OLD Nº 18

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Revista OLD Número 18 Fevereiro de 2013 Equipe Editorial Direção de Arte Texto e Entrevista

Capa Fotografias

Felipe Abreu e Paula Hayasaki Felipe Abreu Camila Martins, Felipe Abreu, Juliana Biscalquim, Luciana Dal Ri e Tito Ferradans David Ellersten David Ellersten, Felipe Vellasco, Lucas Barros e Tiago Calazans

Entrevista

Gui Mohallem

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Parceiros


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David Ellersten Portfolio

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Lucas Barros Portfolio

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Tiago Calazans Portfolio

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Felipe Vellasco Portfolio

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Fissuras Coluna

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Gui Mohallem Entrevista

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Ultrapassagem Coluna


Chegamos à segunda edição da OLD em 2013. Continuamos com nosso modelo, maior, mais robusto, com mais fotografias. Para alegrar mais ainda o mês do Carnaval trouxemos uma seleção completa e variada de trabalhos fotográficos. Começamos com o trabalho do sueco David Ellersten, que traz dois belíssimos e poderosos ensaios para as páginas da OLD. Continuamos as atividades com Lucas Barros e sua visão em preto e branco sobre o cotidiano de grandes cidades. Depois disso damos um breque nos portfolios e vamos para a entrevista da nossa edição de Fevereiro: Gui Mohallem. Um dos grandes destaques da nova geração de fotógrafos que começa a despontar no cenário brasileiro. Gui tem um trabalho muito próprio e nos conta um pouco sobre esse processo e sobre o pensamento por trás da sua produção visual. Nossos portfolios continuam com o ensaio

Sport, de Tiago Calazans. Uma visão que foge completamente do que costumamos ver em fotografia de esportes. Nosso quarto portfolio é de Felipe Vellasco, fotógrafo e diretor de cena, que apresenta um ensaio produzido na Turquia. Fotografias que fogem do óbvio turístico e buscam construir uma parcela do cotidiano turco. Nossos colunistas continuam com força total abordando tanto a criatividade quanto a técnica e inovação dentro da fotografia. Assim continua o trabalho da OLD, sempre buscando novos formatos e linguagens fotográficas para você. Aproveite!

Felipe Abreu


Elephant calf and two men/Tyne & Wear Archives & Museums


David Ellersten There Was Blood & The Harbour Intermission



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David, para começar, nos conte um pouco sobre sua história na fotografia. David Ellersten é um fotógrafo sueco recém-formado. Concentrado na fotografia documental, David apresenta na OLD dois ensaios muito fortes, de maneiras completamente diferentes. There Was Blood e The Harbour Intermission. O primeiro choca pela força crua das imagens. O segundo pela solidão e pela tristeza do espaço apresentado. Um ótimo trabalho, no início de uma carreira muito promissora.

Meu interesse pela fotografia começou OLD 08 quando eu tinha 14 anos. A fotografia me parecia um bom instrumento para expressar sentimentos. Eu já havia tentado o desenho e a escultura antes, mas me dei muito melhor com a fotografia. Nos anos seguintes comecei a me encantar pela fotografia documental e achei que o mundo parecia tão interessante pelos olhos de Robert Capa, Cartier-Bresson, Anders Petersen e tantos outros. Fiz graduação em mídia documental na Universidade de Skovde, aprendendo muito sobre a




história, as questões e os papéis dos fotógrafos e cineastas. Depois do primeiro ano percebi que deveria estudar só fotografia e me transferi para a Escola de Fotografia de Gothenburg. Lá conheci o fotógrafo e companheiro de classe Max Rantil, que como eu, se interessava muito pela fotografia documental. Nós costumávamos discutir problemas/soluções e compartilhávamos projetos. Neste mesmo momento comecei OLD uma empresa com meu irmão designer/ 11 tipógrafo. Nós nos concentrávamos em relacionar a fotografia com tipografia criando posters, capa de CD e afins. No último semestre da faculdade me mudei para Estocolmo para fazer um estágio com o fotógrafo Kristofer Samuelsson. Trabalhei com pesquisa, planejamento, assistência, edição e pós-produção, na maioria dos casos para revistas. Também fiz algumas reportagens e desenvolvi projetos autorais. Em setembro de 2012 voltei para Gothenburg

e estou buscando a publicação de meus trabalhos. Você está apresentando dois ensaios aqui na OLD: There Was Blood e The Harbour Intermission. Quais as histórias por trás de There Was Blood? Como surgiu o interesse em produzir esse trabalho? There was Blood foi feito durante meu estágio em Estocolmo em 2012. Começou como uma fascinação pelo universo da luta livre, eu já tinha visto imagens deste esporte antes e tinha me interessado por fotografar a estrutura do evento como um todo, chegar perto dos lutadores e, se possível, fazer imagens de bastidores. Entrei em contato com Christoffer Sahlgren, o dono da Shtlm Wrestling, e expliquei o que eu gostaria de fazer.


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Com isso comecei uma reportagem junto com a jornalista Kajsa Dragstedt focada OLD no lutador El Duardo, que ainda faria sua 13 primeira luta. Sua primeira luta seria no evento There Will Be Blood, que foi onde fotografei esta série. Além de seguir El Duardo no backstage gostaria de captar a estranha estrutura deste evento, me concentrando na violência surreal e na ambigüidade da platéia. Esse tipo de comportamento é um lado da Suécia que eu nunca tinha visto antes, era tudo tão não sueco [unswedish na resposta original em inglês]. Uma realidade fascinante e surreal.


