Catalogo da exposição Gesto de Barro - Cerâmica no Sesc .

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O Sesc RJ, em suas ações, vem priorizando a visibilidade da produção artística local. O desejo da Instituição é de promover novas perspectivas que estimulem a produção de novos conhecimentos, sejam eles teóricos ou práticos, propiciando vivencias e experiências à trabalhos artísticos extremamente singulares que trazem, na sua essência, a força do território. Partindo dessa perspectiva, a Exposição Gesto de Barro, dentro do projeto Cerâmica no Sesc, reúne trabalhos de nove artistas, do Grupo Arte Cerâmica em Petrópolis - além de outros três artistas convidados. A exposição resgata o lado histórico da Cerâmica em Petrópolis, mas ressalta a importância da cerâmica enquanto obra de arte, apresentando o resultado do processo criativo e de evolução desses artistas que integram essa mostra. Ao promover experiências artísticas, o Sesc RJ busca colaborar com a construção e ampliação do conhecimento, fortalecendo o seu trabalho de inclusão e auxiliando no processo de transformação do indivíduo, contribuindo, dessa forma, para a formação de uma consciência mais apurada e critica, além de ampliar a visão de mundo e a percepção de uma sociedade mais justa e igual. Sesc RJ.





O Gesto da Arte Cerâmica em Petrópolis Cerâmica no Sesc - Gesto de Barro reúne trabalhos dos nove artistas do Grupo ACP (Arte Cerâmica em Petrópolis), Ana Rondon, Arthur Bosisio, Ivo Ferreira, Jane Maia Weinberg, Jean Ruffier, Lydia Sebastiany, Maria Luiza Lacerda, Rosane Teixeira e Rosalia Luz; e de mais três artistas convidadas, Maria Eduarda Gurjão, Marcia Limmanii e Solange Mano. Desde a sua criação, em 2012, o ACP vem trabalhando em torno da proposta de desenvolvimento e valorização da cerâmica artística produzida no Município, buscando revelar uma antiga vocação da cidade de Petrópolis para a arte cerâmica, e promover uma retomada, de forma contemporânea, de uma tradição ceramista que já teve destacado capítulo na vida cultural da cidade em décadas passadas. Foi um período em que, atraídos por um solo rico em argila, acorreram à cidade renomados artistas de várias partes do mundo, fazendo surgir, ali, dezenas de casas cerâmicas, o que contribuiu para a formação de uma verdadeira escola brasileira de cerâmica artística e para o desenvolvimento econômico e social do Município. Gesto de Barro procura trazer à luz todo o processo criativo destes artistas, valorizando a atual produção local e reafirmando a cidade de Petrópolis como um importante polo da arte cerâmica no país.

Desde a primeira exposição, no Espaço Cerâmica Contemporânea Brasileira (Itaipava- Petrópolis – RJ), 2012, o grupo ACP vem participando de diversos eventos em Ateliers, Galerias e Espaços Culturais da região, entre eles: Exposição no Atelier Sol Luna, 2013 (Araras – Petrópolis – RJ); Exposição na Galeria Venina, 2014 (Pedro do Rio – Petrópolis – RJ); Instituição oficial do Dia do ceramista (28 de Maio), 2014, na Câmara Municipal de Petrópolis; Exposição no Espaço Cultural Inter TV, 2015 (Centro – Petrópolis – RJ); Nova Exposição na Galeria Venina, 2015 (Pedro do Rio – Petrópolis – RJ); Comemoração Dia do Ceramista no Luiz Salvador, 2016 (Itaipava - Petrópolis – RJ); Projeto Mão na Massa – Aldeia da Criança Alegre – Kinder in Rio – 2015 e 2016; Exposição na Galeria Cultural Shopping Estação, 2017 (Itaipava – Petrópolis – RJ); Evento “Inspira Ocupa” (Centro – Petrópolis – RJ), além das duas Feiras de Cerâmica de Petrópolis – Shopping Vilarejo (Itaipava – Petrópolis – RJ), 2017 e 2018. Cerâmica no Sesc - Gesto de Barro (Sesc Quitandinha – Petrópolis – RJ), 2019, é um grande e definitivo acontecimento na trajetória do grupo, fundamental não só para o reconhecimento individual de cada artista, como para a sedimentação da arte cerâmica no Brasil.



Breve Histórico Arte Cerâmica em Petropolis. Conhecida por importantes acontecimentos artísticos ao redor do mundo (no Brasil, a Semana de Arte Moderna; na Europa, os movimentos Art Nouveau, Dadaísmo e Surrealismo), a década de 1920 também marcaria o começo de uma história entre a Arte Cerâmica e a cidade de Petrópolis. Em 1926, o empreendedor paraense Alberto Augusto da Costa e o ceramista francês Henry Gonot, discípulo de Edmond Lachenal (famoso ceramista parisiense), fundariam a primeira cerâmica da região, a Cerâmica Itaipava. Em uma época em que a única arte cerâmica conhecida era a dos índios e a das olarias rudimentares, a Cerâmica Itaipava começaria a produzir não só peças no estilo Marajoara, mas uma grande variedade de vasos, fontes, bustos, painéis de azulejos, etc., sempre orientada no sentido da brasilidade. A partir do sucesso extraordinário alcançado, a Cerâmica chegaria a manter uma sucursal na cidade de Petrópolis e outra no Rio de Janeiro, no hall do Edifício Touring Club do Brasil, com mostras permanentes de sua produção artística. O empreendimento pioneiro da Cerâmica Itaipava acabaria por trazer grande fama à região. Com o passar dos anos, foram surgindo outras cerâmicas, como a Luiz Salvador, a Santa Ettienne, a Nova Cerâmica, a Cerâmica Imperial e a Cerâmica Almeida, entre outras. Houve um crescimento, inclusive, da mão de obra especializada e vários artesãos acabaram por abrir as suas próprias cerâmicas, fazendo com que a arte de criar objetos em cerâmica passasse a ser durante muitos anos uma importante atividade local e uma referência dessa arte em todo o Brasil.

