ENTREVISTA COM MARCELO TAS O comandande do CQC solta o verbo: “É mais difícil entrevistar políticos hoje do que na época da ditadura”.
E TEM MAIS A trajetória conturbada de Tim Maia. Aos 21 anos, Pelé já somava 500 gols. Piadas, causos, curiosidades e histórias inspiradoras de luta pela vida.
& ELAS LANÇAM MODAS, BORDÕES E POVOAM A SALA DE CASA COM MOCINHOS E VILÕES. NO ESPECIAL DO MÊS, TRAMAS QUE MARCARAM A NOSSA HISTÓRIA.
Uma batalha que nã Criada em 2008, a Febec reúne mais de 40 entidades dedicadas continuamente ao combate do câncer no País. Seu principal objetivo é unir e dar todo o tipo de suporte às entidades filiadas, como associações, redes de voluntários e hospitais espalhados pelo Brasil. Para viabilizar suas ações, a Febec conta com parcerias e campanhas, como as desenvolvidas junto à APAS (Associação
o permite descanso Paulista de Supermercados) na destinação de recursos provenientes da Nota Fiscal Paulista às entidades de combate ao câncer. E também na venda, dentro dos supermercados e por assinatura, do Almanaque de Cultura e Saúde. Saiba mais no nosso site: www.febec.org.br
Rua Silva Airosa, 40. São Paulo-SP. CEP 05307-040. Fone: (11) 2166-4131
Os nós do novelo
À
s vezes a vida parece mesmo uma novela, cheia de voltas que se desenrolam lentamente. Ou será que as novelas imitam a vida? Amauri Pontes, na página 34, conclui: “Não há alegrias sem tristeza. Não há batalha sem luta. Não há luz sem escuridão”. Ele passou por um tratamento de câncer, e hoje, curado, dá seu depoimento na seção Muito Obrigado. Do outro lado, na seção Gente Ajudando Gente, trazemos a vida e a motivação de voluntárias que auxiliam pessoas como Amauri. Neste número, Leonor Aguiar confessa: “O bem maior sou eu quem recebo”. Este Almanaque de Cultura e Saúde entra na história para arrecadar verbas ao trabalho de apoio biopsicossocial a pacientes com câncer. Vendida por assinatura, a revista é uma parceria entre a Federação Brasileira de Entidades de Combate ao Câncer (Febec), a Associação Paulista de Supermercados (Apas) e a Andreato Comunicação e Cultura. Acreditamos que sempre é possível amenizar voltas de sofrimentos e, muitas vezes, chegar a um final feliz como o de Amauri. Além disso, assumimos a missão de encontrar as alegrias e luzes do percurso nessa vida. Propomos a disseminação da brasilidade e do entretenimento com qualidade, trazendo curiosidades, enigmas, brincadeiras e causos ligados ao País. Neste mês, você pode conferir a trajetória de um certo Tim, que foi para os Estados Unidos com 12 dólares no bolso e voltou expatriado, antes de marcar a música brasileira. Encontramos também algumas pérolas. O traje de gala do pernambucano Ariano Suassuna, fanático pelo Sport Clube, é o Sport Fino – todo vermelho e preto. Por sua vez, Mauro Shampoo, ídolo do Íbis, reconhecidamente o pior time do mundo, recebe os clientes com o uniforme do clube. E atende o telefone com a saudação: “Jogador do Íbis, cabeleireiro e homem: Mauro Shampoo, às suas ordens”. Como o futebol, a novela é paixão e especialidade nacional. Nosso tema do mês é capaz de parar o País e até guerras no exterior. Se quiser entrar na trincheira do nosso lado e receber capítulos de almanaquices todos os meses, assine o Almanaque de Cultura e Saúde. É só acessar www.febec.org.br. Ou ligar para (11) 2166-4100. Até o próximo episódio.
Criar é, acima de tudo, dar substância ideal ao que existe Di Cavalcanti, pintor
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Sumário 5 carta enigmática
18 eSPECIAL Novelas: Histórias em Linha
29 Almacrônica por Lourenço Diaféria
6 você sabia?
22 jogos e brincadeiras
30 em se plantando tudo dá Alho
12 GENTE AJUDANDO GENTE Linor Rodrigues de Aguiar
23 o teco-teco
32 Rir é o melhor remédio
13 PAPO-cabeça Marcelo Tas
24 VIVA O BRASIL Bixiga
33 CAUSoS de Rolando Boldrin
16 Ilustres Brasileiros Tim Maia
28 temperos e sabores Vatapá
34 muito obrigado por Amauri Pontes
Solução na p. 22
o filho do palhaço, o que é? Desde que o pai e ídolo deixou a família, ele foi contínuo, engraxate, garçom, apontador do jogo do bicho. Lírio tinha 13 anos quando começou a trabalhar e 19 quando entrou na Rádio Tamoio como faxineiro, em 1942. Lá garantiu sua vaga de radioator. Logo participaria do teatro de revista, com seu estilo desbocado. Estreou no cinema com muita polêmica, em Anjo do Lodo. Em prol dos bons costumes, o então vereador paulistano Jânio Quadros tentou proibir a película, que mostrava o meretrício e a atriz Virgínia Lane no papel de prostituta. Fez ainda pontas em chanchadas e uma série de impagáveis paródias de longas famosos. Contracenou com Grande Otelo em As Aventuras de Robinson Crusoé. A partir dos anos 1960, participou de diversos humorísticos na tevê: Apertura, Apertem o
Riso, Planeta do Homens, Chico Anísio Show. Também aparecia em comerciais da Loteria dirigidos por Cacá Diegues. “Proibida a execução em lugares públicos e a venda para menores de 21 anos”, informava uma tarja em todos os discos do comediante, sucessos de vendagem. Na capa do primeiro volume, aparecia nu, atrás de uma mesa. Na altura das partes íntimas, sobre a mesa, um peru. Não media termos de baixo calão. E era o rei das caretas. Entre as palavras, comprimia os lábios, colocava a língua pra fora. Seu forte eram as piadas. “Aí a bichinha...”, começava. Gostava também das de português. Morreu aos 72 anos, em 15 de setembro de 1995. O último papel foi no programa Escolinha do Professor Raimundo, uma homenagem a Mazzaropi e Oscarito.
“Chega de bossa nova. Chega de cantar para dois ou três intelectuais uma musiquinha de apartamento. Quero o samba puro, que tem muito mais a dizer, que é a expressão do povo.” Desse modo, Nara Leão marcou o rompimento com a bossa numa entrevista à revista Fatos & Fotos, em 1964. A “dos artistas populares genuínos”, como definia. Esse encontro está registrado no disco Opinião de Nara e na foto ao lado, enquanto aprendia os sambas de Zé Keti e Nelson Cavaquinho em seu famoso apartamento de Copacabana.
reprodução/AB
ex-musa do movimento passou a se aproximar dos sambistas de morro, ou
7/9/1922
15/9/1969
PRIMEIRA TRANSMISSÃO DE RÁDIO NO BRASIL. NO DISCURSO, O PRESIDENTE EPITÁCIO PESSOA CELEBRA OS 100 ANOS DA INDEPENDÊNCIA.
PRIMEIRA TRANSMISSÃO DE TEVÊ EM REDE NACIONAL. ESTRÉIA O JORNAL NACIONAL, COM CID MOREIRA E HILTON GOMES DE SOUZA.
REI É REI
VALENTE COMO NINGUÉm
Nosso primeiro super-herói
Aos 21 anos,
dispensava dublês
Pelé já tinha feito
C
omo todo super-herói, ele tinha uma identidade secreta: o tímido Carlos, químico que namorava Silvana, filha de um agente da Interpol. Quando garoto, Carlos foi levado para o Sétimo Planeta, onde desenvolveu superpoderes. Guardava seu uniforme, compactado, em uma singela caixa de fósforos. Era o Capitão 7, o primeiro super-herói genuinamente brasileiro da televisão. Assim anunciava a música-tema do personagem que lutava contra o crime e a injustiça: Chegou o Capitão 7 / Pra defender o bem / Chegou o Capitão 7 / Valente como ninguém. Criado pelo produtor Rubem Biáfora, o programa estreou na TV Record em 24 de setembro de 1954. O nome do super-herói aludia ao número do canal em que a emissora operava. Exibida até 1966, a série teve mais de 500 episódios. Transmitida três vezes por semana, foi tão bemsucedida que se tornou diária. Capitão 7 era interpretado pelo mineiro Ayres Campos, que se destacou entre dezenas de candidatos pela invejável forma física e pela experiência anterior em atuação. Como não havia na época o recurso reprodução/juvenal pereira/AE
Domício Pinheiro/AE
500 gols
E
m 1969, o Brasil parou para ver Pelé fazer o milésimo gol, contra o Vasco, no Maracanã. Mas sete anos antes o Rei chegava a uma marca tão impressionante quanto, mas muito menos comemorada. Em 2 de setembro de 1962, Pelé fazia o gol de número 500 numa partida contra o São Paulo, válida pelo Campeonato Paulista. Tinha apenas 21 anos. Para chegar até aí, o jogador bateu recordes atrás de recordes. Em 1957 tornou-se o mais jovem artilheiro do Campeonato Paulista. No ano seguinte, marcou 58 tentos pelo mesmo campeonato, número inalcançado até hoje. Em 1959, balançou as redes 127 vezes. O Rei foi ainda o artilheiro do Paulistão por nove temporadas seguidas, de 1957 a 1965. Para efeito de comparação, outro brasileiro que fez mil gols, Romário, alcançou a metade dessa marca aos 29 anos. O corintiano Ronaldo, aos 33, ainda não chegou lá.
Capitão 7: mais de 500 episódio.
do videoteipe, o programa era todo transmitido ao vivo. O próprio Ayres protagonizava as perigosas cenas de ação. Só a partir de 1959 os programas passaram a ser gravados previamente, em película cinematográfica. Também em 1959 a série virou gibi, que durou 54 edições. O desenhista Danyael Lopes, atual detentor dos direitos de publicação do Capitão 7, criou novas aventuras em quadrinhos do super-herói. Quanto aos episódios televisivos, foram todos perdidos em sucessivos incêndios que a emissora sofreu ao longo de sua existência. Só restaram fotos e relatos.
Saiba Mais Enciclopédia Herói, de Alexandre Suannes (Publifolha, 1998).
de quem são estes olhos?
mãe O dono destes olhos nasceu em 10 de setembro de 1952 no interior de São Paulo. Pai lavrador, em doméstica. Fez colégio industrial e faculdade de Artes Cênicas. Ator e diretor, tem vasto currículo No Paulo”. “Sum e ninhum” jeito “Di peças, séries e novelas. Em Tieta, consagrou personagem que dizia Lamarca. Vargas, Getúlio Mauá, de Visconde cinema, coleciona papeis históricos: Confira a resposta na página 22.
a Todo dmi Santo tem u
Bispo de uma cidade próxima a Nápoles no século 3, o religioso foi perseguido e lançado ao fogo. As chamas, porém, não o feriram. Jogado a leões famintos, a única reação dos animais foi a de lamber seus pés. Por fim, foi decapitado. Duas ampolas com seu sangue são conservadas até hoje. No Brasil, o santo é especialmente celebrado no bairro da Mooca, em São Paulo (onde é conhecido como San Gennaro). E também pelos torcedores vascaínos, no Rio.
ARQUIVO/AE
Sao Januário
Plateia indignada vaia guitarras e enlouquece Caetano Veloso
A
companhado pelos Mutantes, Caetano Veloso defenderia a música É Proibido Proibir no 3º Festival Internacional da Canção. Ao subir no palco naquela noite de 15 de setembro de 1968, porém, recebeu uma das mais intensas vaias da história dos festivais. A plateia não queria saber de guitarras elétricas, consideradas um símbolo do imperialismo cultural norte-americano. Além dos apupos, ovos e tomates, e o público virou-se de costas para o palco. Os Mutantes
não tiveram dúvidas. Empunhando o objeto da discórdia, viraram-se também contra a plateia. Enquanto isso, Caetano disparava um furioso discurso de quase três minutos: “Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder?”; “Vocês estão querendo policiar a música brasileira!”; “Se vocês, em política, forem como são em estética, estamos feitos!”. E, sob as vaias que não findavam, cantou o refrão da música que defendia: É proibido proibir!
