Voz de Esperança Nov/Dez 2018

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NOV - DEZ / 2018

ACOLHENDO A DIFERENÇA COMO DOM DO ESPÍRITO

Director: e ro Ano XXIII - 6 Série 1,00

artins Nº 67

a es odr ues Bimestral

“É necessário que todos, na sua diferença, sejam acolhidos e ajudados na sua caminhada na fé”. Nazaré Dantas Págs. 2-3

JOVENS, TENDES UMA PALAVRA A DIZER! “Os jovens não são apenas o amanhã, eles são o hoje da Esperança que habita toda a Igreja e toda a sociedade”. Dep. Arq. de Pastoral Juvenil Pág. 12

EDITORIAL

ACOLHER PARA DISCERNIR

VIGÍLIAS DE ORAÇÃO PELOS SEMINÁRIOS re a de o aulo ( em n r o onc l ar de ra a 16 de novembro 21h15 re a de anta ar a do ouro ( mares 23 de novembro 21h15

Aproxima-se a Semana dos Seminários sob o lema “Formar discípulos missionários”, um dos momentos mais significativos que coloca a realidade do Seminário, enquanto proposta de discernimento da vocação, no “radar” da vida da Igreja. Todo o chamamento tem a sua origem no olhar amoroso de Deus, que reclama, em nós, acolhimento e resposta. Para isso, no interior deste jornal, a partir da diversidade dos e nos relatos, perceberemos a necessidade da resposta, discernida na unidade da diferença de cada um, numa radical e total entrega. A propósito, no Sínodo dos bispos intitulado “Os jovens, a fé e o discernimento vocacional”, numa carta que enviou aos jovens, o Papa Francisco, após a referência às palavras que Deus dirigiu a Abraão, quando o convidou a sair da sua terra, a deixar tudo e a confiar inteiramente n’Ele, afirma: «Hoje estas palavras são dirigidas também a vós: são palavras de um Pai que vos convida a “sair”, a fim de vos lançardes na direção de um futuro desconhecido, mas portador de realizações seguras ... . Convido-vos a ouvir a voz de Deus que ressoa nos vossos corações através do sopro do Espírito Santo». Por isso, consciente desta enorme responsabilidade que lhe assiste hoje, como ontem, o Seminário de Nossa Senhora da Conceição viu ser atribuído, pela mão do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a condecoração da Ordem de Mérito da Instrução Pública, no contexto da comemoração dos 90 anos da casa, recentemente celebrados, reconhecendo-se, assim, que o Seminário, mais do que um edifício, é sobretudo uma comunidade aberta ao mundo e comprometida com ele. Ter o coração disponível para acolher a voz que inquieta e discernir o ideal de uma vida com sentido é, deste modo, o itinerário de quem quer ser esperança e discípulo para a missão.


VISÃO

ACOLHENDO A DIFERENÇA COMO DOM DO ESPÍRITO Nazaré Dantas

No relato da descida do Espírito Santo no dia de Pentecostes (cf. At 2,1-13), vemos cumprir-se a promessa de Jesus narrada no versículo 16 do décimo quarto capítulo do evangelho de S. João: «Eu apelarei ao Pai e Ele vos dará outro Paráclito para que esteja sempre convosco» (Jo 14,16). Jesus ascende para junto do Pai, mas não deixa a Igreja, que estava a nascer, sozinha. No início do segundo capítulo dos Atos dos Apóstolos, percebemos que estes se mantinham unidos e em oração. É neste contexto que o Espírito Santo desce sobre eles e, cheios do d’Ele, «começaram a falar outras línguas, conforme o Espírito lhes inspirava que se exprimissem» (At 2,4). A presença do Espírito Santo revela não só um Deus que não abandona o seu povo, mas também a diversidade de dons com que cumula esse mesmo povo. Sem o dom das línguas, a tarefa dos apóstolos de irem por todo o mundo anunciar o Evangelho (cf. Mc 16,15) seria muito difícil, senão impossível, de cumprir. Podemos assim perceber que o Espírito Santo inspirou diversos dons naqueles homens, para o cumprimento da sua missão. Da mesma forma, hoje inspira-nos em nós, aqueles que ao longo da história os vão sucedendo na missão. Jesus não deixou os apóstolos abandonados, nem nos deixa a nós. Além disso, são esses mesmos dons dos quais o Espírito Santo nos enche que enriquecem a vivência das nossas comunidades. Porém, nem sempre é fácil conviver com as diferenças. Nem sempre é fácil aceitar quem pensa ou age de uma forma diferente da nossa. Quando visitou a Terra Santa, em 2014, o Papa Francisco referiu na homilia da Santa Missa, em Aman, que

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«a diferença de pessoas e a divergência de pensamento não devem provocar rejeição nem criar obstáculo, porque a variedade é sempre enriquecedora». No entanto, nem sempre tal ideia está clara ou presente na mente de todos. Mas a realidade é esta: a diferença enriquece. Com os seus dons, as diferentes pessoas e grupos presentes numa paróquia são fonte de riqueza porque a própria Igreja é feita de indivíduos que, tendo a mesma vontade de seguir o Senhor Jesus, têm ao mesmo tempo características distintas, necessidades próprias, tal como os povos aos quais, há mais de dois mil anos, os apóstolos foram mandados com a missão de evangelizar. Assim, urge que sejamos capazes de abrir o coração à diferença, não só daqueles que queremos ajudar a crescer na fé, como também daqueles com os quais trabalhamos na edificação da Igreja, Corpo de Cristo. Por vezes, no seio das nossas comunidades, há desentendimentos que têm origem na dificuldade de aceitar as diferenças… É preciso a consciência de que, numa comunidade, o “nós” é uma articulação de diversos “eus” e que, nas nossas diferenças, todos nos devemos «configurar cada vez mais a Cristo, a fim de nos sentirmos todos irmãos e, assim, afastarmos de nós rancores e divisões e nos podermos amar fraternalmente» (Papa Francisco, Aman), e edificar comunidades verdadeiramente cristãs. Para tal, é necessária não só coragem como também compromisso e oração, imitando a atitude dos apóstolos que, mesmo nas suas diferenças, se mantinham unidos orando. Os desafios, com os quais a Igreja e os evangelizadores se deparam, foram mudando ao lon-

go dos séculos. Mas a verdade é que continua a existir a necessidade de nos adaptarmos às diferenças, pois também são muito diferentes aqueles que têm sede ou desconhecem o Evangelho. Naquele tempo, os apóstolos dirigiram-se a «partos, medos, elamitas, habitantes da Mesopotâmia, da Judeia e da Capadócia, do Ponto e da sia, da Frígia e da Panfília, do Egipto e das regiões da Líbia cirenaica, colonos de Roma, judeus e prosélitos, cretenses e árabes» (At 2,9-11) e muitos outros por todo o mundo. Hoje, também nas pequenas comunidades (até em virtude da mobilidade demográfica contemporânea) encontramos grande diversidade: pessoas de idades diferentes, de proveniências sociais e culturais diferentes, com experiências e vivências diferentes, num mundo em que as ofertas a que se está sujeito são também elas muito diferentes da proposta do Evangelho. É necessário que todos, na sua diferença, sejam acolhidos e ajudados na sua caminhada na fé, bem como abrir espaço para que os dons, com os quais o Espírito Santo cumula cada um dos membros do Corpo de Cristo, sejam postos “a render”. Para concluir e em jeito de oração, retomo algumas palavras do Papa Francisco em Aman: «a Ele (Espírito Santo) pedimos que prepare os nossos corações para o encontro com os irmãos independentemente das diferenças de ideias, língua, cultura, religião; que unja todo o nosso ser com o óleo da sua misericórdia que cura as feridas dos erros, das incompreensões, das controvérsias; pedimos a graça que nos envie, com humildade e mansidão, pelas sendas desafiadoras mas fecundas da busca da paz». Só assim seremos capazes de anunciar, a todos os outros, as maravilhas de Deus (cf. At 2,13).

