JUL - AGO / 2017
MARIA E A ALEGRIA DO PENTECOSTES “Maria molda maternalmente os apóstolos em irmãos unidos na oração, preparando-os para acolher o Espírito Santo”.
Director: P.e Mário Martins Chaves Rodrigues Ano XXII - 6ª Série | Nº 59 | Bimestral 1,00 €
Patrícia Sangremann Págs. 2-3
“TEMOS MÃE!” “Maria (...) é a Mãe que ensina a todos os discípulos do Senhor a docilidade à voz do Espírito”. Pedro Antunes Pág. 10
EDITORIAL
PENTECOSTES É assim chamada a festa celebrada ao quinquagésimo dia depois da Páscoa. Lucas situa o dom do Espírito Santo no dia de Pentecostes, momento descrito como uma teofania (céu, vozes, trovão, vento e fogo) e como restauração da unidade entre os homens rompida em Babel. Se, em Babel, a tentativa de unidade desejada pela humanidade, em oposição a Deus, levou à dispersão e à confusão de línguas, no Pentecostes, o Espírito, manifestando-se sob a forma de línguas de fogo que se distribuíam sob cada um dos presentes, torna possível a comunhão entre os povos por meio de línguas diversas. Realmente, a festa do Pentecostes leva à realização da Páscoa. Jesus Cristo, que sobe para junto de Deus Pai, cumpre a sua obra, deixando o Espírito que desenclausura os discípulos dos seus medos e dúvidas. Pelo contrário, leva-os ao anúncio do Evangelho de Salvação e a declarar já cumprida a promessa feita ao profeta (cf. Joel 3, 1-5). A descida do Espírito é um sinal escatológico, anúncio de que já se iniciaram os últimos tempos. A partir deste momento, a Igreja é enviada a anunciar o Evangelho a todas as gentes, até aos confins do mundo, enquanto espera o regresso do Senhor. É o Espírito Santo que, hoje como no princípio, prepara a humanidade com a sua graça para os atrair a Cristo, que lhe manifesta o Senhor Ressuscitado, que lhe lembra a sua Palavra, que lhe abre o espírito para compreender o sentido da sua morte e ressurreição, que lhe torna presente o mistério de Cristo. Assim, a celebração do Pentecostes recorda este dom do Espírito que torna atual, recorda e interioriza aquilo que fez Jesus. A partir daquele dia, esta vinda do Espírito Santo não termina mais, quer trilhar connosco e em nós, na alegria daqueles que O procuram, os mesmos caminhos de resposta ao chamamento que Deus faz a cada um e à alegria de sermos verdadeira Igreja “em saída”, à semelhança dos Apóstolos e da comunidade de Jerusalém.
VISÃO
MARIA E A ALEGRIA DO PENTECOSTES Patrícia Sangremann
Maria esteve presente nos três eventos mais significativos da história da salvação: na Encarnação do Verbo, no Mistério Pascal de Cristo e no Pentecostes. Ela, que é a mulher cheia de graça (cf. Lc 1, 28), estava reunida com os Apóstolos no Cenáculo, em Jerusalém, quando o Espírito Santo desceu sobre eles. A palavra Pentecostes vem da palavra grega “pentekosté” e significa “quinquagésimo”, isto é, o 50.º dia depois da Páscoa, em que se comemora a vinda do Espírito Santo e o nascimento da Igreja. Mas, antes de ser uma celebração cristã, o Pentecostes era uma festa judaica. No tempo de Jesus, esta festa era muito especial, pois nela se recordava a chegada dos israelitas ao monte Sinai, depois da saída do Egipto e após “cinquenta” dias de caminhada pelo deserto. No monte Sinai, Deus entregou as tábuas da Lei a Moisés e realizou uma aliança com o seu povo, a qual era celebrada todos os anos pelos judeus. Segundo S. Lucas, o Espírito Santo desceu no Pentecostes porque veio realizar uma nova aliança, não no monte Sinai, mas numa “sala de cima” (At 1, 13), indicando as semelhanças com a antiga aliança, que tinha tido um monte como cenário. A sala dos discípulos transformou-se, então, segundo a ótica de Lucas, no novo Sinai. Maria, nossa mãe e mãe de toda a Igreja, tem peculiar importância no episódio do Pentecostes, pela alegria com que acredita e maternalmente auxilia os