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There Was Blood apresenta um mundo próprio, que parece ser bastante fechado. Como você se aproximou dessa cultura? Como foi o processo de produção dessas imagens? Realmente é um mundo bastante particular e o projeto começou justamente do interesse genuíno em fotografar o esporte de perto. Depois que eu conheci alguns dos lutadores eu me concentrei em Doden e Wrangel (dois dos lutadores que aparecem no ensaio) e ouvi que eles fariam uma luta, um contra o outro. Eles pareciam muito brutos e perfeitos para a minha ideia do que era a luta livre. Eles realmente eram personagens. Tudo aquilo começou a me lembrar do cinema, o que deixava tudo mais surreal.

Comecei a pensar também no contexto da violência como um esporte e de como ela foi vista, ao longo da história, como entretenimento. Mas isso não era violência, eram pessoas que haviam treinado e treinado para fazer parecer com violência. Esse conceito era muito interessante. Eu fiz questão de acompanhar a luta dos dois enquanto acompanhava também a rotina de El Duardo. Achei que seria um desafio interessante, o que realmente foi. Geralmente eu não corro ou tento chamar a atenção enquando estou fazendo uma reportagem, mas isso era diferente, eu me sentia atrapalhando em todo o lugar - acho até que cheguei a ficar na frente de uma das câmeras de vídeo pelo menos umas 10 vezes - era uma situação intensa, eu fiz questão de capturar as reações da platéia, que variavam sempre entre fascinação e disgosto.

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A fotografia congela, na maioria dos momentos, ações contínuas. No caso de There Was Blood isso altera a percepção da luta e poderia ter tirado a força das imagens, o que felizmente não acontece. Como foi retratar as lutas sem perder a intensidade do momento que você fotografava? Muitas vezes quando eu estou fotografando eu tento criar um certo tipo de imagem estática. Todas as imagens acabam sendo desta forma por conta do meio em que foram produzidas, a fotografia, mas nem todas tem essa intenção intrínseca. Você pode congelar uma ação ou somar uma ação, criando uma situação. Tudo depende da sua intenção. Em There Was Blood eu queria capturar o sentimento e a atmosfera da luta livre sueca.

Eu tentei adicionar a luta dentro de uma atmosfera de sentimentos, excitação, violência, medo, entretenimento. É impossível não congelar ações ao usar uma câmera fotográfica, mas eu escolhi momentos em que eu sentia que eram estáticos e de certa maneira icônicos para aquela cena. Quando eu comecei a fotografar este projeto eu tentei me manter calmo e concentrado na atmosfera que me rodeava, apesar de sempre me sentir como uma galinha em galinheiro pequeno demais.

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Você já nos contou um pouco da história de There Was Blood. Agora nos conte OLD 21 sobre The Harbour: Intermission. The Harbour: Intermission é meu trabalho de final de curso da faculdade de fotografia e era uma tema que eu já vinha desenvolvendo nos últimos dois anos, pois eu trabalhava em um lugar parecido na Noruega. No começo eu não tinha certeza sobre como abordaria o tema e nem que história eu queria contar. Sabia que o ambiente teria um papel importante nesta história, mas ainda não sabia como. Comecei a caminhar pela área

por onde os pescadores trabalhavam e percebi uma certa calma, com uma lembrança constante da presença humana, sem que houvesse uma presença visível de pessoas. A desolação e a solidão foram sentimentos fortes e tem grande participação nesta série. Para ter alguma interação com pessoas e fazer um contraponto para a vazies eu tive que chegar ao porto muito mais cedo do que antes. Sair da cama às 3 da manhã e ir para o porto me daria as imagens que precisava. Eu tentei chegar antes que os trabalhadores para que eu pudesse testemunhar a mudança naquele ambiente. Conversei muito com eles e depois de algumas visitas eles já pareciam estar mais confortáveis com a minha presença. Decidi me concentrar em alguns


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trabalhadores específicos para manter a sensação de solidão que eu havia sentido, cortando essas figuras na composição, os transformando em sombras, o que contemplava minha ideia deste lugar duro, escuro e frio. Esse processo durou cerca de 4 meses. The Harbour... relaciona muito bem a importância do espaço e das pessoas dentro do ensaio. Você acha que seria possível contar essa história sem a presença de um dos dois? Para você, é mais interessante contar histórias através das pessoas ou dos locais em que elas estão inseridas? Neste caso eu acredito que seria difícil contar a história sem um dos dois elementos presente nela. Os dois são elementos vitais para o projeto. As pessoas são muitas vezes necessárias em uma série de imagens para

que o observador possa sentir algum tipo de conexão. Eu acredito que é importante para o espectador ter alguma maneira de se relacionar com aquilo que vê ou sente. Para fazer um contraponto a este sentimento eu tinha os portos vazios, escuros e desolados. Para mim é mais importante contar histórias OLD através das pessoas, sem elas não há 26 história. Mas quando você conta a história destas pessoas, você precisa de um contexto. Eu tento usar o espaço como este contexto. Você pode usar o ambiente como forma de contar a história de uma pessoa. Neste ensaio o espaço é um lembrete de que pessoas utilizam estes espaços, mas que naquele momento não há ninguém na cena. Isso torna as imagens mais poderosas e os espectadores são forçados a imaginar as pessoas dentro daquele contexto.