Saiba Mais Ouça o discurso de Caetano em http://tropicalia.uol.com.br
CONTRA A CORRENTE
Grata a Isabel, Guarda Negra deu sangue por monarquia efender Isabel, a Princesa Regente, acima de todas as coisas. Era esse o objetivo da Guarda Negra da Redentora, organizada em 22 de setembro de 1888 por abolicionistas e ex-escravos. Cada novo membro jurava: “Pelo sangue de minhas veias, pela felicidade de meus filhos, pela honra de minha mãe e a pureza de minhas irmãs, e, sobretudo, por este Cristo”, defender “o trono de Isabel, a Redentora”. Gratos pela assinatura da Lei Áurea, e contrariando a ideologia da maioria dos ex-escravos, republicanos, a Guarda Negra empenhavase pela monarquia. O próprio abolicionista José do Patrocínio, à frente do grupo, havia sido republicano ferrenho. A oposição o chamava de “vendido”. As seções da Guarda eram secretas e a quebra do sigilo podia acabar em morte. Entre outras ações, o grupo armava-se de cassetetes para dissipar ouvintes em comícios favoráveis à República.
ÂNgelo Agostini/Reprodução/AB
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Fases da Lua
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Arte não cura, Árbitro se embanana mas pode ser e proclama dois campeões um santo remédio F PRIMEIROS SEM SEGUNDO
paulo pepe/divulgação
Carlos, do Santos, e Isidoro, da Lusa, falharam. Depois, Carlos Alberto marcou, e Calegari errou novamente. Na seqüência, Edu estufou as redes e Wilsinho mandou a bola na trave: Santos 2 a 0. Ainda havia chance de a Lusa empatar a série. Mas, para espanto geral, Armando Marques se embananou nas contas e encerrou a partida, dando o título para a equipe da Vila Belmiro. Em vez de reclamar, o técnico da Lusa, Oto Glória, exigiu que seus jogadores fossem para o vestiário. E de lá para o ônibus. A virada, afinal, era improvável. Ao perceber o erro, o árbitro desceu ao vestiário para pedir que o time voltasse para o gramado, mas já não havia mais ninguém. Sem saída, a Federação Paulista de Futebol teve que declarar ambas as equipes campeãs.
T
arquivo/ae
inal do Campeonato Paulista de 1973: Santos X Portuguesa. Estádio do Morumbi, 116 mil pagantes. No tempo regulamentar, a equipe da Vila Belmiro deu show. Vislumbrando que aquela seria a última oportunidade de levar um caneco pela equipe que o consagrou, Pelé jogou como nos momentos áureos. Driblou, correu, brigou, mandou bolas na trave. Mas nada de gol. A valente Portuguesa se meteu lá atrás e conseguiu segurar o afã do adversário. A prorrogação também terminou com placar inalterado. A decisão foi para os pênaltis. E aí aconteceu uma das mais célebres trapalhadas do futebol brasileiro. O protagonista? Armando Marques, considerado o melhor árbitro do País. Na primeira rodada de cobranças, Zé
Armando Marques dá explicações depois do jogo.
Saiba mais Assista aos melhores momentos da final pelo Youtube (www.youtube.com) com cenas e narração do Canal 100. Busque pelos termos “Santos”, “Portuguesa” e “1973”.
Eduardo Valarelli em uma das oficinas realizadas em hospitais.
udo começou com um problema de saúde. Em 1991, o artista plástico Eduardo Valarelli permaneceu em uma enfermaria durante 25 dias. Era ele o paciente, mas, com doses extras de sensibilidade, diagnosticou o que nenhum médico tinha notado: doente estava também o hospital. Faltava mais do que remédio. Faltava ali atendimento humanizado e atenção integral ao paciente. Como de médico e louco todo mundo tem um pouco, Valarelli decidiu fazer a parte dele na busca da cura. Passou a levar arte para onde só havia dor. Nasceu em 1996 a ONG Carmim, que atua em hospitais de São Paulo, Pará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte. Como a criação de uma obra-prima, o projeto demandou dedicação. O resultado apareceu colorido: 30 mil alunos atendidos nos hospitais com aulas de arte, 500 jovens e adultos em cursos de formação, além de um acervo de 3.500 trabalhos para provar que a arte está ao alcance do todos. Para Valarelli, quando um paciente em tratamento participa da ação da Carmim, ele deixa de ser apenas doente. Torna-se artista, descobre potenciais. Como o portador do vírus HIV que aprendeu a pintar para decorar o quarto do filho, ainda em gestação. O bebê nasceu um dia depois da morte do pai. As pinturas dele inspiram o menino e outros pacientes atendidos no projeto. Pelo trabalho pincelado com capricho, Valarelli recebe o que dinheiro nenhum paga: gratidão, esperança, sorrisos. E sabe que arte não cura, mas pode promover o desenvolvimento e ser um santo remédio para a alma. Saiba mais Site do Carmim: www.projetocarmim.org.br
Fotógrafo foi em busca da “verdade inteira” de Canudos
C
anudos, 1897. O front das operações de guerra era o sertão baiano de Belo Monte, onde quatro anos antes foi construída uma cidade que se tornara palco de resistência contra o governo federal. Para botar tudo abaixo, fora convocado até o ministro da Guerra, marechal Carlos Machado Bittencourt. Mas a luta ganhava contornos turvos. Já era a quinta investida do governo contra Canudos, que resistia. Embora a cobertura da imprensa não fosse das mais completas, ouvia-se falar da resistência e do carisma de Antônio Conselheiro até na Europa e nos Estados Unidos. Era também contra essa imagem que o Exército brasileiro precisava lutar. Para isso, valia-se dos mais variados expedientes, como sua influência sobre os canais de notícia e até o rastreamento de mensagens telegráficas. Em janeiro daquele ano, na Gazeta de Notícias, Machado de Assis condenava “a perseguição que se está fazendo à gente de Antônio Conselheiro”, e considerava que um “repórter paciente e sagaz, meio fotógrafo ou desenhista, para trazer as feições do Conselheiro e dos principais subchefes, podia ir ao centro da seita nova e colher a verdade inteira sobre ela”. Antes que qualquer órgão de imprensa acolhesse a recomendação de Machado, os militares trataram de arregaçar as
mangas para produzir, eles próprios, as “feições” de Conselheiro que lhes eram convenientes. Se a “verdade inteira” viria à tona graças à alquimia de fixação de imagens num meio sensível à luz, foi enviado para o front o fotógrafo Augusto Flávio de Barros. Marchou ao lado do general Carlos Eugênio de Andrade Guimarães e de suas tropas. Partiram da Bahia em agosto, passaram no início de setembro por Queimadas, a mais de 100 quilômetros de Canudos, e por Cansanção. Chegaram ao sertão de Monte Santo em 26 de setembro de 1897. Graças ao trabalho de Flávio, foram imortalizadas cenas desse importante episódio na história do País. As cerca de 70 fotografias são o único registro visual da guerra – embora as descrições de Euclides da Cunha sobre o conflito sejam tão ricas que se aproximem da fotografia. Entre as imagens de Flávio, destacam-se o corpo exumado de Antônio Conselheiro, a destruição da Igreja Nova, a captura de conselheiristas e o ataque final da artilharia. O fotógrafo ficou por lá até o último clique de canhão. As verdades que registrou foram reveladas em negativos de vidro sobre papel albuminado. Mais de um século depois, em 2002, as fotografias passaram por um processo de recuperação digital.
Saiba Mais Cadernos de Fotografia Brasileira dedicados a Canudos (IMS, 2002).
Manuel de Souza/Folha Imagem
SOB ENCOMENDA
Ada Rogato: aviadora pioneira.
GAIVOTA SOLITÁRIA
Brasileira cruza os Andes pelos ares e entra para a história
A
paulistana Ada Rogato foi a primeira mulher sul-americana a saltar de para-quedas e a primeira brasileira a pilotar planadores. Foi precursora também ao tirar o brevê – carteira de habilitação dos aviadores. Mas um fato ocorrido em 12 de setembro de 1950 a colocou definitivamente na história da aviação esportiva. Nessa data, tornou-se a primeira mulher a cruzar a Cordilheira dos Andes num voo solitário. No comando do avião Paulistinha CAP-4, cobriu 11.200 quilômetros ao visitar Uruguai, Argentina, Paraguai e Chile, ocasião na qual cruzou as grandes cordilheiras, numa viagem que durou 116 horas. Nos anos subsequentes visitou ainda 28 países num único projeto; sobrevoou a floresta amazônica; pousou no aeroporto mais alto do mundo, na Bolívia; chegou à Terra do Fogo, no extremo sul do continente; e ao Alasca, no extremo norte. Sempre sozinha. Sua obsessão por voar só, mesmo em aeronaves com recursos limitados, lhe rendeu um apelido: Gaivota Solitária.
o baú do Barão
Quando chove sopa, o pobre está de garfo. Nossa homenagem a Aparício Torelly, o Barão de Itararé.
DIVULGAçÃO
Camisa 10 do pior time do mundo fez um gol em 10 anos “
ogador do Íbis, cabeleireiro e homem: Mauro Shampoo, às suas ordens.” Assim atende o telefone de seu salão o maior craque da história do Íbis Sport Club, o pior time de futebol do mundo. A fama vem da década de 1980, quando a equipe pernambucana acumulou uma série histórica de derrotas colossais. No auge da carreira, Shampoo usava um corte de cabelo inspirado em Diego Maradona. Seu futebol, porém, não era tão vistoso. Em 10 anos de carreira, marcou apenas um gol, em jogo contra o Ferroviário. Pegou o rebote do goleiro e, da marca do pênalti, empurrou a bola para as redes, abrindo o placar. Mas o Ferroviário acabou virando o jogo: 8 a 1. Ainda hoje Shampoo atende os clientes vestido com o uniforme rubro-negro do Íbis. O ex-jogador cobra 15 reais pelo corte. E ainda oferece uma semana de garantia. Os nomes de suas criações: Caminho do Gol, Bicicleta, Gol de Pênalti.
O ex-craque teve infância pobre. Dos 9 aos 14, trabalhou como engraxate nas ruas do Recife. Hoje sonha Mauro Shampoo, ídolo do Íbis: ”Cabelereiro e homem”. abrir uma escola de cabeleireiros para crianças. Nunca ganhou um centavo jogando pelo Íbis. Mas o carisma o alçou à fama regional, amplificada depois rbeiro Até o de participar de inúmeros programas de tevê. Motoristalo b19a, era comum em Portugal Em 2005, foi tema do impagável começo do sécu m com s também lidasse documentário Mauro Shampoo: Jogador, que os barbeiro tológicos, on os médicos e od cabeleireiro e homem, que acumula de gente pequenos serviç isa co a verdade er de o ic éd m e prêmios em festivais de cinema pelo qu já a raro dentes ce óbvio, não er Brasil. E se há tempos deixou os gramados, rica. Como pare strosas. ou cirurgias desa tente, mal-arrancados pe m agora também pode se orgulhar de profissional inco Sob essa Quando via um ”. ro ei deixar um herdeiro nos campos. O clube rb arece um ba “P a: zi di vo po Brasil o pernambucano contratou em maio o meiosão é usada no iração, a expres sp in as. campista Xampuzinho, filho do grande ídolo s maus motorist para se referir ao da história do Íbis.
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e Origem da
Saiba mais Mauro Shampoo: jogador, cabelereiro e homem, filme de Leonardo Cunha Lima e Paulo Henrique Fontenele (Bitola Vídeo, 2005).
FAROL DO CONTINENTE
Hidrelétrica de Juiz de Fora iluminou a América do Sul
N
JORGE A. FERREIRA J.R
10
J
o final do século 19, a industrialização toma fôlego em Minas Gerais. As cidades crescem. Tornam-se necessárias algumas mudanças. Primeiro, a criação de um sistema financeiro próprio para a região. Em Juiz de Fora, surge o Banco de Crédito Real, que durante muito tempo seria o único do Estado. No mesmo ano, em 5 de setembro de 1889, a cidade torna-se pioneira na América do Sul: é inaugurada no rio Paraibuna a Usina Marmelos Zero, primeira a produzir energia hidrelétrica no sul do continente americano: 250 kw, o suficiente para abastecer as 1.080 residências da época. A condição de primeira região da América do Sul a ter uma usina hidrelétrica rendeu à cidade a condecoração de “Farol do Continente”. Hoje, o antigo prédio da usina abriga um museu contando a história da Marmelos Zero.
Saiba mais Museu Marmelos Zero, agendamento de visitas com o professor Sócrates: (32) 3229-3307.
O libriano valoriza a vida social. É uma fonte de energia, faz questão de ser agradável e carismático. Às vezes, prefere manter a elegância a seguir um instinto. Costuma organizar as atividades e proporcionar equilíbrio ao grupo. O nativo do signo da balança deve tomar cuidado, contudo, para não perder sua própria identidade enquanto agrada a todos.