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discípulos na sua fé. Antes de morrer, na hora suprema da nova criação, Cristo conduz-nos a Maria (cf. Jo 19,28), porque não quer que caminhemos sem uma mãe (cf. EG 285). S. João e os discípulos acolheram-na imediatamente. Ninguém, senão ela, participara mais profundamente na vida de Jesus, desde a conceção até à ressurreição. Assim, saboreando os frutos da ressurreição do seu filho e conservando no coração memória de tudo, Maria transmitia com alegria aos Doze, reunidos com Ela no Cenáculo, que recebessem o Espírito Santo, tal como narra S. Lucas em At 1, 13-14: “Quando chegaram à cidade, subiram para a sala de cima, no lugar onde se encontravam habitualmente. Estavam lá: Pedro, João, Tiago, André, Filipe, Tomé, Bartolomeu, Mateus, Tiago, filho de Alfeu, Simão, o Zelota e Judas, filho de Tiago. E todos unidos pelo mesmo sentimento, entregavam-se assiduamente à oração, com algumas mulheres, entre as quais Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos de Jesus”. É esta presença materna de Maria que auxilia os discípulos a perseverarem na fé e na espera. Maria molda maternalmente os apóstolos em irmãos unidos na oração, preparando-os para acolher o Espírito Santo. De facto, Maria confirmou a fé dos discípulos no momento que, desolados, tristes, desanimados, sem compreenderem a situação e o que iria acontecer, estes mais precisavam Dele.
Com a descida do Espírito Santo, “um som comparável ao de forte rajada de vento, que encheu toda a casa onde eles se encontravam” (At 2, 1) e “umas línguas à maneira de fogo, que se iam dividindo” (At 2, 1), os apóstolos venceram os seus temores e, destemidos, proclamaram o Evangelho. Assim se formou a primeira comunidade cristã, donde nasceria a Igreja de Jesus Cristo. Desde o Pentecostes, Maria está presente no meio da comunidade cristã, antes de mais como mãe de Jesus, mas também como memória viva, alegre e permanente, além de elo de comunhão íntima com Ele. De igual forma, está presente no nascimento e crescimento da Igreja como casa de comunhão e no seu envio em missão, em saída para o mundo. Recorde-se que o Papa Francisco diz-nos que “juntamente com o Espírito Santo, está sempre Maria no meio do povo. Ela reunia os discípulos para O invocarem (At 1, 14), e assim tornou possível a explosão missionária que se deu no Pentecostes. Ela é a Mãe da Igreja evangelizadora e, sem ela, não podemos compreender cabalmente o espírito da nova evangelização” (EG 284). De facto, a atividade evangelizadora da Igreja é mariana, “porque sempre que olhamos para Maria voltamos a acreditar na força revolucionária da ternura e do afeto” (EG 288).
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ARTE
ALEGRIAS DE NOSSA SENHORA (6) DESCIDA DO ESPÍRITO SANTO Luís da Silva Pereira
A obra que vamos apresentar é do pintor maneirista El Greco (Domenikos Theotokopoulos). Nasceu na ilha de Creta, em 1541, e morreu em Toledo, em 1614. É um dos grandes da história da pintura, não apenas pela quantidade dos trabalhos que deixou, mas, principalmente, pela sua originalidade e força expressiva. Trata-se da Descida do Espírito Santo, tela pintada entre 1596 e 1600. Não é das mais conhecidas, mas nem por isso deixa de ser um belo quadro
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onde se notam bem as principais características estilísticas do autor. A Descida do Espírito Santo vem narrada nos Actos dos Apóstolos, capítulo 2, 1-4: “Tendo-se completado o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar. De repente, veio do céu um ruído como o agitar-se de um vendaval impetuoso, que encheu toda a casa onde se encontravam. Apareceram-lhes então línguas como de fogo que se repartiam e que pousaram sobre cada um deles”.