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ARTE

ACOLHER O DOM DO ESPÍRITO Luís da Silva Pereira

Giotto di Bondone, mais conhecido simplesmente por Giotto, foi um pintor e arquiteto italiano. Nasceu em Colle Vespignano, atual Vicchio, em 1267, e morreu em Florença, no ano de 1337. É um artista de enorme importância. Foi ele que começou a introduzir na pintura a perspetiva linear, libertando-a da rigidez e hieratismo da pintura bizantina que tanto influenciou a arte ocidental anterior a ele. Confere, deste modo, à sua pintura uma tridimensionalidade que a aproxima da escultura. Foi ele que começou a colocar emoções intensas no rosto e nos gestos das figuras que pintava. Com ele, as personagens movem-se em atitudes por vezes dramáticas. Por outro lado, começa a apresentar as figuras dos santos como homens de aparência normal e até mesmo vulgar e rude. Isso significa que está a mudar a relação do homem com as figuras sagradas, tornando-as mais próximas de nós. Esse fenómeno é, aliás, comum a todas as outras artes, nos finais da Idade Média, e prolonga-se pelo Renascimento. Giotto é, pois, considerado um precursor do movimento humanista dos séculos XV e XVI. O papa Bento XI chamou Giotto para Roma, onde viveu durante dez anos. Em 1320, voltou para Florença,

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para chefiar a construção da Catedral. Aí morreu. A pintura que vamos comentar encontra-se na capela dos Scrovegni, em Pádua, que é considerada por críticos e historiadores como uma espécie de capela Sistina da pintura gótica. O tema escolhido é a descida do Espírito Santo sobre os apóstolos, ou Pentecostes, e ilustra o tema proposto para o triénio do Ano Pastoral da Arquidiocese de Braga, que é o de semear a Esperança, acolhendo o dom do Espírito, o que supõe ter um coração aberto à grande novidade que o Espírito Santo derrama sobre o mundo, para o renovar radicalmente. Há três iconografias fundamentais do Pentecostes: uma em que os apóstolos se encontram reunidos com Nossa Senhora, sempre em lugar central, e com mais outras mulheres; uma segunda, como é o caso presente, em que se encontram apenas os apóstolos. De notar que a presença da Mãe de Jesus é justificada pelo que narram também os Atos dos Apóstolos, no capítulo 1, 14: “E todos unidos pelo mesmo sentimento, entregavam-se assiduamente à oração, em companhia de algumas mulheres, entre as quais Maria, mãe de Jesus”. A terceira iconografia é tipicamente bizantina, e apresenta, de pé, à porta do cenáculo, um rei coroado, que é

o Cosmos, significando todos os povos do mundo a quem os apóstolos são enviados para os evangelizarem. Segura na mão um pano onde se encontram doze rolos, simbolizando a pregação dos doze apóstolos. Se bem repararmos na pintura, os doze apóstolos, identificados pelos nimbos à volta da cabeça, encontram-se encerrados num espaço bem isolado. As janelas estão tapadas e a porta de entrada encontra-se igualmente fechada. Isto significa, em nossa interpretação, o estado de medo em que os apóstolos se encontravam antes de receberem o Espírito Santo. O Espírito Santo paira, sob a forma de pomba, junto ao teto do salão, e os seus raios luminosos repartem-se sobre as cabeças dos apóstolos em forma de línguas vermelhas de fogo. A partir deste momento, os apóstolos começam a falar em várias línguas, com espanto de quantos os ouviam. Essas pessoas são representadas, em nossos entender, pelos três homens que estão fora do cenáculo. A figura, de pé, à nossa esquerda, tem a mão direita na barba, em atitude de enorme perplexidade perante o que está a acontecer. As duas outras figuras olham-se mutuamente, com ar de espanto, procurando talvez uma explicação para tão invulgar fenómeno. Seriam os judeus piedosos provenientes de todas as nações debaixo do céu, como diz o texto.


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SEMINÁRIO MENOR

PROGRAMAÇÃO INTERIOR E EXTERIOR ENCONTRO DE PROGRAMAÇÃO DO ANO Pedro Martins, 12º ano

A comunidade do Seminário de Nossa Senhora da Conceição viveu, entre os dias 22 e 23 de setembro, o seu encontro de programação do ano, realizado em Darque, na Casa Pastoral Paulo VI, diocese de Viana do Castelo. Começamos este encontro de mais um novo ano letivo e pastoral louvando a Deus por aquela manhã, através da celebração das Laudes, onde rezávamos “Bendita esta manhã que nos traz a notícia da presença de Deus jovem e glorioso”. De seguida, fomos acolhidos pelo Bispo da Diocese de Viana do Castelo, D. Anacleto Oliveira, que com muito carinho nos interpelou, tendo em conta o nosso percurso de discernimento vocacional, “a escolhermos não o caminho em que nos sintamos felizes, mas o caminho em que façamos os outros felizes, porque, ao fazermos os outros felizes, com certeza que também o seremos”. Certamente que um dos grandes objetivos deste fim de semana foi programar o ano. Por isso mesmo, tivemos um momento de plenário, onde as várias equipas de trabalho do Seminário apresentaram as suas áreas de atuação, assim como as propostas para o novo ano. Seguiu-se o momento de almoço no alto do monte de São Silvestre, em Cardielos, onde tivemos a oportunidade de viver um momento de especial convívio, seguindo-se uma visita à Igreja Paroquial de Serreleis. 6

Esta atividade de início de ano também ficou marcada por uma formação sobre aspetos litúrgicos, orientada pelo Pe. Rui Sousa, onde aprofundamos alguns temas, em especial a oração pessoal, base de uma vida cristã. Logo depois tivemos a celebração das Vésperas, onde rezávamos em uníssono “Como é profunda a riqueza, a sabedoria e a ciência de Deus!”. Posteriormente, findo o jantar, visitamos o centro histórico de Viana do Castelo, como forma de conhecer a cidade e de aprofundar o espírito de comunhão entre os seminaristas e a equipa formadora. No segundo dia deste fim de semana, dia da Ressureição de Jesus, louvamos novamente a Deus, através da oração de Laudes e da celebração da Eucaristia, no Santuário do Sagrado Coração de Jesus, situado no monte de Santa Luzia, que aconteceu após uma longa caminhada. Posto isto, regressamos ao Seminário, agora já fortalecidos, pois, com esta atividade, pudemos programar não só o exterior, isto é, o que diz respeito à comunidade do Seminário, mas também o interior, para que todos sejamos uma comunidade unida, formando um só corpo em Jesus Cristo, cerne da mesma. Com efeito, esta atividade teve como principais finalidades programar um novo ano e fortalecer os laços de amizade entre a comunidade, num ano em que somos desafiados a “Ser Esperança”.


SEMINÁRIO MENOR

SEMINÁRIO DE NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO CONDECORADO PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA Equipa Formadora

O Presidente da República, Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa, atribuiu a Ordem de Mérito da Instrução Pública ao Seminário de Nossa Senhora da Conceição, também conhecido como Seminário Menor de Braga, respondendo, assim, a um pedido efetuado aquando da celebração dos 90 anos deste Seminário, inaugurado no dia 14 de novembro de 1924. A cerimónia da condecoração decorreu no dia 9 de outubro, às 18h00, no Palácio de Belém, em Lisboa, contando com a presença de elementos da direção do Seminário de Nossa Senhora da Conceição, encabeçada pelo Reitor, Pe. Mário Martins, e de uma delegação da Associação dos Antigos Alunos dos Seminários de Braga, liderada pelo presidente, José Maria Lima da Cruz. No decorrer desta condecoração, o Presidente da República afirmou que as instituições que servem a sociedade portuguesa, como aconteceu e acontece no caso do Seminário de Nossa Senhora da Conceição, “são dignas de receber esta insígnia da Ordem de Mérito da Instrução Pública, uma distinção honorífica que honra não apenas a instituição, mas também a sociedade portuguesa. Na verdade, devemos todos sentir-nos honrados e, sobretudo, agradecidos pela instrução, formação e educação proporcionadas a tantas pessoas, um preciosíssimo contributo ao serviço e construção da sociedade a que todos