A Cerâmica Luiz Salvador, fundada em 1952, na União e Indústria, no distrito de Itaipava, e que até hoje mantém suas portas abertas, também viria a promover, ao longo das décadas seguintes, o pequeno vilarejo a um importante polo turístico. No ritmo desenvolvimentista do GOVERNO JK, a Cerâmica passaria por processos de modernização e de ampliação, e começaria a produzir, então, em escala mais industrial, embora buscasse manter a mesma qualidade artesanal de seus produtos. Itaipava, nessa época, transformava-se em opção para uma nova elite de veranistas, aumentando em muito o afluxo de um novo tipo de consumidor, mais sofisticado e exigente. A construção da BR-040, novo acesso a Belo Horizonte e a Brasília, também contribuiu para esta mudança de perfil. Novos designs foram incorporados e várias tendências de escolas ceramistas importantes foram assimiladas, dando uma nova dinâmica aos tradicionais produtos da marca. A criação do GRUPO ACP (Arte Cerâmica em Petrópolis), em 2012, reunindo diversos artistas da região, veio reafirmar essa antiga vocação da cidade de Petrópolis para a arte cerâmica, e promover uma retomada, de forma contemporânea, dessa tradição ceramista, além de difundir a cidade de Petrópolis como um importante polo, de ontem e de hoje, da arte cerâmica no país e no mundo. Solange Mano e Arthur Bosisio.

> JARRÃO CAMPÂNULA (FAIANÇA). Massa cerâmica: porcentagem de máterias primas; 15 argila são simão, 15 argila mtpt 12 argila suzano, 20 argila oxford, 10 filito, 15 dolomita, 3 talco, 2 quartzo, 8 feldspato. Esmaltes : vidro cerâmico colorido ou não para queima a 1.050 graus. pintura com tintas inorgânicas para decorações baixa e sobre vidro. processo bi queima e confecção por colagem em formas de gesso e posterior acabamento.





O barro contém em si infinitas possibilidades. Antes do gesto do artista, ele é terra, granulada. Matéria viva disposta a transformar-se. A arte da cerâmica possibilita processos próprios e variados nos quais o artista e o barro se formam e se transformam um em função do outro. O artista conduz com o gesto e o barro responde, manifestando também desejos e limites. Esse encontro entre artista e matéria exige uma delicada escuta de ambas as vontades. Uma das artistas desta exposição, Maria Luiza Lacerda, nos falou em nosso primeiro encontro: “cerâmica é um espaço para movimentar desejos”. Gesto de Barro reúne obras dos nove artistas do coletivo Arte Cerâmica em Petrópolis, incluindo peças de mais três artistas convidadas. Durante nossas visitas aos ateliês encontramos nas produções uma grande diversidade que se faz central na formação desse coletivo – universos e linguagens singulares criados a partir de diferentes escolhas técnicas de modelagem, esmaltação e queima. A partir da potência de cada encontro e da expressividade única de cada obra, entendemos o conjunto dessa exposição. No processo de criação dos trabalhos, as inesgotáveis possibilidades que residem no barro já se anunciam na imaginação do artista. Depois, o gesto das mãos, o gesto do barro, da água, do ar, do fogo - tudo gera registro sobre a peça, criando imagens e memórias do processo que se fixam sobre o objeto. As impressões e as vontades de todos esses agentes de criação, atravessadas ainda por acidentes de processo – fissuras, quebras, explosões de cores – fazem nascer sentido na imagem final. A capacidade de expressão se articula através dos múltiplos gestos que atuam sobre a matéria-prima do trabalho. E o que resta das vontades do artista? E das vontades da matéria? O ‘sujeito-autor’ parece se atestar nos sinais de sua ausência, onde apenas através das marcas que deixou vemos sua presença convocada. Já o barro, se transforma num novo corpo autônomo que fala a partir de si. Um gesto de barro. Julia Ariani e Maíra Maneschy

(curadoras de Cerâmica no Sesc - Gesto de Barro - 2019)


Cerâmica no Sesc

“Arte Cerâmica em Petrópolis” e convidados Marcia Limmanii • Solange Mano • Jean Ruffier • Rosane Teixeira • Lydia Sebastiany • Ivo Ferreira • Rosalia Luz • Jane Maia Weinberg • Ana Rondon • Maria Luiza Lacerda • Maria Eduarda Gurjão • Arthur Bosisio




Ana Rondon Radicada em Petrópolis (RJ), desde 2016, a artista plástica e arte educadora, Ana Rondon, possui um vocabulário subjetivo e pessoal, uma poética que pulsa em elaborações inconscientes de suas memórias afetivas, formas fetiches e simbólicas. Suas esculturas orgânicas tangenciam elementos encontrados na natureza: corais, plantas, meteoritos, cirandas, casulos, ninhos, ovos. Em seu processo utiliza diversas argilas com o uso eventual de esmaltes em alta temperatura. Conceitualmente apropria-se do barro como matéria viva ao criar formas que sintetizam a subjetividade do artista em tensão com as infinitas possibilidades da cerâmica autoral dentro do contexto contemporâneo. Graduada em História pela PUC/RJ, com especialização em Arte e Educação na Transdisciplinaridade - UCAM/RJ; Mestrado em Arte e Cultura Contemporânea - UERJ (dissertação sobre a cerâmica indígena etnia Iny : A boneca ritxoko – corpos fluidos da arte karajá), nos anos 90, a artista integrou o Núcleo de Aprofundamento em Pintura e frequentou vários cursos na Escola de Artes Visuais do Parque Lage/ RJ, além de participar de diversos salões de arte e exposições no Brasil. Em 2012, inicia sua experiência com a arte cerâmica no Atelier de Taciana Amorim. Neste período, a artista visita algumas aldeias indígenas de algumas etnias (os Ashaninka, no Acre; os Yawalapiti,

Kamayurá, Waurá, no Parque Nacional do Xingu; os karajá, em santa Isabel do Morro, Fontoura e JK, Ilha do Bananal, TO), além de acompanhar os cursos “Dimensões das Culturas Indígenas”, no Museu do Índio do Rio de Janeiro, onde aprofunda seus estudos sobre cerâmica indígena brasileira. Em 2016, muda-se para a cidade de Petrópolis onde cria o Espaço Artéria, um atelier voltado para o ensino da arte, localizado no bairro de Carangola. Suas obras cerâmicas passam a expressar cada vez mais a questão do corpo como tema atávico. Experimenta novas maneiras de lidar com as argilas em acabamentos e brunimentos que exploram a sensação táctil da pele humana. Nesse processo cria a série vasos comunicantes, com suas formas estranhas e profundamente humanas, as denomina como vaso cabeça, vaso buraco, vaso dorso, etc. Surgem os vasos rituais inspirados nas bonecas karajá, urnas arqueológicas e utensílios rituais pré-históricos e bacias. Objetos imanentes de signos virtuais atávicos, formas síntese, quase banais, a busca pela permanência do gesto simples da própria construção, a memória do gesto.