Ocasião exigia esporte fino, Suassuna foi de Sport Fino
E
escreveu Uma Mulher Vestida de Sol, O Auto da Compadecida, O Romance d’A Pedra do Reino, entre tantos outros. Anos atrás, soube que seria homenageado com uma comenda do Governo de Portugal pelo conjunto da obra. O convite para o evento pedia em letras destacadas: traje esporte fino.Suassuna, além de amante das letras, é um torcedor fervoroso do Sport Club do Recife, time que considera “o primeiro sem segundo”. Quando viu a exigência, nem precisou pensar muito. Para prestigiar as cores do clube e solucionar o dilema das vestimentas para tamanha honraria, criou o traje Sport Fino. A roupa é constituída por calça e casaco pretos de linho, feitos sob medida pelas costureiras e alfaiates do sertão; camisa e meias vermelhas e sapato preto. Elegante que só! É vestido assim que, desde então, Ariano passou a comparecer a todas as solenidades. Trajando o Sport Fino, ele recebeu a Comenda da Ordem do Mérito Cultural e desfilou na Marquês de Sapucaí, em pleno carnaval carioca de 2002, na maior e mais rubro-negra elegância. Alexandre Auler/JC Imagem
ntre a vegetação seca, o céu azul, o sol forte e muitas pedras, na vila de Taperoá, Sertão dos Cariris Velhos da Paraíba, nasceu Ariano Suassuna, nos idos de 1930. Deitado na cama, o menino desde pequeno devorava livros. Literalmente. A cada página lida, arrancava um pedacinho de papel e comia, viajando com as palavras. E assim cresceu mergulhado em uma paixão: a literatura. Tornou-se o porta-voz das histórias do agreste nordestino. Seus livros ganharam o mundo. Inspirado pela terra seca, Suassuna
Ariano é recebido com festa, e traje apropriado, no estádio do Sport.
Saiba Mais Ariano Suassuna – Um perfil biográfico, de Adriana Victor e Juliana Lins (Zahar, 2007).
enigma figurado
ACERVO PESSOAL
eu em 29 de setembro de Na infância em Taubaté, onde nasc espécie de gel caseiro para fixar 1927, era o Caolho e vendia uma em Contabilidade, mas, no cabelos. Adolescente, formou-se unciou um sonoro “boa noite” palco da fest a de um amigo, pron o locutor na Rádio Difusora. que lhe rendeu um emprego com ento noturno passou 27 anos Depois, pela televisão, o cumprim ares de lare s do Brasil. chegando quase diariamente a milh
R.:
Con fira a resp osta na pági na 22.
josé patrício/ae
libra
(23-9 a 22-10)
Divisa do Brasil com a Guiana Francesa.
Do Oiapoque à Europa, é só atravessar o rio Q
uinze minutos de barco separam Brasil e França. O trajeto é feito em catraias que voam pelo rio Oiapoque, partindo da cidade de mesmo nome, localizada no ponto mais extremo do Amapá, e chegando a São Jorge do Oiapoque – ou Saint-George de L´Oyapock –, na Guiana Francesa. O território tem status de departamento ultramarino. Na prática, é um estado da França nas Américas: a moeda é o euro e a língua oficial, o francês. A proximidade com o Brasil fez com que o idioma de Victor Hugo passasse a ser curricular nas escolas públicas do Amapá. A vida na Guiana Francesa é privilegiada. Todos os benefícios oferecidos aos membros da União Européia valem para seus habitantes. São 200 mil ao todo, e estima-se que até 20% deles tenham vindo do Brasil. Muitos, porém, estão ilegais. Houve um tempo em que a imigração era incentivada, quando havia escassez de mão-de-obra. Supridas as necessidades, hoje a Gendarmerie – polícia francesa – expulsa de garimpeiros a deputados, como Manoel Mandi, do PV amapaense, que em fevereiro de 2008 foi “convidado” a voltar ao Oiapoque. O interesse dos brasileiros pela outra margem do rio fez com que as regras para ingresso no País sejam severas, dificultando o turismo. Para entrar na Guiana é necessário visto consular e, para obtê-lo, o interessado precisa apresentar uma espécie de raio X da situação financeira: do holerite à cópia do imposto de renda completo, além de bilhetes aéreos, ida e volta. Mesmo que vá de catraia.
estação colheita O que se colhe no mês
Jaboticaba, mamão, manga, caju, kiwi, uva itália, uva rubi, mexerica.
11
“O bem maior sou eu quem recebo”
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P
ara quem não sabe, são Pelegrino anos. Dois de seus filhos são casados, e é o protetor dos portadores de câna filha que mora com ela trabalha o dia cer. É também o nome do grupo da liga de todo. Por isso, aos 76 anos, disposição e ajuda à doença em Itápolis, cidade de 40 boa vontade não faltam à compenetrada mil habitantes no norte de São Paulo. O senhora. Todo o trabalho do grupo é paGrupo São Pelegrino dá apoio a cerca de ra ao menos amenizar o sofrimento dos Dona Linor, líder do Grupo São Pelegrino, de Itápolis. 250 pacientes que moram no município. pacientes. Ao pensar no apoio e satisfação São pessoas que fazem tratamento em outras cidades e não têm que percebe nos atendidos e suas famílias, no entanto, Linor não tem dúvidas: “O bem maior sou eu quem recebo”. condições de bancar transporte, exames, remédios ou até aliPara arrecadar recursos, as voluntárias contam com doações mentação. Muitas vezes há carência também de atendimento de pessoas físicas, de empresas e outras associações, além de psicológico. A professora Linor Rodrigues de Aguiar encabeça uma equipe de aproximadamente 40 voluntárias que coloca ororganizarem brechós: “Graças a Deus, o povo colabora bastante dem em tudo isso. e estamos dando conta”, comemora Linor. Ela tem ciência da importância de um grupo formado por pessoas que despertam Linor é natural de Jaboticabal, mas aos 23 anos resolveu mudar-se para Itapólis por causa de Milton, o fazendeiro com quem a confiança das pessoas. O trabalho é tradicional e muito respeitado em Itápolis. casou. Quando o grupo de apoio ao câncer se formou na cidade, Como sinal de reconhecimento e apoio à causa, agora o São em 1997, Linor já era viúva havia quase uma década e, aposentada, também não mais lecionava. Desde então entregou-se à Lourenço conseguiu um novo terreno. Vai finalmente deixar a pequena sala emprestada pela prefeitura. No dia em que convercausa. Por ter acompanhado os tratamentos do pai e da irmã, sou com a reportagem, Linor comemorava o presente que tinha conhecia de perto as aflições da doença. E bem sabia da imporacabado de ganhar: 50 sacos de cimento. “E assim, com essas tância de auxílio nessa hora em que “perde-se o chão”. alegrias e conquistas, a gente vai se animando”, sorri. Linor assumiu o cargo de liderança do São Pelegrino há seis
m a rcelo ta s
É mais difícil entrevistar políticos hoje do que na época da ditadura
Laura huzak andreato
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Nos anos 1980, Marcelo Tristão Athayde de Souza era estudante de engenharia. Num jornalzinho da faculdade, descobriu o dom para a comunicação e o nome que lhe acompanharia: Marcelo Tas (tirado das iniciais de seu sobrenome). Dali pulou para uma produtora que apontava novos caminhos para a tevê. Seu personagem mais famoso, Ernesto Varela, desconcertava políticos com perguntas inusitadas. Nunca mais deixaria as telinhas, e nem a aspiração pela ousadia. Precursor e entusiasta da internet, Tas ironiza os que se põem contra os avanços tecnológicos: “Eles estão boiando”. Hoje comanda um dos mais elogiados programas da tevê aberta, o CQC. Como no começo da carreira, continua a deixar os políticos embaraçados. “O maior medo deles é estar diante de uma situação na qual são obrigados a dizer a verdade.”
Como um estudante de engenharia foi se ligar em comunicação? Havia um jornalzinho anarquista na faculdade que eu adorava. Tentei me aproximar do pessoal que o produzia, mas eles me ignoravam, porque eu ainda era bicho na faculdade. Batalhei e consegui publicar um texto. No ano seguinte já me tornei editor, e fiquei três anos na função. Foi muito importante. Eu fazia reuniões de pauta, diagramava, bolava e publicava coisas absurdas. Colocávamos uma página em branco no banheiro masculino e no feminino. As pessoas escreviam o que queriam e a gente publicava, sem censura alguma.
Um jornal debochado eram bem-visto pelo movimento estudantil? Nem um pouco. Eu escrevia uma espécie de coluna social que se chamava Calúnia Social. E detonava o movimento estudantil, tanto da esquerda quanto da direita. Tínhamos muitos problemas, já que quem financiava o jornal era o pessoal da esquerda – e os líderes não costumam ser muito bem-humorados. Um dia, entrevistei uma menina linda ligada à esquerda. Só que na entrevista falamos apenas de sua vida sexual, de namorados, orgasmos. Um dos líderes veio reclamar: “Você quer estragar a imagem de uma de nossas maiores companheiras, uma pessoa séria?”. Fui até ameaçado. Mas ela adorou ter feito aquilo. Isto sempre aconteceu na minha vida: o pessoal da esquerda acha que sou de direita, o da direita acha que sou de esquerda, e recebo pancadas dos dois lados.
Você criou essa imagem propositalmente? Não. Eu 14
faço o que gosto, de forma intuitiva. Não tenho nenhuma intenção de esconder minhas convicções. Se quiserem saber realmente sobre o que penso do Lula, do Serra, do Quércia, deixo clara a minha opinião. Mas sou discípulo daquele ensinamento do Chacrinha: “Eu vim pra confundir, não pra explicar”.
Na produtora de vídeo Olhar Eletrônico, quais eram as aspirações do grupo? Nossas aspirações eram
conceitos. Igual ao que se fala hoje do Twitter. Eles estavam tão perdidos naquela época como estão perdidos hoje. Continuam boiando. Diante de uma novidade, há quem prefira se manter na ignorância, na distância, no “não me misturo com isso”. Essas pessoas não veem que o mundo já foi transformado por essas tecnologias.
Quando vocês entraram na tevê pela primeira vez? A gente tentou emplacar o que fazíamos em todas as emissoras. Em 1982, apresentamos um documentário genial do Fernando Meirelles para a Globo chamado Garotos do Subúrbio, sobre os punks de São Paulo. Viria a ser muito premiado, mas não foi aceito. Pouco depois, o apresentador Goulart de Andrade viu alguns vídeos nossos num festival, achou engraçado e nos abriu duas horas na TV Gazeta às segundas-feiras à noite – como o CQC, aliás. Não tínhamos ideia de como fazer tevê. Quando abriu a câmera, saímos falando, e pondo no ar nossa prateleira de vídeos. O programa fez muito barulho. Dois meses depois, já estávamos no programa principal do Goulart, o Comando da Madrugada, aos sábados. Ele nos dava liberdade total, acreditava nas nossas maluquices.
Podemos ter um papel relevante na história, mas sem esse primitivismo com que tratamos a liberdade de expressão, sem esse pouco investimento em educação.
simplesmente as máximas possíveis. Escrevemos nossa intenção num livro de ata: “Revolucionar a tevê do terceiro milênio”, desse jeito mesmo. A tevê era muito quadrada, só feita com câmeras grandes, pesadas. O cidadão comum não tinha câmeras em casa. Até que conseguimos umas menorzinhas. Íamos às ruas, inventávamos nossas próprias matérias e víamos que o resultado era similar a uma matéria de tevê. Só não tínhamos lugar para veiculá-las.
Você diria que o que unia vocês era a fascinação pelo vídeo? É algo difícil de imaginar hoje, mas o acesso ao vídeo foi uma novidade que chegou como a internet, ou o Twitter. Em São Paulo, pouquíssima gente tinha câmera de vídeo. A Olhar Eletrônico era multidisciplinar. Boa parte vinha da USP, como Fernando Meirelles e Paulo Morelli. Outros vinham da PUC. O que nos ligava era o lance do vídeo mesmo. De poder filmar e ver o resultado logo depois. Era isso o que nos diferenciava do pessoal do cinema.