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Você tem uma técnica de tratamento de cor bastante interessante, que tira um pouco da dureza das imagens e as deixa em um espaço diferente dentro da fotografia. Como você desenvolveu esse estilo? Ele acompanha toda a sua produção ou está presente somente nestes trabalhos? Eu semprei gostei de uma abordagem cinematográfica para a fotografia, criando uma atmosfera, tanto na locação quanto na pós-produção, seja em reportagens documentais ou em outros ramos da fotografia. Mas não acredito que seja um estilo que eu escolhi conscientemente, foi algo que foi crescendo dentro da minha produção, que se encaixava em meus

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projetos e nas histórias que eu queria contar, que muitas vezes tem temas sombrios, que se encaixam bem nessa abordagem visual. Na pós-produção eu tento expressar o sentimento que tive durante a produção da imagem. Se você observar outros trabalhos meus há um fio condutor bastante claro. Costumo usar uma luz dura, com uma escuridão rica, combinada com, quase que exclusivamente, luz natural.


Lucas Barros Portfolio



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Lucas Barros apresenta na OLD um portfolio urbano, em preto e branco, que traz um pouco do cotidiano das grandes cidades brasileiras. Para conhecer mais sobre seu trabalho e sua histórias, batemos um papo com ele. Todas as imagens do seu portfolio são flagrantes do cotidiano urbano. Como é seu ritmo de fotografia? Você busca essas imagens ou acaba esbarrando nelas? As duas coisas acontecem. A cidade é meu

ambiente, vivo a realidade urbana, por isso sempre esbarro com as cenas. Porém, muitas vezes, não reparamos nas paisagens do nosso cotidiano, ainda mais com o ritmo alucinante da vida atual. E por isso, ao mesmo tempo, busco essas imagens, me forço a reparar, mantenho o olhar atento. Acho importante para não ser anestesiado pela cidade. Precisamos manter os sentidos ligados e praticar fotografia ajuda. Seu portfolio apresenta um preto e branco denso, contrastado. Como surgiu essa opção? Como você acredita que o PB contribui para o seu trabalho? Acredito que a foto colorida consiga demonstrar melhor a beleza, o encantamento


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Enxergamos colorido, portanto contemplar a fotografia colorida é algo natural. Porém o preto e branco nos força a montar a cena e entendê-la, e assim estimula nossa mente e olhar, estimula a reflexão, e é o que busco com minha série de imagens. A cor cinza é predominante nas grandes cidades, portanto esteticamente penso ser a melhor escolha para o tema. Já o forte contraste representa a desigualdade retratada, o contraste entre realidades, não apenas na fotografia. Há, em alguns momentos do seu trabalho, um registro da pobreza e da desigualdade nas cidades. Você vê a sua fotografia como um mecanismo de denúncia? Creio que todos que olham para uma

fotografia inevitavelmente pensam sobre a cena, sobre o personagem, sobre o lugar, imaginam o que acontecia e o que poderia acontecer. A reflexão sobre a imagem segue baseada nas experiências do próprio observador, o que ele já viu e viveu influencia sua análise sobre a foto. OLD Mas depois o sentido se inverte e a mesma 40 reflexão interfere no observador, agrega sentimentos, exercita seu pensamento, podendo até alterar sua avaliação e opinião. Por isso a fotografia serve como como alerta, como provocação, como denúncia, para que as pessoas, no mínimo, pensem sobre a situação. Além disso, a fotografia registra uma época, um tempo. E a desigualdade social é uma situação comum atualmente, infelizmente, então condiciona o trabalho, precisamos pensar sobre isso.




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Como você se relaciona com os personagens que fotografa? Há um contato ou essas imagens são “roubadas”? O contato real com o personagem específico da foto nem sempre acontece, pois no momento exato do click tento ser invisível para não interferir na imagem ou provocar reações artificiais. Mas é extremamente importante o contato com o ambiente, ajuda a sentir e interpretar a cena e a situação antes de fotografar, e assim a chance de captar a mensagem e conseguir transformála em fotografia é maior. Por isso procuro me envolver explorando o local, conversando com as pessoas e conhecendo as histórias.

Você vê a cidade como um dos grandes temas da fotografia? Esse é o cenário principal da sua produção? Como sou formado arquiteto urbanista, acho natural que a cidade me atraia. E é um ótimo tema para a fotografia, é vasto, dinâmico e mutante. Por isso acho válido registrá-la, e assim estimulamos o pensamento sobre o cotidiano urbano, o que interfere no nosso estilo de vida e na forma como encaramos o meio onde vivemos, pensando sobre os problemas e soluções ou encontrando a beleza muitas vezes perdida.

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OLD ENTREVISTA GUI MOHALLEM


Gui Mohallem é um dos grandes nomes da nova fotografia brasileira. Lançou no final do ano passado o livro Welcome Home, que apresenta sua experiência em uma fazenda ritualística nos EUA. Em 2013 Gui está concluindo um trabalho desenvolvido no Líbano e estará presente no 3º Foto em Pauta, em Tiradentes. Conversamos com ele para conhecer um pouco mais do seu trabalho e da suas expectativas para este OLD ano. 47 Gui, você é formado em cinema pela USP. Como foi a transição do cinema/vídeo para a fotografia? Posso ser sincero? A USP, o curso de cinema, na minha época era bem complicado. Era muito mais um show de calouros do que uma escola. E o mais importante: não preparavam a gente para trabalhar em equipe, que é essencial no