“Cada obra vira um corpo. A obra é o corpo. Com memória do tempo, do ar, da água, da terra... e o fogo queima e congela.” “Um campo de forças processual onde se confrontam o concreto e o inefável, a matéria e o espírito. E entre eles um grande silêncio. O silêncio indecifrável do gesto criativo.” (Ana Rondon)


METAMORFOSE 1 - METAMORFOSE 2 Argila porcelana, queima em alta temperatura, forno elétrico. “PHALO” (da série vasos rituais) Argila preta, queima em alta temperatura, forno elétrico. ÚTERO Argila tabaco, queima em baixa temperatura, forno elétrico.


A minha produção atual parte da construção de formas a partir da circularidade e da livre modelagem, do embate relacional entre o movimento do corpo e a matéria ‘barro’. O barro enquanto algo vivo, pulsante e maleável, sujeito tanto às interferências climáticas e suas variações de temperatura, umidade e calor, como à temporalidade do fazer, à expressão da minha subjetividade como artista. Um campo de forças processual onde se confrontam o concreto e o inefável, a matéria e o espírito. E entre eles um grande silêncio. O silêncio indecifrável do gesto criativo. O contato com o momento presente, sem uma elaboração de esboços prévios. Deixar fruir, fazer escolhas, errar, voltar atrás, retomar, arriscar, perseverar. Perceber o momento de parar para observar e sentir o que o trabalho te coloca como questão: equilíbrio x desequilíbrio; força x fragilidade; peso x leveza; feminino x masculino.

SEM TÍTULO Argila creme, queima em baixa temperatura, forno elétrico.

Ao criar minhas esculturas cerâmicas percebo que estou conectada com minha trajetória pessoal, com meu próprio vocabulário formal iniciado na pintura. Ao mesmo tempo em que sinto uma conexão com algo atemporal, ao todo que perpassa os arquétipos, gestos arcaicos, uma ‘re-memória’ que transcende o meu “Eu”, sujeito artista, e se transforma no ‘pensamento-barro’ imanente do contato com essa matéria em si: primitiva, atávica, feminina, maleável dada à transmutação e à metamorfose. E formas estranhas surgem, não pertencem mais à busca do “belo” enquanto categoria estética. São expressões livres e profundamente pessoais de um movimento corpóreo quase instintivo de criação. Talvez, por isso, convidam o espectador ao toque, apresentam uma forte expressão sensorial. Minhas obras emanam uma busca pelo simples, pela exposição da matéria ‘barro’ e suas diversas tonalidades e características plásticas. Só buscam ser o que são, formas silenciosas e materiais num mundo contemporâneo de excessos e cada vez mais virtual.



Arthur Bosisio Designer gráfico (ESDI/UERJ) e mestre em Comunicação (ECO/UFRJ), Arthur Bosisio teve o seu primeiro contato com a arte ainda muito jovem, recebendo, já aos 15 anos, o prêmio Menção Honrosa em Pintura no Salão Nacional de Belas Artes. Hoje, em sua casa/atelier na Fazenda Inglesa (Petrópolis – RJ), Arthur procura explorar múltiplos recursos e processos de trabalho em busca de texturas fortes, formas inusitadas e novos resultados cromáticos. Alinhado à filosofia da estética da imperfeição, provoca e valoriza “acidentes cerâmicos” em suas obras, como rachaduras, escorrimentos, bolhas, etc. Para tanto, e em que pese o risco, explora ao limite a resistência da argila e do esmalte, utilizando, por vezes, numa mesma peça, argilas com temperatura de queima diferentes, esmaltes de baixa e de alta, e até quatro queimas (elétricas e a gás). Pesquisa processos construtivos, produzindo obras figurativas ou abstratas (orgânicas ou geométricas); nesses casos de abstração, agrega, quase sempre, representação de pequenos animais encontradiços no sítio onde mora para remeter a obra idealizada ao mundo real. O processo construtivo das peças é, portanto, aberto, orgânico, ao adequar-se às transformações da argila – que reage conforme suas próprias leis – e ao incorporar novos caminhos surgidos no desenvolvimento da modelagem; resulta daí a criação de objeto essencialmente único e, muitas das vezes, imprevisível.

“Vejo o universo da cerâmica artística como espaço caleidoscópico, aberto, inesgotável, para exercício de criação, invenção, pesquisa, descoberta, improvisação e outras tantas formas de realização, fruição e expressão pessoal. Ainda que prática ancestral, a cerâmica coloca sempre novos desafios e aponta novos caminhos para o artista atento. Ademais, o espaço aberto para o acaso, para o acidental - próprio do trato com as forças da terra e do fogo - cria situações surpreendentes a serem exploradas pelo ceramista, e nas quais, por exemplo, eventuais ‘defeitos’ se tornam impensáveis ‘efeitos’. Explorar plenamente a pletora de possibilidades oferecidas pela arte do fogo exige bastante do ceramista, nomeadamente, em atenção, coragem, ousadia e perseverança, mas, por outro lado, entendo eu, ele é transportado para uma “Pasárgada” do poema de Manuel Bandeira, onde pode, à vontade, construir, desconstruir, reconstruir a forma que quiser, com a argila que escolher e, pesquisando os desejos do barro, combinar superfícies em movimento, explorar contrastes e texturas, determinar volumes, alterar tamanho e densidade, testar limites. E, ao final, acumpliciado com o fogo, pode queimar suas peças no processo e da maneira que lhe convier: com argila nua ou esmaltada, em queima à lenha, a gás ou elétrica, em ambiente redutor, neutro ou oxidante, em baixa ou em alta temperatura, em raku ou em outros processos alternativos. Não é sem razão que o eminente historiador da arte, sir Herbert Read, afirmou que a cerâmica é a mais simples, mas, ao mesmo tempo, a mais complexa de todas as artes. E assim é que me parece.”

“...o espaço de risco e deslumbramento - próprio do trato com as forças da terra, da água e do fogo – a cerâmica cria situações surpreendentes a serem exploradas pelo ceramista, e nas quais, frequentemente, eventuais ‘defeitos’ se tornam extraordinários ‘efeitos’.” (Arthur Bosisio)


ESTUDO Nº 157 PARA LUZ E SOMBRA > Argila marfim nua com queima em baixa temperatura e argila marfim em alta temperatura

VÓRTICE Argila marfim, queima em alta temperatura.

MESA COM CROCODILOS ESCHERIANOS Argila shiro, queima em baixa temperatura, pés de madeira. GÊNESIS Argila marfim, queima em alta temperatura. O PARTO DA GALINHA Argila marfim, queima em alta temperatura.