O texto não fala de Nossa Senhora, embora possamos deduzir que ela se encontrava presente a partir do que se diz nos mesmos Actos 1, 12-14. Aí se conta que, depois da Ascensão de Cristo, os discípulos regressaram a Jerusalém, perseverando em oração com algumas mulheres entre as quais a mãe de Jesus. É por isso que há duas iconografias principais do Pentecostes: uma em que Nossa Senhora se encontra presente, outra em que está ausente. Escolhemos um exemplo do
primeiro tipo, uma vez que estamos a tratar das alegrias de Nossa Senhora. Neste primeiro tipo, os apóstolos costumam rodear Nossa Senhora, normalmente sentada, grave e majestosa. Aqui, porém, apresenta-se juvenilíssima. É a única personagem de mãos postas, significando, em nosso entender, que é a primeira a perceber o que se passa. Por cima das cabeças adeja uma pomba, símbolo central do Espírito Santo, donde derivam as pequenas chamas que se distribuem pelas personagens. Todos elevam os olhos para o alto, atraídos pela visão da pomba e das chamas, excepto a terceira figura à esquerda de Nossa Senhora, que olha para nós. É, quase certo, um auto-retrato de Greco. No tempo, era frequente os pintores inscreverem-se nos quados que pintavam, identificando-se por olharem para quem contempla a pintura. Além de Nossa Senhora, estão presentes catorze personagens. Duas delas são mulheres. Uma, mesmo ao lado esquerdo da Virgem, tem um véu na cabeça, indicando ser mulher casada, talvez Maria, mulher de Cléofas. A outra, sem véu, está em segundo lugar à direita de Nossa Senhora, entre dois apóstolos. Podia ser Maria Madalena. Todos os apóstolos têm barbas hirsutas, próprias de homens rudes. El Greco gosta de pintá-los assim. Estão descalços, pelo menos os de costas para nós e um terceiro à nossa esquerda. Deduzimos que os outros também estejam. É uma característica iconográfica dos apóstolos, aqui despojados dos seus atributos habituais. Por isso se torna impossível identificá-los. Julgo, ainda assim, ver S. João naquele que está de costas para nós, do nosso lado esquerdo. É jovem e veste túnica verde e manto vermelho, as suas cores habituais. Os olhos muito abertos e os gestos denotam surpresa e espanto. Em todos se vê uma emoção espiritual intensa, para a qual contribui também a forma alongada dos corpos. É dos elementos estilísticos mais característicos de El Greco. Além de esguios, os corpos parecem sugerir a forma de chamas, como se estivessem a oscilar e a transformar-se nelas. Dão a impressão de iniciarem uma dança, como que possuídos pela força do Espírito. 5
SEMINÁRIO MENOR
TESTEMUNHO DE ALEGRIA… Diogo Silva, 11.º ano
Foi com júbilo e espírito de voluntariado que a comunidade do Seminário de Nossa Senhora da Conceição se deslocou à Casa Sacerdotal da Arquidiocese de Braga para melhor conhecer a casa e os que ali habitam. Tal como no filme “A viagem dos Cem Passos”, nem sempre o que nos é próximo é o que conhecemos melhor e só depois de nos atrevermos a atravessar a rua e ultrapassar as barreiras do desconhecimento é que percebemos a importância desse processo para as nossas vidas. Começámos este encontro com uma visita aos principais espaços da casa, a saber: os quartos dos utentes, a capela e o oratório, as salas de estar e de refeição e a biblioteca. Depois, conhecemos três sacerdotes, infelizmente acamados, o que nos levou a pensar que na nossa Arquidiocese há de facto necessidade de sacerdotes dispostos a servir as comunidades, tal como estes que dedicaram a sua vida ao serviço da Igreja. Posteriormente, tivemos um pequeno momento de partilha com alguns dos sacerdotes residentes na Casa Sacerdotal, em que fomos alertados para a necessidade de um clero cada vez melhor formado, jovem e com espírito missionário, preparado para acolher com agrado a missão que lhe é confiada por Deus. 6
Além da visita a estes sacerdotes, também pudemos conhecer outros utentes (ligados a algum sacerdote e que por esse motivo usufruem deste serviço que a Arquidiocese possibilita) sempre com renovada alegria, para a qual a vivência das obras de misericórdia nos impele. Descobrimos ainda que outros sacerdotes vivem nesta casa, não obstante ainda estarem a prestar algum serviço, como paroquiar em algumas das comunidades da nossa Arquidiocese. Inspirados com os testemunhos recebidos, retornamos à nossa casa com um espírito de comunidade e
de serviço mais revigorado e com a consciência de que também nós podemos dar muito aos outros. Para isso, basta utilizarmos a nossa imaginação e dispormo-nos a viver como autênticos testemunhos de alegria.
