inteiraste ou não da história. - De alguma maneira, inteirei-me. Fui mais um ouvinte do que um interlocutor. Houve até momentos em que receei ter insistido como insisti. Por que, sem que lhe pusesse muitas questões, notava que me excedia, que o sobrecarregava com muitas perguntas. - E ele? - Reforçava a introspecção. Metia-se para dentro da sua carapaça, amadurecida pela lava, e não saía de lá. E


não saía mesmo. Pelo menos, enquanto eu lá estivesse, ao seu lado. - Pressão que querias evitar. - Sem dúvida. - Um dos muitos recantos que esta ilha tem. - E todos paradisíacos. Sublimes, na minha opinião. Por que do ponto de vista natural, não nos podemos queixar. - Em todo o caso, Zé, qual era o seu lamento? - De não se perdoar a si mesmo. - Em que sentido? - O Nicolau é natural daqui? - De ter viajado; de se ter ausentado uns anos do Pico. “A memória é malévola”, rematava-me assim. Descontextualizado, sublinhava-lhe o oposto. Mas não me ouvia. No fundo, eu, outra pessoa que fosse, ver-se-ia como alguém que interrompia apenas o seu discurso. A presença era corporal. Apenas física. Os argumentos eram dele para ele mesmo. “Passam à tua volta centenas de milhares de situações. Nem um terço detectas. Acompanha-las com sorte, e dessa pequena parte, gravam-se-te umas quantas dezenas na memória. Umas mais expressivas do que outras; uma mais significativa do que outra”. - E tu? - Escutava-o. Sentia-me sugado pela força da sua recordação, arrastado por aquela enxurrada abaixo, cerrada, obscura, sem término à vista. Quedava-me ali, absorto, suspenso da minha sensibilidade. Ele oralizava tal e qual pensava, como que uma réplica fiel do original; telegrafava rigorosamente o que lhe vinha à mente “Arcos, Ponta Negra. A Primavera, o Verão aí. O Atlântico foi o início. A construção do que havia para ser. A empatia ajudou. Puxou-nos para o encontro; empurrounos um contra o outro”... - Estavas atónito. - Também. A realidade acabava de suplantar a possibilidade. E eu lá, a assistir na primeira fila, em directo, sem lugar a repetições. - Deve ser difícil. Sobretudo, quando toca a quem nos é querido. - Literalmente, não sabes como agir. Perdes-te na tua própria vontade. Queres confortá-lo, mas soa-te tudo a contraditório. Um simples abraço é excessivo e escasso. Entendes? - Percebo-te. Para não falar das palavras, ficando a dúvida se bem empregues ou não. - Nem me atrevia. As lágrimas impediam-me de qualquer empreendimento lúcido. Reina a insanidade. Presenciá-

lo na evocação, soterrado pelo seu manto, ardido como esta paisagem, era dilacerante. A crueldade, a que sentia, vinha de todo o lado, e por todo o lado. Escorria das paredes da loucura. Diz-me Sebastião: e recomendar-lhe calma, dizer-lhe que aquilo acabará por passar, que tudo acabará bem: conseguirias? - É de arder! - Já se sabe. Agora mesmo: estás a vêlo? Assim, cabisbaixo, cabeça metida entre as pernas, baloiçando as costas? - Estou. - Eram raras as vezes em que não cogitava assim. E eu ardia, interiormente, preocupado ainda assim em encaixar os elos. “O riso aviva-me o que não quero esquecer. É uma forma de olhar encantado, dum mundo aonde quero habitar. Mas tive de ir. Tive de ir. Prometi-lhe regressar ”... - Alguém, então? – Constata Sebastião. - Nunca me disse o nome. - Mulher? - Pressupus. Não é absoluto o juízo, mas roça a universalidade. - Tens razão. Quase sempre implica uma face feminina. E ele? - Prosseguia, sempre no jeito de aforismos, sublinhando o regresso à freguesia, a certeza de vir encontrar tudo como deixou, a ilusão de continuar a sequência temporal como se não tivesse havido uma interrupção. - E daí ela? - “Choro a ausência. A sua ausência. Todos os dias, desde que vim e não a

vi mais”, decorei, vê tu. Assim mesmo, numa semana ou outra, num dia ou outro, de todas as vezes que ia ter com ele. Fechava as portadas do seu ser, sem frecha alguma de luz, completamente às escuras, e pronto: nem eu, ou outro amigo, o tirava dali. - Só ele. - Só ele. Como o faz, e ontem fez, e amanhã religiosamente. De modo que às vezes se sucumbe à evidência. José, Sebastião também, talvez o melhor a fazer é continuar. Decerto que é uma hipótese. Natural, embora pareça cínica. Simplesmente, trata-se de esquecer. O melhor possível. - Proponho darmos um mergulho. Pocinho, o que achas? - Irrecusável. E terminada que está a segunda rodada, há apenas que retribuir a seguinte. O Medeiros é dos seus. - Vou só pagar! São contas fáceis de efectuar. 0.80 x 2 – aí está. Dinheiro certo, trocadinho como quer o comercial, e venha o próximo. - Vamos? - Vamos. E vão. Acreditados na tristeza.

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FAZENDO 101 o boletim do que por cá se faz

junho 2015

www.fazendo.pt

vai.se.fazendo@gmail.com

gatafunhos

tirilha

rebus

Letras e imagens são usados para formar uma nova palavra ou frase. Deve ser lido da esquerda para a direita. Os algarismos entre parêntesis indicam quantas palavras compõem o enigma e o número de letras de cada uma. As letras fornecidas devem ser compostas com o nome das imagens para formar novas palavras. Quando uma letra surge entre parêntesis deve ser subtraída da palavra da imagem correspondente.

(4+4+3+6+7+9)​

solução no facebook do fazendo *

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este jornal comunitário, não lucrativo e independente está a ser financiado pela comunidade de leitores, colaboradores e parceiros


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