Ivo Ferreira Ivo Ferreira é graduado em Administração pela PUC/RJ, e, durante 20 anos, trabalhou em produção de shows e eventos. Iniciou os estudos de cerâmica artística em 1995, com Taciana Amorim, no Rio de Janeiro. Em 2000, já morando na serra, passou a frequentar o ateliê de Flávia Santoro, em Itaipava. Fez oficinas com Sonia Saraiva (RJ), Marcia Limmanii (RJ), Erli Fantini (MG) e Inês Antonini (MG). Teve aulas de torno com Leí Galvão (Cunha/SP) e Pietro Madalena, professor em La Meridiana (Toscana, Itália). Estudou sobre terra sigillata com Miguel Molet, na Espanha. Em 2011, em parceria com a ceramista Lydia Sebastiany, inicia pesquisas sobre argilas e pigmentos naturais, extraídos nas montanhas locais, para uso em terras sigillatas e queimas primitivas. Em 2012, junto com outros ceramistas da cidade, cria o grupo “Arte Cerâmica em Petrópolis”. Ao longo dos últimos anos, participou de diversas coletivas na cidade do Rio de Janeiro, em Petrópolis/RJ e em Cunha/SP. Organizou e produziu duas edições do “Circuito das Artes de Itaipava”. Idealizou e produziu, junto com a ceramista Marcia Limmanii, a “Feira de Cerâmica de Petrópolis”, em 2017 e 2018, além de ministrar aulas de torno e oficinas de raku e queimas primitivas na Casa Lliure, ateliê e espaço de artes desenvolvido com Lydia Sebastiany, no Centro Histórico de Petrópolis.

A música é uma linguagem instintiva e inerente ao homem, e provavelmente surgiu antes da linguagem verbal. A descoberta dos instrumentos musicais, tal qual a cerâmica, tem sua origem no período Paleolítico Superior. Os povos da Antiguidade já usavam instrumentos rítmicos rudimentares, que precederam os tonais e melódicos. A proposta de Terra Sonora é estimular a interação dos visitantes com os instrumentos musicais percussivos de cerâmica - alguns com características escultóricas - para que, a partir dessa vivência tátil e sonora, possam acessar de forma lúdica uma conexão interna com o primitivo sutil e com os quatro elementos. Criam-se condições para o acontecimento espontâneo de experimentos sonoros coletivos, possibilitando que os participantes estabeleçam uma rede de comunicação através da própria performance nos instrumentos, construindo um diálogo sem palavras. Refinam-se sentimentos, dons e tons. (TERRA SONORA – Ivo Ferreira)

Artisticamente, se utiliza de várias vias de expressão: a fotografia, a música, a cerâmica, e, por vezes, de todas elas ao mesmo tempo.

Na alquimia do processo cerâmico, a terra - grande mãe - torna-se plástica com a água e é transformada pelo fogo, que se alimenta do ar.


SINÁRIO Argilas diversas modeladas em torno, com aplicação de engobes e vidrados. Queima em forno elétrico, 1240ºC.

ALBERTINUS Argila de Cunha/SP, construção em rolinhos, aplicação de terras sigillatas pigmentadas. Biscoito em forno elétrico, 970ºC. Segunda queima em saggar de aluminio, forno a gás, 750ºC. Colaboração de Rose Ilg na almofada. Homenagem ao mestre Alberto Cidraes. LITOSFERAL Argila de Cunha/SP, construção em rolinhos, aplicação de terras sigillatas pigmentadas. Queima em forno elétrico, 970ºC. Colaboração de Rose Ilg na almofada. SEM TÍTULO Argila branca, modelagem em torno, aplicação de terra sigillata. Biscoito em forno elétrico, 970ºC. Segunda queima em saggar de alumínio, forno a gás, 750ºC CORALIN, FAYGAN, ABSTRATAMBOR Argila branca, modelagem em torno, aplicação de engobes e vidrado. Queima em forno elétrico, 1240ºC. Finalização com pele de cabra.




Jane Maia Weinberg Beleza é uma forma de conhecimento. E essa é a minha busca na cerâmica. (Jane Maia Weinberg) Tendo atuado por 30 anos como diretora de arte e de criação em grandes Agências (Salles Interamericana de Publicidade e Merchand Design e Merchandising / Promo, Promoção e Merchandising / AAB Relações Públicas e Direct Marketing Diret - Empresas da Ogilvy & Mather) e, posteriormente, em sua própria agência, a Think Tank Comunicação e Design, Jane Maia Weinberg, afirma ter experimentado, ao descobrir a arte cerâmica, a sensação de estar aprendendo um novo idioma: Para quem desde sempre se expressou em 2 dimensões, desenhando em qualquer pedacinho de papel que passasse pela frente, na infância; e criando campanhas, folhetos e logomarcas, profissionalmente; tomar contato com a cerâmica e poder criar em 3 dimensões, foi um enriquecimento! As mãos, antes ‘manicuradas’, ficaram mais ásperas, mais simples e mais vivas!!! Há 17 anos trabalho com a argila e há 17 anos as surpresas e alegrias se sucedem. A cerâmica é uma agregadora na minha vida: a quase meditação no torno, momento solitário e concentrado; a paciência na elaboração das texturas quase primitivas e, ao mesmo tempo, tão sofisticadas; o

partilhar das descobertas com outras pessoas, outros ceramistas... ela, sem dúvida, me ajudou a desenvolver uma valiosa joia chamada: apreciação. A cor sempre foi meu elemento de prazer, mas com a possibilidade de trabalhar a forma em espaço, o balé das curvas que se abrem e se alongam, passou a me envolver e encantar integralmente. Para mim, é um trabalho onde os sentidos se aguçam. Não só o tato e a visão, mas o olfato, o som da massa sendo trabalhada sobre a mesa... tudo isso tem um sabor muito especial, que enriquece a experiência e a vida. No atelier o tempo se transforma, é o momento especial em que o passado se conecta inteiramente ao presente e o presente ao futuro: a ideia, o fazer e o vir a ser. Após frequentar por 10 anos (1996 a 2006) o Atelier de Cerâmica de Taciana Amorim, no Rio de Janeiro, Jane passou a trabalhar em seu próprio atelier, em Petrópolis; participando, durante todo este período, de diversos cursos, workshops e seminários, e expondo o seu trabalho em inúmeras feiras e exposições, quase sempre em conjunto com o Grupo ACP, no circuito Petrópolis – Rio de Janeiro.