A CASA QUE CRESCE SEM SE DESLIGAR DO MUNDO Rafael Cepa, 12.º Ano
Passado um ano, ainda há quem diga que o local onde vivo é uma fábrica que produz miniaturas eclesiásticas em massa. Não concordo, até porque a produção é lenta, incerta e nada competitiva. Portanto, se o Seminário não é uma fábrica, o que estará por dentro destas paredes, em princípio vazias de sentido? De facto, o Seminário não são paredes, mas pessoas que precisam de ser coxeadas, incomodadas, provocadas em pensamento, pessoas que têm dúvidas que precisam de reflexão. É este desafio que faz crescer, aprofunda o humano, escava o espiritual através do encontro comprometido, enleado com quem está ao nosso lado. Portanto, aprofundar o humano significa descentrarmo-nos de nós mesmos, buscar identidade, verdade, autenticidade e coerência na vida. E existem temas que são geradores desta vida plena, capaz de florescer intensamente na perenidade. Depois de um caminho longo, onde limpámos algum nevoeiro, enfrentámos uma tempestade libertadora, o conjunto central de tudo aquilo que nós somos como humanidade relacional, a afectividade, parece um segredo devorador de tudo aquilo que nós somos, mas não; é um segredo revelador de tudo aquilo que nós somos capazes de construir, de edificar. Só através da partilha dos elementos próprios de cada um se torna possível tirar o véu ao tabu das
relações, muitas vezes desvalorizado, mas que é ponto-chave no processo de crescimento vocacional. É através desta descoberta que se encontra o equilíbrio como base de uma boa formação. Diriam grandes místicos que a espiritualidade é uma forma ascendente de crescimento. Contudo, deve ser feita de forma lúcida e consciente.
Ela cresce a partir da afectividade, ou seja, da relação com o outro, com o mundo. Cristo está no outro, é ali que Ele se revela, e é aí que nós O conhecemos. Mas isso só se torna possível se humanamente reconhecermos as nossas limitações, as nossas falhas, e se, como crentes, nos deixarmos guiar pelo Espírito, que é anunciador, que é força, envio de verdade. Jesus é claro quando nos diz que só O seguiremos, se fizermos experiência de encontro íntimo com Ele, num caminho feito com o outro, em verdadeira universalidade familiar. É esta vivência familiar no encontro íntimo com Cristo que o Seminário propõe, levando a que a vocação seja vontade de Deus, no serviço ao outro, fazendo desabrochar em cada um Cristo que se continua a fazer vivo. E é através deste encontro relacional que vamos terminar, ou melhor, regenerar esta jornada. Crescer custa. “Se queres ir rápido, vai sozinho. Se queres ir longe, vai com o outro”, aconselha um provérbio africano.