nos orgulhamos de pertencer, seja pelo empenho do passado, seja pelo compromisso futuro que este galardão também significa”. Tendo estado presente e recebido das mãos do Presidente da República a referida condecoração, o Pe. Mário Martins começa por agradecer este gesto de condecoração que surge na sequência do convite feito pela Associação dos Antigos Alunos dos Seminários Arquidiocesanos de Braga, a propósito da comemoração dos 90 anos desta casa, recentemente celebrados. Na realidade, e como enfatiza o responsável da instituição, “o Seminário de Nossa Senhora da Conceição narra, com a gramática dos afetos e das vidas que se cruzaram, a história de um caminho de incomensurável riqueza, feito pelos mais de 9000 seminaristas que passaram pela história mais recente destes 90 anos, dos quais 1500

receberam o ministério ordenado, dos quais, mais tarde, alguns receberam a ordenação episcopal ou foram elevados ao cardinalato. De facto, ao longo destas nove décadas, o Seminário de Nossa Senhora da Conceição instruiu, formou e educou milhares de jovens provenientes desta região norte do país. Mesmo os jovens que não seguiram a vocação sacerdotal tiveram, em muitos casos, oportunidades profissionais diversas, tornando possível um serviço diferenciado e muito útil à nossa sociedade. O motivo principal desta condecoração pretende, por isso, reconhecer, publicamente, o papel único e o valioso mérito que este Seminário desempenhou na formação deste grande número de jovens, assim como o seu precioso contributo ao serviço da construção da sociedade portuguesa ao longo destes, agora, mais de noventa anos da sua existência”.

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SEMINÁRIO MAIOR

UM ANO A GERMINAR Rafael Gonçalves, 3ºano

Entre os dias 4 e 7 de outubro decorreu, no distrito de Évora, o fim de semana de programação da nossa comunidade de seminário. A atividade começou com a visualização do filme «Des hommes et des dieux», depois da qual se procedeu a uma reflexão que procurou visar aspetos que podem ser úteis para uma melhor convivência em comunidade, quotidianamente. Após o jantar, realizou-se a apresentação do livro Restauro Filológico. Órgão – Manuel de Sá Couto, intercalada com um concerto realizado pelo organista convidado, André Bandeira e pela Schola Cantorum. No dia seguinte, partimos rumo a Vila Viçosa, onde ficamos hospedados no Seminario Menor. Após o almoço, partilhamos as reflexões feitas em grupo no dia anterior. Logo de seguida, tivemos presente entre nós, D. Francisco Senra, arcebispo de Évora, o qual celebrou connos-

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co a eucaristia e, logo após o jantar, encontrou-se connosco a fim de nos desafiar à abertura da mentalidade para os possíveis problemas futuros, passando pela evangelização a partir de pequenos grupos, entre muitos outros desafios. Após esse momento reflexivo, pudemos conhecer melhor as ruas de Vila Viçosa. No dia seguinte, após a eucaristia e o pequeno-almoço, saímos para Évora, onde fomos visitar o Mosteiro da Cartuxa, no qual os monges levam uma vida solitária de oração e contemplação, e a Sé Catedral de Évora. Almoçamos no Seminario Maior, em Évora, onde pudemos conhecer alguns dos seminaristas, bem como as suas raízes e tradições. Seguidamente, visitamos a Igreja de São Francisco e a Capela dos Ossos, local que nos convida a refletir sobre a efemeridade da vida humana e, por isso, a um compromisso de uma permanente vivência da fé. Depois, tornou-se

oportuna a visita ao Centro Histórico de Évora, antes do regresso para Vila Viçosa. Já em Vila Viçosa, desfrutamos de uns momentos de convívio, relaxamento e descanso. No último dia, após a eucaristia e o pequeno-almoço, visitamos o Paço Ducal de Vila Viçosa, mandado construir em 1501 pelo quarto Duque de Bragança. Despedimo-nos assim do Seminário Menor de Vila Viçosa após o almoço. No regresso, aproveitamos ainda a oportunidade de nos deslocarmos ao Mosteiro de Alcobaça, património mundial da UNESCO desde 1989. Daqui partimos em direção à cidade de Braga. Estes momentos de lazer, cultura e meditação proporcionaram uma enriquecedora reflexão para o início deste novo ano letivo, quer a nível intelectual, quer a nível espiritual e pastoral, com vista a uma melhor vivência comunitária.


FAMÍLIA EM MISSÃO Jaimito China e Guilherme Martins, Ano Propedêutico

No dia 11 de outubro, o CMAB (Centro Missionário Arquidiocesano de Braga) realizou um encontro com os seminaristas dos Seminários Maior e Menor. O encontro principiou com uma celebração Eucarística, presidida pelo Pe. José Dias Lima, na Igreja de São Paulo. Seguiu-se o jantar e, por último, o testemunho missionário do casal Susana e Adelino, a respeito de ser uma família em missão. Antes de tudo, o Pe. Vítor Novais deu as boas vindas a todos e manifestou a sua alegria pela criatividade do CMAB, o sair para anunciar, porque, desta forma, todos como Igreja concretizamos o apelo do Papa, «ser uma Igreja em saída». Há muitas formas de ser missionário(a). Santa Teresinha nunca saiu do convento e tornou-se padroeira das missões ao lado de São Francisco Xavier, que evangelizou na Ásia. Hoje em dia, uns evangelizam pelas obras, outros pelas atitudes e outros, ainda, pelo sofrimento. Susana e Adelino foram chamados a São Tomé para uma missão. No dia 11 de maio de 1991, na Igreja de São Pedro de Rates, Deus uniu-os e fez deles um só corpo (matrimónio). Agraciados por Deus sempre, eles e os seus filhos dedicaram-se ao serviço da Igreja em várias dimensões (catequese, grupo coral da paróquia). Se alguém quer seguir-me, renuncie a si mesmo tome a sua cruz e siga-me (Mt 16: 24). Não foi fácil tomar

a decisão, mas o bom é que todos os apoiavam. E com a graça de Deus eles aceitaram e foram dar o melhor de si ao povo de São Tomé, um povo com muitas necessidades, mas que agradecia pelo pouco que lhe era dado. Através deste povo, com um coração de missionário, eles aprenderam a ser humildes sem ser humilhados, administrar a motivação e lidar com as diferenças. Para além dos inúmeros trabalhos que tinham, como por exemplo, agricultura, saúde, formação dos catequistas, construção civil, etc., também eles vendiam chocolates para garantir a própria vida e a dos outros. As dificuldades que encontravam nunca os impediam de realizar a sua missão. Afinal, o vencer das adversidades também faz parte da missão, porque em tudo Deus mantinha-os sempre firmes na fé, alegres na esperança e generosos na caridade,

e, pela caridade, aprenderam que “irmão” é nome sagrado, é ligação para a vida e é dádiva de Deus. Com eles ficou a experiência e a vivência. Portanto, neste testemunho temos uma linda lição de vida, “nada passa pela nossa vida por engano. Não existem erros nos planos de Deus.” Por isso, entender a vontade de Deus nem sempre é fácil, mas crer que ele está no comando e tem um plano para a nossa vida, faz a caminhada valer a pena. Para terminar, a Sara, responsável do CMAB, juntamente com o Pe. Jorge agradeceram ao casal pela disposição e colaboração. E a todos pediram que o testemunho deste casal suscite em nós a vontade de vivermos o nosso chamamento a sermos missionários, porque a missão não é somente para os consagrados, mas para todos os batizados. 9