cinema. Era um monte de gente caindo de pára-quedas, bem diferente de como o curso é hoje, principalmente em termos de programa. Antes de entrar na faculdade eu já fotografava um pouco, tinha uma câmera reflex e eu já brincava no minilab da cidade [Gui é mineiro, de Itajubá], pegava os químicos, testava em diferentes emulsões, para ver como reagiam. Então quando eu cheguei na USP e vi o laboratório PB da universidade fiquei encantado. Fiquei pirando no PB e já comecei a fazer assistência para os veteranos nas férias, no PB. O processo do trabalho em equipe no cinema foi muito estressante para mim, principalmente quando trabalhava com a minha turma, com pessoas com quem eu tinha uma relação mais profunda fora do set. Por conta disso eu me enfurnei no laboratório, foi como um processo de recuperação dos sets em equipe. Depois do incêndio na USP [em 2001 o prédio da Escola de Comunicações e Artes


foi vítima de um grande incêndio, alterando a dinâmica de vários cursos e causando a perda de diversos documentos] eu fui acolhido pelo João Musa e isso abriu minha cabeça para muita coisa. Foi nessa época que conheci o trabalho da Cláudia Andujar que mudou completamente minha visão. A relação que ela tinha com o fotografado, era uma coisa que eu nunca tinha visto antes, de tanta entrega com o personagem. No intervalo da aula fiquei mais um tempo com o livro para entender aquilo. Percebi que eu nunca seria uma alma tão evoluída, capaz de fazer aquilo. Quando eu sai do cinema eu já sabia que queria ter uma produção fotográfica, até porque demora muito pra você errar no cinema: você fica um ano trabalhando no roteiro, depois tem a captação, finalização, depois de três anos de trabalho você para e percebe: “ poxa, deu errado, né?”. Para você aprender você precisa errar e na fotografia eu achava que

você errava mais rápido. Você atua como professor no b_arco e tem uma grande experiência pedagógica passando pelo Instituto Criar de Cinema e TV, entre outras escolas. Como é a experiência de ensinar cinema e fotografia? O que você mais absorve do contato com os alunos? Esse ano deu vontade de voltar a dar mais aulas, por essa troca mesmo. Tem uma coisa que eu descobri recentemente que não basta saber pra dar aula, tem que saber ensinar, que é outro pedaço. Quando eu fui dar aula de elétrica - eu não tive aula disso na USP - eu tive que aprender elétrica, depois aprender a dar aula de elétrica. Uma coisa que minha mãe, que é professora, falou pra mim um dia, depois de uma oficina que eu dei em Itajubá: “filho, do que você fala, só 20% eles vão aprender”. Eu acredito que na

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aula o professor tem que provocar uma experiência, tem que provocar. Quem vai ter o insight é o aluno, o professor não tem nada a ver com isso, o que você pode fazer, como professor é criar uma situação que leve o aluno à descoberta, mas de qualquer forma ela é da pessoa, não do professor. Nas aulas que eu dei no B_arco e no Criar o tempo era isso: pensar em como criar esse tipo de situação. Dentro deste pensamento em OLD toda aula eu acabo aprendendo mais, sobre 49 como dar aula, sobretudo, e sobre como isso acontece, como cada um vai perceber esse momento. Como começou o projeto Welcome Home? Como você descobriu esse local, essa celebração? Foi bem por acaso. Acho que muita coisa na minha vida tem a ver com cliques. Eu tinha um perfil no couch surfing [site que junta

Para aprender você precisa errar e na fotografia eu achava que você errava mais rápido do que no cinema


viajantes dispostos a ceder seu sofá como hospedagem em casa em troca da possibilidade de usar um sofá em outro país ou cidade] e um cara pediu pra ficar na minha casa. Eu já tinha ouvido falar dessa comunidade nos EUA. Eu tinha me envolvido profissionalmente com pessoas ligadas a essa comunidade, mas de repente alguém que morava lá estava na minha sala. Foi isso. E a gente ficou super próximo e ele me convenceu que eu tinha que ir para a comunidade. E eu consegui dar um jeito e fui. Eu não fui pra fotografar nada, eu levei a câmera porque eu sempre levo pra todo lugar, eu fui lá pra viver a história de uma pessoa que naquele momento era muito próxima de mim. Foi realmente muito mágico. Quando eu voltei eu fiz o que eu sempre faço: peguei os filmes, revelei, fiz uma cópia barata e fiz um bolinho, para mexer depois. Um amigo trouxe seu alunos para o ateliê, para eu dar uma aula pra eles e enquanto eu

falava com os alunos dele ele ficou vendo as imagens que eu tinha feito na viagem. Ele me provocou, falando que tinha coisa ali. Meses depois a gente fez um projeto junto chamado Incubadora, que eram três fotógrafos trabalhando suas séries com a interferência dos outros e do Ronaldo Entler, professor da FAAP, na hora de decidir qual série eu iria trabalhar eu decidi por essa, que era a série mais inacabada. Voltei OLD 50 lá mais três vezes para esse projeto, já sabendo que seria uma série, com todos os desdobramentos relativos a isso: já sabendo que seria uma seqüência de imagens, como manter a questão da experiência e ainda assim estar trabalhando, com a intenção de fazer uma série. Fui ao todo umas cinco vezes ao santuário. Das três primeiras fui fotografando, na penúltima eu levei a edição do livro para eles darem autorização, ganhar a benção mesmo e a última, em setembro do ano passado, eu levei o livro mesmo. Fiz um