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SEMINÁRIO MAIOR
INSTITUIÇÕES NO MINISTÉRIO DE LEITOR Miguel Neto, 4.º ano
Foi com profunda alegria que a comunidade do Seminário Conciliar de S. Pedro e S. Paulo viveu e celebrou, no passado dia 7 de maio, a instituição no Ministério de Leitor de quatro seminaristas do quarto ano e de dois candidatos ao Diaconado Permanente. Esta celebração eucarística revestiu-se de um júbilo particular, porque ocorreu em pleno Domingo do Bom Pastor e no encerramento da 54.ª Semana de Oração pelas Vocações, vivida sob o lema «Quereis dar-vos a Deus?». Perante esta interpelação tão forte, foi, para nós instituídos, particularmente significativo meditar e procurar responder a esta questão, no dia em que demos um passo importante na nossa caminhada rumo ao Sacerdócio Ministerial e ao Diaconado Permanente. Na Carta Apostólica Ministeria Quaedam, que estabelece algumas normas relativas aos ministérios instituídos, o Papa Paulo VI afirma que o Ministério de Leitor deve ser «confiado àqueles que desejam consagrar-se especialmente a Deus e à Igreja, enquanto candidatos à Ordem do Diaconado ou do Presbiterado», porque a Igreja nunca deixa de se alimentar na mesa da Palavra de Deus. Este ministério configura-se, assim, com um percurso pedagógico em que os candidatos às Ordens assumem intimamente alguns aspetos do exercício do múnus sacerdotal, o que contribui
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para a autenticidade do ministério que no futuro irão desempenhar, já que se aproximam «das Ordens sacras plenamente conscientes da sua vocação, ferventes de espírito, desejosos de servir ao Senhor, dispostos a perseverar na oração e generosos no prover às necessidades dos santos». Na sua homilia, D. Nuno Almeida, bispo auxiliar de Braga que presidiu a esta celebração, além de sublinhar as prerrogativas de todo o pastor que se quer guiar pelo Bom e Belo Pastor, Jesus Cristo, lançou aos leitores instituídos um profundo repto: de nos seus rostos, palavras e gestos transparecer sempre a Palavra de Deus,
sendo nossa missão não só guardá-la e proclamá-la com dignidade, mas, e sobretudo, vivê-la com intensidade, meditando-a e colocando-a em prática no nosso quotidiano. Por fim, antes de um convívio em que se juntaram os nossos familiares e amigos, houve ainda oportunidade para, lembrando o Bom Pastor, simbolicamente, agradecer com um ramo de flores àqueles que nos guiam no dia-a-dia – ao Sr. D. Nuno e aos membros das equipas formadoras dos Seminários de Braga – bem como, em pleno Dia da Mãe, àquelas que com tanto esforço nos criaram e educaram, ofertando-lhes uma rosa.
XXIX JORNADAS TEOLÓGICAS: DEUS NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA João Martinho, 5.º ano
No alvorecer do século XIX e do seu prolongamento no século XX, no espaço sócio-religioso, a religião esteve submetida a uma vasta e profunda crise. A modernidade assumiu, em relação à religião, uma posição fundamentalmente secularizante, resvalando, não raras vezes, para uma atitude extrema de secularização. Assim, o desenvolvimento da cultura moderna conduziu, de modo progressivo, à autonomização do ser humano relativamente a Deus e da razão relativamente à fé. Assim se desenhou, na cartografia cultural, um mundo desencantado, conforme a conhecida expressão de Max Weber. A este respeito, o saudoso Prof. Jorge Coutinho assinala que «no húmus religiosamente humedecido pelo inverno que se abateu sobre as religiões institucionais estabelecidas, brotam agora espontaneamente, como cogumelos em terra maninha, as novas formas de religiosidade» (Jorge Coutinho, Caminhos da Razão no Horizonte de Deus, 51). Entramos, assim, na pós-modernidade, alérgica aos grandes sistemas e, em geral, a tudo o que é da ordem do institucional e impositivo, a que sucede a «cultura do fragmento», do individualismo e do relativismo. As XXIX Jornadas Teológicas iniciaram com Maria Clara Bingemer que, com uma comunicação intitulada «Deus na sociedade contemporânea», procurou refletir sobre a necessidade de Deus para o ser
humano. Hoje, como outrora, Deus continua a ser questão que atrai, intriga e instiga. Por isso, enquanto a existência permanecer mistério, há fortes probabilidades de Deus permanecer para muitos como resposta credível. No segundo dia, o professor Guilherme d’Oliveira Martins abordou «O fenómeno religioso como identidade e cultura europeia», defendendo que o trajeto da modernidade exige repensar e fazer redescobrir a identidade cristã, no que tem de cultura da diferença dialógica, em que cada um encontra a sua identidade na relação com o diferente. Neste sentido, o conferencista apelou à necessidade de uma cultura de paz, que se traduz numa cidadania inclusiva, numa sociedade aberta, tolerante e que respeita, numa economia para as pessoas, num desenvolvimento sustentável, num pluralismo e unida-
de na diversidade e na coesão económica e social. Por fim, vários oradores, representantes do Cristianismo, do Judaísmo e do Islamismo, contribuíram para a reflexão acerca do diálogo inter-religioso enquanto caminho em direção à paz para a sociedade atual. Este diálogo torna-se um imperativo e os recentes acontecimentos em várias cidades europeias são prova disso. Tal como escreveu Hans Küng, «não pode haver paz entre as nações sem paz entre as religiões. Não pode haver diálogo entre as religiões sem procura de um fundamento teológico».