SEMINÁRIO MAIOR

SERÃO CULTURAL COM O DR. ÁLVARO LABORINHO LÚCIO Miguel Rodrigues, 5º Ano

Que compromisso assumo com o mundo e face à sociedade em que vivo? Como me confronto com a realidade que me rodeia? Quem sou eu como pessoa? Estas, e outras questões, foram a base de um serão cultural em que a comunidade dos Seminários Arquidiocesanos puderam confrontar e reconhecer as suas ideias no que concerne à formação dos futuros pastores. No eixo congregador deste diálogo apresentou-se como convidado e interpelador o Dr. Álvaro Laborinho Lúcio, jurista de formação, natural da Nazaré e cujo currículo é precioso e incontestável. Por conseguinte, todas as condições estavam reunidas para uma noite ímpar, principalmente no estímulo da atividade crítica, criativa e edificativa. Comprometido com o seu auditório, o Dr. Laborinho Lúcio, homem de diálogo e de humor refinado, interpelou-nos com três dimensões que alimentam e fomenta esta hermenêutica do compromisso. Assim, destaca-se a natureza pessoal, social e relacional de cada pessoa. Tendo-se apresentado, inicialmente, como um homem crente, embora com muitas dúvidas, o Dr. Laborinho Lúcio, apresentou-nos, claramente, uma reflexão que se reveste de enorme importância num contexto de formação e discernimento vocacional. Fez uso de expressões claras e vinculativas que expressam a valorização da pessoa humana, de uma sociedade que deve caminhar 10

para que todos cheguem ao limiar do humano, e não a aceitação de uma profetização desencarnada que promove uma “era da pós-humanidade”. A pessoa em pobreza extrema é excluída, pelo que faz parte da missão do cidadão ativo e comprometido trazer cada um à condição de sujeito. Tecnologia, educação, ética, liberdade e justiça foram também alguns dos temas abordados ao longo da noite, ficando a certeza de que o poder ou qualquer tentativa de imposição/dominação não está na possibilidade ilimitada de criticar tudo e todos, não está no uso possessivo da tecnologia, mas no cuidado da liberdade e valores que devem resistir face ao imperativo do lucro. Também a educação deve promover a inclusão total, pelo que a escola não pode ser lugar de vencedores e vencidos, mas lugar da valorização da utopia, do nunca desacreditar do dito “impossível”. Os aspetos até agora salientados foram sendo relacionados e apoiados, pelo orador, numa mensagem

que privilegia a saída, o reconhecimento do outro na sua diversidade e que vem sendo explanada pelo Papa Francisco, em particular na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium. Deste modo, toda a comunidade do Seminário sentiu-se profundamente interpelada a cuidar do legado que recebe, assim como das relações e encontros, tendo sido frisado o cuidado permanente na atenção dada às homilias, enquanto momentos profundos e sérios de relação de um com o outro. Por fim, importa agradecer a presença, as interpelações e riqueza que o Dr. Laborinho Lúcio acrescentou a todos e a cada um de nós. Sem dúvida um homem ímpar no nosso contexto nacional e que nos deixa a forte convicção de que um compromisso crítico e criativo assume as utopias da humanidade, reconhecendo-se a dinâmica relacional e afetuosa de uns com os outros como a chave hermenêutica da procura de sentido e razões do nosso próprio existir.


PASTORAL UNIVERSITÁRIA

RESIDÊNCIA UNIVERSITÁRIA A PROMOVER O VALOR DA PESSOA Sara Madureira (2º ano de Sociologia da Universidade do Minho)

O caminho são os outros. A minha educação partiu sempre deste princípio, de que o próximo, o outro será sempre a minha missão, a missão da vida, que passa por vários desafios. O maior desafio é sempre aquele que lida com a singularidade e a diferença do outro. À medida que crescemos em sociedade vamos dando conta de que a humanidade é, unicamente, uma construção do coletivo e que aquilo que somos depende do próximo. Todos nós damos, de uma forma ou de outra, um bocadinho de nós. Quando estamos tristes, porque algo não correu como esperávamos, todos nós precisamos de um conforto, de um carinho, de um colo, de uma simples presença, de uma palavra. Todos nós crescemos a pedir ajuda, seja em casa, na universidade, no trabalho, na rua. Somos corpos que bailam de incompleto, falta-nos sempre alguma coisa, por isso, precisaremos sempre, mas sempre de um apoio, de uma proteção.

É neste sentido que nasce o Projeto dos Residentes. É um projeto de integração, ainda muito recente, que tem como objetivo a construção de um espaço comum, de partilha de conhecimentos, vivências, desabafos, alegrias, tristezas. Um espaço de proximidade e respeito. É num espírito solidário, de carinho, afeto, amizade e familiaridade que tudo se cria sempre em função do outro e, de uma forma especial, procuramos ter este olhar para com a comunidade estrangeira que, muitas vezes, se sentem solitários e desprotegidos, já que se encontram longe das suas terras e famílias. Este projeto já tem previstas algumas atividades, entre as quais, o jantar de receção aos residentes, o magusto de S. Martinho, a Ceia de Natal. Conta também, com a criação de diversos grupos (musicais, desportivos, leitores, coro) com vista à integração e ao bem-estar pessoal, espiritual e físico dos residentes. Neste momen-

to, o grupo musical já se encontra ativo nas missas dos universitários, que ocorrem todas as terças-feiras na capela do Centro Pastoral Universitário. Os restantes grupos estão ainda em constituição, vão de uma forma, um pouco mais lenta, desenvolvendo os seus objetivos. Sem darmos conta, a fugacidade da vida, coloca-nos num estado de coisas líquidas, rápidas, fluídas, onde tudo se torna passageiro, sem emoção, sem motivo, ficando para trás tudo o que a vida tem de bom, de genuíno, especial, rico e único. Isto leva-me a pensar que um desafio ou uma causa deve ser sempre abraçada de uma forma especial, fazer o bem e partilhá-lo. E é neste espírito de uma respeitosa harmonia com os outros que o Projeto desta Residência da Pastoral Universitária, que acolhe trinta e cinco jovens universitários, de várias nacionalidades, se desenvolve de dia para dia e no caminho certo.

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PASTORAL DE JOVENS

JOVENS, TENDES UMA PALAVRA A DIZER! Departamento Arquidiocesano de Pastoral Juvenil

O Sínodo dos Bispos dedicado aos jovens tem vindo a desenvolver a urgência, apontada pelo Papa Francisco, de dar voz aos jovens na Igreja, para melhor perceber o caminho que esta é chamada a percorrer. Esta tem marcado todo o diálogo sobre as preocupações da Igreja no que se refere à evangelização das novas gerações. A XV Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos incidiu sobre a relação entre fé e vocação. Uma temática sempre atual quando se fala de juventude e, particularmente, de juventude cristã, sempre em busca de um caminho pessoal e comunitário, no Mundo e para o Mundo, a partir da Igreja e dentro dela. Ao contrário do pensamento habitual de que os jovens são o futuro, o Papa chama a atenção para o presente: um presente em que os jovens participam e são chamados «a ajudar a Igreja Católica a identificar a maneira mais eficaz de levar à sociedade a Boa Nova». Estas palavras vão de encontro ao sentir da Igreja atual que, à semelhança do que acontece nas narrativas bíblicas, compreende que é através dos jovens que a Igreja continua a escutar a voz de Deus. Porém, a Igreja, sendo jovem, não pode

descartar a responsabilidade da sua missão evangelizadora, remetendo-a unicamente aos jovens. Todo o Povo de Deus é chamado a esta missão, competindo aos mais velhos acompanhar os mais jovens, ajudando-os a discernir a sua vocação e a reconhecer «o chamamento ao amor e a uma vida plena». O Sínodo dos Bispos partindo das respostas aos questionários que circularam por diferentes dioceses em todo o Mundo, assumem como princípio de reflexão, a própria voz dos jovens, as suas aspirações, anseios e preocupações sobre o presente e o futuro da Igreja. Este é um momento privilegiado para escutar a voz dos jovens, cientes que neles o Espírito Santo se manifesta com uma linguagem direta e ousada. Linguagem esta que permitirá à Igreja descobrir novos caminho e renovar caminhos já trilhados, rumo a um futuro cheio de Esperança. Neste ano pastoral, à luz desta reflexão, os jovens bracarenses são chamados a estar atentos, na medida das suas possibilidades, aos desenvolvimentos do sínodo. Nesta certeza os jovens não são apenas o amanhã, eles são o hoje da Esperança que habita toda a Igreja e toda a sociedade.

Os artigos publicados no “Voz de Esperança” seguem, ou não, o novo acordo ortográfico consoante a escolha dos autores.

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Que o Senhor vos conceda o Seu amor e Graça.