lançamento lá, antes de fazer aqui. Foi bem importante, foi como um encerramento desse processo. Como foi se aproximar de seus personagens e conquistar sua confiança para começar a fotografá-los? Não é a história deles que eu conto. É a minha. Não teve essa questão do OLD documentarista. Eu fui lá viver. Eu tinha 53 relações reais com aquelas pessoas, tem histórias. É muito forte a troca e a fotografia acontece naturalmente, no meio da história. A grande questão, na segunda vez que eu fui, foi começar a mostrar pras pessoas que eu estava realmente fazendo um trabalho ali, que tipo de trabalho era e ter a autorização delas. Quando eu tinha a autorização eu combinava com a pessoa que ela seria fotografada, mas quando ela não estive olhando, em um momento qualquer. Eu

sentia que tinha vontade de fotografar aquela pessoa. A fotografia pra mim tem uma relação muito próxima com o desejo. Pra mim quando você muda o jeito que você fotografa você muda o jeito que você deseja e isso foi uma das coisas mais legais dessa experiência, porque as coisas caminharam muito juntas e isso é uma grande mudança na vida da pessoa, quando você muda a maneira que você deseja ela, que você muda a maneira de expressar esse desejo, como você propõe pro outro isso. Tem para mim um apropriar gradual daquela casa, que ocorreu ano a ano, que eu vejo pela participação que eu tive no próprio ritual e na comunidade. Eu cheguei com um pouco de medo, como um satélite, vendo as coisas. Na segunda vez eu me coloquei mais, me deixei mais vulnerável, comecei a participar da cozinha, fiz tabule para 400 pessoas, me envolvi mais nos preparativos do ritual. Na terceira vez eu já fazia parte da equipe que


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pensa o ritual, foi um movimento natural, de crescimento dentro de um processo. O engraçado é que as pessoas que acompanham o processo desde o começo percebem essas mudanças nas imagens. A pessoa que me levou até lá vê claramente a diferença dentro dessas três fases de relacionamento. OLD 55

Gabriel Bogossian coloca em seu texto sobre Welcome Home que você está ao mesmo tempo dentro e fora da celebração e só dessa forma conseguiria construir essas imagens. Como foi lidar e construir essa relação, de ser ao mesmo tempo parte de um grupo de pessoas e um visitante em seu ritual? Achei lindo quando ele falou, mas não era consciente quando acontecia. Mas para mim eu estava ali e só. É óbvio que eu estou fora, porque eu não pertencia ainda àquele lugar,

porque eu ainda estava conhecendo aquelas pessoas e fotografar é um jeito de conhecer, de entender a própria experiência. Eu acho uma besteira esse papo de digital vs. analógico, mas especificamente neste projeto, foi muito importante fazê-lo em filme, pela simples razão que eu não tinha uma relação “eu com a pessoa/eu com a imagem/ eu com a pessoa” era uma relação direta com a pessoa. A imagem acontecia e eu não via, ela ficava guardada, depois que eu ia ver. Esse tempo que a imagem fica latente, que no meu processo é bastante estendido - demoro para revelar, ampliar e afins -, meu tempo para processar melhor o que eu vivi, tive tempo e coragem para encarar esse processo. As imagens falam mais da minha experiência para mim, me ajudam a entender o que aconteceu. Voltando a questão de estar dentro e estar fora: enquanto eu estou lá... Nossa é tão difícil isso. Eu não consigo separar as coisas não, é como se fosse um


duplo mesmo. Não consigo me ver só dentro, me vejo fora também, mas me vejo dentro o tempo todo. Tem muito amor sabe, tem uma curiosidade do amante. Por isso que eu acho que é dentro e fora ao mesmo tempo, porque é a curiosidade do amante, você olha o detalhe do corpo do outro e se envolve, se apaixona, às vezes é uma ruga, é uma pinta, é uma dobra, é uma curva no ombro, esse curioso não é o do antropólogo, é um curioso que quer também apertar a bochecha. Enfim, acho que por ai vai, encaixa mais. Há um clima muito próprio em suas fotografias, que mistura cotidiano, fantasia e uma certa aura densa, de tristeza ou tensão. Como foi o processo para alcançar essa construção, este estilo? Eu criei uma técnica de fotografia em película, que eu inventei um nome, um

monte de coisa, é toda absurda. No final das contas ela me desobriga de pensar na hora de fotografar. Eu não fotometro, que é a grande questão deste processo. Então eu não penso na câmera na hora de fotografar. Eu revelo o negativo e ele vem todo verde para mim, eu perco a relação com o real e eu construo essas cores depois, no sistema. Então a cor e a densidade das imagens é construída no sistema. A fotografia é um começo e ela é um fim, mas não tem muita fotografia no meio do processo. Tem muito mais da pintura do que da fotografia neste processo. Não quero ser pintor, não tenho nenhuma formação nisso, mas é uma coisa de 80 layers de cor no photoshop, com um tablet pintando cada areazinha, é muito próximo da pintura. Então essa paleta de cores eu vi depois. Tem um “roxinho magenta” em detalhes específicos que eu fui perceber depois que estava em várias imagens. Tem uma relação muito maior com