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SEMINÁRIO MAIOR
“TEMOS MÃE!” Pedro Antunes, 3.º ano
“Temos Mãe!” Foram estas as palavras que o Papa Francisco utilizou para comentar o Evangelho da missa de canonização de Francisco e Jacinta Marto. O sucessor de São Pedro prosseguiu, dizendo que “Deus escolheu o coração inocente e a simplicidade dos pequenos Francisco, Jacinta e Lúcia” para depositários da sua mensagem e que “também nos nossos dias há muita necessidade de oração e penitência para implorar a graça da conversão, como também o fim de muitas guerras pelo mundo, e são cada vez mais, dos conflitos absurdos e das violências, grandes e pequenas, que desfiguram o rosto da humanidade”. A paz é precisamente um dos núcleos da Mensagem de Fátima. Por isso, neste que é o mês mariano, a comunidade do Seminário Conciliar S. Pedro e S. Paulo não poderia deixar de se associar, presencialmente, no dia 13 de maio, em Fátima, a este momento de grande alegria para a Igreja. São Francisco e Santa Jacinta são os santos mais jovens da Igreja Católica, isto é, os dois modelos de santidade mais novos que podemos encontrar na gloriosa galeria dos santos. Vivendo esta alegria, a comunidade do Seminário Conciliar dedicou a Maria, no passado dia 14 de maio, o hino “Akathistos”, que significa “cantado de pé”. Este hino é a 10
mais bela composição mariana do rito bizantino e canta o mistério da encarnação salvífica do Verbo de Deus, desde a anunciação até à parusia, contemplando a Virgem Mãe
indissoluvelmente unida a Cristo e à Igreja. Composto pouco depois do Concílio de Calcedónia (451), apresenta, em forma de síntese orante, tudo o que a Igreja dos primeiros séculos acreditou e exprimiu sobre Maria em declarações do magistério e no consenso universal da fé. Vale, pois, a pena que todos o cantem como prelúdio da tão premente unidade dos cristãos, dom do Espírito Santo (cf. TMA 34). Maria, que concebeu o Verbo encarnado por obra do Espírito Santo e que, durante toda a sua existência, se deixou guiar pela sua ação interior, é a Mãe que ensina a todos os discípulos do Senhor a docilidade à voz do Espírito (cf. TMA 48).
PASTORAL UNIVERSITÁRIA
O SIGNIFICADO E ALEGRIA DE COMEÇAR Eduardo Miranda (Curso de Comunicação da Universidade do Minho)
Quem não soubesse o que se passava, teria achado estranho que, ao chegar ao Parque da Ponte, no dia 13 de Maio, estivesse montado debaixo das árvores um palco e um sistema de som, houvesse cadeiras alinhadas e jovens de traje envergado e com tricórnios de cores diversas e ainda, ao fundo, uma assistência numerosa e de aplauso fácil às palavras da tribuna. Terminar um curso superior é um marco na vida de um estudante. É uma ocasião simultânea e paradoxalmente velha e nova. Velha, pelo significado que a Bênção de Finalistas tem: esse significado, próprio da celebração, é constante de ano para ano e todos os anos emerge no local onde a Bênção se realiza. Nova, porque, apesar da constância anual do significado, ela é sentida por pessoas (os estudantes, as famílias e os amigos) e gerações necessariamente diferentes. Paradoxal pode parecer também incluir no título o verbo ‘começar’ quando falamos de uma cerimónia que pretende homenagear finalistas. Num dia como o último 13 de Maio, agradecemos a Deus, à nossa família, aos nossos amigos e aos nossos professores o apoio e a orientação do nosso esforço e dedicação durante o curso. Conscientes da importância desses elementos, olhamos para a referida celebração como o momento em que damos graças por tudo o