Propriedade do Seminário de Nossa Senhora da Conceição

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SUPLEMENTO

SEMANA DOS SEMINÁRIOS SUMÁRIO ENTREVISTA COM SEMINARISTA PEDRO ANTUNES, PÁG. 2

PRÉ-SEMINÁRIO – INFORMAÇÕES, PÁG. 6

TESTEMUNHOS: — PEDRO CUNHA (PRÉ-SEMINARISTA DO SEMINÁRIO MENOR), PÁG. 8

— SIMÃO MALHEIRO (PRÉ-SEMINARISTA DO SEMINÁRIO MAIOR), PÁG. 8

— RUI ESTEVES (SEMINARISTA DO SEMINÁRIO MENOR), PÁG. 8

— PADRE FILIPE ALVES, NATURAL DE BICO, PÁG. 9

— PADRE LEONEL CUNHA, NATURAL DE CAIRES, PÁG. 10

PROVOCAÇÃO, PÁG. 11

CULTURA, PÁG. 12


ENTREVISTA

O PAPEL DA FAMÍLIA …

… no crescimento da fé …

“Mas não quero calar os sentimentos que me brotam da alma, acerca desta vossa serva que, pela carne, me concebeu para a vida temporal e, pelo coração, me fez nascer para a vida eterna” (Confissões, IX, 8). Estas palavras de Santo Agostinho, referindo-se a sua mãe, Santa Mónica, ajudam-nos a vislumbrar o papel que a família tem no crescimento da fé. Por mais palavras que escreva, não conseguirei atingir a sua profundidade! A família é uma das instituições mais “atacada” na sociedade contemporânea. Algumas ideologias, com claros interesses políticos, têm procurado desconstruir o significado da palavra família, levando-a a querer significar ou expressar “tudo e mais alguma coisa”. Por isso mesmo, algo que pretenda significar tudo, corre o risco de não significar nada. Talvez seja isso o que alguns pretendem… No que respeita ao concreto da família cristã, existem muitos textos da Sagrada Escritura que nos desafiam a perceber o papel nuclear que a família tem no crescimento da fé. Basta, desde logo, pensarmos que Jesus fez uma grande parte do seu amadurecimento espiritual no seio de uma fa2

mília. É uma das conclusões que podemos tirar do Evangelho de S. Lucas que afirma: “Desceu então com eles para Nazaré e era-lhes submisso. Sua mãe, porém, conservava a lembrança de todos esses factos em seu coração. E Jesus crescia em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Deus e diante dos homens” (Lc 2, 51-53). A família é, por isso, um local de excelência para, tal como Jesus, podermos crescer em sabedoria, estatura e graça, ou, dito, por outras palavras, para podermos amadurecer este elo que nos liga a Deus que é a fé. Reconhecer na família este local de amadurecimento da fé só é possível pelos laços de comunhão, no amor, que unem as famílias cristãs

e que, por isso, se tornam, em certa medida, uma imagem da comunhão do Pai e do Filho, no Espírito Santo (cf. CIC, 2205). É, pois, fundamental que, apesar dos desafios que as famílias cristãs hoje enfrentam, estas nunca desistam de propor uma caminhada de fé aos seus filhos, fazendo cumprir o que prometeram à Igreja de Deus, no dia do Batismo: dar-lhes uma educação cristã. Tenho que agradecer à minha mãe e aos meus avós maternos, por me terem proporcionado essa educação cristã. Sabemos que atualmente, muitos pais nem se importam com essa dimensão espiritual dos seus filhos, pois os sacramentos são encarados


ENTREVISTA

NOTA BIOGRÁFICA Nome: Pedro Antunes Idade: 31 anos (26-11-1986) Naturalidade: Azurém, Guimarães Morada: Bouro Santa Marta, Amares Paróquia: Bouro Santa Maria, Amares Atualmente, sou aluno do 5º ano do Mestrado Integrado em Teologia, na Universidade Católica Portuguesa – Braga e frequento o Seminário Conciliar de S. Pedro e S. Paulo – Braga desde 2014. Em 2013, terminei a licenciatura em Sociologia, na Universidade do Minho e, em 2014, terminei o primeiro ano do Mestrado em Sociologia, na Universidade do Minho, no ramo de Desenvolvimento e Políticas Sociais. Nessa altura estava a realizar um estágio profissional na associação Valoriza – Associação de Desenvolvimento Local, com o objectivo de reduzir a info-exclusão, na terceira idade do concelho de Amares. Ao longo dos anos em que fui trabalhador-estudante, desempenhei atividades profissionais diversas, desde lojista, distribuidor de panificação, técnico administrativo numa farmácia, etc. Também procurei sempre ter um papel cívico ativo na sociedade que me rodeava: fui Presidente da Assembleia de Freguesia de Bouro Santa Maria, no mandato 2013-2017. De 2012 a 2014 fui presidente do Núcleo de Estudantes do Curso de Sociologia da Universidade do Minho. Desde 2005, pertenço ao Grupo de Teatro de Bouro Santa Maria. Durante seis anos também pertenci à Associação Recreativa e Cultural de Bouro Santa Maria. O envolvimento paroquial na comunidade de Santa Maria de Bouro, em muito contribuiu para caminho de discernimento vocacional que estou a fazer. Sou catequista desde que recebi o sacramento da Confirmação, em 2002. Ao longo do tempo, o meu pároco, Padre Paulo Neiva, foi-me desafiando a assumir responsabilidades na paróquia. Fui coordenador paroquial e arciprestal da catequese até à minha entrada no Seminário Conciliar de Braga. Pertenço aos Serviços de Formação do Departamento Arquidiocesano da Catequese de Braga. Sempre procurei estar presente onde a paróquia precisava. Por isso, para além da catequese, pertencia ao grupo coral, ao grupo de leitores e, desde 2009, acompanho o compasso pascal em Santa Maria de Bouro e, desde que estou no Seminário, tive a possibilidade de conhecer, neste âmbito, as paróquias de Santa Marta de Bouro e S. Tiago de Goães em Amares e Oliveira e Frades, na Póvoa de Lanhoso.

como convenções sociais, ou simplesmente são ignorados, servindo-se da desculpa da “liberdade”. Sobre isto, importa referir que, da mesma forma em que os pais não perguntam às crianças se querem comer ou ir à escola e, com isso, não estão a prejudicar o seu livre arbítrio, nem a sua liberdade, mas a zelar pela

A educação na fé que recebemos na paróquia, participando nos sacramentos e na catequese, também é educar para a liberdade. Neste aspeto, alegro-me com o testemunho de um casal amigo que, na minha paróquia, decidiu, à dois anos, inscrever o seu filho na catequese, mesmo não sendo este batizado.

sua educação com amor, devem cuidar para que os filhos recebam uma educação na fé. Não fazendo isso, os pais comprometem o crescimento espiritual dos seus filhos. Sobre isto, recordo-me de umas palavras de um professor que comparou esta situação de não propor o Batismo aos filhos, deixando isso para um dia cada um decidir, com a aprendizagem da linguagem. Se os pais não procuram que os seus filhos desenvolvam a linguagem na faixa etária correta, estes correm o risco de comprometerem para sempre essas capacidades. Mas, por outro lado, se os ensinarmos pelo menos uma língua, eles serão capazes de aprender muitas outras línguas. Se, no crescimento espiritual, não propomos um modelo que seja, as crianças nunca serão livres de, no futuro, poderem adotar um outro modelo (ou aprofundarem este), pois não têm nenhuma referência. Aí sim, perdem a sua autonomia e liberdade.