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o meu pensamento, com o acaso, do que com o cinema, que faz um estudo de paleta de cores. Tem um pouco a ver com o que aconteceu, com o sentimento, com tentar traduzir isso tudo em uma imagem. Isso não é inconsciente, mas também não é planejado e o encontro dos tons é uma surpresa. O fato de não existirem algumas cores também é um coincidência, vai acontecendo. Eu tenho muito medo da consciência nos meus próximos trabalhos. O que você está planejando para 2013? Você já tem novos projetos em mente? No meio de 2011, em Junho, eu fiz uma residência artística no Líbano. Meu pai e minha mãe vieram de lá e a residência serviu como uma chance de ir para lá, só isso. Ver de onde veio minha cultura, me ver e me deparar, me encontrar ali espelhado, coisas de mim que eu nem conhecia. Foi bem

intenso. Eu gosto muito de ter um tempo entre fazer o processo e ter a experiência. Em Fevereiro deste ano eu tenho uma exposição de processo em Belo Horizonte, para testar um pouco esse processo. Nesta exposição já vai ter muito vídeo, que era o meio no qual eu estava mais desconfortável e por isso foi o que eu escolhi para investir. Em Junho tem a exposição individual deste trabalho aqui em São Paulo, na galeria OLD Emma Thomas. Eu estou muito ansioso 58 sobre como começar a fazer vídeos, a editar o material. É uma viagem que não aconteceu só nesse mês que eu fiquei no Líbano. Tem todo o processo de mostrar o material para o meu pai, que é uma outra viagem, na qual eu descubro mais histórias. Enfim, as coisas estão acontecendo É o trabalho no qual eu estou mais presente, mais dentro do trabalho, o que dá muita insegurança. Dá insegurança porque é vídeo, porque eu estou presente, fisicamente presente.


Tiago Calazans Sport



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Tiago Calazans traz para a OLD uma visão muito original da fotografia de esportes. Tiago mostra a torcida do Sport de dentro, envolto no processo, esquecendo o jogo e se concentrando no fenômeno das torcidas organizadas. São imagens escuras, fortes e envolventes. A série que você apresenta aqui foi feita durante um jogo do Sport. Qual a sua relação com a fotografia de esportes? É um de seus principais ramos de atuação? Adoro fotografar para revistas, fazer retratos,

ensaios autorais é onde mais atuo, mas quando comecei a estagiar no Jornal do Commercio (Recife/PE) iniciou meu interesse por fotografia esportiva, uma fotografia rápida, que necessita de muita atenção, prevê os lances, imaginar a trajetória da OLD bola, pra onde ela vai. Tudo isso é muito 62 instigante. Tive oportunidade de fotografar campeonatos nacionais e estaduais. Mas a vontade de fotografar a emoção, a expressão do torcedor sempre foi maior do que o jogo em si.
 E como é sua relação com o Sport? Você é torcedor do time? Foi tranquilo fotografar no meio da torcida? Quando criança ia com meu pai para todos


os jogos do Sport. Torcia, gritava, ficava emocionado com a torcida, ver um estádio lotado gritando em um único coro é belo. Durante a execução do trabalho então foi emocionante. 
O ensaio foi executado durante o jogo que classificou o Sport para série A do Brasileirão em 2011. O jogo era fora de casa e fui fazer uma pauta na sede do time onde estava passando o jogo num telão. Tinha muita gente, mal dava para caminhar, OLD como cheguei só no segundo tempo o 63 melhor lugar que encontrei foi em cima de um muro onde fotografei tudo até o jogo acabar, assim que terminou corri entre os torcedores que estavam e êxtase. Já tinha feito um outro ensaio dentro da torcida e terminei reencontrando alguns personagens. As pessoas pediam a todo momento para fotografá-las. Seu ensaio foge completamente do que estamos acostumados a ver em fotografia


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esportiva, mesmo de torcidas. Como foi a busca por essa linguagem própria? OLD 67

É importante observar, ler imagens. A melhor forma de sair do comum é ver o que esta sendo produzido, foi assim que começou a busca por uma fotografia diferente, abrindo os jornais, revistas de esportes, estudando. O ensaio foi realizado durante uma pauta e ter esse input foi essencial para as escolhas na hora H. Suas imagens são bastante tensas, opressoras até. Essa era o clima ali? Esse é um dos pontos importantes do seu ensaio?

Foi tudo muito rápido, durante o jogo as condições de luz eram bem diferentes, as pessoas se comportavam, apesar de muito fervorosas, de outra forma, o jogo não foi fácil. Faltando alguns minutos para o fim começou uma briga entre os torcedores. Desligaram o telão começou uma correria, até que o jogo acabou e a impressão que eu fiquei fotografando toda essa confusão de cima foi que a briga acabou com o apito final. Desci do muro e tinha uma mistura de confusão e alegria, uma montanha de cadeiras jogadas em um canto, as pessoas pareciam que estavam comemorando uma vitória sangrenta. Era uma quadra fechada e os sinalizadores deixaram o ambiente esfumaçado dando uma impressão de conflito.


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As fotografias que você apresenta aqui na OLD tem grandes áreas de sombra e uma predominância da cor vermelha. Quais suas intenções com essa construção? As condições de luz eram bem precárias então aproveitei os pontos de luz, ajustei o balanço de branco para que as imagens conversassem com o time e a torcida que são rubro-negros. Foi a forma que encontrei para mostrar o clima do local, era tudo escuro, havia um algo parecido com a comemoração pelo final de uma guerra sangrenta, as pessoas que ali estavam sentiam-se parte daqueles guerreiros que estavam em campo.

Há também uma presença forte de uma exposição mais longa dando mais movimento às imagens. Você vê essas características como pilares do seu estilo fotográfico? Vejo essa exposição mais prolongada como uma técnica que executei para mostrar ação, movimento. Todos estavam comemorando, correndo, dando socos no ar. A fumaça tirava a nitidez dos movimentos, era como meus olhos enxergavam tudo aquilo.