“Nós somos um meio para o Universo conhecer a si mesmo. Uma parte do nosso ser sabe que essa é a origem. Nós desejamos voltar. E podemos, porque o Cosmos também está dentro de nós. Nós somos feitos de matéria estelar.” (Carl Sagan – Cientista, Astrofísico e Comunicador)

IDENTIDADES Argilas branca shiro e marfim esmaltadas com técnica de compressor. Queimadas em alta temperatura em forno elétrico.


CONEXÕES Argila tabaco, esmaltada com técnica de compressor. Queimada em alta temperatura, 1260ºC em forno a gás. DIA A DIA Argila creme torneada, esmaltada com reservas. Queimada em alta temperatura, 1260ºC em forno elétrico.



Jean Ruffier Nascido em Natal (RN), Jean veio ainda criança para o Rio de Janeiro, tendo estudado no Colégio Brasileiro de Almeida (Ipanema), onde teve oportunidade de participar de um curso de cerâmica, aprendendo técnicas básicas, fato importante para o desenvolvimento futuro. Formou-se em medicina, junto com sua mulher, Cléa, optando pela pediatria e pela especialização em Terapia Intensiva Pediátrica. Na época, não sobrava tempo para dedicar-se às artes cerâmicas. Vieram os filhos e o tempo ficou ainda mais escasso. A cerâmica ficou guardada, com ansiedade, até o ano 2000, quando passou a cursar aulas no Atelier Barro e Cor, com Lucinda Barclay e seus auxiliares Leonardo, Pedro e Pretinha. Participou com eles de algumas exposições – xícaras, leiteiras, réplicas de Picasso e máscaras.

Sobre o barro ...eu tive a oportunidade de ter contato com o barro, a argila, a formatação, quando era adolescente ainda, e aquilo ficou gravado em mim... Sobre o gesto ...a principal característica do meu trabalho é a de ser rústico... pouco uso o torno, e quando uso não gosto da perfeição, eu termino entortando, amassando a peça... Sobre inspiração ...a inspiração é dada na hora, quando se está ouvindo uma boa música, a natureza, ou simplesmente, o silêncio... quando chego no atelier e começo a trabalhar com o barro, pode ser que saia exatamente como eu pensei antes, mas pode ser que saia totalmente diferente... a argila ou o barro é uma verdadeira terapia! (Jean Ruffier para o Cerâmica no Sesc - Gesto de Barro)

Montou seu próprio atelier, Atelier de Cerâmica Jean Ruffier, em seu sítio – Sítio Vale das Seriemas, no Brejal (Distrito de Petrópolis – RJ), que dispõe de torno, mesas de trabalho e três fornos – um grande, a gás; um menor, para queima Raku; e outro, à lenha. Ali, começa a produzir chaleiras, painéis, bules, garrafões e a criar pequenas esculturas. Participa do grupo “Arte Cerâmica em Petrópolis” desde sua formação, sempre objetivando a integração, a cooperação, a divulgação e a disseminação da cerâmica da região serrana do Rio de Janeiro. Esteve, com o grupo, em Mostras de Itaipava, Araras e Rio de Janeiro.

E a cerâmica ficou guardada, com ansiedade, até o ano 2000, junto com as xícaras, leiteiras, réplicas de Picasso e máscaras.



ESPIGA DE MILHO Argila branca; esmaltes verde e amarelo. Forno a gás - biscoito, 960ºC e esmalte, 1080ºC INCÓGNITA Argila terracota, esmalte marrom. Forno a gás - biscoito, 960ºC e esmalte, 1080ºC. LINHA DE CHEGADA Argila Cunha Leir; esmaltes azul marinho, celeste e branco. Forno a gás - biscoito, 960ºC e esmalte, 1080ºC.

MÃE E FILHA Argila terracota, óxidos de ferro e estanho, esmalte transparente. Forno a gás biscoito, 960ºC e esmalte, 1080ºC.



Lydia Sebastiany “Nasci na cidade do Rio de Janeiro, envolvida pela Mata Atlântica, junto à Floresta da Tijuca. Lá tive meus primeiros e decisivos contatos com a exuberância da vida, que determinariam minhas escolhas futuras e, de certa forma, a decisão de nunca me separar do que eu mais gostava: a simples apreciação do belo.” (Lydia Sebastiany) Estudou Belas Artes, Ballet Clássico e Dança Contemporânea, e em seguida iniciou os estudos em Cerâmica Artística. Hoje, Lydia Sebastiany possui um atelier em Petrópolis, um verdadeiro espaço de encontro entre artistas das mais diversas linguagens. Ali, além de se dedicar ao estudo e à prática da cerâmica, tem a oportunidade de compartilhar, trocar experiências, incentivar o conhecimento, enfim, de explorar todos os caminhos que essa instigante forma de expressão pode proporcionar. - Acredito que a Arte pode unir e desenvolver a paz entre povos de diferentes culturas. Espero, através do meu trabalho, sempre contribuir nesse sentido. (LS) Nos primeiros 25 anos de vida, morou numa casa construída no sec. XIX junto à Floresta da Tijuca. O primeiro idioma que aprendeu foi o inglês, do lado materno. O início de sua formação foi fundamentada na observação da natureza. Árvores seculares, montanhas e potentes nascentes de água. Entender e, sobretudo, sentir as plantas, a terra, a água, o céu, as nuvens, não foi difícil. Cedo pôde perceber o que seria a generosidade infinita da terra e a beleza fundamental em todas as coisas. Aos três anos, frequentou a Escolinha de Arte do Brasil, incentivada pela mãe, que,

então, era aluna de Fayga Ostrower. Nesse contexto, envolvida por esse ambiente, entendeu, de certa forma, que viver pelo caminho da arte seria natural. Dançar fazia parte. O corpo reagia dessa forma. Foi apresentada ao ballet clássico da escola russa e à música por uma de suas tias-avós. Igualmente aos compositores clássicos e ao aprendizado do piano. Chegou às Belas Artes na UFRJ, bem como aos novos momentos no ballet clássico na escola de Tatiana Leskova. Em 1982, o encontro com Juliana Carneiro da Cunha. Com ela, o estudo de expressão teatral, no que seria o embrião da Casa de Artes de Laranjeiras. Logo a seguir, num momento inesperado, encontra Angel Vianna. Angel mostrou como seria o caminho. A compreensão da vida através do movimento e tudo que isso envolve. Em 1986 se formou em dança contemporânea e consciência corporal, onde hoje funciona a Faculdade Angel Vianna. Poucos anos depois, se deu o contato com a argila e a cerâmica com Ana Malboisson, Conceição Santiago, Tito Tortori e Angela Cantarino, todos do Rio de Janeiro. Flavia Santoro, em Cunha - São Paulo, e Miguel Molet, na Espanha. Em 1990 mudou-se para Petrópolis, cidade serrana do RJ, onde criou os dois filhos, Gregory e Thomas, numa linda casa no Centro Histórico construída por seu bisavô. Ali, nasceu seu atelier onde trabalha até hoje. Desde a idade dos 16 anos, sem interrupções, ofereceu aulas em artes, dança, desenho, consciência corporal e cerâmica. Há dez anos compartilha seu atelier com o artista Ivo Ferreira. Nesse ambiente, pôde amplificar sua proposta artística, ao promover cursos, oficinas e eventos variados no campo.