… no acompanhamento dos jovens (escola, universidade …)

Como é óbvio, este papel da família em ser imagem da comunhão da Trindade e educadora na fé, não se limita ao tempo da infância. Como refere a Lumen Fidei, “sobretudo os jovens, que atravessam uma idade da vida tão complexa, rica e importante para a fé, devem sentir a proximidade e a atenção da família e da comunidade eclesial no seu caminho de crescimento da fé. (…). Os jovens têm o desejo de uma vida grande; o encontro com Cristo, o deixar-se conquistar e guiar pelo seu amor alarga o horizonte da existência, dá-lhe uma esperança firme que não desilude.” (LF, 53). A família tem que se fazer presente neste tempo tão difícil, mas tão belo, da juventude. Ela deve ser uma espécie de “sacrário da fé”, pois é, muitas vezes, durante o tempo escolar 3


ENTREVISTA

e académico que a fé dos jovens é esvaziada de toda a esperança. Tenho muita estima pelos professores e tenho muitos amigos professores, mas, enquanto catequista, ligado, nos últimos anos ao 7º e 8º ano de catequese, deparo-me com jovens que me referem algumas considerações e opiniões pessoais que, alguns professores, tecem sobre a fé em Cristo, ou a vida da Igreja, a relação Igreja-sociedade, ou, simplesmente, da religião em geral e que não refletem em nada, a posição ou o pensamento da Igreja sobre esses assuntos e revelam sobretudo um conjunto de preconceitos pessoais, fruto de uma sociedade do “achismo”. Para nós, catequistas que passamos apenas 2 horas por semana com os jovens, é difícil fazer um acompanhamento adequado. Por isso, a família tem que se mostrar como um pilar da fé cristã para os jovens, mas isso nem sempre é fácil… A família deve ser capaz de apontar sempre O Caminho de esperança que é Cristo. A atitude para enfrentar as dificuldades, na linha do que nos propõe a nossa Arquidiocese de Braga, para este ano pastoral, encontra-se nas palavras de São Paulo: “Sede alegres na esperança, pacientes na tribulação, perseverantes na oração.” (Rm 12, 12). Este ser alegres na esperança implica encarar os desafios do nosso tempo com uma certeza que nos deve animar desde o nosso batismo: se somos batizados já somos ressuscitados em Cristo! É isto que S. Paulo nos refere na Carta aos Colossenses: “Sepultados com Ele no Batismo, foi também com Ele que fostes ressuscitados, pela fé que tendes no poder de Deus, que o ressuscitou dos mortos.” (Col 2, 12). Que outros motivos precisamos para ter esperança?

… no processo de discernimento vocacional (matrimónio, sacerdócio, vida consagrada…)

No âmbito das Semanas dos Seminários ou das Vocações, costumo dizer, aos jovens que vou encontrando nas 4

catequeses, que a família é fonte de todas as vocações. Contudo, não podemos dizer que a família é fonte de todas as vocações, apenas porque das famílias saem pessoas para seguir outras vocações, para além da vocação ao matrimónio. É preciso ir mais além! A família é o local por excelência para que uma vocação possa germinar de forma saudável e discernida, consciente e responsável. É no lar familiar que “se aprende a tenacidade e a alegria no trabalho, o amor fraterno, o perdão generoso e sempre renovado, e, sobretudo, o culto divino, pela oração e pelo oferecimento da própria vida.” (CIC, 1657). Também a Constituição Pastoral Gaudium et Spes refere a missão dos pais, ou de quem faz a vez destes, no processo de discernimento: “Os filhos sejam educados de tal modo que, chegados à idade adulta, sejam capazes de seguir com inteira responsabilidade a sua vocação, incluindo a sagrada, e escolher um estado de vida; e, se casarem, possam constituir uma família própria, em condições morais, sociais e económicas favoráveis. Compete aos pais ou tutores guiar os

jovens na constituição da família com prudentes conselhos que eles devem ouvir de bom grado; mas evitem cuidadosamente forçá-los, directa ou indirectamente, a casar-se ou a escolher o cônjuge.” (GS, 52). No fundo, o amadurecimento humano e espiritual que deve ocorrer no seio da família é um “educar para o Amor” que tem que ser materializado num caminho vocacional, livremente escolhido por cada um. Todo o cristão é chamado à santidade, como nos exorta S. Pedro, na sua Primeira Carta: “assim como é santo aquele que vos chamou, sede santos, vós também, em todo o vosso proceder, conforme diz a Escritura: Sede santos, porque Eu sou santo.” (1 Pe 1, 15-16). Por isso, o cristão, apoiado na família, deve concretizar esta procura pela santidade num caminho de doação e generosidade relativamente ao próximo, que pode ser o matrimónio, a vida consagrada ou o sacerdócio. Trata-se de construir em família um projeto de felicidade para a nossa vida, mas que se alcança pelo amor e serviço ao (O)outro: é estar em permanente missão.


ENTREVISTA

… na tomada de decisão por um caminho (particularmente de entrada no Seminário…)

Não sei se sou o melhor exemplo para falar deste tema, dado que quando falei à minha mãe que ponderava um caminho sacerdotal para a minha vida, já me tinha decidido a entrar no Seminário. Mas reconheço a importância da família compreender as nossas decisões ou mesmo questioná-las. Os nossos pais conhecem-nos tão bem que, por vezes, achamos que os vamos surpreender com alguma decisão e eles já estão mais do que preparados para nos ver a tomá-las. Assim foi comigo, pois quando contei à minha mãe a minha decisão de discernir um caminho sacerdotal, ela apenas me disse que queria que eu fosse feliz e, se era esse o caminho que eu escolhia, ia ter sempre o seu apoio. Mas devemos atender sempre às circunstâncias de cada pessoa em discernimento e de cada família. Admito que, no meu caso, o facto de ser mais velho e de procurar sempre viver na responsabilidade, ajudou a que a minha decisão fosse aceite no âmbito familiar. Contudo, poderão haver jovens que precisem de ser desafiados e interpelados pela própria família a seguirem um caminho de discernimento rumo ao sacerdócio. Por vezes, somos nós próprios que colocamos entraves a esse caminho, porque estamos assombrados por não ter certezas sobre o futuro. Só com a confiança de sentirmos que é Deus quem chama e, por isso, nos dará condições para seguir esse caminho, conseguimos ter a ousadia de dar o primeiro passo. Aqueles que nos amam estarão sempre connosco, seja qual for o caminho escolhido. Mesmo que a nossa decisão possa parecer mais radical, é preciso deixar que seja o tempo, o nosso trabalho quotidiano e, claro, o Espírito de Deus a mostrar a todos que estamos a caminhar para a nossa felicidade. Nesse sentido,

procuro guiar-me pelas palavras de S. Inácio de Loyola: “Trabalha como se tudo dependesse de ti e confia como se tudo dependesse de Deus”.

… e no acompanhamento durante o tempo de Seminário.

Por vezes temos visões deturpadas sobre como será o relacionamento com a nossa família, depois da entrada num Seminário. Pensamos que vamos “deixar” a nossa família, ou que os nossos pais ou irmãos precisam da nossa presença constante, que estão dependentes de nós, etc. Pura ficção! Precisamos ter presente que o papel da família é autonomizar-nos para uma vida em sociedade, que requer uma escolha vocacional discernida. A família será sempre um suporte dessa escolha, mas pode implicar um certo perder para ganhar, à maneira do grão de trigo: “se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto.” (Jo 12, 24). Uma certa distância familiar, ajuda-nos a valorizar e a crescer na relação que temos com a família e ajuda-nos a recentrar essa relação no essencial: o amor. Enquanto cristãos, o nosso horizonte é sempre Cristo, por isso, tudo o que somos, pensamos, sentimos e

fazemos deve estar orientado para esse Horizonte. No meu caso concreto de entrada no Seminário Conciliar de Braga, posso afirmar que a minha família procura estar sempre presente na minha caminhada. Fazemos esta caminhada lado a lado. O Seminário também procura partilhar com as famílias muitos momentos marcantes ao longo do ano. Por isso, nota-se que há um esforço, por parte dos responsáveis pela formação, para que as famílias também sejam parte ativa neste processo de discernimento vocacional. Por fim, quero referir que não sei como agradecer todo o apoio, paciência, confiança, conforto, generosidade, trabalho, espírito de sacrifício (no fundo amor) que recebi da minha mãe, irmãos, dos meus avós, padrinhos, tios, pároco, Equipa Formadora dos Seminários e amigos, toda a minha vida, mas particularmente desde a minha entrada no Seminário Conciliar de Braga. Só posso agradecer a Deus por todas as pessoas que coloca, a cada dia, na minha vida e pedir-Lhe que me faça uma testemunha fiel do Seu Evangelho. Para isso procuro enfrentar a vida desta forma: “Em tudo Amar e Servir.” (S. Inácio de Loyola). 5


PRÉ-SEMINÁRIO

PRÉ-SEMINÁRIO, UM DINAMISMO VOCACIONAL COM SENTIDO

O que é o Pré-Seminário? O Pré-Seminário é uma proposta diocesana para acompanhar adolescentes, jovens e adultos no seu processo de discernimento vocacional. Pretende-se, por isso, ajudar os candidatos ao Seminário a colocarem corretamente e com seriedade a questão vocacional, como abertura a um projeto de vida com sentido, segundo a vontade de Deus. Por outras palavras, é uma caminhada para descobrir aquilo que Deus quer para cada pessoa (a sua vocação) e quais os sinais que Ele revela na sua vida quotidiana. Trata-se de um processo para aprender a escutar a voz de Deus, no testemunho e na alegria de quem quer ser feliz e fazer felizes os outros, nas escolhas que toma para a sua vida. É também uma oportunidade para conhecer o ritmo de vida do Seminário e

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o projeto educativo que este tem para oferecer, numa caminhada conjunta com os formadores e os seminaristas.