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Felipe Vellasco Dilge



uma cultura tão diferente?

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Felipe Vellasco, também conhecido como Vellas, é um fotógrafo e diretor de cena, com base em São Paulo. Vellas dirigiu recentemente o filme publicitário da nova Leica M Monochrom, que fez muito sucesso entre os fotógrafos. Aqui na OLD nós vamos conhecer seu portfolio produzido na Turquia. Vamos ao papo! Seu ensaio apresenta a cultura turca, que é um bocado diferente da nossa. Como foi esse contato? Como foi para você retratar

Fotografar outra cultura sempre tem seus desafios. Não importa muito se é fora ou dentro do país. Você nunca sabe como será recebido, se apontar uma câmera pra alguém pode ser ofensivo, se vão gostar, se exibir, enfim, é sempre uma incógnita. Na Turquia, pra minha surpresa, eles são bem receptivos com fotos, e a câmera não assusta tanto. Eu uso uma Leica analógica, que praticamente não faz barulho nenhum e é bem mais “informal” do que uma DSLR digital, que é um canhão. Isso me ajuda bastante na hora de fotografar fora do país, ou mesmo em lugares mais afastados no Brasil, onde a


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cultura e os costumes são bem diferentes do Sudeste, onde vivo. A Turquia é um lugar com bastante turistas, então você precisa sair um pouco do circuito pra encontrar a vida como ela é, de verdade. O lado Asiático em Istambul é um desses pontos da cidade onde não se encontra um turista por um bom tempo, e isso ajuda às vezes. Além de fotógrafo você também é diretor de audiovisual. Como essa relação com o vídeo influencia sua produção fotográfica? Acho que é uma via de 2 mãos. Ser diretor, me ajuda na hora de fotografar, pois eu me sinto bem a vontade de conversar, me enfiar, pedir autorização para entrar em um edifício,

pra fotografar a família de alguém, e as vezes, até dirigir uma foto. Acho que é uma “manha” que você vai adquirindo com a profissão e que ajuda na hora de fotografar na rua, sem qualquer produção. E ser fotógrafo me ajuda na profissão, pois acabo entendendo muito mais de lentes, distância focal, movimentos, enquadramentos e composição do que antes. Sou diretor de comerciais, e os filmes que produzo são geralmente filmes com uma pegada estética, de direção de arte, fotografia etc. E a fotografia me ajuda a aprimorar e estar sempre testando coisas novas.

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Seu trabalho é composto basicamente por imagens analógicas e em PB. Como começou sua relação com a fotografia de filme? Como foi a opção de usá-la para produzir este trabalho? OLD 81

São alguns fatores. Eu fotografo só com filme. Tenho feito mais coisa em cor ultimamente, mas uso cor basicamente a noite. E PB de dia e de noite. Vez ou outra compro uns Fuji Provia (cromo) e tiro de dia também, depende um pouco de onde for usá-lo. Se for uma história que a cor ajude a contar, eu acabo usando cor. Mas geralmente uso PB. Como minhas fotos são bem documentais, eu acabo usando mais PB pois acho que passa mais emoção, as texturas e desvia menos o olhar do que fotos coloridas.

Eu não uso digital pois acho muito “liso”, muito limpinho. Não sei.. Gosto de fotos mais sujas, granuladas, como as do Pedro Martinelli, Mascaro, Tiago Santana, Trent Parke, Daido Moriyama... Acho foda. Eu sei que posso sujar e texturizar e manipular no Photoshop, mas tenho preguiça e sinto que estou roubando no jogo. Gosto do fato da foto estar ali, fisicamente, num negativo e não num HD. Gosto da espera, da dúvida se ficou bom ou não, se saiu ou não, se eu acertei a exposição, se estava focado... E gosto do fato de me desconectar emocionalmente da foto. Eu levo as vezes 2 - 3 meses pra mandar revelar um negativo, eu nem me lembro o que tem lá dentro. Isso ajuda na hora de editar.


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Suas imagens apresentam um cotidiano urbano, típico de um dia a dia de cidade. Como foi o processo de encontrar essas imagens? E como foi a edição até chegar na seleção que vemos aqui? O processo é bastante simples. Saio com a câmera e fotografo o que acho interessante. Ando randomicamente pela cidade, vou fazer o que quero fazer, ver o que quero ver e vou parando e tirando foto. Depois revelo, e faço um pré select. Depois mais um select e depois um select final. Ai eu me arrependo e faço tudo de novo. Na Turquia eu tirei bastante foto, mas menos do que achei que fosse tirar. Acho que voltei de lá com uns 20 rolos entre Istambul e Capadoccia. Nesse caso acabou sendo menos demorado.

Você produziu alguns retratos para esse ensaio. Como foi a abordagem desses personagens? Você chegou a estabelecer alguma relação com algum deles? Ah, varia de caso pra caso, mas basicamente eu tirava a foto e fazia um “jóia” depois.. Não tive problemas. Acho que tenho mais problemas com essa técnica no Brasil do que fora. Aqui as pessoas são mais agressivas, tem mais medo, não sei. Eu fotografei na Tailândia na sequência da Turquia, e fiquei espantado como eles eram receptivos. Eu estava fotografando umas crianças

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Você está trabalhando em algum outro projeto atualmente?