Havia desconfiança em relação ao que vocês faziam? Éramos totalmente pró-tecnologia e rolava um certo preconceito. Igualzinho ao que rola hoje em relação à internet. Os intelectuais da USP diziam: “A televisão, o vídeo, é tudo uma diluição e blablablá”, aquele monte de
Nessa época surgiu o Ernesto Varela. Como era, ainda na ditadura, fazer perguntas tão provocativas a políticos? Muito excitante. E digo mais: hoje é mais difícil entrevistar políticos do que na época da ditadura. No CQC temos um controle absurdo na hora de falar com políticos. Para se aproximar do presidente ou mesmo de um candidato a deputado, temos que passar por barreiras de segurança. Às vezes apanhamos – coisa que não acontecia quando me aproximava do ex-presidente Figueiredo, por exemplo. Jamais um segurança do Figueiredo me deu uma porrada na frente das câmeras.
Por que os políticos lidam tão mal com programas como o CQC? O maior medo deles é estar diante de
uma situação na qual são obrigados a dizer a verdade. Eles têm aparatos gigantescos para evitá-la: marqueteiros, assessoria de imprensa, estrategistas, seguranças, carros blindados. Os políticos não confiam no taco deles. Alguns se saem bem no trato de improviso com a imprensa, como o presidente Lula. Mas mesmo assim ele se expõe pouco. Quantas entrevistas, exclusivas e coletivas, ele deu? Poucas. Um presidente norte-americano dá duas, três entrevistas por semana. É uma coisa normal. Aqui há couraça, é algo blindado. Só veículos muito espertos arrancam entrevista. Mas sempre negociadas, com perguntas mornas.
Você considera essa estratégia dos políticos brasileiros eficiente? Eu acho uma burrice. Porque algo diferente, mais quente, seria bom para eles. Hoje é tudo morninho, tudo “photoshopado”... Eles acreditam que, assim, cuidam das suas imagens. Pelo contrário. Assim a imagem deles perde totalmente a relevância. O que pensam não repercute na opinião pública, ninguém está nem aí. Aos poucos, o CQC foi ganhando relevância porque com a gente eles falam de outro jeito. O primeiro a sacar isso foi o Lula. Depois, o Maluf, que é muito esperto. Ele sabe que, por mais que apanhe ao se aproximar do microfone do CQC, vai interagir com pessoas que não se importavam mais com ele. E po-
de ser que ganhe novos simpatizantes, por ser considerado uma pessoa corajosa, que não tem medo de se aproximar de quem o critica. Além de ter a possibilidade de prestar conta das coisas das quais é acusado. Desde que o entrevisto, existe um questionamento se ele é ou não corrupto. Eu fiz essa pergunta a ele há mais de 25 anos. Até hoje a dúvida persiste.
Em 1986, como Ernesto Varella, você entrevistou Nabi Abi Chedid e ocorreu uma discussão homérica. Há pouco tempo ocorreu o mesmo com o prefeito de Barueri durante uma matéria do CQC. Os acontecimentos foram parecidos? Os dois casos têm muito a ver. Mas, para fazer justiça ao Nabi, ele nunca tentou me censurar, mesmo com poderes para isso. Ele era chefe da delegação na Copa de 1986 e havia proibido os jogadores de falar sobre política. O Brasil vivia eleições, e tínhamos a seleção mais politizada da história: Sócrates, Casagrande... Eu estava indo fazer outra reportagem pelo pool SBT e Record quando ouvi a notícia pelo rádio do carro e resolvi ir para a concentração. Estava rolando uma entrevista coletiva, e, para minha surpresa, ninguém havia questionado o Nabi sobre a proibição. Só no fim da coletiva consegui pegá-lo. Rolou uma grande discussão, ele me chamou de mau brasileiro e outras coisas mais. Talvez seja uma das minhas entrevistas que mais repercutiu. À noite, no hotel, toda a cúpula dos cronistas esportivos nos visitou para ver a matéria em primeira mão: Juca Kfouri, Alberto Helena, Ricardo Kostcho. Mas não recebi represália alguma do Nabi. Tive acesso total aos treinos e aos jogos. Hoje rola uma limitação gigantesca ao trabalho do jornalista e a gente acha normal. É revoltante este ambiente de censura em que vivemos.
Como no caso do prefeito de Barueri? Por que ele agiu daquela forma agressiva? Ele agiu no DNA antigo, que chamo de DNA analógico – quando só se fala, não se ouve. Dane-se o telespectador e o eleitor. Age-se como se não fosse haver reação. No mundo digital, as coisas são diferentes. Ele tomou um susto quando viu toda a repercussão. Mesmo assim, conseguiu nos censurar por uma semana. Um prefeito do interior de São Paulo consegue censurar um programa televisivo! Isso é muito preocupante. O Brasil avançou numa série de coisas, mas ainda há instrumentos de censura à livre expressão.
Como falar de política em ano de eleição? Nós brincamos de Chico Buarque, “fazendo música” com segundos, terceiros, quartos sentidos. No período em que as pessoas mais querem discussões políticas, é proibido ter debate político na tevê. É ridículo. Os veículos são mornos, com aqueles debates desinteressantíssimos. Não há como ter surpresas. Fica todo mundo amestrado. As perguntas todas com muito bom-senso: as estradas, o saneamento básico... Um baita papo furado que faz todo mundo dormir. Chega ao ponto de cartunista ser proibido de ironizar a figura dos candidatos. O que vai fazer um cartunista sem ironia? É a mesma coisa que um médi-
co sem bisturi. Isso despolitiza uma geração. Pelo CQC, percebo que as pessoas estão voltando a se interessar por política.
Este é um fenômeno brasileiro ou acontece em outros países? Em nenhum lugar. Talvez na Coreia do Norte, quem sabe na China... A primeira emenda norte-americana fala que é proibido legislar sobre liberdade de expressão. Não é uma emenda que diz que são favoráveis à liberdade de expressão. É proibido legislar sobre o tema. É algo genial, feita no século 19! A gente ainda não chegou nesse estágio.
Acredita que a tevê melhorou dos anos 1980 pra cá? Não digo que melhorou. Prefiro dizer que andou bastante. Mas ainda está muito aquém do que o telespectador espera, principalmente no quesito ousadia. O telespectador já está pronto para a ousadia, e a tevê fica sonegando isso. Vai soltando ousadia homeopaticamente. A ousadia dá sempre certo: CQC, Pânico, TV Pirata!, novela Pantanal. Mas olha essas novelas atuais... São todas iguais. Os mesmos cenários, os mesmos apartamentos. Parece que são filmadas na Tok Stok.
Você considera a internet uma revolução nos meios de comunicação, ou uma evolução natural de outros meios? A internet é um nó dramático em nossa história. O rádio, a tevê, o jornal, o cinema foram cortes lineares. A internet é um corte não linear, que afeta toda a cadeia. Antes, aparecia a tevê e afetava um pouco o cinema. Logo depois os dois conviviam novamente. Agora temos um corte que afeta da indústria de pasta de dente à produção de livros, da tevê à indústria fonográfica. E tudo ao mesmo tempo.
E no campo educacional, o que mudou? A escola deve estar muito atenta à internet. O aluno que chega hoje numa sala de aula não tem mais um único provedor de informação, como eu tive, que era o professor. Hoje tem milhares. O aluno precisa desenvolver outras habilidades para discernir, filtrar as informações das quais tem acesso. O papel do professor hoje é auxilia-lo neste processo.
Qual o papel do Brasil diante de tantas transformações mundiais? O Brasil precisa chegar ao presente. Nós fomos durante muito tempo em direção ao futuro. Agora temos que chegar ao presente e perceber que temos uma chance enorme nas mãos. Nem é preciso grandes elucubrações filosóficas. Hoje, ao lado da Índia, do México e de alguns outros países, temos uma chance gigantesca de começar a ter um papel relevante na história humana. Claro que sem esse primitivismo que tratamos a liberdade de expressão, sem esse pouco investimento em educação. Nossa chance está presente. As pessoas, mesmo que aos trancos e barrancos, estão cada vez mais tendo acesso à informação, indo à escola, se formando. O País tem saúde comercial. Quer um exemplo? Nossos voos estão sempre cheios. Às vezes pego avião em horários inusitados e percebo esse fenômeno. Tem voo às 23h de São Paulo a Aracaju, e está totalmente cheio. Dá vontade de perguntar: “O que vocês estão indo fazer em Aracaju a esta hora?”.
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Um v ulcão chamado Ti m a Tim Mai
Capaz de gestos nobres e brigas homéricas, Tim Maia não era um sujeito fácil de lidar. Pai da soul music brasileira, apresentou ao País uma sonoridade jamais ouvida por estas terras. Era perfeccionista, levava à loucura os músicos e técnicos de som.
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Faltava a shows, xingava a plateia, entrava Reproducão/AB
em seitas malucas. O Brasil, em resposta,
E
le mesmo se definia: “Sou o gordinho mais simpático da Tijuca”. E, para muitos, se tornaria o gordinho mais simpático do Brasil. Ia além: o mais talentoso, o mais generoso, e também o mais briguento, o mais explosivo, o mais corrosivo, o mais autodestrutivo. O senso comum não seria capaz de compreender o vulcão Tim Maia. Ele nasceu em 28 de setembro de 1942, numa família religiosa de 12 filhos do bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro. A contragosto, chegou a ser coroinha da paróquia local. Caçula, era o mais paparicado de todos. Foi o único a ganhar uma bicicleta, quando completou 12 anos. Mas o que lhe interessava mesmo era a música. Em 1957 formou Os Sputniks, inspirado no satélite lançado aos céus pelos soviéticos. Chamou dois amigos próximos e, para completar, um capixaba de nome Roberto Carlos. O grupo conseguiu se apresentar no programa Clube do Rock, da TV Tupi, comandado por Carlos Imperial. Não passaria daí. Nos
só conseguiu amá-lo.
bastidores, Roberto convenceu Imperial de que deveria se apresentar sozinho, imitando Elvis. Tim não gostou nada daquilo. E Os Sputniks foram para o espaço.
O pai do soul brasileiro
Em 1959, com 12 dólares no bolso, Tim decidiu se mandar para os Estados Unidos. Lá ganhou intimidade com a música negra americana, formou a banda The Ideals e trabalhou como babá. Também foi preso por roubar um carro para viajar pelo país. Voltou ao Rio em 1964, já com ideias musicais bem definidas. Conseguiu gravar um compacto com músicas em inglês, mas a repercussão foi pífia. Tim sofria com sua aparência. Em 1968 hospedou-se na casa de dois amigos, um músico, outro empresário. Eles eram boa-pinta, e os brotos não saiam de lá. Todas para eles, nenhuma para Tim, que ouvia, triste, a diversão alheia através da parede. Numa ocasião, quase chorando, compôs: Na vida a gente / Tem
Temperamental, reforçava a fama de faltar a shows, brigar com gravadoras, músicos, empresários e técnicos de som. Não poupava nem a plateia. que entender / Que um nasce pra sofrer / Enquanto o outro ri. “Mermão! Tu acabou de fazer a música da tua vida”, comemorou um dos amigos. As coisas começariam a mudar quando Roberto Carlos lhe encomendou uma música meio cafajeste, mais soul, sem se assemelhar às baladinhas da Jovem Guarda. Nasceu Não Vou Ficar: Há muito tempo eu vivi calado / Mas agora resolvi falar / Não tem mais jeito, tudo está desfeito / E com você não posso mais ficar. Também entrou em estúdios com Elis Regina e, em 1970, lançou o primeiro lp solo. A música João Coragem entrou na novela Irmãos Coragem, da TV Globo. E o soul começava a cair no gosto popular. Na esteira vieram mais três discos, com sucessos como Não Quero Dinheiro e Gostava Tanto de Você. Até que uma seita cruzou o seu caminho.
Universo em desencanto
Em 1975 Tim folheou, à toa, um livro que estava sobre a mesa de um amigo. Ficou maluco com o que leu. Anunciou que tinha descoberto toda a verdade sobre a existência. “Nós somos originários de um planeta distante e perfeito, e estamos na Terra exilados.” Era parte da doutrina do Universo em Desencanto. A seita pregava que os adeptos não podiam beber, usar drogas, comer carne vermelha ou fazer sexo sem o intuito de procriar. Também tinham que se vestir apenas de branco. Em certa ocasião, Tim mandou que até os instrumentos da banda fossem pintados de branco. Só se salvaram as teclas pretas do piano. Nessa viagem, surgiram dois discos que propagavam o ideal racional. E dá-lhe exortar os ouvintes a ler o tal livro da seita. Na música Bom Senso, explica: Já fiz muita coisa errada / Já dormi na rua / Já pedi ajuda / Mas lendo atingi o bom sen-
so / A imunização racional. Numa certa manhã, cansou-se de tudo aquilo e espalhou para todos que o líder da seita era um picareta. Tim voltava ao normal. A seu normal.