Quem pode frequentar o Pré-Seminário? Frequentar o Pré-Seminário implica aderir a Jesus de Nazaré e à sua belíssima mensagem, ou seja, ser seu discípulo, e uma predisposição para fazer um caminho de discernimento vocacional. Quando estas condições estão reunidas em rapazes com idades compreendidas entre os 12 e os 15 anos, então eles podem falar com o pároco, os catequistas e/ou os pais para participarem nos encontros de Pré-Seminário Jovem, que decorre num sábado por mês, entre as 09h30 e as 17h00, no Seminário de Nossa Senhora da Conceição. A partir do 11º ano ou equivalente, os jovens e adultos que queiram compreender se o Seminário os poderá ajudar a discernir a vocação sacerdotal, então poderão frequentar


PRÉ-SEMINÁRIO

o Pré-Seminário Adulto, que acontece mensalmente, no Seminário Conciliar de São Pedro e São Paulo. As datas destes encontros para o Ano Pastoral 2018/2019 já estão disponíveis. Como estabelecer o contacto? Para esclarecer dúvidas e/ou iniciar o processo de Pré-Seminário,

os candidatos podem estabelecer o contacto com os respetivos responsáveis: com o Pe. Joaquim Félix, no Seminário Conciliar, através do telefone 253203300 e do email joaquimfelix@hotmail.com; e com o Pe. Rui Sousa, no Seminário Menor, através do telefone 253202820 e do email ruisousa@arquidiocese-braga.pt.

Para obter mais informações, poderá consultar a página web dos Seminários Arquidiocesanos de Braga, www.fazsentido.pt, e manifestar a sua adesão na respetiva página das redes sociais.

Pe. Joaquim Félix e Pe. Rui Sousa

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TESTEMUNHOS

CAMINHO DE DESCOBERTA

DISCERNIR EM SÉRIE

Sou o Pedro, tenho 14 anos e pertenço à paróquia de Vilela, em Amares. Eu comecei a frequentar os encontros de PréSeminário, pois desde muito cedo tenho vindo a revelar um certo interesse em ser sacerdote. Por isso, os meus pais e o meu pároco sugeriram que eu participasse nos encontros mensais de Pré-Seminário, o que já vem a acontecer desde há três anos. Estes encontros têm ajudado a descobrir se a minha vida passa mesmo pelo sacerdócio ou não. Afinal, algumas experiências como estas só podem se realizar num certo local, como no Seminário.

O meu nome é Rui Esteves, sou natural de Vilela, Amares, e frequento o Seminário desde 2014, quando entrei para o 7º ano escolar, estando agora no 11º. Mais do que a ideia de uma “fábrica de padres”, o Seminário ajuda-me a discernir e a pensar a vocação a que Deus me chama. No Seminário, estabeleci relações de amizade e fui fazendo descobertas e com elas discernindo e percebendo o que Deus verdadeiramente quer de mim. Mais do que crescer fisicamente, no Seminário, eu cresci na caminhada de configuração com Jesus Cristo. Com Cristo no coração, tenho procurado viver na simplicidade e autenticidade, à luz de um discernimento no Senhor. Trago e levo comigo Cristo, como missionário junto dos que encontro na caminhada da vida.

Pedro Cunha, Vilela

Rui Esteves, Vilela

O CONVITE Sou o Simão Malheiro, tenho 15 anos e sou da paróquia de Santa Maria de Ferreiros, arciprestado de Amares. Frequento o Pré-Seminário Jovem/Adulto no Seminário Conciliar São Pedro e São Paulo, tendo-me sido proposto este percurso de discernimento vocacional pelo Padre Rui Filipe Marques Araújo, aquando do seu estágio pastoral em Amares. A minha família não estranhou o facto de frequentar o Pré-Seminário, pelo contrário, pois sempre souberam que o que eu ansiava era ter um maior contacto com a realidade “Seminário”. Frequentar o Pré-Seminário é gratificante, pois, nada melhor que ter contacto com os seminaristas, com a equipa formadora, e com os colegas pré-seminaristas, para discernir, e entender se faz, ou não, sentido. O Pré-Seminário é também lugar de contacto com realidades comuns, pois, o exemplo de vida dos colegas pré-seminaristas auxilia também ao discernimento. No ano pastoral 2017/2018 (o primeiro ano em que frequentei o Pré-Seminário), eram vários os pré-seminaristas que já trabalhavam, ou que se encontravam a tirar um curso superior, mas que colocavam a hipótese de “deixar tudo” para ingressar no Seminário. Portanto, convido os jovens a discernirem os sinais vocacionais no PréSeminário, pois, um pré-contacto com a realidade é fundamental para que a decisão seja conscientemente tomada. Simão Malheiro, Ferreiros

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TESTEMUNHOS

DO SILÊNCIO AO ANÚNCIO O meu processo de discernimento terá sido um pouco diferente do habitual. E até entrar no seminário, fui sempre muito solitário neste processo. Desde muito novo sempre tive consciência do questionamento do “Porque não ser padre?”, mas fui tentando evitar essa consciência, colocando-a de parte. Nunca contara a ninguém esse questionamento, o que funcionou até ao dia em que ganhei coragem e decidi ouvir a Deus. Sim, não é uma conversa fiada; tive de o fazer, de outra forma acredito que não conseguiria tomar a decisão. Costumo dizer que Deus foi muito paciente comigo. Ao longo dos anos fui recebendo muitos sinais, pequenos sinais: do nada alguém me disse que poderia ser padre (chateava-me um pouco isso); mas também pequenos eventos do dia a dia me levavam a esse questionamento, além do sentirme mal com o abandono dessa questão ou o estar numa celebração e só pensar no colocar-me no lugar do celebrante. Sou de uma família com profunda vivência católica. Fui ensinado na assiduidade à Eucaristia e da oração em família. A família é fundamental em todo o processo. Sempre me fascinou a vida de um santo da Igreja: Santo Agostinho. Fui conhecendo a sua história, os seus escritos. Via no exemplo de vida de Santo Agostinho algo que se identificava comigo. Cada vez mais me convenço que foi uma forte influência na minha vocação. O meu pároco foi fundamental, não que eu tivesse conversado bastante com ele sobre isto; aliás, a primeira vez que falámos sobre este assunto foi já para ver da possibilidade de vir para o seminário. Contudo, o seu exemplo enquanto pároco, a sua dedicação, o seu serviço foi para mim um claro testemunho. Deus foi muito paciente comigo, a Sua generosidade em continuar a chamar-me a esta vocação mostra o amor que tem por mim. Reflito muitas vezes: Deus não precisa de mim para ser Deus, então porque continuava a chamar se eu ignorava? Só pode ser amor. Saber e sentir que Ele me ama é uma explosão de alegria. Agora, a vida paroquial leva a uma experiência única do serviço e encontro. Porém, os tempos são de grande exigência. Os párocos são o rosto mais visível e concreto para os fiéis. São a primeira linha, daí que sejam inúmeros os desafios, solicitações e um trabalho árduo. A experiência é ainda muito curta, estou mesmo no início da vida paroquial. Contudo, para encontrar sempre a explosão de alegria, é necessário não nos perdermos num ativismo pastoral e recentrar no essencial: Jesus Cristo e o memorial que nos mandou realizar, a Santa Missa. Pe. Filipe Alves, Bico