Sobre a poética dos trabalhos de Lydia em Cerâmica no Sesc - Gesto de Barro ("The Last Kingdom", "The Tree", e a Performance criada e orientada por ela e Angel Vianna): “...Não conseguiam mais entender que a terra guarda e transforma tudo. Bastava ter cuidado bem dela. Pisar silenciosamente e com suavidade. Tocar na água com cuidado. Teria sido tão fácil entender tudo sobre esse berço perfeito.”


THE TREE - FISSURAS DE OUTRO TEMPO NO TEMPO Argila branca shiro. Aplicação de terras sigillatas, queimando em biscoito, 980°C e esmaltes em cone 7, forno elétrico.


“Pobres miseráveis bestas humanas. Santificarão- se.”

THE LAST KINGDOM Argilas branca shiro e terracota. Aplicações de terras sigillatas pigmentadas com pincel e aerógrafo. Queima biscoito, 980° C em forno elétrico e queima primitiva em forno a lenha. Pesquisa e confecção de rendas Annelise Kersten.


Angel Vianna

Performance realizada por Angel Vianna e concebida por Lydia Sebastiany Registro de performance. Pano e vĂ­deo que resultou do encontro de pessoas que entraram em contato com seu ser bĂĄsico e se entregaram de forma total ao material argila, sentindo seu toque e sua energia acolhedora, percebendo conceitos que transitam pelo universo do contorno, volume, apoios, estrutura, eixo, densidade, plasticidade e movimento, tanto no corpo humano, como no corpo argila. Redescobrindo e reinventando uma maneira sempre gentil de tocar e ser tocado, evocando o respeito a terra e a vida que nela brota.

Participantes: Ana Clara Guinle, Ana Rondon, Claudia Ribeiro, Liana Nigri, Luiz Carlos de Almeida, Maria Eduarda GurjĂŁo e Ricardo Imperatore (percussionista).


PERFORMANCE > Argila em diversas densidades, aliadas a outros materiais (pano, papelĂŁo e vĂĄrias fibras naturais).



Marcia Limmanii Geometria Sofisticada No princípio era o barro. E ele era moldável, tornava-se sensível à palma da mão. Sua germinação exigia instrumentos, não brotava simplesmente, emergindo do solo. Formas insuspeitadas foram surgindo do tato. Utensílios, objetos domésticos, complementos da vida. Nas esculturas de Marcia Limmanii as mais simples conformações, tubos, esferas, quadrados, expressões de uma geometria elementar, adquirem o máximo de sofisticação. A medida das linhas e a superfície dos volumes é inusitada. Acopla-se ao ferro, o material é tratado, alisa-se, enruga-se, é lanhado, macerado, foscado. O que fica de tudo é uma sensação ‘brancusiana’ de perfeição ou de sua procura. O branco a serviço da forma. O redondo e o vertical em convívio. As cores se recolhendo, envergonhadas. O preto em pequenas audácias. A mão, afinal, vitoriosa.” (por Rachel Jardim, escritora – 2000) O exercício lúdico entre formas orgânicas e naturais é uma marca constante no trabalho da carioca Marcia Limmanii. Inovadora, desenvolve objetos e elementos do cotidiano, extraídos de uma natureza poética, sempre marcada por um estilo contemporâneo. Usa em seus desenhos os

movimentos do traço livre e espontâneo e busca a repetição da forma como uma expressão coletiva de seu trabalho. Desde 1989, tem uma trajetória expressiva, que inclui várias exposições, no Brasil e no exterior. Atualmente, vive e desenvolve seus projetos em Petrópolis, no Rio de Janeiro. Por Marcia Limmanii Meu olhar está voltado para a natureza, é onde encontro inspirações. Ela me encanta e me ensina. O exercício lúdico entre formas geométricas e naturais sempre acontece no meu trabalho. Sou atraída pelo barro nas suas surpreendentes texturas e cores. Estou sempre atenta para criar novas formas e, muitas vezes, os movimentos espontâneos do traço, livre e solto nas pinturas, parecem se reunir e remontar permanentemente. Existe um jogo na busca de equilíbrio durante este exercício contínuo de forma. O barro como Mãe Terra, o defensor da criação. Onde tudo começa. Sobre a obra ESPAÇO VAZIO É uma referência ao momento de não pensar... de não pensar para criar, as esferas flutuantes se apropriando das sombras e da força do espaço vazio.

“Existe um jogo na busca de equilíbrio durante este exercício contínuo de forma. O barro como Mãe Terra, o defensor da criação. Onde tudo começa.” (Marcia Limmanii)


PRATOS ESFERAS Stoneware - argila creme.


ESPAÇO VAZIO Stoneware - porcelana – porcelana tingida – argila creme



Maria Eduarda Gurjão Nasceu no alto das montanhas, com os pés no chão. Prosseguiu crescendo com as raízes das árvores, observando a sabedoria milenar dos que trocam com a terra, familiarizada com as medicinas da natureza. Artista intuitiva, Maria Eduarda encontrou no gesto ancestral de moldar o barro um caminho de expressão. Em 2016 foi acolhida por artistas experientes no fazer cerâmico e na arte de viver, frequentando o atelier de Lydia Sebastiany, adquirindo bagagem com quem já atuava nessa dança com a terra e com o fogo antes mesmo dela nascer. Se encantou com todos os processos, mas teve desde o princípio forte afinidade com o torno, em criar peças em movimento no torno. Aprendeu técnicas com Ivo Ferreira sobre esse ofício de autoconhecimento. Praticando em seu torno diz aprender todos os dias a centrar a sua vontade, a observar o seu corpo e suas emoções e a refinar a percepção do que está pronto no astral para fluir na matéria. O torno em sua oficina na floresta foi construído com materiais que já ocupavam o universo: a estrutura é a carcaça de uma máquina de lavar roupas, o acabamento feito com madeira de demolição, o motor de uma máquina de costura e a roda dianteira de um fusca que o pai de sua mãe, Ildebrando Batista da Silva, dirigiu nos anos 80. Esse avô que há tempos já lhe dizia que a roda foi feita pra girar. Quanto às queimas, afirma: “...as queimas são como orações, processos meditativos que invocam o divino. O fogo como portal de comunicação com o espiritual. Ensina humildade, presença, respeito e harmonia entre os corpos envolvidos. Todos os elementos são importantes quando em equilíbrio. A plasticidade da argila depende