Amável encrenqueiro
Durante os anos 1980 e 1990, lançou vários sucessos: Descobridor dos Sete Mares, Me Dê Motivos, Do Leme ao Pontal. Ao mesmo tempo, reforçava a fama de temperamental, de faltar a shows, de brigar com gravadoras, músicos, empresários, técnicos de som. Não poupava nem a plateia. Vez ou outra soltava impropérios aos fãs que o vaiavam por demorar a começar algum show. Nada que o fizesse ser menos admirado. Era respeitado por craques da música. Só de Caetano Veloso há três canções que fazem referência a ele: Podres Poderes, Pra Ninguém e Eclipse Oculto: Quero que tudo saia / Como o som de Tim Maia, sem grilos de mim / Sem desespero, sem tédio, sem fim. Já para Jorge Ben, era o síndico, evocado num dos maiores sucessos dos anos 1990: W/Brasil (Chama o Síndico). Em março de 1998 subiu ao palco do Teatro Municipal de Niterói para mais uma apresentação. Tentou cantar, mas não conseguiu ultrapassar os primeiros versos de Não Quero Dinheiro, e se retirou do palco. O público achou que era mais uma malcriação, e começou a vair. Não era. Minutos depois correu a notícia de que ele tinha sofrido uma crise de hipertensão, uma embolia pulmonar e uma parada cardiorrespiratória. Foi internado no Hospital Antônio Pedro. Não resistiu. Dias depois, o pulsante coração de Tim parou de pulsar. SAIBA MAIS Vale Tudo: O som e a fúria de Tim Maia, de Nelson Motta (Objetiva, 2007).
O melhor produto do Brasil é o brasileiro CÂMAR A CASCUDO
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Desenroladas dia após dia, as novelas fazem parte da vida e da história brasileiras. Suas tramas, mocinhos e mocinhas, vilãs e vilões e até cortes de cabelo marcaram épocas.
“C
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omo o próprio nome diz, é um novelo que vai se desenrolando aos poucos”, bem observou Janete Clair, uma das maiores novelistas brasileiras – a “usineira dos sonhos”, segundo Drummond. A técnica que ela tão bem soube descrever e usar, no entanto, não é invenção nova, nem nacional. Desde o fim do século 19, folhetins franceses veiculados nos jornais fazem leitores rir, chorar e aguardar ansiosamente o próximo capítulo. E até eles já eram herança de antigas histórias de cavalaria da Idade Média. As novelas, em verdade, “tratam de questões milenares como encontro, separação, traição, segredo, mistério e disputas”, disse uma vez a especialista Maria Lourdes Motter, para explicar por que se perpetuam na linha do tempo. Essa história começou a se desenrolar no Brasil durante a Era do Rádio, fazendo estrondoso sucesso. Os folhetins sonoros originaram os visuais, nas divertidas sequências de fotos com balões de fala. Por fim,
As livra afirmara rias espíritas m graças à em 1994 que, n A Viagem ovela global doutrina , difusora da k vendas c ardecista, suas resceram 50%.
as histórias seriadas foram para a televisão, reunindo primeiro a vizinhança, depois a família para celebrar a hora da novela. Foi aí que viramos mestres. A teledramaturgia brasileira fez-se a melhor do mundo, capaz de parar o País e até guerras. Em dia de capítulo final, é comum três milhões de televisores – ou oito a cada 10 que estão ligados – sincronizarem o episódio. Elas lançam modas, bordões, manias. Há quem diga que as tramas televisivas são capazes de alterar costumes importantes da sociedade, como o número de filhos por casal, por exemplo. Há também teóricos que acreditam que as expectativas e ansiedades vivenciadas com as histórias em série ajudam o povo a superar problemas e catástrofes coletivos. Pois vamos “deixar de lado os entretanto e partir para os finalmente”, como diria Odorico Paraguaçu, inesquecível personagem de O Bem-Amado.
tel. timo Céu, Grande Ho da Capricho, Ilusão, Sé un seg a am tav en res s rep Juntas, as fotonovela os an s no revistas do País maior vendagem de s ita Mu s. ho s quadrin 1970, atrás apenas do namorar lendo romances a ram de ren ap s ha mocin esar de geralmente ap es, tor vividos por fotoa tura tinho para isso – a lei terem que dar um jei ”. Nas ília fam ida nas “casas de m costumava ser proib dia po s, da ica oc tórias ad bancas, apesar das his r maiores de 15 anos. po ser compradas apenas
Em um co o nom ncurso para e Em Bus e do bebê da tr scolher am ca Naciona da Felicidade a de , a Rádio l recebe cartas muitas u quase 50 m dela il e roupin has par s com chupet a o pers a onagem s .
Rádio Nacional chegou a produzir 116 tramas em três anos
A primeira radionovela brasileira – Em Busca de Felicidade, de 1941 – e a de maior audiência – O Direito de Nascer, 10 anos depois – tinham roteiros cubanos, verdadeiros dramalhões. Mas escrevemos também nossas próprias histórias. Só entre 1943 e 1945, a Rádio Nacional produziu 116 tramas e imortalizou muitos autores: Amaral Gurgel, Mário Lago, Janete Clair, Dias Gomes. Os roteiros da Nacional, da Tupi e da Globo eram vendidos para emissoras locais, de norte a sul. Assim, ganhavam novas interpretações Brasil afora.
Ver com os ouvidos Efeitos sonoros eram essenciais para criar cenas sem que o espectador pudesse vê-las nas radionovelas. Para isso, os estúdios contavam com torneiras, campainhas de vários sons, aparelhos que simulavam o barulho de tiros e, principalmente, com a criatividade dos contraregras. Os profissionais sempre liam o roteiro bem cedo para ter tempo de improvisar os sons. Reunimos aqui algumas soluções.
Isso é coisa de mulherzinha?
Pessoa num formigueiro
comprimido efervescente em refrigerante
Fogo e chuva
Andar de cavalos
Máquina de costura
Submarino com vazamento
papel celofane amassado
batidas de quengas de coco
caixa de fósforo
descarga de vaso sanitário
Para arrepiar o cabelo das feministas, as primeiras radionovelas brasileiras iam ao ar graças a patrocínios de produtos de limpeza e higiene. Passavam de manhã, quando o público era apenas 20% masculino – não é à toa que, em inglês, o gênero se chame soap opera (ópera do sabão). Na década seguinte, entretanto, os dramas ganharam horários noturnos e outros ouvintes, como narra crônica da revista Noite Ilustrada: “Homens sisudos, homens de negócios, senhoras que não são muito afeitas ao vício comum de ouvir rádio sistematicamente, mocinhas casadoiras, rapazes que não têm mais em que pensar, avós e solteironas, todos se agarram ao receptor às segundas, quartas e sextas, às 20 horas. É a hora da novela!”
Pigmaleão 70
Dancin’ Days Globo, 1978
Globo, 1981
Brilhante
Rainha da Sucata
Cabelo “pigmaleão” de Cristina (Tônia Carreiro), mais comprido na frente e curto atrás.
Meia Lurex com sandália, de Júlia Matos (Sônia Braga).
Cabelo curto e lenço no pescoço, de Luisa (Vera Fischer).
Lambada, marca da abertura.
Globo, 1970
Globo, 1990
O Clone
Globo, 2001
Pulseira com anel, moda árabe.
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Nem guerra atrapalha o último capítulo
Os encantos da nossa dramaturgia televisiva ultrapassam fronteiras nacionais. Nos anos 1970, Fidel Castro chegou a suspender o racionamento de energia no horário de transmissão de Escrava Isaura. Lucélia Santos, no papel de escrava branca, paralisou também uma guerra na BósniaHerzegóvina: em 1995, muçulmanos e sérvios tiveram trégua enquanto durou o último capítulo. Na Rússia, o parlamento encerrou a sessão mais cedo para não perdê-lo. Por lá, também Mulheres de Areia fez tanto sucesso que o governo exibiu o desfecho num têm brasileiras rio dia de eleição. Como era feriado, foi a manobra s la e v o n As orá ntido no h ssa, encontrada para evitar que as pessoas viajassem ra a g r a g lu visão ru le te e deixassem de votar. a d re nob fácil sempre é m e n . s e a m m no dução do fazer a tra , por exemplo, nte Tropicalie ropikanka. virou T
Qua Tuc ndo o b Ban ão mor icheir o da G deira 2 reu em , mu l n o ove bo it não os teles de 197 la p t apo ivera ectad 3, m s núm taram dúvid ores n e dele ro d o bic as: a ho . o pr Ganha sepultu o ime ram ra iro prêmtodos io.
Em novela ao vivo, beijo podia durar até um minuto
Éramos Seis Tupi, 1977
Globo, 1976
Simone Marques/ Rosana Reis (Regina Duarte) e Cristiano Vilhena (Francisco Cuoco)
Júlio (Gianfrancesco Guarnieri) e Dona Lola (Nicette Bruno)
Nacib (Armando Bógus) e Gabriela (Sônia Braga)
Por Amor
Laços de Família
Globo, 1972
Gabriela
20
A História de Ana Raio e Zé Trovão Manchete, 1990
Globo, 1997
Zé Trovão (Almir Sater) e Ana Raio (Ingra Liberato)
Edu (Reynaldo Gianecchini) e Camila (Carolina Dieckmann)
Globo, 2000
Nando (Eduardo Moscovis) e Milena (Carolina Ferraz)
Glória Menezes e Tarcísio Meira é o casal que mais se repetiu na história da telenovela brasileira: 15 vezes!
Vo cê S As trilhas das novelas eram compostas e gravadas especialmente para esse fim. Até as duplas Toquinho e Vinicius de Moraes e Raul Seixas e Paulo Coelho dedicaram-se a discos para enredos. Os cantores brasileiros mais constantes em aberturas de telenovelas são Ney Matogrosso e Rita Lee, cada um com sete músicas emplacadas. Eu Sei que Vou Te Amar e Baby são as músicas nacionais mais usadas em trilhas sonoras, seis vezes cada.
i a? ab
Selva de Pedra
Nem sempre os pares românticos viveram cenas quentes. Em nossa primeira trama, exibida pela Tupi em 1951, o próprio diretor Walter Foster contracenava com a atriz Vida Alves – no máximo, deram um rápido selinho. Rosamaria Murtinho e Hélio Souto, por outro lado, precisaram exagerar em 1964, ainda tempos de novela ao vivo. No capítulo final de A Moça que Veio de Longe, da Excelsior, a orquestra daria a deixa para os bailarinos entrarem na hora que seus lábios se encostassem. Só que a orquestra falhou e os atores tiveram que prolongar o beijo por mais de um minuto.
Raquel Eva Wilma e Glória Pires
Odete Roitman (Beatriz Segall) e Maria de Fátima (Glória Pires)
Mulheres de Areia Tupi, 1973, e Globo, 1993
Vale Tudo Globo, 1988
Perpétua Joana Fomm
Filomena Ferreto Aracy Balabanian
Tieta Globo, 1989
A Próxima Vítima Globo, 1995
Nelson Rodrigues recorreu a José de Alencar para evitar censura
Nazaré Tedesco Renata Sorrah
o prot Em Os Estr que o agonista er anhos, an Re da Ex i do Futebo ada menos c e vivia u lsior, em l. Na tram a 1969 me em co scritor que , Pelé ntato entrav com E a Ts.
A censura do governo militar (1964-1985) proibiu duas novelas, já produzidas até o 30° capítulo, de irem ao ar: Roque Santeiro, por “ofensa à moral, à ordem pública e aos bons costumes, bem como achincalhe à Igreja”, e Despedida de Casado, por tratar de “tema impróprio”. Muitas outras tiveram detalhes vetados. Como as palavras “ceroula”, “parir”, “prenhe”, “homossexual” ou o nome de Juscelino Kubitschek. Uma personagem foi proibida de tomar anticoncepcional e outra, de ser mãe antes de casar. Nelson Rodrigues conseguiu evitar a tesoura. Disse logo que a sua Sonho de Amor (TV Rio, 1964) era uma adaptação de José de Alencar, apesar de ter usado apenas os nomes dos personagens do romance original, O Tronco do Ipê.