que de bom (nos) aconteceu durante o curso. Porém, encaramos o dia também como um ponto de partida para uma viagem feliz que vai continuar e durante a qual brindaremos todos os dias com os nossos compagnons de route. Óbvio é que a ‘alegria’ não representa paradoxo algum, pois ao lado dos que mais queremos e amamos, a viagem corre sempre bem. “A lâmina baça e agreste que endurece[u] a luz dos olhos em bisel cortados” evoca, é certo, uma tristeza e saudade por sabermos que algo aqui termina. O contexto das aulas e o da festa deixam de ser os palcos da nossa convivência e, sejamos francos, existe a
probabilidade de esse convívio ser mais disperso no calendário do que até agora. Mas, mais do que promessa, fica a certeza da existência de elos que nos unirão e de forças que nos aproximarão sempre que as vontades o queiram. O padre Eduardo Duque não foi parco nas certeiras palavras de encorajamento, de esperança, de amor, dirigidas aos jovens e às famílias. Ao ver, nessas palavras, sementes que nos foram dadas por Deus, vamos semeá-las no mesmo jardim dos nossos familiares, amigos e professores. Regamos e rezamos todos os dias, na certeza de que elas cairão em terra boa. E darão fruto. 11
PASTORAL DE JOVENS
“FELIZ DE TI, PORQUE ACREDITAS!” Susana Vilas Boas
No passado dia 27 de maio, celebrou-se o Dia Arquidiocesano da Juventude. Este ano, o encontro decorreu em Celorico de Basto e contou com a presença de centenas de jovens vindos dos diferentes arciprestados da Arquidiocese. Movidos pelo tema do encontro – “Feliz de ti, porque acreditas” –, estes jovens caminharam com os olhos postos em Maria e, a seu exemplo, quiseram dizer “sim” aos apelos de Deus e à vivência da fé. O dia começou em marcha, rumo à imagem de Maria, e em descoberta da vida do Venerável Frei Bernardo de Vasconcelos que, nascido em Celorico de Basto, em 1902, continua a ser, hoje, um exemplo para os jovens. Chegados junto ao andor de Maria, os jovens partilharam entre si o que haviam aprendido acerca da vida deste monge beneditino e, sob o olhar atento da Mãe do Céu, quiseram colaborar com questões tendo em vista o Sínodo dos Bispos sobre os Jovens, que se realizará em 2018. De facto, foi à luz destas questões sobre os porquês da fé e da vivência eclesial que se deu início a uma pequena procissão até ao espaço reservado para a celebração da Eucaristia. Durante esta procissão, os cânticos e o clima de oração destes jovens serviram de chamamento a muitos cristãos que, sendo menos jovens, quiseram, também eles, juntar-se à procissão e participar na Eucaristia, presidida por D. Nuno de Almeida e celebrada com entusiasmo, tendo presente o “sim” de Maria e o “sim” de Frei Bernardo Vasconcelos. Aqui se fez memória da mensagem feliz da nossa Mãe e da vida de um jovem que marcou a sociedade da sua época e a dos nossos dias. Depois da Eucaristia, muito participada por todos, e de um jantar pleno de convívio e alegria cristã, os jovens ousaram ir
mais longe e quiseram continuar o dia na presença de Maria. Numa pequena procissão de velas, seguiram até ao espaço reservado para a conclusão deste dia. Aí chegados, foi tempo de cantar a fé com a ajuda da Banda “Suspensórios” e da Banda S. Sebastião. No fim do dia, todos regressaram às suas paróquias e às suas casas com alegria renovada. Uma alegria aprendida de Maria e que espelha a fé de uma juventude que quer continuar a ousar ir mais longe; uma juventude que quer ousar dizer “sim” ao chamamento de Deus no coração da Igreja e do mundo de hoje; uma juventude que, contra ventos e marés, quer continuar a dizer: “sim, sou feliz porque acredito!”
Os artigos publicados no “Voz de Esperança” seguem, ou não, o novo acordo ortográfico consoante a escolha dos autores.
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