da proporção da terra e da água. O tempo de secagem da terra acontece com a ação do ar evaporando as partículas mais aquosas. O ar alimenta o fogo que chega para transformar tudo o que toca.” Sobre as obras TERRA, metamorfose abundante O colo fértil, abundante e grande útero de tudo que existe nos presenteia nos frutos a energia vital plena e nas flores os padrões geométricos sagrados. O divino. Todos os elementos da criação possuem o mesmo valor e estão em constante transformação. A humanidade está se abrindo para um novo nível de consciência. Se libertando de antigos paradigmas de medo e separação e abraçando o potencial coletivo de consciência unificada. O fluxo de energia que nos cria e nos torna vivos acontece em espirais infinitas. (Técnica: Torno, modelagem livre e polimento com sigilatta. Argila creme. Transformada no fogo sagrado.) Sincronicidade Todas as coincidências são, de fato, sincronicidades. Sinais enviados pelo universo para nos mostrar que estamos alinhados com o nosso caminho divino. Precisamos estar receptivos e atentos ao mundo ao nosso redor criando abertura para o inesperado. Tudo está conectado e esse é um dos aspectos mais enigmáticos e surpreendentes do universo, como se um fio invisível conectasse pessoas, acontecimentos e informações. (Técnica: Placa. Argila branca. Mistura dos esmaltes Branco Nata e Nepal com bolhas de sabão misturadas com esmalte Preto Tácito. Forno elétrico aprox. 1240°C)

“A cerâmica não volta a ser argila. A coragem para continuar evoluindo. Há coragem para continuar o movimento.” (Maria Eduarda Gurjão)


TERRA, metamorfose abundante Torno, modelagem livre e polimento com sigillata, argila creme. Queima primitiva SINCRONICIDADE, Molde, argila branca, mistura de esmaltes e bolha de sabĂŁo. Queima 1240ÂşC. >




Maria Luiza Lacerda “...uma compreensão: a de que fabricando um texto como as pegadas de um percurso andarilho, ou objetos a partir de matérias amorfas, é a imaginação que dá forma à experiência humana.” (Leda Tucherman para o livro “A Cerâmica e O Horla”, de Gilberto Paim) A iniciação tardia na Cerâmica, só aos 65 anos, faz com que Maria Luiza Lacerda não tenha propriamente uma história nesta arte, mas o desejo e a inquietação sempre fizeram dela indubitavelmente uma ARTISTA: Foi um presente que me dei ao iniciar a terceira e última etapa de minha vida. Na primeira, casei, tive quatro filhos e trabalhei em Teatro de Bonecos. Na segunda, fui em busca de

um conhecimento maior do Ser Humano e tornei-me Terapeuta; nessa etapa também busquei um conhecimento na Natureza, através das Essências Florais e da Astrologia. Na terceira, tento aprofundar as duas anteriores, limpando, eliminando, indo em busca do mais simples, do mais autêntico dentro de mim, o que ficou desse percurso. A cerâmica, trabalhando o fogo, a água, a terra e o ar, surgiu como meio ideal de expressão desse desejo de simplicidade. E as formas que brotam das minhas mãos, saídas dessa experiência de vida, são testemunhas de uma imensa gratidão pela liberdade de poder me expressar.

SER CERAMISTA (Poema de Maria Luiza para Cerâmica no Sesc - Gesto de Barro) Pensar nosso eu, o mundo e as coisas, comunicar esse pensamento em palavras, e, ir além, dar forma a essas palavras. Escolher o barro, feito da água, do ar e da terra... Terra mãe, material palpável, receptiva, energia feminina, que aceita ser conduzida a uma infinidade de formas, para essa comunicação. As mãos, levadas pelo pensamento, sentem a docilidade da matéria, e a vão apalpando, conhecendo suas possibilidades e seus limites. A ideia, ainda tosca começa a emergir do barro. Mas enquanto o pensamento tentar conduzir e controlar a obra, o resultado parecerá insuficiente, frustrante. A mente se tornará angustiada e insatisfeita, sem perceber que precisa render-se... Vai ser preciso um tempo (nosso grande parceiro) para a compreensão de que será preciso ouvir a matéria... permitir a participação real do barro na concepção da ideia. Aí então será possível o coito, o gozo final, quando o ser pensante se funde com a matéria e produz a forma. Por fim, a entrega confiante da criação ao fogo, o quarto elemento, para a transmutação final do imaterial em material. Quando a fusão é verdadeira, será sempre surpreendente e a peça será sempre inesperada para seu criador. Então o sentimento da gratidão se tornará conhecido.


Nesta série, intitulada “UNIVERSOS INVISÍVEIS”, Maria Luiza tenta expressar no barro a ideia do Budismo, que não crê num mundo externo independente, ou existindo separadamente dos seres humanos. Tenta assim vivenciar a experiência de se sentir interligada com tudo e com todos. Coloca as palavras do lama budista Anagarika Govinda ao lado de suas obras: “...O mundo externo e seu mundo interior são, para ele, apenas dois lados do mesmo tecido, no qual os fios de todas as forças e de todos os eventos, de todas as formas de consciência e de seus objetos, se acham entrelaçados numa rede inseparável de relações intermináveis e que se condicionam mutuamente.” UNIVERSO INVISÍVEL 6 Argila creme, esmalte de cinzas, forno elétrico. UNIVERSO INVISÍVEL 2 Argila creme, esmalte de cinzas, forno elétrico. UNIVERSO INVISÍVEL 7 Argila creme, esmalte de cinzas, forno elétrico. UNIVERSO INVISÍVEL 1 Argila branca shiro, esmalte de cinzas, forno elétrico.