“Tô certo ou tô errado?” Sinhozinho Malta
Lima Duarte – Roque Santeiro, Globo, 1985
“Meninos, eu vi!” Juca Pirama
Luiz Gustavo – O Salvador da Pátria, Globo, 1989
“Vamos deixar de lado os entretanto e partir pros finalmente” Odorico Paraguaçu Paulo Gracindo – O Bem Amado, Globo, 1973
“Oh xente, mai gódi!” Altiva
Eva Wilma – A Indomada, Globo, 1997
“Felomenal!” Giovanni Improta
José Wilker – Senhora do Destino, 2004
“Sou chique, bem!” Márcia
Drica Morais – Chocolate com Pimenta, Globo, 2001
Em junho d de Irmão e 1970, o desfech audiência s Coragem teve m o d a Mundo, r o que a final da C is opa do ealizada n o dia ante olha que rior. o Br vitória de asil levou a taça c E om 4 a 1 sobr e a Itália.. .
Desfecho de O Astro era mistério até para o presidente Muito antes de Odete Roitman fazer parte do inconsciente brasileiro, o País descabelou-se para saber quem matou Salomão Hayala, em O Astro, de Janete Clair (Globo, 1977). Quando Daniel Filho, que fazia parte da trama, compareceu a um compromisso em Brasília, o presidente Geisel não perdeu a oportunidade. Quis saber quem, afinal, era o assassino. Mas o ator não se rendeu e ainda tirou uma casquinha: “Isso é segredo de Estado, e disso sei que vocês entendem”.
“Cada mergulho é um flash!” Odete Mara Manzan – O Clone, 2001
Imagens Acervo Pró-TV e Divulgação TV Globo
SAIBA MAIS Almanaque da Telenovela Brasileira, de Nilson Xavier (Panda Books, 2009).
Senhora do Destino Globo, 2004
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O Calculista das Arábias
ligue os pontos
Nossa homenagem a Júlio César de Mello e Souza, o Malba Tahan
a Um dos precursores do cinema marginal, feito
com poucos recursos, hoje é considerado cult. À Meia-Noite Levarei Sua Alma é seu filme mais famoso.
1
b “Uma câmera na mão, uma ideia na cabeça” era
acervo da família
o lema do movimento capitaneado por este baiano. Indicado ao Oscar, não quis concorrer ao prêmio.
2
c O paulistano de nome Amácio era
constantemente malhado pela simplicidade de seus filmes. Rebatia: “Não vou trair meu público para a crítica falar bem de mim”.
3
d Dirigiu clássicos do cinema nacional, como Rio 40º,
Memórias do Cárcere, além da obra-prima Vidas Secas. É o primeiro cineasta a integrar a ABL.
4
Um viajante ia de camelo pela estrada de Bagdá em direção a Samarra. A fim de preparar-se para o longo caminho que enfrentaria, perguntou a um beduíno que descansava numa pedra quanto tempo demoraria até seu destino. Por sorte, o homem tinha acabado de vir de lá e sabia lhe responder. O viajante, porém, precisaria desvendar o enigma com que o outro, fatigado do percurso, respondera-lhe: “Minha viagem de Samarra até aqui levou alguns dias. O sol ardeu forte, sem sombra alguma, por cinco vezes. Sempre pela manhã ou pela tarde, nunca o dia todo. Foram seis manhãs e três tardes com sombra”. Com poucos instantes de reflexão, o viajante já sabia o tempo de viagem que teria pela frente. Você também, caro leitor?
teste o nível de sua brasilidade
Palavras Cruzadas
De volta do exílio em 6/9/1979, Brizola é recebido no dia seguinte por três mil pessoas em: (a) São Borja (b) Porto Alegre (c) Niterói (d) Belo Horizonte Fundado em 1º/9/1910, o Corinthians quase foi batizado como: (a) Santos Dumont (b) Zona Leste F.C. (c) Todo Poderoso (d) Vicente Matheus Compositores de Sabiá, intensamente vaiada no 3º Festival Internacional da Canção, em 29/9/1968: (a) Vandré e Theo de Barros (b) Roberto e Erasmo Carlos (c) Chico e Tom (d) Dom e Ravel Nascido em 10/9/1930, Ferreira Gullar é autor de: (a) Resmungos (b) Memórias do Cárcere (c) Libertinagem (d) Quaderna Banda criada por Tim Maia, nascido em 28/9/1942: (a) Chocolate (b) The Sputinik (c) Tião e seus Blue Caps (d) Doidões da Tijuca Única brasileira a conquistar o título de miss universo, em 7/9/1930: (a) Martha Rocha (b) Yolanda Pereira (c) Virgínia Lane (d) Dercy Gonçalves
Respostas Paulo Betti
BRASILIÔMETRO 1c; 2a; 3a; 4c; 5a; 6b; 7b; 8d.
Fato que interrompeu a partida entre Brasil e Chile em 3/9/1989: (a) Discurso de Sarney (b) Invasão do Beijoqueiro (c) Queda de alambrado (d) Disparo de foguete
SE LIGA NA HISTÓRIA 1b (Glauber Rocha); 2d (Nelson Pereira dos Santos); 3a (José Mojica Marins); 4c (Mazzaropi).
valiação
O QUE É O QUE É? Tirar extrato. ENIGMA FIGURADO Cid Moreira. CARTA ENIGMÁTICA “Filho de palhaço, começou a trabalhar com 13 anos. Com 19, já como radioator, deu início a sua carreira de comediante.”(Costinha)
DE QUEM SÃO ESTES OLHOS?
Paulo de Tarso/ Divulgação
O CALCULISTA DAS ARÁBIAS Será uma semana de viagem. Basta um raciocínio simples para descobrir. São 9 metades de dia com sombra e 5 metades de dia sem sombra. Na soma, 14 metades de dias, ou seja, 7 dias inteiros.
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Restaurante inaugurado por Cartola em 5/9/1963: (a) Mangueira (b) O Mundo é um Moinho (c) Zicartola (d) Verde e Rosa
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Conte um ponto por resposta certa
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Imigrantes criaram um país multicolorido V um dos países mais miscigenados do ocê já deve ter ouvido que o Brasil é
outros cantos mudou a cara e os sobrenomes da Nação. Engajados, eles promoveram as primeiras greves por condições dignas de trabalho. Trouxeram novos pratos para incrementar a culinária brasileira. Mudaram os costumes de regiões inteiras. Calcula-se que haja 25 milhões de descendentes de italianos no Brasil, o maior número fora da Itália. Há também milhões de espanhóis, alemães, japoneses. Além de muitos outros povos: poloneses, gregos, coreanos... Ah, e apostamos que você não sabia dessa: somos o segundo país com mais descendentes de africanos do mundo. Só na Nigéria há mais negros.
mundo. De fato. Nesta terra há gente de todas as origens. Mas nem sempre foi assim. Até o início do século 19, éramos basicamente três povos: descendentes de portugueses, de africanos e indígenas. Só em 1818 começaram a chegar europeus de outras partes. O fim da escravidão, em 1888, foi o grande propulsor para a vinda de milhões de imigrantes. De início, italianos e alemães. Um péssimo negócio para os negros. Se até então eram escravos, passaram a ser homens livres, porém desempregados, jogados ao deus-dará. A partir de então, a vinda de milhões de imigrantes da Europa e de
JÁ PENSOU NISSO?
¡Hola!
-Líng va
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pa r er
O que o tomate da macarronada foi fazer no banco?
SoluçÃO na p. 22
É tradição na casa de descendentes de italianos uma bela macarronada aos domingos. Mas e se todos os 25 milhões de ítalo-brasileiros resolvessem se esbaldar com a iguaria no mesmo dia? Se cada um comesse um prato de 100 gramas, seriam necessários 10 milhões de pacotes de 500 gramas para alimentar toda essa gente. É muita coisa! Se juntássemos a extremidade de uma embalagem com a outra, daria para percorrer a distância entre São Paulo e Brasília. Mamma mia!
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A imigração ao Brasil é um fenômeno que continua a acontecer. Se antes o maior número era de europeus e asiáticos, agora há um grande contingente de bolivianos que vêm ao País em busca de uma vida mais digna. O destino principal é São Paulo. Estima-se que 200 mil bolivianos vivam na cidade. Assim como os imigrantes do passado, eles também sofrem com o preconceito. Mas mantêm suas tradições, o idioma e o orgulho de um povo milenar. Entre no site do Almanaque para ler uma matéria sobre a Praça Kantuta, um pedacinho da Bolívia em plena pauliceia.
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Se é sina dos chinas sair lá da China, até em cima sairão negócios da China. w w w. Lu c i a n oTa s s o. b lo g s p ot.co m
Cada número no diagrama abaixo corresponde a uma página do Almanaque. Descubra a letrinha colorida na página indicada e vá preenchendo os quadrinhos até completar a mensagem cifrada que escrevemos para você.
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BIXIGA
A Itália ao alcance dos pés Bixiga, um dos primeiros bairros de São Paulo, mesmo cortado em postas pelas avenidas radiais, mantém sua forte identidade, refletida na festa da padroeira Achiropita, nos personagens marcantes e nas cantinas.
P 24
Basta uma breve caminhada para adentrar no estilo ítalo-brasileiro de viver a vida. Ecco il Bixiga!
ostes pintados nas cores da bandeira italiana – verde, branco e vermelho – demarcam a Treze de Maio, mítica rua desse bairro de imigrantes vindos em sua maioria da Calábria. No Bixiga carece andar a pé meio sem roteiro, acompanhado pelo doce som de um realejo e parando para papear com os moradores, capice? Pra começar, é Bexiga ou Bixiga? Nem “be”, nem “bi”. Desde 1910 o nome do bairro é Bela Vista. A culpa do apelido foi de um bixiguento português. Sobrevivente da epidemia de varíola que empestou a região em 1793, Antonio Manoel de Abreu ficou conhecido como Bixiga. E acabou nomeando a área que ia do córrego do Anhangabaú ao riacho Saracura.
Podia prestar viver num bairro com um brutto nome di malatia, nome feio de doença?, perguntava a italianada. Tá certo que o lugar era desconchavado, mas a vista era formosa e alcançava até a Serra da Cantareira. Conseguiram por decreto um novo batismo, Bela Vista. Mas nunca pegou.
Na ponta do guarda-chuva Os primeiros imigrantes italianos chegaram no final do século 19. Os que tinham quattro soldi, um punhadinho de grana, abriram armazéns de secos e molhados. De início, três ou quatro numerosas famílias alugavam uma casa com vários cômodos, o que deu
Podia prestar viver num bairro com um
brutto nome di malatia?
O jeito foi criar um novo nome por decreto: Bela Vista.
Nunca pegou.
Não deixe de conhecer...
...Walter Taverna. Puxe prosa com esse neto de sicilianos, ex-barbeiro – di qualità, di qualità. Invencioneiro, ele realiza anualmente os eventos O Maior Bolo do Mundo, em homenagem à cidade de São Paulo, o Superpão, o maior sanduíche de mortadela de que se tem notícia, e os Varais do Bixiga, de doação de roupas. Fundou ainda a Sociedade de Defesa das Tradições e Progresso da Bela Vista e o Centro da Memória do Bixiga, com acervo de mais de cinco mil fotos e reportagens sobre o bairro. Como encontrá-lo? Ao ouvir os acordes de Funiculí, Funiculá, vindos de uma cantina na Treze de Maio, ele estará ali a postos, batendo tampas de caçarolas.
origem aos cortiços com tanques e varais comunitários. Quando começaram a construir suas próprias moradias, encarregavam os capomastri, pedreiros calabreses autopromovidos a mestre de obras, que arquitetavam o projeto da casa “riscando o desenho na própria terra com a ponta do guarda-chuva”, relata João Sacchetto em Bixiga: Pingos nos is (Sodepro, 2001). Essa simplicidade autêntica encantava o compositor Adoniram Barbosa. Filho de imigrantes vênetos, não era bixiguês nascido, mas vivia por lá, onde tinha muitos amigos, como Walter Taverna e o Ernesto – aquele do Samba do Arnesto. Depois que Adoniran morreu, Walter pensou em homenagear o poeta com um busto de bronze. Dias depois da inauguração, a “estáuta” foi roubada. Walter relembra: “Tanto fiz, tanto não fiz que encontrei o Adoniram em um ferro-velho lá no Brás. Armei tal bafafá, ameaçando chamar a polícia, que o sucateiro, com paúra, implorou: “Tira esse cara daqui, num quero nem de graça”. Um verdadeiro imbróglio. No bairro nasceram também músicos como Antônio Rago, Agostinho dos Santos e Alfredo Le Pêra – parceiro de Gardel em canções como Mi Buenos Aires Querido e El Dia que me Quieras.