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TESTEMUNHOS

O QUERER SER… Quando pensamos e falamos de vocação, a primeira imagem que nos ocorre de imediato é a de um padre, freira, frade, monge… salta-nos a imagem de alguém que opta pela vida religiosa e consagrada. Por vezes, estas imagens podem distorcer o verdadeiro sentido do que é a vocação, pois podem-nos levar a pensar que Deus só chama pessoas para a vida religiosa, ou que aqueles que se sentem chamados para a vida religiosa são uns privilegiados e eleitos de Deus. Contudo, esquecemos que Deus chama-nos a todos. Chama-nos, em primeiro lugar, à vida, quando nos infla o sopro do espírito, o sopro de vida (Gn.2,7). Deste modo, não existem escolhidos de primeira nem de segunda divisão, porque todos somos, à “imagem e semelhança de Deus”, criados por Amor e para amar. E deste contexto nasce a nossa liberdade de optarmos ou pela vida religiosa ou pela vida matrimonial, que também é uma vocação fundamental e estruturante para a Igreja, pois é no seio familiar onde nascem todas as vocações. Neste sentido, tal como a vocação à vida matrimonial nasce de uma relação de amor desinteressado, assim a vocação à vida religiosa e consagrada (padre, freira, frade, religioso(a)…) nasce de uma relação familiar que possibilite o contacto com o sagrado. Tal como no matrimónio o casal vai crescendo no conhecimento mútuo, assim também aquele que se sente chamado à vida religiosa pode e deve contar com um lugar que lhe possibilite crescer na Fé e discernir qual o plano de Deus para a sua vida. É inegável que a família é o alicerce de todas as vocações, tal como foi e é o alicerce da minha vocação presbiteral, pois foi no seio familiar, ainda muito novo, que fiz esta primeira descoberta e comecei a despertar para a vida sacerdotal, percebendo pequenos sinais e valores que os meus pais me iam dando e transmitido nos momentos de oração diários. Sinais e valores que me levaram a dizer que queria ser padre. Porém, há uma outra comunidade fundamental no meu despertar vocacional: a paróquia, na qual também fui percebendo alguns sinais que me apontavam para a vida sacerdotal, desde o querer ser acólito, o interesse na catequese, o admirar o meu pároco… Sinais que me conduziram até aos encontros mensais do pré-seminário e daí ao ingresso na comunidade do Seminário onde recebi toda

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a formação necessária para ser um homem que se quis consagrar a Deus pelo Sacramento da Ordem e assim servir a Igreja. Uma das questões com a qual sou muitas vezes confrontado é: O que o motiva a ser padre? Em primeiro lugar, é sentir que sou chamado por Deus a dar a minha vida pelos outros, ou seja, a responder a um convite de forma totalmente generosa e incondicional, tornando-me presença de Deus junto de cada pessoa. No fundo, é ser desafiado a ser administrador junto de todos, desde o mais pobre e humilde ao mais rico e opulento, de uma graça muito grande que não é minha, mas que me foi concedida por Deus para transmitir aos outros. Em segundo lugar, é perceber que esta entrega total e radical faz sentido no seio de uma Igreja e de um mundo que necessitam de homens não extraordinários, mas capazes de transmitir a alegria de Cristo Vivo e Ressuscitado de uma forma criativa a todos os que precisam de uma palavra de esperança, levando avante a missão que Jesus nos confiou há dois mil anos. Esta missão pode passar pela capacidade de escuta, pelo silêncio ou simplesmente pela presença. Claro que estou consciente que esta radical entrega tem as suas dificuldades, mas Jesus chama-nos a ser corajosos e a testemunhá-Lo, não a partir do nosso “sofá”, mas a partir e no do seio da sociedade, pois, para ser de Deus, é preciso que nos deixemos provocar, que nos desinstalemos das nossas seguranças, do nosso conforto pessoal, para ir onde realmente sentem a nossa necessidade. A grande máxima ao abraçar esta missão é estar disponível para serviço, tendo como único modelo a seguir Jesus ao lavar os pés aos Apóstolos, totalmente despojado para servir aqueles que O haviam de seguir, tal como São Francisco Xavier afirmou: “para Deus sobe-se descendo”. Por isso, não se trata de uma questão de assumir um “poder”, mas de abraçar uma missão de serviço completamente despojado para ser enviado e estar à disposição de todos, pois, tal como Jesus, “Eu estou no meio de vós como Aquele que serve” (Lc. 22,26). Na certeza de que é Deus quem nos chama e envia, sinto que o desafio é interessante porque o amor d`Aquele que nos convoca e provoca é inabalável, capaz de transformar a vida em plena doação à Igreja. Pe. Leonel Cunha, Caires


PROVOCAÇÃO

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CULTURA

Livro: “Transparências” Coordenador: Joaquim Félix Editora: Paulinas Ano: 2017 Jovens e a arte de discernir é um ótimo livro, que se enquadra em perfeita sintonia com tudo quanto se trabalhou no Sínodo dos Bispos sobre os Jovens, a fé e o discernimento vocacional. Na Apresentação, da qual o Pe. Joaquim Félix é autor, além de coordenador de todas as 20 grandes entrevistas, pode colher-se a estrutura, a densidade e a pertinência de uma obra que assume o estilo duma ‘odisseia’, cujo navegar é feito por jovens que se exercitam na arte de discernir a vida.

Livro: “O baptismo da imaginação” Autor: Antonio Spadaro Editora: Paulinas Ano: 2016 A caminho de casa, com o sol de Outono, percebemos um «excesso» nas casas por que passamos diariamente, nas árvores que circundamos, no mistério em que nos embebemos. Spadaro desafia-nos a este experenciar, demorado e contemplativo, atitude de que importa nutrir-nos quando nos abeiramos do poema de Dickinson, ou da imagética presente em “As crónicas de Nárnia”. Competência estética e competência existencial como permeadas pelo mesmo vínculo: a capacidade e a sabedoria de sabermos que a vida “não pode ser só isto”. Poesia e aposta. Imaginação e criatividade, na fronteira necessariamente habitada para o diálogo cultural.

Livro: “O elogio da imperfeição” Autor: Paolo Scquizzato Editora: Paulinas Ano: 2016 Chegar de mãos vazias: à tentação de controlo, ao erro do perfeccionismo, ao esquema prémio-castigo opor o reconhecer, e nesse reconhecimento libertar-me, carecido de adimplemento. É nas nossas chagas, nas feridas e debilidades, no lado mais obscuro que nos permeia, e que de bom grado esconderíamos de nós próprios, que somos aco-

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lhidos por aquela graça longe da qual seriamos/estaríamos fechados/sitiados. Nessa aceitação do frágil que há em nós, do limitado em que nos situamos, o assentimento Àquele que nos Transcende, reconciliação, por um Amor que nos precede, connosco - e com os outros.

Livro: “O pequeno caminho das grandes perguntas” Autor: José Tolentino de Mendonça Editora: Quetzal Ano: 2017 Se, como assinala o autor, hoje ninguém (nos) ajuda a ler o mundo, é, também e em boa medida, porque há um apagão cultural daquelas narrativas, desses textos fundadores de mais de 2000 anos de História, o Evangelho. Um cristianismo sapiencial - a actualização das narrativas, seus personagens e lugares, sempre de corpo inteiro, como referências para podermos acolher a vida boa, nestes dias da segunda década do século XXI - é uma proposta que é redescoberta ousada e necessária para o nosso tempo deslaçado, penetrada pelo fulgurante olhar do literato e homem de fé.

Filme: O cavalo de Turim Autor: Béla Tárr Ano: 2012 Porque secou o poço? O plano demorado, a fotografia íntima e única colocam-nos em cena: como que Sísifo experimentando o absurdo da repetição, na casca de batata diariamente suportada. Não dialogamos, o deserto é real, sopra da rua uma tempestade imensa, há um não sei quê de à espera de Godot. Deixamos que se instalasse o mal, à espera de um intervencionismo exterior mal compreendido (a mediação é inescapável). O louco nietzcheano irrompe pela sala como uma revelação. E há uma vela, com a qual se luta, para a manter acesa, cena dramática: quem constata “a morte de Deus” é, ainda, quem O procura. Como se Deus, ele mesmo, pudesse morrer. Dificilmente, creio, algum filme captará tão bem o espírito de um tempo. E como ficamos quando a “realidade da realidade” é obscurecida, esquecida, ignorada, desprezada. Filme difícil? Difícil é uma existência naqueles comprimidos limites: o de uma concepção de Deus demasiado estreita, e um consequente viver sem sal, sem sabor.


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