Rosalia Luz Cursou Pintura na Escola Nacional de Belas Artes do RJ, de 1957 a 1963; Pintura e Gravura, no MAM – RJ, nos anos 1961 e 1962; Pintura, Desenho, Modelo Vivo, Aquarela, nos anos seguintes, em diversas escolas e ateliers de artistas como Frankie Schoeffer, Augusto Rodrigues, Umberto França e Ivan Serpa. Em 1972, frequentou o Curso de Arte e Civilização na Sorbonne, em Paris. Participou como pintora de inúmeras exposições, no Brasil, destacando-se a de Tiradentes e a do Instituto Brasil Estados Unidos, ambas em 1984, e a da Prefeitura de Petrópolis, em 1985. Formou-se ainda em Direito. Quando decidiu morar em Itaipava, em 2000, conheceu Flávia Santoro e passou a ter aulas no seu atelier. Ali fez novos amigos e descobriu a magia da cerâmica. Após Flávia mudar-se para Cunha (SP), continuou seu aprendizado com Lydia Sebastiany, atelier que frequenta regularmente até hoje. Paralelamente montou seu próprio atelier: - Neste espaço acolhedor se descortina uma linda vista e muita vegetação. Ali praticamos vários tipos de queima. Abri ainda o espaço para aprendizado e

convidei Rosane Teixeira para ministrar aulas, o que me proporciona o grande prazer de ver desabrochar novos talentos. Hoje posso dizer que a cerâmica ocupa um lugar muito importante na minha vida, me trazendo grande felicidade. Nos últimos anos, participou já como ceramista de diversas feiras e exposições, dentre elas, a Primeira e a Segunda Feira de Cerâmica de Itaipava (2017/2018). Sobre o seu método de trabalho e a sua relação com o barro, Rosalia Luz acrescenta: ...eu dificilmente desenho antes... uma placa ou um trabalho... eu vou na hora aplicando o relevo, a textura, de forma meio que espontânea... é impressionante como uma coisa que não tem forma, que passa despercebida no mundo e na natureza, possa se transformar, mediante alguma dedicação e técnica, em tantas... numa infinidade de coisas tão úteis, ou apenas, belas. O barro é tudo!

“Hoje posso dizer que a cerâmica ocupa um lugar muito importante na minha vida, o da felicidade.” (Rosalia Luz)



OUTONO Argila de vários tipos com queima e esmaltação feitas em forno de alta e baixa temperatura.

VESTÍGIOS DO PASSADO Placas com argilas de tonalidades diferentes, tendo 4.5mm de espessura ocorrendo rachaduras diversas. Queimas em baixa (900ºC) e alta (1240ºC) temperatura. Esmaltação praticamente invisível. Desenhos de folhas e galhos.



Rosane Teixeira Na busca em criar peças únicas e exclusivas para o restaurante da família, Rosane Teixeira foi atrás da cerâmica. Iniciou o seu aprendizado no Ateliê de Lydia Sebastiany, em 2013, onde aprendeu várias técnicas como Queima Primitiva, Raku e Terra Sigillata. De aluna a aprendiz ficou até 2017. Hoje, em ateliê próprio, segue o aprendizado e compartilha os ensinamentos dessa curta jornada com suas alunas em Itaipava. Seus trabalhos têm foco, originalmente, em utilitários para restaurante. Progressivamente Rosane ampliou o escopo das obras procurando integrar através de criações livres o espaço arquitetônico dos salões de restaurantes.

“A primeira palavra que me vem da minha relação com o barro é ‘respeito’... tenho um profundo respeito pelo ele... as possibilidades que ele dá... em cada mão ele se mostra de forma diferente... quando eu começo a amassar o barro, abro uma placa, vou fazendo carinho, aliso de um lado, tudo bem devagar... trocando, pedindo permissão para tirar ele daquele estado bruto e ir modelando, sempre com muito cuidado e bem devagar... o barro vai mostrando o caminho, me permitindo...” (Rosane Teixeira)


SEM TÍTULO Extrusora em argilas shiro e terracota Paschoal. Queima: forno elétrico,1240ºC.


SEM TÍTULO Argilas shiro e terracota Paschoal; Queima: forno elétrico,1240ºC. Acabamento esmalte vidrado



Solange Mano Graduada em Direito pela PUC/RJ, Solange trabalhava como executiva quando resolveu, em 1987, fazer cerâmica apenas como hobby. O Barro cada dia vai tomando mais espaço em sua vida. Em 1992 passa a assistente de sua mestra Sylvia Goyanna. Em 1994 abre seu próprio atelier. Volta para PUC para cursar Pós-Graduação em História da Arte e Arquitetura no Brasil. Nos últimos trinta anos, participou de inúmeras exposições, workshops e seminários pelo Brasil, Europa e América Latina. Acreditando que “um sonho sonhado sozinho é apenas um sonho... mas um sonho sonhado junto se torna realidade” resolveu criar, através do Facebook, em 2012, o Dia do Ceramista. A partir daí, a data passou a ser comemorada em vários países do mundo. Húlu... é conhecida no Brasil como Cabaça... na China simboliza “Boa Sorte!!!”. A Cabaça nos primórdios servia para conter... a inteligência humana a transformou no Bule...

Bule... esse objeto que usamos com a maior naturalidade, tanto no Ocidente como no Oriente... mas, vamos combinar... ninguém nunca viu um Pé de Bule... conjugar bico... alça... e corpo foi um grande legado dos nossos ancestrais. Meus Bules reverenciam as antigas Cabaças! O barro e o gesto “A única coisa que você tem que ter pra fazer cerâmica é não ter medo de ser feliz... deu errado, amassa e faz de novo... o barro é um professor fantástico! Primeiro, ele tem o tempo dele. Se você for trabalhar sem respeitar o tempo do barro você não consegue... eu, por exemplo, no meu trabalho, na hora em que eu estou executando o bule, a espontaneidade tem que vir, é o gesto... o barro marca o gesto... porque o barro racha, o barro trinca, o barro quebra... é por causa dele que a gente tem a história do mundo... esses pedacinhos, esses caquinhos é que contam a história da humanidade. (Solange Mano)

“O Barro nos leva a trabalhar de várias maneiras, criamos o espaço interno brincando com o externo. Forma, volume e cor resultam do pensar e do fazer, tentando não deixar à parte o seu lado poético.” (Solange Mano)



DA CABAÇA AO BULE UMA GRANDE SACADA Torno, modelagem e polimento manual. Queima: Oxidação.




Realização Sesc RJ

Produção Estúdio Sauá

Curadoria Julia Ariani, Maíra Maneschy

Expografia Daniel Leão, Tania Sarquis, Tomás Fage Programação Visual PONTE Design

Iluminação Espaço Luz, Antônio Mendel Fotografias Thomas Mendel, Lucas Martins



Ana Rondon • Arthur Bosisio Ivo Ferreira • Jane Maia Weinberg Jean Ruffier • Lydia Sebastiany Maria Luiza Lacerda • Rosane Teixeira Rosalia Luz • Marcia Limmanii Solange Mano • Maria Eduarda Gurjão


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