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Amore mio O Bixiga foi também berço do teatro brasileiro, como o TBC – Teatro Brasileiro de Comédia –, referência para a dramaturgia nacional. Em seu palco atuaram Cacilda Becker, Ziembinski e Paulo Autran, para citar apenas alguns. O antigo Paramount é hoje o Teatro Abril, com sua bela fachada e saguão em estilo art nouveau. Na sequência estrearam o Arena, o Oficina, o Ruth Escobar – a ponto de a atriz Maria Della Costa definir o Bixiga como a Broadway paulistana. Dos palcos para as cantinas, onde triunfam as massas, pasta fatta a mano e de grano duro, sempre al dente, cujo segredo, dizem, é o molho ragú, de tomate e manjericão. Quer saber la verità? A comida da mamma é ótima, mas é indispensável que seja guarnecida pelo prazer de conviver. Essa é a magia. “Chi mangia da solo si strozza” – quem come sozinho engasga, diz o provérbio. A comilança no Bixiga se estende até a Igreja, dedicada a Nossa Senhora Achiropita. Todos os fins de semana de agosto são dedicados a ela, com orações, bênçãos, novenas, missas e procissões pelas ruas do bairro. Nelas se espraiam mais de 30 barraquinhas, como uma verdadeira peregrinação do garfo. Só de fogazze são mais de 14 mil por noite de festa. Isso sem contar polentas, antepastos, pizzas, macarrão e doces típicos. Por toda essa rica e única misturança que apaixona, quem melhor define o bairro é o Taverna, um de seus mais queridos moradores: Bixiga, amore mio!
Preste atenção
Repare nos Arcos do Bixiga. No fim do século 19, os capomastri ergueram, com tijolos que eles mesmos fabricaram, os muros de arrimo da rua Assembleia com a rua Jandira. No decorrer dos anos, construíram-se sobre eles casas, que se transformaram em cortiços. A criação de alças viárias para a avenida 23 de Maio, em 1984, e a consequente demolição do casario, fez ressurgir os arcos.
O Bixiga tem mais
Casa de Dona Yayá Copas de gigantescas e centenárias árvores, como jatobás e mangueiras, envolvem a bela casa da rua Major Diogo, 353, que serviu de hospício particular para Sebastiana de Mello Freire, a Dona Yayá. Hoje é o Centro de Preservação Cultural da USP, criado para receber exposições de fotografias, palestras, cursos e peças teatrais.
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Feirinha do Bixiga Nas alamedas da Praça Dom Orione, ao redor do coreto, todos os domingos cerca de 350 expositores mostram suas preciosidades, que vão de antigas revistas, porcelanas, lustres e cristais a quadros e objetos de decoração art nouveau.
Vai-Vai A escola de samba criada em 1930, tantas vezes campeã do Carnaval paulista e “orgulho da Saracura”, tem sede na rua São Vicente, onde a partir de setembro acontecem os ensaios. Seus foliões convidam: “Quem nunca viu o samba amanhecer, vá no Bixiga pra ver”.
s e rviç o
Onde ficar
Novotel Jaraguá Localizado na região mais charmosa do centro de São Paulo, fica próximo à avenida São Luís, à biblioteca Mário de Andrade e à praça Dom José Gaspar. Fone: (11) 2802-7000.
Quality Suíte Bela Cintra Também na região central, mas mais próximo dos Jardins e de Higienópolis, é uma opção para quem quer estar junto da avenida Paulista. Fone: (11) 2244-9000.
Onde comer
Cantina e Trattoria Conchetta Ambiente festivo, paredes decoradas com fotos antigas e reportagens sobre o bairro. Oferece a tradicional comida italiana, farta e saborosa, acompanhada pela voz de Diego Dalmatto. Rua Treze de Maio, 560. Fone: (11) 3288-7869.
Cantina Roperto Uma das mais antigas do bairro, oferece, além das tradicionais massas, a saborosa perna de cabrito assada. Rua Treze de Maio, 634. Fone: (11) 3288-2573.
Vatapá
O Brasil comestível A iguaria criada pelos povos essenciais do País tornou-se – com toda a justiça – um dos símbolos da culinária brasileira. Mas é também curiosamente polêmica: fez um gênio mundial queimar a língua e metia medo até em valentes cangaceiros.
E
Fabio Castelo
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m nosso cardápio cabe de tudo, numa mistura espetacular capaz de unir num mesmo prato receitas dos quatro cantos do mundo. O que dizer do vatapá, criado a partir de receitas africanas, com pitadas europeias e toques indígenas? Para o poeta Gregório de Matos, o vatapá é o próprio Brasil em forma de comida. O prato foi criado a partir de receitas africanas – muambo de galinha e quitande de peixe – com ingredientes cultivados por indígenas e outros trazidos pelos europeus. Mereceu até receita-canção de Dorival Caymmi: Quem quiser vatapá, ô / Que procure fazer / Primeiro o fubá / Depois o dendê / Procure uma nêga baiana, ô / Que saiba mexer… E trata de completar a lista de ingredientes: castanha de caju, amendoim, camarão, coco. Pra temperar, gengibre, cebola. E pimenta. Mas nem todos se admiravam com a igua-
ria. Por superstição, Lampião não comia vatapá. E ninguém do bando podia comer – ordem de Virgulino. Cuidado: pimenta “Einstein comeu, hontem, vatapá com pimenta.” A manchete é de O Jornal de 12 de maio de 1925. Albert Einstein estava no Brasil, em meio a maratonas sem fim de homenagens, passeios e conferências – que ele achava um tanto chatas, diga-se de passagem. Num almoço, resolveram oferecer vatapá ao alemão. Com um aviso: “Cuidado com a pimenta”. Einstein, porém, não mediu a mão com o tempero. Queimou a língua e começou a suar. Educado, disse que apreciou o quitute, enquanto comia salada de folhas para aliviar o calor. Anotou em seu diário de viagem: “Visita ao manicômio, cujo diretor é mulato e uma pessoa especialmente virtuosa. Com ele, almoço brasileiro com muita pimenta”.
Como fazer Ingredientes 2 pães franceses amanhecidos Leite para umedecer os pães 1 vidro de leite de coco 50g de castanha-de-caju moída 100g de camarão seco 1 2 cebola 200g de camarão sete barbas sem casca Coentro Azeite de dendê
Modo de Preparo Leve o camarão ao forno até secar bem, para ser descascado. Descasque-os um a um. Volte as cascas e cabeças (sem os olhos) ao forno e torre-as, um pouquinho mais, passando-as no liquidificador até que se transformem em pó. Reserve. Demolhe os pãezinhos com leite para amaciarem. Bata os pãezinhos com o leite e mais um vidro de leite de coco no liquidificador. Coloque numa panela. No liquidificador, bata a
cebola e o coentro. Leve a panela ao fogo, mexendo sempre e acrescente os temperos batidos, metade do pó de camarão, a castanha moída e os camarões inteiros sem casca. Mexa uns 10 minutos até que os temperos estejam cozidos. Junte, então, o dendê (umas 2 ou 3 colheres) e mexa por mais três minutos. Está pronto.
Fonte da receita: CyberCook
por Lourenço Diaféria
Três vira e seis acaba
T
enho quase certeza de que a primeira lição de ética prática que tive na vida foi aprendida nas peladas de rua. Percebi isso anos e anos depois; antes a palavra ética soava estranho, constava no dicionário do Laudelino Freire como ethica, sem acento, e significava o conjunto de princípios morais pelos quais o indivíduo deve orientar o seu procedimento na atividade que exerce. Os leitores talvez não saibam o que era uma pelada de rua e possam confundi-la com o modismo, hoje em vias de globalização, de fazer protestos públicos baixando as calças e mostrando as nádegas. Em geral, nádega é menos usada na grande imprensa do que bunda. Mas são sinônimas. Pelada de rua é outra coisa. A pelada de rua – inventada no Brasil em julho de 1894, pleno inverno, numa tarde de sol, mais ou menos na época em que Charles William Miller, um paulistano que nasceu na rua Monsenhor Andrade, no Brás, trouxe na bagagem as duas primeiras bolas de capotão que introduzia o então alcunhado esporte bretão no Parque Dom Pedro II, em São Paulo –, a pelada enfrentou o mais que pôde as vias carroçáveis das cidades. A praça era do povo e o céu era do condor, garantiu Castro Alves. As ruas, por sua vez, eram da molecada. Tudo poesia. Ninguém ainda havia tido a boa idéia de inventar a televisão sem cabo, o fliperama, o provão, o skate, as academias de malhação e outros equipamentos modernos. O que levava a juventude a virar-se para cultivar a mente sã num corpo são. Ainda bem que não faltavam laranjas. A laranja, fruta cítrica, normalmente era chupada. Mas seu formato esférico, sua superfície lisa, a ausência de caroço volumoso, indicava-a como o objeto lúdico natural mais indicado para a única prática de lazer em que os pés substituem com vantagem as mãos. Nascia a bola alternativa, nas duas marcas tradicionais: a bola-pera e a bola-bahia. Embora estes dados todos não figurem com precisão nos manuais de história e nas atas esportivas, acredita-se hoje que o termo pelada se originou da circunstância de que, naquela era da civilização, nem todos os guris dispunham de condições financeiras para adquirir uniforme completo para aderir à brincadeira (fazer bola de laranja era considerada
brincadeira de moleque). Os participantes passaram, então, a organizar-se em dois grupos: com camisa e sem camisa. Começava aí a delinear-se a futura discriminação entre times grandes e pequenos, logo atenuada pela chegada do verão, quando todos preferiam jogar sem camisa. A pelada democratizou-se. Atenuaram-se os desníveis sociais. Ao mesmo tempo, o que nascera como mero divertimento passou a ser considerado peleja. O terreno do jogo passou a chamar-se campo de batalha. A terra batida inicial evoluiu para paralelepípedos. Deste, para o asfalto. Substituíram-se as traves improvisadas com bambus por montículos, também improvisados, com peças de roupas e pedaços de pedra. Os pivetes, nome pelo qual passaram aos poucos a ser conhecidos os moleques de rua, combinaram estabelecer a regulamentação teórica do espaço mítico do gol. Não havia árbitros, nem trenas, nem metros de madeira para definir a grande área, a marca de pênalti, a meia-lua, a bandeirinha de escanteio e a bola-fora. As regras não escritas da pelada dependiam do consenso dos jogadores, da palavra oral, da honra individual forjada no caráter e na hombridade pessoal de cada um. Inventava-se a ética do pé no chão. Com acento, como palavra trissílaba. Mas a pelada continuava ágrafa. A laranja tinha o inconveniente de murchar em geral na metade do jogo, o que deu lugar à técnica da bola-de-meia, depois à bolade-borracha e ainda depois à bola-de-quebrar-vidraça. Mas a pelada impunha-se como lídima conquista popular da garotada. Foi então que surgiram forças reacionárias e retrógradas que passaram a acusá-la de fomentar más companhias e ajuntamentos suspeitos de moleques de rua. A polícia foi chamada por vezes a intervir para manter a ordem pública. Por fim, a pelada sucumbiu ao perder melancólica e definitivamente a inocência de sua simplicidade. Numa incerta tarde plúmbea e úmida de chuvisco, Tonhão, o goleiro, apareceu na rua calçando chuteiras de bico duro e protegido por joelheiras. Depois disso aconteceu o resto que todo o mundo sabe. Assim, esgarçou-se a alegria juvenil em que ética era estabelecer previamente e respeitar o resultado de três vira e seis acaba, sem necessidade de haver o homem do placar.
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ALHO Allium sativum L.
Pequeno porém grande É um dos vegetais mais usados para fins culinários, medicinais e místicos. O prato mais modesto, acrescido de alho, vira acepipe. São incontáveis os males que ele previne ou cura. E há milênios a humanidade o tem como protetor contra perigos invisíveis.