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e geralmente isso é meio difícil, porque os pais acham que você possa ser algum pedófilo freak e eu na verdade até entendo. Mas lá, eles chamavam os irmãos pra aparecer também. Os pais sentiam um certo orgulho de que tinha alguém interessado nos filhos deles. Era maluco. Lá foi o lugar mais receptivo que já fotografei na vida.

Sim, atualmente tenho 2. Estou fotografando as Ocupações do FLM (Frente de Luta por Moradia) em São Paulo, e devo acabar até o final de 2012. Já tenho bastante coisa, mas ainda quero ir em alguns lugares pra terminar. O outro eu já estou editando, sobre a Tailândia. Passei 20 dias pelo país, fotografando com minha esposa as cidades e o campo. Vou edita-lo nos moldes que editei o livro que contém este ensaio da Turquia, chamado “Dilge”.


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Ultrapassagem por Tito Ferradans

Lens whacking é uma experiência visual viciante. Há uma textura nostálgica, onírica, de memória ou sonho há muito esquecidos, onde poucas coisas são importantes e todo o resto é fluido e luminoso, difícil até de descrever. Quando uma lente está encaixada na câmera, os únicos raios de luz que chegam ao sensor são através dela. Mas se a lente não está encaixada os raios de luz entram pelo vão do encaixe e incidem diretamente sobre o sensor, produzindo artefatos diferentes de qualquer flare normal. Nessa abordagem todo o processo de foco é manual, aproximando ou afastando a lente do sensor: poucos milímetros de afastamento são suficientes para o foco percorrer vários


metros. E, para foco mais próximo, mais distante a lente estará do sensor, deixando mais luz entrar clandestinamente e reforçando a sensação visual. Tecnicamente, são utilizadas lentes em que a distância para a formação de imagem em foco sobre o sensor seja maior do que a distância do encaixe padrão da câmera. O grande truque é não usar adaptadores. Com o foco no infinito e a íris toda aberta, segure a câmera com uma mão e a lente com a outra. É praticamente impossível alinhá-la perfeitamente com o sensor. Uma vez que o plano de foco não coincide com o plano do sensor, é possível, por exemplo, ter assuntos a uma mesma distância onde um está focado e outro não, dependendo da inclinação da lente (similar a uma tilt-shift). Câmeras digitais são mais adequadas, pois há a opção de monitorar a imagem pelo LCD, especialmente nos modos de vídeo. É possível ter maior controle sobre a luz que

entra direto mudando o posicionamento das mãos de forma a cobrir parcialmente o vão entre a lente e o encaixe. Vale lembrar que não é só a luz entra pelas brechas, pó também passa e acaba caindo sobre o sensor.Riscos à parte, impossível negar a força da conexão criada entre as imagens produzidas e as áreas menos racionais de nossa mente. Uma espécie de transe se estabelece e não dá pra largar a câmera antes de experimentar um bocado. Às vezes a ideia não é nem fazer uma imagem específica, mas brincar com a fluidez hipnótica, aleatória e envolvente que transforma o mundo claro e rígido à nossa frente num agradável caleidoscópio. Tito é fotógrafo de vídeo e vive a testar todas as (im)possibilidades que câmeras e lentes lhe oferecem. Você pode saber um pouco mais de suas peripécias em tferradans.com/blog

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Gilvan Barreto

Fissuras por Ágata

Moscouzinho, a construção de uma República do Afeto (parte 1) Explorar as fissuras deixadas pelo processo criativo e passar a compreendêlas criam linhas de fuga do pensamento e abrem outras perspectivas para a obra, evidenciando seu passado e memória. Em meio ao desabrochar dessas reflexões, “Moscouzinho”, livro de Gilvan Barreto, chegou às nossas mãos durante o 8º Paraty em Foco, em setembro de 2012. O trabalho


do fotógrafo pernambucano instigou, acima de tudo, pela riqueza do processo de criação. Foi a perda do pai que o fez mergulhar em suas memórias, dar braçadas em Jaboatão dos Guararapes, o pequeno município onde cresceu, e emergir em Moscouzinho, uma ilha imaginária, construída pelo afeto e ficcionada pelo tempo. No início do projeto, Gilvan achou que se depararia com a Mouscouzinho deixada por ele na infância, aquela onde fazia discursos políticos em cima de carros de som e ao lado de seu pai. Qual não foi a surpresa ao perceber que aquela imagem que guardava com tanto zelo na lembrança, poderia ser reproduzida com os ganhos da ficção. No livro, a delicada imagem retrata um menino segurando um microfone de mãos dadas com um homem, que parece ser levado pelo vento. O fotógrafo, inspirado pela pintura Promenade, de Marc Chagal, deixou de lado as manipulações e escolheu

vivenciar a experiência, dando às mãos ao seu filho numa espécie de performance necessária à sua autobiografia reinventada. Assim como essa, outras cenas são produzidas no “tablado imaginário” do fotógrafo que, como ele diz, não cessam de acontecer novamente aos seus olhos. Elas vêm da poesia - no caso a poesia soviética - e ganham uma narrativa cinematográfica com roteiro e encenação. OLD São imagens documentais sem compromisso 92 com a verdade, mas com a experiência do reencontro. Além de mostrar um ciclo do ato criativo, que parte da realidade, passa pela memória e recorre à ficção para se materializar em obra. Ágata é um coletivo multidisciplinar em construção. Um encontro de afinidades que tem na fotografia um campo fértil para o exercício crítico e da expressão artística.


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VinĂ­cius Ferreira


Women dancers from Kiralfy’s Carnival of Venice, “The Trail,” Lewis and Clark Exposition, Portland, Oregon


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