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o pesquisar para este trabalho, descobrimos, surpresos, que a primeira greve de que se tem notícia deu-se há mais de cinco mil anos. Mais surpresos ainda ficamos ao saber que o causador foi o alho. Ele fazia parte da ração dos trabalhadores livres e escravos que erguiam as pirâmides. Sobrevindo uma escassez que resultou no corte da provisão, cruzaram os braços. Exigiam a volta do alimento que, acreditavam, aumentava o vigor e os protegia contra doenças – tal como a cebola. Estavam certos os grevistas, como a ciência comprovaria. Bem antes das pirâmides, babilônios já prezavam esse bulbo originário da Ásia. Eles, como outros povos antigos – indianos, gregos, hebreus, russos, chineses –, consideravam o alho tão valioso quanto o sal. O princípio ativo é a alicina, um de seus componentes à base de enxofre, benéfico para a saúde, responsável pelo odor característico. Alho vai bem em todo tipo de prato. Uns dentes refogados ou fritos dão vida à mais simples das sopas. Uma carne, marinada em vinha-d’alhos desde a véspera, e assada, é banquete para chefe de estado receber chefe de estado. Mas, quer apenas um lanche? Rale, misture com manteiga ou azeite de oliva e passe no pão. E por ativar a secreção gástrica e a movimentação das paredes do estômago durante a refeição, não só serve como
aperitivo, quanto como digestivo. Quem come alho habitualmente previne uma série de males: hipertensão, arteriosclerose, infecções, tumores. É bactericida, vermífugo, antiviral, antisséptico, anti-inflamatório, antitérmico, anticancerígeno. Descongestiona as vias respiratórias, limpa os pulmões. Também aumenta a resistência do organismo ao frio e ao calor. Por ser antioxidante, fortalece a imunidade e nos traz longevidade. Por conter enxofre, desintoxica o sangue e reduz riscos de infarto e de derrame. “Estimulando o coração e depurando o sangue, facilita a circulação e faz baixar a tensão”, afirma o naturopata francês Raymond Dextreit. De sua excelência como tempero, Câmara Cascudo passa atestado citando o autor espanhol Julio Camba, que traduzimos: “Se nossas cozinheiras são tão aficionadas ao alho, não é porque este condimento lhes sirva para fazer uma boa comida, mas, ao contrário, porque lhes serve para não ter que fazê-la.”
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Como repelir pretendente, ou não
Com ele ninguém pode
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muleto natural, diz Cascudo. Afasta mau-olhado, perigo oculto, feitiçaria. Espanta lobisomem, vampiro, mula sem cabeça. O pai do coautor, Bernardo Severiano, usou até a mocidade patuá com alho pendurado no pescoço para “fechar o corpo”. Em várias culturas, uma réstia na porta protege a casa; para marinheiros gregos, pendurada no mastro, é mascote contra tempestades. Nada como uma expressão proverbial para traduzir a sabedoria do povo. Em Portugal, para se referir a alguém muito esperto, dizem: é vivo como alho!
Com alho e pão vive o homem são (ditado português)
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lho é tudo de bom, só não serve para uma coisa: perfumar o hálito. A propósito disso, Jorge Guinle, o milionário playboy brasileiro que viveu em Hollywood entre 1940 e 1950 e namorou inúmeras atrizes, conta no livro de memórias Um Século de Boa Vida saborosa historinha. A temperamental e cultuada Bette Davis comia alho cru antes de filmar cenas de beijo com Errol Flynn, já famoso pelo papel de Robin Hood. Fazia isso pra baixar a crista do presunçoso galã. Se ela gostasse de Errol tanto quanto de alho, poderia usar um dos truques para tirar o hálito que ele deixa: mastigar ramos de salsa, ou grão de café, ou um cravo-da-índia. O cravo é o nosso preferido, pois além de neutralizar o odor indesejável, você exala um hálito agradável (tire a cabecinha do cravo para a língua não arder). Caso Bette se apaixonasse a ponto de cozinhar para Errol, tiraria o cheiro também das mãos: esfregaria nelas pó de café ou suco de limão, depois de preparar-lhe uma entradinha de pão com alho – antes do prato principal.
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ores reumáticas, artríticas e da coluna melhoram com a fricção de uns dentes de alho esmagados com óleo canforado. Ele é rico em selênio, que contribui para varrer radicais livres e elevar a capacidade antioxidante do organismo. Ajude a espantar gripe, bronquite, esgotamento, insônia, herpes, ácido úrico, cálculo renal, câncer, colesterol. Como? Por exemplo, pondo toda noite um dente de alho num copo com água e bebendo-a de manhã em jejum: faz bem a todo o organismo.
SAIBA MAIS As Hortaliças na Medicina Doméstica, de Alfons Balbach (Edificação do Lar, 1976). História da Alimentação no Brasil, de Luis da Câmara Cascudo (Global, 2004). A Argila que Cura – Uma via da medicina natural, de Raymond Dextreit (Itau, 1979).
Consultoria: Nutricionista Aishá Zanella (aishazanella@hotmail.com)
Na varanda – Amor, você acha que meus lábios são desejáveis como fruto maduro? – Claro, querida. – E meus cabelos, de seda? – Sim, meu bem. – Minha pele, de pêssego? – É obvio, amor. – Ai, adoro quando você fala essas coisas maravilhosas de mim.
Mulheres falam mais
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Num congresso, estudiosos discutem uma pesquisa que mostra: homens usam em média 1.500 palavras por dia; e mulheres, no mínimo 3.000. Uma participante se levanta: – É lógico que nós, mulheres, precisamos falar o dobro. Temos sempre de repetir tudo o que dizemos para que os homens consigam entender! E o presidente da mesa: – Como assim?
Vendo pra crer A noiva queixa-se com a mãe sobre a incredulidade do futuro marido: – Mamãe, o Rogério diz que não acredita em inferno. – Case com ele, filha, e deixe comigo, que eu o farei acreditar!
Má sinalização O caipira seguia pela estrada quando viu uma placa: Devagar, quebra molas. O capiau acelerou o carrinho velho o máximo que pôde. Quando passou pelo obstáculo, sentiu que todas as molas do carro tinham se espatifado. Inconformado, deu meia volta, pegou uma caneta e completou a mensagem da placa: Rápido também.
O bêbado e o padre Um bêbado, tropeçando, entra na igreja durante a missa. O padre está no altar falando aos fiéis, que estão de pé: – O álcool é a desgraça do homem. Todos os que quiserem ficar livres da bebida, sentem-se agora. Todos os fiéis se sentam. O bêbado, lá da porta, grita para o religioso: – Só sobrou nós dois mesmo, né, seu padre?
Problema em excesso Bola fora! ANFITRIÃO – Bem-vindo à minha festa. Aquela mulher que está cantando ao lado do pianista é minha mulher! CONVIDADO – Como? Fala mais alto que tem uma gralha cantando!
– Que cara é essa, rapaz? – O marido duma dona com quem eu ando saindo descobriu tudo e me escreveu uma carta, diz que me mata se eu aparecer na casa deles de novo. – Mas que bobagem, esquece essa, você anda com pelo menos uma dúzia de mulheres casadas. – O problema é esse. O sujeito não assinou a carta.
Escola de gago O rapaz gago aborda uma senhora na rua: – A se... a se... a senhora sasabe on... onde... fifica a escocola de ga... ga... gago? − Mas pra quê? O senhor já gagueja tão bem!
Nome de japonês Um japonês que mora no Brasil vai batizar o filho. Não sabe qual nome escolher. Um escrivão ajuda: – Sugiro Antônio. O japonês, todo feliz: – Antônio non gosta muito, mas Sujiro é booommmm.
Terceira Guerra Mundial Os líderes dos Estados Unidos e da Grã Bretanha estão num jantar. Um dos convidados aproxima-se: – De que é que estão conversando de forma tão animada? – Estamos fazendo planos para a terceira Guerra Mundial – responde o líder britânico. – Sério? E quais são esses planos? – Pretendemos matar 14 milhões de argentinos e um dentista – explica o norte-americano. – Um dentista? Mas por que diabos vocês vão matar um dentista? O americano dá um tapinha nas costas do britânico e exclama: – Não te disse? Ninguém vai perguntar pelos argentinos!
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Conversa dos bichos
O
Zequinha, menino de uns 10 anos de idade, era na fazenda do meu padrinho o que se pode chamar de “charrete boy” – o menino que com a charrete do fazendeiro vai buscar as coisas ou as pessoas na cidade. Pois naquele dia o Zequinha tinha ido buscar na cidade o padre Antônio, que era iniciante e tinha uma particularidade que só se descobriu depois: era ventríloquo. Logo de saída, o padre pergunta se era longe a tal fazenda, ao que o menino responde que levaria uns pares de horas. Padre – Ô, menino! Você sabia que os animais conversam com a gente? Você quer ver os animais conversando comigo? Zequinha – Ara, sêo padre. Essa eu tô pagando pra vê. O sinhô me adiscurpa, mas num querdito. Padre (falando para a égua) – Dona eguinha! Está muito pesada a charrete? (E faz a
voz da égua sem abrir a boca) – Tááá... sêo padre. Zequinha (gaguejando) – Sêo... padre... A égua falô... Eu escuitei... Padre – Todos os animais conversam com a gente... E assim o padre Antônio foi se divertindo com a surpresa encantada daquele caboclinho. A viagem, que poderia ser longa, terminou logo, logo. Ao se aproximar da fazenda, eis que se deparam com várias cabras, bodes e cabritas que pastavam na grama verdinha. O menino estanca com as rédeas a eguinha, olha para o pároco e, apontando para uma das cabritinhas, diz: Zequinha – Óia, sêo padre! O sinhô tá vendo aquela cabrita branca ali na grama? Num querdite em nada que ela falá pro sinhô, viu?!
Não há luz sem escuridão Por Amauri Pontes
E 34
u levava uma vida normal na
minha mãe, dos meus dois irmãos
minha cidade, Palmital, no
e da minha então namorada, com
interior de São Paulo. Até que, em
quem hoje estou casado. No hospital
2008, comecei a sentir dores estra-
também fiz grandes amigos. Mas é
nhas no joelho direito. Bastava jogar
claro que preferia tê-los conhecido
bola ou correr que as dores apare-
em outro lugar...
ciam. Comecei a trabalhar como
O tratamento acabou em maio de
operador de trator numa empresa. E,
2009, e mesmo com algumas limi-
com apenas três semanas de traba-
tações, agradeço a Deus por perma-
lho, ao descer do trator, escorreguei
necer com a minha perna. É emocio-
e torci a perna. A dor foi muito forte.
nante como minha família se uniu
Depois de indas e vindas em hospitais
ainda mais pelo tratamento. Tenho
públicos e consultórios particulares,
certeza, ao olhar para os olhos da mi-
veio a dura notícia: eu estava com câncer.
nha mãe, que ela preferia ter passado por isso no meu lugar. Mas
Indicaram-me ir à Associação do Câncer de Palmital. Lá, fui re-
ela foi forte para não me deixar mais tenso.
cebido pela Regina Menocci, que se prontificou a me encaminhar
Também não esqueço quando minha irmã me viu pela primeira
para Jaú, para me tratar no Hospital Amaral Carvalho. Logo co-
vez sem cabelo. Emocionada e abalada, começou a chorar. Disse a
meçaram as primeiras sessões de quimioterapia. Foram seis du-
ela: “É bobagem chorar. Cabelo cresce de novo. Você que chora por
ras sessões até a cirurgia. A operação – que trazia riscos – durou
mim, chore de felicidade por eu estar bem”. Mas também rolaram
cinco horas, e correu tudo bem. Apenas um mês depois eu já dava
lances preconceituosos. Uma pessoa, por exemplo, disse que tinha
os meus primeiros passos com auxílo de bengala.
vontade de me visitar, mas tinha medo de ser contagiado pela doen-
As sessões de quimioterapia, porém, não cessaram. Ainda seriam
ça. Como há pessoas ainda que acham que câncer é contagioso?
12 dali para frente. Eu saía da minha cidade às duas da manhã
Mas eu também soube encarar o tratamento de forma leve. Não
para chegar às 5h em Jaú, duas vezes por semana. A ajuda do pes-
que não estivesse preocupado, mas nunca fiquei triste. Soube le-
soal da Associação de Câncer de Palmital foi incrível. Eles estão
var para o tratamento o meu jeito bem-humorado de ver a vida. E
sempre dispostos a ajudar a todos que precisam. A Regina acom-
aprendi a perceber a beleza do que antes passava batido.
panhava de perto o transporte, ajudava nos remédios, na alimen-
Hoje toco e canto em um coral, tenho ainda mais amor pela mi-
tação e nos exames. Toda a semana me levava a uma feirinha para
nha mulher e pela minha família. Sempre ia me tratar, não com a
comprar frutas, legumes, leite e outros alimentos fundamentais
tristeza de passar por aqueles momentos delicados, mas pela ale-
para uma alimentação saudável. E todos os pacientes da associa-
gria da vontade de viver. Tudo isso me fez receber lições eternas.
ção recebiam o mesmo tratamento.
Não há alegria sem tristeza. Não há batalha ganha sem luta. Não
Para eu permanecer otimista, foram fundamentais a ajuda da
há luz sem escuridão.